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Arapiraca 2015 BENEDITO PEDROZA DE CARVALHO JUNIOR SISTEMA DE ENSINO PRESENCIAL CONECTADO SERVIÇO SOCIAL DIVISÃO SOCIAL DO TRABALHO AS RELAÇÕES FAMILIARES NA CONTEMPORANEIDADE MULHER, MERCADO DE TRABALHO E AS CONFIGURAÇÕES FAMILIARES DO SÉCULO XX Arapiraca 2015 DIVISÃO SOCIAL DO TRABALHO AS RELAÇÕES FAMILIARES NA CONTEMPORANEIDADE MULHER, MERCADO DE TRABALHO E AS CONFIGURAÇÕES FAMILIARES DO SÉCULO XX Trabalho interdisciplinar apresentado à Universidade Norte do Paraná - UNOPAR, como requisito parcial para a obtenção de média bimestral na disciplina de fundametos do serviço social I, sociologia, ciências políticas e filosofia. Orientador: Prof. Rosane, Sergio, Wilson e Adir BENEDITO PEDROZA DE CARVALHO JUNIOR SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 3 2 DIVISÃO SOCIAL DO TRABALHO ...................................................................... 7 3 RELAÇÕES FAMILIARES NA CONTEMPORANEIDADE ................................. 11 4 AS MULHERES E O MERCADO DE TRABALHO ............................................. 15 4.1 OS MÚLTIPLOS PAPÉIS DA MULHER TRABALHADORA ........................... 16 5 CONCLUSÃO .................................................................................................... 18 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 20 3 1 INTRODUÇÃO A divisão social do trabalho se distribui nas diferentes sociedades ou estruturas sócio- econômicas que surge quando grupos de produtores realizam atividades especificas em consequência do avanço de um certo grau de desenvolvimento das forças produtivas e de organização interna das comunidades. Com a determinação de funções para a forma variadas e múltiplas do trabalho, constituem-se grupos sociais que se diferenciam de acordo com a sua implantação no processo de produção. O advento da modernidade marcou profundamente a história humana, pois trouxe um jeito “todo novo” de experimentar o mundo. A sociedade moderna se diferencia completamente de suas precedentes pré-modernas nas suas instituições, relações sociais e etc., porém, vivenciamos na contemporaneidade uma nova ordem social que já se diferencia da moderna quando esta foi estudada pelos clássicos da sociologia como Marx, Weber e Durkheim. Muitos autores falam em “fim da modernidade”, muitos falam em “pós-modernidade” e outros trabalham com a “modernidade avançada”, que seria uma modernidade ainda mais moderna. É nesse último conceito que vamos no ater para explicar como a primeira instituição social humana conhecida, a família, se modificou até aparecer nos dias de hoje em um formato completamente diferente da noção que se tinha na sociedade pré- modernas e início da modernidade. O nome família continua o mesmo, mas em seu interior, a família se modificou completamente. E, paralelamente, como todas as instituições sociais passaram por radicais transformações na modernidade avançada, não foi diferente com o Direito, que é o responsável por “organizar a sociedade” e administrar seus conflitos. Com essa constante modificação das relações sociais, o Direito precisou e ainda precisa, se transformar para poder atender toda uma demanda social. Nesse artigo, após debater a noção do conceito de família na contemporaneidade através da análise de autores que estão trabalhando incessantemente esse tema, abordaremos a transformação jurídica ocorrida paralelamente e como esta pode se transformar para poder atender às necessidades dessa nova organização familiar que está se formando e transformando constantemente. 4 1. As transformações sociais na modernidade avançada A modernidade começa a surgir na Idade Média e início do Renascimento. Até os dias atuais, foram inúmeras transformações sem precedentes históricos. Podemos dizer que hoje, vivemos em uma época de constante transformação em praticamente todos os âmbitos da vida social e institucional. Da sociedade tradicional para a sociedade industrial ocorreram rupturas que demarcaram essa mudança e fizeram com que os indivíduos transformassem praticamente o da sua forma de ação e seu olhar sobre o mundo a sua volta, transformando completamente suas narrativas de vida. Krishan Kumar, ao analisar o surgimento da modernidade, coloca que esta se iniciou como uma invenção da Idade Média cristã, destacando o mundo moderno cristão do mundo antigo pagão. Na renascença ocorreu uma espécie de retorno ao tempo cíclico antigo, através da grande valorização que