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Meio ambiente II

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POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA
ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO
NOVO CONTEXTO DE MERCADO
Uma análise da experiência recente dos EUA e do
Brasil
por
Gilberto De Martino Jannuzzi
Professor Livre-docente do Departamento de Energia, Faculdade de Engenharia Mecânica, Universidade
Estadual de Campinas
C.P. 6122 13088-970 Campinas, São Paulo
Telefone/fax: 19-788-3282 email: jannuzzi@fem.unicamp.br
URL http://www.fem.unicamp.br/~jannuzzi
1999
AGRADECIMENTOS
Gostaria de agradecer o apoio recebido do Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico - CNPq durante minha estadia no Lawrence Berkeley National
Laboratory, Universidade da Califórnia-Berkeley, onde foi desenvolvido o presente trabalho. Ao
meu colega e amigo Dr. Ashok Gadgil que me facilitou diversos contatos e com quem mantive
interessantes discussões nesse e em outros temas sobre energia, tecnologia, meio ambiente e
ambiciosamente especulamos sobre o futuro da humanidade.
Dedico este trabalho à minha querida família, companheira
solidária e fiel em todas minhas empreitadas:
Ana Maria
Felipe, Helena e Daniel
Berkeley, Maio 1999
ii
SUMÁRIO
AGRADECIMENTOS ................................................................................................. I
LISTA DE TABELAS ...............................................................................................IV
LISTA DE FIGURAS ................................................................................................V
LISTA DE QUADROS .............................................................................................VI
GLOSSÁRIO .........................................................................................................VII
PREFÁCIO ............................................................................................................X
RESUMO ...........................................................................................................XI
CAPÍTULO 1: INTRODUÇÃO ....................................................................................1
Motivação, objetivos e estrutura do estudo.....................................................1
Energia e “bem público”...................................................................................3
Externalidades do setor energético.................................................................4
Benefícios públicos de sistemas energéticos e o mercado.............................6
CAPÍTULO 2: A REFORMA DO SETOR ELÉTRICO NOS EUA .....................................11
Introdução......................................................................................................11
Conceituando as Reformas do Setor Elétrico................................................12
As reformas segundo mecanismos de coordenação..................................12
As reformas segundo sua natureza e objetivos..........................................14
As motivações para as reformas nos EUA....................................................17
Causas das mudanças na estrutura do setor elétrico dos EUA..................19
Quais foram as mudanças e principais impactos........................................21
Impactos das mudanças................................................................................24
Eqüidade.....................................................................................................25
O papel do governo federal........................................................................28
Acesso e divulgação de informações..........................................................28
A questão da competição entre gás e eletricidade.....................................28
CAPÍTULO 3: A EFICIÊNCIA ENERGÉTICA ..............................................................31
Introdução......................................................................................................31
Os programas de eficiência energética antes das reformas.......................32
Tipos de programas de eficiência energética.............................................34
As implicações das reformas para a eficiência energética............................34
Efeitos da des-verticalização......................................................................35
Efeitos da competição................................................................................37
A eficiência energética e o mercado.............................................................40
O “energy efficiency gap”............................................................................41
Barreiras, falhas e intervenção no mercado de energia.............................45
As mudanças das atividades em eficiência energética nos EUA...................47
Atividades comerciais.................................................................................47
Atividades para o setor público...................................................................49
CAPÍTULO 4: FONTES RENOVÁVEIS E MEIO AMBIENTE.............................................52
Introdução......................................................................................................52
As fontes renováveis.....................................................................................52
Introdução...................................................................................................52
O mercado de energia renovável (green marketing)..................................58
O mercado e políticas públicas...................................................................59
O meio ambiente...........................................................................................60
iii
Mecanismos de mercado: a experiência com SO2 .....................................63
A geração distribuída.....................................................................................65
CAPÍTULO 5: A PESQUISA E DESENVOLVIMENTO ....................................................67
Introdução......................................................................................................67
Pesquisa de interesse público....................................................................69
Efeitos da reestruturação...............................................................................71
O papel futuro da P&D no setor energético...................................................73
CAPÍTULO 6: A PARTICIPAÇÃO DA SOCIEDADE CIVIL ...............................................75
Introdução......................................................................................................75
Califórnia.......................................................................................................76
Nova Inglaterra:.............................................................................................78
A Região do Noroeste-Pacífico......................................................................79
Minnesota......................................................................................................80
Texas.............................................................................................................82
CAPÍTULO 7: MECANISMOS PARA PROMOVER PROGRAMAS DE BENS PÚBLICOS ......83
Introdução......................................................................................................83
Mecanismos fiscais........................................................................................83
Mecanismos regulatórios...............................................................................88
Ações diretas do governo..............................................................................89
CAPÍTULO 8: EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E OUTROS BENS PÚBLICOS NO BRASIL ..........91
Introdução......................................................................................................91
Bens públicos e as reformassetoriais no Brasil............................................92
Características da regulação para Eficiência Energética e P&D................93
As reformas do setor energético e o novo arranjo institucional.....................94
Mudanças do papel do setor público.............................................................95
Investimentos em Programas Regulados durante 1998-99...........................98
Eficiência Energética..................................................................................98
Pesquisa e desenvolvimento....................................................................101
O problema de consumidores de Baixa Renda...........................................105
Conclusões..................................................................................................106
CAPÍTULO 9: CONCLUSÕES ................................................................................109
Bens públicos nos EUA...............................................................................110
Bens Públicos no Brasil...............................................................................112
ANEXO..............................................................................................................115
O Protocolo de Quioto.................................................................................115
Características dos mecanismos de implementação................................115
A Implementação Conjunta (Joint Implementation – JI)...........................116
O Mecanismo de Desenvolvimento Limpo................................................116
Os Certificados de Emissões (Global Tradable Permits).........................119
BIBLIOGRAFIA ...................................................................................................120
iv
LISTA DE TABELAS
TABELA 1: AS RESPONSABILIDADES DE POLÍTICAS PÚBLICAS .....................................9
TABELA 2: O EFEITO DO MERCADO NAS RESPONSABILIDADES PÚBLICAS DAS EMPRESAS
DE ENERGIA ..................................................................................................10
TABELA 3: TIPOLOGIA DE MODELOS DE COORDENAÇÃO..........................................12
TABELA 4: TIPOLOGIA DE MODELOS DE COORDENAÇÃO MISTOS...............................13
TABELA 5: IMPLICAÇÕES DA DES-VERTICALIZAÇÃO PARA A EFICIÊNCIA ENERGÉTICA ..36
TABELA 6: IMPLICAÇÕES DA COMPETIÇÃO PARA A EFICIÊNCIA ENERGÉTICA ..............40
TABELA 7: PRIORIDADES PARA PROGRAMAS DE EFICIÊNCIA ENERGÉTICA FINANCIADAS
PELOS CONSUMIDORES DE ENERGIA ................................................................50
TABELA 8: A ESTRUTURA DE PRODUÇÃO DE ELETRICIDADE NA CALIFÓRNIA (1989-95)
....................................................................................................................57
TABELA 9: CAPACIDADE INSTALADA DOS NGU (GW).............................................58
TABELA 10: SUMÁRIO DAS IMPLICAÇÕES DE REFORMAS DO SETOR ELÉTRICO NO SEU
DESEMPENHO AMBIENTAL...............................................................................62
TABELA 11: PREÇOS DE ENERGIA RENOVÁVEL NA INGLATERRA DURANTE A
PRIVATIZAÇÃO (1991-94) (EM C/KWH)............................................................63
TABELA 12: INVESTIMENTOS EM PESQUISA E DESENVOLVIMENTO EM ALGUNS PAÍSES
....................................................................................................................69
TABELA 13: MECANISMOS PROPOSTOS PARA FINANCIAMENTO DE P&D...................75
TABELA 14: MECANISMOS PARA INCENTIVAR A PROMOÇÃO DE BENS PÚBLICOS: TAXAS
E INCENTIVOS ...............................................................................................84
TABELA 15: EXEMPLOS DE APLICAÇÃO DO SBC EM ALGUNS ESTADOS.....................86
TABELA 16: RENÚNCIA FISCAL FEDERAL PARA PRODUTOS EFICIENTES E FONTES
RENOVÁVEIS 1999........................................................................................87
TABELA 17: MECANISMOS PARA INCENTIVAR BENEFÍCIOS PÚBLICOS NO CONTEXTO
COMPETITIVO: MEDIDAS REGULATÓRIAS ........................................................89
TABELA 18: POSSÍVEIS AÇÕES DO GOVERNO PARA IMPLEMENTAÇÃO DE BENEFÍCIOS
PÚBLICOS NO CONTEXTO COMPETITIVO: MECANISMOS PARA IMPLEMENTAÇÃO DE
PROGRAMAS .................................................................................................90
v
LISTA DE FIGURAS
FIGURA 1: REPRESENTAÇÃO ESQUEMÁTICA DA ESTRUTURA DO SETOR ELÉTRICO DOS
EUA, ANTES E APÓS AS REFORMAS ................................................................24
FIGURA 2: EXEMPLO DO “ENERGY EFFICIENCY GAP”..............................................42
FIGURA 3: EXEMPLO DE CURVA DE SUPRIMENTO DE ENERGIA CONSERVADA ...........43
FIGURA 4: O PAPEL DE POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EXPLORAR O POTENCIAL DE
EFICIÊNCIA ENERGÉTICA .................................................................................47
FIGURA 5: INVESTIMENTOS EM P&D NA ÁREA DE ENERGIA NOS E.U.A. (1974-80-90-
96)..............................................................................................................67
FIGURA 6: SEGMENTAÇÃO DO POTENCIAL DE EFICIÊNCIA ENERGÉTICA ENTRE OS
DIVERSOS AGENTES.......................................................................................97
FIGURA 7: INVESTIMENTOS REGULADOS PARA PROGRAMAS DE EFICIÊNCIA ENERGÉTICA
E P&D DE INTERESSE PÚBLICO .....................................................................114
vi
LISTA DE QUADROS
QUADRO 1: AS AGÊNCIAS DE REGULAÇÃO DA CALIFÓRNIA E SUAS ATRIBUIÇÕES .....25
QUADRO 2: PROGRAMAS PARA POPULAÇÃO DE BAIXA RENDA..................................27
QUADRO 3: OS PRINCIPAIS ATORES PÚBLICOS DO SETOR ENERGÉTICO APÓS A
REFORMA SETORIAL .......................................................................................95
QUADRO 4: DIFERENÇAS E SEMELHANÇAS ENTRE CE E IC..................................118
vii
GLOSSÁRIO
AIC Atividades Implementadas Conjuntamente, o mesmo que AIJ.
