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Mobiliario Baiano_Monumenta IPHAN

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M o b i l i á r i o b a i a n o
M
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M a r i a H e l e n a o c H i F l e x o r
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H
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F
l
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A Coleção Obras de Referência do Programa Monumenta/Iphan 
reedita mais um título para a bibliografia básica do Patrimônio: a pesquisa da 
professora Maria Helena Flexor a respeito dos móveis e do mobiliário usado 
em Salvador do início do século XVIII até meados do século XIX. 
A obra, agora revista e atualizada, apresenta o inventário dos móveis 
encontrados na primeira capital brasileira durante o período e localiza 
os exemplares subsistentes. Além disso, trata dos estilos, da mão 
de obra e dos materiais empregados em sua confecção, oferecendo fartas 
referências bibliográficas e iconografia.
M o b i l i á r i o b a i a n o
M a r i a H e l e n a o c H i F l e x o r
M o n u M e n t a / i p H a n
c r é d i t o s
Presidente da rePública do brasil
Luiz Inácio Lula da Silva
Ministro de estado da cultura
João Luiz Silva Ferreira (Juca Ferreira)
Presidente do instituto do PatriMônio Histórico e artístico nacional
coordenador nacional do PrograMa MonuMenta
Luiz Fernando de Almeida
coordenador nacional adjunto do PrograMa MonuMenta
Robson Antônio de Almeida
coordenação editorial
Sylvia Maria Nelo Braga
edição 
Caroline Soudant
coPidesque
Ana Lúcia Lucena
 
revisão e PreParação
Denise Costa Felipe, Gilka Lemos
 
design gráfico
Cristiane Dias
 
diagraMação
Ronald Neri
 
fotos e ilustrações
Arquivo da autora, Caio Reisewitz, Nelson Kon, Sylvia Braga, Editora de Arte Espade
caPa e guarda
Caixão ou arcaz. Século XVIII. Sacristia da Catedral de Salvador. Foto de Caio Reisewitz, 2008.
F619m Flexor, Maria Helena Ochi.
Mobiliário baiano. 
Brasília, DF: Iphan / Programa Monumenta, 2009.
 176 p.: il.; 26cm. (Referência ; 3)
ISBN 978-85-7334-119-5
1. Mobiliário – Bahia. 2. Patrimônio histórico - conservação. 3. Instituto do Patrimônio Histórico e 
Artístico Nacional. 4. Programa Monumenta. I. Título. II. Coleção.
CDD 64z0
www.iphan.gov.br | www.monumenta.gov.br | www.cultura.gov.br
 
 a p r e s e n t a ç ã o 0 7
 i n t r o d u ç ã o 0 9
1 | p a n o r a M a H i s t ó r i c o 1 2
2 | e s t u d o s c l á s s i c o s 2 2
3 | M e t o d o l o g i a d o p r e s e n t e e s t u d o 3 0
4 | M ã o d e o b r a : o s o F í c i o s M e c â n i c o s 3 6
5 | M a t e r i a i s u t i l i z a d o s 6 4
6 | M ó v e i s e M o b i l i á r i o 7 8
7 | c o n c l u s õ e s 1 3 8
8 | g l o s s á r i o 1 4 4
9 | r e F e r ê n c i a s b i b l i o g r á F i c a s e b i b l i o g r a F i a 1 5 8
s u M á r i o
~6~
~7~
a p r e s e n t a ç ã o
O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional vem publicando, desde a 
sua fundação em 1937, títulos fundamentais para a promoção do patrimônio histórico e 
suporte do ensino de arte e arquitetura no país.
Um grande acervo foi editado, mas muitas obras relevantes estão esgotadas 
e, como jamais integraram os catálogos das editoras comerciais, encontram-se hoje 
inacessíveis para um público carente da bibliografia básica sobre nosso patrimônio.
É pensando, portanto, nos estudantes, pesquisadores, professores de arte, história 
e arquitetura que o Programa Monumenta/Iphan chamou para si a tarefa de reeditar 
importantes textos de referência, tais como Arquitetura e Arte no Brasil Colonial, de John 
Bury, e o Atlas dos Monumentos Históricos e Artísticos do Brasil, de Augusto da Silva Telles.
Neste momento, um novo título é lançado, em edição revista e atualizada: o 
Mobiliário baiano, de Maria Helena Flexor, um minucioso estudo dos móveis e do mobiliário 
em uso em Salvador, do início do século XVIII até meados do século XIX. Mais que um 
simples inventário dos móveis encontrados na primeira capital brasileira durante o período, 
a autora apresenta os estilos, a mão de obra e materiais empregados em sua confecção, 
além de localizar os exemplares subsistentes e levantar um extenso material bibliográfico, 
textual e iconográfico, do qual o leitor certamente poderá tirar proveito.
 
 Luiz Fernando de Almeida
 Presidente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
 Coordenador Nacional do Programa Monumenta
Dezembro 2009
Papeleira rococó, século XVIII-XIX. Museu de Arte da Bahia.
~9~
i n t r o d u ç ã o
O conteúdo deste livro foi desenvolvido com base em estudo feito nos anos 1970, 
enriquecido ou reafirmado, posteriormente, ao longo de mais de trinta anos, com vários 
outros trabalhos, muitos dos quais apresentados em colóquios e congressos ou elaborados 
para publicação em livros e periódicos, nacionais e internacionais.
O estudo centra-se, sobretudo, em Salvador, sede do governo colonial de 1549 a 
1763. Como também foi capital, sucedendo Salvador, o Rio de Janeiro (1763-1960) serve de 
base para algumas comparações. São acrescentados exemplos do estado de Minas Gerais, 
considerado por alguns autores, a partir dos anos 1930-1940, produtor da mais importante 
expressão da arte nacional. Citam-se, eventualmente, outras regiões.
Focalizou-se nesse estudo os móveis e mobiliário em uso na cidade no período 
compreendido entre 1700 e meados do século XIX. Escolheu-se como baliza inicial o princípio 
do século XVIII, por corresponder a um momento em que a sociedade soteropolitana já 
estava administrativa, social e economicamente estruturada, dotando-se de registros 
documentais mais regulares. A baliza final, meados do século XIX, corresponde ao momento 
em que as residências passaram a ser compostas não mais por peças individualizadas de 
móveis, mas por conjuntos de móveis, ou mobília, com uniformidade formal, estilística e 
decorativa, de origem ou de influência estrangeira1. 
A pesquisa dá também a conhecer o tipo de mão de obra que atuou, durante o 
período considerado, na Cidade do Salvador. Estende-se, portanto, à organização dos oficiais 
mecânicos, como eram chamados os artesãos ou artífices de diversas especialidades, como 
marceneiros, carpinteiros, torneadores, correeiros e ferreiros. 
Para este estudo foram coletados dados na documentação, manuscrita e impressa, 
do Arquivo Histórico Ultramarino e Biblioteca da Ajuda, de Lisboa, do Arquivo Público do 
Estado da Bahia, do Arquivo Histórico da Prefeitura Municipal do Salvador, hoje sob a 
guarda da Fundação Gregório de Mattos, e do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia. 
Essa documentação inclui inventários e testamentos, cartas do governo, registros de 
correspondências entre Brasil e Portugal, livros de cartas de exame, termos de eleições de 
oficiais mecânicos, livros de posturas, provisões do senado, livro de registro de licenças, 
cartas do senado e atas da câmara. Jornais também integram a bibliografia.
Como complementação, buscou-se obter informações sobre os materiais usados 
na construção dos móveis e realizou-se um extensivo levantamento bibliográfico, textual e 
iconográfico, em catálogos ou fotografias de coleções de museus e particulares. De alguns 
móveis, no entanto, não foi possível localizar nenhum exemplar em Salvador, recorrendo-
se a modelos semelhantes de outras regiões do país, de Portugal, França ou Inglaterra, 
cujas descrições coincidiam com aquelas dos documentos consultados.
Conjunto de mobília neoclássica, século XX. Museu Carlos Costa Pinto.
M o b i l i á r i o b a i a n o
~10~
Usam-se citações de documentos de época para introduzir no estudo o olhardos 
personagens daqueles tempos e permitir que se verifiquem as diferenças que marcavam os 
habitantes de Salvador dos séculos XVIII e XIX. Essas citações terão a ortografia atualizada 
para facilitar a leitura e compreensão. Também para facilitar a compreensão, é apresentado 
um glossário, no final do livro.
n o t a s
1 – O levantamento envolveu a consulta, no Arquivo Público do Estado, dos inventários e de 
alguns testamentos referentes à capital. Dos “inventários dos bens” ou “autos de partilha”, 
extraíram-se dados descritivos, por vezes bastante minuciosos, de 14.800 móveis, num total 
de 1.843 inventários. Esse levantamento foi complementado por bibliografia e inventários 
impressos, usados a título de comparação, já que se partia de metodologia completamente 
diversa de estudos anteriores.
Antifonário híbrido 
(clássico renascentista/
barroco), século XVIII. 
Detalhe do caixão ou arcaz clássico e bofete barroco, século XVIII. Sacristia da Igreja do Convento do Carmo, Salvador.
I n t r o d u ç ã o
panoraMa Histór ico
1
~15~
p a n o r a M a H i s t ó r i c o
a c i d a d e e a s o c i e d a d e
Em princípios do século XVIII, a Cidade do Salvador já era bastante povoada, 
segundo Thales de Azevedo1. Não há coincidência entre os números da população total 
citados pelos autores, mas estes estão concordes em afirmar que a maioria dos habitantes 
era constituída por pretos e pardos. No mapa das freguesias, de 1775, consta que as “[...] 10 
freguesias da cidade contêm 7.080 fogos, com 40.992 almas, a maior parte pretos e pardos 
cativos, porém os fogos a maior parte são brancos”2. 
Essa característica não mudaria até o final do século, segundo as informações de 
José da Silva Lisboa e Luís dos Santos Vilhena. Em carta de 18 de outubro de 1781, dirigida 
ao doutor Domingos Vandelli, diretor do Jardim Botânico de Lisboa, Silva Lisboa dizia que 
“a cidade da Bahia tem quase 50.000 (habitantes), de que só a quarta parte será composta 
de brancos”3. O cronista Vilhena computava menos de 60.000 habitantes, e estimava: “[...] 
a terça parte de todos estes habitantes incluindo o Recôncavo poderão ser de brancos, e 
índios, sendo as duas outras partes de negros e mulatos”4. 
