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TROTSKY, Leon. A História da Revolução Russa, v. 1

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Un1 
Testemunho 
Autentico 
Pelu pnme1 ru veL, nu h1st6na das revolu~cks 
que trunsformaram o mundo, um dos seus 
lideres de1xa para a Histona seu testemunho. E 
o fal de maneiru inteligente, ousada, dominan-
do o futo e o processo que the deram causa, 
numa analise profundae nota vel de ucuidade e 
percep~iio da •mportancia da Revolu~ao de 
Outubro de 1917 
A Hi.Ht)ria da Rel'l)/ucoo Ruua. de Leon Trots-
ky, nao constilu1 um desenrolur de fatos e da-
tas. E um livro de te e. E um hvro de mterpre-
tucao poliuca e oc•olog•ca E o hvro de um 
ob ervador e ps1c6logo profundo, que nos da o 
quadro revoluc1omirio e a personalidade dos 
homens-destino da Revolu~iio de 1917. Eo li-
vro de um homem que niio conheceu o medo 
do~ mnos e das coisas estabelec1das. 
Um hvro de lin1t1vo. "U ma obra 1mparcJal. isto 
e, raCIOnal, ObJetlva, Clentifica", no dizer do 
Mtrroir de l'llifloire. 
Por sua vez, The Time.r Literary Supplement 
co menta: 
" A 1/iwiria da Re,•oluciio Russo e descrita por 
Max l:.astman como a pnme1ra historia cientl-
lica de um grande acontecimento ... escrita por 
um homem que desempenhou um papel domi-
nante nele. tscnta no exiho mais de dez anos 
A HISTORIA DA 
REVOLU<;AO RUSSA 
Cole~ao PENSAMENTO CRITICO 
Vol. II 
Ficha catalografica 
( Preparada pelo Centro de Cataloga~io-na-fonte do 
SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ) 
T772h 
76-0609 
Trotsky, Leon, 1879-1940. 
A Hist6ria da Revolu~iio russa; tradu~ao de E. Huggins. 
2.ed. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1977. 
3v. ( Pensamento critico, v. II) 
Do original em ingles: The history of the Russian Revo-
lution 
Apendices 
Conteudo.- v.l. A queda do tzarismo.- v.2. A tentativa 
de contra-revolu~ao. - v.3. 0 triunfo dos sovietes 
I. Russia- Hist6ria- Revolu~ao, 1917-19211. Titulo II. 
Serie 
CDD- 947.084 
CDU- 947"1917/1921" 
EDITORA PAZ E TERRA 
Conse/ho Editorial 
Antonio Callado 
Celso Furtado 
Fernando Henrique Cardoso 
LEON TROTSKY 
A HIST6RIA DA 
REVOLU~AO R USSA 
TRADU~AO DE E. HUGGINS 
PRIMEIRO VOLUMB 
Paz e Terra 
© Copyright by The University of Michigan Press, 1932. 
Titulo do original em ingles: 
The History of the Russian Revolution 
Montagem da capa: Mario Roberto Correa da Silva 
( sobre original de Maria Luisa Campelo) 
Direitos desta edi~ilo adquiridos pela 
EDITORA PAZ E TERRA S.A. 
Rua Andre Cavalcanti, 86 
Rio de Janeiro, RJ, 
que se reserva a propriedade desta tradu~o. 
1977 
lmpresso no Brasil 
Printed in Brazil 
NOTA DA PRIMEIRA EDI<;AO 
Consciente da importancia hist6rica deste livro. que pela 
primeira vez se /anfa em lingua portuguesa. e com o objetivo de 
conferir-Ihe o maior apuro e criteria. dotando esta edifiio brasi/ei-
ra do me/hot texto. com notas. apendices e observafoes de tradu-
fOes estrangeiras que se fizessem necessarias. a Editora Saga Ie-
vantou o texto da edifao francesa (tradufio de Maurice Parija• 
nine com prefacio de Alfred Rosmer.- 8ditions du Seuil) e o da 
edirao em espanhol (tradufao de Andres Nin. com nota de Mateu 
Fosa e prefacio de forge Abe/ardo Ramos - Ediciones Tilcara). 
Esta edi>io brasileira tem por base a famosa edifao de Max East-
man. da Universidade de Michigan. abonada por Leon Trotsky. 
As notas de pe de pagina foram rigorosamente controladas 
e suas fontes estio registradas entre chaves. sendo que as do autor 
nio levam referenda de origem e sao remetidas por meio de nli-
meros. As demais - de Max Eastman. da edifao francesa. da edi-
filO espanhola e do tradutor - sao controladas com asterisco. 
6sta edifio contem seis apendices ( um sabre a "Revolufao 
Permanente"). re/afio de dados biograficos dos principais perso-
nagens da Russia de 17 e dos locais mais citados. glossario de ter-
mos especificos. lista e caracteristicas dos principais particlos e 
grupos politicos e indice onomastico. 
-----
Nota Sobre o Autor 
MAX EASTMAN 
E STA e a prlmelra vez que a hlst6rla clentiflea de II1Jl grande 
aeonteclmento tol escrita por um homem que nele desempenhou 
um papel dominants. 1!: a prlmeira vez que uma revolul)io fol re-
constltuida e explleada por um d08 seus lideres. como o autor es-
colheu eserever o llvro objetlvamente, falando de sl na tereelra peaaoa, 
e nio se alongando s6bre 08 seus atoa pessoals ou suas pr6prlas expe-
ri@neias, exceto quando registrad08 por outros, pareee Interessante 
dar ao leitor algum esclareeimento prellmlnar dele e do papel que 
desempenhou. 
Nas Obras completas de Lenlne, a prlmelra grande empri!sa 
editorial realizada pelo Oovemo da RU8sia Sovtetlca depola da Revo-
lul)io, foi lncluido um breve esb6Qo blografleo de todos 08 lmpor-
tantes revolueionarios mencionados por Lenine. l!iste gJ.oasario foi 
preparado pel08 hlstoriadores ofleials do Partido Bolehevtque, sob 
a responsabllldade editorial de Kamenev, um dos membros Uderes do 
seu COmite-Central. 0 paragrafo que trata de Leon Trotsky e o 
que segue: 
L.D. Trotsky• nasceu em 1881 [1879 - N. da E.]. Organfzou o• 
cfrcul08 de trabalhadorea em Nikolaev, fol e:rilado para a SllH!rla 
em 1898, fugiu logo depoiB e colabOrou 4 dlat4ncla no Iskra lo jorual 
editado por Lenlne e outros em Londres - N. da E.] Aomtlu ao 
Segundo Congresso do Partido como delegado da Unido Slberlana. 
Depoi.a do cl84o no Partido, juntou-ae aos menchevlques. Antes da 
Revolu¢o de 1905 anteclpou a sua llnlca e agora eapeclalmente 
celebre teoria da Revolug4o Permanente, aflrmando que a revolugdo 
burguesa de 1905 pasaarla diretamente a uma revolu~do soclallsta, 
que ezperimentarla a primeira de uma drle de revolu¢es naclonals. 
Detendeu esta teorla no jornal Nachalo, o 6rg4o central da tac~ao 
menchevlque, publlcado em Petersburgo de novembro a de2embro 
de 1905. Depois da prlsdo de Khrgstalev-Nosar, Trotskl/ foi elelto 
presidente do Primelro Sovlete de Deputados Operarlos de Peters-
burgo. Preso junto com o seu comite-executivo em 3 de de2embro 
de 1905, e exllado para a colOnia penal de Obdersk, escapou de IIi 
• Leo DG~h. Trot•kU· [Nome verdadetro: Leiba Br<m~teift. (N. 4a E.}] 
9 
e foi para Ionge. Trotsky escolheu Viena como resldencia e Ia pub!i-
cou um tornal popular de operartos, Pravda, para distrlbuiQdo na 
R!lasta. Rompeu com os menchevtques e tentou Jormar um grupo 
eztrapartfddrlo ..• Desae o tnlcto da guerra imperlalista assumiu uma 
nltlda polll¢o internactonallsta, tomando parte na publicaQdo de 
Nashe Slovo, em Parts, e adertndo a plataforma de Zimmerwald. Ex-
pulso cia Franga, /vi para 08 E8tad08 Un!dos. Retornando de l<l depots 
cia .11.evolu¢o de Fevereiro, /oi prlso pelos inglese8 e libertado so-
mente com a 8viicltagdo do Gov§rno Pro0i86rio, que agiu compelido 
pelo Soviete de Peter8burgo. Em Petersburgo tuntou-se a organi-
211¢o dos meohrawontsl, com o8 quais 1ntrodu2iu o Partido Bolche-
vique no Sexto Congresso em tulho de 1917 em Petersburgo. Depois 
clas Jornaclas de Julho to! prlso pelo govlrno de Kerensky e 
acusaaa "de cllrtglr uma insu"eigdo", mas logo obteve liberclade, 
aevtclo a inslstencla do proletarlado de Petersburgo. Depots que o 
Soviete t!e Petersburgo virl)U bolchevique, /Oi eleito seu prellidente, e 
com este poder organlzl)U e cllrtglu a insurreigdo de 25 de outubro . 
Fvi membra permanente do Comite-Central do Partido Comunlsta 
Russo a partir t!e 1917, e membra do Soviete do8 Comlssarlos-do-
Povo, como Comlssarto-cio-Povo das Relag/ie8 Exterlores, ate a aslli-
natura de paz de Brest-L!tovsk, sendo entdo Comtssario-do-Povo 
para a Guerra." 