AIJ Activities Implemented Jointly. Atividades Implementadas Conjuntamente.
ANEEL Agência Nacional de Energia Elétrica.
ANP Agência Nacional do Petróleo.
CDM Clean Development Mechanism. Mecanismo de Desenvolvimento Limpo.
CE Comércio de Emissões.
CEPEL Centro de Pesquisas em Eletricidade
CER Certified Emissions Reductions Certificados de Redução de Emissões (gases estufa)
CLF Conservation Law Foundation. Organização Não Governamental.
CNPE Conselho Nacional de Política Energética
COP Conference of the Parties . Conferência das Partes.
CPUC California Public Utility Commission
CPUC California Public Utilities Commission. Agência de regulação para as empresas que operam serviços públicos
na Califórnia.
DISCO Distribution Utility. É a companhia regulada de distribuição que constrói e mantém a rede de distribuição
ao consumidor final.
DOE Department of Energy. Ministério de Energia do governo norte americano.
DSM Demand-side management. Gerenciamento do lado da Demanda ou GLD.
EB Executive Board. Conselho Executivo.
EC Emission Certificates.. Unidades de Certificados de Emissões.
EDF Environmental DefenFund. Organização Não Governamental dos EUA
EP Emission Permits. Quota autorizada de emissão de poluentes.
EPA Environmental Protecxtion Agency. O´rgão de Proteção Ambiental do governo federal americano.
EPACT Energy Policy Act. Lei do governo americano que facilitou o acesso à rede de transmissão para
produtores independentes.
EPRI Electric Power Research Institute.
viii
ERAM Electric Revenue Adjustment Mechanism. Mecanismo concebido para compensar as concessionárias por
eventuais perdas de receitas com o resultados de programas de eficiência energética.
ESCO Energy Service Company. Uma companhia que se propõe a oferecer serviços para reduzir os gastos de
energia de seu cliente, tendo como pagamento parte dessas economias, oualgum outro arranjo baseado nessa
redução.
EST Energy Savings Trust. Agência responsável por programas de eficiência energética na Inglaterra.
ET Emissions Trading. Comércio de Emissões (CE).
FERC Federal Energy Regulatory Commission. Agência Federal que regula preços, contratos e condições de
fornecimento e transmissão de energia transacionados entre estados americanos. É o equivalente federal das
agências estaduais de regulação.
G77 Grupo de países em desenvolvimento.
GEE Gases de Efeito Estufa.
GLD Gerenciamento do Lado da Demanda.
IC Implementação Conjunta.
IOU Investor-owned utilities. Companhia de propriedade privada (de acionistas).
IOU—Investor owned utility. Uma companhia de propriedade de acionistas que tem o objetivo de produzir lucro
através de serviços de energia. É uma terminologia utilizada para diferenciar das companhias de propriedade
municipal, ou cooperativas rurais.
IPP Independent Power Producer. Produtores Independentes de Energia.
IPP—Independent Power Producer. Uma entidade privada que opera uma unidade de geração de energia e vende
para a rede ou clientes.
ISO Independet System Operatior. Operador Independente do Sistema (no Brasil é chamado Operador Nacional do
Sistema - ONS).
ISO Independent System Operator. Operador Independente do Sistema. Uma organização independente e neutra
sem interesse financeiro na geração de energia que administra a operação e uso do sistema de transmissão. A
OIS tem a palavra final sobre o despacho da geração para preservar a confiabilidade e eficiência do sistema,
garantir o acesso público, administrar as tarifas de transmissão e fornecer informações sobre o estado do sistema
e capacidade de transmissão.
 JI Joint Implementation. Implementação Conjunta (IC).
MME Ministério de Minas e Energia.
MOP
MRPR Mandate Renewables Purchase Requirements. Reduções mandatórias para compra de energia renovável.
NARUC National Association of Regulatory Utility Commissioners. É um conselho consultivo composto pelas
agências de cinqüenta estados, Distrito de Columbia, Porto Rico e Virgin Islands com o objetivo de defender o
interesse do consumidor para aprimorar a qualidade e eficácia da regulação pública no país.
ix
NASUCA National Association of Utility Consumer Advocates. Organização que congrega membros de 38 estados e
do Distrito de Columbia com o objetivo de trocar informações e defender posições de interesse do consumidor
em questões relacionadas a tarifas de energia em audiências das agências federais, Congresso Nacional e tribunais
de justiça.
NDRC Natural Resources Defence Council. Organização Não Governamental (ONG).
NFFO Non Fossil Fuel Obligation. Medida que obrigava as companhias regionais de eletricidade do Reino Unido a
comprar uma parcela de sua demanda de fontes nuclear ou renovável.
NGO Non governmental organization. Organização não governamental (ONG).
NGU Non Generating Utility. CHECK
NPPC Pacific Northeast Electric Power Planning. Órgão regional de planejamento do setor elétrico.
OCDE Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico.
P&D Pesquisa e Desenvolvimento
PD&D Pesquisa, Desenvolvimento e Demonstração.
PIR Planejamento Integrado de Recursos.
PROCEL Programa de Combate ao Desperdício de Eletricidade, inicialmente concebido como Programa de
Conservação de Eletricidade
PU Public Utility.
PUC Public Utility Commission. Agência de Regulação.
RD&D Research, Development and Demonstration. Pesquisa, Desenvolvimento e Demonstração (PD&D).
REC Renewable Energy Credits. Certificados transacionáveis no mercado referentes a quotas de produção de
eletricidade a partir de fontes renováveis.
SBC Systema Benefit Charge. Taxa cobrada dos consumidores para financiar programas públicos de energia.
SE Secretaria de Energia do Ministério de Minas e Energia.
SMUD Sacramento Municipal Utility District
T&D Transmissão e Distribuição de energia.
UEC Units of Emmision Certificates. Unidades de Certificados de Emissão ( o mesmo que UCE). CHECK
URE Unidades de Redução de Emissão (o mesmo que CER)
USAID United States Agency for International Development. Agência de Cooperação do governo dos EUA.
x
PREFÁCIO
Este livro foi escrito com a pretensão de organizar idéias sobre o tema de políticas para
incentivar o desenvolvimento do setor energético na direção de maior participação de fontes
renováveis e maiores esforços para se economizar energia, justamente em um momento
quando novos agentes passam a fazer parte do processo de decisão e investimentos no setor
energético.
A busca de maior competição e eficiência econômica em um setor importante como
este não é uma tarefa fácil e as expectativas de que os mecanismos de mercado poderão
cumprir esses objetivos ainda merecem mais discussões. O tema é extremamente novo e não
existem fórmulas mágicas. Em todo o mundo ainda se aprende a acomodar os interesses do
mercado de energia com objetivos de desenvolvimento sustentável e as experiências não são
facilmente transferíveis de um contexto para outro.
