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UNIVERSIDADE TECNOLÓGICA FEDERAL DO PARANÁ CURSO DE ENGENHARIA QUÍMICA CURSO SOBRE A CIÊNCIA DOS MATERIAIS Prof. Dr. Márcio Eduardo Berezuk APUCARANA 2015 A CIÊNCIA DOS MATERIAIS Ementa: 1. Introdução à Ciência dos Materiais. Classificação dos Materiais e Seleção de Materiais. 2. Fundamentos dos Materiais: Os estudos sobre a Estrutura Cristalina de Materiais. A Difração de Raios-X e identificação da Estrutura Cristalina em Sólidos. Os defeitos do cristal e estrutura não cristalina. A observação de defeitos por Microscopia Ótica e Eletrônica. A difusão em sólidos. 3. Propriedades dos Sólidos: Comportamento mecânico e térmico. O Diagrama de Fases e o sistema Ferro-Carbono. Curvas de resfriamento para materiais metálicos. Tratamento térmico de materiais metálicos. 4. Processamentos Industriais: Processamento de materiais metálicos. Principais estruturas dos materiais cerâmicos. Propriedades mecânicas dos materiais cerâmicos. Estrutura de materiais poliméricos. Processamento de materiais poliméricos. Bibliografia: SHACKELFORD, James F. Ciência dos Materiais, 6.ed., São Paulo: Pearson Education do Brasil, 2008. CALLISTER, W. D. Ciência e Engenharia de Materiais – Uma Introdução, 7.ed., Editora LTC, 2008. ASKELAND, Donald R.; WRIGHT, Wendelin J. Ciência e Engenharia dos Materiais, 3.ed., São Paulo: Cengage Learning, 2014. VAN VLACK, L.H. Princípios de ciência e tecnologia dos materiais. 5. ed. Rio de Janeiro, RJ: Campus, 1993. SMITH, W.F. Princípios de ciência e engenharia dos materiais. 3. ed. Lisboa: McGraw- Hill,1998. NUNES, L.P.; KREISCHER, A.P. Introdução à metalurgia e aos materiais metálicos. Rio de Janeiro: Interciência, 2010. CARTER, C.B.; NORTON, M.G. Ceramic materials: science and engineering. 2nd. ed. New York, US: Springer, 2013. MARINICCI, G. Materiais compósitos poliméricos: fundamentos e tecnologia. São Paulo: Artliber, 2011. Objetivos Conhecer e estudar as propriedades dos materiais, o comportamento das suas estruturas cristalinas, verificar o diagrama de fases de soluções sólidas e estudar os principais processamentos industriais dos materiais metálicos, cerâmicos e poliméricos. SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 1 1.1 Classificação dos Materiais............................................................................. 4 1.2 Da Estrutura às Propriedades ......................................................................... 7 1.3 Processamento de Materiais......................................................................... 11 1.4 Seleção de Materiais .................................................................................... 11 2. ESTUDOS SOBRE A ESTRUTURA CRISTALINA DOS MATERIAIS ................. 12 2.1 Ordens de Curto Alcance e Ordem de Longo Alcance .................................. 13 2.2 Redes, Células Unitárias, Bases e Estruturas Cristalinas ............................. 15 2.2.1 Número de Átomos por Célula Unitária .................................................. 17 2.2.2 Raio Atômico e Parâmetros de Rede ..................................................... 20 2.2.3 Número de Coordenação....................................................................... 21 2.2.4 Fator de Empacotamento ...................................................................... 22 2.2.5 Densidade ou Massa Específica ............................................................ 23 2.2.6 A Estrutura Hexagonal Compacta .......................................................... 23 2.3 Redes, Células Unitárias, Bases e Estruturas Cristalinas ............................. 24 2.3.1 Direções na Célula Unitária ................................................................... 25 2.3.2 Distância de Repetição, Densidade Linear e Fração de Empacotamento .. .............................................................................................................. 27 2.3.3 Planos na Célula Unitária ...................................................................... 28 2.3.4 Distância Interplanar .............................................................................. 31 3. IMPERFEIÇÕES NOS ARRANJOS ATÔMICOS ................................................ 35 3.1 Defeitos Pontuais .......................................................................................... 36 3.2 Defeitos Lineares ou Discordâncias .............................................................. 39 3.3 Defeitos Planares – Imperfeições bidimensionais ......................................... 41 3.4 Sólidos Não-Cristalinos – imperfeições tridimensionais ................................ 43 3.5 Microscopia Óptica e Eletrônica .................................................................... 44 4. PROPRIEDADES DOS SÓLIDOS: COMPORTAMENTO MECÂNICO ............... 47 4.1 Tração: A Curva Tensão-Deformação .......................................................... 48 4.1.1 Limite de Escoamento ........................................................................... 51 4.1.2 Limite de Resistência à Tração .............................................................. 53 4.1.3 Propriedades Elásticas .......................................................................... 54 4.1.4 Ductilidade ............................................................................................. 56 4.1.5 Efeito da Temperatura ........................................................................... 57 4.1.6 Ensaio de Flexão de Materiais Frágeis .................................................. 59 4.1.7 Dureza dos Materiais ............................................................................. 61 4.2 Os Testes de Impacto ................................................................................... 63 4.2.1 Temperatura de Transição Dúctil-Frágil ................................................. 65 4.2.1.1 Relação com a Curva Tensão-Deformação ........................................ 66 5. O DIAGRAMA DE FASES: UM POUCO DE TERMODINÂMICA......................... 67 5.1 A Regra das Fases ....................................................................................... 67 5.2 O Diagrama de Fases ................................................................................... 70 5.2.1 Solução Sólida Completa....................................................................... 70 5.2.2 Diagrama Eutético sem Solução Sólida ................................................. 72 5.2.3 Diagrama Eutético com Solução Sólida Limitada ................................... 74 5.2.4 Diagrama Eutetóide ............................................................................... 75 5.2.5 Diagrama Peritético ............................................................................... 76 5.3 A Regra da Alavanca .................................................................................... 78 5.4 O Diagrama de Fases Ferro-Carbono ........................................................... 84 6. OS MATERIAIS METÁLICOS ............................................................................. 86 6.1 Os Aços ........................................................................................................ 88 6.1.1 Aços: O Efeito da Temperatura.............................................................. 92 6.1.2 Aços: O Efeito do ambiente de utilização ............................................... 93 6.2 Os Aços Liga ................................................................................................94 6.2.1 Aços Liga: Molibdênio e Cromo-Molibdênio ........................................... 94 6.2.2 Aços Liga: Níquel................................................................................... 98 6.2.3 Aços Liga: Aço Inoxidável ...................................................................... 99 6.3 Os Ferros Fundidos (FoFo)......................................................................... 101 6.3.1 Ferro Cinzento ..................................................................................... 102 6.3.2 Ferro Nodular ...................................................................................... 103 6.3.3 Ferro Branco e Ferro Maleável ............................................................ 104 6.3.4 Ferro Vermicular .................................................................................. 105 6.4 As Ligas não Ferrosas ................................................................................ 106 6.4.1 Ligas de Cobre .................................................................................... 106 6.4.2 Ligas de Níquel .................................................................................... 108 6.4.3 Ligas de Titânio ................................................................................... 110 6.5 Os Tratamentos Térmicos dos Metais ........................................................ 111 6.5.1 O Diagrama TTT .................................................................................. 