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152707070715 OAB1FASE HERMENEU JURIDICA EX OR

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OAB 1ª FASE – XVIII EXAME 
Filosofia do Direito para Defensorias – Isolada Teórica 
Bernardo Montalvão 
 
1 
HERMENÊUTICA JURÍDICA – 2 
 
1. INTRODUÇÃO 
 
A expressão “hermenêutica” deriva do nome 
de um deus grego: Hermes, o deus capaz de 
traduzir a língua dos deuses para a língua dos 
mortais e vice-versa. Por isso, entre os 
gregos, a figura de Hermes era associada à 
imagem de uma porta, da porta de casa. “Pois 
a porta é o lugar de fronteira entre a casa e a 
rua, entre o espaço público e o espaço 
privado, entre a família e a sociedade, entre o 
sangue e a política, enfim, entre o dentro e o 
fora”. 
 
Logo, interpretar não é, apenas, aquilo que o 
intérprete diz a partir de sua própria 
circunstância de vida, pois, nesse caso, 
interpretar seria dar uma opinião. Nem 
tampouco é, apenas, esclarecer o significado 
de algo a partir das circunstâncias externas 
(políticas, econômicas, ideológicas etc.) nas 
quais o intérprete se vê emaranhado, pois, 
nesse caso, interpretar implicaria em castrar 
por completo a autonomia de vontade dele. 
“Interpretar, portanto, é colocar na fronteira 
que separa/une a nossa subjetividade da 
objetividade da coisa a ser interpretada. 
 
Nesse sentido, interpretar é uma arte”. Eis o 
problema da interpretação: ela se encontra 
em uma zona de tensão, em uma fronteira 
entre duas línguas. Uma fronteira que separa, 
mas que também une essas duas línguas. 
Cabe agora, então, enfrentar o problema da 
interpretação. 
 
2. O PROBLEMA DA INTERPRETAÇÃO 
O problema da interpretação, e com a 
interpretação jurídica isto não é diferente, é 
que ela convive com dois usos de linguagem: 
onomasiológico (uso corrente ou não técnico) 
e semasiológico (uso técnico). No uso 
onomasiológico, emprega-se o significante 
corrente no sentido comum, ou seja, no 
sentido compartilhado pelos usuários da 
linguagem cotidiana. Por sua vez, no uso 
semasiológico, utiliza-se ou um significante 
técnico, pertencente a certo dicionário 
especializado, ou um significante corriqueiro 
que foi redefinido, ou seja, um signo trivial 
com significado específico. 
Os usos onomasiológico e semasiológico 
podem coincidir, mas nem sempre isto ocorre. 
 
Ou seja, uma mesma palavra pode ser 
empregada da mesma maneira pelos dois 
diferentes usos que se pode fazer da 
linguagem. A partir desta circunstância fica 
claro que estes usos não se encontram 
completamente separados, antes se 
implicam. Isto é, o uso técnico da linguagem 
toma como ponto de partida o uso cotidiano. 
 
E esta relação entre os usos da linguagem 
acarreta a possibilidade sempre presente de 
dúvida quanto ao significado deste ou 
daquele vocábulo empregado pela norma 
jurídica. 
 
Disto decorre, o problema da Hermenêutica 
Jurídica. O problema de superar a 
possibilidade sempre presente de dúvida 
quanto ao significado da norma jurídica. 
Sendo assim, para que serve a 
hermenêutica? 
 
3. FINALIDADE DA HERMENÊUTICA. 
A hermenêutica se presta, assim, a que 
finalidade? A esclarecer o significado de um 
signo. Mas se a hermenêutica se presta a 
tanto, surge, então, uma nova pergunta: o 
significado do signo é descoberto ou 
determinado? Se se admitir que ele seja 
descoberto, então, conclui-se que a 
hermenêutica não constrói o significado do 
signo, antes o declara. Porém, se o ponto de 
partida adotado é que a hermenêutica 
determina, positiva, impõe o significado ao 
significante, então, forçoso é reconhecer que 
ela o constrói. 
 
