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Aula 2 – Delegado da Polícia Federal – 2013 Direito Processual Penal – Teoria e Exercícios Comentados Pablo Farias Souza Cruz www.pontodosconcursos.com.br 1 Aula 2 – Delegado da Polícia Federal – 2013 Direito Processual Penal – Teoria e Exercícios Comentados Olá amigos, Bom dia! Boa tarde! e Boa noite! Nosso objetivo de hoje: Aula 2: 3 Processo criminal: finalidade, pressupostos e sistemas. 4 Ação penal. 4.1 Conceito, características, espécies e condições. 4.2 Sujeitos do processo: juiz, Ministério Público, acusado e seu defensor, assistente, curador do réu menor, auxiliares da justiça, assistentes, peritos e intérpretes, serventuários da justiça, impedimentos e suspeições. Antes, porém, conforme prometido no fim da aula passada, vamos a orientação das respostas aos questionamentos. Lembra-se das perguntas? Vamos rememorar. Aula 2 – Delegado da Polícia Federal – 2013 Direito Processual Penal – Teoria e Exercícios Comentados Pablo Farias Souza Cruz www.pontodosconcursos.com.br 2 “1) Disserte sobre o Indiciamento: Conceito, Atribuição e Consequências. 2) Numa situação de arquivamento do inquérito policial, pode acontecer decisão com a marca da imutabilidade plena? (Ministério Público Federal – 21º Concurso para Procurador da República)” Orientação para a resposta da Questão dissertativa 1): Conforme dito anteriormente, pode-se conceituar indiciamento como o ato pelo qual a autoridade policial reúne um conjunto de elementos de informação em relação a um ou mais suspeitos, de modo a demonstrar a plausibilidade da autoria apurada no procedimento investigativo. No que tange à atribuição para decretar, se tem que o indiciamento é um ato do delegado de policia, e, em que pese desnecessário, tem aptidão para produzir constrangimento natural na vida do mesmo, haja vista a inclusão da informação de indiciado em sua folha de antecedentes. Como consequências jurídicas desse ato, informamos que ele implica: 1) Dificuldade de trancamento do inquérito; 2) Viabilidade da impetração de HC (MS para alguns a depender da hipótese) em caso de indiciamento ilegal; 3) Determinação da tipificação aparente da conduta, o que refletirá na adequação do procedimento investigativo a ser seguido (TCO ou IP a depender da hipótese); 4) Viabilização dos eventuais pedidos de prisão preventiva, prisão temporária e demais medidas cautelares penais; e Aula 2 – Delegado da Polícia Federal – 2013 Direito Processual Penal – Teoria e Exercícios Comentados Pablo Farias Souza Cruz www.pontodosconcursos.com.br 3 5) Necessidade cientificação do indiciado a respeito dos direitos fundamentais que lhe assistem diante dessa configuração. Orientação para a resposta da Questão dissertativa 2): Para responder, primeiro devemos registrar o que seria a imutabilidade plena. Primeiramente, vimos que a coisa julgada costuma ser definida como a imutabilidade que emerge do comando da sentença. Contudo, não mencionamos o qualificativo, plena, como a questão nos propõe. Assim, se poderia falar de imutabilidade plena quando atingimos a denominada coisa soberanamente julgada, situação onde nem mesmo as ações que costumam ter aptidão para desconstituir a coisa julgada terão força para tal fim. Exemplifico: Se uma decisão absolutória transita em julgado, mesmo que ela tenha se pautado em uma fraude, não será possível se falar em ação de revisão criminal, já que esse instrumento jurídico é exclusivo da defesa. Desse modo, as sentenças absolutórias1 fazem automaticamente coisa soberanamente julgada, atingindo assim a denominada imutabilidade plena. Nesse contexto, uma decisão que arquiva o inquérito policial, a depender da hipótese, poderá sim gerar a imutabilidade plena, desde que se fundamente na ausência da pretensão punitiva. Isso ocorrerá, por exemplo, se o inquérito for arquivado com base na atipicidade do fato. Sobre o tema tratamos em nosso Processo Penal Sistematizado: 1 Cuidado se deve ter com a decisão que extingue punibilidade com base em certidão de óbito falsa, pois como historicamente decidiu o STF, somente nesse caso se admitiria revisão criminal contra o réu, já que os direitos e garantias fundamentais não podem servir de escudo para prática de ilícitos. Aula 2 – Delegado da Polícia Federal – 2013 Direito Processual Penal – Teoria e Exercícios Comentados Pablo Farias Souza Cruz www.pontodosconcursos.com.br 4 “Segundo o STF é possível que a decisão de arquivamento se torne imutável pela coisa julgada material, seria a hipótese em que estivesse embasada na prova da inexistência do crime. Sobre o assunto é elucidativa a seguinte decisão: Desarquivamento de Inquérito e Excludente de Ilicitude - 3 O Tribunal retomou julgamento de habeas corpus, remetido ao Pleno pela 1ª Turma, em que se discute a possibilidade de desarquivamento de inquérito policial, com fundamento no art. 18 do CPP (“Depois de ordenado o arquivamento do inquérito pela autoridade judiciária, por falta de base para a denúncia, a autoridade policial poderá proceder a novas pesquisas, se de outras provas tiver notícia.”), e posterior oferecimento de denúncia, quando o arquivamento decorre do reconhecimento da existência de excludente de ilicitude (CP, art. 23, II e III, 1ª parte). Na espécie, após o arquivamento do inquérito, o Ministério Público reinquirira testemunhas e concluíra que as declarações destas, contidas naquele, teriam sido alteradas por autoridade policial. Diante dessas novas provas, o parquet oferecera denúncia contra os pacientes. Pretende-se o trancamento da ação penal — v. Informativos 446, 512 e 569. O Min. Joaquim Barbosa, em voto-vista, acompanhando a divergência iniciada pelo Min. Marco Aurélio, deferiu o writ para determinar o trancamento da ação penal, por reputar que o arquivamento do inquérito policial — realizado a partir do reconhecimento de que houvera legítima defesa e estrito cumprimento do dever legal — fizera coisa julgada material, o que impediria seu posterior desarquivamento. HC 87395/PR, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 26.8.2010. (HC-87395) Desarquivamento de Inquérito e Excludente de Ilicitude - 4 Enfatizou não vislumbrar diferença ontológica entre a decisão que arquiva o inquérito, quando comprovada a atipicidade do fato, e aquela que o faz, quando reconhecida a legalidade e licitude desse, porquanto ambas estariam fundadas na inexistência de crime e não na mera ausência ou insuficiência de provas para oferecimento de denúncia. Registrou orientação da Corte no sentido de que, arquivado o inquérito policial com base na Aula 2 – Delegado da Polícia Federal – 2013 Direito Processual Penal – Teoria e Exercícios Comentados Pablo Farias Souza Cruz www.pontodosconcursos.com.br 5 inexistência do crime, produzir-se-ia coisa julgada material. Aduziu, destarte, que, tal como não seria admissível o desarquivamento do inquérito policial pelo surgimento de provas novas que revelassem a tipicidade de fato anteriormente considerado atípico pelas provas existentes, também seria inviável o desarquivamento na hipótese de fato julgado lícito com apoio em provas sobejamente colhidas. Asseverou que, na situação dos autos, o Ministério Público, diante do acervo probatório apurado, concluíra que o fato investigado não seria criminoso e, em consequência, deixara de oferecer denúncia e requerera o acolhimento das mencionadasexcludentes de ilicitude, o que fora acatado pelo juízo de origem. Assim, o arquivamento não decorrera de mero encerramento de investigações improfícuas, mas sim de um pronunciamento de mérito, anterior ao oferecimento da denúncia e que corresponderia à absolvição sumária. Após o voto do Min. Cezar Peluso, Presidente, que seguia a divergência, pediu vista dos autos o Min. Ayres Britto. Por fim, o Tribunal determinou a suspensão do processo penal, até conclusão deste julgamento. HC 87395/PR, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 26.8.2010. (HC-87395)2 grifos crescidos pelo autor Destarte, quando isso ocorrer, não poderá ser instaurada ação penal pelo mesmo fato. Abaixo segue jurisprudência do STJ no mesmo sentido: Processual Penal. Habeas-corpus. Trancamento de ação penal. Inquérito policial. Reabertura. Inviabilidade. Arquivamento pela atipicidade dos fatos. Novas provas. Inexistência. CPP, art. 18. súmula nº 524/STF. - A regra contida no artigo 18, do Código de Processo Penal somente autoriza a reabertura do procedimento investigatório policial frente à existência de novas provas, cuja extensão vincula-se ao surgimento de circunstâncias substancialmente inovadoras capazes de, por si só, alterar ou interferir na reconstrução dos fatos apurados no inquérito. - O arquivamento determinado pelo Juiz por solicitação do Promotor de Justiça com fundamento na atipicidade dos fatos imputados ao indiciado consubstancia óbice à instauração da ação penal. - A constatação da inocorrência do ilícito penal na oportunidade do arquivamento do inquérito, frente as conclusões contidas em parecer quanto à diligência da assistência médico-profissional prestada, 2 Disponível em: http://www.stf.jus.br/arquivo/informativo/documento/informativo597.htm Aula 2 – Delegado da Polícia Federal – 2013 Direito Processual Penal – Teoria e Exercícios Comentados Pablo Farias Souza Cruz www.pontodosconcursos.com.br 6 inviabiliza a reabertura do procedimento investigatório. - Habeas-corpus concedido. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - RECURSO ORDINARIO EM HABEAS CORPUS - 8987 Concluímos que, se o fundamento do arquivamento é a atipicidade do fato, o que ocorrerá é a COISA JULGADA MATERIAL. Ademais, conforme se viu acima, o STF tem ido além, afirmando que é impossível o desarquivamento de inquérito policial quando a decisão que o arquiva se pauta na inexistência de CRIME, fazendo alusão à coisa julgada material também na hipótese de arquivamento que reconhece excludente de ilicitude do fato.”3 Abordadas as questões da aula passada, vamos aos temas da aula de hoje. 3 Processo criminal: finalidade, pressupostos e sistemas. Conforme afirmamos em nossa aula 1 “O Direito Processual Penal é o “ramo do direito público4 que sistematiza e interpreta as normas processuais penais. O objeto de estudo do direito processual penal é, portanto, a norma processual penal que, por sua vez, traduz a efetivação do direito material respectivo, qual seja, o direito penal. Assim, verifica-se que o direito processual penal é instrumental, pois visa efetivar os comandos da norma penal, atingindo sua finalidade tanto quando condena o culpado, bem como quando absolve o inocente.”5” 3 CRUZ, Pablo Farias Souza. Processo Penal Sistematizado. No prelo a 1ª edição. Rio de Janeiro: Grupo Gen: Forense, 2013, p. 279/280. 4 Embora se reconheça a crítica que se faz à dicotomia romana entre direito público e privado. 5 CRUZ, Pablo Farias Souza. Processo Penal Sistematizado. No prelo a 1ª edição. Rio de Janeiro: Grupo Gen: Forense, 2013, p. 21. Aula 2 – Delegado da Polícia Federal – 2013 Direito Processual Penal – Teoria e Exercícios Comentados Pablo Farias Souza Cruz www.pontodosconcursos.com.br 7 Oportuna agora é a definição de Processo Criminal, de modo a se visualizar a distinção entre os termos Direito Processual Penal e Processo Criminal. Primeiramente devemos entender o que vem a ser o processo. Nesse âmbito se tem que processo é o movimento de atos destinados a prestação jurisdicional. Logo, processo criminal pode ser definido como o movimento de atos destinados à solução do caso penal. Por sua vez, também é oportuna a lição que diferencia processo de procedimento judicial. Enquanto o processo reflete uma ideia abstrata, material, o procedimento se refere ao aspecto externo do processo, sua forma. Logo, quem dita a forma do movimento que é o processo é o procedimento, que tem por finalidade dar lógica sequencial à realização dos atos processuais. O Processo Penal tem natureza jurídica de relação jurídica triangular, pois é formado por três atores: Juiz, Autor e Réu. Para sua existência jurídica ser reconhecida, alguns pressupostos precisam estar presentes. Vejamos: São considerados pressupostos processuais (ou pressupostos processuais de existência) os “elementos mínimos necessários à EXISTÊNCIA jurídica do processo penal. São requisitos cumulativos, necessários ao reconhecimento da existência jurídica do processo: 1)Órgão investido de jurisdição. 2)Pedido. 3)Partes.” 6 Sobre os sistemas processuais, remetemos o aluno ao lecionado na página 59 da aula 1. 6 CRUZ, Pablo Farias Souza. Processo Penal Sistematizado. No prelo a 1ª edição. Rio de Janeiro: Grupo Gen: Forense, 2013, p. 591. Aula 2 – Delegado da Polícia Federal – 2013 Direito Processual Penal – Teoria e Exercícios Comentados Pablo Farias Souza Cruz www.pontodosconcursos.com.br 8 4 Ação penal. 4.1 Conceito, características, espécies e condições. Inicialmente é importante diferenciar Ação Penal de Persecução Penal. A persecução penal pode ser definida como o conjunto de atos destinados à apuração do delito e à devida aplicação da lei penal. Assim, reconhecendo que a persecução penal é entendida como a resultante da soma da investigação preliminar com a ação penal, ambas estudadas no direito processual penal, passemos a análise da Ação Penal, parcela e, somente uma fase da denominada persecução criminal, conforme se visualiza na seguinte esquematização: Conceito de Ação Penal: Direito Público subjetivo ao exercício da atividade jurisdicional penal7. O direito de ação é classificado classicamente como um direito público, subjetivo, autônomo, abstrato e instrumental. A ação é um direito público na medida em que se dirige contra o Estado e em face do réu; subjetivo, pois decorre da qualidade de sujeito de direitos, inerente a cidadania; autônomo, na medida em que não se confunde com o direito material violado; abstrato, porquanto independe do fim ou da sorte do processo penal, existindo, inclusive, quando negado o 7 Feitoza, Denilson. Direito processual penal: teoria, crítica e práxis/ Denilson Feitoza. – 7ª ed., ver. e atual. Niterói, RJ: Impetus, 2010, p. 222. Persecução = Investigação + Ação Penal Preliminar Penal Aula 2 – Delegado da Polícia Federal – 2013 Direito Processual Penal – Teoria e Exercícios Comentados Pablo Farias Souza Cruz www.pontodosconcursos.com.br 9 direito material postulado; e instrumental, por servir como instrumento de proteção ao direito material violado. No contexto da Ação Penal condenatória, deve-se inquirir sobre seus elementos. Assim, são elementos da ação penal: as partes, a causa de pedir eo pedido. Entenda-se por elementos os fatos jurídicos que estão presentes em toda Ação Penal. “Para visualização sistemática, eis o seguinte gráfico: Pergunta: Existe Ação Penal não condenatória no Brasil? Resposta: SIM. São exemplos: o Habeas Corpus (ação penal liberatória), a Revisão Criminal e o Mandado de segurança em matéria criminal. No contexto das ações penais não condenatórias teríamos como partes no polo ativo: o réu, o advogado ou qualquer pessoa (no caso do Hábeas Corpus onde a legitimidade ativa é universal); e no polo passivo o Estado (Revisão criminal) ou a autoridade coatora (HC e MS). Como causa de pedir teríamos o ato ilícito ou abusivo que culminou na restrição indevida do direito fundamental. E como pedido Aula 2 – Delegado da Polícia Federal – 2013 Direito Processual Penal – Teoria e Exercícios Comentados Pablo Farias Souza Cruz www.pontodosconcursos.com.br 10 teríamos a anulação do ato processual, a declaração de inexistência da relação jurídica e consequentemente o restabelecimento do exercício do direito fundamental violado ou ameaçado de violação.”8 Espécies de Ação Penal A) Pública Quando titularizada pelo MP, qual é a peça formal que inicia uma Ação Penal Pública? R.: Denúncia, seja na ação penal pública incondicionada ou condicionada. B) Privada Quando titularizada pela vítima (ofendido), qual peça formal que inicia uma Ação Penal? Queixa-Crime que só pode ser apresentada por quem tem capacidade postulatória (Advogado ou Defensor Público). Obs.: Não confundir: 8 CRUZ, Pablo Farias Souza. Processo Penal Sistematizado. No prelo a 1ª edição. Rio de Janeiro: Grupo Gen: Forense, 2013, no prelo, p. 122/123. Aula 2 – Delegado da Polícia Federal – 2013 Direito Processual Penal – Teoria e Exercícios Comentados Pablo Farias Souza Cruz www.pontodosconcursos.com.br 11 Delação criminosa (“notitia criminis”) → Inicia Investigação Preliminar. Queixa-crime = Inicia a Ação Penal. Peça inicial O que limita a discussão do caso penal é a causa de pedir (e não o pedido), tendo em vista que, no processo penal, o réu se defende dos fatos imputados e não da capitulação legal dada pelo acusador9. Porém, deve ser respeitado o Princípio da correlação entre causa de pedir e da sentença. A sentença NÃO pode ultrapassar a causa de pedir porque esta limita a atuação jurisdicional (o réu se defende dos FATOS). No processo penal, o que limita a discussão é a causa de pedir (descrição minuciosa do fato) e não o pedido. Requisitos da peça inicial de uma Ação Penal Art. 41, CPP: “A denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas”. 