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ROTEIRO DE ESTUDOS ANTROPOLOGIA II UNIDADE_2011_2

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Roteiro de Estudos Antropologia – II Unidade 
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OO SSUURRGGIIMMEENNTTOO DDAA AANNTTRROOPPOOLLOOGGIIAA CCIIEENNTTÍÍFFIICCAA 
As mudanças históricas 
Depois do choque inicial provocado pela descoberta da América, no Século XVI, a 
visão européia sobre a questão do “outro” esteve por muito tempo condicionada às 
necessidades pragmáticas levantadas pela colonização e pela retomada da 
escravidão, que caíra em desuso por vários séculos. A empresa colonial, em última 
análise, implicava buscar conhecimentos apenas na extensão da utilidade prática, uma 
vez que se realizou basicamente através da expropriação territorial de indígenas e do 
trabalho forçado de africanos. 
No século XVIII, a percepção de que um mundo novo estava se estruturando em 
substituição ao antigo inspirou duas respostas diversas perante a questão da 
existência de sociedades que tinham permanecido fora da civilização. Uma corrente 
manifestava-se através da confiança nos valores da civilização ocidental, replicando 
com estranheza a formas de cultura situadas fora desse padrão. A outra, oposta, 
expressava uma espécie de “nostalgia do antigo” que ainda existiria em “outro lugar” 
(LaPlantine); a fascinação pelo estranho ressaltava características como a integração 
ao ambiente protetor, contrastando com a infelicidade que residia do lado da 
“civilização”. 
A chegada dos anos 1800 reflete um contexto totalmente diferente. As feições deste 
novo ciclo, no que se refere aos estudos em geral sobre o homem, podem ser 
reunidas sob três evidências centrais: 
• Início da Era Contemporânea no Ocidente. 
• Domínio absoluto do Capitalismo Industrial. 
• Predominância política, cultural e econômica exercida por um grupo reduzido 
de potências européias, com o acréscimo dos Estados Unidos e, em certa 
medida, do Japão. 
A expansão acelerada provocada pela Revolução Industrial leva as potências 
europeias a uma intensa competição para garantir suas próprias bases de progresso 
capitalista. Tem início uma corrida por influência que levará ao controle, direto ou 
indireto, sobre regiões do mundo onde podiam se localizavam simultaneamente 
FONTES DE MATÉRIAS-PRIMAS e NOVOS MERCADOS para seus produtos. 
Esperava-se, com isso, reduzir os custos de produção, assegurar a continuidade da 
demanda e, adicionalmente, gerar possibilidades de “exportação” de excedentes 
populacionais (fonte de instabilidade e conflitos sociais). Essa política foi denominada 
NEO-COLONIALISMO ou IMPERIALISMO. 
Desde o final do século XVIII e até por volta de 1880 vigorou o chamado 
IMPERIALISMO INFORMAL, em que o exercício de influência era parcial, feito 
principalmente por meio de recursos econômicos e apoio militar. A partir dos anos 
1830, exploradores europeus percorreram o interior dos continentes ainda 
desconhecidos, elaborando mapas e realizando estudos sobre as condições locais. Na 
África, foram marcantes as expedições de DAVID LIVINGSTONE, RICHARD 
BURTON, JOHN SPEKE e JAMES AUGUSTUS GRANT. Ao lado desses 
exploradores, que eram cientistas e naturalistas, também houve uma grande 
participação de missionários, que estabeleceram bases e centros religiosos para 
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conversão de tribos nativas em regiões pouco exploradas. As informações desses 
indivíduos também serviram para formar um conhecimento básico sobre essas 
regiões, o que iria facilitar muito o trabalho de colonização. 
O ponto culminante dessa investida foi a Conferência de Berlim, de 1885, também 
conhecida como Partilha da África. Daí em diante, passou-se a buscar um controle 
mais direto e absoluto, estabelecendo governos coloniais, lançando mão da força 
bruta e transferindo colonos europeus para explorar as regiões dominadas, 
principalmente na África (embora também na Ásia e na Oceania). 
Tudo isso representou um impulso decisivo na formação de um Corpus de estudos 
científicos que se cristalizou no que conhecemos como Antropologia Científica. O 
interesse concreto do expansionismo europeu encarregou-se de proporcionar os 
meios financeiros, a vontade política e a mobilização de recursos, matérias e 
humanos, à nova ciência nascente. Os primeiros estudos propriamente antropológicos, 
portanto, eram diretamente vinculados a esse esforço colonial. Desse modo, era 
natural que os pioneiros nos escritos antropológicos correspondessem a essa 
mentalidade. A motivação deles era “CONHECER PARA DOMINAR”. A corrente 
cultural predominante, na época (fins do século XIX e começo do século XX) foi muito 
influenciada pelas ideias evolucionárias derivadas da teoria de Charles Darwin (1859), 
assim como de outros autores que, mesmo antes dele, já buscavam estabelecer 
padrões que explicassem as mudanças biológicas, criando analogias com as 
mudanças sociais. Nesse sentido, ganharam destaque as noções de Herbert Spencer, 