Procura-se aqui mostrar algo da recente experiência dos EUA em tentar garantir a
preservação e estimular a utilização de formas mais sustentáveis de energia e ao mesmo
tempo criar reformas para permitir livre concorrência entre os produtores de energia. Desde o
início da década de 90 aquele país experimenta uma transição de uma indústria composta de
monopólios regionais com preços e lucros fortemente regulados pelo poder público para uma
situação de mercado competitivo com preços de energia elétrica determinados de acordo com
a oferta e demanda. Chama-se a atenção para os riscos de uma privatização e introdução de
competição sem se definir quais são as características de interesse público que o setor
energético deve manter. A expectativa é que esse material possa servir como referência para
as experiências que se iniciam no Brasil.
xi
RESUMO
POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA
ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO
NOVO CONTEXTO DE MERCADO
Uma análise da experiência recente dos EUA e do
Brasil
No Brasil e em vários outros países, o setor energético passa por grandes
transformações na sua estrutura de gerenciamento, nas decisões de novos investimentos e nas
formas da sociedade implementar mecanismos de controle e regulação. Este é um fenômeno
relacionado com novas condições financeiras, tecnológicas e econômicas principalmente para
a geração de eletricidade. De uma forma geral, a grande preocupação dessas reformas é
garantir competitividade, eficiência econômica para o setor e maiores investimentos da
iniciativa privada. Dependendo da situação em cada país tem se observado maior ou menor
ênfase em um desses aspectos.
É possível notar, no entanto, que o denominador comum dessas mudanças é um
enfraquecimento do poder público, seja ele como o principal gestor da indústria de eletricidade,
ou como regulador de uma concessão privada para a oferta de serviços de energia (conforme
era o caso dos EUA até recentemente). Algumas das reformas inclusive, especialmente
aquelas que se preocupam em introduzir maior competição no segmento da geração, têm
provocado um completo desinteresse em promover serviços de utilidade pública, como é o
caso da eficiência energética, seja pelas companhias de geração, ou distribuição de
eletricidade.
O grande desafio dessas mudanças é, a nosso ver, garantir que a indústria de
eletricidade além de ser competitiva, seja capaz também de atender objetivos sociais, de
proteção ambiental, e assegurar investimentos que promovam maior sustentabilidade do
xii
sistema energético para o futuro. É com esse objetivo que se desenvolve o presente trabalho
para analisar a experiência recente dos EUA com relação a reestruturação do seu setor elétrico
e iniciativas desenvolvidas naquele país para preservaros “bens públicos”. Este país teve um
desempenho diferenciado nessa questão quando comparado com os demais e, embora as
reformas estejam sendo feitas para promover uma agressiva competição nos serviços de
energia, tem havido preocupação em manter o caráter de “indústria de interesse público”.
A tendência das reformas no Brasil é fazer com o setor público participe cada vez
menos de iniciativas diretamente relacionadas com eficiência energética, pesquisa e
desenvolvimento e fontes renováveis, e se dedique mais à criação de um ambiente favorável
para que outros agentes se envolvam nessas atividades.
A análise aqui desenvolvida para o caso norte-americano procura aproveitar sua larga
experiência em criar incentivos através de regulação para estimular a ação de companhias de
energia em investimentos em programas de eficiência energética, embora tenham sido
concebidos durante um período onde ainda não havia competição.
Nossa intenção aqui é a de procurar entender quais são e quais foram as motivações
para preservar “bens públicos” nesse período de reformas e, na medida do possível, procurar
descrever os mecanismos que estão sendo discutidos ou colocados em prática para a
promoção desses bens no ambiente de maior competição.
Verificamos, como conclusão do trabalho, que três fatores tem sido especialmente
importantes para a preservação dos aspectos de utilidade pública da indústria de eletricidade
nos EUA. Em primeiro lugar destacamos a forte tradição do país na implementação de
programas federais, estaduais e regionais de conservação de energia e proteção ambiental.
Essas iniciativas são uma importante herança das várias décadas de rigorosa regulação
pública a que esteve submetida a indústria de eletricidade nos EUA, que inclusive, foi
responsável pela criação de mercados para várias tecnologias eficientes e de energia
renovável. Outro fator foi a participação da sociedade civil, seja através de grupos de proteção
ao consumidor, ambientalistas, acadêmicos, grupos comerciais e industriais ligados a fontes
renováveis. Finalmente observamos o interesse e sintonia de órgãos legislativos, tanto no
âmbito federal como estadual, para atender às reivindicações e preocupações da sociedade.
xiii
Trata-se de um processo ainda em elaboração e com diferentes enfoques de acordo com as
especificidades de cada estado, mas que oferece uma contribuição e inspiração para que
iniciativas semelhantes sejam experimentadas em países como o Brasil.
O presente trabalho consiste de 9 capítulos. Inicialmente são apresentados os
conceitos de bens e benefícios públicos do sistema energético. No segundo capítulo analisam-
se as principais causas e objetivos das reformas nos EUA, buscando evidenciar as principais
mudanças que poderiam comprometer o papel de interesse público dessa indústria. Os
capítulos seguintes discutem com maiores detalhes os efeitos das reformas do setor para a
eficiência energética, fontes renováveis e pesquisa e desenvolvimento, procurando mostrar as
iniciativas que foram realizadas naquele país para garantir esses aspectos. O capítulo 6 discute
o importante papel desempenhado pela opinião pública organizada através de grupos civis na
manutenção dos aspectos de interesse público da indústria. O capítulo 7 resume alguns dos
principais mecanismos utilizados pelos governos estaduais e federal para promover programas
de bens públicos nos EUA. O capítulo 8 apresenta uma análise do mecanismo regulatório
colocado em prática no Brasil para fomentar investimentos em eficiência e pesquisa e
desenvolvimento pelas empresas privatizadas, com o objetivo de verificar se está sendo
realmente eficaz para prover bens públicos para o país. As conclusões estão discutidas no
capítulo oitavo.
CAPÍTULO 1: INTRODUÇÃO
As reformas do setor energético e a situação dos “bens públicos”. Objetivos e contexto
do estudo.
Motivação, objetivos e estrutura do estudo
No Brasil e em diversos outros países, o setor energético experimenta grandes
transformações com relação a sua estrutura de gerenciamento e decisões de novos
investimentos. Este é um fenômeno relacionado com novas condições financeiras, tecnológicas
e de custos para a geração de eletricidade. Existe, é certo, uma diversidade com relação aos
objetivos das mudanças e consequentemente, o mesmo ocorre com a forma como elas estão
sendo implantadas em cada país. No entanto, pode-se afirmar que de uma maneira geral, a
grande preocupação é garantir que estas introduzam maior competitividade, eficiência
econômica e maior investimentos da iniciativa privada no setor energético. Dependendo da
situação particular de cada país, tendo sido dado maior ou menor ênfase a cada um desses
três fatores. Nos EUA, que é o objeto de maior atenção neste trabalho, grande parte das
expectativas com relação a reestruturação se refere a um efetivo decréscimo nos preços de
energia aos consumidores (especialmente para os grandes consumidores) e ao aparecimento
de inovações tecnológicas decorrente da competição entre os chamados Energy Services
Providers – ESP.
É possível notar que o denominador comum das mudanças nos vários países onde se
tem analisado os efeitos das reformas (Hagler Baily 1998a,b,c; Diesendorf, 1996) é um
enfraquecimento do poder público, seja ele como o principal gestor da indústria de eletricidade,
ou como o regulador de uma concessão privada para a oferta de serviços de energia (conforme
era o caso dos EUA até recentemente). Alguns tipos de reformas inclusive, especialmente
aquelas que se preocupam em introduzir maior competição no segmento da geração, têm
provocado um completo desinteresse - pelo menos inicialmente - em promover serviços de
2
utilidade ou benefícios públicos, como é o caso da eficiência energética seja pelas companhias
de geração, ou distribuição (como foi o caso da Noruega, Chile e Argentina).
O grande desafio dessas mudanças é, a nosso ver, garantir que a indústria de
eletricidade além de ser competitiva, seja também capaz de atender objetivos sociais, de
proteção ambiental, e assegurar investimentos que promovam maior sustentabilidade do
sistema energético para o futuro. É com esse objetivo que se desenvolve o presente trabalho
para analisar a experiência recente dos EUA com relação com a reestruturação do seu setor
elétrico e as iniciativas desenvolvidas naquele país para preservar os “bens públicos” (V.
definição na próxima seção). Embora seja um processo ainda em consolidação em vários
estados daquele país, é possível verificar desde o início o interesse e preocupação em
preservar o caráter interesse público dessa indústria. Nosso objetivo aqui é o de procurar
entender quais são e quais foram as motivações para preservar “bens públicos” e, na medida
do possível, procurar descrever os mecanismos que estão sendo discutidos ou colocados em
prática para a promoção desses bens no ambiente maior de competição. Também analisamos
o caso brasileiro que desde 1998 colocou em prática um mecanismo regulatório para financiar
eficiência energética e P&D, o que inicialmente se configura como um avanço considerável e
até mesmo mais agressivo quando comparado ao que se verifica nos EUA. Interessa-nos
verificar, no entanto se essa regulação realmente garante a provisão de bens públicos e quais
são os limites de uma regulação sem uma definição de uma política pública para eficiência
energética e P&D para o setor energético, como tem sido o caso brasileiro.