foi a Idade de Ouro da Antiguidade, o que estava por vir era um passado reformado, renascido”. (KUMAR, Krishan, passim, 2006). De acordo com Kumar, o que a Renascença trouxe para a visão de mundo moderno foi a capacidade de formular novos padrões críticos e racionais que poderiam ser usados contra qualquer forma da autoridade intelectual. Porém, foi no século XVIII que, de acordo com o autor, os tempos modernos finalmente ganharam vida. A modernidade deixou de significar a cópia inferior de uma época antiga gloriosa ou o último estágio empobrecido da existência humano e passou a significar uma ruptura: “um rompimento completo com o passado, um novo começo baseado em princípios radicalmente novos” (KUMAR, Krishan, 2006, p.18). O moderno passou a significar mudança, quanto mais recente no tempo maior é a mudança. O moderno é revolucionário em si, a modernidade é uma revolução constante de ideias e instituições, características essas, que de acordo com Kumar, levaria a modernidade a um relativismo sem objeto. Porém, em seu surgimento, os profetas da modernidade acreditavam em seu significado, a era moderna era vista como um ponto culminante do desenvolvimento humano. Ulrich Beck, como os demais teóricos da sociologia contemporânea, busca encontrar termos chaves para diferenciar as formas de vidas sociais que se configuram na atualidade, das vividas no início da chamada era moderna. O autor observa que não se cabe mais a ideia de uma sociedade industrial, sendo assim, explica que estamos caminhando para a denominada “sociedade de risco”. 5 A modernidade tardia trouxe consigo um processo de individualização social, as pessoas são “libertadas” das formas sociais anteriores como classe, estrato, família, estatuto de gêneros e etc. Essa situação gerou, sobre tudo no mundo ocidental, um “impulso social individualizatório”. Isso dissociou as pessoas, através da ruptura de continuidade da história, dos condicionamentos ligados à classe e família. Nesse sentido, de acordo com Beck, o processo de individualização é concebido teoricamente como processo de reflexividade. O autor, vê a questão da reflexividade moderna por duas óticas, de um lado a toma como uma libertação do indivíduo das formas de vida ditadas pela sociedade industrial, o indivíduo ligado às questões de classe, gênero e família. Ao mesmo tempo o coloca em um estado de insegurança que antes era substituído pelas “formas de controle do medo e da insegurança em ambientes sociomorais”. Agora é o indivíduo que tem o controle e as instituições sociais se deparam com uma nova demanda em relação à educação, política, família e etc. A família entrou para o que Beckchama de “instituições zumbis”, são as instituições que estão “mortas e ainda vivas”. Nas últimas décadas a mulher intensificou sua luta no combate à opressão e desigualdades a favor de sua emancipação econômica e social, e pelo direito ao trabalho. Desta forma, alcançou uma igualdade política e social em relação aos homens. Deve-se isto, principalmente, aos movimentos feministas, bem como ao entendimento da sociedade que a legitimou, tendo em vista as consequências da divisão sexual do trabalho e ao mesmo tempo em que a mulher destaca seu papel na educação escolar. Ao longo dos últimos anos, ao persistir em suas lutas, reivindicando novos e maiores espaços no mercado de trabalho e na sociedade, as mulheres têm alcançado muitas conquistas. Antigamente, o processo de emancipação das mulheres era mais lento, hoje, com a tecnologia, tem avançado cada vez mais, uma vez que, com os meios de comunicação, as diversas informações chegam a uma parcela significativa da população, esclarecendo sobre direito universal, liberdade e democracia. As mudanças sociais e as inovações tecnológicas possuem um importante papel na organização das lutas pelos direitos das mulheres, pois permitem que as pessoas se organizem e comuniquem seus pensamentos de maneira eficiente, abrindo um leque de informações e possibilidades de mobilização. Sabe-se que, por meio de muitas lutas, as 6 mulheres conquistaram seu espaço no mercado de trabalho. No entanto, apesar da crescente inserção delas no mundo profissional, da sua contínua busca por capacitação e especialização, há ainda longos caminhos para percorrer no que diz respeito ao gênero. Com sua inserção no mercado de trabalho, a mulher conquista, também, novos espaços na sociedade, sendo levada a assumir múltiplos papeis. Hoje a mulher se encontra com uma ampliação de ideais, novos interesses e necessidades, além de seu compromisso profissional, ela ocupa ainda um espaço amplo no âmbito doméstico, não podendo se desvincular dele tão facilmente, por se tratar de uma questão cultural. Considerando o universo feminino no que diz respeito às suas lutas pela emancipação, este trabalho busca apresentar, discutir e analisar os múltiplos papéis da mulher trabalhadora na contemporaneidade, enfatizando suas lutas e conquistas históricas e a sua busca incessante por direitos iguais. 