primeiro a desenvolver a teoria da “Sobrevivência dos mais aptos”. Por essas ideias, 
muitos consideram Spencer o pai intelectual do Darwinismo Social. 
O papel da Antropologia Científica, no seu nascimento, era construir um saber que 
possibilitasse a empresa neo-colonial bem sucedida. A ideologia elaborada neste 
caldo de influências, no qual predominava a ambição expansionista, moldou-se na 
crença da supremacia racial, do direito à conquista e do etnocentrismo exacerbado. O 
discurso e a visão de mundo da época evoluiu para considerar essas ações como 
legítimas, em função do “atraso” dos povos que controlavam esses territórios. 
Em resumo, a motivação ideológica que envolveu o surgimento da Antropologia 
Científica foi a pretensão de CONHECER PARA DOMINAR. É nesse contexto que se 
organiza a primeira corrente teórica da Antropologia propriamente científica: o 
EVOLUCIONISMO. 
As principais características dessa tendência podem ser resumidas como segue: 
1. A evolução do ser humano, em termos físicos e culturais, obedece a leis 
universais; 
2. A teoria geral da evolução aplica-se aos fenômenos culturais. Isso significa 
que, onde e quando quer que se encontre, a cultura tem um ritmo de 
desenvolvimento progressivo através dos tempos, sendo que todos os povos 
da Terra obedecem a uma sequência determinada (desenvolvimento unilinear); 
3. Levando em conta os dois primeiros postulados, as sociedades estavam 
destinadas a evoluir nos mesmos termos das culturas mais “avançadas”. A 
tarefa dos estudiosos era medir a dimensão e importância do “atraso” que 
afetava os povos “primitivos” – isto é, das culturas que diferiam do padrão 
europeu. 
4. As sociedades “primitivas” se encontravam em estágio equivalente à “Infância 
da Humanidade”. 
5. O volume de dados dá a aparência de um corpus científico, mas na prática se 
assemelha muito à filosofia do século XVIII, que não buscava seus 
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fundamentos na reflexão sobre tantos documentos mas sim no exercício 
especulativo. 
O Evolucionismo estruturou-se em torno da ideia de que as sociedades desenvolvem 
uma trajetória histórica linear desde um estado originalmente primitivo, tornando-se 
gradualmente mais civilizadas. Referencialmente, a condição primitiva aproxima-se do 
padrão de comportamento animalesco, e a de civilização é assemelhada ao modelo 
representado pelas sociedades europeias ocidentais do Século XIX/XX. 
O critério para medir o estágio de desenvolvimento das sociedades, na perspectiva 
evolucionista, era o grau de desenvolvimento tecnológico e 
científico que demonstravam. A definição desse critério 
refletia a abordagem etnocêntricado evolucionismo, já que 
aos “mais adiantados” cabia o papel de “Eu”, enquanto os 
“atrasados” eram vistos como “Outro”. Sob outras 
variantes, contudo, esses papéis se inverteriam. 
Os primeiros propositores da concepção teórica 
evolucionista foram os ingleses Edward Burnett Tylor e 
Herbert Spencer e o norte-americano Lewis Henry Morgan. 
Seu propósito era ajustar o pensamento social com a 
teoria biológica da evolução, adotando a perspectiva da 
“sobrevivência do mais apto” de Spencer e assimilando-a à 
tese da seleção natural de Darwin. Por isso essa corrente 
se tornou conhecida como DARWINISMO SOCIAL. 
Impregnada de forte racismo, apesar de distinguir entre 
“cultura” e “raça”, a teoria evolucionista colheu influências 
também do pensamento iluminista e pós-iluminista. Fonte 
de muitas referências, o filósofo alemão Hegel, por 
exemplo, defendia que o desenvolvimento social era 
inevitável e determinado por leis fixas, comparável a uma 
semente que não tem alternativa a não ser transformar-se 
em árvore. Sendo assim, as sociedades surgiam em 
estágio semelhante ao descrito por Hobbes como Estado 
de Natureza (O Leviatã), evoluindo em termos qualitativos 
até alcançar o estágio atingido pela Europa industrial. 
O Evolucionismo também buscou referências no modelo 
esquemático de filosofia da História de Auguste Comte, 
fundador da Sociologia, para quem o espírito racional 
evoluiria em uma trajetória que se alternava entre três 
grandes estados: o Estado Teológico, o Estado Metafísico 
e o Estado Positivo (LEI DOS TRÊS ESTADOS); 
Tylor acreditava que o papel dos antropólogos era 
estabelecer uma escala e civilização, enquadrando as 
diferentes sociedades conforme seu estágio evolutivo. 
Para ele, as instituições humanas eram estratificadas de 
modo semelhante às diferentes camadas do planeta Terra, 
que se sucediam de maneira uniforme por todo o planeta. Desenvolveu o que chamou 
de “aritmética social”, modelo matemático de análise dos costumes que permitia 
relacionar os que estavam presentes em cada sociedade. 
Morgan, depois de pesquisar entre os índios iroqueses nos Estados Unidos, fixou-se 
nas relações de parentesco (tendência constante na investigação antropológica). 
Desenvolveu um esquema detalhado do que, segundo ele, seriam as etapas 
sucessivas de desenvolvimento das sociedades. 
 
