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A História da Maconha no Brasil - Elisaldo Araújo Carlini

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Revisão de literatura – Literature review
A história da maconha no Brasil
The history of marihuana in Brazil
Recebido
23-11-06
Aprovado
23-12-06
&RUUHVSRQGrQFLD�SDUD��Elisaldo Araújo Carlini
Rua Botucatu, 862 – 1º andar do ECB – Vila Clementino –04023-062 – São Paulo-SP – Tel.: (55) (11) 2149-0155 
– Fax: (55) (11) 5084-2793 – e-mail: carlini@psicobio.epm.br
Elisaldo Araújo Carlini
Resumo
A história da maconha no Brasil tem seu início com a própria descoberta do 
país. A maconha é uma planta exótica, ou seja, não é natural do Brasil. Foi 
WUD]LGD�SDUD�Fi�SHORV�HVFUDYRV�QHJURV��GDt�D�VXD�GHQRPLQDomR�GH�IXPR�GH�
Angola. O seu uso disseminou-se rapidamente entre os negros escravos 
H�QRVVRV�tQGLRV��TXH�SDVVDUDP�D�FXOWLYi�OD��6pFXORV�PDLV�WDUGH��FRP�D�
popularização da planta entre intelectuais franceses e médicos ingleses 
do exército imperial na Índia, ela passou a ser considerada em nosso meio 
um excelente medicamento indicado para muitos males. A demonização 
da maconha no Brasil iniciou-se na década de 1920 e, na II Conferência 
Internacional do Ópio, em 1924, em Genebra, o delegado brasileiro Dr. 
3HUQDPEXFR�D¿UPRX�SDUD�DV�GHOHJDo}HV�GH����RXWURV�SDtVHV��³D�PDFRQKD�
p�PDLV�SHULJRVD�TXH�R�ySLR´��$SHVDU�GDV�WHQWDWLYDV�DQWHULRUHV��QR�VpFXOR�
;,;�H�SULQFtSLRV�GR�VpFXOR�;;��D�SHUVHJXLomR�SROLFLDO�DRV�XVXiULRV�GH�
maconha somente se fez constante e enérgica a partir da década de 1930, 
possivelmente como resultante da decisão da II Conferência Internacional 
do Ópio. O primeiro levantamento domiciliar brasileiro sobre consumo 
GH�SVLFRWUySLFRV�� UHDOL]DGR�HP�������PRVWURX�TXH������GD�SRSXODomR�
FRQVXOWDGD� Mi� KDYLD� H[SHULPHQWDGR�PDFRQKD�SHOR�PHQRV�XPD�YH]�QD�
vida (lifetime use���R�TXH�VLJQL¿FD�GL]HU�TXH�DOJXQV�PLOK}HV�GH�EUDVLOHLURV�
poderiam ser acusados e condenados à prisão por tal ofensa à presente 
lei. No presente, um projeto de lei foi aprovado no Congresso Nacional 
propondo a transformação da pena de reclusão por uso/posse de drogas 
(inclusive maconha) em medidas administrativas.
Palavras-chave: maconha, proibição, uso medicinal, delta-9-THC.