O presente trabalho consiste de 9 capítulos. No primeiro são apresentados os
conceitos de bens e benefícios públicos do sistema energético. Os capítulos 2 a 7 referem-se
ao caso norte-americano. No segundo capítulo analisam-se as principais causas e objetivos
das reformas nos EUA, buscando evidenciar as principais mudanças que poderiam
comprometero papel de interesse público dessa indústria. Os capítulos seguintes discutem
com maior detalhes os efeitos das reformas do setor para a eficiência energética, fontes
renováveis e pesquisa e desenvolvimento, procurando mostrar as iniciativas que foram
realizadas naquele país para garantir esses aspectos. O capítulo 6 discute o importante papel
da opinião pública organizada através de grupos civis na manutenção dos aspectos de
3
interesse público da indústria. O capítulo 7 resume alguns dos principais mecanismos utilizados
pelos governos estaduais e federal para promover programas de bens públicos nos EUA. O
capítulo oitavo discute a obrigatoriedade de implantação de programas de eficiência e P&D nas
empresas privatizadas no Brasil, seus primeiros resultados e limitações. As conclusões estão
discutidas no capítulo nono com algumas reflexões sobre aprimoramento da regulação para
fomentar iniciativas de interesse público da indústria de eletricidade.
Energia e “bem público”
É importante definir o que se entende como "bem público". Vários economistas no
início dos anos 50 e 60 se preocuparam com esse tema. São chamados de “bens públicos”
aqueles bens e serviços que não são produzidos em função da existência de um mercado
competitivo, ao contrário, são na verdade um clássico exemplo das chamadas imperfeições de
mercado. São bens (e serviços) consumidos por todos indivíduos e não podem ser restritos
para beneficiar somente um ou poucos grupos de compradores. Dessa maneira tampouco
existe interesse de indivíduos ou firmas agindo isoladamente na produção desses bens, uma
vez que não existirá um consumidor que individualmente esteja disposto a pagar por um bem
que é usufruído por todos1.
Bens públicos são caracterizados por três fatores. Um deles é o atributo da não
exclusão (ou não exclusividade), mencionado acima, ou seja, uma vez que esse bem foi
colocado a disposição de um consumidor, não é possível restringir o seu consumo por outros.
Por exemplo, investimentos em melhoria da qualidade do ar de uma cidade beneficiam todos
os cidadãos daquela região. Outro atributo de um bem público é a chamada não rivalidade: o
consumo desses bens por um indivíduo não diminui as possibilidades dos outros consumirem.
 
1 A teoria dos "bens públicos" teve início entre economistas europeus e começou a ser discutida
nos EUA em meados da década de cinqüenta, especialmente por Paul Samuelson. Mais tarde,
discussões sobre a teoria de ação coletiva (Mancur 1965) foram também baseadas na teoria
de bens públicos e deram novos enfoques sobre o acesso aos "bens públicos". Foi também
considerado que enquanto bens privados são perfeitamente fornecidos pelo mercado, o
suprimento de "bens públicos" deve se dar através de instituições políticas (Buchanan 1968)
(citação extraída de Mielnik 1998). Existe também o clássico artigo Hardin (1968) intitulado
“Tragedy of the Commons” que analisa o caso de uma vila onde cada habitante podia levar seu
carneiro para pastorear em campos que pertenciam a todos. Como o campo era coletivo, cada
um procurava levar o maior número de animais para pastar até exaurir a pastagem. Esse é um
exemplo que ilustra o tipo de dificuldades para gerenciar benefícios de recursos públicos. A
presente seção baseia-se em Pindyck&Rubinfeld (1994), Nordhaus (1999) e Rosset (1997).
4
Isso significa que a produção de quantidades adicionais desses bens não implica em que
novas quantidades de recursos seja utilizadas, em outras palavras, o custo marginal para a
produção de novos bens é zero. É claro que existem limitações quando a demanda por esses
bens é excessiva, por exemplo vias públicas utilizadas para trânsito de veículos é um bem
público que não exclui nenhum usuário, mas pode tornar-se congestionada em função de um
excesso de veículos trafegando ao mesmo tempo e impedir que outros veículos tenha acesso.
Finalmente, e como conseqüência dos aspectos anteriores, bens públicos são caracterizados
pela falta de interesse de firmas ou indivíduos em produzi-los. É necessário que sejam fundos
coletados da sociedade através de taxas, impostos, ou outras formas, para o financiamento da
produção desses bens.
No caso do setor de energia elétrica o que se observou na literatura recente dos EUA,
foi a preocupação de se definir quais seriam os aspectos de "bens públicos" cuja manutenção
seria necessária no contexto de menor regulação pública no que se refere a preços e
organização da indústria e maior competição entre as empresas.
Como exemplo dessa preocupação, tem-se que em 1994 a CPUC (CPUC, 1997)
apresentou um documento onde fica explicitada a relação de "bens públicos" que deveriam ser
mantidos pela nova configuração do setor elétrico da Califórnia e estabelecia níveis de recursos
que deveriam ser investidos em programas para que os mesmos fossem disponibilizados para
os cidadãos daqueles estado. Foi definido que os bens públicos eram: eficiência energética,
fontes renováveis, proteção ambiental, pesquisa, desenvolvimento e demonstração em áreas
de interesse público, e a manutenção de programas para atender a população de baixa renda.
Externalidades do setor energético
Este é outro conceito relevante quando se discute a reforma do setor energético.
Externalidades são os efeitos sobre terceiros, ou sobre a sociedade como um todo, causadas
por atividades na produção, transmissão, distribuição e consumo de energia que não são
capturados adequadamente através de mecanismos de preços. Essas externalidades podem
ser positivas quando beneficiam outros, ou negativas quando trazem prejuízos. Por exemplo,
embora os custos de produção de eletricidade através de painéis fotovoltaicos sejam maiores
que a eletricidade produzida por óleo diesel, o sistema de preços não reconhece nenhuma
5
vantagem da fonte renovável (solar) sobre o diesel. Como será visto mais adiante (Capítulo 4:
fontes renováveis e meio ambiente) os diferentes impactos sociais e ambientais das fontes de
energia podem também justificar a intervenção do setor público para sinalizar as preferências
da sociedade, quando os mecanismos usuais de mercado são limitados para esse fim.
A indústria de energia é particularmente responsável por uma série de impactos
negativos no meio ambiente local e global. Existem basicamente três maneiras de se procurar
refletir as preferências da sociedade de minimizar os efeitos negativos da produção ou
consumo de energia: estabelecimento de normas, ou padrões; impostos ou taxas; e mais
recentemente temos a criação de quotas de poluição que podem ser transacionadas entre os
agentes através de mecanismos de mercado.
O setor público pode estabelecer limites para emissões de poluentes, ou especificar
padrões de desempenho energético de equipamentos. Essa tem sido uma ferramenta muito
usada para controlar qualidade de combustíveis, poluição atmosférica, eficiência energética de
equipamentos e edificações, entre outros. A contínua revisão dessas normas tem possibilitado
incorporar os avanços tecnológicos e exigências da sociedade e em alguns casos inclusive,
induzir o desenvolvimento de novas técnicas e padrões de uso de energia.
Taxas ou impostos podem ser adicionados de acordo com critérios que possam
encarecer aquelas fontes de energia que são mais poluentes e favorecer as demais que
apresentem maiores benefícios sociais e ambientais.
A criação de quotas ou permissões transferíveis é um sistema onde se estabelece um
teto global para emissões (ou outro aspecto de interesse) que é repartido entre os agentes
responsáveis. Dependendo das possibilidades de cada um em promover reduções ele pode
transferir (vender) a parcela não utilizada de sua quota para um outro, ou seja, essas
permissões são negociadas entre os agentes. Esse mecanismopossibilita o aproveitamento de
diferentes oportunidades existentes entre as empresas de promover as reduções utilizando o
mecanismo de mercado (“preço” das permissões e o custo das reduções) para priorizar as
soluções de menor custo. Esse mecanismo foi introduzido com sucesso para controlar as
emissões de enxofre na indústria de eletricidade dos EUA (v. Capítulo 4) e mais recentemente
6
é parte dos esforços para controle de emissões de CO2 através do Mecanismo de
desenvolvimento Limpo do Protocolo de Quioto (v. Anexo).
Benefícios públicos de sistemas energéticos e o mercado
É possível verificar a preocupação que existiu em se definir quais devem ser os
interesses públicos a serem atendidos pela indústria de eletricidade nos EUA desde o início
das discussões sobre a restruturação. As discussões que se desenrolaram criaram a
possibilidade de um contexto favorável para proposição de políticas para o atendimento de
interesses públicos em mercados competitivos.
Golove & Eto (1996) sumariam os interesses públicos associados a essa indústria a
partir de vários documentos elaborados por órgãos encarregados de conduzir o processo de
reestruturação nos EUA: 1) promoção da eqüidade inter e intra-classe (eqüidade vertical) de
consumidores e entre gerações; 2) the equal treatment of equals (eqüidade horizontal), mesmo
tipo de consumidores recebem mesmo tratamento (tarifas, condições de
pagamento/fornecimento, etc.); 3) equilíbrio entre metas de longo e curto prazo que possuem o
potencial de comprometer o futuro das novas gerações; 4) proteção contra o abuso de poder
monopolístico; e 5) proteção geral para a saúde e bem estar dos cidadãos do estado, nação e
mundo.