9 Assim, é possível se pedir uma coisa e “obter” outra. Exemplo: promotor pede a condenação por roubo, mas o juiz condena no furto por entender que não existiu violência ou grave ameaça. Aula 2 – Delegado da Polícia Federal – 2013 Direito Processual Penal – Teoria e Exercícios Comentados Pablo Farias Souza Cruz www.pontodosconcursos.com.br 12 O primeiro requisito fundamental, que é o endereçamento ao juízo competente para o conhecimento daquela demanda, não está expresso, mas deve ser respeitado. Se não o for, isso não causará a extinção do processo, entretanto o juízo incompetente não irá receber a denúncia ou queixa e irá, imediatamente, declinar da competência em prol do juízo competente. É necessário ressaltar que a incompetência do juízo não é causa de rejeição, pois quem é incompetente, tanto o é para receber a denúncia quanto para rejeitá-la. Os requisitos de uma denúncia ou de uma queixa-crime vão obedecer rigorosamente aos elementos identificadores de uma demanda, que são (nessa ordem): as partes, a causa de pedir e o pedido. Após o endereçamento, há a qualificação das partes. Eventuais omissões de dados qualificativos poderão ser sanadas a qualquer tempo. Nesse sentido é a redação do artigo 259 do Código de Processo Penal. Art. 259, CPP: “A impossibilidade de identificação do acusado com o seu verdadeiro nome ou outros qualificativos não retardará a ação penal, quando certa a identidade física. A qualquer tempo, no curso do processo, do julgamento ou da execução da sentença, se for descoberta a sua qualificação, far-se-á a retificação, por termo, nos autos, sem prejuízo da validade dos atos precedentes”. Desse modo a ausência de dados qualificativos não impede que a denúncia seja recebida. O promotor pode oferecer a denúncia com a descrição física do acusado, ou até mesmo tratá-lo por meio de alcunhas para facilitar a identificação. A causa de pedir é o elemento identificador da demanda mais importante que temos. Ela se traduz na narrativa da conduta, que deve ser concisa e clara. Concisa, porque não deve se estender à Aula 2 – Delegado da Polícia Federal – 2013 Direito Processual Penal – Teoria e Exercícios Comentados Pablo Farias Souza Cruz www.pontodosconcursos.com.br 13 descrição de circunstancias divorciadas da infração ou do autor do fato. Ademais, quanto maior for a narrativa, maior será o ônus probatório do Ministério Público. Já a clareza é necessária, porque é a causa de pedir que delimitará, em primeiro lugar, o exercício do direito de defesa e, em segundo lugar, os limites da prestação jurisdicional. Portanto, a causa de pedir vai delimitar os limites de dois princípios, quais sejam, ampla defesa e congruência. Tecnicamente o princípio que vigora no processo penal deveria ser distinto do processo civil, haja vista aqui não é necessário que haja correlação entre o pedido e a sentença, mas sim entre a causa de pedir e a sentença. Isso porque no Processo Penal, o acusado irá se defender da narrativa fática, bem como a prestação jurisdicional será limitada por essa narrativa. O juiz está adstrito à causa de pedir, aos fatos narrados pelo acusador. Sobre o ponto insta transcrever o artigo que prevê a denominada emendatio libelli. “Art. 383. O juiz, sem modificar a descrição do fato contida na denúncia ou queixa, poderá atribuir-lhe definição jurídica diversa, ainda que, em conseqüência, tenha de aplicar pena mais grave. (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008).” Embora se reconheça que a exigência de narrativa detalhada implementa os princípios do contraditório e da ampla defesa no processo penal, verifica-se, em determinadas hipóteses, que os tribunais superiores admitem uma narrativa um pouco mais geral, desde que precisa o suficiente para viabilizar o direito de defesa e a realização da prestação jurisdicional. Ressalte-se, porém, que essa flexibilização somente é possível se a imputação descrever, ao menos, os chamados elementos Aula 2 – Delegado da Polícia Federal – 2013 Direito Processual Penal – Teoria e Exercícios Comentados Pablo Farias Souza Cruz www.pontodosconcursos.com.br 14 essenciais, que são os necessários para identificar a conduta como fato típico. O que se admite, portanto, é a confecção da denúncia geral10, impropriamente chamada, em alguns julgados, de genérica. O que, numa prova objetiva, pode obrigar o candidato a marcar a alternativa não tecnicamente perfeita, pois apesarde correta a distinção exposta (em nota de rodapé) verifica-se muitas vezes que os próprios tribunais utilizam o termo de forma não precisa. A respeito do tema, aos que se interessarem, vale observar a transcrição exarada no informativo 607 do STF, disponível em http://www.stf.jus.br//arquivo/informativo/documento/informativo60 7.htm#transcricao1 Prazo 10 “...para a boa compreensão da matéria ora em apreço, a essencialidade da distinção entre ‘denúncia geral’ e ‘denúncia genérica’. Entendida a primeira como a descrição clara e precisa do fato criminoso, na inicial acusatória, e a sua imputação a todos os acusados (seja pelo fato de que todos dele participaram, seja pela impossibilidade de esmiuçar a conduta de cada acusado, individualmente considerado), não se vislumbra maiores problemas à sua aceitação na doutrina e na jurisprudência pátrias, uma vez que a denúncia geral possibilita ao acusado o conhecimento preciso da imputação que lhe é feita, não lhe impedindo ou dificultando a defesa. Por outro lado, a denúncia genérica caracteriza-se justamente pela não-individualização das condutas/fatos criminosos narrados, de forma que todos são atribuídos, indistintamente, a todos os acusados – atitude esta de inegável desrespeito, pelo órgão acusador, aos princípios constitucionais que tutelam o acusado e, em última análise, que asseguram o próprio "ius libertatis". Desse modo, a ausência de relação de pertinência subjetiva entre os acusados e os fatos narrados na inicial acusatória – traço marcante da denúncia genérica – viola diversos postulados constitucionais, tais como o devido processo legal em sua vertente adjetiva, em que se enquadram as garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa (art. 5º, LV, da CF/88), o princípio da não-culpabilidade ou da presunção de inocência (art. 5º, LVII, da CF/88), o princípio da individualização da pena (art. 5º, XLVI, da CF/88) e, em última análise, o sobreprincípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF/88). Destarte, defende-se a impossibilidade de aceitação da denúncia genérica em quaisquer crimes, inclusive, nos denominados crimes societários.” (LIMA, Marília Silva Ribeiro de. Da (im)possibilidade de denúncia genérica nos crimes societários. Jus Navigandi, Teresina, ano 15, n. 2592, 6 ago. 2010 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/17111>. Acesso em: 25 jul. 2012.) Aula 2 – Delegado da Polícia Federal – 2013 Direito Processual Penal – Teoria e Exercícios Comentados Pablo Farias Souza Cruz www.pontodosconcursos.com.br 15 Art. 46, CPP: “O prazo para oferecimento da denúncia, estando o réu preso, será de 5 dias, contado da data em que o órgão do Ministério Público receber os autos do inquérito policial, e de 15 dias, se o réu estiver solto ou afiançado. No último caso, se houver devolução do inquérito à autoridade policial (art. 16), contar-se-á o prazo da data em que o órgão do Ministério Público receber novamente os autos”. “§1º: Quando o Ministério Público dispensar o inquérito policial, o prazo para o oferecimento da denúncia contar-se-á da data em que tiver recebido as peças de informações ou a representação”. “§ 2º: O prazo para o aditamento da queixa será de 3 dias, contado da data em que o órgão do Ministério Público receber os autos, e, se este não se pronunciar dentro do tríduo, entender-se- á que não tem o que aditar, prosseguindo-se nos demais termos do processo”. Prazo para oferecimento da denúncia é PROCESSUAL, contando-se da data em que os autos chegarem ao MP (“dies a quo”). Nesse tipo de prazo exclui-se o dia do começo e inclui-se o do término (“dies ad quem”). Não há sanção de natureza processual. Portanto, é um prazo impróprio. Mas MP pode ser punido administrativamente pela mora injustificada e ainda se viabiliza a Ação Penal Privada Subsidiária da Pública (queixa subsidiária) aplicação do princípio da inafastabilidade do poder jurisdicional. Outros prazos: → Economia popular – 2 dias → Eleitorais – 10 dias → Abuso de autoridade – 48 horas → Drogas – 10 dias No que tange ao prazo de oferecimento da queixa, deve-se observar o seguinte: 6 meses (art. 38, CPP). ∟ da data do conhecimento do autor do fato. Art. 38, CPP: “Salvo disposição em contrário, o ofendido, ou seu representante legal, decairá no direito de queixa ou de representação, se não o exercer dentro do prazo de seis meses, contado do dia em que vier a saber quem é o Aula 2 – Delegado da Polícia Federal – 2013 Direito Processual Penal – Teoria e Exercícios Comentados Pablo Farias Souza Cruz www.pontodosconcursos.com.br 16 autor do crime, ou, no caso do art. 29, do dia em que se esgotar o prazo para o oferecimento da denúncia”. PRAZO DECADENCIAL que não se interrompe, não se suspende e nem se prorroga. Obs: Lei de imprensa não foi recepcionada (como previa o prazo de 3 meses → não recepção da lei → volta à regra geral → portanto, 6 meses). ∟ prazo → art. 38, CPP (contado da data em que a pessoa sabe quem é o autor do fato). + art. 103, CP Art. 103, CP: “Salvo disposição expressa em contrário, o ofendido decai do direito de queixa ou de representação se não o exerce dentro do prazo de 6 (seis) meses, contado do dia em que veio a saber quem é o autor do crime, ou, no caso do § 3º do art. 100 deste Código, do dia em que se esgota o prazo para oferecimento da denúncia”. O Prazo decadencial é um prazo “penal” e, como tal, é contado nos moldes do direito material (art. 10, CP), incluindo o dia do começo e excluindo o dia do término. Art. 10, CP: “O dia do começo inclui-se no cômputo do prazo. Contam-se os dias, os meses e os anos pelo calendário comum”. Conforme afirmamos na aula 1 ainda trataremos dos princípios do processo penal de maneira específica, no decorrer do curso. Vejamos os princípios relacionados à Ação Penal. Princípios da Ação Penal Pública: (tanto para