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Direito Constitucional

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CONSTITUCIONALISMO
1 – Introdução
No constitucionalismo encontram-se as principais etapas da evolução do Direito Constitucional. Ele se opõe ao absolutismo.
A história do constitucionalismo é a da busca pela limitação do poder. Nessa busca, três ideias principais sempre se encontram presentes: garantia de direitos, separação dos poderes e princípio do governo limitado.
1.1 – Garantia de direitos
O constitucionalismo tem por objetivo proteger direitos fundamentais contra o Estado, evitando o arbítrio estatal.
1.2 – Separação dos poderes
Segundo Montesquieu, que desenvolveu a ideia de Aristóteles, todo aquele que detém o poder e não encontra limites tende a dele abusar. Ou seja, abusar do poder seria uma tendência natural do ser humano.[1: Segundo o autor, “É uma experiência eterna de que todos os homens com poder são tentados a abusar”.]
Na realidade brasileira, isso se verificou, por exemplo, com relação ao abuso dos Presidentes da República na edição de medidas provisórias, o qual chegou a tal ponto que foi necessária nova regulamentação acerca da matéria.
1.3 – Princípio do governo limitado
Mais uma vez, o que busca o constitucionalismo é limitar o poder conferido aos governantes.
2 - Etapas do constitucionalismo[2: A classificação exposta é bastante detalhada, não sendo adotada pela unanimidade dos autores de direito constitucional.]
2.1 - Constitucionalismo antigo
2.1.1 - período
O constitucionalismo antigo vai da antiguidade clássica até fins do século XVIII.
2.1.2 - experiências históricas importantes
No constitucionalismo antigo, há quatro experiências importantes: i) Estado Hebreu (como se tratava de um estado teocrático, o governo era limitado por dogmas religiosos); ii) Grécia; iii) República Romana; e iv) Inglaterra (apenas no ano 2000 que a Inglaterra incorporou um tratado internacional de direitos humanos, que passou a ser considerado sua constituição escrita).
2.1.3 - características
São características do constitucionalismo antigo: i) inexistência de uma constituição escrita; ii) forte influência da religião; e iii) supremacia do monarca ou do Parlamento.
No constitucionalismo antigo não havia controle de constitucionalidade etc. Sequer se falava na existência de um Poder Judiciário. As constituições eram consuetudinárias ou baseadas nos precedentes judiciais (é o caso da Inglaterra).
2.2 - Constitucionalismo clássico ou liberal
2.2.1 - período
O constitucionalismo clássico ou liberal começa no fim do século XVIII e vai até o fim da Primeira Guerra Mundial (1918).
2.2.2 – características básicas
O principal diferencial do constitucionalismo clássico, em relação à fase anterior, é o aparecimento das primeiras constituições escritas. A partir delas, surgem as noções de rigidez constitucional (o que define a rigidez das constituições é o processo diferenciado de modificação e não a presença de cláusulas pétreas) e supremacia da constituição.
2.2.3 - experiências históricas importantes
No constitucionalismo clássico, duas experiências constitucionais merecem destaque, com características peculiares: a norte-americana e a francesa.
2.2.3.1 – constitucionalismo norte-americano
Cada vez mais o constitucionalismo europeu atual (neoconstitucionalismo) se aproxima do modelo americano de 200 anos atrás, cujas características são:
i) criação da primeira constituição escrita, elaborada em 1787
A Constituição norte-americana manteve-se por 200 anos, pois, sendo concisa, é mais facilmente preservável no tempo. Originariamente, tinha sete artigos. Além disso, ela possui dispositivos bastante amplos. Na verdade, ela foi e vem sendo alterada, mas pelo Poder Judiciário (mudança constitucional pela via judicial).
ii) surgimento do primeiro controle de constitucionalidade tendo como parâmetro uma constituição escrita
Na Inglaterra, já havia experiências de “judicial review”. Todavia, o controle de constitucionalidade, como conhecido hoje, surgiu através do famoso caso Marbury vs. Madison (1803).
Na eleição presidencial dos EUA de 1800, Thomas Jefferson derrotou John Adams. Após a derrota, John Adams resolveu nomear vários juízes para cargos relevantes, para que pudesse manter certo controle sobre o Estado, dentre os quais William Marbury, nomeado Juiz de Paz. O secretário de justiça de John Adams, contudo, não entregou o diploma de nomeação a Marbury. Já com Jefferson presidente, seu novo secretário de justiça James Madison, também se negou a intitular Marbury, o qual apresentou um writ of mandamus perante a Suprema Corte Norte-Americana exigindo a entrega do diploma.
O processo foi relatado pelo Presidente da Suprema Corte, Juiz John Marshall, em 1803, que concluiu que a lei federal que dava competência à Suprema Corte para emitir mandamus contrariava a Constituição Federal, motivo pelo qual não cabia a ela decidir o pedido.
A decisão tem muitas falhas, por exemplo: i) O Juiz John Marshall tinha atuado como secretário de John Adams e fora o responsável pela não titulação de Marbury; ii) Marshall podia adotar várias soluções mais plausíveis, mas fez um raciocínio complexo, com o objetivo de contrariar o Poder Executivo e confirmar o poder dos Tribunais de deixarem de aplicar leis federais inconstitucionais.
O caso Marbury vs. Madison foi decidido em 1803 pela Suprema Corte dos Estados Unidos, sendo considerado a principal referência para o controle de constitucionalidade difuso exercido pelo Poder Judiciário. Nos EUA, até hoje se questiona a legitimidade da Suprema Corte para a realização do controle de constitucionalidade.[3: Como será estudado adiante, a grande maioria da doutrina diz que o controle de constitucionalidade difuso teria surgido da decisão proferida por John Marshall. Na verdade, segundo Novelino, foi a primeira vez que a Suprema Corte norte-americana declarou uma lei inconstitucional, mas não a primeira em que ela exerceu o controle de constitucionalidade, o que já havia ocorrido em dois casos: “Hayburn’s case” (1792) e “Hylton vs US” (1796).]
iii) fortalecimento do Poder Judiciário.
Na obra “Os Federalistas”, Hamilton ensina que o Poder Judiciário é o mais fraco dos poderes, por não possuir a espada nem o cofre. Os norte-americanos tinham bastante medo dos abusos perpetrados pelo Parlamento inglês, razão pela qual optaram pelo fortalecimento do Judiciário.
iv) importante contribuição para as noções de separação dos poderes, forma federativa, sistema republicano e presidencialista e regime democrático
v) existência de declarações de direitos
A Declaração de Direitos da Virgínia é anterior à própria constituição (1776).
Interessante notar que a busca pela felicidade já constava da Constituição desde aquela época. O tema é atual, pois há PEC tramitando no Congresso, da autoria de Cristovão Buarque, pretendendo inseri-la na CR/88.
2.2.3.2 – constitucionalismo francês
O marco inicial do constitucionalismo francês é a Revolução Francesa, de 1789. A primeira constituição francesa escrita é de 1791.
Duas ideias que constam da Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, são fundamentais para a compreensão do constitucionalismo francês: garantia de direitos e separação dos poderes:
Art. 16º - Qualquer sociedade em que não esteja assegurada a garantia de direitos, nem estabelecida a separação dos poderes não tem Constituição.
São características fundamentais do constitucionalismo francês:
i) consagração do princípio da separação dos poderes
Montesquieu foi estudar no direito britânico a separação dos poderes. Os franceses, que não entendiam esse sistema, originário de um país de common law, foram buscar inspiração nos EUA, onde a separação dos poderes foi bem recebida. Na verdade, os sistemas francês e norte-americano se interpenetraram reciprocamente em seu surgimento.
ii) distinção entre poder constituinte originário e derivado
O francês Abade Emmanuel Joseph Sieyès foi o téorico do poder constituinte (“Qu’est-ce que le tiers état?” – O que é o terceiro Estado? A Constituinte Burguesa). Nesta obra, Sieyès, combase na doutrina do contrato social (John Locke, Jean-Jacques Rousseau), vislumbrava a existência de um poder imanente à nação, superior aos poderes ordinariamente constituídos e por eles imodificáveis: o poder constituinte. Além de legitimar a ascensão do Terceiro Estado (o povo) ao poder político, a obra traçou as linhas mestras da Teoria do Poder Constituinte, ainda hoje relevante para o estudo do Direito Constitucional.
iii) supremacia do Parlamento
No modelo francês de constitucionalismo clássico, o Parlamento era considerado o poder supremo. Somente nos dias de hoje é que isso começa a mudar (a primeira vez que um tribunal francês exerceu o controle repressivo de constitucionalidade foi em março de 2010).
iv) surgimento da escola da exegese, a partir do Código de Napoleão de 1804
Para a escola da exegese, a interpretação era uma atividade mecânica, e ao Judiciário cabia somente dizer o que já estava na lei. O juiz deveria somente expressar o que a lei continha, e não interpretar. Os adeptos dessa teoria entediam que o Código de Napoleão já era algo perfeito e acabado e não tinha de ser interpretado, muito menos complementado.
2.2.4 - constitucionalismo clássico e as gerações (ou dimensões) dos direitos fundamentais
Correlato ao estudo do constitucionalismo clássico é o das gerações (ou dimensões) dos direitos fundamentais, que será desenvolvido no tópico relativo à teoria geral dos direitos fundamentais.
Por ora, cumpre salientar que com as constituições do constitucionalismo clássico surge a 1ª geração (ou dimensão) dos direitos fundamentais, dos direitos relacionados à liberdade.