Outro documento bastante esclarecedor sobre a visão do papel das políticas públicas
para a manutenção de benefícios coletivos da indústria de eletricidade nos EUA é o “Public-
Policy Responsabilities in a Restructured Electricity Industry” de Bruce, Hirst & Bauer (1995).
Esse trabalho foi escrito a partir dos resultados de um seminário onde participaram
representantes de diversos setores: companhias de eletricidade, PUCs, agências estaduais de
energia, NGOs, comunidade acadêmica e produtores de energia. A Tabela 1 mostra o elenco
de benefícios coletivos segundo esse estudo que estão associados à indústria de eletricidade e
sua relação com a promoção de crescimento econômico, eqüidade social e proteção ambiental.
É interessante verificar que houve a preocupação de se explicitar as áreas de atuação para
políticas públicas no novo ambiente de maior competição e menor regulação da indústria:
confiabilidade do sistema, investimentos em pesquisa e desenvolvimento, gerência de recursos
naturais e riscos, acesso não discriminatório de produtores à rede de transmissão, programas
7
de fornecimento de energia para população de baixa renda, estabelecimento de padrões
mínimos de qualidade de serviço, proteção aos consumidores, incentivo ao uso de fontes
renováveis e redução de níveis de poluição. Essas áreas de atuação atendiam a metas e
objetivos dessa comunidade e que devem ser a base das políticas públicas. Essa Tabela
mostra também a estreita relação da indústria de eletricidade com diversas áreas de interesse
público.
A Tabela 2 apresenta os possíveis impactos do mercado competitivo para o acesso
desses benefícios públicos. Enquanto alguns objetivos que satisfazem interesses coletivos
como, por exemplo a confiabilidade do sistema elétrico, poderão ser garantidos por um
mercado competitivo outros não o serão, e devem ser supridos por iniciativa do poder público.
Esse é o caso de medidas de proteção ambiental e proteção ao consumidor, entre outras.
Essas informações ilustram o importante exercício de análise feito nos EUA para se
entender os limites e os benefícios que o mercado competitivo pode trazer para a manutenção
dos aspectos de interesse público considerados relevantes naquele país.
9
Tabela 1: As responsabilidades de políticas públicas
Ações
Valores e objetivos
P&D
Confia-
bilidade do
sistema
Gerência
dos
recursos/ris
cos
GLD Acesso não
disc. Trans-
missão
Progra-mas
de Baixa-
renda
Padrões
mínimos de
serviços
Proteção ao
consumi-
dor
Energia
renovável
Redução de
níveis de
poluição
Progresso Econômico
Eficiência econômica 33 33 33 33
Competitividade industrial 33 33 33 33 33 33 33
Desenvolvimento
Econômico
33 33 33 33 33 33 33
Escolhas para
consumidores
33 33 33 33 33
Equidade Social
Repartição eqüitativa de
custos e benefícios
33 33 33 33 33 33 33
Participação pública 33 33 33
Proteção ao bem estar
público
33 33 33 33 33 33
Proteção ambiental
Geração e distribuição de
eletricidade limpa
33 33 33 33
33 33
Qualidade ambiental
regional
33 33
33 33
Fonte: Bruce, T. & E. Hirst, Bauer, D. 1995.
10
Tabela 2: O efeito do mercado nas responsabilidades públicas das empresas de energia
Ações favorecidas pelo mercado
Confiabilidade dos
sistema
Consumidores em um mercado competitivo poderão considerar a confiabilidade do
serviço e o preço pago para escolher seus fornecedores.
Acesso não-
discriminatório
Como a transmissão continuará a ser um monopólio, ela permanecerá sob a
regulação do FERC. Discriminação poderia ser um problema se os proprietários da
transmissão também controlassem a geração ou a distribuição.
Ações parcialmente favorecidas pelo mercado
Pesquisa e
Desenvolvimento
Haverá investimentos em determinados tipos de P&D. Algumas inovações poderão
ter repercussões sociais importantes, outras ficarão restritas a determinados nichos
e sempre terão o objetivo maior de aumentar a competitividade e lucros da empresa
de energia.
GLD Deverá haver o fornecimento de serviços de energia para os consumidores quando
essas atividades fornecerem receitas para as companhias. As decisões sobre que
tipo de programas se farão sob uma perspectiva da empresa (rate-impact measure
test) e não sob uma perspectiva social (total resource cost test)
Energia renovável A falta do PIR e a habilidade de engajar diversos atores nas decisões sobre a
utilização de recursos naturais deverá reduzir o uso de fontes renováveis que
possuem preços mais caros que as alternativas convencionais. Reduções em P&D
nessa área também adiarão a entrada de novas fontes. Por outro lado com o acesso
não discriminatório os produtores existentes poderão ter acesso a um mercado.
Gerenciamento de
recursos naturais e
riscos
Existe uma incerteza sobre os critérios que nortearão as decisões sobre
investimentos na exploração de recursos naturais, especialmente quando se pensa
no longo prazo.
Ações que não serão favorecidas pelo mercado
Controle da poluição
e proteção ambiental
Custos de controle de poluição ainda não são internalizados pela indústria. Se os
reguladores puderem estabelecer incentivos para a redução de níveis de emissões,
por exemplo, a indústria deverá procurar maneiras de atingir essa meta com o menor
custo. O despacho ambiental é uma maneira de se atingir esse objetivo.
Reguladores poderão taxar as plantas mais poluentes ou estabelecer um limite de
emissões.
Programas para
consumidores de
baixa renda
O fornecimento de serviços para consumidores de baixa renda não é uma atividade
rentável.
Padrões mínimos de
serviços
Referem-se aqui a serviços que devem ser mantidos obrigatoriamente (mesmo sem
pagamento) para os consumidores (como fornecimento durante os meses de
inverno). Esses serviços somente serão mantidos se forem mandatórios. Pequenos
consumidores ou consumidores cativos terão dificuldades para controlarem a
qualidade de serviços de energia.
Proteção ao
consumidor
O mercado por si mesmo não oferece garantias ao consumidor. Isso é importante se
houver um grande número de companhias e intermediários para vendasde energia.
Fonte: baseado em Tonn, Hirst & Bauer, 1995.
CAPÍTULO 2: A REFORMA DO SETOR ELÉTRICO NOS EUA
Antecedentes e motivações
Introdução
O setor elétrico dos EUA possui uma capacidade instalada de cerca de 725 GW (1996),
ou seja mais de dez vezes que o Brasil, o que dá idéia da complexidade e dimensão dos
impactos que as reformas devem causar no contínuo desenvolvimento de iniciativas de
economia de energia e de fontes renováveis naquele país. O crescimento do consumo total de
eletricidade tem sido modesto, entre 2-3% nos últimos anos, sendo que o setor comercial e
residencial apresentam as maiores taxas de crescimento. As reformas não foram motivadas
pela busca de maior eficiência no gerenciamento do setor, uma vez que já é um setor bem
administrado, com perdas técnicas em torno de 3% e perdas comerciais menores que 1%, mas
sim com o objetivo de reduzir os custos finais de energia, possibilitando a introdução de novas
tecnologias de produção de energia e aumentar a competitividade da economia americana no
mercado global.
O processo e velocidade da implantação das reformas variam muito de estado para
estado. Algumas regiões se encontram em estágios mais avançados, como a Califórnia e
estados da Nova Inglaterra, mas cerca de um total de 48 estados (1998) já estão introduzindo
reformas no setor para estimular a competição principalmente do lado da geração.
O objetivo deste capítulo é descrever de uma maneira geral as principais mudanças
ocorridas no setor elétrico e quais foram as motivações que determinaram iniciativas de
proteção aos bens públicos. Neste capítulo serão apresentadas as principais causas das
reformas no país e em alguns estados em particular. Inicialmente procura-se conceituar o
significado das reformas promovidas no âmbito da indústria de eletricidade de maneira geral,
para melhor colocar o contexto das mudanças nos EUA.
12
Conceituando as Reformas do Setor Elétrico
A análise de novas estruturas de organização do setor elétrico em vários países mostra
que existe uma grande diversidade de enfoques adotados. As mudanças que estão sendo
chamadas de “reformas” do setor energético são basicamente novas formas de organização
industrial e gerenciamento desse setor.
Para melhor apresentar as reformas implantadas nos EUA dentro do contexto de
possibilidades de novas organizações da indústria de eletricidade lança-se mão aqui de dois
referenciais: um que mostra as possibilidades de reformas segundo mecanismos de
coordenação entre os governo e empresas de energia, e outro que procura categorizar as
mudanças de acordo com sua natureza e objetivos.