Abstract
The present study describes of history of Cannabis sativa L. (marihuana) 
since the arrival in Brazil in the Portuguese discovers, in 1500. During the 
following centuries Cannabis cultivation was stimulated by the Portuguese 
&URZQ��ZKLFK� LQFOXGHG� VHQGLQJ� VHHGV� WR�%UD]LO�� WKH�PHGLFLQDO� XVH� RI�
Cannabis was also common, mostly during the second part of 19th century, 
being the Cigarros Índios (Cannabis cigarettes) imported from France, 
DQG�DGYHUWLVHG� LQ�%UD]LOLDQ�PHGLFDO� MRXUQDOV�XS� WR� WKH�¿UVW�\HDUV�RI� WKH�
20th century. The repression against Cannabis use reached proportion 
only in the 20th century. This probably happened because the Brazilian 
representatives at the II International Conference on Opium and Coca/
&RFDLQH�ÀDWO\�GHFODUHG�WKDW�LQ�%UD]LO�Cannabis�ZDV�³PRUH�GDQJHURXV�WKDQ�
RSLXP´��7KH�FRQGHPQDWLRQ�RI��Cannabis in that Conference was seemingly 
extended up to the 1961 Single Convention of Narcotic Drugs, United 
Nations, in which Cannabis�ZDV�FRQVLGHUHG�D�³SDUWLFXODUO\�GDQJHURXV�GUXJ´�
and as such was included together with heroine in the Schedule IV of that 
&RQYHQWLRQ��3RVVLEO\��DV�D�FRQVHTXHQFH�WKH�UHSUHVVLRQ�VWDUWHG�VHULRXVO\�
LQ�WKH�EHJLQQLQJ�RI�WKH������GHFDGH��DQG�DFFRUGLQJ�WR�WKH�%UD]LOLDQ�ODZ�
6.368/1976, the recreational and medical uses of Cannabis products 
are prohibited. Such uses are criminal offenses and as such the users 
may face prison penalties. However a new law is under discussion in the 
%UD]LOLDQ�&RQJUHVV��$FFRUGLQJ�WR�LW�WKH�SRVVHVVLRQ�RI�D�FHUWDLQ�TXDQWLW\�RI�
marihuana (and other drugs) is no longer a criminal offense and will be 
subject to administrative sanctions.
Key words: marihuana, forbidding, medicinal use, delta-9-THC.
&HQWUR�%UDVLOHLUR�GH�,QIRUPDo}HV�VREUH�'URJDV�3VLFRWUySLFDV��&(%5,'���'HSDUWDPHQWR�GH�3VLFRELRORJLD�GD�8QLYHUVLGDGH�)HGHUDO�
de São Paulo (UNIFESP) (Carlini EA)
$UWLJR�LQLFLDOPHQWH�SXEOLFDGR�HP�&DUOLQL�($��5RGULJXHV�(��*DOGXUy]�-&)��&DQQDELV�VDWLYD�/��H�VXEVWkQFLDV�FDQDELQyLGHV�HP�PHGLFLQD��
São Paulo: CEBRID, 2005.
A história da maconha no Brasil
J Bras Psiquiatr, 55(4): 314-317, 2006 315
Introdução
'H�XPD�FHUWD�PDQHLUD��D�KLVWyULD�GR�%UDVLO�HVWi�LQWLPDPHQ-
te ligada à planta Cannabis sativa L., desde a chegada à nova 
terra das primeiras caravelas portuguesas em 1500. Não só as 
YHODV��PDV�WDPEpP�R�FRUGDPH�GDTXHODV�IUiJHLV�HPEDUFDo}HV��
HUDP�IHLWDV�GH�¿EUD�GH�FkQKDPR��FRPR�WDPEpP�p�FKDPDGD�D�
SODQWD��$OLiV��D�SDODYUD�PDFRQKD�HP�SRUWXJXrV�VHULD�XP�DQDJUD-
PD�GD�SDODYUD�FkQKDPR��FRQIRUPH�PRVWUD�D�Figura 1.