Com efeito, as constituições liberais (americana e francesa) preocupavam-se precipuamente com o valor liberdade. Por isso o nome “Revoluções Liberais”. Os direitos fundamentais de primeira geração são chamados até hoje de “Direitos Civis e Políticos”. Têm um caráter negativo, pois impõem principalmente uma abstenção do Estado. São direitos basicamente individuais, oponíveis ao Estado pelo indivíduo, fruto da luta burguesa contra o arbítrio estatal. Nessa época, não se falava em invocar os direitos fundamentais contra um particular. Tinham eficácia somente vertical. Hoje se fala na eficácia horizontal dos direitos humanos, que é justamente a invocação de direitos fundamentais também contra particulares.
2.2.5 - sistematização do conceito de Estado de Direito
No constitucionalismo clássico, surge a primeira sistematização coerente do conceito de Estado de Direito. Estado de Direito e Estado Liberal são palavras usadas com o mesmo sentido.
2.2.5.1 – concretizações do Estado de Direito
As três principais concretizações do Estado de Direito são: i) rule of Law (Inglaterra); ii) rechtsstaat (Prússia); e iii) état legal (França).
2.2.5.2 – características do Estado de Direito
São características que identificam o Estado de Direito o liberalismo político e econômico.
Liberalismo Político (Estado limitado) é uma doutrina a respeito dos limites aos poderes públicos, segundo a qual: i) a limitação do Estado pelo direito se estende ao soberano; ii) há limitação da administração pública pela lei (princípio da legalidade da administração pública); e iii) os indivíduos têm direitos fundamentais oponíveis ao Estado.
Liberalismo Econômico (Estado mínimo), por sua vez, preconiza um mínimo de intervenção do Estado em relações econômicas e sociais. A função do Estado Liberal é a de defesa da ordem e da segurança públicas. A ideia é a de um estado abstencionista, que deixa as questões econômicas a serem resolvidas pela livre concorrência.
2.3 - Constitucionalismo moderno ou social
2.3.1 - período
O constitucionalismo moderno ou social vai do fim da Primeira Guerra Mundial (1918) até o fim da Segunda Guerra Mundial (1945).
O Estado Liberal funciona quando há equilíbrio de condições entre as pessoas. A crise econômica do pós-guerra aprofunda as desigualdades econômicas existentes, ocasionando, como consequência, a crise do Estado Liberal, que teve de deixar de ser abstencionista.
2.3.2 - experiências históricas importantes
Os dois principais modelos de Constituição do constitucionalismo moderno foram a Constituição Mexicana (1917) e a Constituição de Weimar (1919).
Lembrar que a Constituição Mexicana (1917) foi a primeira a incluir os direitos trabalhistas entre os direitos fundamentais.
2.3.3 - constitucionalismo moderno e as gerações (ou dimensões) dos direitos fundamentais
Com as constituições do México e de Weimar surge a 2a geração (ou dimensão) dos direitos fundamentais (direitos ligados à igualdade), em razão das profundas desigualdades sociais que havia no período, agravadas pela Primeira Guerra. 
A igualdade de que se trata na segunda geração dos direitos fundamentais é a material, na medida em que a formal já havia sido reconhecida no liberalismo.
Os direitos de 2a dimensão (sociais, econômicos e culturais) servem para a redução das desigualdades no plano fático. Têm um caráter essencialmente positivo. Exigem prestações por parte do Estado, tanto jurídicas quanto materiais (construção de escolas, fornecimento de medicamentos etc.) Daí a diferença entre o Estado Liberal (abstencionista) e o Social (intervencionista). Direitos sociais, econômicos e culturais são basicamente coletivos.
Nessa época, surgem as chamadas “garantias institucionais”. São garantias de determinadas instituições fundamentais para a sociedade, como a família, o funcionalismo público, a imprensa livre etc. Percebeu-se que tais instituições seriam merecedoras da mesma proteção antes conferida somente ao indivíduo.[4: O tema foi questão de prova do CESPE.]
Na prática, os direitos individuais têm uma efetividade muito maior que os sociais, não somente por uma questão política, mas pelo próprio caráter excessivamente oneroso destes. O fator econômico (a reserva do possível) influencia na efetividade dos direitos que exigem prestações do Estado.
2.3.4 - do Estado de Direito ao Estado Social
No período do constitucionalismo moderno, verifica-se em alguns Estados a transformação do Estado de Direito (ou Liberal) em Estado Social, cujas principais características são as seguintes:
i) intervenção no âmbito social, econômico e laboral
O Estado Social abandona a postura abstencionista e passa a intervir nas relações econômicas, sociais e trabalhistas.
ii) papel decisivo na produção e distribuição de bens
iii) garantia de um mínimo de bem estar social “Welfare State” (“O Estado do Bem Estar Social”)
Exemplo de garantia do mínimo existencial no ordenamento jurídico brasileiro é o benefício chamado “salário social”, previsto na Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), através do qual pessoa idosa ou incapaz com renda familiar per capita de até um quarto do salário mínimo recebe um salário mínimo do Estado, sem a exigência de haver contribuído para a Previdência.
iv) sofisticação da interpretação do direito
Em 1850, surgem os elementos interpretativos desenvolvidos por Savigny. A interpretação deixa de ser a exegética e fica mais sofisticada, com quatro elementos: gramatical (ou literal), lógico, sistemático e histórico. A eles foi posteriormente acrescido um quinto, que não chegou a ser desenvolvido por Savigny, o teleológico (dos fins sociais a que a lei se destina), adotado pela LINDB, em seu art. 5º:
Art. 5o Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.
Os elementos interpretativos de Savigny são até hoje os mais importantes. Muitos dos métodos de interpretação moderna são baseados neles.
2.4 - Constitucionalismo contemporâneo
O constitucionalismo contemporâneo é chamado pela Escola do Rio de Janeiro de “neoconstitucionalismo”, expressão criticada pelos doutrinadores da Universidade de São Paulo.
2.4.1 - período
O constitucionalismo contemporâneo surge com o fim da Segunda Guerra Mundial (1945), a partir das experiências e atrocidades terríveis praticadas pelo Nazismo.
O valor constitucional supremo e fundamental passa a ser a dignidade da pessoa humana. Essaé a grande mudança de paradigma: a preocupação com o ser humano e sua dignidade, independente de qualquer condição pessoal.
2.4.2 - características
São características do constitucionalismo contemporâneo:
2.4.2.1 – reconhecimento definitivo da normatividade da Constituição
O marco teórico do reconhecimento da normatividade constitucional é a obra de Konrad Hesse: “A força normativa da Constituição” (1959).
Os críticos do constitucionalismo contemporâneo dizem que a normatividade da constituição sempre existiu, exemplificando com a força normativa da constituição americana.
Todavia, as constituições europeias, que sempre foram vistas como instrumentos de caráter político (sempre se entendeu que os direitos fundamentais não vinculavam o legislador), começam a ser encaradas como instrumentos de vinculação normativa. 
Tem-se, ainda, a normatividade dos princípios. Os princípios não eram considerados normas jurídicas. O reconhecimento pleno da normatividade dos princípios apareceu há algumas décadas apenas. Todos os dispositivos da constituição são considerados vinculantes para todos os poderes públicos. Hoje, toda constituição é considerada uma norma vinculante, não existindo dispositivos que não vinculem, pois todos são considerados normas. 
2.4.2.2 – centralidade da Constituição
Centralidade da Constituição é a noção de “constitucionalização do direito”, que tem basicamente três significados:
i) consagração na Constituição de normas originariamente pertencentes a outros ramos do direito
Ex.: o art. 5o da CR contém normas de Direito Penal, Processual Penal, Civil. O art. 37 contém normas de Direito Administrativo etc.
ii) interpretação conforme a constituição
Além de os demais ramos do direito buscarem seu fundamento na Constituição, os valores consagrados no texto constitucional devem servir de fonte para a interpretação da legislação infraconstitucional. Ex.: extensão de direitos de união estável a casais homoafetivos, em virtude da dignidade da pessoa humana, igualdade, isonomia etc.
iii) eficácia horizontal dos direitos fundamentais
Na Europa, não se admitia a utilização de direitos fundamentais para a resolução de casos concretos. Países como a Alemanha ainda não admitem a eficácia horizontal dos direitos fundamentais, exigindo a existência de lei regendo a relação concreta (eficácia horizontal indireta). O Brasil admite a eficácia horizontal direta (ex.: ampla defesa no processo de expulsão de associado de clube). O tema será tratado adiante, no tópico relacionado à teoria geral dos direitos fundamentais.
2.4.2.4 – maior abertura da interpretação e aplicação da Constituição
Relacionada à hermenêutica constitucional, a amplitude da interpretação e da aplicação da Constituição decorre do reconhecimento da normatividade dos princípios.
A doutrina atual (pós-positivista) entende que a norma jurídica é gênero, que tem como espécies os princípios e as regras.[5: Em filosofia e nos modelos de pesquisa científica, pós-positivismo (também chamado de pós-empiricismo) é uma instância meta teorética que critica e aperfeiçoa o positivismo. Os juristas de alguns países, notadamente da Espanha e do Brasil, apelidam de pós-positivismo uma opção teórica que considera que o direito depende da moral, tanto no momento de reconhecimento de sua validade como no momento de sua aplicação. Nessa visão, os princípios constitucionais, tais como a dignidade humana, o bem-estar de todos ou a igualdade, influenciariam a aplicação das leis e demais normas concretas. Essa visão do direito é inspirada em obras de filósofos do direito como Robert Alexy e Ronald Dworkin (apesar de eles não utilizarem o termo pós-positivismo). Alguns preferem denominar essa visão do direito "moralismo" ou “neoconstitucionalismo”.]