Figura 3 - Gráfico de cunho 
nitidamente racista compara a 
fisiologia dos cérebros humanos. 
No topo, em analogia ao deus 
grego Apolo, o crânio de um 
europeu ocidental. O de um 
africano, ao centro, é 
imediatamente associado ao do 
macaco, embaixo. 
 
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MODELO ESQUEMÁTICO DE MORGAN 
PPPeeerrríííooodddooosss EEESSSTTTÁÁÁGGGIIIOOOSSS CCCIIIVVVIIILLLIIIZZZAAACCCIIIOOONNNAAAIIISSS 
SELVAGERIA (Antigo) 
Superior 
(Alto) 
A partir da invenção do arco e flecha 
Médio Desde a dieta à base de peixes e uso do 
fogo 
Inferior 
(Baixo) 
Desde a infância da humanidade (pré-
hominídeos) 
BARBÁRIE 
(Intermediário) 
Superior 
(Alto) 
Desde a fundição do ferro e uso de 
ferramentas 
Médio Domesticação de animais e plantas (por 
meio da irrigação) Adobe, tijolos, pedras 
Inferior 
(Baixo) 
Desde a invenção da cerâmica 
CIVILIZAÇÃO (Recente) 
 Desde a invenção do alfabeto fonético, 
com uso da escrita, até a atualidade. 
Fonte: ALVES, Elizete Lanzoni e SANTOS, Sidney Francisco: Iniciação ao conhecimento da Antropologia Jurídica. 
Por onde caminha a Humanidade? Conceito Editorial, Florianópolis, SC - 2007 
POSTULADOS BÁSICOS DO EVOLUCIONISMO 
a) Sucessão Unilinear: Os evolucionistas acreditavam na unilinearidade do 
processo evolutivo. Mesmo que houvesse degenerações em certos momentos, 
a tendência das sociedades era sempre de “subir” na escala, já que ela 
funcionava como um padrão de valores progressivos. Sendo assim o 
evolucionismo não era um modelo científico no sentido exato do termo, mas 
sim uma concepção teórica e hipotética. Baseava-se na convicção de que 
havia uma unidade psíquica do gênero humano, que fazia com que todos os 
seres da espécie fossem igualmente motivados para o processo evolucionário, 
embora alguns estivessem mais avançados devido a fatores como o clima, o 
solo etc. A idéia de unidade psíquica, contudo, não implicava em uniformidade 
moral – característica dos ideários racistas. 
b) Método comparativo: o método utilizado por eles consistia em ordenar os 
fenômenos observados de acordo com princípios estabelecidos previamente e 
interpretados a partir de uma ordem cronológica. Mesmo assim, muitas vezes 
utilizaram esse método de forma arbitrária, preenchendo espaços vazios e 
afastando contradições e paradoxos a partir da ideia preconcebida de como o 
processo evolucionário “deveria” ser. Foi dessa forma que fixaram por exemplo 
a tese de que os sistemas de matrimonio evoluíram a partir de um estágio 
primitivo de completa promiscuidade, o que se mostraria completamente falso. 
c) Sobrevivência: Este conceito se manteve até a atualidade. Os evolucionistas 
foram os primeiros a identificar que certos elementos culturais se perpetuam 
em condições diversas das que deram origem a sua existência. 
Contribuições dos evolucionistas para a teoria antropológica: 
►Foram os primeiros a afastar o conceito de cultura de sua primitiva confusão com 
“raça”. 
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►Perceberam que os fenômenos culturais não são acidentais, mas sim que estão 
sujeitos a leis científicas e a generalizações, tais como os fenômenos naturais, 
permitindo assim o estudo sistemático sobre eles. 
►Estimularam os estudos sobre parentesco e formas de casamento e organização 
familiar, estabelecendo correlações entre a terminologia de parentesco, princípios de 
descendência e regras matrimoniais. Introduziram termos como Exogamia e 
Endogamia (McLennan), primos cruzados e primos paralelos (Tylor) etc. 
 