Pode-se falar, assim, em duas diferentes 
finalidades para hermenêutica, as quais, por 
sua vez, correspondem a duas distintas 
concepções de linguagem, são elas: a) a 
descoberta do significado, que corresponde à 
concepção substancialista ou idealista de 
linguagem; b) e a construção do significado, a 
que se refere à perspectiva convencionalista 
da linguagem. Uma concepção 
substancialista imagina que a linguagem 
representa a realidade ou o pensamento. A 
seguir, no momento oportuno, se verá como 
isso se apresenta no campo específico da 
 
 
 
 
 
 
 
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OAB 1ª FASE – XVIII EXAME 
Filosofia do Direito para Defensorias – Isolada Teórica 
Bernardo Montalvão 
 
2 
hermenêutica jurídica. Enquanto que uma 
concepção convencionalista pressupõe que a 
linguagem é um acordo celebrado entre os 
usuários dela. Usuários estes que teriam a 
capacidade limitada de manipular os 
significantes, os significados e as relações 
entre eles. 
 
Como se vê, quando se atribui à 
hermenêutica a finalidade de descoberta do 
sentido, assume-se o risco de se sustentar 
uma concepção naturalista ou a-histórica de 
interpretação. Isto porque, se a hermenêutica 
serve para investigar e descobrir o significado 
escondido do signo, em maior ou menor 
medida, o que se admite é que ela tem 
capacidade de chegar ao significado perfeito 
e completo do texto. Ora, o que é perfeito, 
não precisa mudar, não deve mudar. Tem-se, 
então, uma linguagem estática. Esse foi o 
intento de Justiniano no que toca ao seu 
Corpus Juris Civilis. 
 
Todavia, quando se confere à hermenêutica o 
objetivo de construção do significado do 
signo, o hermeneuta chama para si a tarefa 
de defender uma perspectiva normativista ou 
histórica de interpretação. Afinal, se a 
hermenêutica serve para edificar ou construir 
significados, imperioso é, então, admitir que 
ela não tenha a capacidade de chegar ao 
significado perfeito e completo do texto. O 
que é imperfeito, muda constantemente, em 
um ciclo que nunca chega ao fim. Eis, então, 
que se tem uma linguagem dinâmica. 
Uma vez compreendida as finalidades 
possíveis da hermenêutica, cabe agora a 
seguinte pergunta: qual é a finalidade da 
hermenêutica jurídica? A resposta a esta 
pergunta parte da seguinte pressuposição: a 
hermenêutica jurídica apresenta aspectos que 
lhes são peculiares, não podendo, portanto, 
ser tratada da mesma forma que as demais 
espécies de hermenêutica. Em outros termos, 
se a hermenêutica é gênero, a hermenêutica 
jurídica é uma de suas espécies. Não a única, 
é lógico. Mas, sim, uma delas. O que há, 
então, de específico na hermenêutica 
jurídica? 
 
 
 
4. HERMENÊUTICA JURÍDICA: A 
DISCUSSÃO. 
A depender da finalidade que se atribua à 
interpretação, se descreverá as 
peculiaridades próprias da hermenêutica 
jurídica de diferentes modos. Dito de outro 
modo, não há uma só concepção acerca do 
que venha a ser hermenêutica jurídica e de 
quais são as suas principais características. A 
doutrina é muito controversa acerca do tema. 
Por isso, com o intuito de apresentar algumas 
abordagens em torno do assunto, a seguir se 
fará uma apertada exposição de algumas 
concepções. A apresentação destas 
concepções não tem, é lógico, o intuito de 
exaurir as correntes doutrinárias acerca da 
matéria. Pelo contrário, o objetivo é apenas 
exemplificar algumas concepções e, a partir 
delas, evidenciar a discussão. 
Sendo assim, inicialmente, se descreverá a 
polêmica que marcou o assunto no século 
XIX. Feito isto, se apresentará o pensamento 
de Kelsen em torno da questão. A seguir, 
será feita uma apertada síntese do raciocínio 
de Miguel Reale. Após o que, se explicará a 
lição de Tercio Sampaio Ferraz Jr. O que se 
quer alcançar com estas exposições? 
Demonstrar erudição? Não, definitivamente 
não. O que se deseja é explicitar o óbvio: não 
existe a concepção correta de interpretação, 
pois se a interpretação é a fronteira entre os 
usos de linguagem, é a zona de tensão entre 
o sujeito que conhece (o intérprete) e o objeto 
que é conhecido (o texto, a lei, a norma, o 
contrato etc.), então ela não é ponto de 
partida nem é ponto de chegada, mas a ponte 
entre duas margens. 
 