O método de aplicação dos princípios, em geral, é a ponderação (ou sopesamento). O das regras, a subsunção (premissa maior, premissa menor e conclusão).
O sopesamento dá ao intérprete uma margem de atuação bastante ampla. Ou seja, ampliam-se as possibilidades decisórias. O meio de controle dessa atividade, que não pode ser subjetiva, é a argumentação. A subjetividade nunca acabará no direito. É ilusão imaginar uma interpretação neutra, mecânica.[6: Acerca do tema, recomendam-se os vídeos de Marcelo Novelino em que ele trata da “leitura moral da Constituição”.]
2.4.2.5 – fortalecimento do Poder Judiciário
Nos EUA, o fortalecimento do Poder Judiciário já aconteceu há muito tempo. Em países como a Alemanha e o Brasil percebe-se um protagonismo judicial muito maior que há dez anos. O Judiciário está muito mais presente na vida das pessoas.
Esse fenômeno dá origem a duas expressões muito em voga:
i) judicialização da política
Questões que antes eram consideradas meramente políticas, hoje são definidas em âmbito judicial. Minorias que perdem no Congresso tentam resolver a questão no STF (ex.: CPI´s, verticalização, fidelidade partidária, questão da “ficha limpa”etc.)
ii) judicialização das relações sociais
Todas as questões importantes na sociedade são discutidas e definidas no STF (ex.: aborto do anencéfalo, demarcação das terras indígenas, união homoafetiva etc.)
Uma das principais críticas feitas ao neoconstitucionalismo é o excessivo fortalecimento do Judiciário em detrimento do legislador, o que seria antidemocrático (substituição do legislador pelos juízes). O ideal é haja um equilíbrio entre os poderes e não o fortalecimento excessivo de um ou outro poder. 
2.4.2.6 – rematerialização das constituições
As Constituições do segundo pós-guerra (constitucionalismo contemporâneo) são, em geral, prolixas, tratando de vários temas e os especificando de maneira mais pormenorizada. São ecléticas (possuem valores do liberalismo e do estado social) e totalizantes (tratam de vários temas da sociedade).
Significa a consagração de um extenso rol de direitos fundamentais, diretrizes e opções políticas. Esta característica é que faz com que o neoconstitucionalismo seja um misto da experiência americana e da experiência francesa, pois da francesa retira o extenso conteúdo (envolve o tratamento de várias matérias, ou seja, prolixidade) e o reconhecimento da normatividade da constituição, e da constituição norte americana retira a garantia jurisdicional, ou seja, o Judiciário com o papel de garantir a efetividade da constituição. No constitucionalismo francês, a garantia jurisdicional da constituição não era assegurada, ou seja, não havia efetiva normatividade da constituição.
2.4.3 - constitucionalismo contemporâneo e as gerações (ou dimensões) dos direitos fundamentais
No constitucionalismo contemporâneo, surgiram a terceira, a quarta e a quinta dimensões de direitos fundamentais.[7: A classificação adotada por Marcelo Novelino é a de Paulo Bonavides. Relativamente às duas primeiras gerações, há consenso entre os autores. A partir da terceira, entretanto, há diferentes posições na doutrina.]
2.4.3.1 – terceira dimensão dos direitos fundamentais
A terceira dimensão dos direitos fundamentais é a dos direitos ligados à fraternidade e à solidariedade.
Paulo Bonavides apresenta rol exemplificativo de direitos de terceira dimensão: direito ao desenvolvimento (ou progresso), autodeterminação dos povos, direito ao meio ambiente, direito de propriedade sobre o patrimônio comum da humanidade etc. São direitos transindividuais, alguns difusos, outros coletivos.
O direito ao meio-ambiente é um bom exemplo do acerto da teoria de Bobbio, segundo o qual os direitos fundamentais são históricos, ou seja, conquistados pela sociedade a partir de determinadas demandas. A proteção ambiental somente se tornou necessária depois da Revolução Industrial. Antes, não se falava no tema. Até poucos anos, não havia sentido em falar no direito à identificação genética. Com o avanço da tecnologia, o direito vem sendo reconhecido como direito fundamental, decorrente da dignidade da pessoa humana.
2.4.3.2 – quarta dimensão dos direitos fundamentais
A quarta dimensão dos direitos fundamentais é a dos direitos ligados àdemocracia, à informação e ao pluralismo (“DIP”).[8: Há quem considere que os direitos tecnológicos, como o biodireito, seriam de quarta geração.]
Ela não possui nenhum valor que identifique os direitos que consagra. Eles protegem principalmente as minorias, ainda que nem todos tenham esse viés. Dalai Lama disse que o maior problema da nossa civilização não é a ausência de solidariedade das pessoas, mas da falta de tolerância para com as pessoas que não nos parecem iguais. Os direitos de 4a dimensão cuidam dos direitos de tolerância.
2.4.3.2.1 – democracia
A democracia, sob seu aspecto formal, tem como premissa a vontade da maioria, o poder do povo. No direito constitucional contemporâneo, contudo, a democracia não é vista segundo esse enfoque meramente formal (o qual, apesar de não ser o único, talvez ainda seja o principal).
Hoje, ela é vista como algo mais amplo: a chamada democracia material (ou substancial). Para Norberto Bobbio, a democracia é a observância das regras do jogo. Segundo essa concepção, para a manifestação livre da vontade, é indispensável a presença de certos requisitos, ou pré-condições, como a observância das liberdades de pensamento e reunião.
Além disso, a democracia em seu aspecto material abrange a observância de direitos fundamentais básicos de todos, inclusive os das minorias. Segundo a definição de Ronald Dworkin, a Democracia Constitucional consiste no tratamento de todos com igual respeito e consideração.
Existe uma tensão forte entre democracia e constitucionalismo. Se de um lado há a busca pela prevalência da vontade da maioria, de outro há a proteção de direitos fundamentais. Na medida em que determinados direitos fundamentais são consagrados, eles são retirados da vontade e do âmbito de disponibilidade da maioria (cláusulas pétreas). A maioria não pode, por exemplo, instaurar a pena de morte ou o fim da liberdade religiosa. Assim, ao consagrar o direito de todos com igual direito e consideração, o conceito de Dworkin harmoniza as noções historicamente conflitantes de democracia e constitucionalismo.
2.4.3.2.2 – pluralismo
O pluralismo está previsto no art. 1o, V, da CR. É um dos fundamentos da República Federativa do Brasil:
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados, Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: (...)
V – o pluralismo político
Tal pluralismo não é apenas político-partidário, mas muito mais amplo, abrangendo também a diversidade cultural, artística, religiosa e de concepções de vida.
Boaventura de Souza Santos (sociólogo), tratando do assunto, faz um contraponto entre o direito à diferença e o princípio da isonomia. Segundo o autor, temos o direito de ser iguais quando a diferença nos inferioriza; temos o direito de ser diferentes quando a igualdade nos descaracteriza.[9: A esse respeito, ver as seguintes obras: Álvaro Ricardo, “Direito à diferença”, e Daniel Sarmento, “Livres e iguais”, Lúmen Iuris.]
2.4.3.3 – quinta dimensão dos direitos fundamentais
A quinta dimensão dos direitos fundamentais é a do direito à paz. Até a edição de 2008/2007, Bonavides classificava a paz como direito fundamental de 3a dimensão. A partir de então, ele mudou o entendimento e passou a classificá-la como de 5a dimensão, notadamente com o objetivo de dar à paz maior visibilidade, em decorrência da importância desse direito.
2.4.4 – surgimento do Estado Democrático de Direito
O modelo de Estado surgido no constitucionalismo contemporâneo é do chamado “Estado Democrático de Direito”. Marcelo Novelino prefere chamá-lo de “Estado Constitucional Democrático”, para afastar a ideia do império da lei, típica e historicamente associada ao Estado de Direito, ideia surgida na Europa, após as Revoluções Liberais.[10: O Estado norte-americano nunca se transformou em Estado Social.]
Quando se fala em Estado Constitucional Democrático, destaca-se a mudança de paradigma para a supremacia da Constituição. No entanto, a expressão “Estado Democrático de Direito” é mais aceita na doutrina, tendo sido consagrada pela própria CR.
São características do Estado Democrático de Direito:
i) consagração, pelo ordenamento jurídico, de instrumentos de participação direta do povo na vida política do Estado
Nas constituições do segundo pós-guerra, surgem instrumentos de democracia direta, como o plebiscito (consulta prévia), o referendo (consulta posterior à elaboração da lei), a iniciativa popular de lei (ex.: a lei da ficha limpa), a ação popular etc. Há uma ampliação gradativa da participação democrática.
ii) preocupação com a efetividade e a dimensão material dos direitos fundamentais
A preocupação com a efetividade e a dimensão material dos direitos fundamentais é outro aspecto que distingue o Estado Democrático de Direito e o constitucionalismo contemporâneo. O problema não é mais a consagração formal dos direitos, mas fazer com que eles sejam cumpridos na prática, ou seja, a realização da finalidade para a qual foram criados, principalmente os sociais, econômicos e culturais.
A igualdade não é vista mais como igualdade formal, mas como princípio voltado à redução das desigualdades fáticas existentes. Os direitos ganharam uma dimensão mais ampla, para serem usufruídos por todas as pessoas.
iii) a limitação do Poder Legislativo deixa de ser meramente formal e passa a abranger também o conteúdo das leis e as omissões do legislador
Uma das críticas que se faz ao neoconstitucionalismo é que as características dele sempre existiram, principalmente nos EUA. Todavia, na Europa percebe-se essa evolução. Kelsen falava do controle concentrado das leis, mas não no que se refere ao conteúdo delas. Tal controle, para o autor, estaria adstrito à forma da produção do direito (quórum etc.). Ele entendia que a Constituição que consagrasse direitos de forma ampla daria muito poder aos juízes.