7 2 DIVISÃO SOCIAL DO TRABALHO Assim como Auguste Comte, Karl Marx e Max Weber, Dürkheim também procura com seus métodos de análise e objeto de estudo, explicações para as modificações estruturais ocorridas com o advento da sociedade moderna. O triunfo da indústria Capitalista promoveu uma transformação radial em sua estrutura socioeconômica, dando um novo rumo à sociedade emergente. É nesta perspectiva que a sociedade moderna Capitalista será colocada no plano de análise deste sociólogo. Foi com Émile Durkheim (1851-1917), que a Sociologia passou a ser considerada uma ciência, estabelecendo-lhe uma base empírica, com métodos próprios de investigação e demonstrando que seu objeto de estudo, os fatos sociais, teriam características próprias, que os distinguiriam dos estudados pelas demais ciências. É importante retomarmos aqui a proposta metodológica deste teórico, para compreendermos a função prática do seu conceito de divisão social do trabalho. Durkheim considera que a sociedade precisaria ser estudada como um fenômeno sui generis; como uma unidade ou sistema organizado de relações permanentes e mais ou menos definido, com leis naturais de desenvolvimento que são baseadas na articulação de suas partes. Portanto, os “fenômenos sociais têm origem na coletividade não em cada um dos seus participantes” (QUINTANEIRO, 69:2002). Esclarece ainda que os fatos individuais são refletidos na consciência individual o nas representações físicas e, no caso das representações coletivas, estas expressam a vida mental do grupo social. É por isso que para Durkheim a sociedade é semelhante a um corpo vivo, em cada órgão cumpre uma função, ou seja, as partes (os fatos sociais) existem em função do todo (a sociedade). Ao comparar a sociedade a um organismo vivo, Durkheim identifica dois estados em que esta pode se encontrar: o estado normal que designa os fenômenos que ocorrem com regularidade na sociedade e o patológico, comportamentos que representam doenças e devem ser isolados e tratados porque põem em risco a harmonia e o consenso, estando fora dos limites permitidos pela ordem social e pela moral vigente. Para Durkheim, a sociedade moderna se encontra em um estado doentio, porque deixou de exercer o papel de freio moral sobre os indivíduos. Como Durkheim demonstra no prefácio à 8 segunda edição de sua obra “Da divisão do trabalho social”: Durkheim considera que os conflitos e as desordens da sociedade moderna são sintomas deste estado de anomia e ainda que, a Religião, o Estado e a família têm sido pouco eficazes no controle moral desta sociedade. Para este teórico, o mecanismo que oferece a coesão para a sociedade seria a solidariedade social. Nesta perspectiva, cabe-nos demonstrar que a solidariedade social se expressa, segundo sua teoria, por uma maior ou menor divisão do trabalho, somando ainda à consciência que poderá se individual ou coletiva. A divisão do trabalho e a forma de consciência que se expressa em cada sociedade, levaram Durkheim a demonstrar que os fatos sociais têm existência própria, externa aos indivíduos e que no interior de qualquer grupo ou sociedade existem formas padronizadas de conduta e pensamento baseadas na soma destas categorias. Esta soma, por sua vez, formam os dois tipos de solidariedade: a solidariedade mecânica e a solidariedade orgânica. Em sua obra, Durkheim demonstra que a sociedade modela o comportamento social do homem no processo da evolução social, passando de uma solidariedade mecânica, para uma solidariedade orgânica. A solidariedade mecânica é mais simples e se forma pela igualdade: os indivíduos vivem em comum porque partilham de uma consciência coletiva comum. A consciência coletiva é “um conjunto das crenças e dos sentimentos comuns à média dos membros de uma mesma sociedade [que] forma um sistema determinado que tem vida própria” (DURKHEIM, 50:2004). Este tipo de solidariedade predominava nas sociedades pré-capitalistas, onde