4.1. VOLUNTAS LEGIS OU VOLUNTAS 
LEGISLATORIS? 
“É hoje um postulado universal da ciência 
jurídica a tese de que não hánorma sem 
interpretação, ou seja, toda norma, pelo 
simples fato de ser posta, é passível de 
interpretação”. Logo, a pretensão de Justiano 
de que fosse proibida a interpretação das 
normas de seu Corpus Juris Civilis, em 
verdade, não é uma exceção ao postulado, 
mas, sim, a pretensão de que apenas a 
interpretação do imperador fosse considerada 
vinculante. 
É muito recente a consciência de que a 
hermenêutica jurídica não é um amontado de 
 
 
 
 
 
 
 
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Filosofia do Direito para Defensorias – Isolada Teórica 
Bernardo Montalvão 
 
3 
técnicas de interpretação esparsas, mas, sim, 
um saber teórico. 
Essa conscientização científica acerca 
hermenêutica só veio a ocorrer no início do 
século XIX. O certo é que a hermenêutica 
jurídica é marcada, desde então, por uma 
profunda controvérsia entre duas concepções 
de interpretação, são elas: a objetiva e a 
subjetiva. 
A concepção objetiva é aquela que assinala 
que a interpretação se presta a descobrir a 
vontade da lei, a voluntas legis, o que 
pressupõe uma linguagem capaz de 
representar o evento real, a realidade do 
conflito. Por outro lado, a concepção 
subjetivista é aquela que sustenta que a 
interpretação objetiva descobrir a vontade do 
legislador, ou seja, a voluntas legislatoris. 
Parte-se, aqui, da pressuposição de que a 
linguagem representa o pensamento do 
legislador. 
Antes de avançar no assunto, é conveniente 
destacar o cuidado que se deve ter ao 
empregar os termos, subjetiva e objetiva. Isto 
porque a doutrina oscila ao empregá-los. Há 
quem compreenda como concepção objetiva 
aquela em que o intérprete deva se manter 
vinculado estritamente ao texto de lei, não 
tendo qualquer margem de liberdade. Se 
adotada esta definição para concepção 
objetiva, note-se que o significado da 
concepção, neste segundo sentido, seria 
completamente diferente do mencionado 
anteriormente. O mesmo se pode dizer em 
torno da concepção subjetiva, vez que há 
quem entenda esta concepção como aquela 
em que se permite ao intérprete certa 
margem de liberdade ao realizar a 
interpretação. 
Apresentada a controvérsia doutrinária acerca 
da melhor compreensão das concepções, 
convém ressaltar que em volta delas ainda há 
mais uma advertência a ser feita. É preciso 
chamar atenção que a discussão entre as 
duas concepções se dá dentro da perspectiva 
idealista de linguagem, ou seja, da 
perspectiva que confere à linguagem a 
capacidade de representar com exatidão 
alguma coisa. Esta alguma coisa pode ser ou 
o pensamento, ou a realidade. 
Nesse sentido, é possível compreender a 
divergência entre voluntas legislatoris e 
voluntas legis a partir da capacidade de 
representação da linguagem. Quando se 
defende que a interpretação jurídica busca 
descobrir a voluntas legislatoris, em verdade, 
o que de defende é que a linguagem tem a 
capacidade de representar o pensamento do 
legislador. 
Por outro lado, quando se sustenta que a 
interpretação jurídica busca descobrir a 
voluntas legis, em verdade, o que se 
pressupõe é que a linguagem tenha a 
capacidade de representar a realidade, uma 
vez que, neste caso, o texto da lei teria a 
capacidade de representar com precisão o 
conflito a ser decidido. 
Feitos tais esclarecimentos fica fácil, agora, 
com apoio na doutrina de Karl Engish e na 
lição de Tercio Sampaio Ferraz Jr, apontar as 
críticas que a concepção objetiva dirige à 
vertente subjetivista: 
 