Na Europa, as Declarações de Direito historicamente não vinculavam o legislador, que era visto como amigo das Constituições. A teoria de Kelsen também não fala em controle das omissões do legislativo. A inconstitucionalidade por omissão surgiu somente em 1974, na Iugoslávia, e em 1976, em Portugal.
iv) surgimento de uma Jurisdição Constitucional para assegurar a supremacia da Constituição e a proteção efetiva dos direitos fundamentais
Jurisdição Constitucional é a proteção da Constituição pelo Judiciário, através de vários mecanismos criados pela própria Carta Magna. Talvez não exista nenhuma no mundo que tenha tantos mecanismos de proteção da constituição e de direitos fundamentais como a brasileira.
2.5 - Constitucionalismo do futuro
Há alguns anos, foram realizados debates para a discussão do futuro do Direito Público. Na oportunidade, os autores buscaram adivinhar quais seriam os valores fundamentais do constitucionalismo do futuro.
Restaram propostos os seguintes:[11: Ver, a esse respeito, o artigo do argentino Jose Roberto Dromi.]
i) verdade: as Constituições do futuro não trarão promessas inexequíveis, pois isso as desvaloriza (ex.: na anterior Constituição brasileira constava a previsão de uma colônia de férias para trabalhadores).
ii) solidariedade: haverá uma nova ideia de igualdade, baseada na solidariedade entre os povos (a base do princípio da igualdade).
iii) integração: trata-se da integração também entre os povos, ou seja, do fim dos limites nacionais, de tratamentos diferentes entre estrangeiros e nacionais. Observa-se essa tendência no Mercosul e na União Europeia.
iv) continuidade: a Constituição não deve sofrer mudanças que descaracterizem a identidade constitucional (a CR tem 67 emendas, que não a têm descaracterizado, na medida em que a base mantém-se a mesma).
v) consenso: as constituições do futuro serão fruto de um consenso democrático.
vi) participação: trata-se da exigência de uma participação mais ativa e responsável do povo nas decisões políticas.
vii) universalidade: como todos os direitos fundamentais têm um núcleo comum (dignidade da pessoahumana) e todos os seres humanos, independentemente de qualquer condição, têm dignidade, os direitos fundamentais devem ser universalizados. Serão afastadas as alegações de diferenças culturais para fundamentar, por exemplo, o apedrejamento de uma mulher.
CLASSIFICAÇAO ONTOLÓGICA OU ESSENCIALISTA[12: Este tema não está inserido no tema constitucionalismo.]
Esta classificação ontológica é de autoria do jurista Karl Loewenstein, que utilizou o critério da concordância das normas constitucionais com a realidade do processo de poder, a partir da premissa de que a constituição é aquilo que os detentores e destinatários do poder fazem dela na prática. 
Toda classificação de constituição deve ser feita com base em um critério, mas o importante é que a classificação tenha utilização prática.
Nesta classificação ontológica (ontologia é o estudo do ser), leva-se em consideração a essência da constituição, ou seja, a relação entre as normas constitucionais e a realidade de poder. 
1 – Constituição Semântica
Constituição Semântica é aquela utilizada pelos detentores do poder com o objetivo de se perpetuar nele. Só é constituição no nome, pois na essência não é uma constituição. O objetivo das constituições é limitar o poder e garantir os direitos, e não é o que se observa neste tipo de constituição. A constituição utilizada pelos detentores do poder para nele se perpetuarem não é realmente uma constituição. Seu objetivo essencial foi desvirtuado. 
Este tipo de constituição tem validade e efetividade, mas não tem legitimidade. Ou seja, esta constituição vale como norma jurídica, tem efetividade, pois corresponde à realidade, mas não é legítima, vez que a finalidade das constituições não é perpetuar ninguém no poder, ao contrário, limitar o poder e garantir direitos. Exemplo: constituições napoleônicas e constituição brasileira de 1967 e de 1969.
2 – Constituição Nominal
Apesar de válida sob o ponto de vista jurídico, a constituição nominal não consegue conformar o processo político às suas normas, carecendo de força normativa adequada. Esta constituição não tem efetividade, pois sucumbe perante a realidade, não possuindo mecanismos para alterá-la. Exemplo: constituição alemã de Weimar de 1819. Geralmente são constituições de democracias incipientes.
3 – Constituição Normativa
Normativas são aquelas constituições cujas normas efetivamente dominam o processo político, ou seja, realmente têm força normativa capaz de alterar a realidade, conformar o processo de poder e não se submeter a ele. Exemplo: constituição norte-americana de 1787 e a Lei Fundamental de Bonn (constituição alemã do segundo pós-guerra de 1949). 
A Constituição brasileira de 1988 é classificada como normativa (Pedro Lenza) ou nominal (Bernardo Fernandes), segundo a classificação de Karl Loewenstein. Há divergência na doutrina. Novelino entende que a CR/88 não consegue se encaixar perfeitamente em nenhuma das duas classificações, aproximando-se cada vez mais da constituição normativa (quando surgiu era muito mais nominal, mas tem evoluído com o passar do tempo).
PODER CONSTITUINTE
1 - Conceito
Poder constituinte é o poder responsável por criar uma nova constituição ou modificar a existente.
2 – Espécies
O poder constituinte costuma ser classificado em espécies, ainda que, a rigor, somente a primeira delas seja realmente poder constituinte.
2.1 – Poder constituinte originário
2.1.1 – conceito
O poder constituinte originário é o responsável pela criação de uma nova constituição, que pode ser a primeira de um Estado, no caso de um Estado que acaba de surgir, ou uma nova constituição, num Estado existente.
Esse poder dá início a todo um novo ordenamento jurídico. Os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário são considerados poderes constituídos, pois tiram sua força da Constituição. O poder constituinte originário está acima da constituição e, como consequência, de todo o direito positivo, de todo o ordenamento jurídico.
2.1.2 – natureza
Numa visão juspositivista, como está acima do direito positivo, o poder constituinte seria um poder político (ou de fato). Isto é, ele não retira sua força de uma norma jurídica. É apenas um poder político, retirando sua força da sociedade.
Já o jusnaturalismo, concepção que defende que o direito natural está acima do direito positivo (ou seja, o direito positivo está limitado pelos princípios do direito natural), entende que o poder constituinte originário seria um poder de direito. Ora, se o poder constituinte originário tem de observar as normas jurídicas do direito natural, ele não é um poder de fato, mas jurídico.
Sem dúvida, o entendimento que prevalece e é cobrado é o positivista (poder constituinte como poder de fato, político).
2.1.3 – características
O poder constituinte originário tem características peculiares, que o diferenciam dos poderes constituídos.
2.1.3.1 – concepção positivista
De acordo com uma concepção positivista, seriam quatro as características essenciais do poder constituinte originário: inicial, autônomo e incondicionado.
2.1.3.1.1 – inicial
O poder constituinte originário é inicial porque não existe nenhum outro poder antes ou acima dele.
2.1.3.1.2 – autônomo
O poder constituinte originário é autônomo porque cabe apenas a ele escolher livremente a ideia de direito que prevalecerá e será consagrada na constituição (social, liberal), o tipo de estado, os direitos fundamentais consagrados etc.
2.1.3.1.3 – incondicionado
O poder constituinte originário é incondicionado porque não está sujeito a nenhuma regra jurídica anterior relativa à forma de produção e ao conteúdo do direito.
A constituição rompe com todo o ordenamento jurídico de um Estado. Faz-se uma nova constituição, em geral, através de um golpe de estado ou uma revolução (ruptura brusca). Com a CR/88, todavia, houve fenômeno diverso: a chamada “transição constitucional” (Jorge Miranda). Não houve uma mudança drástica, mas uma transição com relação às constituições de 1967/69, tendo inclusive sido observadas determinadas regras nelas previstas.
Alguns autores sustentam até hoje que, por conta disso, a atual constituição não teria surgido de um poder constituinte originário. Marcelo Novelino entende em sentido diverso, mesmo com o fenômeno da transição democrática, pois os constituintes não estavam limitados a nenhuma norma da constituição anterior.
2.1.3.1.4 – soberano, independente e ilimitado juridicamente
É possível dizer, ainda, que o poder constituinte originário é soberano, independente e ilimitado do ponto de vista jurídico.
2.1.3.2 – concepção de Emmanuel Sieyès
Um dos principais formuladores do poder constituinte originário foi Abade Emmanuel Sieyès, um teórico com viés jusnaturalista, doutrina predominante à época, como se pode verificar das constituições francesa e americana.
Para Sieyès, o poder constituinte originário teria as seguintes características:
2.1.3.2.1 – permanente 
O poder constituinte originário é permanente porque ele não se esgota com seu exercício. Ele não deixa de existir, ainda que a constituição tenha sido criada. Para o autor, uma vez elaborada a Carta Magna, ele fica em estado latente, até que seu titular resolva convocá-lo para fazer nova constituição.
2.1.3.2.2 – inalienável
O poder constituinte originário é inalienável, pois a sua titularidade não pode ser transferida.
Para Sieyés, a titularidade do poder constituinte originário pertence à nação, independentemente de quem o exerça. A teoria evoluiu e, hoje, fala-se que o titular seria o povo, um conceito mais amplo e abrangente que o de nação.