Neste breve es~o, os tres pontos altos da vida de Trotsky 
estio incllcados na cleciara9io de que se tornou presldente do So-
vito de Sio Petersburgo em 1905, lsto e, o lider - desde que houve 
um nnico- da prlmelra revolu9io russa; que "organlzou e dlrigiu a 
l:nsurrel9io de outubro em 1917", o que signl!ica que sob a llderanga 
poUtlca de Lenlne, estando o pr6prioLenine oculto, oomandou as 
f6r9as na revo1u9iio bolchevique, sobre a qual este livro e essencial-
mente escrlto; e na declaragio de que se tornou Comissario-do-Povo 
para a Guerra no Governo sovietlco. Isto slgnlfica que organlzou a 
detesa da nova rep(lb!lca dOs trabalhadores, criando o Exercito Ver-
melho e condUZindo uma guerra contra as t6r9as contra-revolucio-
nartas, sustentada com munlgio e suprlmentos por t6das as grandes 
potenclas do mundo - uma guerra que toi lutada em 14 frontes 
dlterentes, com uma Jlnha de batalha de 7.000 mllhas de comprl-
mento e que toi a vit6ria sob a sua llderanga. 0 grau do poder indo-
pendente de Trotsky, como supremo-comandante durante esta 
guerra Civil, e lncllcado pelo tato de que Lenlne, o chefe do Partido 
Bolchevique e do Govi!mo, contlou-lhe uma !6lha de papel em 
branco, com sua asslnatura, para endosso de qualquer ordem ou 
co man do que Trotaky se dlspusesse a escrever nela. 
Um comentario, daqueles sltuados numa poslgao de julgar, 
s6bre cada um dessea tres pontos altos da vida de Trotsky, sera mais 
litll do que qualquer coisa que possamos dlzer. Lunacharsky, outro 
emlnente bolchevique, que se tornou Comissario da Educagao no pri-
111 
melro Governo sovletlco, escreveu o que segue sobre o trabalho de 
Trotsky na revolu~iio de 1905: "A popularldade de Trotsky entre 
o proletarlado de Petersburgo na epoca de sua prlsiio era multo 
grande, e aumentou como resultado de sua conduta her6ica e extra-
ordlnlirlamente pltoresca na corte. Eu devla dlzer que Trotsky, de 
todos os llderes soclals-democratlcos de 1905 e 1906, indubitavel-
mente revelou-se, apesar de sua juventude, o mals densamente pre-
parado; de todos, o que menos deu a lmpressiio de uma certa estrel-
te•a de emigrants que, como dlsse, prejudlcava ate mesmo Lenlne 
na epoca; mals do que qualquer outro verlflcou o que realmente 
e uma extensa Juts pela soberanla. E salu da revolu~iio com o malor 
Jucro de popularldade. Nem Lenlne, nem Martov alcan~aram qul-
quer Jucro essenclal. Plekhanov perdeu multo, em conseqiiencla de 
suas tendenclas semlcadetes. Trotsky, desde esta epoca, permaneceu 
na llnha de frente ... " 
Esta declara~io mostrara como e fantastlca a lenda de jornal, 
de que Trotsky pulara de uma obscura posl~iio de alfalate no Bronx 
para a Jlderan~ da revolu~iio russa. Trotsky fol para Nova Iorque, 
depots de banldo da Sul~a. da Fran~a e da Espanha como um perl-
goso agltador contra a guerra lmperlallsta, sendo bem-vlndo pela 
popul~ao trabalhadora eslava como o her61 de sua revolu~iio pas-
sada, um lider lnevltavel da revolu~ii.o futura. Dlrlglu lmensos 
meetings de massa, de um dos quais - o do Hlp6dromo - multos 
amerlcanos se recordam, e ganhou a vida como editor do dlarlo re-
voluclonarlo russo, Novy Mtr. 
Quanta iL segunda grande reallza~iio da vida de Trotsky, a 
organlza~o e a llderan~a da lnsurrel~ii.o de outubro de 1917, e quase 
desnecessli.rlo lntroduzlr comentar!ps, pois os fatos siio ·conhecldos 
pelo mundo lntelro. 0 lei tor flcara lnteressado, todavla, no trlbuto 
segulnte iL llderan~a de Trotsky, vlndo de quem posterlormente se 
tornou o seu mals aspero ln!mlgo politico. Escrevendo "0 Pape1 dos 
Mals Emlnentes Llderes do Partido" (Pravda, n9 241), Josef Stalin 
conflrmou o julgamento oficlal do papel de Trotsky em outubro, 
com as segulntes palavras: "Todo o trabalho de organlzacii.o pratlca 
da lnsurrel~iio fol conduzido sob a lideran~a lmedlata do Presldente 
do SOvlete de Petrogrado, Camarada Trotsky. 1!: posslvel declarar 
oom certeza que a passagem r&.pida da guarnif;B.O m1lltar parS. o lado 
do SOvlete, e a execu~iio audaclosa do trabalho do Comlte Revo;u-
cionarlo Mllltar, o Partido deve prlnclpalmente e aclma de todos ao 
Camarada Trotsky." 
A terce Ira grande reallzacii.o da vida de Trotsky, a organlza~ao 
e o comando do Exerclto Vermelho na Guerra Civil, e tambem bas-
tante conheclda, e niio preclsa de comentarlo. Ha, entretanto, uma 
passagem nas mem6rias de Maximo Gorky. na qual o escritor re-
corda o pr6prlo trlbuto de Lenlne iL reallza~ii.o de Trotsky nil. esfera 
militar. Em uma con versa entre Gorky e Lenine, a questio de certos 
rumOres de desacOrdo entre Lenine e Trotsky surglu, e Lenlne ex-
clamou: "Parece que mentem multo, e conslderiLvelmente sObre mlm 
e Trotsky!" E entao, batendo com a mao na mesa: "Mostre-me outre 
11 
homem que organlzarla quase um modiilo de exercito num linlco 
ana!" 
Acredltamos que este trabalho presente, A Hi8t6!ia da Bevo-
lu~ao Bussa, tomara o seu Iugar no regtstro da vida de Trotsky junto 
da sua proeza juvenll da Revolu~io de 1905, da sua organlz~ e 
da sua llderan~a da lnsurrel~ao de outubro, da sua crlaQao e do 
comando vltorloso do Exerclto Vermelho, como uma das supremas 
rea.IIza~oes desse espirlto e dessa vontade versatels e poderosos. 
Neste llvro, Trotsky deu esboQos de cnrater dos outros homens 
eminentes da Revolu~io Russa, mas natura.Imente delxou de dar o 
do seu pr6prlo. Para suprlr esta deflclencla, oferecemos ao leltor 
os trechos adlclonals segulntes, extraldos do estudo de Trotsky es-
crlto por A.V. Lunacharsky, o Comtssarlo Bovletlco da Educa~io -
estudo do qual ja cltamos um paragrafo. Fol publlcado em Moscou 
em 1923, num pequeno volume chamado Perjts Bevoluclonarios. 
"Prlmelro encontrel Trotsky em 1905, depols do aconteclmento 
de janeiro. Velo para Genebra, esquecl quando, e era para fa.lar 
comlgo num grande meeting convocado para dlscutlr essa tragedla. 
Trotsky era entia extraordlnil.rlamente elegante, bem dlferente de 
todos n6s, e multo bonito. Essa sua elegancla, e especlalmente uma 
especle de desculdada e poderosa manelra de falar com nio-lmporta-
com-quem, choearam-me desagradavelmente. Olhel com desa-
provaQio para esse janota, que balan~ou a perna sObre 0 joelho, e 
esereveu• apressadamente com um lapis um esquema do dlscurso lm-
provtsado que Ia fazer no meeting. Mas Trotsky fa.Iou admlravel-
ment~ bem ... 
"Encontrel-o pouco depols, na revolu~ao de 1905. &le se man-
teve separado nio sOmente de n6s, mas dos menchevlques. Seu tra-
ba.lho era pr!nclpa.lmente no Bovlete de Deputados Operarlos ... 
"Recordo quando alguem dlsse na presenQa de Lenlne: 'A es-
trela de Khrystalev calu, e o homem-forte no Bovlete agora e 
Trotsky.' Lenlne confundlu-se um pouco, e depols dlsse: 'Bern, 
Trotsky ganhou lsso com a sua lnfatlgabUidade e o seu admlravel 
trabalho.' ... 
"Uma tremenda lmperlosldade e uma especle de lnabllldade ou 
ma vontade de ser lntelramente culdadoso e atencloso com o povo, 
uma ausencla daquele charme que sempre cercou Lenlne, condena-
ram Trotsky a uma certa solldio. Recordemos que ate mesmo alguns 
dos seus ainlgos pessoals (fa.lo, e claro, apenas da esfera political 
tornaram-se depols lnlmlgos seus declarados ... 
"Para traba.lhar em grupos politicos Trotsky parecla pouco 
adaptado, mas no oceano de aconteclmentos hlst6rlcos, onde tals 
caracteristlcas pessoals perdlam a sua lmportancla, sOmente o seu 
!ado favoravel Vlnha a frente ... 
"Sempre conslderel Trotsky um grande homem. Slm, e quem 
duvldarla dlsto? Em Paris <durante a guerra) ele ja crescera pode-
roaamente aos meus olhos CQmo politico, e em seguida cresceu con-
12 
tlnuamente ou porque o cOnheci melhor. e ele mostraria melhor a 
medlda completa de sua for~a no campo mats largo que a Hist6ria 
!he ofereceu, o.u porq.ue a experlencla atual da Revolu~io e seus 
problemas o engrandeceram e ampliaram o alcance de suas asas. 
"0 trabalho de aglta~ii.o da prlmavera de 1917 niio pertence 
a tarefa dessas flguras, mas devo dlzer que, sob a lnfluencla do seu 
enorme escopo e seu deslumbrante sucesso, multas pessoas pr6xlmas 
a Trotsky flcaram mesmo lnclinadas a ver nele o genuino prlmelro 
llder da Revolu~ii.o Rossa. Asslm M.C. Uritsky, que considerava 
Trotsky com lmenso respelto, dlsse uma vez para mlm e, parece, para 
Manullsky: 'Voceve, a grande revolu~ii.o esta ai, e apesar da sua ln-
teligencla, Lenlne come~a apagar um pouco ao !ado do genlo dP 
Trotsky.' Essa avalla~io se revelou incorreta, nio porque exagerou o 
talento e a for~a de Trotsky, mas porque nessa epoca a dlmensio 
do genlo politico de Lenlne alnda niio era nltlda ... 