111 6.5.2 Fatores que influenciam nos tratamentos ............................................ 114 6.5.3 Recozimento ........................................................................................ 116 6.5.4 Normalização ....................................................................................... 118 6.5.5 Têmpera .............................................................................................. 119 6.5.6 Revenido ............................................................................................. 120 6.6 Os Tratamentos Termoquímicos dos Metais ............................................... 121 7. OS MATERIAIS POLIMÉRICOS ....................................................................... 129 7.1 A Estrutura Molecular dos Polímeros .......................................................... 133 7.2 A Classificação dos Polímeros .................................................................... 134 7.3 Copolímeros ............................................................................................... 135 7.4 Síntese dos Polímeros ................................................................................ 137 7.5 A Conformação de Materiais Poliméricos ................................................... 141 7.5.1 A Moldagem ........................................................................................ 142 7.5.2 Fabricação de Fibras ........................................................................... 147 7.5.3 Fabricação de Filmes .......................................................................... 148 8. OS MATERIAIS CERÂMICOS .......................................................................... 149 8.1 Os Silicatos ................................................................................................. 151 8.2 Os Tipos de Cerâmicas .............................................................................. 155 8.2.1 Os Vidros ............................................................................................. 155 8.2.2 As Vitrocerâmicas ................................................................................ 158 8.2.3 As Argilas e Louças ............................................................................. 160 8.2.4 Cerâmicas Refratárias ......................................................................... 161 8.2.5 Cerâmicas Abrasivas ........................................................................... 162 8.2.6 Cimentos ............................................................................................. 163 8.3 A Fabricação e Processamento das Cerâmicas.......................................... 164 8.3.1 Conformação do Vidro ......................................................................... 164 8.3.2 Técnicas de Fabricação de Argilas ...................................................... 167 8.3.3 Secagem de Argilas ............................................................................. 169 8.3.4 Cozimento / Calcinação de Argilas ...................................................... 170 1 1. INTRODUÇÃO A Ciência e a Engenharia dos Materiais é um campo interdisciplinar que estuda e manipula a composição e a estrutura de materiais utilizando escalas de proporção, a fim de controlar as propriedades dos materiais através da síntese e do processamento. O termo composição indica a constituição química de um material. O termo estrutura se refere à descrição detalhada do arranjo de átomos. O termo síntese se refere ao modo como os materiais são feitos, a partir de quais substâncias químicas naturais ou sintéticas são utilizados. O termo processamento diz respeito ao modo como os materiais são transformados em componentes úteis e com propriedades adequadas. Desta forma, a Ciência dos Materiais concentra-se nos fundamentos científicos da correlação entre síntese e processamento, microestrutura e propriedades dos materiais. A Engenharia dos Materiais desenvolve modos de converter e transformar materiais em dispositivos ou estruturas úteis. POR QUE ESTUDAMOS OS MATERIAIS? Inúmeros equipamentos de uso industrial e também pessoal foram desenvolvidos graças ao entendimento dos materiais que oferecem utilidades aos seres humanos. Necessitamos de materiais que ofereçam resistência, sejam dúcteis, sejam leves, sejam pesados, conduzam eletricidade, calor, sofram menos corrosão, aguentem altas temperaturas e pressões, aguentem à fadiga, aos impactos, sejam baratos, sejam abundantes, entre outros. Um conhecimento prévio dos materiais pode dar ao profissional da Química uma maior visão sobre as necessidades industriais de equipamentos de processo. 2 Os materiais a serem estudados nesta disciplina destinam-se à construção de equipamentos de processos das indústrias químicas, petroquímicas, farmacêuticas, alimentícias e correlatas, entre eles: Vasos de pressão: colunas de destilação ou absorção, reatores, tanques de processo para líquidos, etc.; Figura 1 – Sistema de destilação industrial, reator batelada e tanque para cozimento de grãos. Caldeiras; Figura 2 – Caldeira a óleo. Trocadores de Calor (TC): aquecedores, resfriadores, evaporadores, condensadores, etc.; 3 Figura 3 – Trocadores de calor a Placas e Tubular, evaporador e condensador industrial. Fornos, tanques de armazenamento e tubulações em geral; Figura 4 – Fornos, pátio de tanques e tubulações. Peças, conexões, válvulas e encaixes; 4 Figura 5 – Peças e conexões. 1.1 Classificação dos Materiais Há várias formas de classificação dos materiais (Tabela 1). Uma delas está descrita como: 1. Metais e Ligas; 2. Cerâmicas e Vidros; 3. Polímeros; 4. Materiais Compósitos; 5. Semicondutores. Os materiais de cada um desses grupos apresentam estruturas e propriedades distintas. Como os materiais são amplamente usados em aplicações estruturais, suas propriedades mecânicas são de grande interesse prático. Seguemos seus termos: Tensão: refere-se à carga mecânica ou força por unidade de área. Deformação: significa o alongamento ou a alteração de dimensão dividida pela dimensão original. A aplicação da tensão causa a deformação. Caso a deformação desapareça após ser removida a carga ou a tensão aplicada, diz-se que a deformação é elástica. Se a deformação permanecer após ser removida a tensão, a deformação é plástica. Quando a deformação é elástica, tensão e deformação estão linearmente relacionadas, e o coeficiente angular da reta tensão-deformação deste trecho é conhecido como módulo de elasticidade. 5 A tensão necessária para iniciar uma deformação plástica é denominada limite de escoamento. A deformação percentual máxima que se pode obter é uma medida da ductilidade de um material. Tabela 1 – Aplicações, propriedades e exemplos para cada categoria de materiais. Metais e Ligas Incluem aços, alumínio, magnésio, zinco, ferro fundido, titânio, cobre, níquel etc. Uma liga é um metal que contém adições de um ou mais metais ou não metais. Os metais e ligas possuem alta resistência mecânica, alta rigidez, boa ductilidade (deformação extensa e permanente) e resistência a choques mecânicos. A Figura 6 mostra os elementos químicos da tabela periódica, dentre eles os metais. 6 Figura 6 – A Tabela Periódica e os metais. Cerâmicas e Vidros São os materiais mais naturais que existem. A areia, as rochas, a argila, os minerais são exemplos de cerâmicas em estado natural. No entanto, se estes materiais naturais são refinados, processados ou sintetizados, têm-se materiais muito avançados como: catalisadores químicos, microchips, sensores, capacitores, isolantes elétricos, revestimentos de turbinas, dentre tantos outros. Estão em diversos produtos de consumo como tijolos, louças, vasos sanitários, tintas e revestimentos, refratários e abrasivos. Os materiais cerâmicos geralmente não são bons condutores de calor, por isso, bons isolantes. Porém possuem altos pontos de fusão. Possuem características de alta dureza e resistência, mas ao mesmo tempo, são frágeis. Apesar de serem considerados muitas vezes materiais inorgânicos cristalinos, os vidros são amorfos e derivados de líquido fundido. No entanto, materiais vítreos que passam por processo de nucleação de cristais por processos térmicos tornam-se cristalinos e recebem o nome de vitrocerâmicas, apresentando propriedades diferentes. Polímeros São materiais orgânicos produzidos por um processo denominado polimerização. Unidades repetidoras de polímeros, os monômeros, passam por reações 7 químicas entre si, crescendo a cadeia de polímeros e formando os materiais. Os polímeros são materiais muito versáteis como ser bons isolantes térmicos e elétricos, baixa resistência mecânica, porém com boa relação resistência-peso. Geralmente não possuem uso adequado a altas temperaturas podendo se deteriorar ou se liquefazer. São materiais fantásticos, importantes para o advento da tecnologia moderna como: telas de cristais líquidos (LCD), roupas, peças em geral, polímeros “verdes”, de forma barata e abundante. Compósitos Com as propriedades dos materiais metálicos, poliméricos e cerâmicos devidamente conhecidos, há um segmento da ciência de materiais que estuda a junção entre estas três classes de compostos na formulação de uma quarta classe, denominada materiais compósitos. Desta forma, materiais especiais são formados e muito utilizados no mundo inteiro como: o concreto, compensados e fibras de vidro e fibras de carbono. Geralmente busca-se materiais mais leves e mais resistentes. Semicondutores São materiais formados por um pequeno grupo de elementos químicos que possuem características de semicondutividade, ou seja, são elementos que conduzem eletricidade de forma intermediária em comparação aos demais, desta forma geralmente não são bons condutores elétricos e nem isolantes elétricos, possuem característica elétrica mediana. Em alguns semicondutores, pode-se controlar o grau de condutividade elétrica, de modo que possibilite a fabricação de componentes eletrônicos empregados em circuitos integrados. 