De qualquer forma, cumpre diferenciar a titularidade do exercício. Exercício está relacionado a quem elabora a constituição. Caso uma junta militar tome o poder e elabore uma constituição, ela não se torna titular do poder constituinte originário, que continua sendo o povo. Ela só exerceu esse poder.
A importância de se distinguir o titular do poder daquele que o exerce é permitir a análise da legitimidade. A junta militar exerce o poder constituintede forma ilegítima. Já uma assembleia nacional constituinte (conjunto de representantes do povo eleitos para aquela finalidade) exerce o poder de forma legítima.
2.1.3.2.3 – incondicionado pelo direito positivo
Como ressaltado, Sieyés era jusnaturalista. O poder constituinte originário, para ele, teria de observar certos princípios de direito natural.
A teoria do direito natural sofreu grande evolução na doutrina. Hoje, não mais se fala em princípios superiores e imutáveis. A teoria sofreu reestruturação no pós Segunda Guerra, notadamente após os abusos causados pelo nazismo. Autores como Otto Bachof e Gustav Radbruch trataram da matéria na Alemanha. Segundo a fórmula de Radbruch, o direito extremamente injusto não é direito. Ela foi utilizada nos julgamentos dos nazistas no pós-guerra.
2.1.4 – limitações materiais 
A globalização e a necessidade de fortalecimento dos direitos humanos têm flexibilizado o conceito de soberania e, por consequência, trazido limitações ao poder constituinte originário. Jorge Mirante preconiza três espécies de limitações ao poder constituinte:
2.1.4.1 – limitações materiais transcendentes[13: A teoria da vedação ao retrocesso social caiu em prova do MPF com o nome de non cliquet, um nome importado do alpinismo, que veda movimentos que retrocedam.]
Limitações materiais transcendentes são as dirigidas ao poder constituinte material, advindas de imperativos do direito natural ou de valores éticos ou de uma consciência jurídica coletiva.
Poder constituinte material é o responsável pela escolha do conteúdo a ser consagrado dentro da constituição (“material” justamente porque a substância da constituição será escolhida por ele). O poder constituinte formal é o responsável pela formalização desse conteúdo, consagrando-o em normas constitucionais. O material relaciona-se ao povo, enquanto o formal à assembleia constituinte. São dois momentos distintos, dois lados da mesma moeda.
A limitação material dependerá da teoria adotada. Jusnaturalistas ou positivistas darão explicações diferentes acerca da origem de tais limitações.
Entre os limites transcendentes inclui-se a “cláusula de proibição de retrocesso”, segundo a qual a concretização dos direitos sociais, previstos em cláusulas abertas, não pode retroceder (vedação do retrocesso social). Em matéria de poder constituinte originário, o raciocínio é análogo: os direitos fundamentais conquistados por uma sociedade não podem sofrer um retrocesso quando da elaboração de uma nova constituição. 
Na vedação do retrocesso social há uma limitação a poderes constituídos. Na vedação do retrocesso, o poder constituinte originário resta limitado, em decorrência da proibição de retrocesso com relação a direitos fundamentais básicos, em torno dos quais há um consenso profundo na sociedade. Ex.: a CR/88 veda a possibilidade de pena de morte, salvo em caso de guerra. Para os defensores da limitação material transcendente, uma nova constituição não poderia retroceder nessa conquista social, prevendo pena de morte para o caso de guerra não declarada.
Outro exemplo é o voto direto. Se outra constituição consagrasse o voto indireto, isso poderia ser considerado um retrocesso, pois há um consenso profundo na sociedade da necessidade do voto direito. O professor acredita que esse exemplo é melhor que o da pena de morte, pois o consenso é muito mais profundo em relação ao direito de voto direto. 
De acordo com a fórmula de Radbruch, o direito extremamente injusto não pode ser considerado direito. Essa fórmula estabelece um limite à injustiça. Pode até haver injustiça, porém, se o direito atingir um nível de injustiça extremamente alto, ele não pode ser considerado direito. Na Alemanha, havia uma norma jurídica que permitia fossem confiscados todos os bens pertencentes aos judeus. No pós-guerra, ela foi afastada pelo Tribunal Constitucional Federal, pois o tribunal considerou que se tratava de um direito extremamente injusto, que ultrapassava os limites do tolerável, e por isso não poderia ser considerado direito. Muitos judeus ajuizaram ação de indenização contra o Estado Alemão e ganharam as demandas.
2.1.4.2 – limitações imanentes
As limitações imanentes são relacionadas à configuração do Estado à luz do poder constituinte material ou à própria identidade do Estado, da qual a constituição representa apenas um momento em sua marcha histórica.
Aquele conteúdo escolhido pelo povo tem de ser o consagrado pela assembleia constituinte. É uma limitação imposta ao poder constituinte formal pela escolha feita pelo poder constituinte material.
Para Jorge Miranda, a constituição é apenas uma fase na marcha histórica do estado. Ela deve respeitar determinadas características, sob pena de restar sem qualquer efetividade. Ex.: no estado norte-americano, uma constituição que acabasse com o federalismo estaria fadada à ineficácia. A soberania é também considerada uma limitação imanente.
2.1.4.3 – limitações heterônomas[14: Observação: poder constituinte supranacional é o responsável pela elaboração de uma constituição supranacional (ex.: poder constituinte responsável pela Constituição Europeia). Ele é formado pelos cidadãos que compõem todos aqueles países.]
Limitações heterônomas são as impostas por outros ordenamentos jurídicos. Ex.: hoje se fala numa Constituição Europeia. Se aprovada, haverá nos países que compõem o bloco um limite heterônomo, que restringirá o poder constituinte originário daqueles países. O mesmo ocorreria se houvesse uma Constituição do MERCOSUL. Na CR/88, teriam de ser adaptadas determinadas normas às da nova constituição.
Há um movimento cada vez mais forte no sentido de um sistema internacional forte de proteção aos direitos humanos, que limitará o poder constituinte e as constituições dos Estados.
2.2 – Poder constituinte decorrente
2.2.1 - conceito
O poder constituinte decorrente é o que permite a elaboração das constituições estaduais.
No Brasil, ele tem previsão em dois dispositivos da CR/88: art. 11 do ADCT e art. 25 da CR.
Art. 25. Os Estados organizam-se e regem-se pelas Constituições e leis que adotarem, observados os princípios desta Constituição. (...)
Art. 11. Cada Assembleia Legislativa, com poderes constituintes, elaborará a Constituição do Estado, no prazo de um ano, contado da promulgação da Constituição Federal, obedecidos os princípios desta.
Parágrafo único. Promulgada a Constituição do Estado, caberá à Câmara Municipal, no prazo de seis meses, votar a Lei Orgânica respectiva, em dois turnos de discussão e votação, respeitado o disposto na Constituição Federal e na Constituição Estadual.
Discute-se na doutrina se poderia haver nova revisão com base, por exemplo, em novo dispositivo constitucional incluído por emenda constitucional. Não há uma posição pacífica sobre o tema, mas a doutrina em sua maioria é contrária à nova revisão. O professor entende que até poderia haver nova revisão, mas deve haver um acontecimento que justifique, por sua excepcionalidade, a revisão constitucional. Exemplo: em 60 anos, caso não se queira fazer uma nova constituição, poderia haver uma revisão da constituição.
2.2.2 – princípio da simetria
Dos dois dispositivos acima, o STF extrai o chamado princípio da simetria (uma criação da jurisprudência do tribunal), segundo o qual as constituições estaduais devem observar o modelo estabelecido pela Constituição da República.
Os paradigmas e princípios estabelecidos pela CR devem ser seguidos pela constituição estadual, o que não significa que ela deva ser uma cópia da CR (deverá seguir apenas o modelo estabelecido).
Cumpre observar que as assembleias legislativas de que trata o art. 11 do ADCT (norma de eficácia exaurida) não foram convocadas para esse fim. O poder constituinte decorrente foi atribuído pelo ADCT à assembleia já existente na ocasião.
Segundo o parágrafo único do art. 11, a Lei Orgânica municipal tem de observar uma dupla simetria: a das constituições estadual e da República. Ex.: a CR não fala na possibilidade de edição de medida provisóriapelo Governador. A constituição estadual pode trazer essa previsão (ex.: Santa Catarina). Relativamente aos prefeitos, para o professor, se a constituição estadual permite a edição de MP pelo Governador, a lei orgânica municipal também poderá permitir, por questão de simetria. Caso não haja a previsão na constituição estadual, não poderá a lei orgânica dar ao Prefeito o poder de editar medida provisória. Essa questão, contudo, não é pacífica.
Para o STF, o princípio da simetria é consagrado no art. 25 da CR, na expressão “observados os princípios desta constituição”. Autores como Daniel Sarmento e Ana Paula de Barcellos entendem que o princípio não teria previsão na CR, sendo uma mera invenção do STF.
2.2.3 – limitações ao poder constituinte decorrente
Segundo José Afonso da Silva, o poder constituinte decorrente está limitado por três grupos de princípios constitucionais: sensíveis, extensíveis e estabelecidos.
2.2.3.1 – princípios constitucionais sensíveis
Princípios constitucionais sensíveis são aqueles relacionados à essência da organização constitucional da federação brasileira. São consagrados no art. 34, VII, da CR:
Art. 34. A União não intervirá nos Estados nem no Distrito Federal, exceto para: (...)