(P�VtQWHVH�� VDEH�VH�KRMH�TXH�D�PDFRQKD�QmR�p�QDWLYD�
GR�%UDVLO�� WHQGR� VLGR�SDUD� Fi� WUD]LGD�SHORV�HVFUDYRV�DIULFDQRV��
conforme também atestam dois outros autores brasileiros:
³(QWURX�SHOD�PmR�GR�YtFLR��/HQLWLYR�GDV�UXGH]DV�GD�VHUYL-
GmR��EiOVDPR�GD�FUXFLDQWH�VDXGDGH�GD�WHUUD�ORQJtQTXD�RQGH�¿FDUD�
D�OLEHUGDGH��R�QHJUR�WURX[H�FRQVLJR��RFXOWDV�QRV�IDUUDSRV�TXH�OKH�
HQYROYLDP�R� FRUSR� GH� pEDQR�� DV� VHPHQWHV� TXH� IUXWL¿FDULDP�H�
SURSLFLDULDP�D�FRQWLQXDomR�GR�YtFLR´��'LDV��������
³3URYDYHOPHQWH�GHYH�VH�DRV�QHJURV�HVFUDYRV�D�SHQHWUDomR�
GD�GLDPED�QR�%UDVLO��SURYD�R�DWp�FHUWR�SRQWR�D�VXD�GHQRPLQDomR�
IXPR�G¶$QJROD´��/XFHQD��������
No século XVIII passou a ser preocupação da Coroa 
SRUWXJXHVD�R�FXOWLYR�GD�PDFRQKD�QR�%UDVLO��0DV�DR�FRQWUiULR�GR�
TXH�SRGHULD�VH�HVSHUDU��D�&RURD�SURFXUDYD� LQFHQWLYDU�D�FXOWXUD�
da Cannabis:
³DRV���GH�DJRVWR�GH������R�9LFH�5HL� ������HQYLDYD�FDUWD�
ao Capitão General e Governador da Capitania de São Paulo 
������UHFRPHQGDQGR�R�SODQWLR�GH�FkQKDPR�SRU�VHU�GH�LQWHUHVVH�GD�
0HWUySROH�������UHPHWLD�D�SRUWR�GH�6DQWRV�������µGH]HVVHLV�VDFDV�FRP�
���DOTXHLUHV¶�GH�VHPHQWHV�GH�PDFRQKD���´��)RQVHFD��������
Com o passar dos anos o uso não-médico da planta se 
disseminou entre os negros escravos, atingindo também os índios 
EUDVLOHLURV��TXH�SDVVDUDP�LQFOXVLYH�D�FXOWLYi�OD�SDUD�XVR�SUySULR��3RX-
co se cuidava então desse uso, dado estar mais restrito às camadas 
socioeconômicas menos favorecidas, não chamando a atenção da 
classe dominante branca. Exceção a isso talvez fosse a alegação de 
TXH�D�UDLQKD�&DUORWD�-RDTXLQD��HVSRVD�GR�5HL�'��-RmR�9,���HQTXDQWR�
DTXL�YLYLD��WHULD�R�KiELWR�GH�WRPDU�XP�chá de maconha.
1D�VHJXQGD�PHWDGH�GR�VpFXOR�;,;�HVVH�TXDGUR�FRPHoRX�
D�VH�PRGL¿FDU��SRLV�DR�%UDVLO� FKHJDUDP�DV�QRWtFLDV�GRV�HIHLWRV�
hedonísticos da maconha, principalmente após a divulgação dos 
WUDEDOKRV�GR�3URI��-HDQ�-DFTXHV�0RUHDX��GD�)DFXOGDGH�GH�0HGLFLQD�
GD�7RXU��QD�)UDQoD��H�GH�YiULRV�HVFULWRUHV�H�SRHWDV�GR�PHVPR�SDtV��
0DV�IRL�R�XVR�PHGLFLQDO�GD�SODQWD�TXH�WHYH�PDLRU�SHQHWUDomR�HP�
QRVVR�PHLR��DFHLWR�TXH�IRL�SHOD�FODVVH�PpGLFD��$VVLP�GHVFUHYLD�
XP�IDPRVR�IRUPXOiULR�PpGLFR�QR�%UDVLO��HP������
³&RQWUD�D�EURQFKLWH�FKURQLFD�GDV�FULDQoDV�������IXPDP�VH��FL-
garrilhas Grimault) na asthma, na tísica laryngea, e em todas (...)
'HEDL[R�GH�VXD�LQÀXrQFLD�R�HVStULWR�WHP�XPD�WHQGrQFLD�jV�
LGpLDV�ULVRQKDV��8P�GRV�VHXV�HIHLWRV�PDLV�RUGLQiULRV�p�SURYRFDU�
JDUJDOKDGDV�������0DV�RV� LQGLYtGXRV�TXH� ID]HP�XVR�FRQWtQXR�GR�
KDVFKLFK�YLYHP�QXP�HVWDGR�GH�PDUDVPR�H�LPEHFLOLGDGH´��&KHU-
noviz, 1888).