As reformas segundo mecanismos de coordenação
Arentsen e Künneke (1996) propõem um modelo conceitual para representar os
diversos mecanismos de coordenação que caracterizam a organização de uma indústria
nacional de eletricidade. São considerados três tipos de mecanismos: preços de mercado,
acordos voluntários e autoridade governamental (Tabela 3). Cada unidade de decisão possui
um mecanismo de alocação prioritário com objetivos próprios.
Tabela 3: Tipologia de modelos de coordenação
Modelos de
coordenação
Tomadores de decisão Mecanismo de
alocação
Objetivo econômico
Mercado Indivíduo Sistema de preços Vantagens individuais
Rede de atores Grupo Acordos voluntários Vantagens mútuas
Hierarquia Autoridade pública Normas, leis, regras Interesse público
Fonte: a partir de Arentsen e Künneke (1996)
Uma combinação desses três mecanismos em pares, considerando “mecanismo de
coordenação dominante/ mecanismo de coordenação acessório”, gera a tipologia de modelos
de coordenação setorial que esses autores utilizam para estudar a organização do setor
13
energético em vários países. Essa tipologia oferece um referencial teórico para analisar a
diversidade de reformas setoriais (Tabela 4). Esses autores propõem chamar de liberalização a
qualquer movimento na direção ao topo da tabela e/ou à sua esquerda, ou seja fora da
localização da estrutura hierárquica e mais próxima do Mercado Puro.
Tabela 4: Tipologia de modelos de coordenação mistos
Mecanismo de coordenação dominante
Preço
(A)
Acordos Voluntários
(B)
Autoridade Pública
(C)
Preço Mercado Puro Auto-Coordenação
Competitiva
Hierarquia
Competitiva
(A)
Acordo
voluntários
Mercado
Coordenado
Auto-Coordenação
Pura
Coordenação
Hierárquica
(B)
M
e
ca
n
is
m
o
 d
e
 C
o
o
rd
e
n
a
çã
o
 S
e
cu
n
d
á
ri
a
Autoridade
pública
Mercado Regulado
pelo Poder Público
Auto-Coordenação
Controlada
Hierarquia Pura (C)
Fonte: a partir de Arentsen & Künneke 1996
Uma representação matricial desses modelos segundo o grau de centralização de seus
decisores permite elencar um espectro de configurações possíveis desde aquelas onde
predominam ações de Mercado baseada em preços de energia (Tabela 4, coluna A) até
Organização Hierárquica onde as iniciativas são do tipo “comando e controle” (Tabela 4, coluna
C). Como exemplo, podemos utilizar esse referencial representando a situação do Brasil até
meados da década de 90, como a de “Coordenação Hierárquica” uma vez que havia a
característica de interação entre diversos atores do setor elétrico, representando diferentes
companhias de eletricidade estaduais e regionais, sob a coordenação da ELETROBRÁS.
Decisões sobre o planejamento da operação e expansão, juntamente com financiamento e
execução dos planos eram coordenados através da ELETROBRÁS. A França através da
Eléctricité de France - EDF tem ainda a característica de ser tipicamente um caso de
“Hierarquia Pura”.
14
As reformas nos EUA e no Brasil
De acordo com essa tipologia, a presente reestruturação dos EUA pode ser descrita
como sendo um movimento a partir de um Mercado Regulado pelo Poder Público (através de
controle de tarifas e lucros das empresas) na direção de um Mercado Puro (competição livre
para produção e distribuição e preços determinados pelas regras de oferta e demanda). Nos
EUA, portanto, as reformas significam um movimento de baixo para cima, mas restrito à
segunda coluna à esquerda da Tabela 4, um movimento de (A,C) para (A,A).
Já no caso brasileiro as reformas implicam em mudanças profundas na propriedade (de
pública, ou estatal para privada) e gestão do setor que deixou de ter um planejamento
centralizado, em um movimento de (C, B) para (A,A) ainda não completado.
As reformas segundo sua natureza e objetivos
Um estudo realizado para o Departamento de Energia, Meio Ambiente e Tecnologia da
Agência norte-americana USAID (Hagler Bailly, 1996) categoriza em 5 os tipos principais de
reformas realizadas no setor elétrico a partir de uma análise comparativa entre vários países.
São elas comercialização, privatização, des-verticalização, competição para o mercado
atacadista mercado varejista, e regulação. No entanto, é bom ressaltar, se processam dentro
de um período de tempo que pode ser longo e incluir muitas das etapas descritas a seguir.
Comercialização
A comercialização significa a introdução de princípios de gerência e administração
comercial em companhias de propriedade do estado. Essas companhias passam a obedecer
as mesmas regras de preços, empréstimos, contabilidade e impostos que as empresas
privadas. São eliminados subsídios governamentais e outras vantagens como interferência e
garantias governamentais para obtenção de novos empréstimos. Freqüentemente o passivo de
dívidas da empresa é assumido pelo poder público.
Além disso, as empresas passam a apresentar sua contabilidade em separado para as
atividades de geração, transmissão e distribuição de energia. Suas decisões de investimentos
possuem um caráter comercial e deixam de ter uma conotação de política de desenvolvimento15
econômico-social, e sofrem ajustes visando redução de custos, aprimoramento do sistema de
tarifas e faturamento, melhorando a medição e redução de perdas comerciais.
A comercialização tem sido encarada como uma etapa intermediária na direção da
privatização e outras reformas. Alguns países tem introduzido a comercialização do setor
elétrico através da gestão privada, mas mantendo ainda o setor sob domínio público, como por
exemplo a Costa do Marfim, Gana, Senegal, Tailândia, Singapura e Malásia.
Privatização
Privatização significa a transferência de empresas originalmente pertencentes ao setor
público para a iniciativa privada. Em algumas situações inicia-se o processo dando à iniciativa
privada a oportunidade de investir em capacidade adicional e depois passa-se a vender as
companhias existentes. Uma maneira de transferir à iniciativa privada novos investimentos é
designar, a partir de um determinado plano de expansão, aqueles empreendimentos que
devem ser explorados pela iniciativa privada. Outra maneira tem sido identificar as
necessidades de nova capacidade e deixar para a iniciativa privada determinar as fontes de
menor custo. A privatização tem sido a maneira de se introduzir reformas em países como
Argentina, Brasil, Chile, China, Colômbia, Costa Rica, Costa do Marfim, entre outros.
Quando se decide pela transferência do setor energético para a iniciativa privada é
necessário manter um conjunto de regras para controlar o setor e proteger o interesse público,
principalmente o controle de tarifas e garantias de qualidade de serviço. Isso pode ser feito
através de contratos na ocasião da venda das empresas ou através de comissões/agências de
regulação. Idealmente as comissões de regulação e as novas regras devem ser criadas antes
da privatização por agências com certa independência política, mas isso tem sido raro.
Des-verticalização ou Reestruturação
Esse tipo de reforma refere-se a um desmembramento das companhias de eletricidade,
separando as unidades de geração, da transmissão e distribuição de energia em diferentes
companhias. A Inglaterra e o Chile foram os pioneiros a realizar esse tipo de reforma. Outros
países que estão adotando a des-verticalização incluem a Argentina, Austrália, Bolívia, Brasil,
El Salvador, Hungria, Nova Zelândia, Nicarágua, Paquistão, Filipinas, Polônia, Suécia, Ucrânia.
16
Em alguns países tem havido também um desmembramento horizontal com divisões
de companhias responsáveis por um segmento de atividade da indústria (geração ou
distribuição) segundo regiões geográficas.
Competição
Embora a porção da transmissão e distribuição seja considerada um monopólio natural,
pode-se introduzir a competição tanto para companhias de geração de energia (que venderão
no mercado atacadista) como também diretamente no varejo. A competição no lado da oferta
pode contar com produtores independentes de energia que podem negociar contratos com as
companhias de eletricidade.
A competição no varejo significa que consumidores finais podem negociar contratos de
compra diretamente com diferentes fornecedores. A competição no varejo inicia-se com
grandes consumidores industriais e comerciais, que são tipicamente mais atraentes para
disputarem contratos diretos com produtores de eletricidade.
Regulação
Esse é o tipo de reforma que vem associado principalmente quando também se
introduz a privatização. É seu objetivo principal proteger o interesse público, principalmente a
evolução de tarifas, qualidade do serviço e atendimento da região de concessão.
Quando existe uma privatização de companhias verticalmente integradas é
extremamente importante controlar a transferência de recursos dos consumidores para as
companhias através de regulação. Essa era a situação prevalecente nos EUA até
recentemente. Quando existe uma competição estabelecida no lado da geração deixa-se de se
regular esse segmento pois acredita-se que o próprio mercado se encarregará de controlar a
evolução das tarifas de suprimento.
As reformas nos EUA
O sistema elétrico americano já possuía uma estrutura descentralizada na qual vários
proprietários privados poderiam participar em um mercado competitivo para fornecimento de
energia, uma vez estabelecidas as novas regras. Não eram necessárias, portanto, iniciativas de
comercialização ou privatização de empresas.
