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A IDENTIDADE DO PEDAGOGO E SEU CAMPO DE ATUAÇÃO NO CONTEXTO ATUAL: O OLHAR DO DISCENTE SOBRE O CURSO DE PEDAGOGIA DA UFPE Mariama Tavares de Lira1 Simonne Falcão Trindade da Silva2 Ivanilde Alves Monteiro3 RESUMO Diante das modificações que o curso de pedagogia vem sofrendo em todo o território Nacional, dispostas nas Diretrizes Curriculares, é que pretendemos, com este trabalho, apresentar uma reflexão acerca do referido curso. Escolhemos como campo de investigação o Curso de Pedagogia da UFPE, objetivando conhecer o olhar do discente deste curso quanto a sua formação, identidade e campo de atuação. Trata-se de uma pesquisa qualitativa, em que adotamos como procedimento a aplicação de questionários presenciais, cujos resultados apontam elementos importantes para o debate sobre o curso em tela. Palavras – chave: curso de pedagogia, identidade, campo de atuação. INTRODUÇÃO ___________________________________________________ Estamos vivendo num período de grandes transformações sociais. São nítidas as mudanças que vêm ocorrendo no âmbito da economia, da cultura e do social. O século XXI está caracterizado pelo processo de globalização com mudanças na economia, no sistema de produção e na oferta de emprego, o que ocasiona intensas transformações em todos os setores da sociedade. Como conseqüência, a vida social e produtiva tem demandado inúmeras possibilidades formativas, com novas formas de fazer política e de formar cidadão, sendo necessário profissionais da educação com novos perfis capazes de articular trabalho pedagógico aos campos de outras ciências, de modo a atender às peculiaridades do atual contexto. A sociedade atual exige, necessariamente, uma educação comprometida com as mudanças e transformações sociais. A educação tem 1 Aluna concluinte do Curso de Pedagogia da UFPE. mariamalira@hotmail.com. 2 Aluna concluinte do Curso de Pedagogia da UFPE. simonnefalcao@hotmail.com 3 Orientadora e Profª Adjunta do Departamento de Métodos e Técnicas de Ensino do Centro de Educação da UFPE. 2 que se estruturar/reestruturar considerando esse contexto globalizado, as perspectivas históricas diferenciadas e os projetos políticos. Nesse sentido, Pimenta (2005) entende que a educação não só retrata e reproduz a sociedade, mas projeta a sociedade desejada, vincunlando-se profundamente ao processo civilizatório e humano. A educação tem, historicamente, enquanto prática pedagógica, o desafio de responder às demandas que os contextos lhe colocam bem como possibilitar transformações, a partir, inclusive, da formação de professores que vão atuar nestes mesmos contextos. O curso de pedagogia, na sua criação em 1939, teve como vocação a formação de professores primários. Com o tempo, a realidade evidenciava outras necessidades. Os educadores envolvidos com as reformulações da pedagogia defendiam que o pedagogo deveria ser capaz de exercer as atividades específicas, conforme as exigências da complexidade da escola. “Assim, a formação do pedagogo deveria propiciar ao educador tanto a formação do especialista, quanto a do professor” (Brzezinski, 1997, 2002 apud Monteiro, 2005, p. 350). No decorrer de seus mais de sessenta anos de história, as discussões a respeito de suas funções e os contínuos conflitos no que se refere à organização de seu currículo fizeram com que o curso enfrentasse, o que se convencionou denominar, uma crise de identidade. Como demonstrou Silva (1999), sua história pode ser considerada como uma história de busca de afirmação de identidade. Inserido em todo esse contexto, o curso de Pedagogia da UFPE4 vem sendo palco de reformas e grandes debates junto à comunidade acadêmica, principalmente nestas duas últimas décadas. Ao ingressar no curso de Pedagogia a maioria dos discentes possuem uma visão superficial da área de atuação do pedagogo, não sabendo ao certo a quem este propõe formar. Em nosso cotidiano acadêmico, em conversas informais sobre o espaço de atuação deste profissional, percebemos que muito se falava sobre a diversidade de possibilidades de exercício da função. Em alguns momentos, na sala de aula, quando éramos perguntados sobre qual a nossa expectativa a respeito da atuação profissional, poucos revelavam desejo 4 UFPE - Universidade Federal de Pernambuco. 3 por atuar na docência. Falava-se muito na pedagogia em espaços não escolares. Mas, o que o curso da UFPE propõe para este profissional? O que pensa o aluno sobre o que é ser pedagogo e qual o seu desejo quanto a sua futura atuação? Diante destas indagações é que temos como objetivos identificar a proposta de pedagogo no perfil 1321 do curso de Pedagogia da UFPE, investigar a concepção que os alunos do curso de pedagogia desta Universidade têm acerca do conceito e identidade deste profissional e seu campo de atuação a partir de sua formação e confrontar a formação que o curso de Pedagogia da UFPE propõe com a perspectiva dos alunos do mesmo. Supõe-se que a maioria dos estudantes de Pedagogia vê no curso a possibilidade de atuação em vários espaços profissionais: empresas, ONG’s5, escolas, movimentos populares..., enquanto outros , em sua minoria, percebem o curso como preparação para a docência. Para formarmos o corpo teórico deste artigo, no sentido de investigarmos a formação do Pedagogo e seu campo de atuação, discutimos essa temática à luz de teóricos como: Libâneo (2006), Kuenzer (2006), Brzezinski (1996) entre outros, que têm se destacado através de pesquisas e estudos acerca desta temática. Os procedimentos metodológicos adotados na construção das discussões do tema deste artigo contemplam os princípios e técnicas da abordagem qualitativa da pesquisa, utilizando tanto o levantamento bibliográfico e documental6, quanto dados empíricos construídos através de questionários aplicados de forma presencial, com questões abertas e sujeitos escolhidos aleatoriamente que estejam cursando regularmente a partir do sexto período. Esperamos desta forma, construir um referencial consistente e uma análise mais elaborada acerca deste tema para que seja possível atingir os objetivos propostos anteriormente. Acreditamos que as reflexões surgidas neste trabalho poderão nortear futuros debates sobre o Curso de Pedagogia, sua identidade em construção, o conceito que se tem a respeito deste profissional e a importância de levar em 5 Organização Não Governamental. 6. Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Pedagogia. Parecer CNE/CP nº5/2005 aprovado em 13/12/2005. 4 consideração o pensamento do aluno sobre sua formação, visto que muitas vezes a idéia que se tem do curso não está compatível com a realidade da graduação. Breve histórico do Curso de Pedagogia: a busca da identidade Todos os setores da sociedade foram se transformando no decorrer dos tempos, de acordo com as demandas dela suscitadas. Com a formação docente não foi diferente. Ao analisarmos a história do curso de Pedagogia, desde sua criação, observamos que já se pensava em elevar o nível de formação de professores. Desde então, a crise de identidade dos profissionais da educação tem sido bastante debatida/vivida no nosso país. Para o entendimento sobre os debates que têm sido travados nacionalmente, acreditamos ser necessário um breve retroceder na história do curso de pedagogia. Como afirma Monteiro (2005), Por ser este o espaço onde se dá tal formação, buscando localizá-lo no contexto das políticas nacionais para a formação de professores, entendidas como resultado das relações que se estabelecem em cada momento histórico, entre educação e sociedade, e das lutas que se travam entre as propostas oficiais para o curso de pedagogia e o movimento dos educadores. (p.344) O Curso de Pedagogia foi incluído como curso superior na Faculdade de Filosofiae regulamentado, segundo as Diretrizes Curriculares7, nos termos do Decreto-Lei nº 1.190/1939. Criado como conseqüência da preocupação com o preparo de docentes para a escola secundária, atribuindo-se a ele, nas primeiras propostas, o “estudo da forma de ensinar”. De acordo com tal decreto, ele foi definido como lugar de formação de “técnicos em educação”. Tal diretriz afirma ainda que a padronização do curso em 1939 é decorrente da concepção normativa da época, que alinhava todas as licenciaturas ao denominado “esquema 3 + 1”. Segundo o esquema, o curso oferecia o título de bacharel a quem cursasse três anos de estudos em conteúdos específicos da área e o título de licenciado aos que, tendo concluído o bacharel cursasse mais um ano de estudos dedicados à didática e à prática 7 Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Pedagogia. Parecer CNE/CP nº5/2005 aprovado em 13/12/2005 - Breve História do Curso de Pedagogia. 5 de ensino. Com essa dualidade, o curso dissociava o campo da ciência com o conteúdo da didática. Como bacharel, o profissional não tinha precisão na definição de suas funções e como licenciado não havia um campo exclusivo. Para a docência, o principal campo de atuação era o curso normal que formava professores primários. Neste curso, qualquer profissional com diploma de curso superior poderia lecionar, de acordo com a Lei Orgânica do Ensino Normal. Assim, a falta de identidade do curso de pedagogia já se refletia no exercício profissional do pedagogo. Marcado por uma pseudo-identidade, passo a passo, o curso de pedagogia foi ocupando lugar periférico no contexto das licenciaturas, já consideradas periféricas no elenco dos demais cursos superiores, por serem vistas como cursos de segunda categoria. (Monteiro, 2005, p.348). Apesar de alguns retoques feitos na sua estrutura em 1962, esse quadro perdurou até 1968, quando este foi reorganizado, sendo então abolida a distinção entre bacharelado e licenciatura. Com a Lei da Reforma Universitária n° 5.540, facultava-se à graduação a oferta de habilitações: Supervisão, Orientação, Administração e Inspeção educacional. Um ano depois, com o Parecer CFE8 n° 252 e a resolução CFE n° 2, determinou-se que “a formação de professores para o ensino normal e de especialistas para as atividades de orientação, administração, supervisão e inspeção, fosse feita no curso de Pedagogia, de que resultava o grau de licenciado”. Com o passar dos anos, o acesso à escola ampliou-se, trazendo com esse crescimento um público bastante heterogêneo, surgindo então a necessidade de um profissional mais qualificado e valorizado tanto para a área da docência quanto para a gestão e assessoramento. O curso hoje, apresenta uma notória diversificação curricular e uma ampla gama de habilitações para além da docência. Com as várias possibilidades de atuação mencionadas nas diretrizes, conclui-se que apenas um curso de graduação é insuficiente para contemplar cada um desses objetivos de formação. Porém, restringir toda a graduação apenas à docência é reduzir a educação à mera instrução; a formação docente ao treinamento de habilidades; os professores em ensinadores. O crescimento 8 Conselho Federal de Educação. 