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Crimes contra a administração publica

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DIREITO PENAL
Professor Doutor Fernando Alves
Crimes contra a Administração Pública
CONCEITO DE FUNCIONÁRIO PÚBLICO
-O conceito de funcionário público no ordenamento jurídico em geral é sempre mais amplo do que aquele estabelecido pelo direito administrativo.
-Nesse ramo do direito, 2(duas) são as teorias que buscam estabelecer um conceito de funcionário público: 1) a teoria restritiva; 2) a teoria ampliativa (penalmente extensiva).
-Pela teoria restritiva, funcionário público somente é aquele que, na representação da soberania do Estado, exerce um poder de império, autoridade ou discricionário, por menor que seja.
-Na teoria restritiva a função pública é confundida com autoridade, pois somente através desta a atividade do Estado se faz presente, realizando a satisfação de uma necessidade pública.
-Já a teoria ampliativa a concepção de função pública não se confunde mais com autoridade.
-O conceito de funcionário público estaria indissoluvelmente ligado com o de função pública. No caso dos crimes praticados por funcionário público, tal função seria elemento constitutivo ou essencial do delito.
-Segundo Riccio, a “atribuição da função reflete-se no sujeito e o qualifica, e ele, num certo sentido, se identifica com a Administração Pública”.
-O conceito de funcionário público é, portanto, mais amplo e genérico do que o de autoridade. A função de autoridade, na verdade, é uma espécie de função pública.
-O Código Penal Brasileiro, ao seguir a teoria ampliativa a elasteceu ainda mais, transformando-a em teoria extensiva. Dispensa para a caracterização de funcionário público o exercício profissional ou permanente da função pública.
-O Direito Penal foi mais além do que o Direito Administrativo, dando ao conceito de funcionário público matizes mais amplos, não exigindo o exercício permanente da função pública.
Art. 327 - Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública. 
§ 1º - Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal, e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública. 
§ 2º - A pena será aumentada da terça parte quando os autores dos crimes previstos neste Capítulo forem ocupantes de cargos em comissão ou de função de direção ou assessoramento de órgão da administração direta, sociedade de economia mista, empresa pública ou fundação instituída pelo poder público . 
-Segundo Nelson Hungria, para que ocorra a conduta do art. 327 do Código Penal, não é propriamente a qualidade de funcionário que caracteriza o crime funcional, mas sim o exercício da função pública, seja ela permanente ou temporária, remunerada ou gratuita. A função tanto pode ser exercida profissionalmente, de forma efetiva ou interina, como também não.
-Dispensado o exercício profissional e a permanência, o Código Penal brasileiro considera funcionário não apenas aquele conceituado pelo direito administrativo, mas também aquele que exerce emprego público, como o contratado pelo regime da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), assim como todo aquele que exerce, de qualquer modo, mesmo que momentaneamente e sem remuneração, a função pública.
-Perante o Código Penal, a função pública em sentido genérico abrange todas as órbitas de atividade do Estado, seja no Executivo, no Legislativo ou no Judiciário.
-Tanto é funcionário público o presidente da República quanto o estafeta de uma repartição em Caicó/RN, tanto o senador da República quanto o vereado do mais humilde município.
-Podem ainda ser considerados funcionários públicos, para os efeitos penais: prefeitos municipais, vereadores, serventuários da Justiça, funcionários de cartórios, peritos judiciais, auditores fiscais, contadores de prefeituras, leiloeiros oficiais, juízes de paz, zeladores de prefeituras, militares das Forças Armadas, policiais federais, rodoviários, civis e militares, bombeiros, guardas municipais ou inspetores de quarteirão, promotores e procuradores de justiça e procuradores autárquicos, magistrados, guardas ou vigilantes noturnos contratados diretamente por prefeituras (sem terceirização), professores e médicos da rede pública federal, estadual ou municipal.
-Nesse contexto, no exercício das funções públicas, abrange-se não somente o serviço efetivo, exercido por funcionários aprovados em concurso público, mas também o serviço temporário, celebrado por um contrato em regime especial ou por um contrato regido pelas normas da Consolidação das Leis do Trabalho, tanto no âmbito do Poder Executivo, do Judiciário, do Legislativo ou do Ministério Público.
-Não são, todavia, considerados funcionários públicos aqueles que exercem um mero munus publico e não uma função pública propriamente dita: síndico da massa falida; defensor dativo; administradores e médicos de hospitais privados credenciados pelo Governo; tutores e curadores; inventariantes; advogados que exercem atividade profissional em entidades de classe, como sindicatos.
-O §1º do art. 327 do CPB, com redação dada pela Lei 9.993, de 17.07.2000, equipara a funcionário quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal, e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública.
-Em relação a esse dispositivo, inicialmente Heleno Fragoso alertava que a equiparação somente abrangia os ocupantes de cargos em comissão, em função de direção ou assessoramento.
-Entretanto, a Lei 9.983/2000 corrigiu eventuais distorções, sendo muito mais abrangente, incluindo não somente a pessoa que exerce cargo, emprego ou função numa entidade paraestatal, como uma autarquia, mas também pessoas que trabalham em sociedades de economia mista, empresas públicas e fundações instituídas pelo poder público.
-O artigo 84, em seu §1º, da Lei 8.666/93, definiu o que a lei entende por servidor público em entidade paraestatal, dizendo que: 
“Equipara-se a servidor público, para os fins desta lei, quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal, assim consideradas, além das fundações, empresas públicas e sociedades de economia mista, as demais entidades sob controle, direto ou indireto, do Poder Público”
-O §1º do artigo 327 do CP equipara a funcionário público, para os efeitos penais, pessoa que trabalha para empresa que mantém contrato de prestação de serviços ou convênio com a Administração, e que pode, em decorrência disso, ser responsabilizado criminalmente.
-Por contrato administrativo, segundo Maria Zanella Di Pietro, entende-se “todo acordo que a Administração, nessa qualidade, celebra com pessoas físicas e jurídicas, públicas ou privadas, para a consecução de fins públicos, seguindo um regime jurídico de direito público”
-O contrato administrativo difere do convênio, que por sua vez é “a forma de ajuste entre o Poder Público e entidades públicas ou privadas para a realização de objetivos de interesse comum, mediante mútua colaboração”.
-Para fins penais, o §1º do art. 327 equipara-se a funcionário público tanto o que trabalha em empresa contratada ou conveniada, respectivamente, sob o regime de um contrato administrativo quanto o de um convênio.
-Apesar do Código Penal não fazer referência direta aos funcionários de autarquias e fundações públicas, para o legislador penal, autarquia e entidade paraestatal são expressões equivalentes.
-O § 2º do artigo 327 tem uma causa de aumento de pena quando os autores do crime “forem ocupantes de cargos em comissão ou de função de direção ou assessoramento de órgão da administração direta, sociedade de economia mista, empresa pública ou fundação instituída pelo Poder Público”.
-A questão não é pacífica não doutrina, mas autores como Luiz Regis Prado tendem a defender que a majorante somente cabe no caso de agentes nomeados expressamente.
-Trata-se de tese também defendida por Heleno Fragoso, Pierangeli, Mirabete, Damásio de Jesuse Paulo José da Costa Júnior. Tais autores entendem que a equiparação a funcionário público e a causa de aumento devem ser restringidas às pessoas mencionadas na lei que as nomeou para o exercício de tais cargos.
PECULATO
Art. 312 - Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio: 
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. 
§ 1º - Aplica-se a mesma pena, se o funcionário público, embora não tendo a posse do dinheiro, valor ou bem, o subtrai, ou concorre para que seja subtraído, em proveito próprio ou alheio, valendo-se de facilidade que lhe proporciona a qualidade de funcionário. 