O DIFUSIONISMO 
Predominando no pensamento antropológico entre 1900 e 1930, o Difusionismo surgiu 
como uma reação ao Evolucionismo, criticando a ideia de um progresso cultural linear 
e procurando maior rigor científico e metodológico. A fase de maior popularidade foi a 
década de 1920. 
Esta teoria antropológica se ocupava do desenvolvimento de culturas e tecnologias, 
dedicando-se especialmente à História Antiga. Segundo seu ponto de vista, certas 
inovações surgem em uma determinada cultura, e são depois disseminadas por outras 
culturas, a partir de um processo de “empréstimo”. Desde o começo, considerava que 
algumas invenções são extremamente raras, e o fato de surgirem posteriormente em 
outras sociedades só podia ser explicado pela difusão por empréstimo. Era por isso 
povos diversos se tornavam semelhantes ou diferentes: a causa era a absorção ou 
não dos avanços desenvolvidos por outras culturas. As sociedades se desenvolviam 
de forma semelhante mais por terem entrado em contato umas com as outras e menos 
por terem dado origem, elas próprias, às invenções. 
Exemplo: a roda, como uma inovação central, teria sido criada em algum momento, e 
em certo local, e foi sendo transmitida a outros grupos e culturas, que por meio da 
imitação, negociação ou conquista militar, adotaram elas próprias o uso daquele 
artefato. Da mesma forma podiam ser explicados a arte, os modelos religiosos e todos 
os demais aspectos da cultura humana. 
Pensando dessa maneira, os difusionistas procuraram traçar linhas do tempo que 
permitissem entender como as diferentes sociedades e culturas tinham se 
diversificado ao longo da história. 
 
CORRENTES PRINCIPAIS DO DIFUSIONISMO 
Suas principais linhas de pesquisa foram: 
1 - Escola hiperdifusionista inglesa, também conhecida como heliocêntrica ou 
Escola de Manchester. 
Características marcantes: o dogmatismo, a atitudeanti-científica e a descrença total 
na criatividade humana. 
Seus principais formuladores foram G. Elliot Smith e W. J. Perry. Smith foi muito 
influenciado pelas descobertas no Antigo Egito, chegando à conclusão, sem maior 
cuidado científico, de que dali tinha se originado toda a cultura. Segundo esse 
entendimento, os egípcios teriam se espalhado pelo mundo, levando traços de sua 
cultura que foram imitados pelos outros povos – inclusive na América Central. Entre 
esses traços culturais estariam o culto ao Sol e o modelo político de reinado. Essa 
teoria foi desenvolvida por Perry na obra the Children of the Sun, na qual afirmava que 
a cultura do mundo todo era essencialmente idêntica. 
2 - Escola histórico-cultural alemã-austríaca. 
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Franz Boas 
 
Essa escola, também conhecida como histórico-geográfica, era formada em parte por 
integrantes da “Escola de Viena”. Desenvolvia uma visão pluralista da origem da 
cultura, aceitando que teriam existido múltiplos pontos de origem e difusão da 
evolução das sociedades, dando origem à totalidade final. 
Um dos seus integrantes, Willy Roy, elaborou o conceito de CÌRCULOS CULTURAIS 
(Kulturkreise), defendendo que a cultura humana teria surgido no interior da Ásia, 
difundindo-se para regiões mais longínquas a partir de círculos cada vez mais amplos, 
impulsionados por migrações. O Padre Wilhelm Schmidt explicava o cenário cultural 
moderno como resultado de uma difusão complexa de vários esquemas, que poderiam 
ser utilizados para reconstruir os círculos culturais originais. No modelo proposto por 
ele, a difusão cultural se dera em três fases, subdivididas cada uma em outras três, 
sendo: 
a) Três fases primitivas ou arcaicas: pigmeus, esquimós e aborígenes 
australianos; 
b) Três fases primeiras: com os caçadores-coletores e pastores nômades; 
c) Três fases secundárias: formadas por povos agrícolas. 
A tese dos Círculos Culturais foi a principal contribuição dessa escola. O círculo seria 
um conjunto de traços associados com um sentido, podendo ser isolados e 
identificados na história cultural. Além disso, insistiram na historicidade do método e 
dos contatos culturais, como primeiro passo para compreender o problema das trocas 
culturais. 
Os críticos assinalavam que os “círculos” eram apenas compostos generalizados , que 
os autores não conseguiam explicar como eles tinham surgido e como tinham se 
difundido em áreas distantes. 
 