6 desses significados apequenam e alteram a identidade da Pedagogia fazendo- a distanciar de seus ideais político-transformadores. Identidade: Conceito e construção Para entender o que é identidade e quais fatores interferem na sua construção, faz-se necessário analisar tanto o contexto contemporâneo e seus desdobramentos na nossa vida, quanto a dinâmica e diversidade cultural existente entre as sociedades humanas. De acordo com o dicionário Aurélio, identidade é “o conjunto de caracteres próprios e exclusivos de uma pessoa.” A enciclopédia, Wikipedia (2006), define ainda que: Identidade é o conjunto de caracteres próprios e exclusivo com os quais se podem diferenciar pessoas, animais, plantas e objetos inanimados umas das outras, quer diante do conjunto das diversidades, quer ante seus semelhantes. Sua conceituação interessa a vários ramos do conhecimento (história, sociologia, antropologia, direito etc.), e tem, portanto diversas definições, conforme o enfoque que se lhe dê. Identidade é também definida como sendo “o resultado simultaneamente estável e provisória, individual e coletiva, subjetivo e objetivo, biográfico e estrutural, dos diversos processos de socialização que, em conjunto, constroem os indivíduos e definem as instituições” (Silva, 2003, p.94). Nos dias atuais, atravessamos um momento caracterizado pela pluralidade sócio-cultural (convivemos em um mundo composto por diversos grupos humanos diferentes, cada qual com sua cultura diferenciada) e facilidade de troca (entre os diversos universos, ou seja, as pessoas podem realizar recortes de crenças e culturas, criando e recriando a sua própria identidade). As características da realidade sócio-econômica, cultural e profissional marcadas pela freqüente mutabilidade de referenciais culturais e pela precariedade e instabilidade profissional intervêm, de igual modo, na construção / reconstrução das identidades. (Silva, 2003, p.97) 7 Como a construção da identidade se dá, em grande medida, na interação social, com toda essa facilidade de mudança, as características e a exclusividade tanto de um campo de estudo quanto de uma pessoa, acaba sendo fragmentada, tornando seu conceito impreciso. Na sociedade atual, o indivíduo é fragmentado, tendo ou "fazendo" parte de várias identidades. Com a globalização, mais acelerada do que nunca, é, e não poderia ser diferente, o fato do indivíduo não ter apenas uma identidade e sim se familiarizar, se identificar com várias. A identidade não é estável e unificada, ela é mutável e até mesmo provisória. A construção das identidades sociais encontra-se atravessada pelas representações sociais: “à construção da identidade está, portanto, inerente o processo de socialização, constituindo um componente essencial tanto das práticas como das representações dos sujeitos” (Ruano-Borbalan,1998 apud Silva, 2003, p.92). Como a educação é um processo de múltiplas práticas educativas, a construção da identidade atravessa o repensar e o construir as diferenças culturais. Com relação ao curso de Pedagogia, entendemos que identidade seria o seu campo exclusivo de atuação, aquilo que lhe é peculiar, bem como um conteúdo próprio que justifique sua existência. Logo, é preciso construir uma definição clara sobre o que constitui o curso, qual é a função reservada a ele, em que consiste o trabalho do pedagogo e, consequentemente, o destino de seus egressos. O que é ser Pedagogo? Qual o seu campo de atuação? Segundo a enciclopédia, Wikipedia9: “ a Pedagogia é a ciência ou disciplina cujo objetivo é a reflexão, ordenação, a sistematização e a crítica do processo educativo. A palavra, Pedagogia, tem origem na Grécia antiga, paidós (criança) e agogé (condução). O pedagogo era o escravo que conduzia as crianças”. Era atividade do escravo conduzir as crianças aos locais de estudo, onde deveriam receber instruções de seus preceptores. Quando ocorreu a dominação romana sobre a Grécia, o “escravo pedagogo” não só continuou a 9Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Pedagogia. Acessado em: 16.09.2006. 8 agir como condutor de crianças, mas também assumiu as funções de preceptor. Como vimos, originalmente a Pedagogia está ligada ao ato de “condução do saber”, o que não significa, necessariamente, que este saber esteja estritamente reduzido à função da docência, a espaços escolares, mas sim, a qualquer prática educativa que se faça necessária num ambiente, mesmo que não seja escolar, visto que é uma ciência, logo tem base na investigação, contemplando reflexõesacerca do indivíduo, da sociedade etc, e não apenas a técnicas. Ainda nos tempos hodiernos, perdura uma grande confusão entre o campo científico e o objeto da Pedagogia, entre ação educativa e a ação docente. Isso nos suscita questões, pois afinal ser pedagogo é ser professor? Ser professor é ser pedagogo? Na tentativa de elucidar estas questões, reportamo-nos às Diretrizes Curriculares(2005). Estas definem, como objetivo do Curso de Pedagogia, a formação de professores para exercer funções de “magistério na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental, nos cursos de Ensino Médio, na modalidade Normal, de Educação Profissional, na área de serviços e apoio escolar e em outras áreas nas quais sejam previstos conhecimentos pedagógicos.” Percebemos, no decorrer das referidas diretrizes, que estas ao mesmo tempo que centra a formação no “Licenciado em Pedagogia”, ou seja, na docência, conceitua a Pedagogia de forma mais ampla sendo “campo teórico-investigativo da educação, do ensino, de aprendizagens e do trabalho pedagógico que se realiza na práxis social”. Para Libâneo (2006, p.222), em reflexão sobre o parágrafo único do artigo 4º, a insuficiência conceitual leva a definições operacionais muito pouco convincentes do ponto de vista teórico, “sua imprecisão conceitual é o entendimento de que quaisquer atividades profissionais realizadas no campo da educação, ligadas à escola ou extra-escolares, são atividades docentes”. Para este autor, um professor é um pedagogo, mas nem todo pedagogo precisa ser professor, pois, para ele, a base de um curso de pedagogia é o 9 fenômeno educativo, em sua complexidade e magnitude, já a docência é uma modalidade de atividade pedagógica, cuja base é a formação pedagógica, não o inverso. Kuenzer (2006) entende ainda que o curso deve construir caminhos interdisciplinares que articulem os conhecimentos relativos ao trabalho pedagógico aos campos de outras ciências de modo a formar profissionais da educação com novos perfis, capazes, por exemplo, de