Peculato culposo 
§ 2º - Se o funcionário concorre culposamente para o crime de outrem: Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano. 
§ 3º - No caso do parágrafo anterior, a reparação do dano, se precede à sentença irrecorrível, extingue a punibilidade; se lhe é posterior, reduz de metade a pena imposta. 
Antecedentes Históricos
-A palavra peculato provém do latim, do termo peculatus ou depeculatus, utilizado na Roma Antiga, antes da introdução da moeda.
-A palavra também é empregada no direito francês como péculat e no direito espanhol como peculado.
-Em Roma, quando o gado (pecus) era destinado aos sacrifícios, este constituía a parte mais significativa do patrimônio de uma coletividade, e também o mais fácil de ser transportado, uma vez que consistia num bem móvel.
-No Direito romano entendia-se que o peculatus era uma espécie de furtum (próprio ou impróprio), que ao lado do sacrilegum, era considerado um furto de extraordinária gravidade, visto que estava ligado à subtração de um patrimônio utilizado nos sacrifícios religiosos.
-Se o gado estava vinculado a um sacrifício destinado a uma divindade, o furto de coisas consagradas aos deuses era um fato extremamente grave.
-Dizia-se na época do Direito romano que o furto de coisas consagradas aos deuses equivalia ao furto de dinheiro público (furto de coisas sagradas).
-O título 13 do Livro do Digesto de Justiniano já tratava do crime de peculato sob o título Ad legem luliam peculatus, et de sacrilegis et de residualis.
-Inicialmente, portanto, o peculato equiparava-se ao sacrilégio (crime contra a cidade e contra os deuses). Posteriormente, com o surgimento da moeda, o peculato passou a ser entendido como toda submissão de metais ou moedas em prejuízo do aerarium do povo romano ou de outra entidade pública, cometida, ainda que não necessariamente, pelos magistrados ou seus dependentes.
-O peculato nessa época abrangia não somente o furto no seu sentido próprio, mas também a apropriação indébita, de dinheiro devido ao erário pelos funcionários contábeis na soma resultante de sua prestação de contas (pecuniae residuae).
-Na evolução do conceito de peculato ampliou-se sua concepção para compreender toda fraude cometida em prejuízo da renda pública, ainda que não consistisse na subtração ou desvio de dinheiro.
-A Lex Julia, por exemplo, reprimia a conduta de quem desviasse dinheiro público recebido para um fim determinado, e também punia o funcionário que se apropriasse do saldo do erário público após a dedução das despesas.
-O importante salientar é que, no Direito romano, o peculato sempre foi considerado um delito contra o Estado, cujo julgamento competia aos quaestori parricidi, originalmente punido com a pena de morte, mais tarde sendo substituída por uma pena pecuniária.
-Durante o Império romano, ação penal por peculato poderia ser promovida também contra os herdeiros.
-Na Idade Média as penas aplicadas ao peculato eram atrozes. Era comum a aplicação cumulativa da pena de infâmia, pena que alcançava até o condenado morto.
-Entretanto, segundo Impallomeni, em algumas legislações da época a pena era mais branda, aplicando-se ao autor do peculato a mesma pena aplicada ao furto, pois se entendia que o peculato não passava de um furto praticado por funcionário público.
-Com o movimento humanista do século XVIII, as penas para o peculato passam a ser mitigadas.
-As Partidas Espanholas (Partida VII, Título XIV, Lei 14) acolhiam a distinção romana entre peculato próprio e impróprio (na verdade, assemelhava-se ao furto próprio e impróprio), estabelecendo uma pena de morte para o primeiro e uma pena de multa para o segundo.
-Em Portugal, as Ordenações Filipinas do século XVIII, no Livro V, Título LXXIX, tratavam do delito praticado pelos “oficiais do rei que lhe furtam, ou deixam perder sua Fazenda por malícia”.
-Os bens públicos pertenciam à Coroa, e não ao monarca e as penas aplicadas eram as mesmas para o furto, que, no caso, tinha uma pena pecuniária multiplicada nove vezes sobre o valor das coisas furtadas ou maliciosamente levadas, cumulada com a perda do cargo ou ofício.
-Já no Brasil do século XIX, no Código Criminal do Império, o art. 170 previa o peculato, posicionado entre os crimes contra o tesouro público e a propriedade pública, punindo-se o infrator com a perda do emprego, prisão com trabalho por dois a quatro anos e multa de cinco a 20% da quantia ou valor dos bens apropriados, consumidos ou extraviados.
-Com a proclamação da república, o Código Penal republicano de 1890 contemplou o delito de peculato no artigo 221, classificando-o no Título dos Crimes contra a Boa Ordem e a Administração Pública.
-Em 1923, o Decreto 4.780, de 27 de dezembro ampliou a proibição no tipo penal do peculato, acentuando as penas cominadas e incluindo a apropriação de bens móveis particulares, na posse de funcionário público em razão do exercício do cargo.
-Finalmente o Código de 1940 previu o peculato em seu artigo 312, contemplando três modalidades de peculato próprio, enquanto que o artigo 313 refere-se ao peculato impróprio.
-Na doutrina as modalidades de peculato próprio passaram a ser chamadas de peculato apropriação, peculato desvio e o peculato furto.
Conceito
-No peculato ocorre um enriquecimento ilícito do agente, na qualidade de funcionário público, em detrimento da Administração.
-Anteriormente, o Código Penal Italiano de 1889, chamado de Código Zanardelli chamava esse tipo de delito de malversação.
-O peculato constitui-se numa das formas mais graves de malversação, porque além do proveito econômico, ocorrem atos ilegais em que o agente executa sua conduta sob aparência de poder ou de autoridade no exercício de uma função pública.
-Se a conduta já é grave pelo fato do agente agir em descompasso com suas funções, agindo em nome próprio mas usando o nome do Estado, mais grave ainda é quando dessa conduta resulta um enriquecimento ilegal.
-No peculato ocorre um descumprimento do dever de probidade e de fidelidade que deve orientar toda e qualquer conduta funcional.
-Ocorre, segundo os dizeres de Pannain, uma traição à fidúcia que decorre do ofício ou de um serviço.
Objeto Jurídico
- A doutrina menciona que o objeto jurídico na incriminação do peculato é a defesa dos bens patrimoniais da Administração Pública.
-Entretanto, além do patrimônio público, leva-se em conta na objetividade jurídica do delito de peculato a probidade e a fidelidade do funcionário público, proferida mediante juramento. Desta forma, Carrara classificava o delito como um crime contra a fé pública.
-Portanto, dupla é a tutela da norma jurídico-penal que estabelece no artigo 312 o delito de peculato: de um lado, a norma penal protege bens patrimoniais, incriminando a apropriação ilegítima desses bens; do outro, tutela a probidade e a fidelidade do funcionalismo público, garantindo a imparcialidade e a dignidade da função pública. 
-Para Maggiore, “no peculato, mais do que material, o dano é moral e político, que se concretiza no descumprimento do dever de fidelidade do funcionário em face da Administração Pública”. 
-Da mesma forma, Manzini ressalta que a repressão do peculato consiste em “representar a probidade na Administração Pública e o índice de progresso moral e da educação política dos povos”.-Segundo Nelson Hungria, “convergem no peculato a violação do dever funcional e o dano patrimonial”. 
-Pune-se o peculato tanto porque é um delito patrimonialmente lesivo ao poder público, como também significa uma quebra de fidelidade no desempenho de cargo público.