$R�TXH�SDUHFH��DV�FLJDUULOKDV�*ULPDXOW�WLYHUDP�YLGD�ORQJD�
no Brasil, pois ainda em 1905 era publicada em nosso meio a 
propaganda (Figura 2�� LQGLFDQGR�DV� SDUD� ³DVWKPD�� FDWDUUKRV��
LQVRPQLD��URQFDGXUD��ÀDWRV´�
Na década de 1930, a maconha continuou a ser citada 
QRV�FRPSrQGLRV�PpGLFRV�H�FDWiORJRV�GH�SURGXWRV�IDUPDFrXWL-
cos. Por exemplo, Araújo e Lucas (1930) enumeram as proprie-
dades terapêuticas do extrato fluido da Cannabis:
³+\SQRWLFR�H�VHGDWLYR�GH�DFomR�YDULDGD��Mi�FRQKHFLGR�GH�
'LRVFyULGHV�H�GH�3OtQLR��R�VHX�HPSUHJR�UHTXHU�FDXWHOD��FXMR�UHVXO-
WDGR�VHUi�R�ERP�SURYHLWR�GD�YDOLRVD�SUHSDUDomR�FRPR�FDOPDQWH�H�
DQWL�VSDVPyGLFR��D�VXD�Pi�DGPLQLVWUDomR�Gi�jV�YH]HV�HP�UHVXO-
tados,franco delírio e allucinações. É empregado nas dyspepsias 
�������QR�FDQFUR�H�~OFHUD�JiVWULFD�������QD�LQVRPQLD��QHYUDOJLDV��QDV�
SHUWXUEDo}HV�PHQWDLV�����G\VHQWHULD�FKURQLFD��DVWKPD��HWF�´�
Segundo documento oficial do governo brasileiro (Mi-
nistério das Relações Exteriores, 1959):
³$�SODQWD�WHULD�VLGR�LQWURGX]LGD�HP�QRVVR�SDtV��D�SDUWLU�
de 1549, pelos negros escravos, como alude Pedro Corrêa, e 
DV�VHPHQWHV�GH�FkQKDPR�HUDP�WUD]LGDV�HP�ERQHFDV�GH�SDQR��
DPDUUDGDV�QDV�SRQWDV�GDV�WDQJDV´��3HGUR�5RVDGR��
(VVD�DQWLJD�UHODomR�SRGH�WDPEpP�VHU�YLVWD�FRP�R�TXH�
seria a primeira descrição em português dos efeitos da planta, 
conhecida na época pelo nome de bangue. De fato, em um livro 
HVFULWR�HP������SRU�*DUFLD�GD�2UWD���������Ki�XP�LQWHUHVVDQWH�
GLiORJR�HQWUH�GRLV�SHUVRQDJHQV��2V�WUHFKRV�FRSLDGRV�D�VHJXLU�
descrevem efeitos tanto de euforia e boa viagem como o bode
�Pi�YLDJHP��
³5XDQR�±�3RLV�DVL�KH��GL]H\PH�FRPR�VH�ID]�HVWH�EDQJXH��
H�SHUD�TXH�R�WRPmR��H�TXH�OHYD"
2UWD�±�³)D]VH�GR�Sy�GHVWDV�IROKDV�SLVDGDV��H�iV�YH]HV�
GD�VHPHQWH��������SRUTXH�HPEHEHGD�H�ID]�HVWDU�IyUD�GH�VL��H�SHUD�
R�PHVPR� OKH�PHVWXUmR�QR�PRVFDGD����H�R�SURYHLWR�TXH�GLVWR�
tirão he estar fora de si, como enlevados sem nenhum cuidado e 
SUD]LPHQWHLURV��H�DOJXQV�D�ULU�KXP�ULVR�SDUYR��H�Mi�RXYL�D�PXLWDV�
PXOKHUHV�TXH��TXDQGR�KLmR�YHU�DOJXP�KRPHP��SHUD�HVWDU�FRP�
FKRTXDUHULDV�H�JUDFLRVDV�R�WRPRYmR��(�R�TXH�������VH�FRQWD�������
KH�TXH�RV�JUDQGHV�FDSLWmHV��������DFXVWXPDYmR�HPEHEHGDU�VH�����
FRP�HVWH�EDQJXH��SHUD�VH�HVTXHFHUHP�GH�VHXV�WUDEDOKRV��H�QDP�
FXLGDUHP��H�SRGHUHP�GRUPLU��������(�R�JUDP�6ROWmR�%DGXU�GL]LD�D�
0DUWLP�$IIRQVR�GH�6RXVD��D�TXHP�HOOH�PXLWR�JUDQGH�EHP�TXHULD�
H�OKH�GHVFXEULD�VHXV�VHFUHWRV��TXH�TXDQGR�GH�QRLWH�TXHULD�\U�
D�3RUWXJDO�H�DR�%UDVLO��H�i�7XUTXLD��H�i�$UDELD��H�j�3pUVLD��QmR�
ID]LD�PDLV�TXH�FRPHU�XP�SRXFR�GH�EDQJXH�
5XDQR�±�(X�YL�KXP�SRUWXJXH]�FKRTXDUHLUR���������H�FRPHR�
uma talhada ou duas deste letuario, e de noite esteve bebedo 
JUDFLRVR�H�QDV�IDODV�HP�HVWUHPR��H�QR�WHVWDPHQWR�TXH�ID]LD��(�
SRUpP�HUD�WULVWH�QR�FKRUDU�H�QDV�PDJRDV�TXH�GL]LD��������PRVWUDYD�
WHU�WULVWH]D�H�JUDQGH�HQMRDPHQWR��H�iV�SHVVRDV�TXH�R�YLmR�RX�
RXYLmR�SURYRFDYD�R�ULVR��FRPR�R�ID]�KXP�EHEHGR�VDXGRVR������
H�WHU�YRQWDGH�GH�FRPHU�´
Figura 1. Anagrama com a palavra maconha
Carlini EA
316 J Bras Psiquiatr, 55(4): 314-317, 2006
)RL� WDPEpP�QD�GpFDGD�GH������TXH�D� UHSUHVVmR�DR�
uso da maconha ganhou força no Brasil. Possivelmente essa 
intensificação das medidas policiais surgiu, pelo menos em 
parte, devido à postura do delegado brasileiro na II Conferência 
Internacional do Ópio, realizada em 1924, em Genebra, pela 
antiga Liga das Nações. Constava da agenda dessa conferên-
cia discussão apenas sobre o ópio e a coca. E, obviamente, os 
delegados dos mais de 40 países participantes não estavam 
preparados para discutir a maconha. No entanto o nosso re-
presentante esforçou-se, junto com o delegado egípcio, para 
incluí-la também:
³���� DQG� WKH�%UD]LOLDQ� UHSUHVHQWDWLYH�� 'U�� 3HUQDPEXFR��
GHVFULEHG�LW�DV�³PRUH�GDQJHURXV�WKDQ�RSLXP´��Y�����S��������$JDLQ��
no one challenged these statements, possibly because both were 
speaking on behalf of countries where haschich use was endemic 
�LQ�%UD]LO�XQGHU�WKH�QDPH�RI�GLDPED�´��.HQGHOO��������
Essa participação do Brasil na condenação da maconha 
é confirmada em uma publicação científica brasileira (Lucena, 
1934):
³���Mi�GLVSRPRV�GH�OHJLVODomR�SHQDO�UHIHUHQWH�DRV�FRQWUD-
ventores, consumidores ou contrabandistas de tóxico. Aludimos 
à Lei no�������GH����GH�-XOKR�GH������TXH�PHQFLRQD�R�KDVFKLFK��
No Congresso do ópio, da Liga das Nações Pernambuco Filho 
e Gotuzzo conseguiram a proibição da venda de maconha (grifo 
nosso). Partindo daí deve-se começar por dar cumprimento 
aos dispositivos do referido Decreto nos casos especiais dos 
IXPDGRUHV�H�FRQWUDEDQGLVWDV�GH�PDFRQKD´�
Entretanto essa opinião emitida em 1924 pelo Dr. Per-
nambuco em Genebra é de muito estranhar, pois, de acordo 
com documento oficial do governo brasileiro (Ministério de 
Relações Exteriores, 1959), esse médico:
³2UD�� FRPR� DFHQWXDP� 3HUQDPEXFR� )LOKR� H� +HLWRU�
Peres, entre outros, essa dependência de ordem física nunca 
VH� YHULILFD� QRV� LQGLYtGXRV� TXH� VH� VHUYHP� GD�PDFRQKD�� (P�
FHQWHQDV�GH�REVHUYDo}HV�FOtQLFDV��GHVGH�������QmR�Ki�XPD�
só referência de morte em pessoa submetida à privação do 
HOHPHQWR�LQWR[LFDQWH��QR�FDVR�D�UHVLQD�FDQiELFD��1R�FDQDELVPR�
QmR�VH�UHJLVWUD�D�WUHPHQGD�H�FOiVVLFD�FULVH�GH�IDOWD��DFHVVR�GH�
privação (sevrage), tão bem descrita nos viciados pela morfina, 
SHOD�KHURtQD�H�RXWURV�HQWRUSHFHQWHV��IDWRU�HVWH�LQGLVSHQViYHO�
QD�GHILQLomR�RILFLDO�GH�206�SDUD�TXH�XPD�GURJD�VHMD�FRQVL-
GHUDGD�H�WLGD�FRPR�WR[LFRPDQyJHQD´�
O início dessa fase repressiva no Brasil, na década de 
������DWLQJLX�YiULRV�HVWDGRV��0DPHGH��������
³'H�SRXFRV�DQRV�D�HVVD�SDUWH��DWLYDP�VH�SURYLGrQFLDV�
no sentido de uma luta sem tréguas contra os fumadores de 
maconha. No Rio de Janeiro, em Pernambuco, Maranhão, 
Piauhy, Alagoas e mais recentemente Bahia, a repressão se 
YHP�ID]HQGR��FDGD�YH]�PDLV�HQHUJLD�H�SRGHUi�SHUPLWLU�FUHU�VH�
QR�H[WHUPtQLR�FRPSOHWR�GR�YtFLR�´
³1R�5LR��HP�������UHJLVWUDYDP�DV�SULPHLUDV�SULV}HV�HP�
FRQVHTrQFLD�GR�FRPpUFLR�FODQGHVWLQR�GD�PDFRQKD�
Em 1940, a Polícia Bahiana (...) detia alguns indiví-
GXRV�TXH�VH�GDYDP�DR�FRPpUFLR�DPEXODQWH�������FRPR�VHQGR�
maconha.
Mais recentemente, com permanência entre nós de 
tropas da marinha norte-americana, surgiram alguns de nossos 
remanescentes viciados e procuraram (...) colher lucros (...) 
H[SORUDQGR�HVWH�VXSRVWR�PHLR�GH�HVTXHFLPHQWR�GRV�KRUURUHV�
GD�JXHUUD�RX�R�OHQLWLYR�GD�VDXGDGH�GRV�HQWHV�TXHULGRV��$�DomR�
serena (...) altamente eficiente dos homens do Shore Patrol 
IH]�UXLU�RV�LQWHQWRV�FULPLQRVRV´�
Esta postura repressiva permaneceu durante décadas 
no Brasil, tendo para isso o apoio da Convenção Única de 
Entorpecentes, da Organização das Nações Unidas (ONU), de 
������GD�TXDO�R�%UDVLO�p�VLJQDWiULR��&RPR�VDEHPRV��HVVD�FRQ-
venção ainda considera a maconha uma droga extremamente 
prejudicial à saúde e à coletividade, comparando-a à heroína 
e colocando-a em duas listas condenatórias.
³$�SURLELomR�WRWDO�GR�SODQWLR��FXOWXUD��FROKHLWD�H�H[SORUD-
ção por particulares da maconha, em todo território nacional, 
ocorreu em 25/11/1938 pelo Decreto-Lei no 891 do Governo 
)HGHUDO´��)RQVHFD��������
'HYH�VH�QRWDU�TXH�D�PDFRQKD�QmR�p�XPD�VXEVWkQFLD�
QDUFyWLFD��H�FRORFi�OD�QHVVD�FRQYHQomR�GH�HQWRUSHFHQWHV�IRL�
um erro. A Lei no��������GH�������TXH�OHJLVOD�VREUH�R�DVVXQWR��
SUHYr�SHQD�GH�SULVmR�SDUD�D�SHVVRD�TXH�WHQKD�HP�SRGHU�TXDO-
TXHU�TXDQWLGDGH�GH�PDFRQKD��PHVPR�TXH�SDUD�XVR�SHVVRDO�
$WXDOPHQWH�HVWi�HP�IDVH�ILQDO�QR�&RQJUHVVR�1DFLRQDO�D�
GLVFXVVmR�GH�XP�SURMHWR�GH�OHL�TXH�VXEVWLWXL�D�SHQD�GH�SULVmR�
por sansões administrativas�QR�FDVR�GH�SRVVH�GH�SHTXHQDV�
TXDQWLGDGHV�SDUD�XVR�SHVVRDO��(VVH�SURMHWR� Mi� IRL� DSURYDGR�
SHOD� &kPDUD� GRV� 'HSXWDGRV� H� GHYHUi� SUR[LPDPHQWH� VHU�
votado no Senado.