VII - assegurar a observância dos seguintes princípios constitucionais:
a) forma republicana, sistema representativo e regime democrático;
b) direitos da pessoa humana;
c) autonomia municipal;
d) prestação de contas da administração pública, direta e indireta.
e) aplicação do mínimo exigido da receita resultante de impostos estaduais, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino e nas ações e serviços públicos de saúde. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 29, de 2000)
A violação aos princípios constitucionais sensíveis permite a decretação de intervenção federal no estado-membro, a qual somente poderá ser realizada pelo chefe do Executivo (Presidente da República), desde que presente um pressuposto: a procedência de uma ADI interventiva pelo STF. Trata-se de uma ação de controle concentrado proposta pelo Procurador Geral da República (art. 36, III):
Art. 36. A decretação da intervenção dependerá: (...)
III – de provimento, pelo Supremo Tribunal Federal, de representação do Procurador-Geral da República, na hipótese do art. 34, VII, e no caso de recusa à execução de lei federal. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) [A “representação” a que se refere o art. 36 é justamente a ADI interventiva.]
O Presidente só pode decretar a intervenção em estado, no DF ou em Município localizado em território. Município localizado em estado não pode ser objeto de intervenção federal. Quem pode decretar a intervenção em município é o Governador (note que é sempre o chefe do Executivo a autoridade competente para a decretação da intervenção).
O julgamento da ADI interventiva é reservado ao STF. É, portanto, um instrumento de controle concentrado. Não é um controle concentrado abstrato, feito em tese. Neste caso, o estado concretamente viola um princípio constitucional sensível. Portanto, é um controle concentrado concreto (por ser realizado com base em um caso concreto).
O PGR atua como substituto processual, no interesse da coletividade, com a finalidade de preservar a federação. 
A natureza da decisão do STF é político-administrativa e não jurídica. Isso é relevante, pelas seguintes razões:
i) no caso de violação dos princípios sensíveis da CE pelo Município, o PGJ (autoridade simétrica ao PGR) pode ajuizar ADI interventiva no TJ;
ii) justamente por conta dessa natureza político-administrativa, o STF entende que, em se tratando de decisão do TJ, não cabe RE;
iii) julgada procedente a ADI, o Presidente, para a maioria da doutrina, está vinculado à decisão do STF. Esse entendimento é reforçado pelo art. 12, 3, da Lei 1.079/1950:
Art. 12. São crimes contra o cumprimento das decisões judiciárias: (...)
3 - deixar de atender a requisição de intervenção federal do Supremo Tribunal Federal ou do Tribunal Superior Eleitoral;
Se o Presidente não atende à requisição do STF, ele comete crime (a menos que se entenda que o dispositivo não teria sido recepcionado pela CR).
2.2.3.2 – princípios constitucionais extensíveis
Os princípios constitucionais extensíveis são normas organizatórias da União extensíveis aos estados, que têm de observá-las.
Há duas espécies de princípios constitucionais extensíveis:
i) expressos (arts. 28 e 75 da CR)
Art. 28. A eleição do Governador e do Vice-Governador de Estado, para mandato de quatro anos, realizar-se-á no primeiro domingo de outubro, em primeiro turno, e no último domingo de outubro, em segundo turno, se houver, do ano anterior ao do término do mandato de seus antecessores, e a posse ocorrerá em primeiro de janeiro do ano subsequente, observado, quanto ao mais, o disposto no art. 77. 
§ 1º Perderá o mandato o Governador que assumir outro cargo ou função na administração pública direta ou indireta, ressalvada a posse em virtude de concurso público e observado o disposto no art. 38, I, IV e V. 
§ 2º Os subsídios do Governador, do Vice-Governador e dos Secretários de Estado serão fixados por lei de iniciativa da Assembleia Legislativa, observado o que dispõem os arts. 37, XI, 39, § 4º, 150, II, 153, III, e 153, § 2º, I. 
Art. 75. As normas estabelecidas nesta seção aplicam-se, no que couber, à organização, composição e fiscalização dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, bem como dos Tribunais e Conselhos de Contas dos Municípios. [O dispositivo estende aos Tribunais de Contas Estaduais as normas do TCU.] (...)
Trata-se das chamadas “normas de observância obrigatória”. Geralmente, ao utilizar a expressão, o STF refere-se aos princípios extensíveis, ainda que os sensíveis sejam também de observância obrigatória.
ii) não expressos
São exemplos de princípios constitucionais extensíveis o art. 58, §3o, da CR (CPI), os arts. 59 e seguintes da CR (processo legislativo). Exemplos: leis de iniciativa privativa do presidente são também de iniciativa do Governador; o quórum para as Emendas Constitucionais é o mesmo etc.[15: Acerca desta hipótese, havia dispositivo que previa expressamente a extensão na CR/1969. O STF manteve o entendimento então consolidado.]
Art. 58 (...) § 3º - As comissões parlamentares de inquérito, que terão poderes de investigação próprios das autoridades judiciais, além de outros previstos nos regimentos das respectivas Casas, serão criadas pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, em conjunto ou separadamente, mediante requerimento de um terço de seus membros, para a apuração de fato determinado e por prazo certo, sendo suas conclusões, se for o caso, encaminhadas ao Ministério Público, para que promova a responsabilidade civil ou criminal dos infratores.
2.2.3.3 – princípios constitucionais estabelecidos
Segundo José Afonso da Silva, princípios constitucionais estabelecidos são aqueles que impõem limitações aos estados e estão espalhados de forma assistemática na Constituição:
i) regras mandatórias:
São aquelas que impõem ao Estado a observância de determinados princípios, constrangendo sua liberdade organizatória aos limites positivados. Ex.: 37, caput, da CR (os Estados não têm opção senão adotar os princípios ali previstos):
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) (...)
b) regras vedatórias:
São aquelas que proíbem os Estados de adotarem determinados atos ou procedimentos. Elas podem ser expressas (ex.: art. 19 da CR) ou implícitas (ex.: art. 22 da CR):
Art. 19. É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
I - estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantesrelações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público;
II - recusar fé aos documentos públicos;
III - criar distinções entre brasileiros ou preferências entre si.
Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: (...)
Relativamente ao art. 22, note que se as competências são privativas da União, implicitamente os estados estão proibidos de delas tratarem.
2.3 – Poder constituinte derivado (reformador, instituído ou constituído)
2.3.1 – conceito
O poder constituinte derivado é o responsável pela modificação da constituição.
Como visto acima, a rigor, constituinte é o poder originário, motivo pelo qual Marcelo Novelino prefere a expressão “poder derivado reformador”.
O poder constituinte derivado está previsto no art. 60 da CR (que será analisado adiante).
2.3.2 – limitações
Há quatro espécies de limitações impostas ao PCD: temporais, circunstanciais, formais (ou processuais) e materiais (ou substanciais).
2.3.2.1 – limitações temporais
As limitações temporais impedem a modificação da constituição durante um determinado período de tempo. Ex.: o art. 174 da Constituição de 1824 proibia a alteração da constituição nos primeiros 4 anos de vigência. Era um prazo para dar estabilidade à primeira constituição brasileira:
Art. 174. Se passados quatro annos, depois de jurada a Constituição do Brazil, se conhecer, que algum dos seus artigos merece roforma, se fará a proposição por escripto, a qual deve ter origem na Camara dos Deputados, e ser apoiada pela terça parte delles.
O art. 60 da CR/88 não estabeleceu nenhuma limitação temporal. O art. 3o do ADCT, no entanto, é uma limitação temporal (aplicável ao poder revisor, não ao reformador):
Art. 3º. A revisão constitucional será realizada após cinco anos, contados da promulgação da Constituição, pelo voto da maioria absoluta dos membros do Congresso Nacional, em sessão unicameral.
2.3.2.2 – limitações circunstanciais
As limitações circunstanciais impedem a alteração da constituição em situações excepcionais, de extrema gravidade, nas quais a livre manifestação do poder derivado possa estar ameaçada. Note que se trata de situações, não de períodos de tempo.
Elas estão previstas no art. 60, § 1o, da CR:
Art. 60 (...) § 1º - A Constituição não poderá ser emendada na vigência de intervenção federal, de estado de defesa ou de estado de sítio.
São elas: i) intervenção federal (art. 34); ii) estado de defesa (art. 136); e iii) estado de sítio (art. 137). A intervenção federal suspende a tramitação das emendas.[16: Os dispositivos serão analisados adiante, no tópico “Estados de Legalidade Extraordinária”.]
2.3.2.3 – limitações formais (ou processuais)
As limitações formais (ou processuais) relacionam-se ao processo de elaboração das emendas constitucionais. Trata-se de limitações porque não é possível a modificação da CR de outra maneira, devendo o poder constituinte derivado as observar, obrigatoriamente.
São limitações formais:
i) iniciativa para a proposta de emenda constitucional (art. 60, I a III, da CR):
Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:
I - de um terço, no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal;
II - do Presidente da República;
III - de mais da metade das Assembleias Legislativas das unidades da Federação, manifestando-se, cada uma delas, pela maioria relativa de seus membros. (...)
Observe que, no caso de iniciativa de leis, a amplitude de legitimados é bem maior que no das emendas constitucionais (art. 61). Isso porque a CR/88 é rígida (ou seja, prevê um procedimento especial para a sua alteração).
Art. 61. A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer membro ou Comissão da Câmara dos Deputados, do Senado Federal ou do Congresso Nacional, ao Presidente da República, ao Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores, ao Procurador-Geral da República e aos cidadãos, na forma e nos casos previstos nesta Constituição. (...)
A CR exige a proposta de, ao menos, 1/3 dos membros da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal.