a Condicionada como Incondicionada). Aula 2 – Delegado da Polícia Federal – 2013 Direito Processual Penal – Teoria e Exercícios Comentados Pablo Farias Souza Cruz www.pontodosconcursos.com.br 17 Obrigatoriedade O Ministério Público diante da convicção da existência de indícios de autoria e prova da materialidade de uma infração penal é obrigado a atuar, ofertando a denúncia respectiva. Tal princípio sofre uma exceção (ou mitigação) conforme aponta a doutrina. Tal hipótese se refere às infrações penais de menor potencial ofensivo. Nesses casos, como o MP não está obrigado a oferecer denúncia se entende que essa hipótese seria uma mitigação ao princípio da obrigatoriedade. Entretanto o órgão acusador não pode ficar omisso, pois a lei impõe ao mesmo um dever de agir diverso da denúncia, que seria a oferta da Transação Penal (previsto nos arts. 61 e 72 da lei 9099/95) que, nada mais é, do que um acordo de aplicação imediata de pena, estabelecido judicialmente. Alguns denominam essa situação como decorrência da formulação do princípio da discricionariedade regrada, aplicável nos crimes de menor potencial ofensivo. Art. 61, 9099/95: “Consideram-se infrações penais de menor potencial ofensivo, para os efeitos desta Lei, as contravenções penais e os crimes a que a lei comine pena máxima não superior a 2 (dois) anos, cumulada ou não com multa”. Art. 72, 9099/95: “Na audiência preliminar, presente o representante do Ministério Público, o autor do fato e a vítima e, se possível, o responsável civil, acompanhados por seusadvogados, o juiz esclarecerá sobre a possibilidade da composição dos danos e da aceitação da proposta de aplicação imediata de pena não privativa de liberdade”. A transação penal só cabe para infração penal de menor potencial ofensivo, presente na lei 9099/95, que são: Aula 2 – Delegado da Polícia Federal – 2013 Direito Processual Penal – Teoria e Exercícios Comentados Pablo Farias Souza Cruz www.pontodosconcursos.com.br 18 Nesses casos acima expressos, quer-se evitar a pena privativa de liberdade. “Por derradeiro, deve-se atentar para outra suposta hipótese de mitigação do princípio da obrigatoriedade da ação penal. É a previsão da nova lei antitruste (Lei 12.529 de 2011) que, repetindo parcialmente texto do art. 35-C da Lei 8884/94, veio a ampliar suas disposições para além dos Crimes Contra a Ordem Tributária, incluindo expressamente os Crimes diretamente relacionados à prática de cartéis, como os tipificados na Lei de Licitações e o crime de Quadrilha ou Bando (art. 288 CP). Para visualizar a alteração, segue o quadro comparativo das disposições legais: Art. 35-C da Lei 8884/94 Art. 87 da Lei 12.529 de 2011 Art. 35-C. Nos crimes contra a ordem econômica, tipificados na Lei no 8.137, de 27 de novembro de 1990, a celebração de acordo de leniência, nos termos desta Lei, determina a suspensão do curso do prazo prescricional e impede o oferecimento da denúncia. (Incluído pela Lei nº 10.149, de 21.12.2000) Art. 87. Nos crimes contra a ordem econômica, tipificados na Lei no 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e nos demais crimes diretamente relacionados à prática de cartel, tais como os tipificados na Lei no 8.666, de 21 de junho de 1993, e os tipificados no art. 288 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, a celebração de acordo de leniência, nos termos desta Lei, determina a suspensão do curso do prazo prescricional e impede o oferecimento da denúncia com relação ao agente beneficiário da leniência. Aula 2 – Delegado da Polícia Federal – 2013 Direito Processual Penal – Teoria e Exercícios Comentados Pablo Farias Souza Cruz www.pontodosconcursos.com.br 19 Parágrafo único. Cumprido o acordo de leniência pelo agente, extingue- se automaticamente a punibilidade dos crimes a que se refere o caput deste artigo. (Incluído pela Lei nº 10.149, de 21.12.2000) Parágrafo único. Cumprido o acordo de leniência pelo agente, extingue-se automaticamente a punibilidade dos crimes a que se refere o caput deste artigo. Desse modo, como se trata de norma ampliativa de direitos, de natureza híbrida, percebe-se que sua aplicação será retroativa, tendo em vista tratar primordialmente de matéria penal (causa de extinção da punibilidade11).”12 Oficialidade Somente órgãos oficiais podem propor a Ação Penal. Obviamente tal afirmação só se aplica às ações penais públicas, já que as ações penais privadas são propostas por advogado (pessoa privada com capacidade postulatória) como regra, também podendo ser proposta por defensor público. Assim, se afirma que a ação penal pública só pode ser promovida por órgãos oficiais (MP – art. 129, I, CF). A oficialidade também se aplica na fase preliminar de investigação => assim, a investigação será promovida por órgãos oficiais (polícias judiciárias). Sabemos que, geralmente, quem faz a investigação são as Polícias Judiciárias (civis e federais), sendo que as polícias administrativas não detêm tal atribuição (com exceção da hipótese relacionada ao Inquérito Policial Militar). Tecnicamente, a investigação particular é ilegal, constituindo Usurpação da Função Pública, crime previsto no art. 328 do CP13. 11 Indagamos se não seria inicialmente suspensiva e posteriormente extintiva de punibilidade. 12 CRUZ, Pablo Farias Souza. Processo Penal Sistematizado. No prelo a 1ª edição. Rio de Janeiro: Grupo Gen: Forense, 2013, no prelo, p. 170. 13 Conforme sustenta Hidejalma Muccio, em seu: Prática de Processo Penal – Teoria e Modelos. São Paulo: Método, 2009.. Aula 2 – Delegado da Polícia Federal – 2013 Direito Processual Penal – Teoria e Exercícios Comentados Pablo Farias Souza Cruz www.pontodosconcursos.com.br 20 Na ótica do princípio da oficialidade, é possível sustentar que, com base no art. 144, §1º, IV, CF, SOMENTE A POLÍCIA JUDICIÁRIA poderia investigar. Entretanto, há quem sustente que esse inciso, juntamente com o §4º, denota que há diferença entre POLÍCIA JUDICIÁRIA e INVESTIGATIVA, sendo que, somente aquela, seria uma função EXCLUSIVA da polícia, tendo em vista que a CF não utiliza palavras inúteis. Tal distinção se torna relevante para o debate a respeito da (im)possibilidade do Ministério Público presidir investigação criminal. O entendimento que tende a prevalecer é o de que o MP pode investigar por causa da: TEORIA DOS PODERES IMPLÍCITOS, uma vez que se o MP pode exercer a ação penal, por que não poderia exercer as atribuições relacionadas à instrumentalização da mesma, se ele pode o fim, por que não poderia o meio, se ele pode mais, por que não poderia o menos? Ademais se o MP tem o poder de exercer o controle externo da atividade policial, pode também investigar, já que as atividades de controle envolvem, justamente, a realização de atos de investigação. Ainda segundo o art. 129, CF, se indaga: Se o MP pode averiguar atos de improbidade administrativa, presidindo o inquérito civil, por que não poderia investigar? Por outro lado, se entende que é justamente porque o MP realiza o controle externo, investigando a polícia, que ele não poderia realizar a investigação, em respeito à Separação dos Poderes (evitando a concentração de poder nas mãos de um único órgão)14. Assim, não seria saudável que o ente controlador também pudesse realizar a atividade controlada. 14 Para maior aprofundamento, conferir questão subjetiva, no fim da unidade, a respeito da investigação criminal por parte do Ministério Público. Aula 2 – Delegado da Polícia Federal – 2013 Direito Processual Penal – Teoria e Exercícios Comentados Pablo Farias Souza Cruz www.pontodosconcursos.com.br 21 O STF tem caminhado no sentido de admitir a investigação criminal pelo Ministério Público, vejamos a decisão da 2ª turma: Ministério Público e Poder Investigatório - 1 O Ministério Público dispõe de competência para promover, por autoridade própria, investigações de natureza penal, desde que respeitados os direitos e garantias que assistem a qualquer indiciado ou a qualquer pessoa sob investigação do Estado, observadas, sempre, pelos agentes de tal órgão, as prerrogativas profissionais de que se acham investidos os advogados, sem prejuízo da possibilidade — sempre presente no Estado Democrático de Direito — do permanente controle jurisdicional dos atos praticados pelos promotores de justiça e procuradores da república. Com base nesse entendimento, a Turma indeferiu habeas corpus em que se alegava a nulidade de ação penal promovida com fulcro em procedimento investigatório instaurado exclusivamente pelo Ministério Público e que culminara na condenação do paciente, delegado de polícia, pela prática do crime de tortura. Grifos acrescidos pelo autor HC 89837/DF, rel. Min. Celso de Mello, 20.10.2009. (HC-89837) Ministério Público e Poder Investigatório - 2 Inicialmente, asseverou-se que não estaria em discussão, porindisputável, a afirmativa de que o exercício das funções inerentes à Polícia Judiciária competiria, ordinariamente, às Polícias Civil e Federal (CF, art. 144, § 1º, IV e § 4º), com exceção das atividades concernentes à apuração de delitos militares. Esclareceu-se que isso significaria que os inquéritos policiais — nos quais se