Os pretos, se não moravam com seus senhores, distribuíam-se pelos becos e 
ladeiras, em casas pobres, como as da ladeira da Misericórdia. Segundo informava um 
documento, as vítimas do desabamento de terras nesse local, no inverno de 1797, foram 
notificadas como “sendo quase todos pretos, e pretas, e nenhuma pessoa de consideração”5. 
As casas nobres “de sobrado e com loja de alugar” distribuíam-se em pontos não 
muito distantes do primeiro núcleo de povoamento de Salvador, entre a Igreja da Ajuda e 
o Pelourinho. 
Segundo Vilhena, os melhores edifícios estavam na Praia, ou Cidade Baixa, bairro 
“opulento pela assistência, que nele fazem os comerciantes da praça”. Sobre a Cidade 
Alta, comenta que “os seus grandes edifícios, templos, e casas nobres, são de ordinário 
pelo gosto e risco antigos, em que se notam algumas irregularidades, à exceção de poucos 
mais modernos”6. 
Tudo isso foi confirmado por outro documento, no qual se afirma: 
“ [...] é certo que os edifícios não são da melhor arquitetura, nem da mais sólida 
construção, apesar de se encontrarem alguns nobres como sejam templos e também 
várias casas particulares muito boas, e de gosto mais moderno; as ruas são limpas, 
mas não regulares, nem calçadas com perfeição.7” 
O distanciamento socioeconômico que a escravidão criou, especialmente na Bahia, 
entre brancos, pardos, mulatos e pretos cativos mereceu críticas por parte de Vilhena: 
Fachada da igreja e detalhe do Convento do Carmo, século XVII-XVIII, Salvador.
~16~
M o b i l i á r i o b a i a n o
“os brancos naturais do país hão de ser soldados, negociantes, escrivães, ou 
escreventes, oficiais em algum dos tribunais, ou Juízo de Justiça, ou Fazenda, 
e alguma outra ocupação pública, que não possa ser da repartição dos negros, 
como cirurgiões, boticários, pilotos, mestres, ou capitães de embarcações, caixeiros 
de trapiches, etc., alguns outros se bem que poucos, ou raros, se empregam em 
escultores, ourives, pintores, etc.“8
Segundo o mesmo autor, “há outros que entusiasmados sem fundamento, de que 
são alguma coisa neste mundo, vivendo em sua casa envolvidos na sórdida miséria, quando 
saem fora se empavesam de tal forma, que até custa reverenciar a Deus”9. Essa observação 
é confirmada por outro documento:
“A maior parte [dos escravos] é bem inútil ao público e só destinada para servir 
aos caprichos e voluptuosas satisfações de seus senhores. É prova de mendicidade 
extrema o não ter um escravo: ter-se-ão todos os incômodos domésticos, mas um 
escravo a toda a lei. É indispensável ter ao menos 2 negros para carregarem uma 
cadeira ricamente ornada, um criado para acompanhar esse trem. Quem saísse à 
rua sem esta corte de africanos, está seguro de passar por um homem abjeto e de 
economia sórdida.”10 
Não deixou Silva Lisboa de criticar, também, as senhoras patrícias.
Os brancos mostravam o que não eram. A ostentação pública de riqueza, muito 
embora nem sempre essa riqueza fosse real, era comum entre eles, não fugindo à exceção 
os religiosos, como observaram os Arcebispos Frei D. Manuel de Santa Inês11 e Frei D. 
Antônio Correia12, nem os militares.
Essa parece ter sido a feição de Salvador do século XVIII, principalmente na sua 
segunda metade. Mesmo com a mudança da capital para o Rio de Janeiro, em 1763, o luxo 
aparente da sociedade não deixou de existir.
Dos senhores e proprietários das residências – umas ricas, outras médias, 
poucas pobres e a grande maioria, de brancos – foram consultados inventários e alguns 
testamentos. Levantaram-se dados dos pertences daqueles habitantes que residiam nas 
ruas Direita da Praia, do Pilar, das Laranjeiras, do Maciel, Cruzeiro de São Francisco, Direita 
das Portas do Carmo, Santo Antônio Além do Carmo, Taboão, Direita de Palácio, São Bento; 
na Baixa dos Sapateiros; nas ladeiras da Praça e da Preguiça e, à medida que se caminhava 
para o século XIX, e com a melhoria dos transportes urbanos, São Pedro Velho, Piedade, 
Mercês, Vitória, Estrada da Graça, Saúde, Ribeira, Itapagipe. Deve-se, no entanto, ressaltar 
que, até meados dos oitocentos, existiam engenhos na região do Pilar, chácaras em Brotas, 
Rio Vermelho e Barra.
~17~
Pa n o r a m a h i s t ó r i c o
Naquele século, com o processo que Gilberto Freyre13 chamou de “reeuropeização” 
do Brasil, verificou-se a adoção, pela assimilação, pela imitação, pela coerção, na 
colônia e depois no império, de “uma série de atitudes morais e de padrões de vida que, 
espontaneamente, não teriam sido adotados pelos brasileiros.” 
A feição de Salvador começou, então, a se modificar. 
A esse tempo, os franceses também tiveram grande influência, impondo as suas 
modas. Não eram raros os anúncios de jornais acusando a presença de modistas francesas, 
hospedadas em alguma parte central da cidade, dispostas a receber as senhoras baianas, 
para vender seus vestidos e acessórios, trazidos diretamente de Paris. E vieram acessórios 
para casa que guardaram, por muito tempo, sua designação original entre os brasileiros, 
como, após 1850: retrete, toilette, bidet, console, plateau, étagers, etc. 
Foi nessa época que algumas modas francesas retornaram, formando agora 
conjuntos de mobílias. É o caso do modelo denominado “estilo Luís XV” ou “à Luís XVI” 
que se usou no Brasil até o princípio do século XX, sendo o único estilo assim chamado 
documentadamente. Reavivou-se então o móvel barroco, confeccionado mecanicamente e 
em série, de forma estilizada, compondo o estilo eclético.
Simultaneamente, registrou-se o aumento emnúmero dos caixeiros viajantes, que 
eram portadores de produtos importados, bem como dos bazares, nos quais se vendiam 
“trastes”, tanto novos, quanto usados. 
Cabe ainda enfatizar que, fora as madeiras e couros, todos os materiais e utensílios 
vinham de Portugal. No final do século XVIII, não eram raros os produtos que chegavam 
da Inglaterra, através dos portos de Lisboa ou 
do Porto. Importavam-se desde pregos, colheres 
de pedreiros, candeeiros, almofarizes, bacias 
de estanho ou de arame, panelas de cobre, 
tigelas de pó de pedra, mangas de vidro, baús, 
carteiras de mão, bancas de abrir, cadeiras, 
mesas de abas de jantar, até mesas de chá ou 
de jogo. Quadros, livros, instrumentos musicais 
e relógios eram raros. Os espelhos e vidros só 
foram mais profusos no século XIX. E também 
eram importados. 
Os móveis, especificamente, tinham 
ainda outras origens. Nas últimas décadas do 
século, viam-se anúncios como estes:
Caixão ou arcaz híbrido 
(clássico/renascentista 
e barroco), século XVIII. 
Sacristia da Igreja do 
Convento de Santa Teresa, 
Museu de Arte Sacra, 
Salvador.
~18~
M o b i l i á r i o b a i a n o
“Indústria Americana
Figuras, bustos, cantos, flores e outros enfeites de talha, preparados com a maior 
perfeição em madeira e pós de serraduras, próprios para ornar e dar o maior realce as obras 
de marcenaria, especialmente camas, aparadores, guarda-vestidos, toilletes, etc. recebemos 
grande porção d’estas formosas peças, por preços baratíssimos, que só os Estados Unidos 
podem apresentar: há-os desde 100 rs até 5$000.
 AU PALAIS-ROYAL”14
“Mobílias Americanas
Imensa Aceitação
Além de mais fortes e elegantes do que as austríacas, custam menos da 
metade, visto que as outras custam 150$000. Embarcam-se também para fora da 
província sem mais despesa alguma que a de frete.
AU PALAIS-ROYAL
grande bazar dos melhores artigos americanos preferidos aos da Europa.”15
M ó v e i s e s o c i e d a d e
O luxo aparente dos brancos, quando se apresentavam em público, no século XVIII, 
parece não ter afetado o interior das residências baianas: 
“Com efeito ao luxo exterior dos vestidos, em nada cede aos nossos europeus; e a 
seda é vulgarissima até nos negros forros. Porém tudo é sem proporção: a indigência 
muitas vezes se esconde debaixo desta exterioridade de pura fanfarronada, 
entretanto, que o interior da família está em desesperação. Felizmente para nós 
este luxo não tem penetrado no interior das casas, que é excessivamente modesto 
e despojado, pelo ordinário, de ornato e rico aparelho de móveis da Europa. A mesa 
costuma ser abundante, se os víveres são baratos; mas a delicadeza suntuosa e 
regular se não acha ainda entre gentes, que tem comodidades. A coisa nasce da 
falta de fundo real de riqueza na maior parte das pessoas.”16
Os inventários deixam concluir que os bens materiais desses baianos dos séculos 
XVIII e XIX, bem como dos portugueses que se estabeleceram em Salvador, consistiam 
principalmente de propriedades imobiliárias, dinheiro, jóias – sobretudo de prata, ouro 
branco ou, eventualmente, ouro – e escravos. Os móveis, em geral restritos ao necessário, 
~19~
Pa n o r a m a h i s t ó r i c o
representavam uma parcela mínima das posses e, na grande maioria dos casos, contrastavam 
com a fortuna de seus proprietários. 
O luxo aumentou um pouco no século XIX, com a introdução de móveis envidraçados, 
de maior número de peças supérfluas, vidros e espelhos de ornamentação que, por sua 
natureza, tinham a aparência de objetos luxuosos, ainda mais quando contornados de 
dourado. Somente a partir de meados desse século a quantidade de móveis aumentou 
consideravelmente, “entulhando” as residências mais abastadas.
As casas dos séculos XVII e XVIII contrastavam radicalmente com as moradias da 
segunda metade do século XIX, quando a burguesia nascente encheu todos os espaços 
residenciais com vários conjuntos de mesas e cadeiras, guarda-comidas, bancas, sofás, 
guarda-roupas, leitos, além de numerosas estampas, importadas da Europa, e mangas de 
vidro, protegendo ramos de flores metálicas, biscuits e imagens de santos, numa mesma 
sala, por exemplo.