1.2 Da Estrutura às Propriedades Para poder entender as propriedades ou características dos materiais é necessário entender sua estrutura em uma escala atômica e/ou microscópica. As ligações químicas nos mostram uma arquitetura associada a escalas diminutas, atômicas. Por exemplo, a Figura 7 nos mostra claramente que existem os mesmos materiais cerâmicos construídos molecularmente na forma arranjada (cristalina) e de forma desarranjada (amorfa), o que traz características diferenciadas entre os mesmos materiais químicos. 8 Figura 7 – Comparação de estruturas a) cerâmica (cristalina) e b) vidro (amorfo). Também se pode observar a natureza de escala microscópica que, mesmo de proporções diminutas não se pode comparar com a escala atômica. A Figura 8 apresenta o material compósito de fibras de vidro, que tem uma matriz polimérica reforçadas com vidro, claramente identificado pela imagem mostrada. Figura 8 – Compósito de fibra de vidro em escala microscópica. Vejamos dois exemplos de comparação: um de escala atômica e outro de escala microscópica. Frequentemente, o engenheiro de materiais se depara com a necessidade de produzir materiais que precisar ser dúcteis e outros, frágeis. As ligas de alumínio são tipicamente dúcteis e as de magnésio são normalmente frágeis. Essa diferença crucial se relaciona diretamente com as suas estruturas cristalinas. Pela Figura 9, pode-se observar que a liga de alumínio segue arranjo cúbico e a do magnésio, um arranjo hexagonal. A estrutura cúbica do alumínio permite 4 vezes mais deformação mecânica comparada com a do magnésio, e isto tem a ver com a sua geometria de ligações 9 químicas destas estruturas. Estas informações só são possíveis graças aos estudos em ordem atômica dos materiais. Figura 9 – Comparação das estruturas cristalinas para a) alumínio e b) magnésio. A Figura 10 apresenta dois entalhes (liga de alumínio e de magnésio) para análise em um extensômetro. Figura 10 – Contraste no comportamento mecânico do a) alumínio e b) magnésio resultantes da estrutura em escala atômica, em um extensômetro. Como análise em escala microscópica, pode-se verificar que a cerâmica formada de óxido de alumínio (alumina) pode ser capaz de ser um material opaco e também translúcido, depende do jeito ao quais estes materiais são formados. A cerâmica convencional e opaca do óxido de alumínio é produzida pelo aquecimento de pós cristalinos a altas temperaturas até que se seja formado um produto forte e denso. Realizada desta forma, o material apresenta uma porosidade 10 relativamente grande, correspondente ao espaço aberto entre as partículas de pó originais antes do processamento em alta temperatura. Esta porosidade leva à perda da transmissão de luz visível, dispersando a luz. Se eliminarmos a formação da porosidade ou diminuirmos bastante, o material pode passar a ser translúcido ou transparente. Adicionando 0,1% de MgO em peso no processamento faz com que o processo de densificação em alta temperatura para o pó de Al2O3 se completasse, praticamente eliminando a presença de poros na estrutura. Na Figura 11, pode-se verificar este fato, observando as estruturas microscópicas. Figura 11 – Microestrutura porosa no Al2O3 policristalino a e b) material opaco c e d) quase sem porosidade resultando e translúcido. A obtenção de um materialfeito de Al2O3 de forma transparente foi muito importante para melhorar a tecnologia de lâmpadas, principalmente a de sódio que trabalha a uma temperatura de 1000 C, porém oferece iluminação substancialmente maior que as lâmpadas convencionais (100 lúmens/W em comparação com 15 Lúmens/W). Assim, veja como é importante os estudos das propriedades dos materiais que, neste caso, está diretamente ligado à estrutura das substâncias (Figura 12). Figura 12 – Lâmpada de vapor de sódio em alta temperatura, que se tornou possível pelo uso de um cilindro de Al2O3 translúcido para conter o vapor de sódio. 11 1.3 Processamento de Materiais O uso de materiais na tecnologia moderna depende de nossa capacidade de fabricá-los. O tópico sobre processamento de materiais tem duas funções. A primeira é oferecer uma compreensão maior da natureza de cada tipo de material. A segunda, e mais importante, é oferecer uma apreciação dos efeitos do histórico do processamento nas propriedades. 1.4 Seleção de Materiais “Que material se seleciona para determinada aplicação?” Esta pergunta é muito comum para a produção de materiais. A seleção prévia dos materiais para confeccionar os equipamentos de processos é um dos problemas mais difíceis que o projetista se defronta, devido à grande possibilidade de opções e características que o processo exige dos materiais. Por exemplo: Um cilindro de gás comercial. Primeiramente deve-se perguntar qual tipo geral de material é apropriado? Metal, Cerâmica, Polímero? Segundo, o melhor material específico dentro desta categoria deverá ser encontrado. Um cilindro de gases tem que oferecer capacidade de retenção dos gases a pressões de até 200 Kgf/cm2 por períodos indefinidos. Neste caso, materiais poliméricos já são rejeitados inicialmente por geralmente oferecerem resistências mecânicas baixas. Semicondutores também são rejeitados por não terem função alguma para este caso. As cerâmicas estruturais podem suportar a carga de serviço prevista, mas geralmente elas deixam de oferecer a ductilidade necessária para sobreviver ao manuseio prático. O uso de um material frágil em um processo que contenha pressão pode ser extremamente perigoso. Neste caso, fica fácil perceber que os metais são fortes candidatos por oferecer resistência mecânica e ductilidade compatível para o objeto, mas os compósitos reforçados com fibra também podem satisfazer os requisitos exigidos. Neste caso, um terceiro critério é exigido, o custo, o que eliminarão o suo de materiais compósitos, pois o processo de fabricação destes materiais é mais custoso que fabricar o cilindro com ligas metálicas, a não ser que haja uma vantagem especial 12 que justifique o custo. O peso reduzido do cilindro é certamente uma vantagem especial. A Figura 13 ilustra uma sequência de escolhas necessárias para selecionar um tipo de material. Figura 13 – a) Sequência de escolhas que levam à seleção de metal como tipo de material apropriado para a construção de um cilindro de gás comercial. b) Cilindro de gás comercial. Além disso, outras características de ajuste devem ser observadas: Sua tolerância à corrosão, ao pH, à explosividade, à toxidez, à incrustação, flamabilidade ...; Fatores relativos à fabricação dos equipamentos tipos de aços, ligas metálicas, soldabilidade, usinabilidade, etc.; Segurança, tempo de vida útil. Desta forma, o projeto de materiais acaba sendo definido no intuito de satisfazer todas as necessidades do objeto formado e o seu uso industrial. 2. ESTUDOS SOBRE A ESTRUTURA CRISTALINA DOS MATERIAIS Tendo as categorias de materiais já apresentadas, agora deve-se caracterizar os materiais. Deve-se estudar a estrutura química em escala atômica afim de conhecer se sua estrutura é cristalina ou não-cristalina (amorfa). A estrutura cristalina deve ser entendida como uma regularidade segundo a qual os átomos ou íons estão arranjados uns em relação aos outros. Desta forma, um 13 material dito como cristalino é um material em que os átomos estão posicionados de uma forma arranjada, organizada e repetitiva ao longo de toda a sua extensão. 2.1 Ordens de Curto Alcance e Ordem de Longo Alcance Primeiramente, alguns elementos químicos não se enquadram em nenhuma destas ordens de alcance, ou seja, são elementos denominados sem ordem de alcance que são: os gases monoatômicos (como o argônio) ou o plasma criado no interior de lâmpadas fluorescentes. Ordem de Curto Alcance Um material terá ordem de curto alcance se o arranjo espacial dos átomos se estenderem apenas aos vizinhos mais próximos de cada átomo. Ex: a água no estado vapor. A molécula da água (H2O) possui ligações covalentes entre os átomos de hidrogênio e de oxigênio e estas ligações possuem ângulos regulares de 104,5, no entanto, não existe um arranjo espacial entre as outras moléculas de água vizinhas. Outro exemplo é o vidro silicato, que possui a estrutura regular tetraédrica (SiO4)4- com ângulo de ligação e distância atômica bem definidas, porém todas as unidade tetraédricas individuais são agrupadas aleatoriamente, criando estruturas que não possuem um arranjo regular como um todo, apenas individualmente. Neste caso, temos estruturas de ordem de curto alcance, ou mais conhecidas estruturas amorfas. A Figura 14 mostra os níveis de arranjo atômicos dos materiais. Figura 14 – Níveis dos arranjos atômicos dos materiais. A) gases inertes monoatômicos, b e c) molécula da água ou gás nitrogênio e sílica amorfa, d) Metais e ligas, cerâmicas e alguns polímeros. 