atuar com as novas tecnologias, com as diferentes mídias e linguagens, com a participação social, com o lazer, com programas de inclusão dos culturalmente diversos, dos portadores de necessidades especiais, e outras inúmeras possibilidades formativas que a vida social e produtiva tem demandado em decorrência do regime de acumulação flexível. (p.190) Para a autora, a nova proposta para o curso fecha, enrijece, essa gama de possibilidades abertas pela prática social e produtiva, “reduzindo o pedagogo ao professor de educação infantil, séries iniciais, magistério em nível médio e cursos profissionalizantes para os técnicos administrativos das escolas e sistemas de ensino”. Já nos documentos da ANFOPE10, se acredita que: a formação do educador de caráter sócio-histórico e a concepção da docência como base da formação dos profissionais da educação – têm outro caráter: indicam a necessidade de superação tanto da fragmentação na formação – formar, portanto, o especialista no professor – quanto para a superação da dicotomia – formar o professor e o especialista no educador. A defesa do movimento em relação à organização institucional e curricular dos Cursos de Formação dos Profissionais da Educação, tendo por referência a base comum nacional, orienta-se no sentido de uma estrutura organizativa que favoreça a articulação de todos os componentes curriculares dentro do Projeto Pedagógico de cada Instituição e Curso, de forma a superar as práticas curriculares que tradicionalmente dicotomizam teoria x prática, pensar x fazer, trabalho x estudo, pesquisa x ensino. 10 ANFOPE - Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação e ANPEd – Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação; CEDES – Centro de Estudos Educação e Sociedade (Documento enviado ao Conselho Nacional de Educação visando a elaboração das Diretrizes Curriculares Nacionais para os Cursos de Pedagogia, em 10.09.2004). Disponível em http://www.anped.org.br/200904PosicaoDiretrizesCursosPedagogia.doc. Acessado em 17/09/2006. 10 Quanto à Resolução do CNE de 2005, a posição assumida pela ANFOPE permanece, ou seja: pedagogo é aquele que lida diretamente com a formação humana, produz conhecimentos e organiza o trabalho pedagógico escolar e não escolar, na Educação Básica. Tendo a docência como fundamento na ação do pedagogo, a produção de conhecimento aparece como uma de suas atribuições. No campo de atuação do pedagogo, ainda permanece uma imprecisão conceitual. De acordo com os Parâmetros estabelecidos pelo Ministério da Educação (MEC), são definidas as Diretrizes Curriculares para os diversos cursos formadores dos profissionais de todos os campos do saber e do ensino. Assim, ao invés de se estabelecer currículos, o novo modelo estabelece apenas Diretrizes Curriculares, deixando às Instituições a atribuição de delinear seus currículos concretos. Desta forma, o currículo é adaptado de acordo com os interesses de cada instituição, podendo estas optar pela oferta que melhor lhe convier. Por um lado, o qual consideramos positivo, as Diretrizes são uma forma de superar o engessamento, possibilitando uma melhor resposta à dinamicidade das mudanças no mundo do trabalho de cada realidade. Em contra partida, essa flexibilidade pode ser negativa, especificamente para o curso de Pedagogia, visto que ele não tem o seu campo de atuação definido. Pode-se incorrer no erro de ampliar demais seu perfil e competências e o currículo ser insuficiente para contemplar tudo isso. Dentre as possibilidades de atuação, de acordo com as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Pedagogia, estão: Formação de professores para exercer funções de magistério na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental, nos cursos de Ensino Médio, na modalidade normal, de Educação Profissional na área de serviços e apoio escolar e em outras áreas nas quais sejam previstos conhecimentos pedagógicos. As dicotomias permanecem quanto ao fazer pedagógico, ao ser pedagogo, a identidade do curso de pedagogia e seu campo de atuação. Mas um ponto é consensual: o curso de pedagogia, tal como se apresenta historicamente, não satisfaz às exigências no momento atual de redemocratização do país, quando o compromisso dos educadores implica uma série de determinações econômicas, políticas e ideológicas. 11 Curso de Pedagogia da UFPE: Proposta de Pedagogo no Perfil 1321 O Curso de Pedagogia da UFPE, em sua atual proposta currículo- político-pedagógica, o perfil 1321 – Magistério, tem a docência como base obrigatória de sua formação e identidade profissionais, habilitando o pedagogo a atuar no magistério das séries iniciais do Ensino Fundamental e das matérias pedagógicas do Ensino Normal Médio; também podem atuar na educação infantil, na Educação de Jovens e Adultos, e na Educação Especial. Além da docência, o profissional de pedagogia atua na organização e gestão de sistemas, na coordenação pedagógica, unidades e projetos educacionais escolares e não-escolares, na produção e difusão do conhecimento em diversas áreas da educação. Como vemos, o curso tem a docência como eixo norteador e, a partir do primeiro semestre de 2001, foi instituída a prática pedagógica como elo articulador dos diversos componentes curriculares, redimensionando o oferecimento das trezentas horas-aula obrigatórias para a realização do Estágio Supervisionado e da Prática de Ensino (artigo 65 da Lei de Diretrizes e Bases do Ensino n.9394/96), distribuindo-as ao longo do curso, a partir do 3º período contemplando a perspectiva de situar a relação teoria-prática como eixo articulador da produção do conhecimento, na dinâmica do currículo. Uma materialização dessa perspectiva foi a implantaçãodas disciplinas de Pesquisa e Prática Pedagógica (PPP) e Trabalho de Conclusão de Curso, na qual os discentes devem elaborar um documento