"Os principals dotes exterlores de Trotsky siio o seu dom ora-
torio e o seu talento como escritor. Consldero Trotsky provavel-
mente ·o malor orador de nossa epoca. Em meus dlas ouvl todos os 
grandes oradores parlamentares e populares do Soclaltsmo, e multos 
dos famosos oradores do mundo burgues, e eu terla dlflculdade em 
menclonar qualquer um deles, exceto Jaures, que coloco ao !ado de 
Trotsky. 
"Presen~a efetiva, gestlcula~io bela e ampla, rltmo poderoso 
de dlscurso, voz alta absolutamente descansada, maravllhosa solidez, 
qualldade literana da frase, abundiincla de lmagens, Ironia ardente, 
p~~.ti&Os fluente, e uma 16gica absolutamente extraordinarla, real-
mente felta de a~o em sua clareza - siio essas as qualldades do 
dlscurso de Trotsky. £le pode faiar eplgramaticamente, atirar al-
gumas flechas notavelmente bem apontadas, e pode pronunclar eases 
majestosos dlscursos politicos como ouvl noutro Iugar s6mente de 
Jaures. VI Trotsky falar por duas e mela a tres horas a uma audl-
encla absolutamente sUenclosa, parada em po!, e ouvlndo como que 
enfelti~ada por uma enorme dlsse~io politlca .... 
"Para a estrutura lnterna de Trotsky como lider, Ja dlsse, i!le 
era, na pequena escala da organlza~o do Partido, lnapto e lnexpe-
rlente. Era prejudlcado aqul pela extrema preclsio do es~ de 
sua personalldade. 
"Trotsky e esplnhoso, lmperativo. SOmente em suas rela!)6es 
com Lenine, depois de sua uniio, mostrou sempre uma tocante e 
terna condesceridencla. Com a modestia caracteristlca dos homens 
verdadelramente grandes, reconheceu a priorldade de Lenlne. 
"Como um homem politico de sabedoria, Trotsky permanece 
no mesmo nivel que oeupa como orador. E como poderia ser de outro 
modo? 0 n.als habll orador cujo dlscurso niio e llumlnado pelo pen-
samento nada mats e do que um lnutll vlrtuose, e t6da a sua ora-
t6rla e um tlnldo de clmbalo. Aquele amor de que o Ap6stolo Paulo 
fala pode niio ser necessarlo ao orador; ele pode estar chelo de 6dlo, 
maa 0 pensamento. e absolutamente necessarto .... 
ll 
"Diz-se muitas vezes que Trotsky e pessoalmente ambicioso. 
Isto e evldentemente puro absurdo. Lembro uma das multas frases 
slgnlflcatlvas dltas por Trotsky no momento em que Chernov acei-
tou urn Iugar no Governo: 'Que desprezivel ambl~iio - abandonar 
a sua posl~iio hist6rtca por um mlnlstt!rlo!' Percebe-se aqui a to-
talldade de Trotsky. Niio ha urn plngo de valdade nele ... 
"Lenlne tambt!m nao e nem um pouco amblcioso. Crelo que 
Lenine nunca ()lha para si pr6prio, nunca procura olhar no espelho 
da Hlst6rla, nunca nem mesmo pensa no que a posterldade dlroi. 
dele - slmplesmente faz o seu trabalho. Faz o seu trabalho impe-
riosamente, nio porque lhe seja doce o poder, mas porque tern 
certeza de que esta certo, e niio pode tolerar que alguem estrague 
o seu trabalho. Seu amor pelo poder cresce da sua tremenda se-
guran~a e da corre~io dos seus principios, e, se quiserem, fora de 
uma lnabilldade (multo uti! num lider politico) para ver do ponto 
de vista do seu oponente ... 
"Diferentemente dele, Trotsky multas vezes olha para s1 pro-
prio. Trotsky entesoura o seu papel hist6rico, e estaria lndubita-
velmente pronto a tazer qualquer sacrificlo pessoal, niio por qual-
quer melo que exclua o sacrificio de sua vida, a tim de permanecer 
na memoria da humanldade com o halo de um genulno lider revo-
lucionario. 0 seu amor pelo poder tern o mesmo carater do de 
Lenlne, com a dlferen~a de que ele t! freqiientemente capaz de 
cometer erros, niio tendo o instlnto quase lnfalivel de Lenine, e de 
que, sendo urn homem de temperamento colt!rlco, t! capaz, embora 
apenas temporarlamente, de se delxar cegar pela palxao, enquanto 
Lenlne, uniforme e sempre dono de si mesmo, diflcllmente terla 
um aeesso de lrrita~!l.o. 
"Nao se deve pensar, todavla, que o segundo grande lider da 
Revolu~iio Russa ceda em todos os respeltos ao seu colega; ha pon-
tos em que Trotsky lndublti>.velmente o supera: e mais brtlhante, 
e mals Claro, e mals dlnil.mlco. Lenlne adaptou-se perfeltamente . ao 
sentar na cadelra de presldente do Sovlete dos Comlssarlos-do-Povo, 
gu!ando com genlo a revolu~iio mundlal, mas obv!amente niio con-
duzlrla a tarefa' t!til.n!ca que Trotsky carregou em seus ombros, 
aquelas v!agens-relil.mpagos de um local a outro, aqueles magnificos 
dlscursos, fanfarras de comandos !nslantil.neos, aquele papel de 
continuo eletr!zador de um extremo a outro do ext!rc!to enfraque-
cido. Niio ha urn homem na Terra que pudesse substituir Trotsky Ia. 
"Quando uma revolu!tiO realmente grande chega, um grande 
povo sempre enc:ontra para cada papel um ator adequado, e um dos 
slnais da grandeza de nossa revolu~iio t! que o Partido Comunlsta ou 
os extra!u do seu proprio meio, ou foi busca-los em outros papt!is, 
e vigorosamente implantou em seu corpo muitas pessoas capazes de 
se adequarem a esta e 9.quela func;i.o governamental. 
· "Os maiores de todos os adequados aos seus papels siio os dois 
mais vigorosos dos vigorosos - Lenine e Trotsky." 
M.E. 
14 
PREFACIO 
A RUssia, ainda nos dois primeiros meses de 1917, era a monarquia 
dos Romanov. Otto meses mais tarde os bolcheviques apodera-
vam-se do leme, ~les que, no principia do ano, eram desconhecidos, 
e cujos lfderes, no momenta mesmo do acesso ao poder, joram 
inculpados de alta trai~ao. Nfio encontramos na Hist6ria outro 
exemplo de uma reviravolta tao brusca, sobretudo se nos lembrar-
mos de que se trata de uma na~fio contando com 150 milhoes de 
habitantes. Claro esta que os acontecimentos de 1917 - sob qual-
quer prisma em que os consideremos - merecem ser estudados. 
A hist6ria de uma revolugao, como t6da a Hist6ria, deve antes 
de tudo relatar os fatos que se passaram e como se passaram. Isto 
porem nfio basta. Segundo a pr6prla narrattva, e necesstirlo que 
se veta claramente por que os tatos aconteceram desta e nao de 
outra forma. Os acontecimentos nao poderiam ser conslderados como 
um encadeamento de aventuras, nem inserldos, uns ap6s outros, 
num fio de moraZ preconcebida. Devem permanecer contormes a 
sua pr6prla lei racional. t na descoberta desta lei intima que o 
autor v~ sua mlssao. 
A caracteristica mais incontestcivel da revoluqtio e a interven.-
Qdo dtreta das massas nos acontecimentos hist6rlcos. Comumente, 
o Estado, mondrquico ou democrdtico, domina a nacdo; a HistOria 
e tetta pelos especialistas da materia: monarcas, mintstros, buro-
cratas, parlamentares, jornalfstas. Todavia, nas curvas dectsivas, 
quando um velho regime se torna intolercivel ds massas, estas des-
troem as muralhas que as separam da arena polftica, derrubam 
os seus representantes tradieionais e, intervindo d8ste modo, crism 
uma posi~fio de partida para um novo regime. Seta isto um bem ou 
um mal, cabe aos moraltstas julga-lo. Quanta a nos, tomamos os 
jatos tal como se apresentam, em seu desenvolvimento objetivo. A 
hist6ria de uma revozuclio e, para n6s, inicialmente, a narrattva de 
uma irrupciio violenta das massas nos dominios onde se desenrolam 
seus pr6prios destinos. 
Numa sociedade em revolucdo, as classes entram em luta. t, 
por conseguinte, absolutamente evidente que as transjormacOes pro-
duztdas, entre o principia e o jim de uma ·revolugcio, quer nas bases 
econ6micas da sociedade, quer no substrata social das classes, nao 
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sao suflclentes para e:>:Plfcar a marcha da revolu¢<> em sf, uma 
VB2 qtte, em curto lapso de tempo, derruba as lnstltul~oes seculares, 
e cria novas para, em aegutda, derrubd-las tambl!m. A dlndmlca 
dUS acOntectmentos revOluclontiriOS edlretamente determfnada pelas 
rtip!das e intensas e apalxonadas mudan~as pslcol6gicas das classes 
constttutdas antes da revolu~lio. 
Com efelto, uma socledade nlio modi/lea as suas. institui~oes 
na medlda de auas necessldades, como um artifice renova o seu ins-
trumental. Ao contrtirio: a socledade prtltlcamente considera as ins-
titu!¢ea que a dominam como algo para sempre estabelectdo. Du-
rante uma dezena de anos, a critfca de opOsiQdO serve apenas como 
v<ilvula de eacapamento ao descontentamento das massas, o que se 
conatttut em condi~lio da establlidade do regime soctal: tal e, em 
princtplc, o valor adqulrido pela crlttca soctal-democrata. Slio ne-
cesatirias ctrcunatllnclas absolutamente excepclonais, independentes 
da oontade individual ou · dos partldos, para llbertar os descontentes 
dos estoroos do esplrito conservador e levar as massas a insurrei~lio. 