os indivíduos permanecem em geral independentes e autônomos em relação à divisão do trabalho social. Neste caso, os indivíduos que executam as mesmas tarefas reconhecem que têm pelo menos parte da personalidade em comum, e se unem em torno dela. Nas sociedades de solidariedade mecânica, existe total predomínio do grupo sobre os indivíduos que se identificavam através da família, da religião, da tradição e dos costumes. Devemos destacar ainda que, segundo Durkheim, a solidariedade permite a integração geral da sociedade, porque tem natureza moral. Embora algumas formas de solidariedade manifestam-se nos costumes, como é o caso da solidariedade mecânica, ela se materializa do Direito. Nas sociedades de 9 solidariedade mecânica, o direito é repressivo, apresentando uma punição por meio dos costumes, já que o crime representa uma ruptura com os elos de solidariedade. O criminoso no caso, age contra a sociedade e sua punição é proporcional ao delito. A evolução da sociedade, promove uma diferenciação social, no qual predomina a divisão do trabalho. De acordo com Durkheim, são três os fatores responsáveis pelo crescimento da sociedade: volume, densidade sócia e densidade moral. Com o crescimento quantitativo (volume) e qualitativo (densidade material e moral) da sociedade, ocorre nasociedade um processo de especialização de funções denominado por Durkheim de Divisão Social do Trabalho. Nesta nova sociedade o indivíduo é socializado porque, embora tenha uma esfera própria de ação, depende dos demais, e por conseguinte, da sociedade resultante dessa união. Para Durkheim, nesta sociedade predomina a solidariedade orgânica, ou seja, uma sociedade em que os indivíduos estão unidos em virtude da divisão social do trabalho. Vale ressaltar que a divisão social do trabalho, explicitada pelo teórico, não se refere apenas à especialização de funções econômicas, mas também pelas diferentes esferas sociais que se diferenciam e se especializam cada vez mais como a economia. A política, a educação, o direito e outros. Além disso, a divisão social do trabalho, exerce nos homens a função de freio moral, como veremos a seguir. A solidariedade orgânica é fruto das diferenças sociais, há que são essas diferenças que unem os indivíduos pela necessidade de troca de serviços e pela sua interdependência. É neste ponto que encontramos a originalidade da obra de Durkheim, que nos apresenta a divisão social do trabalho como um novo mecanismo de integração social. Vemos, portanto, que a solidariedade orgânica prevalece nas sociedades complexas de tipo capitalistas, onde, através da acelerada divisão social do trabalho, os indivíduos se tornam interdependentes e suas funções são vitais para o funcionamento do sistema social. Neste tipo de solidariedade a consciência coletiva se afrouxa, dando espaço à consciência individual que expressa o que temos de pessoal e distinto. O direito predominante na solidariedade orgânica seria os restitutivo, que implica no restabelecimento das relações perturbadas, sob sua forma normal. Isto nos revela outro aspecto importante da obra de Durkheim: a especialização de funções e o grande desenvolvimento das atividades 10 econômicas levaram a uma acentuação da consciência individual, o que pode ser prejudicial à coesão social. Neste caso, se a diferenciação de atividades que dá origem à solidariedade orgânica for muito forte, a coordenação entre elas não poderá ocorrer de maneira eficaz. Ou seja, a infinidade de ocupações distribuídas ente o homem impedirá que eles percebam a complementariedade entre elas, gerando um forte sentimento de individualismo. A acentuada especialização de atividades faz com que o indivíduo oriente seus atos, segundo suas próprias intenções, deixando de lado os valores coletivos. Desta forma, o individualismo exacerbado, segundo Durkheim, leva a sociedade a um estado de anomia moral, ou seja, à perda de uma moral orientadora e disciplinadora dos comportamentos. A falta de regulamentação das atividades profissionais também levaria a sociedade a uma “divisão anômica do trabalho”. Este seria para Durkheim o grande desafio das ciências sociais: preservar a sociedade garantindo assim o seu bom funcionamento. Qual seria, portanto, a proposta deste teórico para restaurar a sociedade de seu estado patológico ou anômico? Se as instituições sociais como a Igreja, a família e o Estado são pouco eficazes no controle moral da sociedade, a qual instituição caberia