científico. Desta forma, os graduandos têm a oportunidade de se aproximar da realidade educativa e até mesmo interferir nela, visto que nas PPPs IV e V passa-se de observadores a ministrantes. Entendendo que a teoria por si só não leva à transformação da realidade, por outro lado, compreendemos que a prática não fala por si mesma. Neste sentido, Freire (1996) coloca que a reflexão crítica sobre a prática se torna uma exigência da relação teoria-prática, sem a qual, a teoria pode tornar-se “blábláblá” e a prática “ativismo”. De acordo com o Manual Acadêmico dos Cursos de Graduação em Pedagogia e Licenciaturas Diversas, todo o aluno de Pedagogia deve concluir o seu curso com a habilitação Magistério, sendo as demais optativas. Os 12 créditos mínimos exigidos para o Magistério equivalem a 2.325 horas. Para as demais habilitações são: Administração Escolar – 2.520 horas; Supervisão Escolar – 2.445 horas e Orientação Escolar – 2.445 horas. Destaca-se ainda que o aluno deverá cursar no mínimo 270 horas em disciplinas eletivas e/ou atividades desenvolvidas no âmbito dos programas de iniciação à docência, científica e extensão. Essa grade curricular, ora apresentada, possivelmente sofrerá modificações, tendo em vista que os Cursos de Pedagogia, em todo o território nacional, deveriam ser reformulados até dezembro de 2006. Após a homologação do Parecer 2005, muitas reuniões, debates e assembléias vêm sendo realizados no Centro de Educação da UFPE a fim de enquadrar o curso nas Diretrizes em questão. As discussões que hoje preocupam a comunidade acadêmica do Centro de Educação travam-se, também, na carga horária, visto que continua tendo a docência como eixo norteador desde o seu funcionamento em 1986.2. As disciplinas passam de 60 horas/aula para 70 horas/aula, o que dificulta o enquadramento dos alunos do turno da noite, por já terem seu tempo reduzido em relação aos outros horários. A reforma parcial exclui as habilitações porque todos os pedagogos têm que se formar, por força da lei, em docentes. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ______________________________ Estamos vivenciando momentos de reformulação do Curso de Pedagogia, em decorrência do Parecer de 2005, trazendo à tona as discussões acerca da identidade deste. Visando iluminar o dinamismo da situação atual do curso, adotamos a abordagem qualitativa da pesquisa que considera a realidade social e a experiência dos sujeitos, supondo um contato direto e prolongado do pesquisador com o ambiente e a situação que está sendo investigada. Para Minayo (Org.) a pesquisa qualitativa responde a questões muito particulares. Ela trabalha com o universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis (1994, p.21 e 22). 13 Para caminharmos no conhecimento, precisamos de parâmetros. Enquanto conjunto de técnicas, a metodologia deve dispor de um instrumental claro, coerente, elaborado, capaz de encaminhar os impasses teóricos para o desafio da prática, funcionando como articulação entre conteúdos, pensamentos e ação. Para este trabalho, utilizamos como procedimentos metodológicos a pesquisa bibliográfica, documental e a empírica. O processo se deu nas seguintes etapas: § Levantamento de materiais, investigando elementos que pudessem contribuir para elucidar as questões levantadas na pesquisa. Realizamos análises em livros, artigos, revistas, monografias, teses e dissertações, assim como consulta em sites específicos da internet que nos forneceram informações atuais. § Análise documental do tipo oficial, pois se trata do Parecer aprovado em 13/12/2005 das Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Pedagogia e o Manual Acadêmico dos Cursos de Graduação em Pedagogia e Licenciaturas Diversas (2003). Através de documentos oficiais, pudemos ratificar e validar as informações obtidas, visto que “os documentos constituem uma fonte poderosa de onde podem ser retiradas evidências que fundamentem afirmações e declarações do pesquisador.” (André & Ludke,1986, p.39). § Na pesquisa de campo, utilizamos como método de coleta de dados a aplicação de questionários individuais e presenciais. No sentido de se obter informações contidas na fala dos atores sociais. Os dados obtidos foram de ordem subjetiva, pois se relacionam aos valores, às atitudes e as opiniões dos sujeitos entrevistados. Instrumentos: - Elaboração e aplicação de um pré-teste, antes da aplicação final do questionário, para quatro sujeitos, de acordo com os critérios descritos abaixo. Pretendíamos verificar, com as perguntas e respostas obtidas, se as mesmas atingiriam as propostas da pesquisa, assim como “identificar possíveis falhas quanto à redação das questões. Falhas como imprecisão na formulação do questionário, revelando alguma ambigüidade, ou ainda deixar o respondente 14 exausto pela complexidade ou grande quantidade de questões.” (Oliveira, 2005, p.98) - Questionário aberto, com perguntas estruturadas, previamente formuladas. Sujeitos: Delimitamos o universo estudado selecionando vinte e três graduandos do curso de Pedagogia da UFPE, por considerarmos este quantitativo um número expressivo para atingirmos os objetivos pretendidos com este trabalho. Os sujeitos da pesquisa foram escolhidos de forma aleatória adotando-se os seguintes critérios: - Ser aluno regularmente matriculado no Curso de Pedagogia - UFPE, visto que em nosso estudo queremos investigar que tipo de pedagogo essa universidade propõe formar e qual a expectativa dos alunos desta instituição; - Cursando a partir do 6º período, pois nesse estágio o aluno já detém uma bagagem de reflexão teórica e prática, assim como um bom conhecimento da dinâmica do curso; - Ser regular do perfil 1321, visto que é necessário fazermos um recorte histórico para a realização da pesquisa. Pelo fato da matrícula ser feita por disciplina, o aluno tem a