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es- forços e despender energias, tempo e dinheiro para conhe- cer cientificamente a audiência (em geral e raramente em particular). Uma das características principais da comunicação social é a "mobilidade psíquica"que oferece às pessoas (Marín et al, 1999: 81). Efectivamente, se as viagens oferecem mobilidade física, a comunicação social favorece a mobilidade mental, psíquica, no www.bocc.ubi.pt Elementos de Teoria e Pesquisa 57 sentido de que proporciona às pessoas experiências comuns do mundo (representações do mundo), gerais e imediatas, que não ocorriam nas sociedades antigas. Embora a metáfora seja muito imperfeita, já que há muitos mecanismos que o impedem plena- mente, a comunicação social, num certo sentido, é "uma janela para o mundo". Por outro lado, a comunicação social é um agente de socializa- ção e aculturação, de disseminação de informação e de modelação social do conhecimento4. Alguns conseguem usá-la para garantir o seu enriquecimento pessoal, social e cultural e para ascenderem socialmente, outros nem tanto5. Porém, é certo que ela contri- bui para que todos "conheçam"mais coisas sobre o mundo, em comunhão, constituindo, neste sentido, uma instituição que desa- fia educativa e formativamente a própria escola, inclusivamente através da disseminação de mensagens didácticas. Além disso, a comunicação social (ver também Marín et al., 1999: (124-147): • Promove o estatuto social das pessoas que atraem a aten- ção dos media (figuras públicas), mas em contrapartida pode suscitar a devassa da vida privada; • Tende areforçar as normas sociais, contribuindo para a definição do que é e não é desviante e inaceitável, embora também possa ter um papel de ruptura às normas em certas situações; • Tira tempo a outras formas de interacção dos indivíduos uns com os outros e com os grupos, as comunidades e a sociedade; • Dissemina informações e promove conhecimentos-comuns 4 Sobre estes pontos, consultar os capítulos dedicados às escolas e autores do pensamento comunicacional e aos efeitos da comunicação. 5 Sobre estes pontos, consultar os capítulos dedicados às escolas e autores do pensamento comunicacional e aos efeitos da comunicação. www.bocc.ubi.pt 58 Jorge Pedro Sousa que favorecem a agregação dos cidadãos na sociedade, já que estes deixam de se sentir estranhos a ela; • Funciona, muitas vezes, como um espaço de entretenimento e mesmo de saudável libertação da imaginação, propici- ando a fuga mental à dureza da vida ou à rotina quotidiana; • Tem uma função interpretativa, que radica na valorização e no enquadramento dos acontecimentos que são objecto de discurso mediático, embora possa oferecer, simultanea- mente, várias valorizações e enquadramentos em confronto; • Contribui para a transmissão cultural e para disseminar explicações que tornam o mundo compreensível, embora, por vezes, gere explicações digladiantes; • Contribui para a reprodução social e cultural, mecanis- mos através dos quais, quotidianamente, uma sociedade se recria a si mesma e à cultura dominante, a um nível conjun- tural; neste contexto, desenvolve a formação dos consensos que são necessários para a convivência social e para a go- vernação; • É veículo de mensagens persuasivas, quer digam respeito à luta pelo poder (propaganda política), quer à luta comer- cial, sendo estas últimas bastante mais comuns; • Tende a reforçar as atitudes pessoais, pois as pessoas cos- tumam expor-se, principalmente, às mensagens que vão ao encontro do seu sistema de crenças, valores e expectativas; • Pode favorecer a mobilização pública para se atingirem determinados objectivos (políticos, militares, de desenvol- vimento, sociais, religiosos, etc.); • Coordena actividades separadas, dando-as a conhecer; www.bocc.ubi.pt Elementos de Teoria e Pesquisa 59 • Promove as negociações entre indivíduos para se co-ori- entarem em relação a terceiros, ao mundo e às coisas, devido às mensagens simbólicas que difunde, que cobram aos receptores um posicionamento em relação àquilo a que se referem; • Contribui para o desenvolvimento e crescimento econó- mico, ao gerar conhecimentos susceptíveis de melhorar as práticas produtivas, a educação e a saúde; ao oferecer infor- mações que permitem às pessoas escolher novos produtos, conhecer oportunidades alternativas de ganhar a vida, etc.; ao incentivar o consumo e, portanto, a produção; ao forçar os líderes a governar com maior atenção aos governados e com mais profundo conhecimento dos dossiers, devido à publicitação e vigia dos actos de poder, etc. Assim sendo, a comunicação social tem repercussões extre- mamente positivas e outras que podem ser negativas, dependendo dos usos que dela fazem produtores e receptores de mensagens e dos efeitos que estas e os meios que as veiculam ocasionam. A propósito, uma referência final à necessidade de distinguir entre a comunicação social em si e o sistema de meios que a su- porta. Uma coisa é a produção e difusão de mensagens e os efeitos que estas geram, outra os suportes usados para essas mensagens (os media difusores)6. 1.6 Comunicação, comunidades, sociedade e cultura Não há uma definição única de sociedade, mas também não é ob- jecto deste livro definir o que é uma sociedade e como as diferen- tes sociedades comunicam entre elas e qual o estatuto que assu- mem em relação ao indivíduo. De qualquer modo, podemos dizer 6 Ver o capítulo sobre os media. www.bocc.ubi.pt 60 Jorge Pedro Sousa que o conceito de "sociedade"é abstracto, descrevendo, na sua essência, relações entre pessoas e estruturas formadas por essas relações, ou seja, um sistema social. Em síntese, uma sociedade é um sistema de indivíduos, grupos, organizações e instituições em interacção e vinculados à estrutura resultante dessa interacção. Igualmente abstracto é o conceito de "comunidade", contra- ponto analítico da noção de "sociedade", apesar de, na sua es- sência, o conceito de "comunidade"também descrever um tipo de relações entre pessoas e a estrutura que delas brota. A noção de comunidade pode contrapor-se, analiticamente, à noção de sociedade, pois enquanto na comunidade os indivíduos se unem por laços naturais (descendência/ascendência) e/ou es- pontâneos e por objectivos comuns, na sociedade os indivíduos relacionam-se com base nos interesses individuais ou nos interes- ses das suas comunidades, o que resulta, muitas vezes, em com- petição e numa certa indiferença face aos outros. A sociedade, contudo, não se dissolve porque aos indivíduos é imposta uma so- lidariedade orgânica, expressa numa estrutura social que agrega organismos diferentes, com funções individualizadas, e que re- sulta, em grande medida, da divisão social do trabalho7, que torna os indivíduos interdependentes. Tendo em conta o propósito deste livro, o que interessa per- ceber é que quer a comunidade quer a sociedade só se formam e subsistem porque existe comunicação, pois esta é o substrato em que se desenvolvem as relações e interacções entre os actores sociais, sejam estes individuais ou colectivos, e em que constan- temente se negoceiam e encontram os equilíbrios que asseguram a sobrevivência do sistema social e do sistema comunitário. Por exemplo, em termos sociais, é comunicando que se desenvolve o parlamentarismo democrático e se chega a acordo para publicar leis; em termos comunitários, é comunicando que uma família de- cide se está na hora de ter mais um filho, ou de comprar um carro novo... 7 Há quem cultive a terra, quem transforme produtos, quem preste servi- ços... www.bocc.ubi.pt Elementos de Teoria e Pesquisa 61 Assim, se há interacções entre os elementos estruturantes das comunidades e da sociedade, em concreto entre os actores sociais colectivos e individuais, e se são essas interacções que constroem quotidianamente as identidades, as comunidades e a sociedade e dão