esta função? Qual seria, portanto, a função da divisão social do trabalho neste contexto? Tentaremos, a seguir, responder a tais questões. Durkheim irá procurar no campo do trabalho, um lugar de construção da solidariedade da moralidade perdidas. Para este sociólogo, a anomia que desestabilizou a sociedade, necessita da criação de uma nova moral, condizente com os valores da sociedade industrial emergente. Esta nova moral estaria intrínseca ao mundo do trabalho que poderia exercer a regulamentação moral nas sociedades. Neste sentido, a profissão assume grande importância, substituindo a família, a religião e o Estado como instituições integradoras. De acordo com QUINTANEIRO (2002), a saída para a moralização seria criar corporações capazes de cumprir a autoridade moral, estabelecendo regras de conduta sobre os indivíduos, criando entre eles uma forte solidariedade. A função da divisão social do trabalho, seria produzir a solidariedade, dando sentido às ações dos trabalhadores. Ao restabelecer a solidariedade entre os homens, a divisão social do trabalho, assumiria seu caráter moral ampliando a harmonia, a integração e a coesão na sociedade moderna. 11 3 RELAÇÕES FAMILIARES NA CONTEMPORANEIDADE Para Giddens, o desenvolvimento das instituições sociais modernas criou oportunidades bem maiores para os seres humanos desfrutarem de uma existência mais segura e gratificante que qualquer tipo de sistema pós- moderno. A radicalização da modernidade, a modernidade em sua forma potencializada, como analisada aqui, é vista por Giddens sobre vários aspectos, um é o lado sombrio que essa radicalização da modernidade trouxe. Como conseqüência do desenvolvimento industrial, a natureza foi modificada de forma intensa, “talvez tenhamos alterado o clima do mundo, além de ter danificado uma parte muito maior de nosso habitat terrestre” (GIDDENS, 2003, p.31). Esse fato traz sim a noção de risco que não existia nas culturas tradicionais. Outro importante ponto analisado pelo autor dentro de seus estudos sobre a modernidade radicalizada é questão das relações afetivas humanas. O autor ao analisar as transformações ocorridas nas relações sociais na modernidade, utiliza como palco dessas transformações a família. “A família é um local para as lutas entre tradição e modernidade, mas também uma metáfora para elas”. (1993 p.63) A família e o casamento se encaixam, para Giddens, dentro das “instituições-casca”, instituições essas que por dentro se transformaram radicalmente. De acordo com o autor, um casal hoje baseia seu relacionamento na comunicação e na intimidade emocional, nunca antes o casamento se baseou na intimidade. A ideia do relacionamento superou na importância a ideia do casamento. Para o autor as três áreas principais onde a intimidade está substituindo os velhos laços que antes uniam as pessoas são: relacionamentos sexuais e de amor, os relacionamentos pais-filhos e a amizade. O autor analisa que os relacionamentos atuais que são tidos como bons relacionamentos são os que se aproximam da democracia pública. Giddens coloca que o princípio da democracia também é ideal dentro da noção atual de um “bom relacionamento”, isso não quer dizer que todos os relacionamentos atuais se dão dessa forma. Mas o princípio de um bom relacionamento atualmente é o que se estabelece entre iguais, onde procura-se ter confiança mútua e esta tem que ser trabalhada, “o bom relacionamento é aquele isento de poder arbitrário, coerção e violência.” (1993, p.71). O 12 também sociólogo da contemporaneidade Zygmunt Bauman, enxerga a questão da intimidade e do relacionamento humano dentro da modernidade radicalizada, de forma mais inquietante que Giddens. Para Bauman, as redes de parentesco se sentem frágeis e ameaçadas frente a uma ordem social que carece de pontes estáveis. Em seus estudos sobre a sociedade contemporânea, chamada por Bauman de sociedade liquido-moderna, o autor coloca que vivemos em uma vida de incertezas, é nesse sentido que ele afirma que vivemos uma vida líquida. A sociedade líquido-moderna é aquela “em que as condições sob as quais agem seus membros, mudam em um tempo mais curto do que o necessário para a consolidação, em hábitos e rotinas, das formas de agir” (BAUMAN, 2001, p.7). Sendo assim, as realizações em posse que os indivíduos conquistam são a todo momento passíveis de se transformarem: trata-se de uma vida mergulhada em incertezas. Para Zygmunt Bauman, vivemos em umasociedade de