-No tocante a sua objetividade jurídica, o crime de peculato é, portanto, pluriofensivo, pois tutela o bem jurídico do interesse estatal na probidade e correção do funcionário público, bem como protege os bens patrimoniais, confiados ao servidor público a quem compete dar destinação adequada.
Sujeito Ativo
-O sujeito ativo no peculato somente pode ser funcionário público. Aquele que mantém uma relação direta com o objeto material do delito. Trata-se, portanto, de um crime próprio.
-Como se trata a qualidade do agente de uma elementar do crime, o peculato comunica-se aos coautores, mesmo que não sejam funcionários, que respondem pelo mesmo delito.
-Ainda em relação ao concurso de agentes, não se faz necessário que o funcionário público seja o autor do delito, bastando que dele participe. 
-Ocorre que é indispensável que a apropriação da coisa(dinheiro, valor ou outro bem móvel), tenha se dado por conta da condição de funcionário púbico do agente, coautor ou partícipe.
Sujeito Passivo
-O sujeito passivo no peculato é sempre o Estado; ou seja, o crime é próprio tanto em relação ao agente quanto á vítima.
-O Estado, nesse caso, pode ser representado tanto pela União, quanto por Estados-membros e Municípios, bem como as pessoas de direito público mencionadas no art. 327, §1° do CP.
-Se o crime é praticado por militar, aplica-se o artigo 303 do Código Penal Militar.
Núcleo do Tipo
-No caput do art. 312 situam-se duas modalidades de peculato próprio: a) peculato-apropriação e peculato-desvio.
-Essas duas proibições consistem nos verbos típicos: apropriar e desviar.
-Em ambas as situações, o agente, em razão do cargo ou função, tem a posse de coisa móvel apropriada ou desviada.
a) Peculato-apropriação: o peculato-apropriação ganha bastante semelhança com a apropriação indébita, pois, assim como ocorre no citado delito, nesta modalidade de peculato o agente promove o assenhoreamento da coisa que se encontra em sua posse, passando a dela dispor como se fosse seu proprietário.
-No peculato-apropriação acontece, portanto, uma transmutação da posse legítima para um apossamento uti dominis. Há uma conversão da posse legal em uma propriedade ilegal.
-O agente tem a posse da coisa móvel apropriada em razão de seu cargo. Para que o peculato ocorra, as coisas que constituem o objeto material do delito devem estar na posse do funcionário, em razão de suas funções.
-Inexistente o antecedente da posse da coisa pelo funcionário em razão do cargo, há de se identificar se houve peculato-furto (§1º do art. 312) ou mesmo furto comum (art. 155). 
-Segundo Heleno Fragoso, “ é necessário que essa posse lhe seja confiada em razão do cargo, o que significa que a entrega da coisa ao agente deverá ser feita em virtude de sua competência funcional, estando o ato dentro das atribuições inerentes ao cargo que ocupa.
-O peculato-apropriação difere da apropriação porque, no caso dessa última, o agente pode ser qualquer pessoa, enquanto que no peculato o autor do delito só poderá ser o funcionário público no exercício de suas funções.
-Na apropriação indébita, a posse pode ser de qualquer natureza, enquanto que no peculato a posse decorre do ofício ou do serviço prestado pelo funcionário.
-No peculato-apropriação ocorre um desvio de conduta que representa um ato de infidelidade, um descumprimento de um dever jurídico e moral para com a Administração Pública, que, nesse caso, é a real proprietária ou possuidora de bens móveis seus ou de particulares, que estão temporariamente sob a posse do agente, que deles se apropria.
-A competência do funcionário para ter a posse sobre a coisa pode decorrer de lei, regulamento ou outros atos administrativos, não se excluindo a prática usual e costumeira, desde que não contrária à lei, conforme ensina Heleno Fragoso.
-Tal prática deve ser usual, ou seja, habitual, entre as pessoas que desempenham atividades no serviço público, geralmente contando com ordem verbal ou orientação de superior hierárquico.
b) Peculato-desvio: além do peculato-apropriação, no peculato-desvio o funcionário não se apropria da coisa que tem a posse em razão do cargo, mas direciona dinheiro, valor ou qualquer outro bem para fim diverso daquele previamente previsto pela Administração.
-Nessa modalidade de peculato, o agente desencaminha a coisa, bem ou valor para satisfazer seu interesse ou de outrem.
-Nesse caso, dentro do núcleo do tipo do artigo 312, insere-se um elemento normativo, caracterizado pela expressão “em proveito próprio ou alheio”.
-O proveito próprio trata-se de uma vantagem econômica, pois se a vantagem foi somente moral, não se trata de peculato, mas sim de prevaricação (art. 319).
-No peculato-desvio o agente dá à coisa uma destinação diversa daquela que deveria dar, fazendo-a em benefício próprio ou de terceiro. 
Ex.1: empréstimo de dinheiro feito pelo funcionário de que tem a guarda.
Ex.2: pagamento conscientemente feito por funcionário por serviço não prestado ou por mercadoria não recebida pela Administração.
-Não existe no Código Penal brasileiro o peculato de uso. Entretanto, doutrinariamente, entende-se que somente pode haver peculato de uso impunível se o objeto material tratar de coisa não fungível, porque só essa pode ser usada.
-O peculato de uso ocorre quando o funcionário faz uso momentaneamente da coisa que lhe é confiada, sem a intenção de torná-la sua, isto é, sem animus domini. Ex: o uso momentâneo de um computador ou de um automóvel da Administração pelo funcionário, sem que ele queira usá-los como se fossem seus.
-Entretanto, a utilização de dinheiro público, ainda que funcionário tenha a firme intenção de restituí-lo, configura o crime de peculato.
-Nesse caso, a ausência de animus rem sibi habendi não modifica a incriminação, permanecendo a tipificação do delito.
-A jurisprudência sedimentou entendimento quanto ao peculato de uso, que o uso de máquinas e veículos não caracteriza o crime em estudo, mas ocorre peculato próprio quando o agente não repõe peças ou o combustível consumido.
Objeto Material
-O objeto material do peculato deve ser dinheiro (moeda metálica, papel-moeda em curso legal no país), valor e qualquer título ou documento conversível em dinheiro ou mercadoria (papel de crédito, apólices, ações, letras de câmbio, letras do tesouro, vale postal, nota promissória, warrants etc).
-Para fins de objeto material, o legislador também incluiu na proibição qualquer outro bem móvel, valendo-se de uma expressão genérica para definir qualquer coisa que possa ser deslocada de um lugar para o outro.
-Exclui-se apenas o bem imóvel, que poderá se converter em objeto material do delito quando mobilizado.
-No delito de peculato, também podem ser incluídas como objeto material a energia elétrica e a telefonia.
-Se o agente, valendo-se do cargo, desvia energia elétrica destinada para uso exclusivo em serviço, comete peculato. Da mesma forma é autor de peculato o funcionário que faz chamadas telefônicas particulares, usando o telefone destinado ao serviço. Ambos são casos de peculato-desvio.
Elemento Subjetivo
-O peculato, em regra, é punido a título de dolo. Trata-se de dolo genérico, que consiste na vontade livre e consciente do agente de se apropriar da coisa pública.
Consumação e Tentativa
-A consumação ocorre no momento e no lugar em que o agente (funcionário público) pratica um ato que exprima de modo inequívoco sua vontade de tomar dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel de que tem a posse em razão do cargo. 
-O peculato é um delito instantâneo, que se consuma no momento em que a posse em razão do cargo que exerce se transmuda e o agente passa a dar uma destinação diversa daquele que é devida.