14 Ordem de Longo Alcance A maioria de metais e ligas, como semicondutores, cerâmicas e alguns polímeros possui estrutura cristalina na qual os átomos ou íons apresentam ordem de longo alcance. Assim, verifica-se que a estrutura atômica espacial estende-se a distâncias bem maiores (acima de 100 nm), estando em forma repetitiva, regular e tridimensional. Tais materiais são denominados cristalinos. Os materiais cristalinos podem ser formados por um único cristal (monocristal) ou por policristais. Os monocristais são considerados estruturas cristalinas quase perfeitas e possui características particulares muito úteis à sociedade atual, como aplicações eletrônicas e ópticas. Um exemplo são os chips de computador, feitos de silício na forma de grandes cristais individuais de até 300 nm de diâmetro. Pedras preciosas também estão neste seleto grupo de materiais. Os materiais policristalinos são compostos por várias pequenas regiões com diferentes orientações espaciais. Estes cristais são conhecidos como grãos e as fronteiras destes grãos em que há desalinhamento entre os cristais são chamados de contornos de grãos. Um exemplo são os materiais de aço que apresentam diversas microestruturas policristalinas (Figura 15). Para detectar e medir a ordem de longo alcance em materiais cristalinos pode- se utilizar a técnica da difração de raios-x, em equipamentos de laboratório. Figura 15 – A) Cristal individual de silício na forma de lingote, b) Micrografia de aço inoxidável policristalino. A B 15 2.2 Redes, Células Unitárias, Bases e Estruturas Cristalinas A ordenação dos átomos nos sólidos cristalinos indica que pequenos grupos de átomos formam um padrão repetitivo. Assim, torna-se evidente subdividir a estrutura em pequenas entidades denominadas de células unitárias. A célula unitária é a menor estrutura química cristalina e base para a repetição tridimensional (Figura 16).Figura 16 – Geometria de uma célula unitária geral. Na natureza, apenas existem 7 formas exclusivas para preencher o espaço tridimensional, denominados assim como Sistemas Cristalinos. Também define-se uma rede como um conjunto de pontos denominados pontos de rede sendo o local espacial onde os átomos irão dispor na estrutura de célula unitária. Em muitos casos, os pontos de rede são representados por esferas e situam- se, por exemplo, nas arestas do objeto geométrico formado pela célula unitária. Um número limitado de apenas 14 posições diferentes existe na natureza, conhecida como as 14 redes de Bravais. Os parâmetros de rede são os comprimentos ou dimensões axiais da célula unitária e por convenção, são denominados como a, b e c. Os ângulos entre os comprimentos axiais, conhecidos como ângulos interaxiais são representados pelas letras gregas , e . A Figura 17 e 18 apresentam os sistemas cristalinos e as redes de Bravais. 16 Figura 17 – Os sete sistemas cristalinos. 17 Figura 18 – As 14 redes de Bravais. 2.2.1 Número de Átomos por Célula Unitária Cada célula unitária contém um número de pontos de rede. Ao se contar o número de pontos de rede pertencentes a cada célula unitária, esses pontos podem ser compartilhados por mais de uma célula unitária. Considerando uma estrutura cúbica com 8 vértices, fica claro perceber que cada vértice pode compartilhar 8 células e, desta forma, 1/8 do volume do átomo de cada vértice pertence a uma céulua específica. Assim: ( 1/8 𝑝𝑜𝑛𝑡𝑜 𝑑𝑒 𝑟𝑒𝑑𝑒 𝑣é𝑟𝑡𝑖𝑐𝑒 ) ( 8 𝑣é𝑟𝑡𝑖𝑐𝑒𝑠 𝑐é𝑙𝑢𝑙𝑎 ) = ( 1 𝑝𝑜𝑛𝑡𝑜 𝑑𝑒 𝑟𝑒𝑑𝑒 𝑐é𝑙𝑢𝑙𝑎 𝑢𝑛𝑖𝑡á𝑟𝑖𝑎 ) Os vértices contribuem com 1/8 de ponto, as faces contribuem com ½ e as posições de corpo centrado contribuem com 1 ponto inteiro. A Figura 19 mostra as estruturas das células unitárias de cúbica simples (CS), cúbica de corpo centrado (CCC) e cúbica de faces centradas (CFC). 18 Figura 19 – Compartilhamento de átomos de face e de vértice, a) modelo cúbica simples, de corpo centrado e de faces centradas. Exemplo 1 – Determinação do número de pontos de rede em sistemas cristalinos cúbicos. 19 Exemplo 2 – A estrutura do cloreto de sódio. 20 2.2.2 Raio Atômico e Parâmetros de Rede As direções da célula unitária ao longo das quais os átomos estão em contato contínuo são as direções compactas. Em estruturas simples utilizam-se tais direções para calcular a relação entre o tamanho aparente do átomo e o tamanho da célula unitária. Após determinar geometricamente os parâmetros de rede e o número de raios atômicos ao longo dessa direção, é possível determinar a relação matemática desejada. Exemplo 3 – Determinação da relação entre raios atômicos e parâmetros de rede. 21 2.2.3 Número de Coordenação O número de coordenação corresponde ao número de átomos que está em contato com um átomo específico ou ao número de vizinhos mais próximos a esse átomo específico. Nas estruturas cúbicas que contêm apenas um átomo por ponto de rede, os átomos possuem um número de coordenação relacionado à estrutura de rede. Ao se examinar as células unitárias da Figura 20, pode-se ver que cada átomo da estrutura CS possui um número de coordenação 6, ao passo que cada átomo da estrutura CCC possui 8 vizinhos mais próximos. 22 Figura 20 – Número de coordenação em células unitárias CS (a) e CCC (b). 2.2.4 Fator de Empacotamento O fator de empacotamento ou fração de empacotamento atômico corresponde à fração do espaço ocupada por átomos, pressupondo que eles são esferas rígidas dimensionadas de forma que toquem, sempre que possível, seu vizinho mais próximo. A expressão geral do fator de empacotamento é: 𝐹𝑎𝑡𝑜𝑟 𝑑𝑒 𝐸𝑚𝑝𝑎𝑐𝑜𝑡𝑎𝑚𝑒𝑛𝑡𝑜 = (𝑛ú𝑚𝑒𝑟𝑜 𝑑𝑒 á𝑡𝑜𝑚𝑜𝑠/𝑐é𝑙𝑢𝑙𝑎)∗(𝑣𝑜𝑙𝑢𝑚𝑒 𝑑𝑒 𝑐𝑎𝑑𝑎 á𝑡𝑜𝑚𝑜) 𝑣𝑜𝑙𝑢𝑚𝑒 𝑑𝑎 𝑐é𝑙𝑢𝑙𝑎 𝑢𝑛𝑖𝑡á𝑟𝑖𝑎 (1) Exemplo 4 – Calculando o fator de empacotamento. 23 2.2.5 Densidade ou Massa Específica Pode-se calcular a densidade teórica de um material utilizando as propriedades da estrutura cristalina. A fórmula geral é: = (𝑛ú𝑚𝑒𝑟𝑜 𝑑𝑒 á𝑡𝑜𝑚𝑜𝑠/𝑐é𝑙𝑢𝑙𝑎)∗(𝑚𝑎𝑠𝑠𝑎 𝑎𝑡ô𝑚𝑖𝑐𝑎) (𝑉𝑜𝑙𝑢𝑚𝑒 𝑑𝑒 𝑐é𝑙𝑢𝑙𝑎 𝑢𝑛𝑖𝑡á𝑟𝑖𝑎)∗(𝑛ú𝑚𝑒𝑟𝑜 𝑑𝑒 𝐴𝑣𝑜𝑔𝑎𝑑𝑟𝑜) (2) Exemplo 5 – Determinação da densidade do ferro CCC. 2.2.6 A Estrutura Hexagonal Compacta A estrutura hexagonal compacta (HC) possui uma rede hexagonal, com uma base de dois átomos do mesmo tipo: um localizado em (0,0,0) e outro em (2/3, 1/3, 1/2). Essas coordenadas são sempre frações dos comprimentos axiais a, b e c, mesmo se estes não forem iguais. A rede hexagonal tem um ponto de rede por célula unitária localizada nos vértices da célula unitária. 24 Em metais com uma estrutura HC ideal, os eixos a0 e c0 possuem razão 𝑐0/𝑎0 = √8/3 = 1,633. No entanto, a maioria dos metais varia ligeiramente deste valor teórico ideal por terem ligações mistas. Como a estrutura HC também possui o mais eficiente fator de empacotamento (0,74) e um número de coordenação 12, vários metais se organizam nesta estrutura (Figura 21). Figura 21 – Estrutura hexagonal compacta e a sua célula unitária. A Figura 22 apresenta um resumo dos estudos de célula unitária dos metais. Figura 22 – Características da estrutura cristalina de alguns metais. 2.3 Redes, Células Unitárias, Bases e Estruturas Cristalinas É possível localizar pontos na célula unitária construindo um sistema de coordenadas da Figura 23. Estas coordenadas são expressas como três distâncias separadas por vírgula. 25 Figura 23 – Coordenadas de pontos na célula unitária. Cada número refere-se à distância em relação à origem, quanto aos parâmetros de rede. 2.3.1 Direções na Célula Unitária Certas direções presentes na célula unitária são de particular importância. Os Índices de Miller referentes à direção constituem a notação abreviada que se utiliza para descrever estas direções. Veja a seguir o procedimento para se encontrar os índices de Miller referentes às direções: I. Com o auxílio de um sistema de coordenadas orientadas, determine as coordenadas de dois pontos situados nesta direção; II. Subtraia as coordenadas do ponto final das coordenadas do ponto inicial, a fim de número de parâmetros de rede percorridos na direção de cada eixo do sistema de coordenadas; III. Elimine frações por meio de divisão/multiplicação dos resultados da subtração para obter números inteiros possíveis; IV. Coloque os índices entre colchetes. Caso haja algum sinal negativo, represente-o com uma barra sobre o número. Os índices não são separados por vírgula. 26 Exemplo 6 – Determinação dos índices de Miller de direção. Observe que: Como as direções são vetores, determinada direção e seu negativo não são idênticos. De fato, [100] não equivale a [1̅00]; eles representam a mesma linha mas em sentidos opostos; Toda direção e seu múltiplo são idênticos. De fato, [100] representa a mesma direção que [200]. 