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Professor: Carlos Alberto A. Monerat Rio de Janeiro, 2013/2 2 INTRODUÇÃO À HISTOLOGIA Um tecido pode ser considerado um agrupamento de células que têm grande interação e interdependência, atuando de modo integrado na execução de diferentes funções para o organismo no qual se encontram. A histologia é, portanto, a ciência que se encarrega de estudar esse conjunto de células (histo=tecido; logos=estudo). A multicelularidade, passo importante para o surgimento dos tecidos, é um evento recente em se tratando de tempo evolutivo, tendo surgido nos eucariontes há menos de 1 bilhão de anos aproximadamente. O seu aparecimento pode estar relacionado com o desenvolvimento de elaborados sinais químicos, através de estruturas localizadas principalmente na membrana plasmática celular, que eram responsáveis pelo reconhecimento de outras células, propiciando que elas fossem capazes de se comunicar e se unir, estabelecendo um comportamento social e um convívio coordenado. Os tecidos animais diferenciam-se ao longo do desenvolvimento embrionário, onde uma única célula precursora (célula-ovo ou zigoto) possui a propriedade de ser totipotente, ou seja, tem potencialidade para formar todos os outros tipos de célula do organismo. Desse modo ocorre a diferenciação e a especialização das funções das células que formarão os tecidos adultos. Apesar da sua complexidade, o organismo humano é constituído por apenas 4 tipos básicos de tecidos: tecido epitelial, tecido conjuntivo, tecido muscular e tecido nervoso, os quais são designados (B) (A) (A) Esquema de diferenciação celular e da organização dos tecidos em órgãos e sistemas. (B) Esquema dos quatro tipos principais de tecidos, com exemplos de alguns deles e a sua localização no corpo humano. 3 de acordo com os tipos e as funções das células de que são formados e também recebem a sua designação conforme a substância produzida por essas células (substância intercelular ou matriz extracelular), a qual se localizará entre essas mesmas células. Imagens de diferentes tipos de tecidos e da matriz extracelular de cada um deles representadas por asteriscos: A) cartilagem hialina; B) tecido ósseo; C) tecido conjuntivo denso; D) tecido conjuntivo mole (cordão umbilical); E) paredes celulares do sistema vascular do caule de uma planta, células do sistema de revestimento; F) tecido epitelial (onde não há praticamente nenhuma substância intercelular); G) tecido nervoso (onde não há praticamente nenhuma matriz extracelular). Durante o processo de gastrulação, onde são estabelecidas as três camadas germinativas do embrião - ectoderma, mesoderma e endoderma, configurando o disco germinativo ou embrião trilaminar, pode-se ter a noção do como será a diferenciação das células para formação dos diferentes tipos de tecidos do corpo: - Ectoderma: dá origem a órgãos e estruturas que mantêm contato com o mundo externo, como a epiderme e seus acúmulos e espessamentos queratinosos como pêlos e unhas; as mucosas de revestimento do nariz, boca e ânus; o sistema nervoso central e periférico; as glândulas sudoríparas, sebáceas, mamárias e salivares; e o esmalte dos dentes. - Mesoderma: formação do restante do sistema dérmico, como o endotélio (tecido de revestimento interno dos vasos sanguíneos), o epitélio de revestimento do sistema urogenital e o epitélio das membranas que revestem órgãos como a pleura, o pericárdio e o peritônio; os tecidos conjuntivos em geral e o tecido muscular. - Endoderma: fígado; pâncreas; formação do trato gastrointestinal (exceto as cavidades oral e anal), incluindo o epitélio de revestimento interno do tubo digestório; glândulas tireóide, paratireóides e timo; 4 epitélio de revestimento interno do trato respiratório (exceto as cavidades nasais), bexiga urinária e uretra. TECIDO EPITELIAL Características gerais: Também conhecido como epitélio, é caracterizado devido à presença de células estreitamente unidas, dispostas lado a lado (justapostas), e consequentemente possuindo pouca substância intercelular. Tais células aderem-se umas às outras firmemente por meio de junções intercelulares, permitindo que elas se estabeleçam como folhetos que revestem a superfície externa e as cavidades do corpo, ou ainda, que se organizem em unidades secretoras. A substância intercelular, representada basicamente por glicoproteínas e fibras colágenas, também auxilia na adesão entre as células que formam esse tecido. O epitélio possui terminações nervosas, porém, com raras exceções, não possui vasos sanguíneos, sendo considerado um tecido avascularizado. Por conta disso, os processos envolvendo as trocas metabólicas são realizados através dos capilares localizados no tecido conjuntivo sobre o qual o tecido epitelial se encontra disposto, por processos de difusão. Entre o tecido epitelial e o tecido conjuntivo subjacente existe