-Em outras palavras, o peculato é consumada quanto o agente passa a agircomo se fosse dono da coisa, bem ou valor.
-Nos dizeres de Magalhães Noronha, no peculato-apropriação o delito se consuma “ quando o agente transforma a posse ou detenção em domínio, executa atos de dono, passa a dispor da coisa como se tivesse a propriedade, não mais agindo em nome e no interesse de quem lhe confiou ou conferiu a posse”. 
-Já no peculato-desvio, a consumação ocorre quando o agente dá a coisa destinação diversa daquela determinada pela Administração Pública. O delito é consumado quando o agente utiliza a coisa em fins outros que não aqueles regularmente estabelecidos, em proveito próprio ou de terceiro.
-Como se trata, doutrinariamente, quanto à consumação, de um crime material e de dano, admitindo um resultado, naturalmente o peculato admite a tentativa.
-A tentativa de peculato ocorre, por exemplo, quando o tesoureiro ou caixa da repartição é detido ao sair desta portando dinheiro que deveria ficar num cofre.
-No peculato doloso, ao contrário do culposo, a reparação do dano é irrelevante, podendo, quando muito, influir na aplicação da pena.
Peculato-furto
-Está previsto no §1º do art. 312 do CP. O peculato-furto é punido com a mesma pena do tipo fundamental previsto no caput do artigo. 
-O peculato-furto ocorre quando o funcionário, embora não tendo a posse do dinheiro, valor ou bem, o subtrai ou concorre para que seja subtraído, em proveito próprio ou alheio, valendo-se da facilidade que lhe proporciona sua qualidade de funcionário.
-Nesse caso, o agente, ainda que funcionário público, não tem a posse da res mobilis, pública ou particular em razão do cargo, mas sua condição de funcionário lhe permite subtraí-la. 
-A facilidade a que diz respeito o Código refere-se a qualquer circunstância de fato que proporciona ao agente a subtração da coisa (dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel).
-A condição de funcionário público não é causa, mas condição do crime.
-No peculato-furto são 2 (duas) as condutas a incriminar:
A) a conduta do agente que, aproveitando-se da facilidade que lhe concede sua condição de funcionário púbico, pratica a subtração da coisa;
B)a conduta do agente que, aproveitando-se da facilidade que sua condição de funcionário lhe outorga, concorre, conscientemente, para que outrem realize a subtração.
-No segundo caso do peculato-furto ocorre um concurso necessário, pois o funcionário público pode até praticar o delito sozinho na primeira hipótese, mas na segunda concorre com sua conduta ativa ou omissiva, para a prática da subtração. 
-Não ocorre a necessidade da adesão de outrem a sua conduta, mas tão somente que outros também possam concorrer para subtrair a coisa, valendo-se o funcionário de sua condição para que tal delito se consuma, seja através dele diretamente ou através da ação de outrem.
-A conduta omissiva do agente no peculato-furto traduz-se no consentimento ou na consciente colaboração do funcionário em não impedir que a subtração se efetue.
-Exemplo da hipótese 1: um funcionário da copa e cozinha, que executa o seu trabalho em todas as partes do prédio onde funciona uma repartição fazendária ou um tribunal. Aproveitando-se dessa condição ele subtrai uma importância em dinheiro que se encontra em uma gaveta de uma sala. Ocorre crime de peculato-furto.
-Exemplo da hipótese 2: o funcionário que entrega ou facilita o acesso de outras pessoas as chaves da porta da repartição ou o segredo do cofre onde está guardado dinheiro público, ou simplesmente deixa aberta uma das portas para que seus comparsas entrem.
-Nesse segundo caso, no entendimento de Nelson Hungria, pela regra do art. 30 do CP, como a circunstância de caráter pessoal (funcionário público) é elementar do crime, tal circunstância se comunica com a conduta dos demais no crime em concurso de agentes, passando todos a responder por peculato.
-Importante salientar que, se um funcionário público, sozinho ou acompanhado, ingressar na repartição pública destruindo ou rompendo obstáculo para a obtenção da coisa, ele estará cometendo furto qualificado e não peculato, visto que não é sua qualidade de funcionário público fator determinante para o êxito da ação delituosa.
-O peculato-furto consuma-se quando a res sai da posse da Administração Pública passando para o agente, que dela passa então a dispor.
-A tentativa é possível, pois se trata de um crime material, em que o iter criminis é fracionável e pode ser interrompido antes da consumação por alguma circunstância alheia a vontade do agente.
-O peculato-furto é um crime punido exclusivamente a título de dolo, que consiste na vontade livre e consciente de subtrair coisa móvel, pública ou particular sob a guarda da Administração Pública, ciente da ilicitude de sua conduta.
-O tipo penal exige o dolo específico, que é o de subtrair em proveito próprio ou alheio, ou seja, o animus lucri faciendi.
-Há causa de aumento de pena, aumentando-se a pena da terça parte quando os autores do delito “são ocupantes de cargos em comissão ou de função de direção ou assessoramento de órgão da administração direta, sociedade de economia mista, empresa pública ou fundação instituída pelo Poder Público (art. 327, §2º do CP).
Peculato culposo
-Poucos são os Códigos Penais de diversas nações que admitem a forma culposa do peculato. Hoje em dia, a Espanha e Portugal que tinham essa figura típica nas versões antigas de seus Códigos, já não a tem mais, e não existe mais essa figura no Direito Penal Europeu.
-Entretanto, na América Latina, especialmente no Brasil, Argentina, Bolívia, Colômbia, Chile, Guatemala, Cuba, Honduras, Costa Rica, Nicarágua, Panamá, Peru e El Salvador ainda prevalece a figura do peculato culposo.
-A punibilidade dos crimes patrimoniais a título de culpa é excepcional, pois a regra é que tais delitos sempre se manifestam na forma dolosa.
-Carrara ensinava, por exemplo, que “ a imprudência humana deve ser freada e reprimida pela lei somente quando seja causa de um dano não reintegrável”.
-O sujeito ativo desse delito só pode ser o funcionário público, que pratica a conduta consciente dessa qualidade. Já o sujeito passivo somente pode ser o Estado, porque somente ele é quem pode sofrer os prejuízos de ordem patrimonial que se apresentam como exclusivos no âmbito do peculato.
-O peculato culposo ocorre quando o funcionário público exerce sua conduta com negligência, visto que, pelas circunstâncias, ele estava obrigado a ter cuidado no exercício de suas funções, e por conta de seu descuido, permite uma subtração por outrem de coisa pública ou coisa particular sob a guarda da Administração Pública.
-Magalhães Noronha expõe dois casos ou hipóteses em que o peculato culposo é possível:
a) o funcionário, por imprudência, negligência ou imperícia, concorre para que outro funcionário se aproprie de dinheiro, valor ou outro bem móvel público ou particular; 
B) o funcionário, por culpa, concorre para que um particular, de parceria com outro funcionário, se aproprie de dinheiro, valor ou outro bem móvel etc.
-No caso de peculato culposo é incabível o concurso de agentes não havendo participação culposa.
-O funcionário público descuidado, que deu oportunidade para a subtração praticada por terceiro responde pelo peculato culposo, mas o autor da subtração responde pelo outro delito patrimonial (roubo ou furto, por exemplo), uma vez que este agiu com dolo e não culpa.
-O crime consuma-se no momento em que se concretiza a ação criminosa do terceiro.
-Não existe tentativa no crime culposo, porque, nesse caso, não se quer direta ou eventualmente o resultado lesivo. Portanto, só haverá crime se o terceiro praticar a ação, logrando êxito no assenhoreamento ou subtração da coisa que está sob custódia ou guarda da Administração.