As bruacaa mudan~s de opinilio e do humor das massas, em 
epocas de revolu~o. provlim, par conseguinte, nlio da maleabllldade 
ou da tnconat/lncla do pslqutsmo humano, porem de seu pro/undo 
conaervanttamo. As tdetas e as rela~oes socials, permanecendo 
cr6nlcamente em atraao quanta tls novas clrcunstdnclas objetivaa, 
ate o momenta em que tals clrcunstlincias ae abatem como um 
catacl!sma, provocam, em epoca de revolu~lio, sobreasaltos de ideias 
e pal.1:0es que a cerebros de pollclals se apresentam slmplesmente 
como obra. de "demagogos". 
Aa massas entram em estado de revol~lio nlio com um plano 
preutabelecldo de tranaforma~6.o social, mas com o amargo senti-
menta de nlio lhea ser ma!s poaslvel tolerar o antigo regime. Apenas 
o centro dlrlgente da claase passu! um programa pallttco, o qual, 
entretanto, prevlaa ser conttrmado pelos acontectmentos e aprovado 
peiGs massas. 0 processus politico essenctal de uma revolu¢<> estti 
prec!samente no tato de que a classe toma conactlincta dos proble-
71Z41 apresentados pela crf.se social e de que, ainda, as mas.sas se 
orienta.m, ativamente, segundo o m£todo das aproximaQOes sucessi-
vas. As dlversas etapas do processo revoluclonariO, consolldadas pela 
aubatitui~lio de alguns parttdos por outros mats extremlstas, tradu-
zem o impulso sempre crescente das massas para a esquerda, ate 
que late tmpulso se quebra de encontro aos obstticulos materials. 
C~a entlio a rea~lio: deaencantos em certos metos da closse revo-
luctondria, multtpltca~6.o do n!lmero de indiferentes e, em seguida, 
conaoltd~o das f6r~as contra-revoluctontirtas. 8ste tot, pelo menos, 
o esquema das ant!gas revo1u9iies. 
£ sOmente atraves do estudo do processus pOlitico nas massas 
que se pode compreender o papel dos partidos e dos l!deres que 
n4o temoa a menor lnten91i0 de !gnorar. Constttuem um elemento 
nlio aut6nomo do processus, porem multo important•. sem organt-
zfl9{lo dlrigente, a energla das massas se volattllzarla como o VallOT 
n4o encerrado em caldelras com bombas de ptatlio. 0 movlmento, 
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entretanto, nao provem nem da caldeira nem do pistao, porem, ao 
cootrt!rio, do vapor. 
As di/iculdades encontradas quando se estuda as modijica-
~lies da consciencia das massas em epoca de reval~ao, sao total-
mente evidentes. As classes oprimidas tazem a Hist6ria nas ft!bricas, 
nos quartets, nos campos, e, as da cjdade, nas ruas. NO.o tem entre-
tante o hdl>ito de anotar, por escrito, o que fazem. Nos periodos 
em que as paixoes socials atingem a mats alta tensao nao ht! senao 
um Iugar insignijicante para a contempla~iio e as des~oes. TOdas 
as musas, inclusive a musa plel>f!ia do jornallsmo, apesar de apre-
sentar os flancos s6lidos, encontram dijiculdades para viver em 
tempo de revoiu~ao. Mas, apesar dlsso, a situa~ao do historiador 
na• e de torma alguma desesperadora. As anota~es sao incomple-
tas, dlsparatadas, for,uitas. Mas, d luz dos acontecimentos, eotes 
fragmentos permitem, muitas vezes, adivinhar a direQ<io e o ritmo 
do processo sul>jacente. Bem ou mal um partido revoluciont!rlo !>a-
seta " su.. tt!tica na aprecia~ao das modifiea96es que se operam 
na consciencia das massas. 0 percurso hist6rico do l>olchevlsmo 
demonstra que esta estlmativa, pelo menos em l>ruto, e reallztivel. 
POT que, enttio, o que era acessfvel a um politico revoluciondrio 
no torveltnho da !uta se tornaria impassive!, retrospectivamente, 
para um hlstoriador? 
Os processus que se produzem na consciencta etas massas ndo 
sao, entretanto, nem autOnomos nem independentes. Embora desa-
gradando aos idealistas e eclf!ticos, a consctencla das massas e, 
todavia, determinada pelas condiQ6es gerais de exlstencia. Nas 
circunsttlnclas historicas da torma9ao da Russia, com sua economia, 
suas classes, seu poder de Estado, assim como na influencia scil>re 
ela exercida pelas potencias estrangeiras, deviam estar inseridas 
as premlssas da Revolu~iio de Feve1"eiro e da sua sul>stituta - a 
ds Outul>ro. Tanto quanta poB!a parecer particularmente enigmcitico 
que um pais atrasado tenha sido o prlmelro a Zevar o proletariado 
ao f)Oder, e necessdrto, preltminarmente, procurar a chave dtste 
enigma nas pecullarldades de tal pais, isto e, naquUo que o dife-
rencia dos outros. 
As particularidades hist6ricas da Russia e o peso especifico 
de tats particulartdades estiio caracterizados nos primeiros capituloa 
dllste llvro, que contilm uma exposi~/io sucinta do desenvolvimento 
da sociedade russa e de suas t6rt;as internas. Esperamos que a tne-
vitdvel esquematuacao destes capitulos nlio desantme o leitor. Na 
contfnua9do da obra encontrarti as mesma s j6rt;as sociais em plena 
agdo. 
:Rste trabalho nao estd, absolutamente, baseado em recorda-
~· pessoais. A circunsttlncia de ter o autor par.ticipado dos acon-
tecimentos ndo o exime do dever de basear sua narrativa em 
documentos rtgorosamente controlados. 0 autor tala de si, sempre 
que ol>rigado pela marcha dos aconteclme1!tos, na tercetra pessoa. 
E isto nao e apenas uma forma litert!ria: o tom sul>jetivo, inevitavel 
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em autobiograjla ou em mem6rias, serta inadmfssivel num estudo 
niBtortco. 
0 jato de haver parttclpado da !uta torna-lhe, naturalmente, 
mats jtici! compreender nlio somente a psicolagla dos atO.es, indi-
viduos e coletividades como, tambem, a correla~lio Intima dos acon-
tecimentos. Esta vanlagem pode javorecer os resu!lados positlvos, 
entretanto com uma condi~lio: seta nas pequenas como nas grande& 
cotsas, seja na exposi~lio do& jatos como em rel~ aos mottvos 
determtnantes e aos estados de oPtnilio - a de nlio lan~ar mao ape-
nas do testemunho de sua memOria. 0 autor estima que, no quanta 
!he di2 respeito, cumprtu tal condi~lio. 
Ainda uma questlio - a da posi~lio politica do autor que, 
em sua qualidade de hfstortador, se mantt!m nos pontos de viSta 
que eram os seus como miUtante nos acontecfmentos. 0 leltor, no 
entanto, nlio estti obrtgado a parttclpar da oPtnilio polltica do autor, 
posi~lio que nlio tem motivo algum para dissimu!ar. Tem o leitor, 
porem, o direito de exig!r que um trabalho hlst6rico nlio constitua 
a apologia de uma post~lio politica, mas sim uma exposi~ao projun-
damente jundamentada do verdadeiro processus da Bevol~ao. Um 
trabalho hfst6rtco s6 a!can~a plenamente a sua jinalidade quando 
os acontectmentos se desenrolam pdgtna por pdgtna, naturalmente, 
e na medtda em que sdo necessdrtos. 
Sera por isso indispenstivel intervir o que se chama "a impar-
ctal!dade" do histortador? Ninguem ate ho:le explicou claramente 
em que consiste esta tmparcialidade. Citou-se muttas vezes certo 
ajorisma de Clemenceau sabre a necessidade de ser uma revolu¢o 
estudada "em bloco"; tsto ndo passa de espirituoso subterfti.gi.o: 
como nos podertamos declarar partidtirto de um todo que traz, em 
sua essencta, a div!slio? A jrase de Clemenceau jot ditada, em parte, 
por um certo pudor que ele sentia dlante dos seus antepassados 
demastadamente resolutos e, em parte atnda, pelo mal-estar do cles-
cendentedlante das sombras daqueles antepassados. 
Um dos historiadores reacionarios e, por conseguinte, multo 
apreclado da Fran~a contempordnea, o Sr. L. Madelin, • e que na 
qualidade de homem de saliio tanto caluntou a Grande Revolu~iio 
- vale dizer, o nascimento da na9do trancesa - ajtrma que •~o 
h.fstoriador deve sublr nas muralhas de uma cldade amea~ada e, 
de ld, observar tanto os sitiantes como os sitiados". Somente assim, 
segundo ele, chegar-se-ia d "iusti~a que conctlia". Os trabalhos do 
Sr. Madelin provam entretanto que, se escalou as muralhaB que 
separavam os dots campos, o tez. apenas na qualtdade de esclarece-
dor da rea~ao. Fe!i2mente trata-se, no seu caso, ttio-somente, dos 
campos de batalha do passado: em tempo de revolu¢o e extrema-
mente pertgoso manter-se s6bre as muralhas. Alitis, na hora do 
perigo, os pontifices de uma "justtQa conciltadora'' permanecem em 
casa quase sempre, esperando ver para que !lido se decide a vitOrla. 
• LOU'-! MGdeUn - Hlstorlador franc68 (1871·1956), [N. 4o T.] 