“1. pelo argumento da vontade, afirmando que 
a “vontade” do legislador é mera ficção, pois o 
legislador é raramente uma pessoa 
fisicamente identificável; 
 
2. pelo argumento da forma, pois só as 
manifestações normativas trazidas na forma 
exigida pelo ordenamento têm força para 
obrigar, sendo, em consequência, aquilo que 
se chama de legislador, no fundo, apenas 
uma competência legal(a autorização 
conferida pela norma imediatamente superior 
no ordenamento jurídico); 
 
3. pelo argumento da confiança, segundo o 
qual o intérprete tem de emprestar confiança 
à palavra da norma como tal, a qual deve, em 
princípio, ser inteligível por si; 
 
4. pelo argumento da integração, pelo qual só 
a concepção que leve em conta os fatores 
objetivos em sua contínua mutação social 
explica a complementação e até mesmo a 
criação do direito pela jurisprudência”. 
 
Por seu turno, os subjetivistas criticam a outra 
concepção dizendo o seguinte: 
 
“1. O recurso à técnica histórica de 
interpretação, aos documentos e às 
discussões preliminares dos responsáveis 
pela positivação da norma é imprescindível, 
 
 
 
 
 
 
 
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Bernardo Montalvão 
 
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donde a impossibilidade de ignorar o 
legislador ordinário; 
2. os fatores (objetivos) que eventualmente 
determinassem a chamada vontade objetiva 
da lei (voluntas legis) também estão sujeitos a 
dúvidas interpretativas: com isso, os 
objetivistas criariam, no fundo, um curioso 
subjetivismo que põe a vontade do intérprete 
acima da vontade do legislador, tornando-se 
aquele não apenas „mais sábio‟ que o 
legislador, mas também „mais sábio‟ do que a 
própria norma legislada; 
3. seguir-se-ia um desvirtuamento na 
captação do direito em termos de segurança 
e de certeza, pois ficaríamos à mercê da 
opinião do intérprete”. 
Eis, então, o problema. Qual das concepções 
teria razão? Seria este um problema 
insolúvel? O certo é que esta polêmica 
remete o estudioso de hermenêutica jurídica 
ao desafio kelseniano: é possível falar em 
interpretação verdadeira? A hermenêutica 
jurídica pode ser teorizada como um saber 
científico? 
 
4.2. DESAFIO KELSENIANO: 
INTREPRETAÇÃO AUTÊNTICA E 
DOUTRINÁRIA 
 
Se interpretar juridicamente é decodificar 
conforme regras de uso, forçoso é admitir que 
há na interpretação um aspecto arbitrário, 
uma vez que ela é voltada a por fim à uma 
sucessão de interpretações que decodificam 
interpretações. Ou seja, a interpretação 
jurídica não pode dar ensejo a uma sucessão 
indefinida de interpretações, ela tem que 
produzir como resultado uma interpretação 
final. Esse aspecto, aliás, caracteriza a 
interpretação dogmática e, ao mesmo tempo, 
constitui o seu problema teórico, o problema 
de criar uma teoria que justifique o caráter 
dogmático da interpretação jurídica. 
 
É por conta deste problema que Kelsen se 
coloca a questão de “saber se é possível uma 
teoria científica da interpretação jurídica que 
permita ao jurista falar da verdade de uma 
interpretação”. A partir da observação da obra 
“Teoria Pura do Direito”, nota-se que Kelsen 
não fornece a partir dela nenhuma base para 
a hermenêutica dogmatica. 
 