-Como existe uma relação funcional entre o funcionário público e os bens que estão sob sua guarda e custódia, como objeto material do delito, ele somente será responsabilizado pelo peculato culposo se o terceiro conseguir subtrair a coisa, devido o descuido do funcionário. 
-Se não houver subtração do bem porcircunstância alheia a vontade do terceiro, este responderá somente pela tentativa de subtração, mas a conduta do funcionário é atípica, não cabendo sua responsabilização.
-O §3º do art. 312 ainda fala da reparação do dano em caso de peculato culposo. Nesse caso, como já foi observado, a reparação somente é cabível na forma culposa do delito e não na forma dolosa.
-Se, no caso do peculato culposo, a reparação do dano ocorre antes da sentença irrecorrível, extingue-se a punibilidade. Se a reparação se dá após o trânsito em julgado da sentença condenatória, a pena é reduzida da metade.
-No caso da reparação do dano no peculato culposo, o ressarcimento pode ser feito pelo próprio funcionário ou por terceiro.
-O ressarcimento, ainda que tenha implicado em extinção da punibilidade, não exclui a responsabilidade administrativa do funcionário, estando ele ainda sujeito a sanções disciplinares.
PECULATO MEDIANTE ERRO DE OUTREM
Art. 313 - Apropriar-se de dinheiro ou qualquer utilidade que, no exercício do cargo, recebeu por erro de outrem: 
	Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) 	anos, e multa. 
Conceito:
-O peculato mediante erro de outrem é um tipo autônomo de peculato, classificado na doutrina como peculato impróprio e também chamado por alguns doutrinadores como peculato-estelionato.
-Nesse tipo penal o agente não possui a posse lícita de bens pertencentes à Administração Pública ou sob a responsabilidade desta.
-O agente não viola a confiança que é inerente ao específico dever funcional. 
-Segundo Heleno Fragoso, trata-se de apropriação indébita de dinheiro ou utilidade havida pelo funcionário público. por erro de outrem, no exercício do cargo.
Objeto Jurídico:
-A tutela penal, nesse caso, recai sobre o dever de probidade do funcionário público, que não deve aceitar coisas que lhe são entregues por erro, devendo restituí-las se as recebeu de boa fé (entendimento de Manzini e Antolisei).
-O dever fundamental do funcionário público é o de probidade e correção. Tal dever se traduz na honestidade do funcionário de não aceitar coisas que foram produzidas por erro.
-Em segunda lugar, a tutela penal recai sobre outro bem jurídico: o patrimônio da pessoa que, por erro próprio, entregou coisa que é sua a funcionário público, que dela se apropriou indevidamente.
Sujeito Ativo
-Como se trata de um crime próprio, no peculato mediante erro de outrem o agente somente pode ser funcionário público, quando está no exercício do cargo.
-Portanto, o crime praticado por funcionário aposentado ou que tiver cessado o exercício da função pública, não será mais o do art. 313, mas sim o do artigo 169 do CP (apropriação de coisa havida por erro).
-Apesar de não ser tema pacificado na doutrina, o entendimento majoritário, liderado por juristas como Magalhães Noronha é de que o crime do artigo 313 admite concurso de agentes.
Ex: um funcionário que, por equívoco, recebe determinada quantia de um contribuinte, e não opera com a devida restituição, pois foi instigado por outrem, particular, a dividir com ele o dinheiro.
-Caso contrário é quando um funcionário se apropria indevidamente da quantia de outrem, que foi induzido a erro por uma terceira pessoa, que pretendia obter vantagem ilícita juntamente com o funcionário, mas sem o conhecimento deste.
-Nesse caso, o funcionário responde pelo art. 313, enquanto que o particular que ensejou o erro da vítima responde pelo delito do artigo. 171 do CP (estelionato).
Sujeito Passivo
-O sujeito passivo é o Estado, comprometido pela ausência de dever funcional do funcionário, mas além do Estado, o particular que sofreu perda em seu patrimônio também pode ser sujeito passivo do delito.
Núcleo do Tipo
-O verbo nesse delito é o apropriar-se. É o ato do funcionário de se apossar do dinheiro ou de qualquer outra utilidade que receba em decorrência do erro de outrem.
-O delito é chamado de peculato impróprio porque o agente, funcionário público, não tem a precedente posse lícita de bens pertencentes ao Estado ou que estão sob sua responsabilidade.
-No que tange a tipicidade objetiva, o funcionário público também pode incorrer em erro no ato do recebimento do objeto, mas o crime surge quando, após verificado o equívoco, o funcionário se apodere da coisa, desaparecendo a boa fé e surgindo no dolo.
-Além da apropriação, outro pressuposto d de natureza subjetiva do delito é o erro de outrem.
-Deve se tratar de um erro espontâneo, pois, se o erro foi provocado, trata-se de estelionato, na modalidade de “mante alguém em erro”, como estabelece a segunda parte do caput do art. 171 do CP.
-Também não há o crime do art. 313 se o agente, funcionário público, aproveita-se de um momento de distração do particular para se apossar de coisa ou dinheiro, hipótese que configurará o delito de furto (simples ou mediante fraude) e não de peculato.
-Erro é a falsa percepção da realidade, que pode decorrer ignorância, falso conhecimento, desatenção, confusão etc.
-Na doutrina o erro abrange a ignorância, podendo ser tanto um erro de tipo quanto um erro de proibição.
-O erro pode versar tanto sobre a coisa que o sujeito passivo entrega, quanto a pessoa, a quem ele faz a entrega (por entender, erroneamente, que tem competência funcional para receber).
Objeto Material
-A estrutura do tipo apresenta dois elementos normativos: dinheiro e utilidade. 
-Dinheiro é qualquer moeda que circule no país. Não se considera para o tipo penal a moeda estrangeira, posto que não tem curso legal, mas pode ser aproveitada no conceito de utilidade.
-A palavra utilidade é empregada pelo legislador no Código para identificar um bem móvel, conforme estabelece o art. 312 do CP.
-Entende-se portanto a utilidade como qualquer coisa móvel passível de apropriação.
Elemento Subjetivo do Tipo
-É o dolo (dolo genérico), que consiste na vontade livre e consciente do funcionário público, de se apropriar de um bem, sabendo que não é seu, em decorrência do erro de outrem.
-O agente deve ter consciência do erro alheio e estar no exercício das funções. Além disso, o agente deve ter consciência de que está no exercício da função pública e da vinculação dessa função com a errônea consignação.
-O dolo pode se manifestar posteriormente, após o agente se dar conta da apropriação.
Consumação e Tentativa
-A consumação do delito ocorre quando o agente se apropria da coisa recebida por erro, e passa a dispor dela como se dono fosse.
-A tentativa é possível, mas de difícil caracterização, visto que só com a atuação do funcionário o delito pode se consumado. Ex: há tentativa quando o funcionário sabe que o valor depositado está sendo feito errado, mas ele não consegue se apropriar por conta da intervenção de seu superior hierárquico.
Ação Penal
-A ação penal é pública incondicionada, atuando o Ministério Público como seu titular.
-Segue-se na ação penal o rito especial previsto no artigo 513 e seguintes do Código de Processo Penal (procedimento de julgamento dos crimes praticados por funcionários públicos).
INSERÇÃO DE DADOS FALSOS EM SISTEMA DE INFORMAÇÕES
Art. 313-A. Inserir ou facilitar, o funcionário autorizado, a inserção de dados falsos, alterar ou excluir indevidamente dados corretos nos sistemas informatizados ou bancos de dados da Administração Pública com o fim de obter vantagem indevida para si ou para outrem ou para causar dano: 
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. 