Escola histórico-cultural norte-americana. 
Também conhecida como HISTORICISMO, dirigiu a atenção antropológica para a 
ANÁLISE ESPECÍFICA DA HISTÓRIA CULTURAL DE CADA SOCIEDADE. Para 
compreender uma cultura, era preciso reconstruir 
sua história, saber como ela tinha se constituído 
como uma sociedade específica em si mesma. 
Desenvolveu os conceitos de traço cultural, 
complexo cultural, padrão cultural e área cultural, 
que até hoje são válidos. Dava muita importância à 
pesquisa de campo e à delimitação do campo de 
estudo da antropologia, preferindo áreas limitadas 
e restritas; 
Os membros desta escola foram críticos ásperos 
do Evolucionismo do Século XIX, firmando uma 
tendência antievolucionista duradoura. Ao mesmo 
tempo, formaram um núcleo importante de 
combate ao racismo científico, contestando seus 
pressupostos (em um ambiente politicamente 
adverso, fortemente marcado pelas atitudes 
racistas). 
Os principais representantes foram FRAZ BOAS, 
CLARK WISSLER e ALFRED L. KROEBER 
Boas, o mais importante deles, nasceu na Alemanha e naturalizou-se estadunidense. 
Ele defendia que cada cultura devia ser entendida em sua história particular, incluindo 
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não apenas seu passado, mas também o presente. Os fenômenos locais deviam ser 
estudados dentro de uma área definida e geograficamente delimitada, com as 
comparações limitadas à área cultural que constituía a base para as investigações. 
Isso rejeitava por completo a ideia de que era possível entender as culturas 
comparando-as com outras, situadas em regiões distantes e cuja trajetória histórica 
tinha sido determinada por fatores diversos. Era uma posição de crítica direta ao 
modelo evolucionista, buscando a individualidade ou diversidade das culturas. Ele e 
seus seguidores aceitavam parcialmente a tese da identidade psíquica, mas 
discordavam dos grandes esquemas de desenvolvimento cultural propostos pelos 
evolucionistas. 
WISSLER apresentou a ideia de que a cultura se distribui em padrões, sendo que 
padrão cultural é o agrupamento de complexos e traços culturais, formando uma 
organização maior, de feições distintas, que caracterizam uma cultura. Além disso, 
ressaltou o aprendizado ocorrido desde a infância, vendo a cultura como um conjunto 
de reflexos condicionados que eram implantados no individuo pela convivência com o 
grupo de que era originário. 
O FUNCIONALISMO 
Surgiu na década de 1930, como uma nova concepção dentro da Antropologia teórica, 
fornecendo uma nova explicação para os fenômenos culturais. Sem rejeitar ou negar 
as orientações precedentes, inovou no campo da interpretação antropológica. 
Os funcionalistas se preocupavam menos com as origens ou história das culturas, 
interessando-se por sua lógica enquanto SISTEMA. Defendiam uma visão sincrônica 
que procurava conhecer a realidade cultural em dado momento, combinada com a 
abordagem sistêmica, que relacionava a sociedade a um organismo vivo, uma unidade 
complexa, um todo organizado. 
Os primeiros estudos da análise funcional foram produzidos no campo da Sociologia, 
destacando-se Herbert Spencer e Émile Durkheim. Eles influenciaram muito as idéias 
dos antropólogos funcionalistas. É preciso levar em conta as tendências organicistas 
que permeiam essa corrente: o estudo de uma sociedade deve ser feito como uma 
fisiologia. Quando se estuda um organismo, deve-se observar as partes componentes, 
as relações que se desenvolvem, as funções que desempenham e como mantém a 
continuidade de sua existência. A teoria foi descrita por Leslie A. White como tendo 
sua essência na crença de que as sociedades humanas e suas respectivas culturas 
existem como todos orgânicos, constituídos de partes interdependentes. As partes não 
podem ser plenamente compreendidas separadamente do todo, e o todo deve ser 
compreendido em termos de suas partes, suas relações umas com as outras e com o 
sistema sociocultural em conjunto. 
Sendo assim, qualquer traço cultural, costumes, objetos materiais ou ideias existentes 
no interior das sociedades têm funções específicas e mantém relações com cada um 
dos outros aspectos da cultura, com o objetivo de manter o modo de vida total. Cada 
costume é socialmente significativo, já que integra uma estrutura, participando de um 
sistema organizado de atividades. Uma cultura não é um simples organismo, mas sim 
um sistema. 
Os principais representantes do Funcionalismo foram o inglês de origem polonesa 
Bronislaw Malinowski e o britânico Alfed R. Radcliffe-Brown. Os dois realizaram 
trabalhos nas ilhas do Pacífico e tinham posições muito semelhantes, apesar de terem 
atuado de forma independente. 
 