Essa maldição sobre a maconha tem reflexos negativos 
HP�RXWUD�iUHD��(VWi�VREHMDPHQWH�SURYDGR�TXH�R�¨9-tetraidro-
FDQDELQRO��¨9-THC), o princípio ativo da maconha, tem efeito 
DQWLHPpWLFR�HP�FDVRV�GH�Y{PLWRV�LQGX]LGRV�SHOD�TXLPLRWHUDSLD�
DQWLFkQFHU�H�p�XP�RUH[tJHQR�~WLO�SDUD�RV�FDVRV�GH�FDTXH[LD�
DLGpWLFD�H�D�SURGX]LGD�SHOR�FkQFHU��2�¨9�7+&�HVWi�UHJLVWUDGR�
FRPR�PHGLFDPHQWR�HP�YiULRV�SDtVHV��LQFOXVLYH�QRV�(8$��0DUL-
nol®). Mas, apesar de esses fatos estarem relatados em revistas 
científicas internacionais sérias, por respeitados grupos de 
SHVTXLVDGRUHV��KRXYH�H�Ki� UHVLVWrQFLDV�� LQFOXVLYH�QR�%UDVLO��
HP� DFHLWDU� HVVD� VXEVWkQFLD� FRPR�PHGLFDPHQWR�� ,VVR� ILFRX�
SDWHQWH�HQWUH�QyV�TXDQGR��HP����GH� MXOKR�GH�������GXUDQWH�
o simpósio Tetraidrocannabinol como medicamento?, com a 
Figura 2. Propaganda dos cigarros Grimault
A história da maconha no Brasil
J Bras Psiquiatr, 55(4):314-317, 2006 317
presença do ministro da Saúde e do presidente do Conselho 
Federal de Entorpecentes (CONFEN), promovido e realizado 
no Ministério da Saúde, os médicos presentes revelaram sérias 
reservas ao derivado de maconha.
Por outro lado, a epidemiologia de uso da maconha 
QR�%UDVLO�PRVWUD�TXH�HVVH�DVVXQWR�QmR�SRGH�ILFDU�PDLV�VHP�
um enfrentamento franco e decisivo. Assim, o consumo da 
planta entre estudantes vem aumentando (Galduroz et al.,
�������DOpP�GH�VHU�HOHYDGR�R�XVR�SRU�QRVVDV�FULDQoDV�TXH�
vivem em situação de rua (Noto et al., 1998). O I Levantamento 
Domiciliar sobre Consumo de Drogas no Brasil (Carlini et al.,
������ UHYHORX� TXH� ����� GRV� ���PLOK}HV� GH� KDELWDQWHV� GDV�
����PDLRUHV�FLGDGHV�EUDVLOHLUDV�Mi�FRQVXPLUDP�D�SODQWD�SHOR�
PHQRV�XPD�YH]�QD�YLGD��R�TXH�FRUUHVSRQGH�D�������PLOK}HV�
de pessoas.
&RQWUDVWDQGR�FRP�HVVHV�GDGRV� WHPRV�TXH��DR� ORQJR�
dos últimos 15 anos, o número de pessoas internadas por 
intoxicação aguda ou por dependência de maconha (Noto et 
al., 2002) não ultrapassou 300 por ano no triênio 1997-1999. 
(P�FRQWUDVWH��DV�LQWHUQDo}HV�SRU�iOFRRO�DOFDQoDUDP�XP�WRWDO�
de 119.906 internações no mesmo triênio.