27 2.3.2 Distância de Repetição, Densidade Linear e Fração de Empacotamento A distância de repetição (ou a distancia entre pontos de rede ao longo de certa posição) é outra forma de caracterizar posições. Imagine, por exemplo, a direção [110] em uma célula unitáriaCFC (Figura 24). Se começar na origem (0, 0, 0), o próximo ponto de rede estará no centro de uma face, ou seja, no local (1/2, 1/, 0). Portanto, a distância entre os pontos de rede corresponde à metade da diagonal de uma face ou: 1/2√2𝑎0. (3) No caso do átomo de cobre, que tem parâmetro de rede de 0,3615 nm, a distância de repetição é de 0,2556 nm. Figura 24 – Cálculo da distância de repetição, densidade linear e a fração de empacotamento em uma direção [110] do cobre. A Densidade Linear é o número de pontos de rede por unidade de comprimento ao longo da direção considerada. No caso do átomo de cobre, há duas distâncias de repetição ao longo da direção [110] em cada célula unitária. Como essa distância √2𝑎0 = 0,51125 𝑛𝑚, assim: 𝐷𝑒𝑛𝑠𝑖𝑑𝑎𝑑𝑒 𝐿𝑖𝑛𝑒𝑎𝑟 = 2 𝑑𝑖𝑠𝑡â𝑛𝑐𝑖𝑎𝑠 𝑑𝑒 𝑟𝑒𝑝𝑒𝑡𝑖çã𝑜 √2𝑎0 = 2 0,51125 = 3,91 𝑝𝑜𝑛𝑡𝑜𝑠 𝑑𝑒 𝑟𝑒𝑑𝑒/𝑛𝑚 (4) Agora pode-se calcular a Fração de Empacotamento de uma direção específica, ou seja, a fração realmente ocupada por átomos. Ainda no caso do cobre, no qual há um átomo localizado em cada ponto de rede, essa fração equivale ao produto da densidade linear pelo dobro do raio atômico. Na direção [110] do cobre CFC, o raio atômico 𝑟 = √2𝑎0/4 = 0,1278 𝑛𝑚. Assim: 28 𝐹𝑟𝑎çã𝑜 𝑑𝑒 𝑒𝑚𝑝𝑎𝑐𝑜𝑡𝑎𝑚𝑒𝑛𝑡𝑜 = (𝑑𝑒𝑛𝑠𝑖𝑑𝑎𝑑𝑒 𝑙𝑖𝑛𝑒𝑎𝑟) ∗ (2𝑟) (5) 𝐹𝑟𝑎çã𝑜 𝑑𝑒 𝑒𝑚𝑝𝑎𝑐𝑜𝑡𝑎𝑚𝑒𝑛𝑡𝑜 = (3,91) ∗ (2) ∗ (0,1278) = 1,0 2.3.3 Planos na Célula Unitária É muito importante também definir os planos da célula unitária como forma de orientação espacial dos cristais. Utilizam-se os índices de Miller também para os planos: I. Identificar os pontos nos quais os planos interceptam os eixos x, y e z quanto ao número de parâmetros de rede. Se o plano passar pela origem, a origem das coordenadas terá de ser deslocada para a de uma célula unitária adjacente; II. Calcular os inversos dessas intersecções; III. Eliminar as frações, mas sem arredondar para os números inteiros mais baixos; IV. Colocar os números resultantes entre parênteses (). Também, nesse caso, os índices negativos devem ser expressos com uma barra sobreposta. Não se utilizam vírgulas para separar os índices. Observe que: Os planos e seus negativos são idênticos (o que não ocorre com as direções), porque são paralelos. Portanto, (020) = (02̅0); Os planos e seus múltiplos não são idênticos (o que difere do que foi visto com as direções). Demonstra-se este fato definindo as densidades planares e frações de empacotamento planar. A Densidade Planar é o número de átomos por unidade de área, com centros situados no plano. Quanto a Fração de Empacotamento Planar é a parcela da área do plano efetivamente ocupado por tais átomos. 29 Exemplo 7 - Determinação dos índices de Miller de planos. Exemplo 8 – Calculando a densidade planar e a fração de empacotamento. 30 Exemplo 9 – Desenhando direções e planos. 31 2.3.4 Distância Interplanar A distância entre dois planos paralelos e adjacentes de átomos, com os mesmos índices de Miller, é denominada distância interplanar (dhkl). A distância interplanar em materiais cúbicos é dada pela equação geral: 𝑑ℎ𝑘𝑙 = 𝑎0 √ℎ2 + 𝑘2 + 𝑙2 (6) Em que a0 é o parâmetro de rede, e h, k e l representam os índices de Miller dos planos adjacentes. As distâncias interplanares de materiais não cúbicos se dão por expressões mais complexas. 2.4 A Difração de Raios-X como Análise de Estruturas Cristalinas Pode-se analisar a estrutura de um material cristalino utilizando as técnicas de Difração de Raios-X (DRX). Max von Laue (1879-1960) recebeu o Prêmio Nobel de Física em 1914 por sua descoberta relacionada à difração de raios X por um cristal. William Henry Bragg (1862-1942) e seu filho William Lawrence Bragg (1890-1971) receberam o Prêmio Nobel de Física em 1915 por sua contribuição à técnica de DRX. Quando um feixe de raios X de um só comprimento de onda, com a mesma ordem de grandeza das distâncias atômicas de um material, incide sobre este material, os raios X são espalhados em todas as direções. Grande parte da radiação espalhada por um átomo cancela a radiação espalhada pelo outros átomos, no entanto, os raios X que atingem certos planos cristalográficos em ângulos específicos interferem construtivamente em vez de serem anulados. Esse fenômeno recebe o nome de difração. Os raios X são difratados, isto é, o feixe é reforçado quando as condições satisfazem à Lei de Bragg. 𝑆𝑒𝑛 𝜃 = 2𝑑ℎ𝑘𝑙 (7) Em que o ângulo corresponde à metade do ângulo entre o feixe difratado e a direção original do feixe, o é o comprimento de onda dos raios X e dhkl é a distância interplanar entre os planos que provocam o reforço construtivo do feixe (Figura 25) 32 Figura 25 – Geometria para difração de raios X. O equipamento de difração de raios X é chamado de difratômetro. A Figura 26 apresenta o mecanismo da difração e o difratômetro. A) B) Figura 26 – a) Representação esquemática de um difratômetro, b) Equipamento. A Figura 27 apresenta um típico difratograma de raios X. 33 Figura 27 – Padrão de difração de uma amostra de pó de ouro. A Lei de Bragg é uma condição necessária, porém insuficiente, para a difração. Ela define a condição de difração para células unitárias consideradas primitivas, ou seja, aquelas redes de Bravais com sítio apenas nos vértices da célula unitária. As estruturas cristalinas com células unitárias não-primitivas possuem átomos em locais adicionais da rede, localizados ao longo de uma aresta, dentro de uma face ou no interior da célula unitária. Os centros de difração extras podem ocasionar difração fora de fase em certos ângulos de Bragg. Assim, parte da difração prevista por Bragg não ocorre. Desta forma a Figura 28 apresenta as regras de reflexão para as estruturas mais comuns. Figura 28 – Regras de reflexão do DRX para metais comuns. Desta forma, as estruturas CCC a difração ocorre somente quando h2 + k2 + l2 somam valores pares, ou seja, iguais a 2, 4, 6, 8, 10, ... No caso de metais CFC, ocorre interferências mais destrutivas e a soma hkl resultam em valores ora pares ora ímpares como 3, 4, 8, 11, 12, 16, ... Para determinar e identificar as medidas cristalográficas geralmente se faz tabelas contendo os valores de sen2, pela seguinte expressão: 34 𝑠𝑒𝑛2𝜃 = 2 4𝑎0 2 (ℎ2 + 𝑘2 + 𝑙2) (8) Exemplo 10 – Examinando dados obtidos com difração de raios X. 35 3. IMPERFEIÇÕES NOS ARRANJOS ATÔMICOS No capítulo anterior, verificou-se o universo dos materiais cristalinos o que representa estruturas verdadeiramente exatas, perfeitas. No entanto, o nosso mundo não é tão perfeito o que indica que imperfeições devem existir nos materiais, permitindo que falhas estruturais aconteçam. Os defeitos provêm de diversos fatores. Deve-se pensar a estrutura sólida como uma solução ao quais os átomos tem a tendência de se misturarem com maior ou com menor facilidade. Como sólidos é difícil pensar em uma mistura (como a líquida) mas ela ocorre. Para ocorrer uma mistura completa nas soluções sólidas metálicas, os dois metais devem ser muito semelhantes, conforme a Regra de Hume-Rothery: Os metais devem ter menos de 15% de diferença nos raios atômicos; Seguir a mesma tendência de estruturacristalina; Eletronegatividades semelhantes (capacidade do átomo de atrair elétrons); A mesma valência. 36 Se uma ou mais regras de Hume-Rothery forem violadas, somente uma solubilidade parcial será possível. Por exemplo, menos de 2% (porcentagem atômica) e silício é solúvel em alumínio. Observando a tabela periódica as eletronegatividades destes dois elementos são bem diferentes, indicando que houve violação da regra. 3.1 Defeitos Pontuais São descontinuidades localizadas nos arranjos atômicos ou iônicos, teoricamente considerados perfeitos, de uma estrutura cristalina. Embora pontuais esses defeitos prejudicam bastante a região cristalina das estruturas. Essas imperfeições são criadas pelo movimento dos átomos ou íons, provocado pelo aumento de energia interna decorrente de um aquecimento, ou a introdução de impurezas (intencional ou não) durante processamento do material. Impurezas são elementos ou compostos químicos que se originam de matérias-primas ou do processamento. Também pode-se entender como forma de impureza, os elementos considerados dopantes, ou seja, elementos adicionados na estrutura para garantir propriedades benéficas aos produtos oriundos do processamento. Alguns tipos de defeitos pontuais são: a lacuna (vacância), átomo intersticial, átomo substitucional, defeito de Frenckel e defeito de Schottky, conforme a Figura 29. Figura 29 – Defeitos pontuais: a) lacuna, b) átomo intersticial, c e d) átomo substitucional pequeno e grande, e) defeito de Frenckel e f) defeito de Schottky. 