Conceito
-Introduzido no Código Penal pelo artigo 1ºda Lei 9.983, de 14.07.2000, o delito de inserção de dados falsos em sistema de informações também foi chamado de “peculato eletrônico”, quando o projeto de sua criação foi encaminhado ao Congresso Nacional, dentre os crimes praticados por funcionário público contra a Administração Pública.
-Trata-se de um crime que é punido com as mesmas penas do peculato próprio (art. 312).
-O tipo penal cuida de normatizar a ação do funcionário público que inserir dados falsos, alterar ou excluir dados corretos nos sistemas informatizados ou bancos de dados da AdministraçãoPública, com o fim de obter vantagem indevida para si ou para outrem ou para causar dano.
-A Alemanha foi um dos primeiros países a adotar em sua legislação essa figura típica, incriminando as fraudes mediante computador e alteração de dados armazenados.
-Seguindo o modelo alemão, no Código Penal Brasileiro o legislador decidiu definir os dois crimes eletrônicos num único tipo penal dividido em dois subtipos: os artigos 313-A e 313-B.
Objeto Jurídico
-O bem jurídico tutelado pela norma penal é a regularidade dos sistemas informatizados ou bancos de dados da Administração Pública.
-A proteção recai sobre a probidade administrativa, além da preservação do patrimônio público.
Sujeito Ativo e Passivo
-Trata-se de um crime próprio, pois o sujeito ativo do delito somente pode ser o funcionário público autorizado a operar e manter sistemas informatizados ou banco de dados da Administração Pública. 
-Quem pratica o crime é o funcionário que está lotado na repartição encarregada de operar e manter sistemas informatizados ou banco de dadods.
-Caso se trata de funcionário público de uma repartição, mas não autorizado a operar com esses específicos sistemas eletrônicos, que pratique delito assemelhado, trata-se de falsidade ideológica, prevista no parágrafo único do art. 299 do Código Penal.
-O sujeito passivo será o Estado, representado pela União, Estados-membros, Distrito Federal, Municípios, ou quaisquer das pessoas jurídicas mencionadas no §1º do art. 327 do CP.
-Eventualmente o particular também pode ser sujeito passivo se sofrer algum dano em razão da conduta do sujeito ativo.
Elementos Objetivos do Tipo
-Dois são os verbos no núcleo do tipo penal que traduzem o delito do art. 313-A: a) inserir ou facilitar o funcionário público a inserção de dados falsos nos sistemas informatizados ou bancos de dados falsos da Administração Pública; b) alterar ou excluir, indevidamente, dados corretos existentes nos sistemas de bancos de dados da Administração.
-Inserir é introduzir, incluir, colocar, adicionar, alimentar dados falsos.
-Já facilitar implica em tornar fácil, tornar possível, facultar, permitir. 
-Alterar é mudar, modificar, transformar, desestruturar dados, enquanto que excluir consiste em retirar, eliminar, afastar, remover dados ou informações.
-Na primeira parte do art. 313-A o agente trabalha com dados falsos. Ele insere ou facilitar a inserção de uma informação que não corresponde a realidade.
-A primeira conduta (inserir) é comissiva, já a segunda (facilitar) tanto pode ser comissiva quanto omissiva.
-A segunda parte trata da alteração ou exclusão indevida de dados corretos. Ao contrário das condutas anteriores, aqui os dados não são falsos, mas sim verdadeiros, e são adulterados pelo agente, funcionário público, que modifica tais dados ou mesmo os anula, excluindo-os.
-Na linguagem da informática utilizam-se as expressões “deletar”, “apagar”, “remover” ou mesmo “resetar” total ou parcialmente dados constantes de um banco existente.
-Muitas vezes, como instrumento do crime, o agente se vale de vírus informáticos para alterar ou apagar esses dados.
-Os vírus podem provocar alterações tanto nos programas, como nos arquivos, excluindo assim o funcionário, dados corretos outrora existentes em banco de dados.
-A expressão “banco de dados” é um elemento normativo do tipo, que merece uma definição jurídica.
-Por banco de dados entende-se um depósito de conjuntos de dados inter-relacionados entre si.
-Trata-se de uma compilação de informes sobre determinados fatos ou pessoas, que se encontram armazenados em um meio físico (computadores ou não) e que podem ser acessados de diversas formas.
-Um sistema de gerenciamento de banco de dados refere-se a uma coleção de dados inter-relacionados e um conjunto de programas que permite o seu acesso, tendo como objetivos evitar a redundância e inconsistência de dados, facilitando o acesso e evitando o seu isolamento.
-Atualmente, a maioria dos órgãos públicos no país, inclusive pequenos Municípios, valem-se desse sistema.
-Por sistemas informatizados, entende-se um conjunto de elementos materiais ou não, coordenados entre si, que formam uma estrutura organizada, armazenada e transmitida por computadores.
-Através de um sistema informatizado, um órgão público pode, por exemplo, deferir a alguém o pagamento de um benefício ou eliminar alguém que esteja sendo pago.
-Sistemas informatizados não se confundem com banco de dados, uma vez que os primeiros podem abranger os segundos, mas o banco de dados não necessariamente precisa ser armazenado em computadores.
-Existem banco de dados armazenados em arquivos e fichas de papel, que, guardados em cofres ou gavetas, não são objeto de informatização.
Elemento Subjetivo
-Trata-se de crime punível exclusivamente a título de dolo, que consiste na vontade livre e consciente de praticar quaisquer das condutas previstas no tipo penal descrito.
-Há o dolo específico, pois a conduta deve ser praticada “com o fim de obter vantagem indevida para si ou para outrem ou para causar dano”.
Consumação e Tentativa
-O crime se consuma com a prática de quaisquer das condutas incriminadas previstas no art. 313-A do CP, independentemente do agente ter obtido a vantagem almejada ou produzido dano para a Administração.
-Trata-se, pois, de um crime formal, pois se consuma com a própria ação do agente, independente do resultado.
-A tentativa é possível, porque, para praticar o delito, o agente tem de se valer de vários comandos para atingir sua meta, podendo o iter criminis ser interrompido no meio do caminho.
-Ex: o agente que é surpreendido no instante em que iniciou as alterações, mas não conseguiu êxito em produzir a inserção, alteração ou exclusão desejada.
Concurso de Pessoas e de Crimes
-Admite-se o concurso de agentes, apesar de ser crime próprio, pois pode ocorrer a participação de outro funcionário público ou de um particular.
-Na modalidade “facilitar” há concurso necessário, visto que, nesse caso, o agente facilitou a atuação de outrem para o delito ocorrer.Nessa hipótese, o particular pode ser coautor ou partícipe, exigindo-se que ele tenha conhecimento prévio da condição de funcionário público do autor.
-Já no tocante ao concurso de crimes, se o agente, ao realizar a conduta, pratica sucessivos atos em momentos que se protaem no tempo, ocorre crime continuado, na forma do art. 71 do CP, se de cada ação ou omissão em cada ato houver a falsificação ou alteração de arquivos informatizados ou banco de dados. 
-Nesse caso, diante da pluralidade de crimes o legislador entende que ocorreu uma única ação que se desdobrou em vários atos.
MODIFICAÇÃO OU ALTERAÇÃO NÃO AUTORIZADA DE SISTEMA DE INFORMAÇÕES
Art. 313-B. Modificar ou alterar, o funcionário, sistema de informações ou programa de informática sem autorização ou solicitação de autoridade competente: 
Pena – detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos, e multa. Parágrafo único. As penas são aumentadas de um terço até a metade se da modificação ou alteração resulta dano para a Administração Pública ou para o administrado. 