Porém, ele afirma que há dois tipos de 
interpretação, são elas: a doutrinária e a 
autêntica. A interpretação autêntica é a que é 
realizada por órgãos competentes (pelo órgão 
autorizado por uma norma imediatamente 
superior). Por exemplo, é a interpretação feita 
pelo magistrado no exercício de suas 
funções. A interpretação doutrinária, por seu 
turno, “é realizada por entes que não têm a 
qualidade de órgão competente”. Por 
exemplo, quando o doutrinador emite a sua 
interpretação acerca de certo texto de lei. 
Em suma, a interpretação doutrinária não é 
vinculante, não obriga, ao passo que a 
interpretação autêntica tem este poder. Ou 
seja, da interpretação autêntica resulta uma 
norma, a norma específica que é declarada a 
partir da norma genérica. Por outro lado, da 
interpretação doutrinária decorre uma 
sugestão, uma recomendação. Em outras 
palavras, enquanto a interpretação autêntica 
define (estabelece limites, fronteiras) o 
sentido do conteúdo da norma, sendo esta 
definição o produto de um ato de vontade, a 
interpretação doutrinária. 
 
Percebe-se, apartir do exposto, que, para 
Kelsen, é “possível denunciar, de um ângulo 
filosófico (zetético), os limites da 
hermenêutica, mas não é possível fundar uma 
teoria dogmática da interpretação”. Nas 
palavras de Wittgenstein, “sobre o que não se 
pode falar, deve-se calar”. Mas, qual é a 
compreensão de Miguel Reale em torno do 
problema hermenêutico? 
 
4.3. A COMPREENSÃO DE MIGUEL REALE 
EM TORNO DO PROBLEMA 
HERMENÊUTICO. 
 
De acordo com Miguel Reale, a norma 
jurídica deve ser entendida pela hermenêutica 
jurídica atual em termos de: 
 
“a) um modelo operacional de uma classe ou 
tipo de organização ou de comportamentos 
possíveis; 
 
b) que deve ser interpretado no conjunto do 
ordenamento jurídico; 
 
c) implicando a apreciação dos fatos e valores 
que, originariamente, o constituíram; 
 
 
 
 
 
 
 
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d) assim como em função dos fatos e dos 
valores supervenientes”. 
 
A norma deve ser entendida como modelo 
operacional, ou seja, como modelo útil a 
decidir conflitos. Este modelo, por sua vez, é 
hábil ou a controlar comportamentos (normas 
de conduta) ou a regular outras normas 
(normas de organização). Logo, como quer 
Hart, não há apenas normas de 
comportamento, mas, também, normas de 
organização, normas de normas. Normas de 
organização que se subdividem em normas 
de reconhecimento, normas de modificação e 
normas de julgamento. Essa é, aliás, uma das 
maiores críticas dirigidas por Hart à Kelsen, 
vez que, segundo aquele, este apresenta uma 
teoria sobre a norma jurídica incompleta. 
 
Ademais, a norma jurídica que deve ser 
interpretada no conjunto do ordenamento 
jurídico. É dizer, a norma deve ser 
interpretada sistematicamente. A norma 
jurídica não pode ser interpretada em tiras. E, 
além disso, o intérprete deve levar em 
consideração os fatos e valores que, 
originariamente, constituíram a norma. Em 
outras palavras, a norma deve ser 
interpretada a partir dos fatos e valores 
relevantes no momento de sua constituição, 
isto é, de acordo com a vontade do legislador. 
 
Porém, segundo Miguel Reale, a norma deve 
ser interpretada não apenas segundo a 
vontade do legislador, mas, também, em 
função dos fatos e dos valores 
supervenientes à sua elaboração. Ou seja, a 
norma deve ser interpretada também segundo 
a vontade da lei, segundo os fatos e os 
valores relevantes no momento em que ela é 
aplicada. Logo, a partir da lição de Miguel 
Reale, a hermenêutica jurídica atual deve 
combinar as duas correntes acima 
explicitadas, voluntas legis e voluntas 
legislatoris. 
Em suma, a hermenêutica jurídica atual, de 
acordo com Miguel Reale, deve possuir uma 
dupla visão da norma, retrospectiva (voluntas 
legislatoris) e prospectiva (voluntas legis). É a 
partir dessa dupla visão que deve aparecer o 
significado concreto da norma, 
“reconhecendo-se ao intérprete um papel 
ativo e criador no processo hermenêutico, o 
que se torna ainda mais relevante no caso de 
se constatar a existência de lacunas no 
sistema legal”. Mas será que o melhor 
caminho é esse? Será que interpretar é uma 
questão de descobrir alguma coisa? Será que 
a linguagem tem a capacidade de representar 
algo? Não seria a interpretação uma 
tradução? 
 