37 Lacuna ou Vacância É simplesmente um sítio atômico não ocupado na estrutura do cristal. As lacunas se formam em metais ou ligas metálicas durante o processos de solidificação, devido às taxas de difusão dos átomos em toda a estrutura cristalina, portanto, é função da temperatura (Figura 30). Figura 30 – Lacuna ou vacância. Átomos Intersticiais Neste defeito têm-se a presença de átomos que acabam ocupando um espaço que normalmente não é ocupado em uma célula unitária cristalina, de modo que haja um aperto espacial ao meio (Figura 31). Figura 31 – Átomo intersticial. 38 Átomos Substitucionais Neste caso, o defeito ocorre quando um átomo ou íon é substituído por um tipo diferente de átomo ou íon. Nesses casos, os átomos ou íons substitucionais ocupam as posições normais de rede. O problema são as distorções atômicas na rede provocados por estes átomos ou íons que possuem raios atômicos maiores ou menores que os raios atômicos substituídos, perturbando o cristal e criando tensões em sua vizinhança (Figura 32). Figura 32– Átomo substitucional. Defeito de Frenckel O defeito de Frenckel é um par lacuna-interstício que se forma quando um íon ou átomo salta de um ponto normal da rede para um espaço intersticial, deixando uma lacuna em seu lugar (Figura 33). Figura 33– Defeito de Franckel. 39 Defeito de Schottky O defeito de Schottky é exclusivo de materiais iônicos, sendo comumente encontrado em materiais cerâmicos. Quando lacunas ocorrem em materiais com ligações iônicas, uma quantidade idêntica de ânions e cátions deve estar ausente nas posições atômicas regulares para que a neutralidade seja preservada (Figura 34). Figura 34 – Defeito de Schottky. 3.2 Defeitos Lineares ou Discordâncias As discordâncias são imperfeições lineares em cristais. Elas ocorrem durante um processo de solidificação do material ou quando o mesmo e deformado de modo permanente. Estas discordâncias se encontram em todos os tipos de materiais, mas particularmente em materiais metálicos. São classificados em: discordância de aresta, discordância espiral ou discordância mista. Discordância de aresta Neste defeito, imagina-se um corte de parte de um cristal perfeito, afastando as duas partes e preenchendo o corte com um semipleno adicional de átomos. O símbolo deste defeito é um “T” invertido () que representa a aresta de um semipleno extra de átomos. Para preencher o contorno gráfico este defeito tem-se o Vetor de Burgers (b). Este parâmetro é simplesmente o vetor deslocamento necessário para completar uma trajetória fechada em torno do defeito (Figura 35). 40 Figura 35 – Discordância de aresta. Discordância espiral Na discordância espiral pode-se perceber uma distorção do cristal por uma distância equivalente ao espaço de um átomo (Figura 36). A discordância espiral deriva seu nome do empilhamento espiral de planos cristalinos em torno da linha de discordância. Figura 36 – Discordância espiral: a) Visão no interior de um cristal, b) vista de cima. 41 Discordância mista A maioria dos defeitos lineares nos materiais reais será mista, como mostra a Figura 37. A discordância mista tem características de aresta e espiral Figura 37 – Discordância mista: a) Visão no interior de um cristal, b) vista de cima. 3.3 Defeitos Planares – Imperfeições bidimensionais Os defeitos pontuais e os defeitos lineares são confirmações de que os materiais cristalinos não podem ser isento de falhas, pois essas imperfeições existem no interior de cada um deles. Mas também se tem de considerar que os materiais estão limitados a uma quantidade que é finita e que eles estão contidos em alguma superfície de contorno. Essa superfície, por si só, é uma ruptura do arranjo do empacotamento atômico do cristal. Podem-se listar alguns dos principais defeitos planares: Superfície Um dos contornos mais óbvios é a superfície externa, na qual termina a estrutura do cristal. Os átomos de superfície não estão ligados ao número máximo de vizinhos e encontram-se em um estado de maior energia. Para reduzir esta energia, os materiais tendem a minimizar a área total da sua superfície (Figura 38). 42 A B C Figura 38 – A) Superfície simplificada de material cristalino B) Modelo mais detalhado de uma superfície cristalina C) Micrografia de elementos cristalinos. Contorno Gêmeo ou Macla Nesta falha tem-se uma ruptura de duas regiões cristalinas estruturalmente imagens espelho entre si. Esta descontinuidade altamente simétrica pode ser produzida pela deformação e pelo recozimento (em metais) (Figura 39). A 43 B Figura 39 – A) Contorno gêmeo ou macla B) Microscopia óptica mostrando as placas de martensita dentro do grão austenístico. Contorno de Grão Nesta imperfeição tem-se uma separação assimétrica de dois pequenos grãos ou cristais que possuem orientação cristalográfica diferente. Na região do contorno (provavelmente largura de poucos átomos), existe um desalinhamento entre os átomos de um grão e de outro adjacente (Figura 40). A B Figura 40 – A) Contorno de grão de um aço carbono B) Estrutura de um contorno de grão. 3.4 Sólidos Não-Cristalinos – imperfeições tridimensionais Alguns materiais da engenharia não possuem a estrutura repetitiva, cristalina. Esses sólidos não-cristalinos, ou amorfos, são imperfeitos em três dimensões (Figura 41). 44 Figura 41 – Esquemas bidimensionais para o SiO2 A) Cristalino B) Amorfo. 3.5 Microscopia Óptica e Eletrônica A microscopia é a técnica que tem por objetivo criar uma imagem muito maior que o próprio objeto. Os primeiros equipamentos capazes de fazer esta função foram os microscópios óticos (por volta de 1860) ao qual até hoje utilizam um conjunto de lentes de vidro que focalizam feixes de luz obtendo um aumentona imagem refletida. Com o avanço da tecnologia surgiram os microscópios eletrônicos ao qual, ao invés de utilizar feixes de luz, o princípio parte na focalização de feixes de elétrons com o uso de eletroímãs (Figura 42). Figura 42 – Semelhanças de desenho entre A) um microscópio óptico e B) um microscópio eletrônico de transmissão (TEM). 45 Um dos tipos de microscópios eletrônicos mais utilizados é o Microscópio Eletrônico de Transmissão (TEM ou MET). A imagem no microscópio TEM é o resultado do contraste de difração (Figura 44). A amostra é orientada de modo que parte do feixe seja transmitida e parte seja difratada. Desta forma, qualquer regularidade cristalina existente fará com que uma fração da intensidade do feixe incidente seja difratada, levando a uma variação da luminosidade da imagem em uma tela de visualização na base do microscópio. É possível a identificação de um conjunto de defeitos pontuais (não-isolados) e verificar diversas estruturas de discordância e elementos químicos (Figura 43 e 45). Figura 43 – Imagem de SiC na forma hexagonal realizado por TEM. 46 Figura 44 – Contraste de difração. Variações estruturais na amostra fazem com que diferentes frações (I) do feixe incidente sejam difratadas, gerando variações de luminosidade da imagem em uma tela de visualização final. Figura 45 – A) Imagem do TEM em uma liga de zircônio indicando os efeitos pontuais (átomos intersticiais ou vacâncias) B) Inúmeras discordâncias em um aço inoxidável e C) contorno de grão onde as linhas paralelas identificam o contorno. 47 Outro microscópio muito utilizado é o Microscópio Eletrônico de Varredura (SEM ou MEV). Neste caso o SEM utiliza um feixe de elétrons de 1 m de diâmetro e varre repetidamente a superfície da amostra. Quando se faz a incidência dos feixes (elétrons primários), surgem os elétrons secundários – elétrons ejetados da superfície da amostra, aos quais seus sinais são observados e exibidos em uma tela (computador). A melhor característica do SEM é que a imagem é muito nítida, sendo possível observar imagem com profundidade. No entanto, possui uma ampliação menor que ao TEM (Figura 46). Figura 46 – Partículas em pó de uma liga de alumínio analisado por SEM. 4. PROPRIEDADES DOS SÓLIDOS: COMPORTAMENTO MECÂNICO Neste capítulo têm-se informações sobre o comportamento mecânico e térmico dos materiais metálicos, cerâmicos e poliméricos por meio de diversas análises físicas dos materiais. Por meio destas análises que é possível verificar qual a aplicabilidade dos materiais para seus diversos fins. Por exemplo, os materiais metálicos podem ser utilizados em diversas funções sendo as mais aplicadas a sua resistência mecânica para suporte de edifícios, pontes, equipamentos e estruturas diversas. Os materiais cerâmicos geralmente são utilizados como isolantes térmicos ou elétricos, tendo aplicações a altas temperaturas. Os materiais poliméricos são muito versáteis e 48 adquirem inúmeros formas ou objetos de uso cotidiano, no entanto, geralmente trabalham sob temperaturas amenas. 4.1 Tração: A Curva Tensão-Deformação O ensaio de tração mede a resistência de um material a um carregamento mecânico estático ou aplicado lentamente. O equipamento que aplica a força de tração e mede o deslocamento do corpo de prova é denominado de Extensômetro (Figura 47). Figura 47 – Extensômetro para medidas de tração. Com as curvas de tensão-deformação podem-se determinar o limite de escoamento, o limite de resistência à tração, a tensão e a deformação de engenharia, etc. A Figura 48 apresenta a curva de tensão-deformação de um material polimérico. 