Além deles, pode propor emenda o Presidente da República. Cumpre atentar para o fato de que o Presidente é o único legitimado que pode propor lei e emenda. Correlata a esse tema, há uma questão muito importante: a única participação que o Presidente tem na elaboração da emenda constitucional é a iniciativa. Ele não participa de nenhuma outra etapa (não sanciona, não veta, não promulga e não publica). Com efeito, não existe sanção de emenda. Aprovada a proposta, ela vai direto para a promulgação.
Além desses legitimados, podem propor emenda mais de 50% das Assembleias Legislativas das unidades da Federação, pela maioria relativa de seus membros. No Brasil há 26 estados e o DF. Portanto, para que a proposta de emenda possa ser apresentada dessa forma, pelo menos 14 unidades da Federação teriam de participar da iniciativa e em cada uma das respectivas Assembleias teria de ser aprovada a proposta por maioria relativa (ou seja, mais de 50% dos presentes).[17: Observação: a maioria relativa tem esse nome por ser variável, dependendo do número de presentes. A maioria absoluta corresponde a mais de 50% dos membros da Casa. Sendo o número de membros fixo, ela não variará. Na Câmara dos Deputados, a maioria absoluta corresponde a 257 Deputados.]
Essa previsão existe nas constituições brasileiras desde 1891. Até hoje, nenhuma proposta de emenda foi apresentada através desse procedimento, que é extremamente complexo.
ii) votação e promulgação da PEC (art. 60, § 2º, da CR):
Art. 60 (...) § 2º - A proposta será discutida e votada em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, considerando-se aprovada se obtiver, em ambos, três quintos dos votos dos respectivos membros.
As fases de discussão, votação e aprovação das emendas constitucionais serão iniciadas na Câmara ou no Senado, a depender do legitimado. Para que a PEC seja aprovada, são necessários 3/5 (60%) dos votos dos respectivos membros, em dois turnos de votação.
Ocorrendo a votação em primeiro turno na Câmara dos Deputados, por exemplo, há um interstício mínimo previsto no Regimento Interno. Posteriormente, é realizada nova votação, em segundo turno, com mesmo quórum. O mesmo procedimento ocorre no Senado. Feita eventual alteração pela segunda casa, retorna à primeira somente a parte alterada, não a totalidade do projeto.
Discutida, votada e aprovada, a emenda constitucional (que depois de aprovada deixa de ser PEC) é promulgada pelas mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal (“e”, não “ou”: repare que as Casas promulgam a emenda conjuntamente):
§ 3º - A emenda à Constituição será promulgada pelas Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, com o respectivo número de ordem.
iii) impossibilidade de reapresentação da PEC rejeitada na mesma sessão legislativa (art. 60, § 5º, da CR):
Art. 60 (...) § 5º - A matéria constante de proposta de emenda rejeitada ou havida por prejudicada não pode ser objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa.
Alguns autores consideram a limitação acima como de natureza temporal. Entretanto, pela própria definição acima (limitação formal é a relativa ao processo de elaboração das emendas) e segundo a maioria da doutrina, não se trata de limitação temporal, pois a CR não está impedida de ser modificada por uma questão de tempo, mas de forma.
A sessão legislativa está prevista no art. 57, caput, da CR:
Art. 57. O Congresso Nacional reunir-se-á, anualmente, na Capital Federal, de 2 de fevereiro a 17 de julho e de 1º de agosto a 22 de dezembro. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 50, de 2006) (...)
Trata-se do período de trabalho parlamentar, também chamado de “sessão legislativa ordinária (anual)”. Vai de 2 de fevereiro a 17 de julho e reinicia-se em 1º de agosto, indo até 22 de dezembro. Veja que há anualmente dois recessos.
Rejeitada uma PEC em 2013, ela somente poderá ser apresentada a partir de 2 de fevereiro de 2014.
Sessão legislativa, período anual, nãose confunde com Legislatura, que é um período de 4 anos, o período de mandato dos Deputados (art. 44, parágrafo único, da CR):
Art. 44 (...) Parágrafo único. Cada legislatura terá a duração de quatro anos.
O art. 62, § 10, da CR prevê às medidas provisórias uma regra muito parecida com a do art. 60, § 5º:
Art. 62 (...) § 10. É vedada a reedição, na mesma sessão legislativa, de medida provisória que tenha sido rejeitada ou que tenha perdido sua eficácia por decurso de prazo. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 32, de 2001)
2.3.2.4 – limitações materiais (ou substanciais): as cláusulas pétreas
2.3.2.4.1 – conceito e nomenclatura
As limitações materiais impedem a alteração de determinados conteúdos consagrados no texto constitucional.
A essas normas, que limitam substancialmente o poder reformador, dá-se o nome de “cláusulas pétreas”. Oscar Vilhena, que tem a melhor obra sobre poder reformador (“A constituição e sua reserva de justiça”) refere-se a elas como “cláusulas superconstitucionais”. Na Alemanha, são chamadas de “cláusulas intangíveis” ou “cláusulas de eternidade”. Nos EUA, de “cláusulas entrincheiradas” ou “cravadas na pedra”.
2.3.2.4.2 – finalidades
Como visto anteriormente, existe uma tensão entre o constitucionalismo e a democracia, pois a esta é associada, em geral, a vontade da maioria, e a consagração de cláusulas pétreas na Constituição obstaculiza a imposição dessa vontade. Ex.: ainda que a maioria entenda que deva haver pena de morte para crimes comuns ou que o princípio da presunção de inocência deva ser afastado, as cláusulas pétreas impedem que essa vontade prevaleça.
Para Marcelo Novelino, as cláusulas pétreas têm três finalidades principais:
i) preservar a identidade material da constituição:
Toda constituição tem traços que a caracterizam. A brasileira é republicana, democrática, consagradora de direitos fundamentais etc. Se essa identidade pudesse ser livremente modificada, ela perderia o sentido, deixando de ser ela própria.
O povo, titular do poder constituinte, pode criar outra Constituição. Entretanto, se possui uma, deve a identidade dela ser mantida.
ii) proteger institutos e valores essenciais:
Trata-se da proteção de valores que a sociedade considera muito importantes. Exemplo são os direitos e garantias individuais previstos no art. 5º da CR.
iii) assegurar a continuidade do processo democrático:
A cláusula pétrea assegura a observância das regras do jogo. Isso é importante, pois, caso não seja protegido o processo democrático, a democracia acaba asfixiada. Aqueles que têm o poder tendem a querer nele se perpetuar, sufocando as minorias. Exemplo de regra que busca evitar esse fenômeno é a inaplicabilidade da nova regra eleitoral antes de um ano da sua edição.
Thomas Jefferson utilizava, para criticar a ideia das cláusulas pétreas, a expressão “governo dos mortos sobre os vivos”. Nos EUA, a discussão acerca da legitimidade das cláusulas pétreas faz muito sentido, na medida em que eles possuem a mesma constituição há mais de 200 anos.
2.3.2.4.3 – teorias de justificação das cláusulas pétreas
i) teoria do pré-comprometimento (Jon Elster)
Segundo a teoria do pré-comprometimento, a proteção de determinados conteúdos pelas constituições visa a assegurar o próprio processo democrático, resguardando metas a longo prazo, a fim de proteger a sociedade de suas inconsistências temporais. 
A cláusula pétrea seria um mecanismo de autovinculação da sociedade, voltado à proteção de si própria contra suas paixões e fraquezas, resguardando metas a longo prazo. O ser humano tem certa miopia para enxergar interesses a longo prazo, muitas vezes mais importantes que os de médio e curto prazo. Não houvesse as cláusulas pétreas, a maioria sempre tentaria fazer prevalecer seus interesses, para se perpetuar no poder.
O autor faz uma analogia com a Odisseia, na passagem do “canto das sereias”. Quando Ulisses passa pela região da tentação das sereias, ele é amarrado no mastro. Essa é justamente a ideia: evitar que a sociedade sucumba ao “canto das sereias”.
O próprio autor, todavia, alterou posteriormente seu entendimento, por considerá-lo inocente demais. Em nova obra, intitulada “Ulisses desacorrentado” (“Ulysses Unbound”), ele passou a defender que a maioria, na verdade, acorrenta o outro com o receio de que, no futuro, ele venha a se tornar majoritário. Ou seja, a maioria está na verdade acorrentando as minorias do momento, para que elas não se tornem depois maioria e queiram mudar as regras do jogo. Assim, não seria Ulysses se acorrentando, mas acorrentando os outros.
ii) teoria da democracia dualista (Bruce Ackerman)
O autor faz distinção entre dois tipos de política, a extraordinária e a ordinária. Política extraordinária corresponde aos momentos de intensa manifestação da cidadania, que ocorrem em contextos de grande mobilização cívica. Política ordinária é aquela realizada cotidianamente, por meio das deliberações de órgãos de representação popular.
O contexto de política extraordinária ocorre, por exemplo, quando da elaboração de uma constituição. No Brasil, esse momento ocorreu por ocasião do movimento “Diretas Já”. Trata-se de um momento de grande expressão da cidadania.
Para o autor, a política extraordinária, justamente por ocorrer nesses momentos de mobilização cívica, seria superior à ordinária, razão pela qual ela pode estabelecer as cláusulas pétreas.
2.3.2.4.4 – o STF e as cláusulas pétreas
Há dois tipos de cláusulas pétreas, as expressas (art. 60, § 4o) e as implícitas, que não estão previstas expressamente, mas são por alguma razão consideradas imodificáveis.
Art. 60 (...) § 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:
I - a forma federativa de Estado;
II - o voto direto, secreto, universal e periódico;
III - a separação dos Poderes;
IV - os direitos e garantias individuais.