consubstanciam, instrumentalmente, as investigações penais promovidas pela Polícia Judiciária — serão dirigidos e presididos por autoridade policial competente, e por esta, apenas (CPP, art. 4º, caput). Enfatizou-se, contudo, que essa especial regra de competência não impediria que o Ministério Público, que é o dominus litis — e desde que indique os fundamentos jurídicos legitimadores de suas manifestações — determinasse a abertura de inquéritos policiais, ou, então, requisitasse diligências investigatórias, em ordem a prover a investigação penal, conduzida pela Polícia Judiciária, com todos os elementos necessários ao esclarecimento da verdade real e essenciais à formação, por parte do representante do parquet, de sua opinio delicti. Consignou-se que a existência de inquérito policial não se revelaria imprescindível ao oferecimento da denúncia, podendo o Ministério Público, desde que disponha de elementos informativos para tanto, deduzir, em juízo, a pretensão punitiva do Estado. Observou-se que o órgão ministerial, ainda quando inexistente qualquer investigação penal promovida pela Polícia Judiciária, poderia, assim mesmo, fazer instaurar, validamente, a pertinente persecução criminal. Grifos acrescidos pelo autor HC 89837/DF, rel. Min. Celso de Mello, 20.10.2009. (HC-89837) Aula 2 – Delegado da Polícia Federal – 2013 Direito Processual Penal – Teoria e Exercícios Comentados Pablo Farias Souza Cruz www.pontodosconcursos.com.br 22 Ministério Público e Poder Investigatório - 3 Em seguida, assinalou-se que a eventual intervenção do Ministério Público, no curso de inquéritos policiais, sempre presididos por autoridade policial competente, quando feita com o objetivo de complementar e de colaborar com a Polícia Judiciária, poderá caracterizar o legítimo exercício, por essa Instituição, do poder de controle externo que lhe foi constitucionalmente deferido sobre a atividade desenvolvida pela Polícia Judiciária. Tendo em conta o que exposto, reputou-se constitucionalmente lícito, ao parquet, promover, por autoridade própria, atos de investigação penal, respeitadas — não obstante a unilateralidade desse procedimento investigatório — as limitações que incidem sobre o Estado, em tema de persecução penal. Realçou-se que essa unilateralidade das investigações preparatórias da ação penal não autoriza o Ministério Público — tanto quanto a própria Polícia Judiciária — a desrespeitar as garantias jurídicas que assistem ao suspeito e ao indiciado, que não mais podem ser considerados meros objetos de investigação. Dessa forma, aduziu-se que o procedimento investigatório instaurado pelo Ministério Público não interfere nem afeta o exercício, pela autoridade policial, de sua irrecusável condição de presidente do inquérito policial, de responsável pela condução das investigações penais na fase pré-processual da persecutio criminis e do desempenho dos encargos típicos inerentes à função de Polícia Judiciária. Grifos acrescidos pelo autor HC 89837/DF, rel. Min. Celso de Mello, 20.10.2009. (HC-89837) Ministério Público e Poder Investigatório - 4 Ponderou-se que a outorga de poderes explícitos, ao Ministério Público (CF, art. 129, I, VI, VII, VIII e IX), supõe que se reconheça, ainda que por implicitude, aos membros dessa instituição, a titularidade de meios destinados a viabilizar a adoção de medidas vocacionadas a conferir real efetividade às suas atribuições, permitindo, assim, que se confira efetividade aos fins constitucionalmente reconhecidos ao Ministério Público (teoria dos poderes implícitos). Não fora assim, e desde que adotada, na espécie, uma indevida perspectiva reducionista, esvaziar-se-iam, por completo, as atribuições constitucionais expressamente concedidas ao Ministério Público em sede de persecução penal, tanto em sua fase judicial quanto em seu momento pré-processual. Afastou- se, de outro lado, qualquer alegação de que o reconhecimento do poder investigatório do Ministério Público poderia frustrar, comprometer ou afetar a garantia do contraditório estabelecida em favor da pessoa investigada. Nesse sentido, salientou-se que, mesmo quando conduzida, unilateralmente, pelo Ministério Público, a investigação penal não legitimaria qualquer condenação criminal, se os elementos de convicção nela produzidos — porém não reproduzidos em juízo, sob a garantia do contraditório — fossem os únicos dados Aula 2 – Delegado da Polícia Federal – 2013 Direito Processual Penal – Teoria e Exercícios Comentados Pablo Farias Souza Cruz www.pontodosconcursos.com.br 23 probatórios existentes contra a pessoa investigada, o que afastaria a objeção de que a investigação penal, quando realizada pelo Ministério Público, poderia comprometer o exercício do direito de defesa. Advertiu-se, por fim, que à semelhança do que se registra no inquérito policial, o procedimento investigatório instaurado pelo Ministério Público deverá conter todas as peças, termos de declarações ou depoimentos e laudos periciais que tenham sido coligidos e realizados no curso da investigação, não podendo o membro do parquet sonegar, selecionar ou deixar de juntar, aos autos, qualquer desses elementos de informação, cujo conteúdo, por se referir ao objeto da apuração penal, deve ser tornado acessível à pessoa sob investigação. Grifos acrescidos pelo autor HC 89837/DF, rel. Min. Celso de Mello, 20.10.2009. (HC- 89837)15 Uma das decisões mais recentes do STF a respeito do tema foi da 2ª turma, onde se afirmou: Ministério Público e investigação criminal A 1ª Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus em que se pretendia o trancamento de ação penal, sob o argumento de que a investigação criminal teria partido exclusivamente do Ministério Público. Observou-se que a denúncia se baseara em declarações prestadas, espontaneamente, pelo co-réu ao representante do Ministério Público e que, a partir dessas informações, o parquet realizara diligências, devidamente acompanhado pela polícia civil, além de ouvir outras pessoas, o que não implicara presidir inquérito policial e nem invadir seara reservada à Polícia Judiciária. Afirmou-se, ademais, a desnecessidade do inquérito policial se o Ministério Público já dispuser de elementos capazes de formar sua opinio delicti. Concluiu-se não ter havido ilegalidade nos procedimentos adotados pelo órgão ministerial nem ilicitude das provas produzidas. Vencido o Min. Marco Aurélio, que sobrestava o feito até o julgamento pelo Plenário do HC 84548/SP, no qual se discute a distinção do inquérito para propositura da ação civil e para ação penal. No mérito, concedia a ordem por entender que o Ministério Público procedera à investigação e que o acompanhamento da polícia inverteria a ordem natural das coisas. Grifos acrescidos pelo autor HC 96638/BA, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 2.12.2010. (HC- 96638)16 Nos mesmos moldes é a posição do STJ: DENÚNCIA ANÔNIMA. INQUÉRITO. FUNÇÃO. MP. ... Ademais o Parquet, conforme entendimento da Quinta Turma deste Superior Tribunal, possui prerrogativa de 15 Disponível em: http://www.stf.jus.br/arquivo/informativo/documento/informativo564.htm 16 Disponível em: http://www.stf.jus.br/arquivo/informativo/documento/informativo611.htm Aula 2 – Delegado da Polícia Federal – 2013 Direito Processual Penal – Teoria e Exercícios ComentadosPablo Farias Souza Cruz www.pontodosconcursos.com.br 24 instaurar procedimento administrativo de investigação e conduzir diligências investigatórias (art. 129, VI, VII, VIII e IX, da CF; art. 8º, § 2º, I, II, IV, V e VII, da LC n. 75/1993 e art. 26 da Lei n. 8.625/1993). Aduziu ainda que, hodiernamente, adotou-se o entendimento de que o MP possui legitimidade para proceder, diretamente, à colheita de elementos de convicção para subsidiar a propositura de ação penal, só lhe sendo vedada a presidência do inquérito, que compete à autoridade policial. ... Precedentes citados: HC 159.466-ES, DJe 17/5/2010, e RHC 21.482-RS, DJe 12/4/2010. RHC 24.472-RJ, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 15/9/2011.17 Grifos acrescidos Não se ignore que, ainda que se admita a investigação criminal por parte do Ministério Público, tal conclusão não viabiliza uma investigação ilimitada, pois apesar da ausência de regulamentação legal, o próprio STF, além de reconhecer como subsidiária a investigação ministerial, estabelece as seguintes linhas restritivas iniciais: “a) ritos claros quanto à pertinência do sujeito investigado; b) formalização do ato investigativo; c) comunicação imediata ao Procurador-Chefe ou ao Procurador-Geral; d) autuação, numeração, controle, distribuição e publicidade dos atos; e) pleno conhecimento da atividade de investigação à parte; f) princípios e regras que orientariam o inquérito e os procedimentos administrativos sancionatórios; g) ampla defesa, contraditório, prazo para a conclusão e controle judicial.”18 17 Informativo 483 do STJ. 18 Conforme se observa no informativo 672 do final de junho de 2012: Ministério Público e investigação criminal – 17 O Plenário retomou julgamento de recurso extraordinário em que discutida a constitucionalidade da realização de procedimento investigatório