49 Figura 48 – Comportamento tensão-deformação para polímeros frágeis (A), plásticos (B) e muito elásticos (C). Durante a execução de um ensaio de tração, os dados registrados incluem a carga ou força em função da variação do comprimento (l) conforme mostra a Tabela 2, para uma barra de liga de alumínio. Os dados de força e deslocamento são convertidos em tensão e deformação, respectivamente. Da curva tensão-deformação (Figura 49) obtém-se ainda as propriedades mecânicas de cada material. Tabela 2 – Resultados de ensaio de tração de um corpo de prova de liga de alumínio (diâmetro 1,263 cm, comprimento inicial (l0) 5 cm). 50 Figura 49 – Curva Tensão-Deformação para a uma liga de alumínio. Define-se a Tensão de engenharia e a Deformação de engenharia as seguintes equações: 𝑇𝑒𝑛𝑠ã𝑜 = 𝑆 = 𝐹/𝐴0 (9) 𝐷𝑒𝑓𝑜𝑟𝑚𝑎çã𝑜 = 𝑒 = ∆𝑙/𝑙0 (10) Onde: A0 é a seção transversal inicial do corpo de prova, l0 é a distância inicial entre as marcas de referência e l é a variação do comprimento sob a força F. Exemplo 11 – Com os dados da Tab. 2, calcule a tensão e a deformação de engenharia. 51 Exemplo 12 – Projeto de uma barra de suspensão. 4.1.1 Limite de Escoamento Ao se aplicar uma tensão suficientemente baixa ao material ele irá se deformar elasticamente. Essa deformação é completamente reversível quando se retira essa 52 força. Se a tensão aumentar mais, chegará um momento em que o material cederá à tensão aplicada e terá deformação tanto elástica quanto plástica. O valor crítico de tensão aplicada para iniciar este processo de deformação plástica é definido como Limite Elástico do material. Nos materiais metálicos, essa é a tensão requerida para dar início ao movimento das primeiras discordâncias. Nos materiais poliméricos, essa tensão corresponde ao desembaraço das cadeias de moléculas poliméricas. Define-se como Limite de Proporcionalidade como a tensão acima da qual a relação entre tensão e a deformação deixar de ser linear. O limite elástico e o limite de proporcionalidade dos materiais, geralmente são próximos mas de difícil determinação precisa. Devido a isso, acaba-se definindo um Limite Convencional de Escoamento a uma distância de 0,002 ou 0,2% de deformação da peça. Em seguida, traça-se uma reta paralela em relação à parte linear da curva de tensão-deformação (parte elástica) a partir do valor de 0,002, para determinar o valor de tensão correspondente à intersecção dessa linha com a curva de tensão-deformação. A este ponto no gráfico obtém-se o limite convencional de escoamento ou o próprio Limite de Escoamento. Para o ferro fundido cinzento, o limite convencional de escoamento de 0,2% é de 276 Mpa, como se vê na Figura 50. Figura 50 – a) Determinação do limite convencional de escoamento e b) limite de escoamento superior e inferior de um aço de baixo teor de carbono. Em alguns aços de baixo teor de carbono, a transição entre a deformação elástica e a plástica é marcante. Nesses materiais, o começo da deformação plástica é no limite superior de escoamento (S2) e depois a intensidade diminui (Figura 50). Em seguida, a tensão oscila em torno do limite inferior de escoamento (S1). 53 A explicação diz respeito à questão dos defeitos cristalinos dos materiais, no caso, pequenos átomos intersticiais existentes em torno das discordâncias interferem no deslizamento e elevam o limite de escoamento para S2. Dessa forma, as discordâncias deslizam somente após a aplicação de uma tensão mais elevada (S2). Assim que o deslizamento tem início em S2, as discordâncias afastam-se dos átomos intersticiais, como o carbono, e movem-se com grande facilidade com a tensão inferior S1. Ao se projetar peças que devem suportar cargas, deve-se evitar que ocorradeformação plástica durante sua utilização. 4.1.2 Limite de Resistência à Tração A tensão correspondente à máxima força aplicada é o limite de resistência (SUTS), que é a tensão máxima da curva tensão-deformação de engenharia. Esse valor é também conhecido como o último limite de resistência. Em materiais dúcteis ocorre uma estricção no local do corpo de prova que irá se romper devido à tensão aplicada. Quando isso acontece, devido à diminuição da seção transversal neste ponto de estricção, uma força menor é necessária para continuar a deformação, por isso que, geralmente, o ponto de ruptura apresenta-se ter menores valores de tensão aplicada (Figuras 51 e 52). Figura 51 – Curva de carga versus alongamento de um corpo de prova de alumínio. 54 Figura 52 – Deformação localizada de um material dúctil em testes de tração. 4.1.3 Propriedades Elásticas O módulo de elasticidade, ou módulo de Young (E), corresponde à inclinação as curva tensão-deformação na região elástica, ou seja, segue a Lei de Hooke (Equação 11). 𝐸 = 𝑆 𝑒 (11) O módulo de elasticidade está relacionado às energias de ligação atômicas. Um material que possua altos valores de força de ligação química, apresentam um alto valor de módulo de elasticidade. Neste caso, necessita-se de uma forte tensão para provocar uma deformação. A Figura 53 mostra as amplitudes dos módulos elásticos de diversos materiais de engenharia. O módulo de elasticidade dos materiais cerâmicos são altos, em virtude das ligações iônicas e covalentes destes materiais. 55 Figura 53 – Amplitude de módulos elásticos para diversos materiais. O Coeficiente de Poisson () relaciona a deformação elástica longitudinal com a deformação transversal em um processo de tração ou compressão (Equação 12). 𝑣 = 𝑒𝑙𝑎𝑡𝑒𝑟𝑎𝑙 𝑒𝑙𝑜𝑛𝑔𝑖𝑡𝑢𝑑𝑖𝑛𝑎𝑙 (12) Embora o coeficiente de Poisson não apareça diretamente na curva de tensão- deformação, ela é, com o módulo de elasticidade, a descrição mais fundamental do comportamento elástico dos materiais de engenharia. 56 Exemplo 11 – Módulo de Young de uma liga de alumínio. 4.1.4 Ductilidade A ductilidade é a capacidade que um material tem de se deformar permanentemente sem se quebrar, quando uma força é aplicada. Existem duas medidas comuns de ductilidade. A primeira é o Alongamento Percentual que quantifica a deformação plástica permanente quando ocorre a fratura, conforme a Equação 13. % 𝐴𝑙𝑜𝑛𝑔𝑎𝑚𝑒𝑛𝑡𝑜 = 𝑙𝑓 − 𝑙0 𝑙0 × 100 (13) em que l0 é a distância entre as marcas de referência após a fratura do corpo de prova. A segunda é a Redução Percentual da Área de seção transversal, mais conhecido como afinamento ocorrido na amostra, antes e depois da fratura (Equação 14). 57 % 𝑅𝑒𝑑𝑢çã𝑜 𝑃𝑒𝑟𝑐𝑒𝑛𝑡𝑢𝑎𝑙 𝑑𝑒 Á𝑟𝑒𝑎 = 𝐴0 − 𝐴𝑓 𝐴0 × 100 (14) em que Af é a seção transversal final na superfície de fratura. A ductilidade é importante tanto para os fabricantes como para os projetistas de componentes que devem suportar esforços mecânicos, sendo fundamental no processamento mecânico de barras, fios, placas, vigas, fibras. Exemplo 12 – Ductilidade de uma liga de alumínio. 4.1.5 Efeito da Temperatura As propriedades mecânicas dos materiais dependem da temperatura. O limite de escoamento, o limite de resistência e o modulo de elasticidade diminuem em temperaturas mais elevadas, enquanto a ductilidade tende a aumentar. Desta forma, o fabricante de materiais pode deformar o material a altas temperaturas para tirar proveito da maior ductilidade e da menor tensão requerida. A Figura 54 exemplifica tal comportamento. 58 Figura 54 – Efeito da temperatura a) na curva tensão-deformação e b) nas propriedades de tração de uma liga de alumínio. Em materiais poliméricos e vítreos, observa-se comportamento similares aos materiais metálicos no tocante ao aumento da temperatura. Na Figura 55 é possível considerar o polímero poli(metil metacrilato) em ensaio de tensão-deformação desde 4ºC até 60ºC. A 4ºC, o material é totalmente frágil, enquanto que a 60ºC, existe uma deformação plástica considerável. Figura 55 – Influência da temperatura sobre ensaios de tensão-deformação para o polímero poli(metil metacrilato). 59 Operação como a extrusão ou sopro-estiramento de materiais poliméricos só ocorrem pelo efeito do aumento da temperatura. O mesmo pode-se dizer na fabricação de garrafas de vidro, estiramento de chapas de vidro e de fibras de vidro. 4.1.6 Ensaio de Flexão de Materiais Frágeis Os materiais que possuem comportamento frágil (vide Figura 55, curva a 4ºC) possuem características de baixa ductilidade, estricção, no entanto são elásticos com baixa deformação até o ponto de ruptura do material. Este aspecto é importante para poder definir a resistência a flexão destes materiais, no entanto, ao fazer os ensaios em um extensômetro, qualquer defeito superficial da amostra pode causar trincas que atrapalharão os exatos valores das medidas. A flexão é a ação de um dobramento de um corpo retilíneo, assentados a dois apoios afastados com distancia definida ao qual aplica-se uma força contrária à esta posição, tensionando o corpo, podendo chegar até a sua ruptura. A Resistência à Flexão (ou Módulo de Ruptura) descreve a resistência do material pela equação 15: 𝑅𝑒𝑠𝑖𝑠𝑡ê𝑛𝑐𝑖𝑎 à 𝐹𝑙𝑒𝑥ã𝑜 = 𝜎𝑓𝑙𝑒𝑥ã𝑜 = 3𝐹𝐿 2𝑤ℎ2 (15) Em que F é a carga, L é a distância entre os dois pontos de apoio, w é a largura do corpo de prova e h é a espessura. A Figura 56 mostra o ensaio de flexão. A Figura 57 apresenta curva de tensão-deflexão para uma cerâmica à base de MgO. Figura 56 – a) Ensaios de flexão para medir a resistência dos materiais frágeis; b) deflexão do corpo de prova sob flexão. 