Em uma cidade habitada majoritariamente por pretos, crioulos, pardos e mulatos, 
não eram muitas as residências que possuíam móveis. Pelos inventários, percebe-se que a 
casa baiana, e mesmo brasileira, quer de brancos, quer de africanos ou seus descendentes, 
com raríssimas exceções, foi extremamente pobre até meados do século XVIII, observando-
se a ausência de móveis, especialmente os supérfluos. Isso se justifica não apenas pelo fato 
de a vida do baiano estar voltada para a rua, mas pelas próprias condições do povoamento. 
Sabe-se que somente a partir de meados dos setecentos consolidou-se a sociedade em 
alguns núcleos urbanos dispersos pelo Brasil, com a fixação de povoadores nas vilas e 
cidades, incentivada pela política e ações pombalinas. A consolidação da sociedade 
tornou possível o atendimento ao conforto interno das casas, observando-se então, não 
só o aumento do número de móveis, como, sobretudo, a utilização crescente de peças 
especializadas, como as cômodas, guarda-roupas, sofás e mesas de esbarra ou de jogo, 
inexistentes nos seiscentos, ou a substituição de móveis menos refinados, vindos do século 
anterior, como o caixão, por peças aperfeiçoadas.
Salvador, apesar de ter perdido a condição de capital do Vice-Reino em 1763, 
continuou com a feição de maior centro urbano, no parecer do marquês de Lavradio, 
D. Luís de Almeida Portugal Soares Alarcão Eça Melo Silva e Mascarenhas. Confirmava 
isso o conjunto da cidade, que apresentava condições de infra-estrutura melhores que 
as oferecidas à corte quando a sede do Reino foi transferida de Lisboa para o Rio de 
Janeiro, em 1808. Muitas intervenções e construções na cidade foram necessárias, pois 
ela não dispunha de casas nobres, capazes de abrigar a realeza e a corte administrativa, 
diferentemente de Salvador, que tinha porte de capital.
~20~
M o b i l i á r i o b a i a n o
Em Minas Gerais, alguns núcleos urbanos também se estruturaram somente a 
partir da segunda metade dos setecentos, enquanto em São Paulo e em quase todo o Sul 
permaneciam inexpressivos, como muitas partes do Norte e do Nordeste. Nessas regiões, 
certos núcleos cumpriram trajetórias diversas na história artística brasileira: é o caso de 
Recife, por ter permanecido nas mãos dos holandeses, São Luís do Maranhão, fundada pelos 
franceses, ou Belém, que foi capital da região Norte na época pombalina. As companhias 
de comércio, criadas na segunda metade do século XVIII, ao permitir o acesso direto às 
modas européias, reforçaram essa diversidade.
Nesses diferentes brasis, as casas também eram bem díspares, com poucos 
sobrados “com loja de alugar”, de pedra e cal, e muitas casas térreas de taipa, algumas 
vezes tendo apenas a fachada construída com material mais durável. Em geral, situavam-
se em terras foreiras a comunidades religiosas. Umas e outras estavam “místicas”, ou 
misturadas, nos centros urbanos. E é nessas casas térreas, quase sempre de chão de terra 
batida e iluminadas por candeeiros de latão ou veladores de jacarandá torneados, que se 
usavam algumas poucas peças de móveis no século XVIII. Seus moradores eram pequenos 
comerciantes e burocratas, oficiais mecânicos, índios “civilizados”, escravos libertos, 
artistas, pequenos lavradores, etc. 
Os sobrados pertenciam aos nobres e oficiais do governo, alguns senhores de 
engenho e/ou comerciantes, senhores de escravos de aluguel e militares de maior patente. 
Estavam localizados junto aos edifícios religiosos e administrativos e, os maiores, na zona 
comercial. Poucas casas de engenhos ou sobrados urbanos, depropriedade de pessoas mais 
abastadas, contavam, no século XVIII, com um número mais considerável de móveis. 
Como se viu, a grande maioria da população, se não era escrava, constituía-
se de pessoas sem condições econômicas para possuir móveis de elaboração e madeira 
mais refinados. No entanto, alguns ex-escravos alcançavam o mesmo padrão de vida dos 
brancos, habitando casas ao lado destes, como se via na rua do Rosário, em São Paulo, onde 
não só dispunham de móveis, quanto de escravos e de todo o aparato denotativo de certa 
condição econômica: objetos de prata, incluindo bengala com castão desse metal, chapéus 
de Braga, louça da Índia ou da China, móveis de jacarandá, etc. Livres, muitos ex-escravos 
baianos também desfrutavam de condições materiais similares e possuíam escravos.
Pa n o r a m a h i s t ó r i c o
n o t a s
1 – azevedo, Thales. Povoamento da Cidade do Salvador. 3ed. Bahia: Itapuã, 1969, p. 183.
2 – aHu. Loc. cit., v. 32, doc. 8750 (1775), p. 289. 
3 – Idem. v. 34, doc. 10.907 (1781), p. 505. 
4 – vilHena, Luís dos Santos. A Bahia no século XVIII. Bahia: Itapuã, 1969, v. 1, p. 55.
5 – aHu. Loc. cit., 1914, v. 32, doc. 17.433 (1797), p. 459.
6 – vilHena, L.S. Op. cit., p. 44-45.
7 – cartas do governo a sua Magestade (1797-1798). Arquivo da Prefeitura Municipal do Salvador/ 
Fundação Gregório de Mattos, carta 600, 21 out. 1799. fl. 207. 
8 – vilHena, L.S. Op. cit., p. 138.
9 – Idem, p. 52.
10 – aHu. Loc. cit., 1914, v. 32, doc. 10.907 (1781), p. 505. 
11 – Em sua Carta Pastoral, de 1764, frei D. Manuel de Santa Inês criticou severamente as 
religiosas do Desterro quanto ao cerimonial que obedeciam, por admitirem, dentro do convento, 
as escravas para os seus serviços (aHu. Loc. cit., v. 32, doc. 6.556 (1764 anexo ao doc. 6554), 
p. 68).
12 – Frei D. Antônio Correia, em sua Pastoral sem data, provavelmente de 1784, proibia aos 
eclesiásticos o uso de vestes e adornos próprios dos civis (aHu. Loc. cit., v. 32, doc. 11.485 (1784, 
anexo ao doc. 11.481), p. 554).
13 – freyre, Gilberto. Sobrados e mucambos. Rio de Janeiro: José Olimpio, 1968. t. 1, p. 309-310.
14 – diário da baHia, Salvador, 1 mai., 1879, p. 8.
15 – idem. 9 mai., 1879. p. 3. 
16 – aHu. Loc. cit., v. 32, doc. 10.907 (1781), p. 505.
~21~
estudos cláss icos
2
~25~
Após a proclamação da República, em 1889, intensificou-se o processo de 
afirmação da nacionalidade brasileira, que se tentava estruturar desde a Independência, 
em 1822 ou, na Bahia, em 1823. Entre 1889 e 1930, vários fatos importantes marcaram 
a vida cultural brasileira em busca do espírito nacional. A criação dos símbolos nacionais 
– hino, bandeira, armas, heróis –, a proximidade das comemorações do centenário da 
Independência, a recepção da imigração em massa, a introdução dos ideais anarquistas, 
de um lado, e socialistas, de outro, os primeiros movimentos artístico-literários modernos, 
entre outros fatos, fizeram os brasileiros sentir a necessidade de conhecer o Brasil. 
Naquele período, com a chegada em massa de colonos europeus de várias 
nacionalidades, o português deixou de ser “o grande inimigo” e o foco de insatisfação dos 
brasileiros deslocou-se para os novos povoadores estrangeiros. Nesse contexto, não foi 
difícil aos intelectuais brasileiros assumir para si o patrimônio cultural legado pelos lusos 
nos quase 389 anos em que o Brasil esteve sob sua influência, direta ou indireta.
Mário de Andrade1 iniciava, então, uma série de viagens pelo Brasil. Os intelectuais 
e estudiosos, bem como algumas senhoras e curiosos da burguesia paulistana nascente, 
começaram a redescobrir o Brasil. E passaram a fazer o que Eduardo Jardim de Moraes 
chamou o “retrato do Brasil2“. Foi esse movimento que “descobriu” Minas Gerais e 
Aleijadinho, apontando-os como símbolos da “arte nacional”, em contraposição às regiões 
litorâneas e suas produções, que haviam recebido mais intensamente as influências da 
antiga Metrópole. 
Carlos Ott, nessa mesma época, deixava transparecer bem a visão dos estudiosos: 
“Conhecidas como agora são as obras feitas no decorrer dos séculos, e conhecidos 
os seus autores, podemos apreciar o seu valor e investigar as influências que 
receberam. Por outro lado, interessa saber quais as criações tipicamente baianas 
ou regionais.”3
Entre os vários estudos, nesse contexto, encontravam-se os de autores que 
escreveram sobre o mobiliário “brasileiro” usando a metodologia comparativa: resgatavam 
a memória dessa produção no Brasil e a cotejavam com a de Portugal. Essa foi a metodologia 
adotada, por exemplo, por Gustavo Barroso, José de Almeida Santos, Clado Ribeiro de 
Lessa, José Wasth Rodrigues, Mário Barata, Hélcia Dias e José Mariano Filho. 
A criação do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – SPHAN, como 
conseqüência de todo o processo de recuperação dos elementos distintivos da brasilidade e 
sua cultura, em 1937, provocou essa primeira onda de estudos sobre o mobiliário, iniciada 
nessa mesma década e estendida à seguinte. Isso, associado à disseminação do interesse 
e s t u d o s c l á s s i c o s 
Detalhe de anjo tocheiro barroco, século XVIII. Igreja de Santa Teresa ou Museu de Arte Sacra, Salvador. 
~26~
M o b i l i á r i o b a i a n o 
Cofre com três chaves, 
século XVIII-XIX. Convento 
de São Francisco, Salvador.
~27~
E s t u d o s c l á s s i c o s
pelos estudos regionalistas e da cultura popular, estimulou a pesquisa de objetos e peças 
de arte e de mobiliário antigos. 
Os museus, colecionadores e antiquários, a partir da década de 1940, provocaram 
uma segunda onda de interesse pelos estudos do mobiliário que entrou pelos anos 1960. 