¬�YLVWD�GHVVH�TXDGUR�DWXDO�� WRUQD�VH�SHUWLQHQWH�PHQ-
cionar o editorial do Jornal Brasileiro de Psiquiatria publicado 
Ki����DQRV�������������������
³$� IDOWD� GH� GLVFULPLQDomR� HQWUH� YLFLDGRV� HP� GURJDV�
pesadas e simples fumantes de maconha tem resultados 
altamente inconvenientes do ponto de vista social. Se os 
estabelecimentos especiais viessem a ser construídos para 
LQWHUQDU� XVXiULRV� GH� PDFRQKD�� FRP� WRGD� D� SUREDELOLGDGH��
iríamos ressuscitar o famoso dilema do Simão Bacamarte de 
Machado de Assis. Talvez fosse melhor internar a população 
sadia para defendê-la dos supostos perigos dos cada vez mais 
numerosos adictos de maconha.
O perigo maior do uso da maconha é expor os jovens a 
FRQVHTrQFLDV�GH�RUGHP�SROLFLDO�VXPDPHQWH�WUDXPiWLFDV��1mR�
Ki�G~YLGD�GH�TXH�FLQFR�GLDV�GH�GHWHQomR�HP�TXDOTXHU�HVWDEH-
OHFLPHQWR�SROLFLDO�VmR�PDLV�QRFLYRV�j�VD~GH�ItVLFD�H�PHQWDO�TXH�
cinco anos de uso continuado de maconha.
Finalmente, em 1987, a Associação Brasileira de 
3VLTXLDWULD��$%3��WDPEpP�ID]�XP�HGLWRULDO�HP�TXH�FRPHQWD�R�
DVVXQWR� �$�GXSOD�SHQDOL]DomR�GR�XVXiULR�GH�GURJDV�RX�GXDV�
vezes vítima. Revista ABP/APAL, 1987):
³1LQJXpP�FRPR�RV�SVLTXLDWUDV�FRQKHFH�PHOKRU�D�PLVpULD�
KXPDQD�TXH�DFRPHWH�RV�GURJDGRV��(OHV�VmR�PDLV�YtWLPDV�GR�
VLVWHPD�GH�SURGXomR�H�WUiILFR�±�H�GH�VL�PHVPRV�±�TXH�GHOLQ-
THQWHV��1HVWH�VHQWLGR��MXOJDPRV�RSRUWXQR�WUD]HU�j�GLVFXVVmR��
sob a égide deste momento Constituinte, este polêmico tema 
TXH�WHP�GHVHQFDGHDGR�WmR�JUDYHV�FRQVHTrQFLDV�
O problema das drogas em nosso país tem sofrido um 
julgamento apaixonado, permeado por atitudes moralistas e 
um tratamento policial.
O próprio ’tratamento’ compulsório dos dependentes de 
GURJDV�PRVWUD�EDL[D�HILFiFLD��TXDQGR�QmR�DEVROXWD�LQXWLOLGDGH��H�
serve muitas vezes de artifício para beneficiar apenas os mais 
DEDVWDGRV��5HVVDOWH�VH�TXH�D�SDUWLFXODU�TXHVWmR�GR�WUDWDPHQWR�
e da recuperação dos drogados deve estar integrada à rede de 
cuidados gerais à saúde e ao bem-estar social.
3RU�RXWUR�ODGR��Ki�TXH�VH�SURSRU�XPD�PHOKRU�GHILQLomR�
GR�TXH�VHMD�WUiILFR��GH�PRGR�D�H[FOXLU�D�FLUFXODomR�QmR�OXFUDWLYD�
e incluir mandantes e financiadores, aplicando a estes penas de 
SULVmR�PDLV�VHYHUDV�H�PHGLGDV�TXH�FRPSUHHQGHULDP�WDPEpP�
o confisco de bens pessoais.
Finalmente, deve-se considerar com seriedade a neces-
sidade de se promover a descriminalização do uso da maconha, 
HVWLSXODQGR�D�TXDQWLGDGH�FRQVLGHUDGD�SRUWH��VHP�SURPRYHU�D�
liberação da droga. Esta medida ampliaria as possibilidades 
GH�UHFXSHUDomR�GR�XVXiULR��LVRODQGR�R�GR�WUDILFDQWH�H�HYLWDQGR�
sua dupla penalização: a pena social de ser um drogado e a 
pena legal por ser um drogado, esta última muitas vezes mais 
GDQRVD�TXH�D�SULPHLUD´�
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