4.4. INTERPRETAÇÃO E TRADUÇÃO: UMA 
ANALOGIA ESCLARECEDORA 
 
Traduzir é transpor o texto de uma língua 
para outra. Admitindo que o legislador se 
utilize de uma língua e que o conflito a ser 
decidido seja derivado de um ruído na 
comunicação realizada a partir de outra 
língua, nota-se a contribuição que a teoria da 
tradução pode prestar à hermenêutica 
jurídica. O legislador se utiliza de uma 
linguagem técnica ou normativa. Os 
participantes do conflito se valem de uma 
linguagem normal ou cotidiana, língua natural. 
Logo, o problema é: como fazer a tradução de 
uma língua para outra? 
 
Há três hipóteses de tradução: “(a) se as 
regras básicas de ambas as línguas 
coincidem, é possível traduzi-las uma para 
outra; (b) se a coincidência é apenas parcial, 
ocorre uma transferência que exige 
adaptação; (c) se não coincidem, elas são 
incomunicáveis”. No primeiro tipo de 
tradução, ela é feita por correspondência, pois 
há entre as duas línguas, por exemplo, 
vocábulos que se equivalem. Na segunda 
modalidade, a tradução é feita mediante 
adaptação, admitindo-se, assim, uma margem 
reduzida de liberdade ao intérprete. E, no 
terceiro tipo de tradução, ela, em princípio, 
seria impossível. 
 
No entanto, neste último caso, é possível uma 
transposição indireta. Ou seja, lança-se mão 
de uma terceira língua que possa ser utilizada 
como um canal de acesso entre as duas 
outras. O que é preciso é que esta língua 
contenha, entre as suas regras secundárias, 
as regras básicas das outras. O certo é que, 
nesta terceira espécie de tradução, ela se dá 
mediante a “recriação do sentido por meio de 
uma língua intermediária”. A língua 
 
 
 
 
 
 
 
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hermenêutica é esta língua intermediária que 
permite a tradução da língua normativa para 
língua cotidiana. Logo, o problema da 
hermenêutica jurídica não é a descoberta de 
um significado ou de uma vontade (voluntas 
legis ou legislatoris) – a língua não é capaz de 
representar nada - mas, sim, a construção 
dele e, a seguir, a sua atribuição à norma 
jurídica para fins de decisão do conflito 
jurídico. Fica evidente, então, a relação entre 
poder e saber, entre hermenêutica jurídica e 
poder. 
 
5. HERMENÊUTICA JURÍDICA E PODER 
 
Segundo Alysson Leandro Mascaro, até 
mesmo “a teoria de Kelsen, quando trata a 
respeito da interpretação, expõe o problema 
nevrálgico da hermenêutica jurídica: ela é um 
procedimento de poder”. Não se pode negar 
que o profissional do Direito não se 
desvencilha da sua biografia de vida. “Ele é 
alguém que tem convicções, experiências, 
ideologia, compromissos políticos, 
econômicos, culturais, religiosos, de classe 
social. Daí que o jurista nunca analisa a 
norma a partir do nada. Ele lê a norma de 
acordo com a sua visão de mundo”. 
 
Como assinala Hans-Georg Gadamer, a 
hermenêutica não é uma atividade 
descompromissada, não é uma ingênua 
operação lógico-dedutiva, antes se mostra 
como um ato existencialmente interessado. A 
norma jurídica não é apenas um texto. Ela, a 
norma jurídica, não se originou a partir do 
nada. Além disso, convém lembrar que o 
intérprete da norma também não é um ser 
sem experiências e condicionantes. “O jurista 
interpreta a norma a partir de sua situação 
existencial, de seu tempo, de suas 
circunstâncias sociais”. Em suma, “toda 
compreensão é uma pré-compreensão. 
Compreender é um aprender-com, ou seja, é 
uma tomada de entendimento a partir de uma 
determinada situação, construída 
socialmente”. Logo, não se interpreta primeiro 
para decidir depois, antes o contrário, decide-
se primeiro para depois se interpretar. 
 