Foi graças a esses estudos e viagens que se passou a conservar móveis antigos e objetos de 
arte em geral, salvos da destruição e dos cupins, como diria um desses “viajantes” culturais, 
o artista plástico Carybé, que, em companhia de Mário Cravo Júnior, percorreu o Nordeste 
num veículo Skoda enfeitado com um Exu. 
Dos estudos desses dois períodos nasceram conceitos, tipologias, designações 
estilísticas, cronologias e nomenclatura do mobiliário que acabaram consagrados. 
Procurava-se, então, por um lado, distinguir um “estilo brasileiro”, ou “colonial”, e descobrir 
as qualidades artísticas do mobiliário, e, por outro, estabelecer as características formais 
dos conjuntos estilísticos.
Esses autores, porém, mesmo buscando a singularidade brasileira, adotaram a 
nomenclatura estilística do mobiliário de Portugal e respectiva cronologia, comparando as 
semelhanças e diferenças formais. Os estilos eram assim designados com os nomes régios: 
Manuelino ou Filipino, este último com variações jesuíticas, D. João V, D. José ou Pombalino, 
D. Maria I ou Império. Certos autores, reconhecendo “criações genuinamente brasileiras”, 
admitiram os estilos nacionais: D. Maria I brasileiro, Império brasileiro, Colonial brasileiro, 
Regional mineiro e Beranger, que outro autor crismou de D. Pedro II.
Alguns estudiosos, ainda, tomaram a divisão por reinados lusos apenas para 
permitir uma compreensão associativa – tempo-estilo-forma –, mais inteligível que a 
puramente cronológica. Em conseqüência, ligaram-se de tal modo as formas dos móveis 
às figuras dos soberanos, que as designações deixaram de ser simplesmente associativas 
para se tornar sugestivas de uma interferência direta da pessoa real nos estilos e modas de 
seu tempo. Na atualidade, essas designações podem, eventualmente, ter validade didática, 
já que estão consagradas, mas não têm nenhum rigor histórico, pelo menos para o Brasil. 
Tais estudos morfológicos basearam-se nos móveis “sobreviventes” nos museus 
e coleções particulares, adotando uma nomenclatura singular, às vezes esdrúxula, paradesignar peças inteiras ou detalhes decorativos dos móveis. Essa nomenclatura4 acabou 
sendo também consagrada e adotada no vocabulário museológico, dos antiquários e 
colecionadores, que inclui termos como bolachas, treme-treme ou tremidos, almofadas, 
pés de bola, pés de garra e bola, pés de pincel, sapata, pés de espátula, pés de cachimbo, 
pés de voluta, perna de lira, cachaço, tabela, balaústre, avental, arqueta, baú, cadeira de 
estado, mesa holandesa, mesa de bolachas, mesa de dobrar ou de cancela, mesa de aba ou 
~28~
M o b i l i á r i o b a i a n o 
borboleta, mesa de cavalete, mesa de encostar, mesa de dobrar, cadeira de estado, cadeira 
abacial, leito de bilros, cadeira de sola, cômoda boulle5, entre outros. 
Exemplos bem típicos de nova nomenclatura são as designações dadas às caixas 
e caixões, hoje chamadas arcas, arcazes e/ou cômodas. As mudanças adotadas levaram 
Carlos Ott6, colaborador do Iphan, a concluir que “quando nos inventários se fala em 
ornamentos, estes não se especificaram, pois naqueles tempos, ainda não existia nem a 
terminologia portuguesa e muito menos a internacional hoje em dia usada para designar 
os diversos estilos artísticos”.
O estudo morfológico gerou também detalhamentos gráficos que reuniram 
desenhos das diferentes peças de móveis, dando origem à falsa idéia de conjuntos de um 
mesmo estilo, inexistentes no século XVIII. Da mesma maneira, levou à identificação do 
jacarandá como única madeira utilizada na confecção da maior parte dos móveis, por ser 
muito resistente e dura, qualidades que justificariam sua “sobrevivência”. 
Os estudos clássicos contemplam ainda móveis ingleses e franceses. Assim, para 
o mobiliário de influência estrangeira, adotou-se a designação originária, normalmente 
derivada do nome de seu criador, ou designer, como Hepplewhite, Chippendale7 e Sheraton, 
ou das figuras régias, como Rainha Ana (1665-1714), Guilherme e Maria ingleses.
Transpor essa cronologia associada para a Bahia e para o Brasil é utilizar conceitos 
fictícios, tendo em vista que alguns móveis com características do estilo renascentista, o 
qual tem suas origens na Itália do século XIV, persistiram em uso no Brasil até o século 
XVIII. Há, entre eles, móveis de oração, como os oratórios, e móveis de guardar, como 
as caixas, caixões, armários e cômodas8. Algumas dessas peças, como as caixas, foram 
utilizadas até o fim dos setecentos, convivendo perfeitamente com os móveis torneados 
ou entalhados barrocos ou rococós, estilos que, na Europa, sucederam ao renascentista. 
As caixas, chamadas indevidamente arcas nos museus, passaram do século XVI 
para o XVII e foram usadas na Bahia até os finais dos setecentos, com múltiplas funções. 
Até as últimas décadas do século XVIII, os serralheiros ainda faziam fechaduras mouriscas 
para caixas. As arcas, sem almofadas, com o tampo abaulado e gavetas na parte inferior, 
só apareceram no século XVIII. Serviam para guardar roupa, comida, alfaias, louças e, por 
vezes, ao lado de uns poucos tamboretes, eram os únicos móveis das casas.
E s t u d o s c l á s s i c o s
n o t a s
1 – andrade, Mário de. Mário de Andrade: fotógrafo e turista aprendiz. São Paulo: Instituto de 
Estudos Brasileiros, 1993.
2 – Moraes, Eduardo Jardim de. Mário de Andrade: retrato do Brasil. In berriel, Carlos Eduardo 
(org.). Mário de Andrade/hoje. São Paulo: Ensaio, 1990, p. 67-102.
3 – ott, Carlos. História das artes plásticas na Bahia, 1550-1900. Salvador: Alfa, 1992. v. 2, p. 91. 
4 – A maior parte dos termos foi criada pelos colaboradores regionais do Iphan.
5 – Vide por exemplo Krell, Olga. Aprenda a escolher antigüidades. Decoração Cláudia, Rio de 
Janeiro, ano 8, no 87A. p. 6, 8, 10, 12, 15, 17, 19, 21, 24, 26, 28, 30, 35, dez. 1968.
6 – ott, C. Op. cit., v. 2, p. 68, 91. No presente trabalho, é usada a nomenclatura de época, 
fazendo-se referência à nomenclatura do Iphan, para a qual Ott também deu sua contribuição.
7 – Hepplewhite e Chippendale já se enquadravam no processo da Revolução Industrial e 
vendiam suas peças por meio de catálogo, dentro de um novo programa de comercialização de 
produtos feitos em série. Mesmo os móveis com as designações dos nomes régios eram, em sua 
grande maioria, produtos industrializados.
8 – Também continuam a aparecer nas portas e janelas, especialmente dos edifícios religiosos.
~29~
Bofetinho barroco, século 
XVIII. Sala do Capítulo do 
Convento de São Francisco, 
Salvador.
Metodologia do 
presente estudo
3
~33~
Com metodologia diversa, procurou-se reestudar os móveis baianos, considerando, 
além da morfologia e da cronologia, a sua inserção na sociedade, a mão de obra e os 
materiais empregados. Tal procedimento foi em parte adotado logo em seguida por Tilde 
Canti1, englobando exemplares brasileiros. 
Nas descrições presentes na relação de bens dos inventários, testamentos e 
autos de partilha, existentes no Arquivo Público do Estado da Bahia, estão bem claros 
os detalhes, como a designação do móvel, origem, quando se tratava de importado, 
tamanho aproximado, materiais utilizados, ornamentações, estado de conservação, preço 
da avaliação. Essas descrições foram sistematizadas e distribuídas cronologicamente, 
considerando-se que os inventários e testamentos são documentos pós-morte. 
A cronologia aqui utilizada é, pois, baseada na vulgarização, ou moda, dos modelos 
dos móveis. As datas são mais reais, pois correspondem ao momento em que houve o 
grande e geral uso de determinado ou determinados modelos2. A data de introdução de 
novos modelos é secundária, de um lado, por serem em número reduzidíssimo – às vezes, 
uma única peça – e, de outro, porque sua vulgarização levava muito tempo. A defasagem 
cronológica entre a introdução do modelo luso, e/ou inglês ou francês, e a sua vulgarização 
podia atingir mais de cinqüenta anos, em algumas regiões. A defasagem existia mesmo nos 
centros mais adiantados, como Salvador e Rio de Janeiro. 
Antes de mais nada, é preciso considerar que não só a morfologia e a decoração 
das peças podem indicar a época do uso de determinados modelos de móveis, mas 
também a especialização dos oficiais mecânicos empregados na sua elaboração e o uso 
de materiais específicos, que devem ser considerados na sua datação. Pode-se datar 
os móveis, por exemplo, pelo uso constante de madeiras diversas, tipos de ferragens, 
puxadores, madeiras folheadas, couro lavrado, sola picada, palhinha, damasco, veludo, 
verniz, vidro, mármore, pintura branca ou colorida, douramentos etc. É preciso considerar 
ainda que os móveis tinham uma rotatividade diminuta, não só porque era comum 
comprá-los usados em bazares de trastes, mas também porque passavam sucessivamente, 
por herança, aos descendentes. 
Na realidade, seria impossível estabelecer uma cronologia correta tomando-se 
os móveis comumente usados nas casas baianas e mesmo brasileiras, pois modelos muito 
antigos encontravam-se ao lado de outros do estilo subseqüente, junto com móveis da 
moda, ou à “moderna”, como se dizia. O mais comum, especialmente do século XVIII em 
diante, era a utilização de peças isoladas de móveis de formas e estilos diferentes e de três 
tipos – de luxo, ordinários e toscos –, dependendo das posses de seus donos e dos aposentos. 
Não havia o requinte de uniformização decorativa e nem o conceito de mobília. Os móveis 
M e t o d o l o g i a d o p r e s e n t e e s t u d o
Conversadeira. Século XIX. Museu Carlos Costa Pinto.
~34~
M o b i l i á r i o b a i a n o
toscos eram elaborados em madeiras comuns, para o uso popular ou serviço doméstico. 