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0 leitor honesto e dotado de sensa critico niio .•ente a neces-
sidade de uma imparclalidade falaciosa que !he apresente a ta~a 
do espirito conclliador saturada de uma boa dose de veneno, de 
um residua de 6dio reaciontirio, mas necessita, sim, da boa te clen-
tifica, que se ap6ia no estudo honesto dos tatos, na demonstra~iio 
das relaQoes reais entre os tatos, na manifesta~iio do que de racional 
existe no desenvolvimento deles, para exprimir suas simpatias ou 
antipatias, jrancas e ntio mascaradas. SOmente assim e possivel a 
objetividade hist6rica que passa a ser su/iclente, porquanto verifi-
ca<la e comprovada niio pelas boas inten~6es <lo historia<lor - <Ia 
qual, alias, ele dti garantia - mas pela revela~iio da lei intima 
que rege o processo historico. 
As FoNTES deste trabalho toram numerosas publica~6es pe-
rt6dicas, ;ornats e revtstas, mem6rtas e atas de processos, azem de 
outros documentos, alguns manuscritos, a maior parte porem pu-
blicada pelo Instituto Historico da Historia da Revolu~iio, em Moscou 
e Leningrado. Julgamos supertluo incZuir no texto referenclas que 
pudessem, no minima, perturbar o leitor. Dentre os livros hist6ricos 
que se caracterizam como estudo de conjunto, utilizamos princlpal-
mente os dais tomos dos Ensalos siibre a Hlst<\rla da Revolu~iio de 
Outubro rMoscou-!.eningrado, 1927!. Rates ensaios, re<ligidos por di-
versos autores, niio tem todos igual valor, mas contem uma vasta 
documenta~iio sabre 08 tatos. 
As datas registradas no presente trabalho obedecem d velha 
torma, isto e, estiio atrasadas de treze dlas em rela~iio ao calendtirio 
universal, atualmente adotado pelos sovtetes. Viu-se o autor tor~ado 
a seguir o calendtirio em usa na epoca da Revolu~iio. Niio seria 
di/icil, e verdade, transpor as datas segun<lo o calendtirio moderno. 
Esta opera~do, porem, eliminando certas <lificuldades, criaria outras 
mais graves. A queda da Monarquia inscreveu-se, na Hist6ria, sob 
o nome de "Revolu¢o de Fevereiro,. No entanto, de ac6rdo com 
o calendtirio ocidental, teve lugar em mar90. Determinada manijes-
ta~iio armada contra a politica imperialista do Governo Provis6rio 
tot asstnalada na Hist6ria como 1'Jornadas de Abril" quando, se-
gun<lo o calen<lario ocidental, aconteceu em maio. Niio nos detendo 
em outros acontectmentos e datas tntermedidrias, chamamos a 
aten~iio para o tato de que a Revolu~iio de Outubro, para a Europa, 
ocorreu em novembro. Como se pode ver, o pr6prto calendd1io tomou 
as cOres dos acontecimentos e ndo e possivel ao htstoriador desem-
bara~ar-se ,Jas etemerides revoluclontirias por meio de simples ope-
ra~iio aritmetica. Queira o leitor recordar-se de que, antes <le su-
primir o calend<irio bizantino, necessitou a Revolu~iio de abolir as 
institui~6es que se empenhavam em conserva-Zo. 
L. TROTSKY 
Prir.ldpo, l4 de novembro de 1930 
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-..,..,.. 
Primeiro Volume 
A QUEDA DO TZARISMO 
' 
' 
Capitulo I 
PECULIARIDADES DO DESENVOL VIMENTO 
DA ROSSIA 
0 TRA~o essenclal e o mals constante da Hlst6ria da Rilssia e a 
Jentid:io com que o pais se desenvolveu, apresentando como 
conseqiiencia uma economia atrasada, uma estrutura social priml-
tiva e baixo nivel cultural. 
A popula~ao da gigantesca planicie, com seu clima rigoroso, 
exposta ao vento leste e as mlgra~6es asil1ticas, estava destinada, 
pela propria natureza, a uma prolongada estagna~ao. A !uta contra 
os nomades durou quase ate o flm do seculo XVII. E, ainda hoje, 
niio encontrou fim a !uta contra os ventos portadores de espessa 
nebllna, no inverno, e da seca, no estio. A agricultura - base de 
todo. o desenvolvlmento - progredia de maneira extensiva: no Norte 
cortavam-se e quelmavam-se florestas; no Sul desorgantzavam-se 
as estepes vlrgens. Tomava-se posse da natureza em extensiio e niio 
em profundldade. 
Na epoca em que OS barbaros ocidentais Se instalavam sobre 
as ruinas da civl!IZa~iio romana e utlllzavam tanto pedras antigas 
como material de constru~iio, os eslavos do Oriente, em suas in6spi-
tas planicles, nada encontravam para herdar: o nivel de seus pre-
decessores era ainda mais baixo que o seu. Os povos da Europa 
Ocldental, cedo bloqueados em suas fronteiras naturals, criavam as 
aglomera~oes economlcas e culturala das cidades industrials. A po-
pulagio da planicie oriental, tio logo se sentia comprlmida, em-
brenhava-se nas florestas ou entio emlgrava para a periferia, nas 
estepes. Os elementos camponeses mats dotados de iniciativa e mais 
empreendedores transformavam-se, no !ado oeste, em cidadiios, ar-
tifices, mercadores. No leste, certos elementos natives, audaclosos, 
estabeleceram-se como oomerciantes, porem em maior nlimero flze-
ram-se cossacos, guardas-tronteiras .au colonos .. 0 processus de di-
terenciagio social, intenso no ocidente, retardava-se no oriente e 
se dlfundia por expansiio. "0 tzar de Mosc6via - apesar de cristiio 
- governa um povo de espirlto pregul~oso", escrevla Vlco, contem-
porfmeo de Pedro I. 0 espirlto "pregul~oso" dos moscovitas era 
um reflexo do ritmo Iento da evolu~iio economlca, das rela~oes amor-
tas entre as classes, da indlg6ncla de sua hlat6ria Interior. 
As civlllza~6es antlgas do Eglto, da lndia e da China tlnham 
um carater suflclentemente aut6nomo e, por mediocres que fossem 
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as suas possibilidades de produgiio, dlspuseram de tempo bastante 
para elaborar relagoes socials tao bern acabadas em seus detalhes 
quanta os trabalhos dos artifices desses palses. Tanto pela sua 
hlst<irla quanta pela vida social, e niio somente devldo iL sua poslgiio 
geograflca, a Russia ocupava, entre a Europa e a Asia, uma sltuagao 
lntermedlarla. Diferenciava-se do Ocldente, europeu, mas tambem 
diferla do Oriente, asiatlco, embora aproximando-se em alguns pe-
riodos, em v&.rios as~tos, ora de um ora de outro. 0 Oriente 1mp6s 
o jugo tartaro, que entrou como elemento lmportante na ediflcagao 
do Estado russo. 0 Ocldente era urn lnlmigo alnda mals temivel 
que o Oriente, ao mesmo tempo que urn mestre. Nao fol passive! 
a Russia formar-se segundo os mcldes do Oriente, compellda como 
estava em acomodar-se II pressiio milltar e economica do Ocidente. 
A exlstencia do teudallsmo na RliSsia, negada pelos antigos hlstorla-
dores, pode ser considerada como lncontestilvelmente demonstrada 
pelos estudos mals recentes. Alnda melhor: os elementos essenclals 
do feudallsmo na Rlissia eram os mesmos exlstentes no Ocldente. 
0 fato de terem sldo necessarlas longas dlscussaes cientiflcas para 
demonstrar a exlstencla de uma epoca feudal na Russia trouxe 
tambem a prova de que o feudallsmo russo nasceu prematuramente 
e que revelava formas lndeflnidas e pobres quanta aos monumentos 
de sua cultura. 
Urn pais atrasado assimlla as conqulstas materials e ldeol()gl-
cas dos paises adlantados. Niio slgnlflca lsto, porem, que slga servil-
menteestes palses, reproduzlndo t<idas as etapas de seu passado. 
A teorla da repetlgiio dos clclos hlst<irlcos - a de Vico e, mais 
tarde, de seus dlscipulos - baseia-se na observagao dos clc1os per-
corrldos pelas velhas estruturas pre-capltallstas e, parclalmente, 
sabre as prlmelras experlenclas do desenvolvlmento capltallsta. 0 
carater provincial e transit6rlo de todo processus admite, efetlva-
mente, certas repet19oes das rases culturals em melo amblente sem-
pre novos. o capitallsmo, no entanto, marca urn progresso sObre 
tals condlgaes. Preparou e, em certo sentldo, reallzou a unlversali-
dade e a permanencla do desenvolvlmento da humanldade. Flea, 
asslm, excluida a posslbilldade de uma repetl9iio das formas de 
desenvolvimento em diversas na90es. Na contingencia de ser reboea-
do pelos palses adlantados, urn pais atrasado niio se conforma 
com a ordem de sucessiio: o privileglo de uma sltuagao hlstilrlca-
mente atrasada - e este prlvileglo exlste - autorlza urn povo ou, 
mais exatamente, o for9a a assimilar todo o realtzacto, antes do 
prazo prevlsto, passando por clma de uma aerie de etapas lnterme-
di&.rias. Renunciam os selvagens ao area e a flecha e tomam imedla-
tamente o fuzil, sem que necessltem percorrer as dlstiinclas que, 
no passado, separaram estas diferentes armas. Os europeus que 
colonlzaram a America niio recome9aram all a Hlst<irla desde seu 
lniclo. Se a Alemanha e os Estados Unldos ultrapassaram economl-
camente a Inglaterra, lsso se deveu exatamente ao atraso na evolu-
9iiO capltallsta daqueles dols paises. Em compensa~iio, a anarquia 
conservadora que relna na indUstria carbonifera brltinlca, como 
?4 
no cerebro de Mac Donald e seus amigos, ti o resgate de um passa-
. do durante o qual a Inglaterra - e por multos an~s - manteve 
a hegemonia do capitallsmo. 0 desenvolvimento de uma na~io his-
tbricamente atrasada conduz, necess&.riamente, a uma combin~ao 
original das diversas rases do processus hlst6rico. A. 6rbita descrlta 
toma, em seu conjunto, urn carater Irregular, complexo, comblnado. 