criminal pelo Ministério Público. O acórdão impugnado dispusera que, na fase de recebimento da denúncia, prevaleceria a máxima in dubio pro societate, oportunidade em que se possibilitaria ao titular da ação penal ampliar o conjunto probatório. Sustenta o recorrente que a investigação realizada pelo parquet ultrapassaria suas atribuições funcionais constitucionalmente previstas, as quais seriam exclusivas da polícia judiciária — v. Informativo 671. O Min. Gilmar Mendes, acompanhado pelos Ministros Celso de Mello, Ayres Britto, Presidente, e Joaquim Barbosa, negou provimento ao recurso. Ressaltou que a 2ª Turma reconhecera, de forma subsidiária, o poder de investigação do Ministério Público, desde que atendidos os requisitos estabelecidos no inquérito criminal, inclusive quanto à observância da Súmula Vinculante 14. Destacou ser imperioso observar: a) ritos claros quanto à pertinência do sujeito investigado; b) formalização do ato investigativo; c) comunicação imediata ao Procurador-Chefe ou ao Procurador-Geral; d) autuação, numeração, controle, distribuição e publicidade dos atos; e) pleno conhecimento da atividade de investigação à parte; f) princípios e regras que orientariam o inquérito e os procedimentos Aula 2 – Delegado da Polícia Federal – 2013 Direito Processual Penal – Teoria e Exercícios Comentados Pablo Farias Souza Cruz www.pontodosconcursos.com.br 25 Indisponibilidade O princípio da indisponibilidade, decorrência da obrigatoriedade, informa que uma vez instaurada a ação penal o Ministério Público não pode desistir da mesma. Destarte, caso o MP mude de opinião, entendendo que o imputado não é autor da infração penal ou de que a mesma não ocorreu, ele não deve pedir a extinção do processo penal, mas sim a absolvição do réu, já que um processo penal garantista deve servir tanto para condenar o culpado como para absolver o inocente. Referido princípio também apresenta uma mitigação, qual seja, a suspensão condicional do processo (“SUSPRO”), proposta pelo próprio MP após a denúncia. Também é um princípio relativo. A referida Suspensão dura de 2 a 4 anos. Descumprida as condições o processo volta ao trâmite normal. Detalhe importante é que a suspensão condicional do processo se aplica não só a crimes de menor potencial ofensivo, mas a todos administrativos sancionatórios; g) ampla defesa, contraditório, prazo para a conclusão e controle judicial. Verificou que seria lícita a investigação do parquet nos crimes praticados por policiais e contra a Administração Pública. Além disso, a 2ª Turma teria reconhecido a higidez da atividade complementar de investigação quando o órgão ministerial solicitasse documentação, como no caso dos autos, em que a mera aferição de documentos para saber se teria havido, ou não, a quebra da ordem de precatórios acarretaria desobediência. RE 593727/MG, rel. Min. Cezar Peluso, 27.6.2012. (RE-593727) Ministério Público e investigação criminal – 18 O Min. Celso de Mello enfatizou que a questão debatida seria de grande importância por envolver o exercício de poderes por parte do Ministério Público. Reconheceu a legitimidade do poder investigatório do órgão, extraída da Constituição, a partir de cláusula que outorgaria o monopólio da ação penal pública e o controle externo sobre a atividade policial. Salientou que o parquet não poderia presidir o inquérito policial por ser função precípua da autoridade policial. Consignou que a função investigatória do Ministério Público não se converteria em atividade ordinária, mas excepcional a legitimar a sua atuação em casos de abuso de autoridade, prática de delito por policiais, crimes contra a Administração Pública, inércia dos organismos policiais, ou procrastinação indevida no desempenho de investigação penal, situações que exemplificativamente justificariam a intervenção subsidiária do órgão ministerial. Realçou a necessidade de fiscalização da legalidade dos atos investigatórios, de estabelecimento de exigências de caráter procedimental e de se respeitar direitos e garantias que assistiriam a qualquer pessoa sob investigação — inclusive em matéria de preservação da integridade de prerrogativas profissionais dos advogados, tudo sob o controle e a fiscalização do Poder Judiciário. O Presidente afirmou que o Ministério Público teria competência constitucional para, por conta própria, de forma independente, fazer investigação em matéria criminal. Mencionou que essa interpretação ampliativa melhor serviria à finalidade, conferida pelo art. 127 da CF, de defender a ordem jurídica, sobretudo em âmbito penal. Aludiu que diversas leis confeririam competência investigatória ao parquet (Estatuto do Idoso; Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA; Lei Maria da Penha; Estatuto de Defesa e Proteção do Consumidor). Por fim, asseverou que o inquérito policial não exauriria a investigação criminal. Ademais, outros órgãos, além do Ministério Público, poderiam desempenhar atividades investigativas. Após, pediu vista o Min. Luiz Fux. RE 593727/MG, rel. Min. Cezar Peluso, 27.6.2012. (RE-593727). Disponível em: http://www.stf.jus.br/arquivo/informativo/documento/informativo672.htm#Ministério Público e investigação criminal - 17 Aula 2 – Delegado da Polícia Federal – 2013 Direito Processual Penal – Teoria e Exercícios Comentados Pablo Farias Souza Cruz www.pontodosconcursos.com.br 26 os crimes em que a pena mínima em abstrato seja igual ou inferior a 1 ano (art. 89 da lei 9099/95). Art. 89, 9099/95: “Nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a 1 (um) ano, abrangidas ou não por esta Lei, o Ministério Público, aooferecer a denúncia, poderá propor a suspensão do processo, por 2 (dois) a 4 (quatro) anos, desde que por outro crime, presentes os demais requisitos que autorizariam a suspensão condicional da pena (art. 77 do Código Penal)”. (In) Divisibilidade da Ação Penal Segundo o princípio da indivisibilidade, conforme afirma a doutrina clássica, o Ministério Público não pode fracionar a acusação de um crime promovido por ação penal pública. Tal princípio é objeto de antiga discussão, pois, segundo precedente do STF, o mesmo não deveria vigorar, sendo correto se falar, contrariamente ao que ocorre na ação penal privada, em divisibilidade, entendida essa como a possibilidade do Ministério Público fracionar a acusação de um crime de ação penal pública, bem como aditar a denúncia. “Para visualizar a divergência, segue a seguinte sistematização: Indivisibilidade: Tourinho Filho, Aury Lopes Júnior, Marcellus Polastri e Renato Brasileiro, entre outros. Divergência Divisibilidade: STF19, STJ, Denilson Feitoza e Mirabete, 19 Jurisprudência recente a respeito do tema: INFORMATIVO Nº 605 TÍTULO Inquérito Policial e Arquivamento Implícito PROCESSO HC - 104356 Aula 2 – Delegado da Polícia Federal – 2013 Direito Processual Penal – Teoria e Exercícios Comentados Pablo Farias Souza Cruz www.pontodosconcursos.com.br 27 entre outros. Crendo na inexistência de divergência real entre os entendimentos expostos acima, defino o princípio da indivisibilidade como a exigência do ministério público ofertar denúncia contra todos os investigados, desde que forme sua opinio delicti contra todos, reconhecendo indícios de autoria e prova da existência do crime em relação a todas as infrações penais. Assim, se verifica que tal princípio parte, como não poderia deixar de ser, de situação hipoteticamente ideal. Destarte, não sendo o caso, obviamente admitiríamos uma excepcionalidade, qual seja, admitir o fracionamento da acusação para se evitar prejuízo irreparável ao princípio da duração razoável do processo, o que poderia culminar em impunidade. Pensando dessa forma seria possível diferenciar a indivisibilidade do fracionamento20, sendo que o fato da ação penal ser indivisível, não implica na impossibilidade absoluta de seu fracionamento. O sistema processual penal brasileiro não prevê a figura do arquivamento implícito de inquérito policial. Ao reafirmar esse entendimento, a 1ª Turma denegou habeas corpus em que se sustentava a sua ocorrência em razão de o Ministério Público estadual haver denunciado o paciente e co-réu, os quais não incluídos em denúncia oferecida anteriormente contra terceiros. Alegava a impetração que o paciente, por ter sido identificado antes do oferecimento da primeira peça acusatória, deveria dela constar. Inicialmente, consignou-se que o Ministério Público esclarecera que não incluíra o paciente na primeira denúncia porquanto, ao contrário do que afirmado pela defesa, não dispunha de sua identificação, o que impediria a propositura da ação penal naquele momento. Em seguida, aduziu-se não importar, de qualquer forma, se a identificação do paciente fora obtida antes ou depois da primeira peça, pois o pedido de arquivamento deveria ser explícito (CPP, art. 28). Nesse sentido, salientou-se que a ocorrência de arquivamento deveria se dar após o requerimento expresso do parquet, seguido do deferimento, igualmente explícito, da autoridade judicial (CPP, art. 18 e Enunciado 524 da Súmula do STF). Ressaltou-se que a ação penal pública incondicionada submeter-se-ia a princípios