Esse tipo não é focalizado, por ser muito simples, com linhas retas, sem características 
estilísticas específicas.
Como indicação didática, adotou-sea designação dos estilos gerais da arte 
européia ocidental, com os anos de respectivo uso na Bahia, desprezando-se os modelos 
híbridos, isto é, aqueles que, no século XVIII, misturaram elementos renascentistas e 
barrocos, por exemplo: 
a. renascentistas, de linhas retas, com guarnições de almofadas e frontões 
(1600-1740); 
b. primeiro barroco, com torneados e retorcidos (1640-1740); 
c. segundo barroco e rococó, com talhas e linhas curvas (1740-1820); 
d. neoclássicos com linhas retas, colunas estriadas, etc. (1820-1890); 
e. ecléticos e estrangeiros (1840-1910)3. 
Por não haver o conceito de mobília, preferiu-se designar os móveis de acordo com 
a sua utilidade: 
a. móveis de guardar – caixas, arcas, cômodas, frasqueiras, cofres, armários, 
guarda-roupas, guarda-louças; 
b. móveis de trabalho – contadores, papeleiras;
c. móveis de descanso – leitos, camas, catres, preguiceiros, cadeiras, tamboretes, 
sofás, canapés e outros; 
d. móveis de refeição e decoração – mesas, bofetes, bancas, tremós;
e. móveis de higiene – toucadores, gamelas, tinas ou tigres; 
f. móveis de oração – oratórios, altares de dizer missa; 
g. móveis de transporte – (redes)4, serpentinas, cadeirinhas de arruar. 
Essas designações se adequam perfeitamente tanto aos móveis de uso civil e leigo, 
quanto, em parte, aos religiosos.
Como mencionado, a metodologia adotada considera, além da morfologia e da 
cronologia dos móveis, a sua inserção na sociedade, a mão de obra e os materiais empregados. 
Assim, antes de tratar dos móveis propriamente ditos, serão dadas notícias sobre a mão de 
obra que os elaborou no período abordado – considerando-se seu regime de trabalho e sua 
importância na vida da sociedade baiana – e sobre os materiais então utilizados.
Caixa ou arca com gavetas, clássico renascentista, século XVIII. Sacristia da Igreja de São Francisco, Salvador.
~35~
M e t o d o l o g i a d o p r e s e n t e e s t u d o
n o t a s
1 – canti, Tilde. O móvel no Brasil; origens, evolução e características. Rio de Janeiro: Cândido 
Guinle de Paula Machado, 1980. 337 p.
2 – Para a datação dos móveis, foi calculada a idade média de casamento dos inventariados, 
considerando-se a idade da maioridade – 25 anos –, em que o matrimônio era permitido, e a 
idade dos filhos, além da média da expectativa de vida da época.
3 – Quando o Imperador D. Pedro II visitou Salvador, em 1859, vários aposentos do Palácio do 
Governo foram mobiliados com peças de estilo eclético, de influência francesa. A mobília da 
“sala vermelha” era de “mogno, estofada de damasco vermelho, ao gosto da época de Luís XV”, 
por exemplo (MeMórias da viageM de suas Magestades iMPeriais a Provincia da baHia. Rio de Janeiro: 
Indústria Nacional de Cotrin & Campos, 1867. p. 13).
4 – A rede aparece entre parênteses porque, apesar de ter sido, por longo tempo um meio de 
transporte eficaz, não pode ser considerada um móvel, como os demais, pois era feita de tecido.
Mão de obra: 
os oF íc ios Mecânicos
4
~39~
Salvador herdou de Portugal a composição administrativa e a estrutura 
socioeconômica, incluindo a formação de mão de obra, constituída majoritariamente 
de artífices. Na prática, os ofícios foram divididos entre os brancos e os negros, sendo 
exercidos por uns ou por outros – não exclusivamente, mas em grande parte. 
Do século XVI até a terceira década do século XIX, os artesãos ou artífices e alguns 
pequenos comerciantes eram designados na Bahia e no Brasil como oficiais mecânicos. 
Os pintores e escultores, que também usavam as mãos na elaboração de suas obras, não 
eram classificados como artesãos, pois tinham, teoricamente, a possibilidade de “inventar” 
e, por isso, ser profissionais liberais1, enquanto aos artífices cabia “copiar” e permanecer 
administrativamente atrelados às Câmaras.
Vários oficiais mecânicos interferiam na confecção dos móveis, como os 
marceneiros ou carpinteiros de obras brancas e pretas, torneiros, entalhadores, carpinteiros 
de móveis e samblagem, correeiros lavradores de couro, picadores de sola ou couro, 
ferreiros ou serralheiros2. A confecção de cadeiras, por exemplo, podia reunir marceneiros 
e correeiros. O marceneiro podia acumular a função de torneiro, mas não a de entalhador. 
O profissional dessa especialidade intervinha no móvel separadamente. Os entalhadores 
não tinham obrigação de cumprir os preceitos da Câmara, por estarem classificados na 
categoria dos escultores. 
Segundo afirma a historiografia clássica tanto em relação ao urbanismo quanto 
em relação aos ofícios mecânicos, apenas na América castelhana teria havido organização. 
No Brasil, por causa da presença do regime escravista, teria reinado a desordem, a 
desobediência profissional. Isso é bem válido para a vila de São Paulo, que, até o século 
XIX, não teve muita relevância. Até as primeiras décadas daquele século, como acusava o 
governador Antônio José de Franca e Horta, não havia em São Paulo mestres pedreiros e 
carpinteiros hábeis como os que existiam no Rio de Janeiro e na Bahia3.
Fato praticamente desconhecido é que, na Bahia, a partir do final da primeira metade 
do século XVII, foram criados os cargos de procuradores dos mesteres, hierarquicamente 
subordinados à Câmara. A exemplo do que existia em Lisboa, procurou-se constituir as 
guildas de forma ativa, buscando 
“dar maior relevo à atividade dos juízes dos ofícios mecânicos, criando-lhes função 
própria sob a denominação de mesteres, como órgão de classe junto à Câmara, onde 
teriam assento, trazendo mais uma figura ao cenário administrativo da Cidade – o 
juiz do povo – eleito pela assembléia de 12 mesteres, por sua vez aclamados pelos 
vários grupos profissionais, regularmente registrados”4.
M ã o d e o b r a : o s o F í c i o s M e c â n i c o s 
Banca de esbarra ou mesa de encostar, rococó, séculos XVIII-XIX. Museu de Arte da Bahia.
~40~
M o b i l i á r i o b a i a n o
Instituídos os mesteres, por resolução da Câmara de 21 de maio de 16415, dois 
dias depois os oficiais mecânicos se reuniram, por convocação da Câmara, e elegeram 
24 representantes, escolhendo-se, entre estes, 12 – um ou dois de cada ofício, dos mais 
indispensáveis6. Seguia-se o exemplo de Lisboa, que possuía um ou dois representantes, a 
depender do ofício, na chamada Casa dos Vinte e Quatro7. 
Logo após a escolha dos 12, elegeu-se o juiz do povo e o escrivão, aprovados 
com dois procuradores dos mesteres8 por Alvará Régio de 28 de maio de 1644, da mesma 
forma que nas vilas do Reino e com iguais isenções e privilégios9. Cabia-lhes controlar 
as atividades dos seus companheiros, fixar preços e avaliar as obras. Tratava-se de uma 
continuação das guildas medievais.
As “iniciativas partidas dos proletários”, como as chamou Affonso Ruy, “começaram 
a agitar os vereadores, originando-se, aos poucos, um ambiente de reação que foi crescendo 
até à hostilidade contra os representantes corporativos”10. 
Elegeram-se outros juízes do povo e mesteres. Estes, porém, cada vez mais 
infiltravam-se nas competências dos vereadores11 que, por sua vez, procuravam cercear o 
poder daqueles. Os antagonismos continuaram até que, em 1710, os vereadores deliberaram 
que o juiz do povo e os mesteres só fossem às vereações requererem, segundo Affonso Ruy, 
“aquilo que entendessem era útil ao povo”12 e que não comparecessem mais às vereações.
Os juízes do povo e os mesteres foram acusados de provocar reações populares 
contra a Câmara, contra o Governo e contra a Coroa13, até que, “por ter mostrado a 
experiência ser causa dos motins que tem havido em desserviço meu e do público desses 
moradores”, o rei, através da Carta Régia de 25 de fevereiro de 1713, extinguiu esses cargos, 
pelas mesmas razões por que o fizerana cidade do Porto, a pedido da própria Câmara.
Os vereadores, em 1715 e 1716, apelaram ao rei a fim de que novamente se 
instituíssem os cargos de juiz do povo e de mesteres, sem os quais, diziam, “ficava a Cidade 
Capital do Estado do Brasil igual a mais humilde vila dele” e para que houvesse “o sossego 
do bem comum”14. Tudo inútil. Os cargos estavam extintos definitivamente.
Os oficiais mecânicos perderam assim seus representantes junto ao poder 
público e seus privilégios, e tiveram suas atividades restringidas. A partir de então apenas 
examinavam, através do juiz e do escrivão do ofício, aqueles que queriam ingressar na 
atividade, defendiam poucos de seus interesses e avaliavam as obras, em comum acordo 
com a Câmara.
Além da falta de representação junto à Câmara, dois fatores importantes, entre 
vários outros, contribuíram para enfraquecer a organização das guildas, dentro dos 
moldes de Lisboa. Em primeiro lugar, a presença do braço escravo, que exercia alguns 
~41~
M ã o d e o b r a : o s o f í c i o s m e c â n i c o s
ofícios mecânicos, sobretudo aqueles que exigiam maior esforço físico ou que lidavam com 
sangue; em segundo, a instabilidade e as restrições político-administrativas impostas à 
Câmara de Salvador, quer pelo governo geral, quer pela corte.
Como exemplo de interferência de órgãos superiores da corte, escrevia Vilhena15: 
“uma outra origem de desordem no Senado é a ascendência que o Supremo Tribunal 
da Relação tem arrogado sobre ele, sendo certo que querendo o Senado fazer 
obviar algumas infrações das leis municipais, e ainda portarias dos excelentíssimos 
governadores interpõem a parte um agravo para a Relação, e tem por certo o 
provimento com que já conta quando agrava; motivo por que vem a ficar sem 
validade as posturas, e reiteradas portarias do Senado, ou para melhor, o presidente 
iludido, e os perversos com a mão alçada para descarregarem quando este obsta 
as suas pretensões.”16
Apesar disso, a Câmara e os oficiais mecânicos tentaram organizar suas corporações 
mesmo sem os poderes, isenções e privilégios, que haviam conquistado a partir de 1641, e 
que perderam em 1713.