disponibilidade de cursar várias disciplinas, em qualquer horário em um mesmo semestre letivo. Assim, cada aluno constrói a sua vida escolar, adiantando ou atrasando em detrimento de suas necessidades. Em função disto, não foi possível a obtenção do número exato de alunos matriculados no curso a partir do 6º período, pois, de acordo com a coordenação, o número total de alunos inclui matrículas em disciplinas isoladas, alunos que já concluíram e retornam para cursar outra habilitação etc. Pretendíamos com este quantitativo obter uma porcentagem equivalente ao universo total de alunos. Como não foi possível, consideramos que vinte e três entrevistados seria um número representativo. O processo de coleta de dados deu-se em dois momentos: elaboração do material para o pré-teste e o questionário, e aplicação dos mesmos de forma presencial e individual. A análise dos dados foi realizada em quatro momentos: leitura de todas as respostas por perguntas, elencagem de categorias de análise a partir do que foi apurado no primeiro momento, análise 15 dos dados em função das categorias e, por fim, conclusão de todos os dados a partir de todas as perguntas e respostas. Articulamos as conclusões que surgiram dos dados concretos com os conhecimentos produzidos no referencial teórico, estabelecendo uma compreensão dos dados coletados, confirmando os pressupostos da pesquisa. O OLHAR DO DISCENTE SOBRE O CURSO DE PEDAGOGIA DA UFPE ___ Os vinte e três questionários aplicados aos sujeitos da pesquisa nos permitiram perceber o olhar do aluno sobre o curso de pedagogiada UFPE, foco deste trabalho, quanto ao conceito de pedagogo, seu campo de atuação, sua identidade, assim como confrontar a expectativa dos discentes ao ingressarem no curso com sua proposta de formação. Perguntados sobre “o que é ser pedagogo”, os sujeitos inquiridos responderam da seguinte forma: Para você, o que é ser pedagogo? 30% 36% 13% 17% 4% Pedagogo como profissional crítico/consciente, aberto a novas experiências, embusca da humanização. Pedagogo como trabalhador da educação. Pedagogo como pesquisador, cientista da educação. Pedagogo como professor. Não sabe. Mediante estes dados apresentados, podemos inferir que a grande maioria vê o pedagogo como um trabalhador da educação (36%), o que rompe com o estigma de que pedagogo limita-se a professor de educação infantil, objetivo da criação do curso. Tal afirmativa mostra-se clara no discurso do entrevistado, quando diz que ser pedagogo é: É ser um profissional que precisa conhecer os amplos âmbitos, de seu ramo de atuação: a educação. Seja numa sala de aula, ou coordenando uma equipe de educadores, o pedagogo trabalha com os variantes processos de aprendizagem, disseminação de cultura e construção de conhecimento. E sem 16 esquecer da área política e social que abrange sua atuação (Q.19).11 Estar preparado para atuar na área da educação, seja dentro ou fora da escola. (Q. 22) Neste sentido, Libâneo (2006, p.215) entende que “o pedagogo é todo o profissional que lida com a formação dos sujeitos, seja em instituições de ensino, seja em outro lugar”. Percebe-se também que uma parcela significativa (30%) vê o pedagogo como profissional crítico/consciente, aberto a novas experiências em busca da humanização “é ser um profissional que pensa e interfere sobre a educação de modo que promove mudanças. Também é um sujeito que busca a própria humanização através da humanização dos seus alunos” (Q.9). Libâneo (2006, p.215) nos diz que: “a questão central da Pedagogia é, portanto, a formação humana mediante a qual os indivíduos adquirem aquelas características humanas necessárias para a vida em sociedade, considerando uma realidade sempre em mudança”. Outra categoria elencada foi a de pedagogo como professor (17%), como vemos nas falas dos inquiridos: “Significa muita responsabilidade. Significa envolver-se e empenhar-se na tarefa de ensinar, demanda muito esforço psicológico e até físico na busca pelo sucesso do aluno.” (Q.14). “Aplicar as práticas pedagógicas (aprendidas na teoria), na prática, ou seja, escolas, creches etc.” (Q. 12). Essa é uma concepção que nos remete a um enfoque mais exclusivo na sala de aula. Admite, com maior ênfase, a atuação do professor-pedagogo no contexto escolar, mais do que no campo não-escolar, pressupondo um maior espaço do currículo para aprofundamento disciplinar na formação do professor. O Pedagogo como pesquisador, cientista da educação foi outra categoria apontada pelos inquiridos (13%). No discurso de um deles vemos uma demonstração: “Ser pedagogo é ser um cientista da educação, pois sua compreensão de educação tem que ir além da sala de aula. Sendo assim, ele necessita entender a educação presente na sociedade como um todo.” (Q. 20). Schimied-Kowarzik (1983) define a Pedagogia como uma ciência prática da e para a práxis educacional, admitindo a dialeticidade do real educativo. Nesse 11 Os depoimentos transcritos são identificados com a letra Q e um número referente ao número do questionário respondido. 