Uma proposta de emenda tendente a abolir cláusula pétrea é uma violação tão intensa que sequer pode ser objeto de deliberação. Daí a possibilidade de controle de constitucionalidade preventivo pelo STF, através do Mandado de Segurança.
Qual é a extensão da expressão “tendente a abolir”? A maioria dos Ministros do STF (o entendimento não é pacífico no tribunal) entende que as cláusulas pétreas devem ser interpretadas no sentido de proteger o núcleo essencial dos princípios e institutos elencados no dispositivo, e não a sua intangibilidade literal (ou seja, o dispositivo não se torna “intocável”: garante-se o seu núcleo essencial).
Ex.: a separação dos poderes é cláusula pétrea, mas isso não significa que nenhuma atribuição dos poderes possa ser modificada. Emenda constitucional que retirasse a competência do Senado para suspender a eficácia da lei (art. 52, X), não atingiria a separação dos poderes em seu núcleo essencial. Para Daniel Sarmento, sequer acabar com o Senado violaria a separação dos poderes. Assim, é possível que haja alteração de competências constitucionais. O que é vedado é que determinada emenda fortaleça sobremaneira um poder em relação ao outro, desequilibrando a independência e a harmonia que deve haver entre eles.
O STF analisou essa questão por ocasião do julgamento de constitucionalidade da criação do CNJ.
Dentre as cláusulas pétreas expressas, a única que recebe tratamento pormenorizado pela CR é o voto, que deve ser direto, secreto, universal e periódico. Ainda assim, entretanto, é possível interpretação acerca do seu núcleo imodificável. Ex: emenda que previsse eleições de 5 anos em 5 anos não violaria a periodicidade do voto, o que já ocorreria em se tratando de emenda que aumentasse o prazo para 20 anos. O voto obrigatório também não é cláusula pétrea, segundo Marcelo Novelino.
A forma federativa de Estado também é uma cláusula pétrea. Sepúlveda Pertence cunhou expressão que acabou sendo muito usada pelos outros Ministros e é importante para fins de concurso: “a forma federativa de estado, consagrada desde a primeira constituição republicana, é princípio intangível da nossa Constituição”. Por contado quanto dito anteriormente, poder-se-ia imaginar que a expressão estivesse equivocada. Todavia, trata-se muito mais de retórica do que de entendimento do STF propriamente dito. Segundo Marcelo Novelino, “a forma federativa é princípio intangível, mas nem tanto”. Não fosse assim, a própria criação de um novo estado violaria a forma federativa.
O STF entende que o princípio da imunidade tributária recíproca (art. 150, IV, “a”, da CR) é uma cláusula pétrea decorrente da forma federativa de estado. A decisão foi tomada na ADI 939, que questionou o IPMF, criado por emenda constitucional para que a ele não se aplicassem certas limitações constitucionais ao poder de tributar, umas das quais era justamente a imunidade tributária recíproca, que serve para evitar o enfraquecimento de um ente em relação ao outro, prejudicando a forma federativa do estado.
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: (...)
VI - instituir impostos sobre:
a) patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros; (...)
Essa tentativa de burlar a constituição por emenda é chamada de “atalhamento constitucional”, expressão criada por Karl Loewenstein e utilizada por Celso de Melo. Significa a busca por “atalhos” constitucionais. 
No gênero “direitos e garantias fundamentais” há as espécies: i) direitos e garantias individuais; ii) direitos sociais; iii) direitos de nacionalidade; e iv) direitos políticos. A CR fala também em “direitos coletivos”, mas Novelino não os considera uma categoria autônoma, pois eles podem estar inseridos entre os individuais e os sociais. Diz-se que os direitos de associação e de associação sindical seriam coletivos. Todavia, trata-se de direito individual de expressão coletiva.
Alguns autores sustentam que não somente os individuais, mas todos os direitos e garantias fundamentais seriam cláusulas pétreas (Ingo Sarlet, Rodrigo Brandão). Novelino não considera esse o melhor entendimento. O art. 60, § 4º, IV é expresso quanto aos “direitos individuais”. Caso tivesse se equivocado quanto à expressão e quisesse abranger os direitos políticos, a CR não teria previsto expressamente o voto como cláusula pétrea, que já estaria abrangido dentre os direitos políticos. Isso não significa que determinados direitos sociais ou o de nacionalidade não possam ser considerados cláusulas pétreas implícitas. 
O STF consagrou o entendimento de que o princípio da anterioridade eleitoral (que está entre os direitos políticos) é cláusula pétrea. Isso não significa que todos os direitos políticos sejam cláusula pétrea. A leitura que Novelino faz da decisão é que o STF entendeu que o princípio é garantia individual do eleitor e, como tal, cláusula pétrea expressa. Os direitos e garantias individuais não se restringem ao art. 5o da CR.
Novelino considera cláusula pétrea a maioridade penal, por se tratar de direito individual.
O STF considerou cláusula pétrea expressa fora do art. 5º o princípio da anterioridade tributária (art. 150, III, “b”), por ser uma garantia individual do contribuinte. Aliás, as limitações constitucionais ao poder de tributar são cláusulas pétreas, na medida em que protetivas de direitos individuais (ex.: legalidade tributária).
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: (...)
III - cobrar tributos: (...)
b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou; (...)
Autores como Paulo Bonavides e José Afonso da Silva entendem que o art. 60 seria cláusula pétrea implícita. Ele estabelece limitações ao poder constituinte derivado. Quem estabeleceu essas limitações foi o poder constituinte originário, que está acima do derivado. Não faria sentido que o poder derivado pudesse alterar as suas próprias limitações, impostas pelo poder constituinte originário. Se pudesse, não seriam elas consideradas limitações.
A dupla revisão é justamente a alteração da norma proibitiva, para que se possa posteriormente alterar a cláusula pétrea. Trata-se uma espécie de atalhamento constitucional. Amaral Neto tinha como bandeira parlamentar a pena de morte, que é cláusula pétrea. Ele propôs uma PEC buscando revogar o art. 60, § 4o, IV, da CR. Se essa PEC fosse aprovada, os direitos e garantias individuais deixariam de ser cláusula pétrea e, com isso, seria possível a previsão da pena de morte.
Outro exemplo de dupla revisão seria o de PEC diminuindo o quórum para a aprovação das emendas constitucionais, para depois apresentar determinada PEC.
A dupla revisão, para a maioria da doutrina brasileira, não é admitida. É uma espécie de fraude à Constituição, uma burla ao poder constituinte originário.
Alguns autores também consideram cláusula pétrea implícita a forma republicana de governo e o sistema presidencialista. Em prova objetiva, deve-se sustentar a posição diversa. Marcelo Novelino considera que não são cláusulas pétreas. Em 1993, houve o plebiscito para a escolha entre as formas e sistemas de governo. Na assembleia constituinte de 1988, havia uma frente parlamentarista forte, mas o parlamentarismo não conseguiu ser implementado. Todavia, algumas normas foram criadas pensando em posterior criação daquele sistema (ex.: a previsão de medidas provisórias). Ainda que não tenha sido possível implementar o parlamentarismo de plano, os parlamentaristas conseguiram a previsão da hipótese do plebiscito, que restou confirmando o status quo.
Ivo Dantas entende que, a partir do momento em que houve o plebiscito, a forma e o sistema escolhidos teriam se tornado cláusulas pétreas, por incompatíveis com a separação dos poderes. O professor entende que a implementação da monarquia não seria possível, por ferir princípios republicanos, mas o sistema parlamentarista seria plenamente possível, desde que houvesse novo plebiscito ou referendo, para não burlar a vontade do povo já manifestada (ou seja, por mera emenda não seria possível a alteração do sistema).
Além da reforma, a CR fala também em revisão. A reforma é o meio ordinário de modificação da constituição. A revisão é a via extraordinária. O art. 3º do ADCT previu hipótese de revisão constitucional, a ser realizada após 5 anos da criação da CR. O dispositivo trouxe duas limitações à revisão: uma temporal (5 anos) e uma formal (maioria absoluta e sessão unicameral). O dispositivo não menciona limitações circunstanciais e materiais, mas a doutrina entende que elas têm de ser observadas na revisão.
A revisão já ocorreu e não pode ocorrer novamente, com base nesse dispositivo. Trata-se de norma com eficácia exaurida.
O FUNDAMENTO DA CONSTITUIÇÃO
Neste tópico, serão estudadas as diferentes concepções de constituição, cada qual surgida numa época diferente. Na verdade, são formas de ver o fenômeno constitucional sob ângulos distintos. Com efeito, cada uma dessas concepções enxerga a constituição a partir de um determinado fundamento (ou seja, são olhares diferentes sobre a mesma matéria).[18: Novelino aconselha decorar o nome de cada expoente da cada corrente.]
1 – Concepção sociológica (Ferdinand Lassale)
A concepção sociológica é a defendida por Ferdinand Lassale, decorrente de uma palestra proferida por ele em 1862 na Rússia. Naquele tempo, a constituição não tinha força normativa como tem hoje. Para entender a concepção sociológica, é importante que se faça uma distinção entre constituição escrita (ou jurídica) e constituição real (ou efetiva).
Para Lassale, no Estado há o documento constitucional (constituição escrita) e, ao lado dela, há uma constituição real, formada pela soma dos fatores reais de poder que regem uma determinada nação. Tais fatores seriam compostos por aquelas pessoas que realmente detém o poder.
De acordo com o autor, se a constituição escrita não corresponder à realidade, deverá prevalecer a constituição efetiva.
Atribuem a Lassale a ideia segundo a qual, se a constituição escrita não corresponde à realidade,

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