consumidores, ninguém está livre do mercado, estamos todos inseridos dentro deste e temos que agir de acordo com suas regras. Sendo assim, nessa forma diluída da sociedade contemporânea, as relações sociais também estão “misturadas” com as relações de consumo. É nesse sentido que o autor coloca que na sociedade de consumidores, somos todos consumidores e mercadorias ao mesmo tempo. Não importa o meio em que vivemos, temos que constantemente nos tornar atraentes e desejáveis como mercadoria, seja para conseguir um emprego ou reconhecimento social. Perante essas análises, de acordo com Bauman, em nossa sociedade o consumo é um investimento em qualquer coisa que sirva para o valor social e a autoestima do indivíduo. O autor coloca que na sociedade de consumidores seus próprios membros são mercadorias de consumo e é justamente essa característica, ser uma mercadoria de consumo, que os torna membro dessa sociedade. Dentro dessa circunstância, tornar-se e continuar sendo uma mercadoria consumível é a principal preocupação do consumidor, geralmente de forma inconsciente. Essa necessidade está pautada no medo da inadequação, que a maioria dos indivíduos enfrenta na sociedade de consumidores. Para Bauman, sobre determinada ótica, a passagem da sociedade de produtores para a sociedade de consumidores é vista como uma passagem do mundo das restrições para o mundo da liberdade e da 13 individualidade. Outra visão apresentada por Bauman, sobre essa mesma transição, é a de que a passagem de uma sociedade para outra se deu através da aquisição da vida pelo mercado de bens de consumo. Entre as maneiras como o consumidor enfrenta as suas frustrações na sociedade de consumo esta descarta os objetos que causam essa frustração. Para Bauman a sociedade de consumidores desvaloriza o que é durável, considerando o que está “velho” como destinado ao lixo. “Não se espera dos consumidores que jurem lealdade aos objetos que obtém com a intenção de consumir”. (BAUMAN, 2007) Sendo assim, Bauman destaca que essa ênfase no descarte das coisas e não na aquisição, se encaixa de forma perfeita na lógica da nossa economia orientada para o consumo. E isso traz uma crescente insegurança. A vida dos eliminados do jogo do consumismo é de rebelião esporádica, mais comumente destaca no uso das drogas. Bauman coloca que a possibilidade de se tornar outra pessoa é o atual substantivo da salvação por redenção. Sendo assim, o sonho de tornar a incerteza menos assustadora e garantir uma certa felicidade mudando o próprio ego, e mudar o ego “trocando de vestido”, é para Bauman, a utopia dos caçadores. “Uma versão ‘desregulamentada’, ‘privatizada’ e ‘individualizada’ das antigas visões de boa sociedade, uma sociedade hospitaleira à humanidade e seus membros” (BAUMAN, 2007b) É essa crescente individualidade em voga na sociedade de consumidores, que de acordo com Bauman, faz com que os relacionamentos sejam também uma espécie de relação de consumo, onde se busca o prazer imediato e onde se pode “descartar” o relacionamento quando este parecer “pesado demais” para o indivíduo. Enquanto para Giddens a modernidade avançada trouxe uma possibilidade a mais de escolha e liberdade, onde estamos livres para formar laços e desfazê-los sem precisar de estarmos presos a estes eternamente se não quisermos, para Bauman essa situação trouxe um sentimento de insegurança para as pessoas que estão constantemente colocando seus relacionamentos como objeto de reflexão, sabendo que estão “impelidas” a abandoná-los caso apareça qualquer insatisfação. Todas essas modificações de ordem afetiva, além de transformarem as relações sociais, trazem um acarretamento jurídico muito grande, o direito de família cada vez mais se torna objeto amplo de investigações no meio acadêmico, e é nesse sentido que 14 passaremos a analisar a questão da família dentro do judiciário e as formas de acesso à Justiça concomitantes a essa. 15 4 AS MULHERES E O MERCADO DE TRABALHO As mulheres sempre desempenharam um papel fundamental na vida das famílias: o cuidar. E quando ingressaram no mercado de trabalho, os cargos ocupados também estavam vinculados “ao cuidar”: enfermeira, professora, doméstica. Hoje, com os avanços nos direitos e conquistas das mulheres, temos outra realidade para a situação das mesmas no mercado de trabalho: competitividade, salários incompatíveis com suas funções e qualificações, quando comparados aos salários dos homens, desenvolvimento de múltiplos