Essas tentativas estão registradas nos manuscritos existentes no Arquivo Histórico 
da Prefeitura Municipal do Salvador, sob a guarda da Fundação Gregório de Mattos. 
Embora a documentação tenha sofrido várias interrupções ou esteja danificada, pode-se, 
há alguns anos, de uma maneira genérica, estabelecer a “história dos ofícios mecânicos do 
Salvador”17, correlacionando-a à de Lisboa.
As atividades dos oficiais mecânicos eram reguladas, em parte, pelo Livro de 
Regimentos dos Oficiais mecânicos de Lisboa, de 1572. Nesses regimentos, reformados 
pelo marquês de Pombal em 177118, foram baseadas as posturas estabelecidas pela 
Câmara de Salvador. 
Em 1704, os oficiais mecânicos requereram ao rei que, em Salvador, se observassem 
os “estilos”, ou costumes, da corte para a eleição de seus juízes em “casas particulares”, 
como a Casa dos Vinte e Quatro, de Lisboa. Solicitada a opinião da Câmara, esta procurou 
dar esclarecimentos ao rei sobre as irregularidades e diferenças na observância desses 
“estilos”19. A maioria das eleições, apesar desse pedido, continuou sendo realizada na 
Câmara, conforme o costume desta.
Em Salvador, chamava-se vulgarmente de regimento à lista de preços das obras 
que os oficiais mecânicos executavam, e não um conjunto de normas de procedimentos. 
Essa lista era estabelecida em comum acordo com a Câmara, enquanto existiram os juízes 
do povo e os mesteres, e depois somente pela Câmara. Os regimentos dos diversos ofícios 
~42~
M o b i l i á r i o b a i a n o
constam dos livros de posturas da Câmara. As atividades de alguns artífices, entretanto, 
eram regulamentadas pelos regimentos das confrarias. Esses regimentos e/ou as posturas 
da Câmara definiam a vida pública e profissional dos artífices.
As posturas, estabelecidas pela Câmara, eram lidas em pregões públicos, nas praças 
e ruas “costumadas” da cidade, praia e seus arrabaldes, em voz alta e inteligível, para que 
“fossem bem entendidas por todo povo” e que ninguém pudesse “alegar ignorância”20. 
Qualquer pessoa do povo podia denunciar os culpados que agiam contra as posturas 
e tinham direito à terça parte das condenações, as coimas21. As penas impostas eram 
aplicadas pelos almotacés das execuções, a pedido dos juízes de fora ou da Câmara.
Os primeiros livros de posturas foram perdidos. Sabe-se que, com “a entrada dos 
inimigos rebeldes de Holanda se haviam perdido os livros” da Câmara, e pedia-se, expulsos 
os invasores, 
“que se pusessem [...] o traslado das posturas, que se haviam feito antes disso, e 
estavam nos ditos livros perdidos das quais ainda havia alguma notícia, por estar o 
traslado delas em poder do escrivão da Almotaçaria João Mendes Pacheco, as quais 
de novo haviam por boas, e mandaram se copiassem como nelas se continham, e 
que pelas penas nelas estabelecidas fossem executadas as pessoas que caíssem em 
coima, e fossem contra elas.22”
Com referência aos oficiais mecânicos, as posturas da Câmara de Salvador 
estabeleciam que “de novo se mandavam cumprir, e executar nas pessoas que forem contra 
elas” (1625), e definiam:
“que nenhum oficial de qualquer ofício ponha tenda sem licença da Câmara, e 
fiança nela, e seja examinado, e tenha seu regimento a porta, pena de seis mil réis 
.............................................................................................................................................6$00023.
que todos os oficiais serão obrigados a acompanhar a bandeira os dias das procissões 
del Rei, pena de seis mil réis ..................................................................................... 6$000.24”
Ao pedir a licença à Câmara, os oficiais mecânicos pagavam fiança, apresentando 
avalistas. A fiança era válida por um ano, ou seis meses para aqueles que recebiam 
pagamento de terceiros25. Registravam-se em livros próprios os nomes dos oficiais e, por 
vezes, os endereços e tipo de atividade26. As licenças para os escravos eram tiradas em 
nome de seus senhores, os quais pagavam a fiança. Poucos foram os oficiais que cumpriram 
com regularidade essas duas obrigações: licença e exame.
~43~
M ã o d e o b r a : o s o f í c i o s m e c â n i c o s
o F í c i o s e H i e r a r q u i a
Existiam, na Cidade do Salvador, os seguintes ofícios denominados mecânicos: 
barbeiro, sapateiro, carpinteiro de obra branca ou de edifícios, carpinteiro das naus da 
ribeira, carapina, correeiro, dourador, espadeiro, esparteiro, ferreiro, latoeiro, marceneiro, 
ourives do ouro e da prata, parteira, pasteleiro, pedreiro, polieiro, sangrador, seleiro, 
serralheiro, sombreiro, tanoeiro, tintureiro, torneiro, alfaiate, anzoleiro. Muitos dos ofícios 
existentes em Lisboa não passaram para o Brasil por não serem de primeira necessidade ou, 
então, foram anexados a outros ofícios. As demais atividades constituíam, normalmente, 
monopólio real. Como dizia José da Silva Lisboa a Domingos Vandelli, em 1781, “as artes na 
Bahia se reduzem aos ofícios mecânicos de pura necessidade”27. 
Hierarquicamente, encontravam-se em São Paulo o mestre, o oficial, os aprendizes 
e os serventes, enquanto na Bahia existiam o mestre, o oficial, os aprendizes e os jornaleiros. 
Com a exceção dos serventes e jornaleiros, os demais podiam e deviam prestar exames para 
galgar os títulos superiores da hierarquia.
Os exames consistiam na confecção de uma obra própria do ofício ou em 
questionário sobre os principais conhecimentos que o candidato devia possuir. A execução 
da obra, objeto de exame, não tinha prazo definido. Podia estender-se por meses. Apenas 
em caso de troca de juízes ficavam os examinados obrigados a concluí-laem um tempo 
predeterminado. A avaliação cabia aos juízes anteriores. O exame era individual, válido 
para o profissional nele inscrito. 
Se não fosse habilitado na primeira examinação, o candidato deveria submeter-se 
a outros exames seis meses depois. Nesse intervalo, permanecia como aprendiz na tenda 
de um mestre, voltando tantas vezes quantas fossem necessárias até receber aprovação.
Alguns ofícios, dependendo do lugar e da época, foram interditados. Em 1578, 
em São Paulo, o ferreiro Bartolomeu Fernandes foi proibido de ensinar o seu ofício a um 
índio “porque era grande prejuízo da terra”. Já em Porto Seguro, ao contrário, na segunda 
metade do século XVIII, determinou-se que os meninos índios fossem alocados em casas 
de oficiais mecânicos, separando-os das famílias, para que não continuassem a falar a 
língua materna, aprendessem algum ofício e se civilizassem. Ficavam em companhia dos 
mestres ou amos até o tempo do casamento. O produto dos pagamentos devia ser aplicado 
no vestuário, na compra de gado ou ferramentas para a lavoura, telhas e confecção de 
suas casas. Em qualquer circunstância, como compensação pela ajuda, os mestres e amos 
deviam sustentar seus aprendizes e dar-lhes vestuário de uso semanal e festivo, além de 
remuneração por outros “serviços prestados”28. Mas, como grande parte dos habitantes do 
Brasil, estavam todos envolvidos, a partir de 1763, na procura do ouro, não importa onde.
~44~
M o b i l i á r i o b a i a n o
a p r e n d i z e s
A aprendizagem de um ofício era direta, realizando-se por meio da convivência, 
da observação. Podia durar de dois a doze anos. Há notícias de que, em 1727, a Santa Casa 
da Misericórdia da Bahia colocava os filhos de seus escravos como aprendizes de barbeiro 
para que aprendessem a arte de sangrar. No fim de três anos, o barbeiro recebia 12$000 
réis por cada criança que ensinasse. 
Em São Paulo, em 1716, Manoel Mendes dos Santos, após a morte de sua mulher, 
Antônia da Conceição, encaminhou seu filho, João de Passos, para aprender o ofício de 
alfaiate com o mestre Martinho Rodrigues Tinoco. Na ocasião, assinou um termo de 
compromisso pelo qual se obrigava a pagar 30 mil réis ao mestre caso o jovem fugisse ou 
adoecesse. O compromisso valia por dois anos. José dos Passos contava, então, 18 anos. 
Nem todos os pais faziam um contrato por escrito. Este podia ser oral, permanecendo entre 
ambos, pais e mestre, um contrato moral.
Não havia idade certa para o início da aprendizagem. O aprendiz era colocado 
sob a guarda do mestre ou, como chamavam, do amo. Este não somente lhe ensinava o 
ofício, como o educava e, a título de educação, também se servia dele para todos os demais 
serviços, principalmente domésticos. O aprendiz podia ser castigado, eventualmente, com 
penalidades corporais.
Permitia-se aos mestres ter no máximo dois aprendizes, para garantir a eficiência 
da aprendizagem. A falta de mestres, no entanto, por todo o Brasil, mesmo em Salvador, 
levou os aprendizes a procurar as tendas dos oficiais, sem que estes fossem ou tivessem 
o título de mestre. Na Bahia, a inobservância de regimentos, ou posturas, favoreceu essa 
prática. Não existia, pelo menos em Salvador, a categoria de meio-oficial, de que Serafim 
Leite29 dá notícia, repetida por José Mariano Filho30. Existiam, como se disse, jornaleiros e 
escravos admitidos como obreiros31.