informadores inafastáveis, especialmente o da indisponibilidade, segundo o qual incumbiria, obrigatoriamente, ao Ministério Público o oferecimento de denúncia, quando presentes indícios de autoria e prova de materialidade do delito. Explicou-se que a indisponibilidade da denúncia dever-se-ia ao elevado valor social dos bens tutelados por meio do processo penal, ao se mostrar manifesto o interesse da coletividade no desencadeamento da persecução sempre que as condições para tanto ocorrerem. Ademais, registrou-se que, de acordo com a jurisprudência do Supremo, o princípio da indivisibilidade não se aplicaria à ação penal pública. Concluiu-se pela higidez da segunda denúncia. Alguns precedentes citados: RHC 95141/RJ (DJe de 23.10.2009); HC 92445/RJ (DJe de 3.4.2009). HC 104356/RJ, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 19.10.2010. (HC-104356) Grifos acrescidos Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/informativo/verInformativo.asp?s1=indivisibilidade ação penal&numero=605&pagina=2&base=INFO 20 Utiliza-se o termo fracionamento para evitar qualquer confusão. Afirmo isso, pois poderia utilizar o termo desmembramento, entretanto não optei pelo mesmo haja vista sua familiaridade com assuntos atrelados à competência como são a conexão e a continência. Aula 2 – Delegado da Polícia Federal – 2013 Direito Processual Penal – Teoria e Exercícios Comentados Pablo Farias Souza Cruz www.pontodosconcursos.com.br 28 Por derradeiro, concluo que a suposta divergência apontada é conciliável, pois a obrigatoriedade impõe a indivisibilidade e ambos os princípios são mitigáveis em situações excepcionalmente justificadas. Em que pese a argumentação acima exposta, para concursos em que não há indicação bibliográfica no edital, deve-se adotar o posicionamento que prega a divisibilidade, por ser esse o entendimento prevalente no STF e no STJ.”21 Ação Penal Pública Incondicionada É aquela titularizada pelo MP, onde sua proposição não está condicionada nem à representação da vítima e nem à requisição do Ministro da Justiça. É a regra no processo penal brasileiro. Referida ação se sustenta no art. 129, I, CF e no art. 257 do CPP, respectivamente. Vejamos: Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: I - promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei; Art. 257. Ao Ministério Público cabe: (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008). I - promover, privativamente, a ação penal pública, na forma estabelecida neste Código; e (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008). II - fiscalizar a execução da lei. (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008). 21 CRUZ, Pablo Farias Souza. Processo Penal Sistematizado. No prelo a 1ª edição. Rio de Janeiro: Grupo Gen: Forense, 2013, no prelo, p. 175. Aula 2 – Delegado da Polícia Federal – 2013 Direito Processual Penal – Teoria e Exercícios Comentados Pablo Farias Souza Cruz www.pontodosconcursos.com.br 29 Pergunta: Em algum caso a ação penal será sempre pública?! Resposta: Sim, quando houver interesse estatal, conforme dispõe o art. 24, §2º, CPP (apesar de não existir expressa previsão do DF, aplica-se também a ele, através de uma interpretação histórico- evolutiva). Além, é claro, dos casos que a própria lei disser que é só pública. Art. 24, §2º, CPP: “Nos crimes de ação pública, esta será promovida por denúncia do Ministério Público, mas dependerá, quando a lei o exigir, de requisição do Ministro da Justiça, ou de representação do ofendido ou de quem tiver qualidade para representá-lo”. “§2º: Seja qual for o crime, quando praticado em detrimento do patrimônio ou interesse da União, Estado e Município, a ação penal será pública”. Não mais subsiste no Brasil o anteriormente denominado Processo Judicialiforme,onde se admitia a possibilidade da ação publica ser exercida por iniciativa do Delegado ou do próprio Juiz. O art. 26 do CPP apesar de vigente não é válido, pois não foi recepcionado pela atual ordem constitucional, mormente em razão do sistema processual acusatório, que vigora no Brasil. Art. 26, CPP: “A ação penal, nas contravenções, será iniciada com o auto de prisão em flagrante ou por meio de portaria expedida pela autoridade judiciária ou policial”. Ação Penal Pública Condicionada É a ação de titularidade do MP que depende, para sua propositura, da representação da vítima ou de requisição do Ministro da justiça. Representação (art. 39, art. 24, §1º, CPP): É um pedido e ao mesmo tempo uma autorização que condiciona o início da persecução penal. Aula 2 – Delegado da Polícia Federal – 2013 Direito Processual Penal – Teoria e Exercícios Comentados Pablo Farias Souza Cruz www.pontodosconcursos.com.br 30 Se o crime é de ação publica condicionada não pode haver sequer a lavratura do auto de prisão em flagrante sem que a vítima represente. Logo, também não haverá persecução penal. Natureza jurídica: a representação é uma condição objetiva de procedibilidade, é uma condição especial da ação. Art. 39, CPP: “O direito de representação poderá ser exercido, pessoalmente ou por procurador com poderes especiais, mediante declaração, escrita ou oral, feita ao juiz, ao órgão do Ministério Público, ou à autoridade policial”. “§1º: A representação feita oralmente ou por escrito, sem assinatura devidamente autenticada do ofendido, de seu representante legal ou procurador, será reduzida a termo, perante o juiz ou autoridade policial, presente o órgão do Ministério Público, quando a este houver sido dirigida”. “§2º: A representação conterá todas as informações que possam servir à apuração do fato e da autoria”. “§3º: Oferecida ou reduzida a termo a representação, a autoridade policial procederá a inquérito, ou, não sendo competente, remetê-lo-á à autoridade que o for”. “§4º: A representação, quando feita ao juiz ou perante este reduzida a termo, será remetida à autoridade policial para que esta proceda a inquérito”. “§5º: O órgão do Ministério Público dispensará o inquérito, se com a representação forem oferecidos elementos que o habilitem a promover a ação penal, e, neste caso, oferecerá a denúncia no prazo de quinze dias”. Art. 24, §1º, CPP: “Nos crimes de ação pública, esta será promovida por denúncia do Ministério Público, mas dependerá, quando a lei o exigir, de requisição do Ministro da Justiça, ou de representação do ofendido ou de quem tiver qualidade para representá-lo”. “§1º: No caso de morte do ofendido ou quando declarado ausente por decisão judicial, o direito de representação passará ao cônjuge, ascendente, descendente ou irmão”. Aula 2 – Delegado da Polícia Federal – 2013 Direito Processual Penal – Teoria e Exercícios Comentados Pablo Farias Souza Cruz www.pontodosconcursos.com.br 31 • O direito de Representação pode ser exercido por curador especial? Pode, aplicando-se em analogia ao art. 33, CPP – Ação Penal Privada. Art. 33, CPP: “Se o ofendido for menor de 18 anos, ou mentalmente enfermo, ou retardado mental, e não tiver representante legal, ou colidirem os interesses deste com os daquele, o direito de queixa poderá ser exercido por curador especial, nomeado, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, pelo juiz competente para o processo penal”. • Pessoa Jurídica pode exercer direito de representação? Pode, aplicando-se em analogia ao art. 37, CPP. Art. 37, CPP: “As fundações, associações ou sociedades legalmente constituídas poderão exercer a ação penal, devendo ser representadas por quem os respectivos contratos ou estatutos designarem ou, no silêncio destes, pelos seus diretores ou sócios-gerentes”. • É possível a retratação da representação até o oferecimento da denúncia (data do protocolo no fórum ou da secretaria do juízo) - art. 25, CPP e art. 102, CP. Art. 25, CPP: “A representação será irretratável, depois de oferecida a denúncia”. Art. 102, CP: “A representação será irretratável depois de oferecida a denúncia”. “Assim temos a seguinte visualização gráfica: Aula 2 – Delegado da Polícia Federal – 2013 Direito Processual Penal – Teoria e Exercícios Comentados Pablo Farias Souza Cruz www.pontodosconcursos.com.br 32 • Indaga-se: A representação, em qualquer caso, é irretratável APÓS o oferecimento da denúncia? Reposta: Não, pois se o crime envolve violência doméstica22, a retratação da representação deve ocorrer em audiência especialmente designada após o oferecimento da denúncia, mas ANTES do recebimento da mesma. Assim, podemos visualizar exceção à regra acima exposta com o seguinte gráfico: Ponto importante a respeito do tema e que irá refletir diretamente no que se acabou de sistematizar é a mudança da natureza das ações penais que veiculem infrações penais praticadas 22 Jurisprudência recente a respeito do tema: Lei Maria da Penha e audiência de retratação A 2ª Turma denegou habeas corpus em que condenado pela prática do delito de lesão corporal qualificada por violência doméstica (CP, art. 129, § 9º) pretendia o trancamento de ação penal contra ele instaurada. A impetração alegava que a suposta vítima, esposa do paciente, admitira, no decorrer do processo, ser a responsável pelas agressões por ter iniciado o entrevero e, ainda, que o art. 16 da Lei 11.340/2006 (Lei Maria da Penha) dispunha que deveria haver audiência para renúncia à representação perante o juiz. No tocante à primeira assertiva, reputou-se que a pretensão deveria ter sido apurada no decorrer do processo de conhecimento, e não em sede de habeas corpus, conforme requerido. Em relação à audiência de retratação da delação postulatória, aduziu-se que, com fulcro no dispositivo mencionado (“Art. 16. Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de que trata esta Lei, só será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em audiência especialmente designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público”), esta poderia ocorrer, em caso de violência contra a mulher, mas somente antes do recebimento da denúncia pelo Ministério Público. Grifos acrescido pelo autor HC 109176/MG, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 4.10.2011. (HC-109176) (Informativo 643, 2ª Turma) Disponível em: http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/publicacaoInformativoTema/anexo/Informativo_mensal_outubro_2011.pdf Aula 2 – Delegado da Polícia Federal – 2013 Direito Processual Penal – Teoria e Exercícios Comentados Pablo Farias Souza Cruz www.pontodosconcursos.com.br 33 contra mulher no âmbito doméstico. Tal alteração foi promovida pelo STF recentemente (09/02/2012) em sede de Ação Direta Constitucionalidade proposta pelo Ministério Público Federal onde o mesmo impugnava o art. 16 da Lei 11.340/06. Assim, conforme entendimento da Corte, nas palavras no ministro Luiz Fux: Sob o ângulo da tutela da dignidade da pessoa humana, que é um dos pilares da República Federativa do Brasil, exigir a necessidade da representação, no meu modo de ver, revela-se um obstáculo à efetivação desse direito fundamental porquanto a proteção resta incompleta e deficiente, mercê de revelar subjacentemente uma violência simbólica e uma afronta a essa cláusula pétrea.23 Contudo deve-se ter cautela, pois conforme se verifica naparte final do voto do próprio ministro Luiz Fux, a melhor orientação é no sentido de que, conforme se imagina limitada a decisão no âmbito da impugnação de inconstitucionalidade24, só se poderia falar no retorno à natureza pública incondicionada da ação penal nos casos em que a lei 9099/95 teria promovido referida alteração, tendo vista a constitucionalidade do artigo da lei de violência doméstica que expressamente afasta a incidência da lei 9099/95. Nesse ponto insta registrar o importante trecho do voto do ministro no caso em comento: “Justifica-se, portanto, o preceito do art. 41 da Lei nº 11.343/06, afastando-se todas as disposições da Lei nº 9.099/95 do âmbito dos crimes praticados contra a mulher no âmbito doméstico e familiar. Ao suposto ofensor, não serão conferidos os institutos da suspensão condicional do processo, da transação penal e da composição civil dos danos. 23 Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=199853 24 E também de constitucionalidade, já que o assunto também é objeto de ADC, respectivamente: ADI nº 4.424 e da ADC nº 19. Aula 2 – Delegado da Polícia Federal – 2013 Direito Processual Penal – Teoria e Exercícios Comentados Pablo Farias Souza Cruz www.pontodosconcursos.com.br 34 Do mesmo modo, os delitos de lesão corporal leve e culposa domésticos contra a mulher independem de representação da ofendida, processando-se mediante ação penal pública incondicionada. O condicionamento da ação penal à representação da mulher se revela um obstáculo à efetivação do direito fundamental à proteção da sua inviolabilidade física e moral, atingindo, em última análise, a dignidade humana feminina. Tenha-se em mente que a Carta Magna dirige a atuação do legislador na matéria, por incidência do art. 5º, XLI (“a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais”) e do art. 226, § 8º (“O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações”). No que atine à competência prevista no art. 33, a Lei Maria da Penha também não merece reparos. Uma adequada proteção da mulher demanda uma completa análise do caso, tanto sob a perspectiva cível quanto criminal. Desse modo, é essencial que o mesmo juízo possua competências cíveis e penais, sem que se possa nisso vislumbrar ofensa à competência dos Estados para dispor sobre a organização judiciária local (art. 125, § 1º c/c art. 96, II, d, CRFB). Ex positis, voto pela total procedência da ADI nº 4.424 e da ADC nº 19, nos termos pleiteados pelos proponentes.”25 Assim, nos casos em que a lei penal já previa a representação, esta permanece cabível, sob pena de se extrapolar os limites da decisão do Supremo. Exemplo da situação é a referente ao crime de ameaça, que já era de ação penal pública condicionada, onde o panorama permanece o mesmo, nos moldes da sistematização feita acima.”26 • Prazo para oferecer a representação: 25 Transcrições presentes no Informativo 657: Lei Maria da Penha (Transcrições) - (v. Informativo 654) - ADI 4424/DF* e ADC 19/DF* - Relator: Min. Marco Aurélio - VOTO DO MIN. LUIZ FUX. 26 CRUZ, Pablo Farias Souza. Processo Penal Sistematizado. No prelo a 1ª edição. Rio de Janeiro: Grupo Gen: Forense, 2013, no prelo, p. 180. Aula 2 – Delegado da Polícia Federal – 2013 Direito Processual Penal – Teoria e Exercícios Comentados Pablo Farias Souza Cruz www.pontodosconcursos.com.br 35 6 meses (art. 38, CPP). ∟ da data do conhecimento do autor do fato. Art. 38, CPP: “Salvo disposição em contrário, o ofendido, ou seu representante legal, decairá no direito de queixa ou de representação, se não o exercer dentro do prazo de seis meses, contado do dia em que vier a saber quem é o autor do crime, ou, no caso do art. 29, do dia em que se esgotar o prazo para o oferecimento da denúncia”. PRAZO DECADENCIAL que não se interrompe, não se suspende e nem se prorroga. ∟ prazo → art. 38, CPP (contado da data em que a pessoa sabe quem é o autor do fato), serve também para a queixa-crime. + art. 103, CP Art. 103, CP: “Salvo disposição expressa em contrário, o ofendido decai do direito de queixa ou de representação se não o exerce dentro do prazo de 6 (seis) meses, contado do dia em que veio a saber quem é o autor do crime, ou, no caso do § 3º do art. 100 deste Código, do dia em que se esgota o prazo para oferecimento da denúncia”. Prazo decadencial: é um prazo “penal” e, como tal, é contado como direito material (art. 10, CP), incluindo o dia do começo e excluindo o dia do término. Aula 2 – Delegado da Polícia Federal – 2013 Direito Processual Penal – Teoria e Exercícios Comentados Pablo Farias Souza Cruz www.pontodosconcursos.com.br 36 Art. 10, CP: “O dia do começo inclui-se no cômputo do prazo. Contam-se os dias, os meses e os anos pelo calendário comum”. Requisição do Ministro da Justiça: É um pedido e ao mesmo tempo uma autorização de natureza política que condiciona o início da persecução penal. Natureza jurídica: é uma condição objetiva de procedibilidade. Ela é uma condição para que a persecução seja deflagrada. Sem ela não pode haver inquérito, processo, nem lavratura do flagrante. Sem ela, providências criminais não podem ser tomadas contra o suposto infrator. - Destinatário: o chefe do MP = Procurador Geral Republica - Legitimidade ativa: do próprio Ministro da Justiça. Prazo: não tem limite de prazo, sendo possível requisitar a qualquer tempo, desde que pretensão punitiva em relação ao crime não esteja prescrita. Logo, não há que se falar em prazo decadencial. Retratação do Ministro da Justiça: a doutrina majoritária (Denilson Feitoza, Luiz Flávio Gomes e Eugênio Pacelli) vem buscando equiparar a representação com a requisição, para também admitir a retratação. Entretanto, longe de pacífica a questão, há entendimento mais conservador, no sentido da inadmissibilidade do referido instituto. Tourinho Filho afirma que se o Ministro da Justiça se retratar é porque foi precipitado. Segundo Tourinho Filho o ato é irretratável por ausência de previsão legal e também pelo risco que a admissão poderia gerar no sentido de demonstrar a fragilidade do Estado brasileiro. Em que pese o debate exposto acima, o STF e o STJ não julgaram a matéria. Aula 2 – Delegado da Polícia Federal – 2013 Direito Processual Penal – Teoria e Exercícios Comentados Pablo Farias Souza Cruz www.pontodosconcursos.com.br 37 Eficácia objetiva: a requisição do Ministro da Justiça goza de eficácia objetiva, se restringindo aos fatos. Não vinculação: esta requisição é um mero pedido de providencias e não vincula o MP. Ação Penal Privada Ação penal privada é o instrumento de provocação jurisdicional penal titularizada pelo ofendido. Ocorrerá quando houver previsão legal. Se a lei não falar nada a respeito da ação penal, a mesma será pública e incondicionada. Nesse sentido dispõe o Código Penal em seu artigo 100: "A ação penal é pública, salvo quando a lei expressamente a declara privativa do ofendido"..."A ação pública é promovida pelo Ministério Público, dependendo, quando a lei o exige, de representação do ofendido ou de requisição do Ministro da Justiça". Referida ação visa garantir o direito fundamental de
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