17
Nos EUA duas das reformas mencionadas anteriormente foram praticadas: a des-
verticalização (ou reestruturação) da indústria e a introdução da competição a nível da geração
e distribuição, chamada de des-regulamentação. Foi necessário realizar uma reforma nas
regras de operação da indústria (des-regulamentação), eliminando total ou parcialmente as
restrições do governo de modo a permitir a mais completa competição entre as diferentes
unidades seja no mercado atacadista como no varejista.
Em quase todos os estados as reformas buscam inicialmente a competitividade do lado
da geração de eletricidade com a participação de novos agentes como os Independent Power
Producers – IPP (Produtores Independentes de Energia), ou mesmo intermediários comerciais
que poderão realizar contratos e entrar em processos de leilão promovidos por grandes
compradores de energia ou com operadores de sistemas de Transmissão/Despacho de
energia.
As motivações para as reformas nos EUA
Desde o início do século 20 até recentemente o setor elétrico era considerado um
monopólio natural nos EUA, e franquias eram concedidas para que companhias privadas (IOU)
operassem em regiões definidas. Em contrapartida estas companhias tinham a obrigação de
atender a área servida e eram submetidas a uma forte regulação pública abrangendo todos os
aspectos de sua operação. O controle público se dava através de comissões estaduais de
regulação. Ao longo do tempo, muitos estados introduziram a obrigação de se realizar o
planejamento integrado de recursos - PIR, um processo de planejamento onde oportunidades
de gerenciamento da demanda, proteção ambiental e utilização de recursos naturais para
produção de eletricidade eram contempladas simultaneamente. A partir desses estudos a
agência de regulação autorizava os investimentos das companhias de energia. A regulação da
indústria se realizava principalmente a nível estadual, sendo as transações inter-estaduais de
energia controladas por um órgão federal (FERC- Federal Energy Regulatory Commission).
As reformas que começaram a ser implantadas na década de 90 em diversos estados
dos EUA tiveram o objetivo principal de criar competição nessa indústria e reduzir custos finais
de energia dos consumidores, principalmente para o setor industrial, que necessitava manter-
se competitivo globalmente, e grandes consumidores comerciais. As mudanças incluíram a
18
introdução de novos tipos de compradores e produtores de energia2; novos mecanismos para
compra e venda de energia como leilões de blocos de energia de produtores; a des-
verticalização das companhias de eletricidade, separando as unidades de geração,
transmissão e distribuição. O resultado foi o surgimento de produtores independentes - IPPs,
uma entidade central para comandar a transmissão e o despacho de energia, companhias de
distribuição – DISCOs , companhias de comercialização ou brokers e companhias de serviços
de energia - ESCOs. Hoje o mercado de energia elétrica nos EUA é extremamente sofisticado
e dinâmico.
Nos primórdios da implantação da indústria de eletricidade nos EUA, no final do século
19, a situação era bem diferente. Não havia interesse em promover competição entre diferentes
produtores de eletricidade pois isso ocasionava um aumento nos custos de eletricidade aos
consumidores (Smeloff & Asmus, 1997, pg. 10.). Era um período onde a indústria recém
implantada estava lutando com dificuldadespara criar um mercado para seu produto. Admitia-
se na época que a produção de energia era um monopólio natural3 e debatia-se então se as
vendas (distribuição) de energia deveriam ser um monopólio privado ou público. A partir de
1907 um grupo, o National Civic Federation, composto por influentes homens de negócios e
banqueiros estabeleceu um modelo que foi adotado durante os 90 anos seguintes. Nesse
modelo as companhias elétricas eram consideradas monopólios naturais mas eram reguladas
por comissões públicas. As empresas poderiam produzir e vender energia em uma
determinada região de sua exclusividade, ou seja, elas possuíam uma franquia territorial para
explorar os serviços de energia. Esse tipo de regulação criou bases estáveis que propiciaram o
desenvolvimento dessa indústria que a partir de então assumiu uma estrutura verticalizada
responsável por todas as atividades desse negócio.
 
2 Além das classes de consumidores (residencial, comercial, industrial, etc.) com necessidades e
nível de informação distintos, existe uma diversidade de atores como os IOU (Investor-Owned
Utility), POU (Public-Owned Utility), NGU (Non Generating Utility), e ESCO (Energy Services
Company).
3 Um monopólio natural se caracteriza quando uma firma pode produzir um dado nível de
produção de um produto a custos inferiores que quando várias firmas o fazem. Monopólios
naturais ocorrem em indústrias que exibem custos médios de longo prazo decrescentes devido
a economias de escala.
19
Segundo Smeloff & Asmus (1997) foi somente nos anos 30 que houve um esforço e
interesse no desenvolvimento de uma indústria pública de eletricidade. Isso ocorreu durante o
governo de Franklin D. Roosevelt com o início da exploração do potencial hidroelétrico através
de agências públicas. Dessa época datam as primeiras companhias (públicas) municipais, e
diferentemente das outras não eram submetidas às comissões públicas de regulação, uma vez
que já eram de propriedade de governos municipais e submetidas à fiscalização pública.
Causas das mudanças na estrutura do setor elétrico dos EUA
Historicamente as IOUs dominaram a indústria de eletricidade nos EUA, representando
na década de 90 mais de 70% da capacidade de geração e a maior parte da T&D e durante
quase 90 anos esse setor foi operado como uma coleção de monopólios regulados,
geograficamente independentes entre si. As companhias possuíam franquias para serviços de
eletricidade que permitiram sua integração vertical, condição importante para atingir as
economias de escala.
A indústria de eletricidade se desenvolveu muito bem de acordo com esse modelo até
a década de 70. Significativas economias de escala eram até então obtidas com o sistema de
grandes monopólios, que por sua vez construíam grandes usinas e sistemas de transmissão
cada vez maiores. O desenvolvimento tecnológico durante o período possibilitou que as
turbinas a vapor melhorassem continuamente sua eficiência permitindo a construção de usinas
maiores e mais eficientes. Durante esse período houve a diminuição dos custos de produção
de eletricidade, aumento extraordinário do consumo e lucros para a indústria. No entanto, na
medida em que se estabilizaram os ganhos de eficiência técnica através de economias de
escala também se estabilizaram os custos de produção e rentabilidade da indústria. Nesse
momento a energia nuclear passou a ser então uma alternativa tecnológica procurada pela
indústria para diminuir os custos de uma geração baseada até então no carvão.
No final da década de 60 a energia nuclear começava a ser implantada em várias
regiões do país. Ao mesmo tempo dois fatores começaram a impor mudanças no setor:
problemas internos da economia dos EUA (alta inflação e pressões para manter a
competitividade de seus produtos no mercado internacional), e o surgimento de um forte
movimento de consumidores de energia e de ambientalistas.
20
Para um setor intensivo em capital como este, os custos crescentes de financiamento
pressionavam aumento das tarifas dos consumidores. Os novos preços do petróleo da década
de 70 tiveram que ser repassados, uma vez que grande parte da eletricidade era baseada em
petróleo e gás natural.
Concomitantemente uma nova legislação ambiental estava sendo posta em prática a
nível federal e em alguns estados americanos como a Califórnia. É criada a agência ambiental
americana EPA, e leis ambientais bastante restritivas como o Clean Air Act e o California
Environmental Quality Act, entre outros.
Um dos resultados desse conjunto de medidas foi que os custos e o tempo necessário
para a implantação de projetos energéticos começaram a crescer. Na medida em que esses
custos começaram a ser repassados aos consumidores uma forte reação começou a ser
orquestrada por todo o país através de entidades civis. Os grupos de pressão começaram a se
organizar de maneira bastante efetiva e passaram a influir nas audiências das Comissões de
regulação onde se debatiam as novas tarifas (v. também Cap. 6). Resultados importantes
começaram a surgir com a criação de tarifas especiais de cunho de assistência social para
consumidores e foram incrementados os esforços para conservação de energia.
Durante o governo Carter houve interesse em aumentar a independência energética
dos EUA, começou-se a tomar medidas para promover a substituição do petróleo importado e
incentivar a conservação de energia. Três importantes decretos federais foram assinados
durante sua gestão com implicações para os investimentos do setor elétrico que viriam a
seguir:
· O Power Plant and Industrial Fuel Act, que proibia o uso de derivados de petróleo e gás
natural em novas usinas termelétricas. Nessa época metade do petróleo usado em
termelétricas do país era importado e havia também a preocupação com o nível das
reservas de gás natural. Além disso, a população já tinha experimentado problemas com o
abastecimento desse combustível durante os meses de inverno de 1977 e 78. A idéia
prevalecente na época era preservar o gás para aquecimento doméstico.
21
· O Natural Gas Policy Act foi criado para des-regulamentar os preços das novas jazidas e,
com isso estimular a exploração de gás natural no país. Com essa medida os preços de gás
passaram a ser determinados pelo mercado.
· A competição no setor elétrico começou de certo modo com o decreto do PURPA (Public
Utilities Regulatory Policy Act). Esse decreto estipulava que as companhias deveriam
comprar eletricidade de produtores independentes quando o preço era menor que o custo de
se construir novas usinas. Em 1982 a CPUC autorizou contratos de longo prazo que foram
fundamentais para o desenvolvimento de produtores independentes. Outras companhias em
várias partes do país começaram a ver as vantagens das tecnologias que começavam a ser
instaladas na Califórnia. Eram tecnologias de geração em pequena escala.