60 Figura 57 – Curva de tensão-deflexão de uma cerâmica. Também é possível identificar o Módulo de Flexão (Eflexão) que representa o módulo de elasticidade na flexão (equação 16). 𝑀ó𝑑𝑢𝑙𝑜 𝑑𝑒 𝐹𝑙𝑒𝑥ã𝑜 = 𝐸𝑓𝑙𝑒𝑥ã𝑜 = 𝐹𝐿3 4𝑤ℎ3𝛿 (16) Em que é a deflexão da viga ao se aplicar uma força F. Exemplo 13 – Resistência à flexão dos materiais compósitos. 61 4.1.7 Dureza dos Materiais O Ensaio de Dureza mede a resistência da superfície de um material à penetração por um objeto rígido. Pode representar a resistência a riscos ou impressões e ainda ser medida qualitativa da resistência do material. Os ensaios de dureza Brinell e Rockwell são os mais utilizados. No ensaios de dureza Brinell, uma esfera de aço de elevada dureza e 10 mm de diâmetro é forçada contra a superfície do material. O diâmetro da impressão (entre 2 a 6 mm) é medido e o número de dureza Brinell (HB ou BHN) é calculado pela equação 17. 𝐻𝐵 = 2𝐹 𝜋𝐷(𝐷 − √𝐷2 − 𝐷𝑖 2 (17) Em que F é a carga aplicada em Kg, D é o diâmetro do penetrador em mm e D i é o diâmetro da impressão em mm. A dureza Brinell tem as unidades de Kg/mm2. No ensaios de dureza Rockwell emprega-se uma pequena esfera de aço para os materiais macios e um cone de diamante para os materiais mais duros. A profundidade atingida pelo penetrador é medida automaticamente pelo equipamento e convertida em um número de dureza Rockwell (HR). Como não é preciso fazer uma medição das dimensões da impressão formada na peça, o ensaio Rockwell é o ensaios mais utilizado pelasempresas de materiais. Neste método, a carga do ensaio é aplicada em etapas, ou seja, primeiro se aplica uma pré-carga, para garantir um contato firme entre o penetrador e o material ensaiado, e depois aplica-se a carga do ensaio propriamente dita. A leitura do grau de dureza é feita diretamente num mostrador acoplado à máquina de ensaio, de acordo com uma escala predeterminada, adequada à faixa de dureza do material (Figura 58). 62 Figura 58 – Sequência de operações de dureza Rockwell. A dureza Rockwell não possui unidades (como a Brinell), é um número adimensional. Os medidores Rockwell possuem diversas escalas de medida (A, B, C, D, etc...) que são arbitrárias e estão baseadas na profundidade de penetração específica para os diversos tipos de materiais (Tab. 3). Tabela 3 – Condições de ensaios de dureza e aplicação típicas. A Fig. 59 mostram os equipamentos e penetradores Brinell e Rockwell. 63 Figura 59 – Equipamentos para ensaios Brinell e Rockwell. Os ensaios Brinell e Rockwell são considerados ensaios de macrodureza pois são aplicados cargas de no mínimo 2 N, no entanto existem os ensaios de microdureza e os mais conhecidos são o ensaio Vicker e o ensaio Knoop. Nestes ensaios exige-se o uso de um microscópio para efetuar as medições e tem maior uso em materiais de laboratório e permitem medir durezas em diferentes regiões da amostra e principalmente em materiais que não são macroscopicamente uniformes. 4.2 Os Testes de Impacto Os Ensaios de Impacto avaliam a fragilidade de um material sob condições de alta taxa de deformação o que representa grande diferença em relação aos ensaios de tração ao qual as peças são submetidas a taxa muito pequenas de deformação. O impacto súbito e intenso, com altas taxas de deformação provoca a fratura dos materiais analisados e este comportamento frágil é capaz de mostrar novas características aos materiais e verificar a capacidade de energia absorvida pelo corpo de prova no ato de fratura ao qual representa informação valiosa aos materiais sendo mais uma forma de verificar a resistência do material. Esta resistência ao choque 64 também é chamada de tenacidade. A tenacidade do material é a capacidade de resistir à propagação da fratura quando uma carga é aplicada, considerando-se a presença de trincas ou entalhes. Os ensaios de impacto mais conhecidos e utilizados são os tipos Charpy e Izod, sendo o ensaio Izod mais utilizado para materiais poliméricos. Cada tipo de ensaio possui as dimensões do corpo de prova padronizados e geralmente possuem entalhes (forma de V, forma de U invertido ou na forma de fechadura) para direcionamento da fratura a ser feita. As Figuras 60 e 61 apresentam os equipamentos Charpy e Izod além dos detalhes dos entalhes. Figura 60 – Equipamentos para ensaios de impacto Charpy e Izod. 65 Figura 61 – Corpos de prova para ensaios de impacto Charpy e Izod. 4.2.1 Temperatura de Transição Dúctil-Frágil A temperatura de transição dúctil-frágil é a que o modo de fratura de um material modifica de fratura dúctil para fratura frágil. Pode-se obter essa temperatura pela energia média entre as regiões com comportamento dúctil e frágil, considerando uma energia absorvida específica, ou pelo aparecimento de características físicas de fratura frágil na amostra (Figura 62). Figura 62 – Resultados de ensaios de impacto Izod em uma amostra de nylon. 66 Nem todos os materiais tem uma temperatura de transição bem definida (Figura 63). Os metais CCC tem elevadas temperaturas de transição, mas a maioria dos CFC apresenta elevada energia absorvida. E a temperatura diminui gradualmente com a redução da temperatura. É possível que este fenômeno de transição dúctil-frágil pode ter contribuído para o naufrágio do Titanic, pois a temperatura da água era muito baixa. Figura 63 – Resultados de ensaio Charpy com entalhe em V do aço-carbono CCC e aço austenístico CFC. 4.2.1.1 Relação com a Curva Tensão-Deformação A energia necessária para romper um material por impacto nem sempre é proporcional à área sob a curva tensão-deformação verdadeira. Pode-se apenas fazer uma estimativa da tenacidade a partir da curva tensão-deformação. No geral, os metais com alto limite de resistência e alta ductilidade têm uma boa tenacidade, mas pode não ocorrer sob taxas de deformação elevadas como o impacto de fratura. Veja o caso de cerâmicas: elas geralmente possuem baixa resistência ao impacto, apesar de sua elevada resistência à compressão, já que não possuem ductilidade apreciável. Esses materiais possuem, portanto, baixa tenacidade avaliada pela curva de tensão- deformação ou pelo ensaio de impacto. 67 5. O DIAGRAMA DE FASES: UM POUCO DE TERMODINÂMICA Em muitos processos de engenharia existe a necessidade de descobrir quais os estados da matéria temos em uma solução sólida, por exemplo. As estruturas atômicas e microscópicas dependem das variáveis termodinâmicas para existirem e, desta forma, as propriedades destes materiais serão consequência desta disposição que posteriormente formarão as peças e artefatos de uso na sociedade moderna. Uma das ferramentas mais importantes nessa exploração é o Diagrama de Fases que é um mapa que nos guiará na resposta à pergunta geral: que microestrutura deverá existir em determinada temperatura para determinada composição de material? O desenvolvimento microestrutural por meio do diagrama de fases começa com a Regra das Fases, que identifica o número de fases microscópicas associadas a determinada condição de estado, um conjunto de valores para a temperatura, pressão e outras variáveis que descrevem a natureza do material. 5.1 A Regra das Fases Uma FASE é uma porção química e estruturalmente homogênea da microestrutura. Uma microestrutura monofásica pode ser policristalina, mas cada grão cristalino difere apenas na orientação cristalina e não da composição química, que pode ser até a mesma. Por exemplo, átomos de Cu e de Ni têm natureza tão semelhantes que apresentam-se formar uma solução sólida homogênea em quaisquer composições de liga (nota-se que seguem as regras de Hume-Rothery). Em compensação, quando temos os elementos Cu e Zn, contendo uma concentração maior que 30% em zinco, teremos duas fases existentes na solução sólida indicando solubilidade limitada entre os elementos. Acontece que quando a solução Cu-Zn resfriados, primeiramente forma- se uma estrutura CFC com átomos de cobre e de zinco localizados nos pontos normais à rede. Com o excesso de zinco, forma-se uma outra fase cúbica simples entre Cu-Zn devido à saturação de átomos de zinco ao cobre (Figura 64). 68 Figura 64 – a) Cobre líquido e níquel líquido completamente solúveis; b) Ligas sólidas de cobre-níquel com solubilidade total e c) Ligas de cobre-zinco com mais de 30% de zinco formando segunda fase cristalina na solução. Ao invés de elementos puramente atômicos, pode-se pensar em compostos para serem chamados de componentes. É o caso do MgO e NiO que possuem comportamento análogo à solução de níquel-cobre. No entanto, como as regras de Hume-Rothery não são condições fáceis de se conseguir na natureza química, contendo várias restrições de tamanho de átomos, estrutura cristalina e elétrons de valência e eletronegatividade, é mais provável que existem mais fases cristalinas em uma solução sólida. O exemplo mais importante comercialmente (aços-carbono) é a estrutura da Perlita (Figura 65) que consiste em camadas
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