papéis, dentre outros. A sociedade é histórica e dialética, muda de acordo com os meios de produção e a forma de organização, como também de seus valores (morais e intelectuais) e as suas normas sociais (leis e costumes). Assim, a sociedade se organiza e começa a definir múltiplos papéis aos seus indivíduos, e é a partir daí que surge o conceito de gênero na divisão social do trabalho, determinado o papel para os homens e o papel para as mulheres nesta organização social. Esse e outros conceitos são passados de geração em geração, se arraigando fortemente como senso comum e se perpetuando no decorrer das décadas e séculos. O modelo de família patriarcal existe antes mesmo da Idade Média e até hoje perdura. No entanto, tem experimentado um declínio significativo ao longo do tempo. Nele, é a ação do homem (forte) sobre a mulher (fraca) que vigora, cabendo a ela cuidar da casa, dos filhos e do marido em tempo integral, ou seja, desenvolver o papel de esposa que cuida do lar e dos familiares. No modelo patriarcal, à mulher cabe o desempenho de atividades afetivas como o cuidado e educação dos filhos e de atividades domésticas. Ao homem, cabe a execução de atividades instrumentais e intelectuais, sendo que vinculando ao emprego legalizado/remunerado. Com o aprofundamento do capitalismo, a sociedade sofre mudanças e junto com elas temos a alteração do modelo de família, que não mais estavam adequadas às novas formas de reorganização do processo produtivo e, consequentemente dos valores e costumes sociais. De acordo com Oliveira (2007, p.123) “trata-se de uma verdadeira revolução, que tem se processado nos costumes, na sexualidade, no casamento, afetando de forma marcante o 16 padrão de família”. O antigo modelo patriarcal começa gradativamente retirando as mulheres de muitas de suas antigas atribuições e as “liberando” para mercado de trabalho. A inserção das mulheres no mercado de trabalho, de forma efetiva, se deu com o avanço do capitalismo industrial, sendo que, é a partir daí que são constituídas, mais definitivamente, a divisão de valores entre o mundo da produção e o mundo doméstico. Dessa forma, ao se incluírem no mercado de trabalho, apesar de ser, ainda, de modo desigual ao homem, pois, continua existindo preconceito e discriminação, as mulheres têm mais uma forma de direito adquirida. Para Freitas (2007, p.20) “embora se verifique uma maior valorização de certas carreiras femininas, as mulheres ainda ocupam maior parte dos postos mais instáveis e de remuneração mais baixa, evidenciando a permanência das igualdades das relações sociais entre os sexos”. Não há dúvida de que nas últimas décadas a mulher está cada vez mais inserida no mercado de trabalho, buscando por novas formas de participação na sociedade, conquistando o seu espaço, se profissionalizando, estudando mais para disputar o concorrido mercado de trabalho. E isso ocorre tanto em países desenvolvidos como em países em desenvolvimento. Ao longo dos anos, a entrada da mulher no mundo do trabalho vem sendo acompanhada por grande discriminação, não só com relaçãoà qualidade das ocupações, mas principalmente pela desigualdade salarial entre os sexos. Conclui-se, portanto, que, apesar de suas lutas e conquistas, as mulheres ainda não alcançaram a tão sonhada igualdade. 4.1 OS MÚLTIPLOS PAPÉIS DA MULHER TRABALHADORA Enquanto a sociedade no início do século XX organizava-se para manter a mulher no espaço privado, longe do âmbito público que é o espaço permeado de saber e de autonomia, essa mulher sonhava com o despertar da vida de apenas reprodutora, para uma vida com múltiplas possibilidades e praticidade. Entretanto, esse despertar foi por meio de um processo muito lento, pois surgiu a partir da consciência das mulheres pelas lutas de igualdade de gênero e de oportunidades, bem como da própria mudança cultural. Ao inserir-se no mercado de trabalho, a mulher adquire múltiplos papéis, visto que seu papel de 17 esposa, mãe e dona de casa, inerentes à função social antes ocupada, ainda é mantida, mas agora, sua dedicação não é exclusiva ao lar. A mulher contemporânea, ao mesmo tempo em que é dona de casa, é também estudante e profissional realizando ainda, tarefas no meio social. Apesar da correria cotidiana, a mulher consegue administrar seu tempo para se dedicar aos filhos e a seu papel de esposa. Além de sua realização profissional, o trabalho está ligado também à própria subsistência e de sua família, pois, além de suas