17 contexto, cabe ao pedagogo realizar um estudo sistemático da prática social de modo a interferir nesta de forma consistente, cuja finalidade é a humanização dos homens. Pimenta (1996) define ainda a Pedagogia como ciência da educação que tem a prática (seu objeto de estudo) como ponto de partida e chegada. Um dado que nos remete a algumas indagações é o fato da existência de um percentual (4%) de entrevistados que, mesmo estando num período avançado do curso (6º período em diante), não sabem, ou mesmo não refletem quanto a sua própria identidade profissional. Como se vê, a partir desses dados, a visão de pedagogo tem se ampliado significativamente, em relação aos ideários da criação do curso, em 1939. Atualmente o pedagogo é visto como um trabalhador da educação em seus diferentes contextos, onde quer se faça necessário uma reflexão sistemática da prática educativa. Perguntados sobre qual o campo de atuação deste profissional no contexto atual e se, na opinião deles, o curso da UFPE prepara para este campo, obtivemos os seguintes resultados: Categoria Porcentagem 1ª parte da questão 2ª parte da questão Sim % Não % Em parte % 1)Vários âmbitos de atuação 78,26% 27,78 11,11 61,11 2)Âmbito Escolar 13,04% 33,34 33,33 33,33 3)Específico para sala de aula 8,70% 50 0 50 Confirmando a hipótese que havíamos levantado, a grande maioria dos estudantes do curso de Pedagogia da UFPE (78,26%) vêem no curso a possibilidade de atuação em vários espaços profissionais. Diante desta categoria, 27,78% dos inquiridos afirmam que o curso de Pedagogia da UFPE prepara para este campo, já 11,11% colocam que não prepara. Há ainda um quantitativo de 61,11% que acredita que o curso prepara em parte o pedagogo para atuar nas diversas possibilidades de atuação. Tal dado mostra-se claro na seguinte fala: 18 o campo profissional do pedagogo é muito amplo, uma vez que posso atuar na escola como professora, supervisora, orientadora educacional e gestora,mas também em empresas, no setor de recursos humanos, em fábricas de brinquedos etc. No entanto, o curso da UFPE centra na formação do docente deixando as outras funções a desejar. Mas acredito que na formação do docente, presta um ótimo trabalho, porque sinto que tenho um suporte teórico para articulá-lo com a prática. (Q.9). Esta é uma concepção de atuação que não limita o pedagogo ao campo específico da escola. Kuenzer (2006) ratifica isto quando diz que a formação possibilita outros percursos como, por exemplo, o pedagogo do trabalho, ou pedagogo social, ou ainda o pedagogo capacitado a atuar em projetos de inclusão social, quer dos culturalmente diferentes, quer dos portadores de necessidades especiais. Para 13,04% dos questionados o campo de atuação deste profissional é o âmbito escolar. “Atuar principalmente no âmbito escolar, mais frequentemente na sala de aula. E para esse campo a universidade da um suporte até bom.” (Q.11). Como podemos constatar na fala antecedente, 33,34% dos questionados afirmam que o curso os prepara para atuarem no âmbito escolar. No entanto, 33,33% deles disseram que não e outros 33,33% disseram que em parte. Admitir a atuação do pedagogo para além da escola (empresa) não seria absurdo, entretanto é na escola que nós podemos dar nossa maior contribuição, que inclusive transcende qualquer organização social (família, empresas...) o nosso curso tem todo o generalismo necessário, mas falta a especificidade fundamental (escola em todos os espaços). (Q.23). Houve ainda uma minoria (8,70%) que mencionou apenas a sala de aula como campo de atuação do pedagogo. Dentre estes, 50,00% acham que o curso prepara e outros 50,00% declaram que em parte. “No campo atual, o pedagogo é visto como professora da educação infantil à 4ª série”. (Q.17). Apesar da tão mencionada diversidade de atuação do pedagogo, o curso de Pedagogia se firma em todo o país, como aquele que forma prioritariamente o pedagogo para atuar na escola como professor e não como especialista, apesar das habilitações (Brzezinski, 1996). Questionados quanto à identidade do Curso de Pedagogia, assim como se eles acham que a docência deve ser a base identitária do curso, apresentaram os seguintes resultados abaixo expostos. 19 Qual aidentidade do curso de pedagogia ? 9% 13% 52% 13% 9% 4% Pesquisa / construção do conhecimento Educação Magistério/docência Várias identidades Não existe Não sabe A crise da identidade do curso de pedagogia perdura até os tempos hodiernos, embora a pesquisa aponte um quantitativo de 52% que identifica ser o magistério, a docência, a identidade deste. No entanto, a pesquisa revela-nos também que, dentre os entrevistados, 47,88% acham que a docência não deve ser a base do curso de Pedagogia. Podemos verificar estes dados nas falas que se seguem: “a formação de professores é a proposta do curso, é a prioridade e isso certamente não vai mudar. Seria interessante, porém, se tivéssemos maneiras mais claras ou práticas de direcionar o curso para outras áreas, partindo deste eixo central.” (Q.10). “A docência deve ser uma face importante do curso, mas não a única. A Pedagogia é muito mais do que a docência.” (Q.14). Em discordância a esta colocação, Melo nos diz que: a docência concebida na complexidade da ação educativa, do trabalho pedagógico, é a base da formação e da identidade profissional do pedagogo do curso de Pedagogia, o que permite compreender com mais clareza as mais diversas práticas pedagógicas formais e não formais. Isto porque a compreensão e o exercício da docência envolvem múltiplas relações formativas: pedagógicas, comunicativas, interativas, Você acha que a docência deve ser a base identitária do curso? 34,78% 47,83% 17,39% Sim Não Boa Parte 20 cognitivas, psicológicas, afetivas, estéticas, bem como ético- morais, políticas e sócio-culturais entre sujeitos determinados. (MELO 2004 apud MELO, 2006, p. 261) As idéias defendidas por Melo, contrapõem-se a posição de Libâneo que declara: A base de um curso de Pedagogia é o estudo do fenômeno educativo, em sua complexidade, em sua amplitude. Então, podemos dizer: todo trabalho docente é trabalho pedagógico, mas nem todo o trabalho pedagógico é trabalho docente. A docência é uma modalidade de atividade pedagógica, de modo que o fundamento, o suporte, a base, da docência é a formação pedagógica, não o inverso. Ou seja, a abrangência da pedagogia é maior do que a da docência. (2006, p.220) Uma parcela dos discentes entrevistados (9%) indica que o curso não possui uma identidade, argumentando que a educação, fundamento da pedagogia, não é considerada uma ciência. Assim se expressou uma entrevistada cuja fala representa este grupo: “o curso de