Não há registros sobre os custos desse aprendizado. Entre os brancos, o pai do 
aprendiz estabelecia um contrato formal, ou moral, com o mestre. A aprendizagem podia 
ser paga em espécie ou em serviços prestados pelo aprendiz. No caso dos escravos, supõe-
se que prevalecessem as mesmas práticas de remuneração, sob a responsabilidade de um 
amo ou mestre, como se observou em relação aos aprendizes da Misericórdia. Por vezes era 
o próprio senhor de escravos, com uma ocupação artesanal, quem ensinava gratuitamente, 
possibilitando aos aprendizes aperfeiçoarem-se até chegar a oficiais. Os escravos podiam 
também aprender com os oficiais da própria senzala. (Não eram os senhores que iam 
ensinar na senzala, mas existiam escravos oficiais de algum ofício que, naquele lugar, 
podiam ensinar aos outros)
~45~
M ã o d e o b r a : o s o f í c i o s m e c â n i c o s
J u í z e s e e s c r i v ã e s
Para cada ofício havia um ou dois juízes e um escrivão. Em Lisboa e outras cidades 
e vilas do Reino, podiam ser eleitos apenas os que fossem mestres e, no caso dos escrivães, 
aqueles que soubessem escrever, ler e contar. 
De acordo com os regimentos de 1572 e 1771, de Lisboa, a reeleição só era permitida 
três anos após o último exercício, salvo quando não houvesse oficiais categorizados32. Em 
Salvador, entretanto, parece ter havido carência de homens com as qualidades requeridas, 
pois eram eleitos os mesmos juízes e escrivães por anos consecutivos. O espírito de 
liderança e o maior empenho de alguns devem ter exercido certa influência para que a 
escolha recaísse sobre determinados representantes consecutivamente, mesmo porque o 
número de profissionais não era grande, como já se observou.
As eleições eram efetuadas anualmente. Os regimentos de Lisboa estabeleciam 
datas fixas para cada ofício. Em Salvador, porém, de acordo com os registros dos termos 
de eleições, essa norma não foi seguida. As datas das eleições variavam de ano para ano.
Como já mencionado, os oficiais mecânicos recorreram ao rei em 1704, 
reivindicando que em Salvador se observassem os “estilos” da corte. Na carta dirigida a Sua 
Majestade, a Câmara comunicava: 
“[...] sendo os ditos Oficiais os que com vários pleitos e agravos se têm eximido 
de eleger juízes dos seus Ofícios e examinar se do ano de mil setecentos e um 
até o presente (1704) sendo uma e outra coisa conforme ao estilo desse Reino 
se atrevem eles a queixar se a Vossa Majestade das ditas demandas requerendo 
ao mesmo tempo a observância dos estilos que até o presente tem impugnado 
os quais parece não deve Vossa Majestade mandar observar nesta Cidade por Lei 
porque assim como a Câmara dessa Corte e mais desse Reino as introduziram 
segundo a cada uma mais conveniente pareceu podemos nós também estabelecer 
os que mais convenientes forem a este Estado que em muitas causas discrepa desse 
Reino e com efeito neste Senado há também neste particular estilo que há muitos 
anos nele se pratica quase conforme com o de Lisboa e só diferente no modo das 
eleições dos seus juízes e cartas dos seus examinados por que de se fazerem ditas 
eleições fora deste Senado contra a forma que até o presente se usa se lhes dá 
motivos aos subornos desatenções e tumultos que resultaram de se fazerem em 
uma casa particular e trazendo as assim feitas para se lhes dar o juramento vem 
este Senado a ser quase constrangido a aprovar eleições que podem ter muitas 
nulidades não sendo obradas em sua presença e o quererem que os seus nomes 
sejam somente escritos nos Livros da Câmara é contra a regalia que ela tem de os 
confirmar por Provisão e dar-lhes nas costas dela o juramento estilo que se observa 
com os mais ofícios e oficiais que este Senado prove de juízes escrivães pedâneos e 
outros que com este exemplo não quererão servir com mais título nem com outro 
~46~
M o b i l i á r i o b a i a n o
instrumento que o de estarem os seus nomes escritos nos livros dele e sobre os 
examinados foi cá sempre uso que com a certidão dos examinadores lhes passamos 
suas provisões o Senado.”33 
Nada conseguiram os oficiais.
Os juízes eleitos e escrivães continuaram a ser confirmados nos cargos por provisão 
do Senado da Câmara, com sinais e selo próprios, para um período de um ano, “até o último 
(dia) de dezembro”. No verso da provisão transcrevia-se o termo de juramento dos Santos 
Evangelhos, para que “bem e direitamente”servissem o ofício, guardando o “serviço de 
Deus” e “de Sua Majestade”34.
Aos juízes cabia efetuar as examinações dos que desejavam exercer as atividades 
mecânicas, fazer visitas periódicas às tendas e lojas, avaliações e vistorias das obras, estas 
últimas quando convocados pela Câmara. Uma vez habilitado, o candidato recebia uma 
certidão de exame, que devia apresentar à Câmara, onde era também registrada em livro 
próprio. Recebia, então, transcrita na própria certidão de examinação, uma carta de exame 
e a confirmação da certidão. A certidão era feita pelo escrivão do ofício e assinada por ele 
e pelos juízes. O juiz de fora, os vereadores e o procurador assinavam a carta concedida 
pela Câmara.
Na ocasião da apresentação da certidão, os aprovados também prestavam 
juramento, segundo o qual ficavam sujeitos às posturas do Conselho da Câmara e demais 
acordos da mesa de Vereação, e se comprometiam a não se valer de nenhum privilégio. As 
cartas de examinação davam direito aos mestres de exercer seus ofícios e ter tenda aberta 
na Cidade do Salvador e seu termo, que compreendia parte do Recôncavo.
Teoricamente, os juízes e escrivães não podiam examinar seus familiares, como 
filhos e parentes até quarto grau, cunhados ou aprendizes. Deviam requerer à Câmara que 
lhes indicasse um substituto, de preferência um juiz que tivesse servido no ano anterior. 
Também essa norma não foi rigidamente obedecida em Salvador.
Os oficiais ou mestres estranhos, vindos de outras regiões do Brasil ou de qualquer 
parte do Reino, deviam apresentar sua certidão à Câmara. Examinada e tida como 
verdadeira e sem “vício algum que duvidosa a fizesse”, era confirmada sob a condição de 
que o requerente ficasse sujeito, enquanto residisse na cidade ou seu termo, às mesmas 
obrigações que os demais oficiais mecânicos. Caso não possuísse certidão ou carta, o oficial 
devia submeter-se ao exame dos juízes do ano. Uma postura de 1716 previa que, na falta 
de examinação, era necessária a licença do Senado da Câmara para ter tenda pública35, 
facultando, de certa forma, o exame.
~47~
M ã o d e o b r a : o s o f í c i o s m e c â n i c o s
Os profissionais não podiam desempenhar atividades que não fossem de seu ofício, 
sob pena de cadeia e multa, para garantir a boa execução das obras e os limites entre as 
ocupações – teoricamente, porque sempre houve conflitos resultantes de intromissões nas 
atividades alheias.
No Rio de Janeiro, segundo ocorrência registrada nos Autos de Litígio de 1759-1761, 
os mestres entalhadores não estavam sujeitos a exame, como se exigia dos carpinteiros e 
marceneiros. O litígio foi movido pelo mestre marceneiro Manoel da Costa Carvalho contra 
o mestre entalhador Francisco Félix Cruz, porque este estaria usando ilicitamente o ofício 
daquele. Segundo os depoentes, alguns entalhadores vinham trabalhando em obras de 
marcenaria sem que ninguém os impedisse, sendo freqüentemente solicitados por outros 
ofícios, como os de pedreiros, carpinteiros, marceneiros e ourives, para dar riscos, moldes 
ou executar obras de talha, o que era hábito em Lisboa. 
Todas as testemunhas afirmaram pertencer aos marceneiros a função de 
encaixilhar ou ensamblar obras lisas ou com talha, e que tanto marceneiros quanto 
entalhadores interferiam nessas obras, como acontecia na corte e outras cidades do 
Reino, trabalhando uns nas casas dos outros. Em seus depoimentos, esclareciam como uns 
artífices complementavam o trabalho dos outros. Uma das testemunhas dizia que “sabe 
pelo ver, que ao marceneiro pertence fazer cadeiras, e tamboretes, leitos, catres, e outras 
semelhantes obras lisas, emolduradas, mas entalhe, que em algumas das ditas obras de 
marceneiro se faz as mandam estes fazer a entalhador”36. 
Vê-se que, como na escultura, várias pessoas colaboravam numa peça. Manoel de 
Araújo, furriel do Terço de Auxiliares do Rio de Janeiro, testemunha no mesmo litígio, dizia 
que há vinte e um anos trabalhava na cidade de Lisboa e no Rio de Janeiro e que nunca lhe 
proibiram de fazer, em sua loja de entalhador, as obras de talha ou sem ela. E disse mais: 
“ [...] que sabe pelo ver, que os entalhadores desta Cidade não são obrigados ao 
exame, nem examinados, e só o foram em Lisboa por se anexarem a bandeira, 
e Irmandade dos marceneiros para entrarem na Casa dos Vinte e Quatro 
alternativamente com os ditos marceneiros.”37
Conflitos semelhantes ocorreram em Lisboa. Ao fim de meio século de litígios 
entre carpinteiros da rua das Arcas e marceneiros, estes passaram a se denominar, a 
partir de 1767, carpinteiros de móveis e samblagem. Isso explica a denominação daqueles 
mecânicos que chegaram ao Brasil na segunda metade dos setecentos e a adoção da 
mesma designação na Bahia. Eram os carpinteiros de obra preta e se diferenciavam dos 
carpinteiros de obra branca, figuras estas das mais essenciais nos engenhos.
~48~
M o b i l i á r i o b a i a n o
Em Salvador não se encontram referências a registros de cartas de exames, 
eleições ou provisões relativas a entalhadores. Constituem exceções as solicitações 
dirigidas à Câmara a partir de 1790 por Tomás Rodrigues de Santana, que pretendia então 
obter licença para ter tenda de entalhador na rua das Laranjeiras38. Em 1797, entretanto, 
ele aparecia como marceneiro39 e, a partir de 1819, passou a solicitar licença para vender 
obras de marcenaria40. 
A malícia dos oficiais mecânicos deu origem a “acrescentamentos”, ou acréscimos, 
às antigas posturas e, em fins do século XVIII, com respeito às cartas de examinações e 
licenças, diziam: 
“que nenhum oficial, ou qualquer outra pessoa, cujo trato careça de licença, carta 
de exame, digo, do Senado da Câmara para usar dela não se valha de licença, carta 
de exame, ou regimento concedido a diversa pessoa tomando para esse fim o nome 
de terceiro ausente, ou defunto” [...] o não faça antes tire as ditas licenças em seu 
nome com pena de seis mil réis e trinta dias de cadeia pela malícia com que se 
houver neste requerimento.41” 
Com base nessa prática, muitos trabalhavam como jornaleiros para algum mestre 
– fugindo à obrigação de tirar a licença necessária e submeter-se aos exames – ou em 
parceria com oficiais licenciados.