Conceito
-No delito do art. 313-A ocorre a prática de crimes através do uso de computadores.
-No crime de modificação ou alteração de sistema de informações, o computado não é mais o meio utilizado para a prática de um crime, mas sim o próprio objeto material do delito.
-Por isso que alguns autores na doutrina como Damásio de Jesus, Fernando Capez, Cezar Bitencourt e Antonio Lopes Monteiro indicam que o crime de modificação ou alteração de sistema de informações é um crime de informática autêntico, visto que o computador é essencial para a prática do delito.
-Este tipo penal tem pouca relação com o peculato, sendo incluído na definição de “peculato eletrônico”, apenas porque o tipo penal refere-se a funcionário público como autor do delito, tornando o delito um crime próprio.
Objeto Jurídico
-O bem jurídico tutelado pela norma penal trata-se da incolumidade dos sistemas de informação e programas de informática utilizadospela Administração Pública, que só podem sofrer modificações ou alterações mediante autorização da autoridade competente.
Sujeito Ativo e Passivo
-Por se tratar de crime próprio o sujeito ativo é o funcionário público.
-Diferentemente do delito anterior, previsto no art. 313-A, no delito do art. 313-B, segundo Cezar Bitencourt, o funcionário público não precisa de autorização para trabalhar com a informatização de sistema de dados da Administração Pública.
-O sujeito passivo é o Estado, sendo que, secundariamente, o particular também pode ser sujeito passivo do delito, se a conduta do agente público lhe acarretar algum dano.
Elementos Objetivos do Tipo
-A ação nuclear do delito consubstancia-se nos verbos “modificar” ou “alterar”, sistemas de informação ou programa de informática.
-O elemento normativo a completar o núcleo do tipo diz respeito à necessidade da conduta ser praticada “sem autorização ou solicitação da autoridade competente”.
Elemento Subjetivo do Tipo
-É o dolo, que no caso em tela consiste na vontade livre e consciente de alterar sistema de informações ou programa de informática.
-O dolo é genérico e se manifesta quando o funcionário tem ciência de comete o delito sem autorização ou solicitação da autoridade competente.
Consumação e Tentativa
-O delito consuma-se com a modificação ou alteração (parcial ou total) do sistema de informações ou programa de informática.
-Para Damásio de Jesus e Cezar Bitencourt trata-se de um crime formal ou de mera conduta, sendo que resultado naturalístico é irrelevante para a sua consumação. A tentativa é admissível.
-No caso de ser produzido dano para a Administração Pública, tal resultado é previsto como causa de aumento de pena, segundo o parágrafo único do art. 313-B. Tal resultado não é obrigatório para a consumação do delito, mas se ele ocorre, majora a pena cominada inicialmente, de um terço até a metade.
Concurso de Pessoas
-O delito pode ser praticado por funcionário público em concurso com o particular, estranho à Administração.
Ação Penal
-É delito de ação pública incondicionada.
-Como a pena do art. 313-B é de três meses a 2 (dois) anos de detenção e multa, por ser considerado uma infração de menor potencial ofensivo, o delito será julgado em processo de competência do Juizado Especial Criminal, na forma do art. 61 da Lei 9.099/95 e art.2º, parágrafo único da Lei 10.259, de 2001.
EXTRAVIO, SONEGAÇÃO OU INUTILIZAÇÃO DE LIVRO OU DOCUMENTO
Art. 314 - Extraviar livro oficial ou qualquer documento, de que tem a guarda em razão do cargo; sonegá-lo ou inutilizá-lo, total ou parcialmente: Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, se o fato não constitui crime mais grave. 
Conceito
-Trata-se de um crime subsidiário, visto que o extravio de livro oficial pode constituir elementar do crime de corrupção passiva (art. 317) ou configurar crime de falsidade ou supressão de documento (art. 305). Assim, o delito do art. 314 só se configura quando não constitui delito mais grave.
-É um delito de múltipla ação ou conteúdo variado.
-O Código Criminal do Império de 1830, no seu art. 129, §8º, já punia como prevaricadores os servidores públicos que alterassem uma escritura, ou papel verdadeiro, com ofensa de seu sentido, cancelassem, ou riscassem algum de seus livros oficiais, ou não dessem conta de autos, escritura ou papéis que lhes tivessem sido entregues em razão do cargo.
Objeto Jurídico
-O bem jurídico tutelado pela norma penal trata-se trata do normal funcionamento da Administração Pública.
-A lei penal quer tutelar a boa ordem e a regularidade dos serviços públicos, preservando a segurança e integridade dos livros oficiais e documentos confiados pela Administração a funcionário em razão do cargo.
Sujeito Ativo e Passivo
-Por se tratar de crime próprio o agente no delito é sempre o funcionário público (delicta in officio), o que não exclui a participação de particular, desde que aja em concurso com o autor do delito, sabendo da condição deste de funcionário público.
-O sujeito passivo é o Estado, titular do bem jurídico ou do interesse público tutelado pela norma penal.
-Por Estado entenda-se tanto a União, quanto os Estados-membros, o Distrito Federal, Municípios e demais pessoas referidas no art. 327, §1º do CP.
-Em segundo plano, pode-se considerar como sujeito passivo também o particular prejudicado pela ação do funcionário público.
Elemento Subjetivo
-O delito do art. 314 é punido exclusivamente a título de dolo, que consiste na vontade livre e consciente de praticar a ação descrita no tipo penal.
-Basta que o agente tenha consciência de que tem a guarda da coisa em razão do exercício do cargo.
Elemento Objetivo do Tipo
-O tipo do crime de extravio de livro oficial ou documento é caracterizado por três verbos concentrados no núcleo da proibição: a) extraviar; b) sonegar e c) inutilizar.
-Extraviar é o mesmo que desencaminhar, desviar, tirar do caminho, fazer desaparecer.
-Sonegar significa ocultar, encobrir, esconder.
-Inutilizar consiste em tornar inútil, imprestável para o fim a que se destina.
-O objeto material envolve não apenas livro oficial, mas qualquer documento, seja público ou particular, de que o funcionário tenha a guarda em razão do cargo.
-Nos dizeres de Nelson Hungria estão em jogo no delito, livros de escrituração de repartição pública ou registros, protocolos, papéis de arquivos ou museus, relatórios, plantas, projetos, representações, queixas formalizadas, pareceres, provas escritas de concursos públicos, autos de processos administrativos etc.
-Com o desenvolvimento da informática e a utilização de computadores pela Administração Pública, no armazenamento de dados, considera-se, segundo Luiz Regis Prado, que os arquivos eletrônicos também são considerados documentos na acepção jurídica.
-Portanto, o apagar desses arquivos pelo funcionário, extraviando, sonegando ou inutilizando cópias de segurança, também configura o delito do art. 314 do CP.
-Não importa o local da guarda do livro ou documento. 
-O delito pode ocorrer tanto na repartição pública quanto fora dela, exigindo-se apenas que a inutilização ou extravio de tal documento afete o interesse da Administração ou de qualquer outro serviço onde esse interesse se manifeste.
-Segundo Nelson Hungria esse interesse público pode se revestir de “simples valor histórico ou sirva apenas para expediente burocrático”.
-O elemento normativo presente objetivamente no tipo penal diz respeito a guarda do livro ou documento por funcionário público em razão do cargo.