pedagogia não possui hoje uma identidade própria, até porque, a educação, fundamento da pedagogia não é vista como ciência, portanto sem um objeto epistêmico próprio.” (Q.13). Os dados a seguir representam a expectativa dos alunos ao escolher o curso de pedagogia da UFPE, bem como se este está correspondendo. Categoria Porcentagem 1ª parte da questão 2ª parte da questão Sim % Não % Em parte % Superou % Não respondeu % 1)Construção da humanização 13,04% 33,33 - 33,33 - 33,34 2)Trabalhar na Educação 26,09% 33,33 33,33 33,34 - - 3)Ser um profissional crítico/reflexivo 8,70% 50 - - 50 - 4)Aprofundar nas questões educacionais 13,04% 66,67 - 33,33 - - 5)Ser professor/educador 30,43% 42,86 - 28,57 - 28,57 6)Ter Curso Superior/Limite de Vagas 8,70% - 100 - - - Um expressivo número (30,43%) demonstrou ter como expectativa ser professor/educador, dentre estes (42,86%) declara que o curso está correspondendo, como uma das entrevistadas representou na seguinte fala: ao escolher o curso não tinha noção das diversas possibilidades de atuação, então almejava atuar na sala de aula com turmas do Normal Médio, em disciplinas pedagógicas. Na verdade ele correspondeu à medida que mostrou que o 21 pedagogo não precisa ser apenas o professor, mas que para ser atuante em outros espaços é importante ter a vivencia na sala de aula. (Q.20) Os dados da tabela acima nos permitem inferir que o curso de Pedagogia da UFPE vem cumprindo com o que se propõe a formar, dentro do perfil estudado e mencionado no referencial desta pesquisa, uma vez que a única porcentagem negativa (33,33%) deu-se na formação do trabalhador da educação. Revelam-nos também um percentual bastante positivo e significativo, pois aos que mencionaram como expectativa ser um profissional crítico/reflexivo (8,70%), 50% afirmam que o curso corresponde e outros 50%, que superou as expectativas, quanto a esta categoria mencionada. CONSIDERAÇÕES FINAIS ________________________________________ Este trabalho nasceu da preocupação e curiosidade quanto ao Curso de Pedagogia. Preocupação porque o curso, em todo o Brasil, está passando por um período de reformulação, permanecendo, ainda, a polêmica de sua identidade. E a curiosidade nasceu porque, enquanto futuras profissionais da educação, vivendo nesta sociedade globalizada, precisamos ter clara a definição das funções do pedagogo a ser formado, assim como seu campo de atuação. É neste sentido, que buscamos elucidar tais questões, considerando o olhar do discente sobre o Curso de Pedagogia da UFPE. Durante a realização desta pesquisa nos foi possível entender a Pedagogia como um campo amplo de conhecimento, “é a ciência, a arte e a técnica da educação.” Uma ciência porque tem objeto próprio e utiliza métodos científicos, é uma arte porque estabelece preceitos e regras de ação prática, o que exige do educador agilidade, destreza e capacidade criadora; é uma técnica, porque sistematiza, racionalmente os preceitos e as regras da arte pedagógica. É uma ciência do espírito, porque envolve as relações e o aprendizado humano. (Santos, 1963) Sendo assim, a Pedagogia como ciência da e para a educação compõem-se de ramos de estudos próprios como a Didática, a Teoria da Educação e a História da Educação. Ao mesmo tempo, ela busca em outras 22 ciências os conhecimentos teóricos e práticos que concorrem para esclarecimento do seu objetivo, o fenômeno educativo. Em relação às entrevistas, Percebemos que maioria dos inquiridos, confirmando os pressupostos da pesquisa, entende que a pedagogia é ampla, por ser uma ciência que estuda o fenômeno educativo. No entanto ainda travam-se opiniões quanto à base identitária do referido curso. No tocante ao curso de Pedagogia da UFPE, vimos que a expectativa dos alunos, em sua maioria, está sendo correspondida. Em contra partida, já que a docência é o eixo norteador deste curso, sugerimos e acreditamos que seja necessário um investimento maior no currículo quanto às modalidades de ensino como, por exemplo, Educação de Jovens e Adultos e Educação Especial. Um fato inesperado foi a existência de um percentual de alunos que afirmaram não saber o que é ser pedagogo. Mesmo diante da dificuldade em se definir a identidade, estranha-nos o fato de tais sujeitos nem se quer demonstrar um posicionamento. Isso nos leva a pensar que seria interessante haver um momento em que estudássemos sobre a história do curso bem como um esclarecimento prévio quanto a proposta da instituição. Dessa forma, cada aluno saberia o que o curso propõe e para que está se formando. Logo, não haveria “surpresas” nem frustrações. Diante do exposto, uma indagação nos é suscitada: Será que essa indefinição não é a causa de tantos estereótipos mencionados sobre o curso e, por conseguinte a desvalorização deste profissional? Esperamos com esta pesquisa mostrar um pouco do olhar do aluno do curso de Pedagogia da UFPE, quanto ao ser pedagogo, sua importância e papel na sociedade. Acreditamos que a educação, fundamento da pedagogia, tem o papel de instaurar as condições para o desenvolvimento mais coerente e integral do ser humano. Neste sentido, cabe ao curso, seus formadores e formandos, esse entendimento e a busca pelo estudo das condições, dosfins e dos modos de educar. 23 REFERÊNCIAS __________________________________________________ § ANDRÉ, M. E. D. A e LUDKE, M. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. São Paulo, EPU, 1986. § BRZEZINSKI, I. Pedagogia, pedagogos e formação de professores: Busca e movimento. Campinas, SP: Papirus, 1996. § COELHO, J.M. Curso de Pedagogia: A busca da identidade. Brasília: INEP, p.9 –15, 1987. (Séries Encontros e debates, 2). § Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Pedagogia. Parecer CNE/CP nº5/2005 aprovado em 13/12/2005. § FERREIRA, A. B. de H. 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