A posslbllldade de superar OS degraus lntermedbirlos nio e, 
esta claro, absolute; realmente, esta llmltada pelas capaddades 
eoonomicas e culturais do pais. Urn pais atrasado rreqiientemente 
rebalxa as reallza~es que toma de emprestlmo ao exterior para 
adapta-las a sua propria cultura prlmltiva. 0 proprio processo de 
asslmlla~ao apresenta, neste caso, urn carater contradit6rio. Foi 
este o motivo pelo qual, na RUssia, a lntrodu~io de elementos da 
Ucnica e do saber ocidentais e, sobretudo, da arte mllltar e da 
manuratura, sob Pedro I, agravou a lei de servidiio, na medlda que 
representava a forma essenclal da organlza~io do traba!M. 0 ar-
mamento segundo os moldes europeus e os emprestlmos feitos a 
Europa, nos mesmos moldes - lnoontestaveis resultados de uma 
cultura mais adiantada - conduzlram ao rortalecimento do tzarls-
mo que, de seu !ado, rerreava o desenvolvlmento do pais. 
As leis da Hist6ria nada tem em comum o<:m os sistemas 
pedantescos. A deslgualdade do ritmo, que e a lei mais geral do 
processus hist6rlco, evidencla-se com maior vigor e complexidade 
nos destinos dos paises atrasados. Sob o chlcote das necessldades 
extemas, a vida retardatarla v~-se na contlng~ncia de avan~ar aos 
aaltos. Desta lei universal da deslgualdade dos rttmos decorre outra 
lei que, por falta de denomina~io aproprlada, chamaremos de lei 
do tte•envolvimento cOmbinatlo, que signlfica aproxlma~io das di· 
VOJ:sas etapas, comblna~iio das rases direrenciadas, amalgama das 
formas arcaicas com as mals modernas. Sem esta lei, t~mada, bem 
entendldo, em todo o sen conjunto material, e lmposoivel compreen-
der a hlat6rla da Rllssia, COmt> em geral a de todos os paises cha· 
mados a civlllza~iio em segunda, tercelra ou declma llnha. 
Sob a pressl.o da Europa mats rica, o Estado russo, em eom-
para~iio com o Ocldente, absorvla uma parte proporclonal bem 
maJor da rtqueza pUblica, e, dt!sta forma, nio apenas condenava 
as massas populares a uma redobrada mlserla, mas alnda enfra-
quecla as bases das classes possuldoras. Tendo porem o Estado 
necessldade do apoio destas Ultlmas, apressava e regulamentava 
sua rorma~iio. Como resultado, as classes prtvllegiadas, burocratlza-
das, jamals consegulram erguer-se em t6da a sua pujan~a. e o 
Estado russo niio res senilo aproxlmar-se alnda mals dos regimes 
desp6tlcos da Asia. A autocracia blzantlna, adotada of!cialmente 
pelos tzares moscovltas no lnlcio do seculo XVI, submeteu os gran-
des senhores reudals boiardos com o auxlllo da nobreza, e doml-
nou-os transformando em servos a classe camponesa e eriglndo-se 
por tals mel Oil em monarqula absoluta: o absolutlamo de Siio Pe-
teroburgo. 0 atraso no conJunto do processo esta suf!clentemente 
caracterlzado pelo rato de o dlrelto de servldiio, surglndo em fins 
zs 
do seculo XVI, estabelecldo no seculo XVII, ter atlngldo o pleno 
desenvolvlmento no seculo XVIII, sendo juridlcamente abolldo 
apenas em 1861. 
0 clero, ap6s a nobreza, desempenhou, na formaQ3.o da auto .. 
cracla tzarlsta, urn papel bastante apreclavel, se bern que apenas 
de urn funclonallsmo. A Igrej a nao alcan~ou na Russia a for~a 
domlnadora ldentlca a do Catollclsmo no Ocidente; contentou-se 
com a condl~iio de domestlcldade esplrltual ao !ado dos autocratas, 
do que tlrava merlto de humlldade. Os blspos e arceblspos s6 dls-
punham de certo poder, a titulo de subalternos da autcrldade civll. 
Os Patriarcas eram substltuidos sempre que um novo tzar assumta 
o poder. Quando a capital se estabeleceu em Petersburgo, a depen-
dencia da Igreja ao Estado tornou-se alnda mals servil. Duzentos 
mil padres seculares e monjes integraram parte da bur~cracla, 
especie de policia de confesslonarlo. Em retrlbul~ao, o monop6llo 
do clero ortodoxo nas questoes de fe, suas terras e seus rendlmen-
006 estava sob a pro~iio da politlca geral. 
0 eslavofillsmo, messianismo de um pais atrasado, ediflcava 
sua filosofla s6bre a ldela de que o povo russo e sua Igrej a eram 
profundamente democratas, enquanto que a Russia oflclal era uma 
burocracla alema, lmplantada por Pedro I. Marx ~bservou s6bre 
este assunto: "Fol asslm que os asnos da TeutiJnla flzeram recalr 
a responsabllldade do despotlsmo de Frederico II s6bre os franceses, 
como se escravos atrasadooB nio tlvessem sempre necessidade do 
auxillo de outros escravos mals clvllizados para o seu indlspensavel 
aprendlzado." Esta breve observa~iio atlnge ate o fundo nao apenas 
a velha fllooofla eslav6fila como tambem tOdas as descobertas con-
temporlneas dos "raclstas". 
A indlgencla, tra~o caracteristlco niio somente do feuda!lsmo 
russo porem de tiJda a historla da antlga RUssia, encontrou a sua 
mats trlste expressio na falta de cidades do verdadeiro tlpo me-
dieval, CO·mo centres de artifices e mereadores. 0 artesanato, na 
Russia, niio consegulu desvlncular-se da agrlcultura e conservou o 
carater de pequenas industrias locals. As cldades russas de outrora 
eram centros comercials, milltares, admtnistrattvos, centros per-
tanto de consumo e niio de produ~iio. Novgorod • mesmo, que fazla 
parte da Llga Hanseatlca e que jamals conhecera o jugo tartaro, 
era uma cldade comerclal e niio Industrial. II: verdade que as peque-
nas lnd1istrias rurals, espalhadas pelas dlversas regloes do pais, 
exlglam os servl~os lntermedlarlos de um comercio bastante extenso. 
Os mercad~res nomades, porem, nio podlam de modo algum ocupar, 
na vida social, urn Iugar ldentlco ao ocupado no Ocldente pela 
pequena e media burguesla das corpora~es de artifices, de comer-
ciantes e Industrials, burguesla que estava indissoluvelmente Jlgada 
a periferia rural. Alem dlsso, as principals vias de comunica~io do 
comercio russo conduzlam ao estrangelro, garantindo, desde seculos 
• RiJlnakl-Novgorod puaou depot. a cbamar..ae BtaHngrado e hoJe ee chama 
Volgogrado. IN. del E.] 
26remotos, um papel dlrlgente ao capital comercial externo e empres-
tando um carater semicolonlal a qualquer movlmento de negOclos 
nos quais o mercador rusoo servia apenas de intermediarlo entre 
BS cldades do Ocidente e as aldeias russas. Tals rela~es economicas 
continuaram a se desenvolver na epoca do capitallsmo russo e en-
contraram sua mais alta expressiio na guerra imperialista. 
A lnslgnlflcincia das cidades russas contrlbulu ao maximo para 
a formaQiio de um Estado de tipo asiatica, e excluia em particular 
a posslbllldade de uma refonp.a religiosa, isto e, a substltu!Qiio 
da ortodoxia burocratica feudal por outra forma· de cristianlsmo 
mals moderno, adaptado is necessidades da sociedade burguesa. A 
!uta contra a Igreja do Estado niio foi alem da formaQiio de seitas 
de camponeses, das quais a mals poderosa foi a oos "Veillos 
Crentes". 
Quinze anos antes da grande RevoluQiio Francesa rebentou, na 
RUssia, um movlmento de cossacos, de camponeses e de servos ope-
rarlos no Ural, denominado Revolta de Pugachev. Que faltou para 
que este. terrlvel movlmento popular se transformasse em revoiu-
~iio? Urn Tercelro Estad,o. Na !alta de uma democracia Indus-
trial nas cidades, a guerra camponesa niio se poderla transformar 
em revolu9iio asslm ocmo as seitas religlosas das aldeias niio pu-
deram atingir a Reforms. 0 resultado da Revolta de Pugachev fol, 
contririamente, consegulr consolidar o absolutlsmo burocratlco que 
proteg!a cs lnteresses da nobreza, guardia que demonstrou nova-
mente o quanto valla em hora de perlgo. 
A europelzaQiio do pals, inlclada quanto a fc>rma sob Pedro I, 
transformou-se dia a dlf, no secub segulnte, numa necessldade 
para a classe dirlgente, lsto e, para a nobreza. Em 1825 os lnte-
lectUals perteneentes a casta, dando expressiio polltiea a esta ne-
cessldade, chegariam a uma eonsplraQiiO mllitar cuja flnalidade era 
restrlnglr a autoeracia. Impulslonados pela burguesla europela que 
se deaenvolvla, os elementos mala avan9ados da nobreza tentavam 
suprlr o Tereelro Estado que faltava. Entretanto, era lntenQiio de-
lea comblnar o regime liberal com as bases da dominaQio de casta 
e foi por eate motive que temeram sublevar os campcneses. Nio 
e de admlrar, portanto, que esta conjuraQiio tenha sldo obra de 
um grupo brllhante, J)Oi'em ISOlado, de oficiais sacrlficados sem 
quase combater. Tal e o sentldo da revolta dos decembrlstas. 