 
 
 
6. MÉTODOS HERMENÊUTICOS 
 
Os métodos de interpretação, na realidade, 
não são métodos, mas, sim, regras técnicas 
que objetivam a obtenção de um resultado. A 
partir delas buscam-se “orientações para os 
problemas de decidibilidade dos conflitos. 
Esses problemas são de ordem sintática, 
semântica e pragmática”. Essas regras 
subdividem-se em três categorias: a primeira, 
orientada à textualidade da norma e sua 
relação com as demais normas; a segunda, 
que aponta para o contexto da norma; e uma 
terceira, que realçam os objetivos da norma 
jurídica. 
 
Dentro do primeiro grupo, encontram-se as 
regras gramatical, lógica e sistemática. A 
interpretação gramatical dedica-se à análise 
do texto, seja em seuaspecto morfológico, 
seja em seu prisma sintático, seja em sua 
dimensão semântica. Já a interpretação 
lógica “procede de acordo com as 
ferramentas que clarificam o sentido e a 
compreensão do texto”. E, a interpretação 
sistemática, é aquela que é realizada a partir 
da ideia de que a norma não se encontra 
isolada no ordenamento jurídico, antes 
estando emaranhada em meio a certo 
contexto normativo. 
 
Na segunda categoria, podem ser 
encontradas as regras histórica, sociológica e 
evolutiva. A histórica é aquela que busca 
entender as circunstâncias, que em 
determinado contexto histórico, provocaram a 
formação da norma jurídica. A sociológica 
objetiva “buscar, na sociedade, as causas que 
geraram base à formação da norma”. E, a 
evolutiva, é a que procura “entender as 
mudanças, as correções de sentido, novos 
entendimentos ou rupturas no que tange à 
hermenêutica da norma jurídica”. 
 
Enfim, no que toca à terceira modalidade, há 
duas regras, são elas: a teleológica e a 
axiológica. A primeira tem por finalidade a 
busca, a partir das normas e das situações 
jurídicas, da compreensão de seus 
propósitos. 
 
Ou seja, ela tenta descobrir o objetivo que o 
ordenamento jurídico busca alcançar com a 
 
 
 
 
 
 
 
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norma jurídica que está sendo interpretada. 
Já a segunda regra, a axiológica, que tenta 
compreender quais são os valores que se 
encontram relacionados à norma jurídica. 
 
7. TIPOS DE INTERPRETAÇÃO 
 
Três são os tipos de interpretação, segundo o 
seu resultado, são eles: especificadora, 
extensiva e restritiva. A especificadora é 
aquela que fixa os limites de um determinado 
conceito jurídico. A restritiva é a que delimita 
a compreensão da norma, de maneira a 
diminuir as hipóteses de aplicação dela. E a 
interpretação extensiva é a que amplia o 
campo de possibilidades hermenêuticas de 
uma norma jurídica. 
 
8. FUNÇÃO SOCIAL DA HERMENÊUTICA 
 
A função social da hermenêutica jurídica é 
enfraquecer as tensões sociais, “na medida 
em que neutraliza a pressão exercida pelos 
problemas de distribuição de poder, de 
recursos e de benefícios escassos. E o faz, 
ao torná-los conflitos abstratos, isto é, 
definidos em termos jurídicos e em termos 
juridicamente interpretáveis e decidíveis”. 
 
A “hermenêutica possibilita uma espécie de 
neutralização (manter sobre controle) dos 
conflitos sociais, ao projetá-los numa 
dimensão harmoniosa – o mundo do 
legislador racional – no qual, em tese, tornam-
se todos decidíveis. Ela elimina, assim, as 
contradições, mas as torna suportáveis. 
 
Portanto, não as oculta propriamente, mas as 
disfarça, trazendo-as para o plano de suas 
conceptualizações”. Em suma, a 
hermenêutica jurídica “conforma o sentido do 
comportamento social à luz da incidência 
normativa. Ela cria assim condições para 
decisão”.

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