-É, portanto, circunstância elementar do delito que o funcionário extravie, sonegue ou inutilize um livre ou documento que tenha a guarda em razão do cargo. Caso contrário, mesmo que ela seja funcionário, mas não havendo a guarda do documento em razão disso, pratica o delito do art. 337 do CP e não do art. 314.
 Consumação e Tentativa
-O crime consuma-se com a prática de uma ou mais ações previstas no núcleo do tipo, com o extravio, a sonegação ou a inutilização total ou parcial de livro ou documento de que o funcionário tem a guarda, em razão do cargo que ocupa.
-Na modalidade extraviar o delito do art. 314 do CP é crime permanente, pois sua consumação se protai no tempo, enquanto o agente mantém extraviado o livro ou documento.
-Na sonegação , o delito é instantâneo de efeito permanente, consumando-se o crime no exato momento em que é cobrada a apresentação do livro ou documento, e o agente permanece inerte, sem providenciar sua apresentação, escondendo-o.
-Na modalidade inutilizar basta o início da execução para que o delito aconteça, consumando-se, tornando-se crime de mera conduta, desde que ocorra dano efetivo ao documento ou livro, uma vez que a inutilização pode ser total ou parcial.
-
-O delito em tela admite a forma tentada, nas modalidades extraviar ou inutilizar, mas há controvérsias doutrinárias quanto à sonegação. 
-Nesse sentido, entendem Noronha, Fragoso, Mirabete, Delmanto, Regis Prado e Andreucci que, ou o funcionário exibe o livro ou documentoque lhe é exigido e não há crime, ou o sonega, quando o crime se consuma, não havendo tentativa.
Concurso de Pessoas
-O concurso de pessoas no delito de extravio, sonegação ou inutilização de livro ou documento é possível. 
-Pode-se incluir a participação de outro funcionário público ou mesmo do particular, desde que, neste último caso, o particular tenha consciência de que está cooperando com a prática de um delito praticado por funcionário público em razão do exercício do cargo que ocupa.
Distinção com outros delitos
-O delito do art. 314 refere-se a todos os documentos que estão sob a guarda da Administração Pública, com exceção de documentos judiciais ou documentos de valor probatório, cuja inutilização total ou parcial, ou sonegação praticada por advogada configura o delito do art. 356 do CP (sonegação de papel ou objeto de valor probatório).
-O crime do art. 314 é um crime praticado por funcionário público em razão do cargo que ocupa, que também difere do delito do art. 337 do CP (subtração ou inutilização de livro ou documento), que lhe é semelhante, pois; nesse caso, o sujeito ativo do delito é o particular e não o funcionário, incluído no rol dos delitos praticados por particular contra a Administração Pública.
EMPREGO IRREGULAR DE VERBAS PÚBLICAS
Art. 315 - Dar às verbas ou rendas públicas aplicação diversa da estabelecida em lei: Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) meses, ou multa. 
Conceito
-Trata-se de um crime contra a Administração Pública que ingressou no ordenamento jurídico brasileiro por influência do Código Penal Espanhol, que dispunha no seu art. 397 sobre o delito praticado por funcionário público, que dava aos fundos ou verbas públicas destinação diversa a que estavam destinados, resultando em dano e embaraço para a Administração.
-Muñoz Conde observa que essa modalidade de malversação muitas vezes decorre da modificação de situações que não puderam ser consideradas no momento oportuno, no momento em que foram estabelecidas. 
-A palavra malversação aplica-se bem ao delito em tela, e vem da palavra latina mal-versatio, que significa “investir mal”.
-É um crime praticado por funcionário público sem que, necessariamente, ocorra qualquer dano patrimonial para a Administração, visto que as verbas são aplicadas em seu interesse.
-Se houver, entretanto, desvio para beneficiar o próprio funcionário, não haverá o crime do art. 315 e sim o de peculato, disposto no art. 312 do CP.
Objeto Jurídico:
-A norma penal busca tutelar a regularidade administrativa no que respeita a regular aplicação de verbas ou rendas públicas, que não podem ficar ao livre talante do funcionário público encarregado de aplicá-las. 
-A boa ordem da Administração reclama que as verbas e rendas públicas sejam aplicadas de acordo com a destinação previamente estabelecida e não de conformidade com a vontade, preferência ou inclinação do funcionário.
-Trata-se, portanto, da norma penal defender a probidade administrativa.
-O art. 4º da Lei 8.429, de 1992, estabelece que “os agentes públicos de qualquer nível ou hierarquia são obrigados a velar pela estrita observância dos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade dos assuntos que lhe são afetos”.
-O art. 11 da citada lei estabelece o conceito de improbidade administrativa, dizendo que “constitui improbidade administrativa que atenta contra os princípios da Administração Pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade às instituições”. 
Sujeitos Ativo e Passivo
-O sujeito ativo é funcionário público que pode dar às verbas e rendas públicas destino diverso do estabelecido. 
-O funcionário que tem a sua disposição essas verbas geralmente é aquele que administra.
-Podem, portanto, praticar o delito, Presidente da República e seus ministros, governadores e seus secretários, prefeitos municipais e vereadores, diretores de entidades paraestatais etc.
-No que tange ao sujeito ativo, o particular também pode aparecer como partícipe do delito. Para tanto, reclama-se que ele tenha conhecimento da condição de funcionário e gestor público do autor do delito.
-O sujeito passivo é sempre o Estado, o ente público, representado pela União, Estados-membros, Distrito Federal, Municípios e demais pessoas relacionadas no art. 317, §1º do CP.
Elemento Objetivo do Tipo
-As condutas típicas descritas no art. 315 do CP são duas: a) emprego irregular de verbas; b) emprego irregular de rendas;
-Por verbas entende-se fundos destinados por lei orçamentária aos serviços públicos ou serviços de utilidade pública, como as dotações e subvenções.
-Rendas são todo o dinheiro percebido pela Fazenda Pública ou a este pertencente, seja qual for sua origem legal (renda tributária, renda locatícia, renda financeira etc).
-O delito consiste em dar às verbas e rendas públicas aplicação diversa da estabelecida em leis gerais ou especiais (quase sempre leis orçamentárias). 
-Trata-se de uma mudança de diretriz, proibida pela lei penal. No caso, não há qualquer intuito de lucro pessoal do funcionário ou obtenção de vantagem para si ou para terceiros. Cuida-se no art. 315 de um ato abusivo, mas não improbo.
-Em face da proibição legal, as verbas destinadas a um serviço não podem ser empregadas total ou parcialmente em outro serviço. 
-Da mesma forma, as rendas só podem ser empregadas conforme a sua destinação legal. 
-Nelson Hungria afirma que “ ainda quando as verbas ou rendas apresentem superavit, este tem de ser guardado ou recolhido aos cofres públicos (não pode ser empregado senão com permissão legal). 
-Ex: o prefeito que utiliza o dinheiro destinado à construção de creches para construir uma ponte destruída por uma enchente, comete o delito previsto no art. 315 do CP, salvo comprovada uma excludente de estado de necessidade, dada a necessidade e urgência da construção.
Elemento Subjetivo
-O crime de emprego irregular de verbas ou rendas públicas é punido exclusivamente a título de dolo, que consiste na vontade livre e consciente de aplicar verbas e rendas públicas fora de sua destinação legal.
-Basta, portanto, o dolo genérico, não se exigindo o dolo específico.
Consumação e Tentativa
-O crime consuma-se com a prática de quaisquer das ações típicas, sendo irrelevante a ocorrência ou não do resultado material; ou seja, o efetivo prejuízo para a Administração Pública.
-Fala-se apenas em tentativa quando houver perigo para regularidade administrativa uma sucessão de atos que indique desvio de aplicação da verba pública.

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