Os nobres, proprietirios de fabricas, foram os prlmelros, em 
suas castas, a oplnar pelo salirlo livre em substitu!Qio ao trabalho 
ile servo. Eram lgualmente !evades a tala medldas devldo a ex-
PDrt&9io crescente do trlgo russo. Em 1861 a burocracla nobre, 
apolando-se s6bre os proprietaries liberals, efetuou a reforms cam-
ponesa. Impotente, o liberallsmo burgues asslstiu a esta operaQio 
reduzldo a um c6ro dooU. Inutll dlzer que o tzarlsmo resolveu o 
problema essenclal da RUssia - a questiio agrarla - de f~·rma 
alnda mals ladra e fraudulenta do que a empregada pela monar-
qula prusslana, nos dez anos que se segulram, a flm de resolver o 
17 
problema essencial da Alemanba ~ a unlflcac;iio naclonal. Uma 
classe tomar a sl o encargo de resolver os problemas de outra clas-
se t! uma das multas combtnac;oes proprlas de palses atrasados. 
A lei do desenvolvlmento comblnado estil demonstrada como 
sendo a mats tncontestilvel na hlst6ria e no carater da lnddstrla 
russa. Tardlamente nasclda, essa industria niio percorreu, desde o 
lnlcio, 0 clclo dos paises adlantados, port!m neles se lncorporou, 
adaptando ao seu estado atrasado as conqulstas mats modemas. Be 
a evolu~iio economica da RUssia, em conjunto, passou por clma de 
periodos do artesanato corporatlvo e de manufatura, multos de 
seus ramos industrials pularam parcialmente alguma etapa da tt!c-
nlca, que exlgiram, no Ocldente, dezenas de anos. Como conseqiien-
cia, a Industria russa desenvolveu-se em certos perlodos com ex-
trema rapidez. Entre a prlmelra revoluciio e a guerra a produ~ao 
· Industrial da RUssia quase dobrou. Julgaram alguns hlstorladores 
russos ser isto motlvo sutlclente para concluir que era necessaria 
abandonar a Jenda de um pais atrasado e de Iento progresso do 
.Pals. ' Na realidade, a posslbllidade de um progresso asslm rapldo 
era precis!lmente determlnada pelo estado atrasado do pais, que, ln-
fellzmente, niio apenas subslstlu att! a llquldaciio do antigo regime 
mas que, como sua heranca, perdura att! hoje. 
0 mensurador esB!!JICisl do nlvel econ6mico de uma naciio t! a 
produtlvldade do trabalho, o qual, por sua vez, depende do peso 
especiflco da Industria na economla geral do pais. Nas vt!speras 
da guerra, quando a RUssia dos tzares alcancara o apogeu de sua 
prosperidade, a renda publica per capita era olto a dez vt!ses In-
ferior a dos Eotados Unldos, o que niio surpreende se conslderar-
mos que 4/5 da populaciio obrelra russa, trabalhando por s1 mes-
ma, compunham-se de camponeses, enquanto que, nos Eotados Unl-
dos, a propor~iio era de um campon&s para 2,5 operirlos Industri-
als. Acrescentemos que nas vesperas da guerra a RUssia possula 
400 metros de· llnba tt!rrea para cada 100 km•, enquanto que, na 
AJemanlla, esta proporcao era de 11,7 km para a mesma extensiio 
e, na Austria-Hungrta, era de 7 km. Os demais coeflclentes compa-
ratlvos estiio na mesma pro~. 
Como J or. dlssemos, e preclsamente no domlnlo da economla que 
a lei de evolu~iio comblnada se manlfesta com malor f6r~a. En-
quanto que a agricultura camponesa, att! a Revolu~. em sua malor 
parte, permanecla quase no mesmo nlvel do st!eulo xvn, a Indus-
tria russa, quanto a tt!cnlca e sua estrutura capltallsta, encontra-
va-se no mesmo nlvel dos paises adlantados e, mesmo sob alguns as-
pectos, os ultrapassava. Em 1914 as pequenas lnddstrlas com monos 
de 100 oper(lrloa representavam, nos Eotados Unldos, 35% do efetlvo 
total doa oper(lrlos de lndUstrias, ao paaso que na Rdssla a propor-
~ao era de 17,8%. Admltlndo-se um peso especiflco aproxlmadamen-
te lgual para as empresas mt!dlas e grandes, ocupando de 100 a mU 
1, A atlrm.a~ 6 dO Profeleor Jr. N. PoJao•*'· ver Apbdlce I. 
21 
operlirlos, as empresas gigantes,. que ocupavam mais de mil opera-
rios cada uma, empregayam, nos Estados Unidos, apenas 17,8 da to-
talklade dos operarlos, enquar.to que na Russia a propor~ao era 
de 41,4%. Nas principals regloes Industrials a percentagem era aln-
da mala elevada: na regliio de Petrogrado, 44,4%; na reglao de Mos-
cou, 57,3%. Chegaremos aos mesmos resUltados se estabelecermos 
uma compara~ao entre a Industria russa e a IndUstria brttBnlca ou 
a alemi. l!:ste fato apresentado pela prlmelra vez por ncia em 1908, 
d1tiellmente poderia ser lnsertdo na representa~ao banal que nos 
dio de uma economla atrasada na Rllssla. Entretanto, nio nega o 
cari.ter retardatarlo do pais, oferecendo apenas um complemento 
dialetlco. 
A fusao do capital Industrial com o capital bancarkl efetuou-
se na Russia, de forma tao Integral como talvez nao se tenha vlato 
semelhante em qualquer outro pals. A IndUstria russa, porem, au-
bordlnando-se aos bancos, demonatrava efetlvamente sua aubmla-
sio ao mercado monetarto da Europa Ocldental. A lndllstrla peaa-
da (metals, carvio, petr6leo) estava quase lntelramente sob o con-
trille financlador estrangetro que crlara, na Russia, para uso pro-
prio uma rede de bancos auxlllares e lntermedlarlos. A IndUstria 
!eve seguia o mesmo camlnho. Se os estrangelros possuiam, no total, 
mats ou menos 40% de todos os capitals lnvestldos na RUssia, esta 
percentagem nos ramos principals da Industria era bern mals ele-
vada. Pode-se aflrmar, sem recelo de exag~ro. que o centro de con-
tr61e das a~6es emltldas pelos bancos, pelas fabrtcas e manufaturas 
russas encontrava-se no estrangelro e a partlclpa~io da Inglaterra, 
da Fran~a e da Belglca no capital atlngla o dobro da partlclpa-
~io alema. 
As cond1~6es em que se organlzoua lndllstria russa, a pr6pr1a 
estrutura desta Industria, determtnaram o carater social da bur-
guesta do pais e sua flstonomta politlca. A forte concentra~lio da In-
dustria demonstra por s1 mesma que entre as esferas dtrlgentes do 
capltallsmo e as massas populares n:i-::) existia hierarqula interme-
d!Arla. A 1sto se soma o fato de serem as mats tmportantes em~­
sas industrials, bancartas e de transportes proprledade de estran-
geiros, que nao sOmente auferfam Iucros s6bre a RUssia mas alnda 
por clma fortaleclam a pr6pria 1nflu~nc1a politlca nos parlamentos 
de cutros paises, raz:io pela qual, em vez de fomentar a Iuta pelo 
regime parlamentar, na RUssia, a tal se opunham nio raras vezes. 
Basta lembrar aqu1 o papel abomtnavel desempenhado pela Fran-
t;a oftelal. Foram estas as causas elementares e trredutfveis do 
1solamento politico da burguesla russa e de sua atltude contrBrla 
aos tnteresses populares. Se na aurora de sua hist6ria, mostrou-se 
multo pouco amadurectda para reallzar uma reforma, ainda mals 
se encontrava quando chegou o 1nstante de dlr!glr a revolu~iio. 
De ae6rdo com a evoluQio do pais, o reservat6rlo de onde saia a 
classe operliria russa. nio era um artesanato corporativo: era o meio 
rural; nio a cldade, mas· a aldela. 1i: preclso notar que o operarlado 
rUB&:> se formou nio paulattnamente, no decurso dos s6culos, ar-
29 
rastando o enorme fardo do passado, como na Inglaterra, mas" slm 
aos saltos, por meio de transforma~iies bruscas das sltua~oes, de 
l!ga~iies, acordos e, alnda, por melo de ruturas vlolentas com tudo 
o que, na vespera, exlstla. Fol preclsamente asslm - sobretudo du-
rante o regime da opressio concentrada do tzarlsmo - que os ope-
rirlos russos puderam usslmUar as dedu~oes mals ousadas do pen-
samento revoluclonarlo da mesma forma que a retardatarla Indus-
tria russa era capaz de compreender a ultima conqulsta da organl-
za~iio capltallsta. 
o proietar!ado russo recome~ava sempre a curta hlst6r!a de 
suas orlgens. Enquanto que na Jndilstrla metalurglca, sobretudo em 
Petrogrado, se crlstal!zava o elemento proletiir!o de procedencla au-
tentlca - aquele que, deflnltlvamente, rompera com a aldela - nos 
Urals predomlnava alnda o tlpo melo proletiir!o melo campones. 0 
afiUJO~ anual da miio-de-obra, orlunda dos campos, para todos os 
ramos da Industria, restabelecla o contato entre o proletarlado e o 
reservat6rlo social de onde se orlglnava. 
A lncapacldade politlca da burguesla era dlretamente determl-
nada pelo carater de suas rela~es com o proletar!ado e os cam-
poneses. Nii.o era posslvei arrastar conslgo os operar!os que a ela 
se opunham rancorosamente na vida cotldlana e que, multo cedo, 
aprenderam a dar urn sentldo mals geral aos seus objetlvos. Por 
outro Iado a burguesla era lgualmente lncapaz de arrastar a classe 
camponesa porque estava enredada nas malhas de lnteresses co-
muns com os propr!etiir!os de terras e porque temla urn abalo da 
propr!edade sob qualquer forma em que se apresentasse. Se, par-
tanto, a revolu~iio russa tardou em rebentar, niio fol tiio-somente 
por motlvo cronol6glco: a culpa desta demora cabe tambem a es-
trutura social da na~iio. 