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MALINOWSKI – Na base de seu pensamento, os conceitos de natureza humana e de 
cultura formavam o ponto de partida para considerar a própria cultura. Se todos os 
seres humanos são parte de uma espécie animal, só podem sobreviver quando suas 
necessidades biológicas são satisfeitas. Essa satisfação é tarefa da cultura, que 
elabora conteúdos diferenciados para dar conta dos “imperativos” primários. 
Malinowski distribuía as necessidades humanas universais em três tipos: 
a) Primárias ou biológicas (nutrição, defesa, excreção etc.); 
b) Derivadas ou instrumentais (organização econômica, educação etc.); 
c) Integrativasou simétricas (magia, religião, arte etc.) 
Ao buscar atender as necessidades primárias criadas pela própria natureza, 
respondendo às exigências da própria sobrevivência, o homem constrói um ambiente 
secundário. É este ambiente artificial que 
representa a cultura propriamente dita, entendida 
como um todo vivo e interligado, de natureza 
dinâmica, onde cada elemento ou traço tem uma 
função específica a desempenhar no esquema 
integral. Nas palavras de Malinowski, “...o conceito 
de necessidade é simplesmente a primeira 
abordagem para a compreensão do 
comportamento humano organizado [...] nem 
mesmo a necessidade mais simples, nem ainda a 
função fisiológica mais independente de influências 
ambientais, pode ser considerada completamente 
intocada pela cultura”. 
Assim, cada parte da cultura tem sua forma 
específica e desempenha função determinada, não 
existindo isoladamente. As partes se relacionam 
entre si e com o sistema cultural total, configurando 
sua própria estrutura. A cultura tem condição de 
fornecer os meios para satisfazer às necessidades 
dos membros da sociedade, sejam básicas, sejam 
derivadas, através de instituições culturais como 
a família, o parentesco, a economia etc. 
Malinowski apresenta a INSTITUIÇÃO como 
formada analiticamente pelos seguintes elementos: 
1) Estatuto; 
2) Pessoal; 
3) Normas; 
4) Aparelhagem material; 
5) Atividades; 
6) Função. 
Cada instituição existe em uma relação estreita e necessária com o cumprimento da 
função a que ela se destina. Assim, uma instituição desprovida de função tenderia a 
desaparecer. O pensamento de Malinowski mostrava uma preocupação com as 
explicações psicológicas para os fenômenos culturais, embora o conceito de cultura 
permanecesse como base do sistema que ele construiu. 
RADCLIFFE-BROWN 
 