A partir da década de 80 principalmente, as economias de escala na geração foram
drasticamente reduzidas com o surgimento em escala comercial de novas tecnologias como
turbinas a gás com ciclo combinado que podiam ser instaladas modularmente com custos de
capital e prazos de construção muito menores que as principais tecnologias disponíveis
comercialmente.
Em 1992 o Energy Policy Act (EPACT) facilitou ainda mais a des-regulamentação
obrigando o acesso à rede de transmissão para produtores que quisessem vender energia a
grandes consumidores (third party wheeling of power to wholesale customers).
Quais foram as mudanças e principais impactos
Na seção anterior definimos reestruturação como sendo o processo de mudanças na
forma de organização de um determinado tipo de indústria e des-regulamentação como sendo
uma reforma nas regras de operação dessa indústria, eliminandototal ou parcialmente as
restrições do governo de modo a permitir a mais ampla competição entre as diferentes
unidades dessa indústria. Na verdade, o setor energético é um dos últimos a experimentar o
processo de des-regulamentação e reestruturação nos EUA. Esse tipo de experiência em
várias indústrias similares a de energia elétrica já se iniciou há uma década, como foi o caso da
indústria de gás natural, telecomunicações, companhias aéreas, transporte rodoviário de carga.
Todas essas indústrias possuem um conjunto de produtores independentes que se utilizam de
22
uma rede de dutos, vias, estradas, linhas de transmissão, etc. para fornecer seus produtos e
serviços a seus consumidores - portanto similares à indústria de eletricidade - já passaram por
um processo de des-regulamentação há mais de uma década.
O resultado da experiência com des-regulamentação nessas indústrias tem
demonstrado, segundo afirma Crandall & Ellig (1998), que maior competição trouxe benefícios
aos consumidores quando comparada com a situação anterior de forte regulação econômica.
Esses autores, baseados em outros estudos, mostram que houve uma queda real de preços ao
consumidor final para os produtos dessas indústrias e quantificam esses benefícios aos
consumidores4.
Esses fatos foram importantes não só para tornar o debate em torno das reformas do
setor elétrico mais concreto, como também já apontavam um referencial para as iniciativas de
proteção ao consumidor e para disciplinar as transações entre fornecedores, redes de
distribuição e consumidores finais. Outro elemento importante foi o fato que consumidores,
especialmente aqueles do setor comercial e industrial, já possuíam a experiência de se
relacionar com diferentes fornecedores, especialmente na área de telecomunicações, e atuar
dentro de um mercado mais competitivo.
A Figura 1 representa esquematicamente a estrutura da indústria de eletricidade e a
abrangência do órgão regulador antes e depois das reformas. O poder público continua sendo
o responsável pela elaboração de políticas gerais para o setor através de seus órgãos, como o
DOE (Department of Energy) a nível federal e os organismos correspondentes a nível estadual,
mas com menor interferência que antes das reformas.
As companhias de eletricidade foram desmembradas (des-verticalizadas), sendo que
no segmento da geração inicialmente houve a criação de um sistema de um power pool onde
os geradores competem entre si para vender energia a compradores, ou então um sistema
onde os geradores fornecem ao Operador Independente do Sistema (ISO- Independent System
Operator) suas planilhas de regime de operação, que descrevem as quantias e custos de
 
4 Após a des-regulamentação da indústria de telecomunicação estima-se que US$ 5 bilhões
(1995 $) foram economizados pelos consumidores, no setor de aviação civil a cifra é de US$
19,4 bilhões, no transporte de carga rodoviária US$ 19,6 bilhões e no transporte ferroviário US$
9,1 bilhões (Crandall&Ellig 1998).
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energia a serem fornecidas ao longo de um período de tempo. Ao ISO compete a consolidação
dessas planilhas e planos de operação diversos assegurando os melhores preços e
confiabilidade do sistema. O ISO é responsável pelas estimativas horárias de demanda,
controle de leilões de compra de energia (caso seja essa a opção escolhida) e despacho de
energia. O ISO não pode ser proprietário de sistemas de transmissão ou geração e não pode
determinar os preços de energia ou de transmissão.
Com as reformas nos EUA as comissões de regulação não são mais responsáveis pela
fiscalização do segmento de geração, apenas naqueles estados que ainda mantém
companhias verticalmente integradas, ou quando ainda não existe competição. O papel
tradicional de se controlar a evolução das tarifas de geração também está sendo abolido com
as reformas, uma vez que se espera que o próprio mercado se encarregará de minimizar os
preços de energia. Essas agências controlarão as tarifas para a transmissão e distribuição,
mas não mais pelo sistema de custo do serviço e uma taxa de retorno, e sim através de
sistema que incentive preços finais mais baixos possíveis.
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 ANTES DA REESTRUTURAÇÃO APÓS A REESTRUTURAÇÃO
Figura 1: Representação esquemática da estrutura do Setor Elétrico dos EUA, antes e após as
reformas
Fonte: a partir de USAID/Office of Energy.
Impactos das mudanças
Nesta seção serão analisados alguns dos impactos que a reestruturação ocasionou
com relação a eqüidade, papel do governo federal, acesso e divulgação de informações, e
promoção de substituição entre eletricidade e gás. Nos capítulos seguintes serão analisados os
impactos das reformas para o fornecimento dos chamados bens públicos, conforme foi definido
no capítulo 1: eficiência energética, fontes renováveis, proteção ambiental e pesquisa e
desenvolvimento. Serão discutidos mecanismos que estão sendo considerados para a
proteção ou promoção desses bens dentro de um contexto de competição e quais foram os
motivos que levaram à sua implementação.
POLÍTICASPOLÍTICAS
GERAÇÃOGERAÇÃO
TRANSMISSÃOTRANSMISSÃO
DESPACHODESPACHO
IMPORT/IMPORT/
EXPORT.EXPORT.
DISTRIBUIÇÃODISTRIBUIÇÃO
AGÊNCIAS EXECUTIVAS
FEDERAIS E ESTADUAIS
COMPANHIAS
VERTICALMENTE
INTEGRADAS
CONSUMIDORES
REGULAÇÃOREGULAÇÃO
AGÊNCIAS
REGULADORAS
FEDERAIS E
ESTADUAIS
POLÍTICASPOLÍTICAS
GERAÇÃOGERAÇÃO
 OIS/ OIS/
 POWER POWER
 EXCHANGE EXCHANGE
 DISTRIBUIDORES DISTRIBUIDORES
REGULAÇÃOREGULAÇÃO
AGÊNCIAS
REGULADORAS
FEDERAIS E
ESTADUAIS
NOVO DIS-
TRIBUIDOR
CIA. DE
ELE-
TRICIDADE
CIA DE TRANS-
MISSÃO
CIA DE DES-
PACHO
CIA GE-
RADORA
PROD. IND.
INTERME-
DIÁRIOS
AGÊNCIAS EXECUTIVAS
FEDERAIS E ESTADUAIS
CONSUMIDORES
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Quadro 1: As Agências de Regulação da Califórnia e suas Atribuições
The California Public Utilities Commission (CPUC) é a principal agência governamental que
fiscaliza as empresas de serviços públicos (eletricidade, gás, telefone, água e esgotos e transportes). Ela
é constituída por 5 commissioners designados pelo governador para um período de 6 anos e aprovados
pela Assembléia Legislativa do estado. Ela é responsável pela aprovação de preços para eletricidade e
atende os interesses dos consumidores, fiscaliza e aprova os planos de investimentos e a operação das
empresas de eletricidade. Foi a entidade principal e responsável pelo plano de re-estruturação do estado.
Com a re-estruturação a CPUC não é mais responsável por determinar as tarifas a serem cobradas, mas
continua sendo o principal fiscalizador para garantir a qualidade e fornecimento de energia para o estado,
bem como a manutenção dos programas de “bens públicos”.
The California Energy Commission (CEC) também é constituída por 5 elementos designados
pelo governador para um período de 4 anos e aprovados por um comitê específico da Assembléia
Legislativa estadual. A lei exige que quatro membros da CEC tenham especializações nas áreas de
engenharia e ciências exatas, proteção ambiental, economia e direito. O quinto membro deve ser um
representante do público geral. A CEC é responsável por cinco áreas de atividades: projeção da demanda
futura de eletricidade do estado, desenvolvimento de fontes renováveis, promover o uso eficiente de
energia, licenciamento de usinas termelétrica com capacidade maior que 50 MW e o planejamento de
planos de emergência para o estado5.
The Federal Energy Regulatory Commission (FERC) é constituída por cinco elementos
apontados pelo presidente e aprovados pelo Senado Federal. È o órgão encarregado de regular as
vendas de energia entre os estados americanos. FERC verifica se as taxas cobradas para a transmissão
são

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