uma estrutura, visível apenas ao microscópio eletrônico, chamada de lâmina basal, formada por uma delicada rede de delgadas fibrilas colágenas (fabricadas pelo tecido conjuntivo), associadas à glicoproteínas, como a laminina (fabricadas pelo tecido epitelial), onde se constituem em uma barreira delimitadora, que também controla a troca de macromoléculas entre as células epiteliais e o tecido conjuntivo. A membrana basal é uma camada mais densa, situada abaixo do epitélio, visível ao microscópio de luz, formada pela fusão de fibras reticulares do tecido conjuntivo com a lâmina basal, tornando-se mais espessa que esta e exercendo a função de suporte e barreira. Corte de pele que mostra a lâmina basal (LB) e hemidesmossomos (setas), configurando um exemplo típico de uma membrana basal, formada pela associação de uma lâmina basal com uma lâmina reticular contendo fibras reticulares. 5 Desta maneira, as principais funções dos epitélios são o revestimento de superfícies, proteção, absorção de moléculas, percepção de estímulos e secreção de substâncias. Especializações: As células que formam o tecido epitelial possuem dois polos distintos: um voltado para uma superfície livre, chamado de região ou polo apical, e o outro voltado para o tecido conjuntivo subjacente, denominado de região ou polo basal. Essas regiões são anatômica e funcionalmente diferentes, o que é importante para que essas células possam exercer as suas funções. Esquema de corte de epitélio que reveste a cavidade intestinal mostrando dois tipos celulares em relação à diferença de polarização existente em cada uma. As células que formam o epitélio que reveste a cavidade intestinal, por exemplo, realizam dois tipos básicos de função de acordo com os seus polos: um com a função de absorver nutrientes e outro com função secretora, produtora de muco, que protege e lubrifica todo o epitélio intestinal. As células com a função de absorção são constituídas por inúmeros microvilos, estruturas que aumentam a superfície celular e, consequentemente, a área de absorção, localizados na sua região apical. A porção basal, no entanto, possui adaptações para exportar as moléculas absorvidas para os tecidos subjacentes. As células com função secretora, também chamadas de células caliciformes, recebem dos tecidos subjacentes, pela sua porção basal, algumas substâncias que serão usadas na síntese de proteínas, enquanto que na porção apical, há muitas vesículas que brotam do complexo golgiense, contendo a substância que será eliminada da célula. Outros exemplos de células epiteliais com diferenciações na sua porção apical estão presentes na traqueia, nos brônquios e nas tubas uterinas, realizando funções de proteção, através do deslocamentode partículas. Os tecidos epiteliais são altamente resistentes à tração e suas células dificilmente se separam umas das outras. Tais células se apresentam envoltas por uma camada glicoproteica (glicocálix), com função adesiva, além de possuírem, em suas membranas laterais, estruturas especializadas que 6 participam desse processo de adesão, as chamadas junções intercelulares, que servem não só como locais de adesão, mas também oferecem vedação, além de permitirem a comunicação entre células vizinhas, estando presentes em uma sequência que vai do ápice para a base da célula, a saber: zônula de oclusão – região onde há uma fusão entre as membranas plasmáticas de células adjacentes, estabelecendo uma barreira à entrada de macromoléculas no espaço entre essas células. zônula de adesão – região onde as células vizinhas estão firmemente unidas por uma substância intercelular adesiva, porém, suas membranas plasmáticas não chegam a se tocar. Na face citoplasmática dessas membranas existe o acúmulo de um material denso, onde estão inseridos numerosos filamentos de actina, conferindo maior resistência a essa região. junções comunicantes ou junções gap – grupos de proteínas específicas presentes nas membranas plasmáticas de células adjacentes que se tocam no espaço intercelular e se dispõem formando canais que atravessam as bicamadas lipídicas, estabelecendo canais de comunicação entre as células. desmossomos – correspondem a discos de adesão entre as células, formados por duas partes que se unem, sendo uma delas localizada em uma célula e a outra, na célula vizinha. Cada disco é constituído por um material proteico denso, chamado placa de ancoragem, para onde filamentos intermediários de queratina se estendem, reforçando o processo de adesão. hemidesmossomos – apresentam a estrutura semelhante à metade de um desmossomo, prendendo a célula epitelial à sua lâmina basal. (A) Esquema com três células epiteliais mostrando as principais estruturas que participam da sua coesão; (B) Elétron- micrografia de uma seção de células do revestimento epitelial de intestino mostrando uma microvilosidade – MV, a zônula de oclusão - ZO, zônula de adesão - ZA e um desmossomo - D. (B) (A) 7 Classificação: O tecido epitelial é dividido em dois grandes grupos principais, de acordo com a sua estrutura e função: tecido epitelial de revestimento, que reveste todas as superfícies internas e externas do corpo e o tecido epitelial glandular ou de secreção, que também participa da formação glandular. Tecido epitelial de revestimento: podem ser classificados quanto ao número de camadas celulares e conforme as características morfológicas das células presentes na camada superficial. Quanto ao número de camadas celulares: Simples: possui uma só camada de células; Estratificado: possui mais de uma camada de células; Pseudoestratificado: embora possua apenas uma única camada de células, os núcleos estão em diferentes alturas, dando a impressão de diferentes camadas, porém, todas as células se encontram apoiadas na lâmina basal. Quanto às características morfológicas das células: Pavimentoso: formado por células achatadas; Cúbico: formado por células de aspecto cúbico; Prismático, Colunar ou Cilíndrico: formado por células alongadas; Transição: formado por células que modificam o seu formato de acordo com o grau de distensão do órgão. Esquemas de epitélios simples 8 Número de camadas de células Forma das células Exemplos de localização Função principal Pavimentoso Revestimento dos vasos sanguíneos e l infáticos (endotélio); alvéolos pulmonares; revestimento das cavidades pericárdica, pleural, peritoneal (mesotélio) Facilita o movimento das visceras (mesotélio); transporte ativo por pinocitose (mesotélio e endotélio); secreção de moléculas biologicamente ativas (mesotélio) Cúbico Revestimento externo do ovário, dutos glândulares, folículos tireoideanos, túbulos renais Revestimento, secreção Prismático ou colunar Revestimento do intestino, estômago, vesícula biliar Proteção, lubrificação, absorção, secreção Pseudo-estratificado (camada de células de diferentes volumes, nem todas as células alcançam a superfície, mas todas se apoiam na lâmina basal) Revestimento da traquéia, brônquios, cavidade nasal Proteção, secreção, transporte mediado por cíl ios das partículas aderidas ao muco nas passagens aéreas Pavimentoso queratinizado (seco) Epiderme Proteção, previne a perda de água Pavimentoso não queratinizado (úmido) Boca, esôfago, canal vaginal e anal Proteção, secreção, previne a perda de água Cúbico Glândulas sudoríparas, folículos ovarianos em crescimento Proteção, secreção Transição Bexiga, ureteres, cálices renais Proteção, distensibilidade Prismático ou colunar Conjuntiva, ureteres Proteção Simples (uma camada) Estratificado (duas ou mais camadas) Tecido epitelial glandular: é constituído por células especializadas na produção de secreções, que podem ser utilizadas internamente ou eliminadas do organismo. A maioria das glândulas é multicelular, porém, existem também aquelas unicelulares, como as glândulas caliciformes. As glândulas multicelulares originam-se dos epitélios de revestimento, através da proliferação de suas Esquemas de epitélios estratificados e pseudo-estratificado 9 células para o interior do tecido conjuntivo subjacente, com posterior diferenciação. São classificadas em 3 tipos: Glândulas exócrinas: apresentam a porção secretora associada a dutos que lançam suas secreções para fora ou para o interior das cavidades do corpo (glândulas sudoríparas, lacrimais, mamárias, sebáceas e salivares), respectivamente. Glândulas endócrinas: não apresentam canais ou dutos de comunicação com o epitélio de origem. O produto da secreção é denominado de hormônio e é lançado diretamente nos vasos sanguíneos ou linfáticos (glândula hipófise, tireóide, paratireóide e suprarrenal). Glândulas mistas: apresentam porções endócrinas e exócrinas ao mesmo tempo. É o caso do pâncreas, cuja porção exócrina secreta enzimas digestivas que são lançadas no duodeno, enquanto que a porção endócrina é responsável pela secreção dos hormônios insulina e glucagon, atuando, respectivamente, na redução e no aumento dos níveis de glicose no sangue. Formação de glândulas a partir de epitélios de revestimento 10 BIBLIOGRAFIA ALBERTS, B.; et al. Biologia Molecular da Célula. 4ª edição. Ed. Artmed; Porto Alegre. 2004. BOYLE, M. & SENIOR, K. Human Biology. 3ª edição. Collins Advanced Science. Hammersmith, Londres. 2008. CAMPBELL, N.; et al. Biologia. 8ª edição. Ed. Artmed; Porto Alegre. 2010. GARTNER, L. Tratado de Histologia. 2ª edição. Guanabara Koogan. Rio de Janeiro. 2003. JUNQUEIRA, L. C.; CARNEIRO, J. Hisologia Básica. 11ª edição. Guanabara Koogan. Rio de Janeiro. 2008. KATCHBURIAN, E.; ARIANA, V. Histologia e Embriologia Oral. 3ª edição. Guanabara Koogan. Rio de Janeiro. 2012. SADAVA, D.; et al. Vida: a ciêcia da biologia. Volume 1: célula e hereditariedade. 8ª edição. Ed. Artmed; Porto Alegre. 2009.
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