Figura 5 - Bronislaw Malinowski 
 
Roteiro de Estudos Antropologia – II Unidade 
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Inglês, considerava a cultura um sistema adaptativo, enfatizando a importância da 
função e da estrutura social que via como contribuintes para manter o equilíbrio da 
sociedade. O sistema desenvolvido por ele se baseava no conceito de sociedade a 
partir do qual a função de um elemento é O PAPEL QUE ESTE ELEMENTO 
DESEMPENHA EM TODA A VIDA SOCIAL, tornando seu papel fundamental na 
manutenção da estrutura e da integração social. Acreditava ainda que os interesses de 
sobrevivência do grupo eram atendidos por meio das “condições necessárias de 
existência”. 
Radcliffe-Brown se dedicou mais à Antropologia Social do que à Cultural. Preocupou-
se com o conceito de Sistema, entendido como um todo organizado. Não estudou a 
cultura como um todo sistêmico, deixando de lado aspectos da cultura material e se 
concentrando mais nos aspectos da vida social. 
Em resumo: os postulados básicos do FUNCIONALISMO 
1. A cultura é um todo sistêmico, dotado de racionalidade própria, cujo 
funcionamento deve ser captado em dado momento; 
2. A cultura é constituída de partes interdependentes, relacionadas entre si e com 
o sistema sociocultural em conjunto; 
3. Os conceitos de natureza humana e de cultura conduzem à concepção da 
existência de um mundo natural e de outro artificial em correspondência mútua; 
4. Criação da teoria das “necessidades”, fatores percebidos culturalmente como 
decisivos para a sobrevivência individual e coletiva; 
5. Reconhecimento e valorização da função desempenhada pelos elementos 
culturais; 
6. Para Malinowski, as unidades de análise eram as instituições culturais, 
enquanto para Radcliffe-Brown eram as estruturas sociais. O arcabouço teórico 
de Malinowski era funcional, enquanto o de Radclliffe-Brown era estrutural-
funcional; 
7. Introdução do relativismo cultural, permitindo uma visão do cenário cultural e 
social das sociedades diferentes, sem projetar nelas os valores do observador. 
O funcionalismo constituiu uma reação positiva às teorias evolucionistas e 
difusionistas, principalmente em relação ao conceito de sobrevivências. Valorizou a 
pesquisa de campo que aproxima o observador dos grupos nativos, que passavam a 
ser o centro de referência, reconhecidos como portadores de padrões próprios e 
respeitáveis dentro da lógica do sistema que desenvolvem. O funcionalismo 
revolucionou as ciências do comportamento, dando novas perspectivas à teoria 
antropológica. 
O CONFIGURACIONISMO 
Foi a quarta escola teórica antropológica a se desenvolver. É considerada um 
prolongamento do difusionismo norte-americano, por estar voltada igualmente para as 
culturas particulares, embora variando em métodos e enfoques. O destaque dessa 
escola é para a integração e a singularidade do todo, que constituem seus elementos 
básicos de interesse. Também ficou conhecida por dar um tratamento “psicológico” ou 
“tipológico” ao comportamento cultural. 
Roteiro de Estudos Antropologia – II Unidade 
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CONCEITO: Configuracionismo é a “combinação de diversos traços e complexos que 
integram um sistema de cultura de uma área em um momento dado, que depende da 
presença ou ausência de uns ou outros elementos da cultura e da maneira como os 
mesmos se encontram unidos” (Fairchild, 1949: 59-60). 
No entendimento dos configuracionistas, a cultura seria um conjunto integrado de 
elementos culturais encontrados em determinado tempo e espaço, cujas partes devem 
estar de tal modo entrelaçadas que formem um todo coeso e uniforme, pois, se uma 
das partes for afetada, automaticamente 
afetará as demais. 
PRINCIPAIS REPRESENTANTES 
Edward Sapir, primeiro a empregar a 
expressão configuracionismo inconsciente 
em estudos de linguagem. Defendeu que a 
configuração nem sempre é comunicada à 
mente, mas dá à cultura um feitio próprio. 
Todo comportamento cultural é simbólico, 
tendo como base os “sentidos” que são 
compreendidos e comunicados entre os 
diferentes elementos de uma sociedade, 
mesmo de forma inconsciente. 
Para Sapir, as culturas não são entidades 
verdadeiramente objetivas, mas sim 
configurações abstratas de ideias e padrões 
de ação, que têm significados infinitamente 
diferentes para os vários indivíduos do grupo. 
A cultura, portanto, é mais uma “idéia” e 
menos uma “coisa”, apesar de ter uma 
existência concreta. Sapir dava à cultura, à 
sociedade e ao comportamento uma nova perspectiva, quase lhes atribuindo uma 
personalidade. 
Ruth Benedict, no livro Padrões de cultura, declarava que “uma cultura, como um 
indivíduo, é um modelo mais ou menos consciente de pensamento e ação. Dentro de 
cada cultura surgem objetivos característicos não necessariamente partilhados por 
outros tipos de sociedade. Em obediência a esses objetivos, cada povo consolida cada 
vez mais a sua experiência, leva os heterogêneos aspectos de comportamento a 
assumirem formas cada vez mais congruentes”. 
Por ex.: uma região deve ser observada como uma configuração de instituições, 
costumes, tradições, meios de transporte etc., dentro de uma certa área geográfica, 
com um caráter próprio. 
A integração das configurações e sua maior ou menor coesão dependem da vitalidade 
e do funcionamento da cultura, medido em termos de sua eficácia. Como a 
configuração é um todo funcional, formado por partes em reciprocidade de ação, a 
cultura não pode ser entendida como simples soma dos elementos, ou análises de 
cada parte (como faziam os funcionalistas). Ela deve ser vista no conjunto, como um 
todo uniforme e operante. 
O Configuracionismo aceitava o conceito de difusão de traços e complexos culturais, 
mas ao estudar esse aspecto dava destaque aos elementos psicológicos que 
interferem no processo. Certos elementos são selecionados com base no interesse 
que despertam. A partir do todo, aceitam-se os elementos que podem ser úteis, 
rejeitando-se os que não se encaixam no contexto. Os empréstimos culturais são 
 
Ruth Benedict 
 
Roteirode Estudos Antropologia – II Unidade 
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readaptados de acordo com a necessidade do grupo em pauta, visando a sua 
integração, processo que não é necessariamente consciente. 
Entre as contribuições positivas mais importantes do Configuracionismo estavam: 
a) Emprego de conceitos como configurações, padrões de cultura total, 
propósitos, molas mestras, objetivos, orientações etc.; 
b) Desenvolvimento da ideia de que todo comportamento cultural é simbólico; 
c) Investigação concreta de casos culturais; 
d) Empréstimo de conceitos psicológicos de Nietzsche e Spengler, classificando 
os tipos de cultura em apolínea (ou introvertida) e dionisíaca (extrovertida). 
 