tarefas domésticas, no lar, suas atribuições também passam a ser de ordem financeira, visto que sua renda agora é incorporada a renda familiar. Ao contrário do homem, a mulher, ao se colocar no mundo do trabalho, relega a segundo plano a sua identidade profissional ao priorizar a família. Dessa forma, as mulheres, ao somar trabalho com atividades do lar, somam também, às consequências de seus múltiplos papéis, problemas relacionados até mesmo à sua própria saúde. Conforme Carloto (1998, p. 9), “as mulheres que somam serviço de casa com o trabalho assalariado não conseguem se recuperar da fadiga e do desgaste, e ficam mais sujeitas a dores, doenças e vários tipos de sofrimento físico e mental”. Desta forma, temos que o desdobramento dos novos papéis da mulher teve como consequência uma sobrecarga de funções, uma vez que ela foi levada a assumir longas jornadas de trabalho por acumular tarefas dentro e fora de casa. 18 5 CONCLUSÃO A relação mútua entre a vida pessoal e o trabalho mudou de maneira explicita a estrutura da organização familiar. Porém, apesar de todas as mudanças da família na contemporaneidade, ela continua sendo o espaço onde acontece os conflitos, as resoluções dos mesmos, as negociações, direitos, deveres, limites e outros, assim a família ainda é um lugar importante para se socializar e aprender com pessoas. Neste sentido, Durkheim considera que as condutas humanas são determinadas pela sociedade aos indivíduos, Marx, no entanto, nos mostra que a sociedade está dividida em duas esferas: a infraestrutura e a superestrutura e que é o “modo de produção da vida material que condiciona o desenvolvimento da vida social, política e intelectual em geral”. Portanto, se considerarmos a posição de Marx, quanto ao eixo de compreensão da sociedade, vemos que enquanto para Durkheim a sociedade se sobrepõe ao indivíduo e lhe impõe suas regras e condutas morais, para este outro, a esfera econômica é básica para a formação da consciência dos indivíduos, já que esta se apresenta sobre a forma da ideologia dominante no modo de produção capitalista, ou seja, a ideologia burguesa. Não estamos, no entanto, sugerindo que o elemento econômico seja determinante da realidade social, mesmo porque Marx e Engels, já haviam esclarecido que “a situação econômica é a base, mas os vários elementos da superestrutura também exercem influência sobre o curso dos acontecimentos”. No mundo moderno, busca-se com agudeza a igualdade de direitos e oportunidade para homens e mulheres, para alcançar essa igualdade muitos aspectos internos e externos à família precisaram ser repensados e redefinidos, porém alguns desses aspectos não ficaram estáticos, ou até mesmo foram universalizados. Observa-se que mesmo após as grandes conquistas da mulher e dos avanços tecnológicos, o papel da mulher ainda atravessa obstáculos gerados pelo tradicionalismo, onde a mulher é vista como cuidadora da família e a responsável pelo zelo da casa. O papel da mulher na contemporaneidade, diferente do tradicional, soma sua inserção no mercado de trabalho à sua função na família, gerando a dupla jornada da mulher, dentro e fora de casa. 19 Na contemporaneidade observa-se que as pessoas no geral, caminha para a conquista de uma sociedade igualitária e a questão de gênero, assim como as questões raciais e religiosas são tônicas que devem ser discutidas para que a sociedade possa conhecer e reconhecer a necessidade de mudança de pensamentos e ideologias. 20 REFERÊNCIAS “FAMÍLIA E TRABALHO NA REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA: ausência de políticas de emprego e deterioração das condições de vida”, Lilia Montali. http://www.scielo.br/pdf/rbcsoc/v15n42/1736.pdf Mulher, mercado de trabalho e as configurações familiares do século XX http://site.ufvjm.edu.br/revistamultidisciplinar/files/2011/09/Mulher-mercado-de- trabalho-e-as-configura%C3%A7%C3%B5es-familiares-do-s%C3%A9culo- XX_fatima.pdf http://www.aninter.com.br/ANAIS%20I%20CONITER/GT17%20Estudos%20de %20fam+%A1lia%20e%20gera+%BA+%C1es/%D4%C7%A3AS%20RELA+%E 7+%F2ES%20FAMILIARES%20NA%20CONTEMPORANEIDADE%20CONFLI TOS%20E%20SOLU+%E7+%F2ES%D4%C7%D8%20- %20Trabalho%20completo.pdf DURKHEIM, Émile.Da divisão do trabalho social. 2ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 2004. MARX, Karl. O Capital: crítica da economia política. 22ª ed., Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2004. (2 volumes)
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