Todos deviam ter o seu regimento à porta:
“[...] que nenhum oficial de qualquer ofício esconda a taxa do seu ofício caso que 
a tenha, a qual vulgarmente se chama Regimento antes a pender-se a porta da 
mesma tenda para que o povo leia nela os preços das obras, que lhe vai encomendar 
pena de quatro mil réis.”42
O regimento, ou melhor, a lista de preços era estabelecida pela Câmara. Por meio 
da listagem das obras e respectivos preços ou salários, esta procurava controlar de perto 
as obras executadas. 
As intervenções das Câmaras portuguesas nos exercícios mecânicos, administrativa 
e judicialmente, foram sempre mais rigorosas. Em Salvador, a própria situação de Câmara 
de terra conquistada tirava desta grande parte de seu poder, como notificado pelo Tribunal 
da Relação. 
o b r i g a ç õ e s r e l i g i o s a s
Além das obrigações burocráticas, os oficiais mecânicos tinham obrigações de 
ordem religiosa. Todos deviam acompanhar a bandeira43 representativa de seu ofício nos 
dias das procissões “del Rei” ou do Senado, sob pena de multa e prisão. 
~49~
M ã o d e o b r a : o s o f í c i o s m e c â n i c o s
A instituição chamada bandeira não existiu em Salvador. A palavra 
designava apenas o estandarte que os oficiais mecânicos deviam portar nas 
festas organizadas pela Câmara ou pelas confrarias. Esse estandarte era 
zelosamente guardado. Em Minas Gerais, os oficiais mecânicos eram obrigados 
a mantê-lo na Câmara. Acredita-se que os oficiais mecânicos de Salvador 
também guardassem os estandartes naCâmara, retirando-os por ocasião das 
festas, por não disporem de casa particular ou de instituição como a Casa dos 
Vinte e Quatro de Lisboa. 
Nas festas, cabia à Igreja o cerimonial litúrgico, enquanto o 
brilhantismo do acontecimento dependia do Senado da Câmara. Esta dividia 
os grupos por profissões e elegia um encarregado dos festejos – o cabo da festa 
–, que assinava um termo de responsabilidade comprometendo-se a organizar, 
especialmente, os festejos oficiais44. Os artesãos deviam participar ativamente 
dessas procissões, comparecendo com os estandartes dos padroeiros e insígnias 
dos respectivos ofícios mecânicos.
O costume de realizar essas procissões – chamadas “del Rey”, por 
serem obrigatórias e regidas pelas Ordenações Filipinas – passou de Lisboa 
para o Brasil45. As procissões “del Rey” eram obrigatoriamente patrocinadas 
pela Câmara, que além de Corpus Christi, São Sebastião, São Felipe e Santiago, 
Santo Antônio de Arguim e São Francisco Xavier, eram as procissões 
“de São Sebastião [que foi] criada em memória do Sereníssimo Rei Dom Sebastião, 
a de São Filipe Santiago, em ação de graças da feliz restauração desta Cidade e a 
de Santo Antônio de Arguim, cuja criação foi por razão dos inimigos o tomarem na 
força de Arguim, tratando mal o Santo, o fez dar a Costa na dita Capitania [Bahia] 
e apareceu o Santo em uma pedra em pé [em Itapuã].”46 
Essas procissões e a obrigatoriedade de acompanhá-las foram extintas em 1828, 
com exceção da de Corpus Christi47. 
A procissão de São Francisco Xavier, escolhido como padroeiro da cidade, foi 
instituída por voto solene do povo baiano em 10 de maio de 1686 (figura 1). A confraria 
dessa invocação estava instalada na atual Igreja Catedral. A procissão, que havia sido 
extinta com as demais, em 1828, foi restabelecida em 1860 pela mesma confraria.
A festa de Corpus Christi parece ter caído em desuso nas cidades brasileiras por 
volta de 1668, segundo informou Balthazar da Silva Lisboa48. Notificação do Senado da 
Câmara da Cidade do Salvador49 destacava a necessidade de retomar os usos e costumes, e 
é interessante descrever como, em 1673, se recomendava realizar a procissão.
1 – Busto de São 
Francisco Xavier, século 
XVII, padroeiro da Cidade 
do Salvador. Acervo da 
Catedral Basílica do 
Salvador.
~50~
M o b i l i á r i o b a i a n o
“Por haver crescido muito todos os ofícios, e estavam alguns sem concorrerem 
para as ditas procissões com parte nem coisa alguma”, concordaram os oficiais da 
Câmara de Salvador, estando presentes o juiz do povo e mesteres, que os oficiais 
de carpinteiro deviam apresentar na procissão de “Corpus Christi” a bandeira de 
costume e a armação de madeira para a serpe [serpente] e mais madeira que se 
precisasse, tendo a mesma obrigação os marceneiros e torneiros. Os oficiais de 
alfaiate deviam apresentar a bandeira de costume e o pano com que se cobria a 
serpe, pintado e aparelhado. Uns e outros deviam fornecer os negros necessários 
para carregar a serpe. Os sapateiros deviam apresentar a bandeira do costume e 
o drago [dragão]; os pedreiros uma bandeira, os tintureiros, sombreiros, funileiros 
e tanoeiros apresentar uma bandeira e quatro cavalinhos fuscos; os padeiros e 
confeiteiros apresentar dois gigantes e uma giganta e um anão, que o vulgo, ou 
povo, chamava “Pai dos gigantes”. Os ferreiros, serralheiros, barbeiros, espadeiros, 
correeiros, todos pertencentes à Confraria de São Jorge, eram obrigados a apresentar 
uma bandeira, ou guião, conforme o costume e o ”Santo de vulto na sua charola, 
sendo este Santo de figura a cavalo, armado, ou acompanhado, de pagem, alferes, 
trombeta, tambores e seis sargentos da guarda, todos vestidos decentemente e 
armados”. As vendeiras de porta, taverneiros e taverneiras e esparteiros deviam 
apresentar quatro danças. Os marchantes fornecer três tourinhas. À falta com essa 
determinação, prometia-se “pena de seis mil réis que seriam pagos da cadeia”. A 
coima, ou multa, seria encaminhada para as obras da Câmara e Cadeia nova.”50.
Documento idêntico foi expedido no Rio de Janeiro, dando apenas aos marceneiros 
a incumbência de contribuir com a imagem do Menino Jesus e aos marchantes a atribuição 
de apresentar, além das tourinhas, a figura de Davi – “e que não sejam coisas ridículas”, 
recomendava-se naquela capitania, em 170451. 
Os acrescentamentos, ou modificações, feitos às posturas em 1742, determinavam 
que os oficiais mecânicos, nas procissões do Senado e nas demais em que eram obrigados 
a levar bandeiras, deviam comparecer com toda a modéstia, quietação e compostura, 
vestidos com suas casacas e gravatas, e não com capotes, como até então usavam, sob 
pena de seis mil réis de multa, pagos da cadeia, onde ficariam presos por trinta dias52.
Por volta de 1830, desapareceu a exigência de se registrar na Câmara os 
documentos referentes aos ofícios mecânicos. As profissões passaram a ser exercidas 
independentemente de qualquer intervenção da edilidade, dentro da nova organização que 
se estabeleceu, transformando-se os Senados da Câmara em Intendências e, depois, em 
Prefeituras e Câmaras Municipais53, através da Lei de 1º de outubro de 182854. 
Como os demais comerciantes, os oficiais mecânicos continuaram com a 
obrigação de pedir licença para abrir estabelecimento próprio. Entre eles encontravam-
se os marceneiros, executores das obras que interessam diretamente a este estudo, e os 
torneiros, correeiros e serralheiros, que contribuíam com os acessórios.
~51~
M ã o d e o b r a : o s o f í c i o s m e c â n i c o s
o s o F i c i a i s M e c â n i c o s d o s M ó v e i s 
As atividades dos correeiros e dos serralheiros eram regulamentadas pelas 
posturas dos respectivos ofícios. Já as dos marceneiros regulamentavam-se, em parte, pelo 
regimento de Lisboa e, em parte, pelo da Confraria de São José, dos pedreiros e carpinteiros. 
Somente em 1785 é encontrado, nos livros de posturas, o Regimento dos Marceneiros55.
Nas primeiras décadas do século XVIII, pediram licença à Câmara diversos 
oficiais e mestres marceneiros, torneiros e ensambladores, vindos principalmente do 
Norte de Portugal. No fim do mesmo século, vários “carpinteiros de móveis e samblagem”, 
provenientes de Lisboa56, passaram a trabalhar em Salvador57.
Seguindo o costume do Porto, Viana ou Lisboa, os oficiais apresentavam suas 
certidões e cartas de exame na Câmara de Salvador, que lhes passava, como o fazia a todos 
os que vinham do Reino, uma licença geral, como a do exemplo abaixo, ou simplesmente 
registrava suas cartas nos livros próprios.
“Registro de uma Licença geral de marceneiro e torneiro de Simão Henrique.
O Doutor Juiz de fora Vereadores e procurador do Senado da Câmara desta Cidade do 
Salvador Bahia de Todos os Santos etc. Fazemos saber a todos os juízes, vereadores 
e procurador do Conselho desta Capitania e bem assim a todos os corregedores, 
provedores, ouvidores, julgadores e justiças e mais pessoas do Reino de Portugal e 
suas Conquistas a quem apresente licença geral for apresentada, e o conhecimento 
dela deva e haja de pertencer que a nos enviou a dizer Simão Henrique oficial de 
marceneiro e torneiro que pela carta junta consta haver sido examinado na cidade 
do Porto no ano de mil e seiscentos e noventa e sete pelos juízes do dito ofício que 
no dito ano serviam o qual exame fora julgado por bom como da dita carta consta, 
porém como a jurisdição daquele Senado senão estendia a mais que a todo o seu 
termo nos requeria que visto de presente se achar nesta cidade queria usar do dito 
seu ofício de marceneiro e torneiro com sua tenda aberta e por nos constar da dita 
carta ser verdade o que relatava por não ter vício que dúvida fizesse, havemos por 
bem de lhe confirmar e pela presente lhe confirmamos, ficando sujeito as posturas

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