PARTE 7 - ESTRUTURALISMO 
A escola estruturalista é a mais recente. Seu ideário básico desenvolveu-se 
paralelamente ao funcionalismo, alcançando o apogeu nas décadas de 1940 e 50. Do 
mesmo modo, é importante ressaltar que as duas teorias tiveram vários elementos 
comuns, e que Radcliffe-Brown utilizou com frequência o termo estrutura, embora com 
sentido diferente do de Lévi-Strauss. Adotou sempre posições subjetivas. 
Pontos convergentes entre o Funcionalismo e o Estruturalismo: 
1. Visão sincrônica da cultura; 
2. Visão sistêmica e globalizante do fenômeno cultural; 
3. Adoção do termo estrutura; 
4. Influências da escola francesa. 
O criador da teoria estruturalista foi o belga radicado na França Claude Lévi-Strauss, 
que atuou na criação da área de Ciências Sociais da Universidade de São Paulo. No 
Brasil, ele desenvolveu pesquisas de campo fundamentais para o desenvolvimento de 
seu trabalho. A preocupação básica de Lévi-Strauss se voltava mais para a mente 
humana do que para a organização da sociedade – de onde o alto grau de 
subjetividade da teoria. 
A abordagem estruturalista teve início com os estudos 
linguísticos de Ferdinand de Saussurre e Roman 
Jakobson. Lévi-Strauss tomou por base o modelo de 
análise estrutural de Saussurre para estudar 
Antropologia. Para ele, era fundamental que a estrutura 
social não se confundisse com a realidade empírica. 
Essa estrutura seria sempre um modelo construído A 
PARTIR das relações sociais e que serviria para 
estudar estas relações. 
A estrutura é um sistema que reflete a realidade social 
ou cultural, seu funcionamento, as alterações regulares 
a que está sujeita, o rumo das transformações 
provocadas por fatores externos à cultura, e as 
previsões de reação quando alguma de suas partes é 
afetada. 
Os elementos componentes da análise estrutural, na 
visão de Lévi-Strauss, seriam sempre elaboradas a partir de pares dialéticos. A lógica 
individual de cada um, portanto, seria produto de uma “negociação”, em que uma 
certeza e uma dúvida, por exemplo, estariam em permanente relação para produzir 
 
Claude Lévi-Strauss 
 
Roteiro de Estudos Antropologia – II Unidade 
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uma síntese que serviria de fundamento ao conceito adotado pela cultura. A 
possibilidade eventual de mudança estaria condicionada a essa mediação dialética. 
Na definição de Lévi-Strauss: “...para merecer o nome de estrutura, os modelos 
devem, exclusivamente, satisfazer a quatro condições: 
Em primeiro lugar, uma estrutura oferece um caráter de sistema. Ela consiste em 
elementos tais que uma modificação qualquer de um deles acarreta uma modificação 
em todos os outros. 
Em segundo lugar, todo modelo pertence a um grupo de transformações, cada uma 
das quais corresponde a um modelo da mesma família, de modo que o conjunto 
destas transformações constitui um grupo de modelos. 
Em terceiro lugar, as propriedades indicadas acima permitem prever de que modo 
reagirá o modelo, em caso de modificação de um de seus elementos. 
Enfim, o modelo deve ser construído de tal modo que seu funcionamento possa 
explicar todos os fatos observados”. 
Para ele, não é a maneira como os homens veem a realidade (cultural ou natural) que 
importa verdadeiramente, mas o modo pelo qual se pode explicar a sua maneira de 
ver e de agir por uma realidade mais profunda, que lhes é bem difícil entender. É esta 
realidade que se encontra delineada nos “pares dialéticos” que formam o modelo 
estrutural. 
Lévi-Strauss adotou elaborações teóricas importantes de autores como Freud (noção 
de inconsciente) e Marx (conceito de ideologia). Entre as temáticas que analisou com 
maior profundidade estava natureza e história, culturas simples e complexas e 
modelos conscientes e inconscientes.

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