Quando a Inglaterra real!zou a sua revolu~iio pur!tana, a po-
pula~iio do pais niio Ia alem de 5 1/2 mUhoes de habltantes, dos quais 
meio mllhiio vlvla em Londres. A Fran~a. por ocasliio de sua revo-
Iu~iio, contava com apenas melo mllhiio de habltantes em Paris, 
contra 25 mllhoes da popula~iio total. A Russia, no pr!nclplo do 
seculo XX, possula mals ou menos uma popula~iio de 150 mUhiies 
de habltantes, dos quais mals de 3 ml!hoes flxados em Moscou e 
Petrogrado. :tstes dados comparados encobrem alnda dlssemelhan~ 
socials da malor lmportiincla. Niio somente a Inglaterra do seculo 
xvn, mas tambem a Fran~a do xvni lgnoravam 0 proletar!ado 
conbecldo em nossa epoca. Ora, na Russia, a classe operarla em 
todos os setores de trabalho, nas cldades e nos campos, contava 
ja em 1905 com pelo menos 10 mllhoes de pessoas, o que, compre-
endendo suas famillas, representava mals de 25 ml!hoes - ou seja, 
mais do que a popula~iio da Fran~a na epoca da sua grande Re-
volu~iio. Partlndo dos rudes artesiios e dos camponeses lndependen-
tes que formaram o exerclto de Cromwell - passando em segulda 
pelos sans-culOttes de Paris -'- para chegar aos proletiir!os IndUs-
trials de s. Petersburgo, a Revolu~iio teve que modlflcar profunda-
30 
mente seu meeanismo social, seus metodos e, por conseguinte,. seus 
deslgnlos. 
Os aconteclmentos de 1905 foram o pr6logo das duas revolu-
~oes de 1917- a de Feverelro e a de outubro. 0 pr6logo ja contlnha 
todos os elementos do drama que, entretanto, ainda nao estava ter-
mlnado. A guerra russo-japon~sa abalou o tzarlsmo. Utlllzando o 
inoVimento de massas como alavanca, a burguesla liberal abalou a 
Monarqula devldo a sua oposl~ao. Os operlirlos organlzavam-se in-
dependentemente da burguesla, opondo-se mesmo a ela em sovle-
tes, apareeidos pela primeira vez. A classe camponesa, numa exten-
sao !mensa do terrlt6rio, levantava-se para a conqulsta das terras. 
AssJm como os camponeses, alguns efetivos revolucion9..rios, no Exer-
cito, se voltaram para os sovietes que, no memento em que o im-
pulse revoluclonarlo era mals forte, disputaram abertamente o po-
der a Monarqula. Entretanto, tOdas as tor~as revoluclonarlas ma-
nifestavam-se, pela primeira vez, careeendo de experleneia e sem 
confian~a em si mesmas. Os Uberais afastaram-se ostenslvamente 
da revolu~ao logo se tornou evldente niio ser suflclente apenas aba-
lar o trono mas que serla necessaria derrubD.-lo. A rutura brutal 
entre a burguesla e o povo, tanto mals Que a burguesla arrastava 
consigo grupos conslderavels de lntelectuals democratas, facllitou a 
Monarquia sua obra de desagrega~ii.o no Exerclto, a trlagem de con-
tlngentes fieis e alnda a repressii.o sangrenta contra os operlirlos e 
os camponeses. 0 tzarlsmo salu de seus sofrlmentos de 1905 vivo. 
suficlentemente vlgoroso, apesar de algumas de suas costelas terem 
flcado quebradas. 
Durante os onze anos lntermediarlos entre o pr6logo e o dra-
ma, quais foram as modlflca~oes provocadas pela evolu~iio hist6rlca 
na c0rrela~iio das for~as? Durante ~ste periodo o regime tzarlsta 
consegulu alnda mats colocar-se em contradl~iio com as ex!g~nclas 
hlstoricas. A burguesla tornara-se economlcamente mals poderosa, 
mas seu poder, eonforme vimos, repousava sObre a concentrae;i.o mais 
forte na Industria e sobre a lmportil.ncla crescente do papel repre-
sentado pelo capital estrangelro. Influenclada pelas ll~oes de 1905, 
tomou-se a burguesia ainda mais desconfiada e conservadora. 0 
p~so especiflco da pequena e media burguesla, anterlormente ln-
significante, dlmlnulu alnda mals. Os lntelectuals democratas niio 
tlnham, em geral, base social estllvel. Podlam exercer transltOr!a-
mente certa lnflu~ncla polltlca mas niio podlam desempenhar papel 
lndependente: a sujel~iio dos lntelectuals ao llberallsmo burgu!s tl-
nha-se agravado extraordlnRrlamente. Nestas condl~oes sc)mente o 
jovem proletarlado poderla dar a classe camponesa um programa, 
uma bandelra, uma dlre~iio. Os grandlosos problemas que se lhe 
apresentam ex!glam a crla~iio lnadlavel de uma organlza~iio revolu-
clonarla especial que pudesse englobar as massas populares e torna-
las capazes de uma a9iio revoluclonlirla. sob a. dlr09iio dos operlirlos. 
Fol asslm que os sovletes de 1905 alcan9aram em 1917 um formldli-
vel desenvolvlmento. Note-se que os sovletes niio siio slmplesmente 
um produto do atraso hlstorlco da RUssia, mas slm o resultado de 
Jf 
I 
um desenvo!VImento '<>Omblnado, e Jato e comprovado pelo fato de 
o proletarlado do pals mals lndustrlaHzado do mundo, a Alemanha, 
nio ter encontrado, na epoca do lmpulso revoluclonarb de 1918 a 
1910, outra forma de orgaulsa~iio seniio a dos sovletes. 
A revolu~io de 1917 tlnha alndacomo flm lmedlato derrubar 
a monarqula burocratlca. Dlferenclava-se, entretanto, das antlgas 
revolu9(ies burguesas, pelo fato de o elemento declslvo que se manl-
festava agora ser uma nova classe constltuida sObre a base de uma 
lndl\strla concentrada, possuldora de nova organiZ~io e novos me-
wdoa de !uta. A lei do desenvolvlmento comblnado se revela agora 
em sua expressao mals alta: com~ando por derrubar o edlficlo me-
cll.eval apodrecldo, a Revolu~io eleva ao poder, em poucos meses, o 
Pl'C)Ietarlado, encab~ado pelo Partido Comunlsta. 
Asslm, segundo as suas flnalldades prlmeiras, a Revolu~iio rus-
sa era democratlca. Colocava porem, sob n6To aspecto, o problema -ia 
democracla politlca. Enquanto os operarlos cobrlam todo o pais com 
os sovletea, n6les admltlndo soldados e, parclalmente, camponeses, a 
burguesla contlnuava a negoclar, perguntando se convocarla ou nao 
a Assemblela Constltulnte. A medlda que formos descrevendo os 
aconteclmentos esta queatiio se nos apresentara de modo mala ron-
creta. Aqul pretende"!o& apenaa fixar o Iugar des sovletes na su-
cesaiio hlat6rlca das ldelas e das formas revoluclonarlas. 
Em meados do seculo XVII, a revolu~io burguesa reaiiZada na 
Inglaterra decorreu sob o env6lucro de uma reforma rellgl·~sa. A 
luta pelo dlrelto de rezar segundo um determlnado llvro de or~oes 
se ldentlflcou a luta levada a cabo coQtra o rei, a arlstocracla e os 
prlnclpes da lgreja e Rcma. Os presblterlanos e os purltanos eata-
vam profundamente persuadldos de terem colocado os seus lnte-
riaes terrestres sob a t!gide da Dlvina Provld6ncla. Os fins pelos 
qUais combatlam as novas classes confundlam-se lndlssoluvelmente, 
.em suas mentalldades, com os textos blbllcos e com os rltos ecleslas-
t1cos. Os que emtgraram para alem dos mares conslgo levaram csta 
tradl~i\o conflrmada no sangue. Dai a excepclonal vltalldade das 
lnterpreta~oes do Crlstlanlsmo apresentadas pelos anglo-sax6es. Ve-
mos, alnda hoje, mlnlstros "soclallstas" da Grii-Bretanha esconde-
rem a covardla sob os mesmos textos miglcos com que os homens 
do seculo XVII buscavam a justlflca~iio de sua co~em. 
Na Fran~a. pais que pulou sObre a Reforma, a Igreja Cat6llca, 
em aua qualldade de Igreja do Estadc, consegUiu sobrevlver ate a 
Reelu~i\o, que to! buscar, niio nos textos blbllcos mas em abstra-
~ democratlcas uma expressiio e uma Justlflca~iio para os desig-
nlos da socledade burguesa. Qualquer que seja o 6dlo dos regentes 
atuals da . Fran~a pel<> jacoblulsmo, a verdade e que, preclsamentE 
~ a ~iio rlgorosa de um Robesplerre e que 6les alnda tiim a 
poasibllldade de dlsslmular a domlna~iio dos conservadores que siio, 
sob formulas que, outrora, flzeram explodlr a velba socledade. 
Cada UD!a das grandes revolu~s marcou uma nova etapa da 
socledade burguesa aaslm como novas formas na conscl6ncla de """' 
classes. Asslm como a Fran~a pulou por sObre a Reforma, a RUssia 
3Z 
ultrapassou de um ealto a democraela puramente formal. o partido 
revoluelonarlo da Russia, que poria uma pedra sObre tOda uma epo-
ca, procurou uma formula para os problemas lia revolu~iio nao na 
Biblia nem no cristianlsmo secularizado de uma democracla "pura"'', 
mas nas rela~oes materials entre as classes. 0 sistema deu a tala 
rela~oes a expressao mals simples, a menos dlsslmulada, a mals 
transparente. A domlna~ao dos trabalhadores encontrou peia prl-
melra vez sua reallza9iio no sistema dos sovietes que, sejam quais fo-
rem as vicissitudes hist6rlcas que lhes esta reservada, penetrou 
na conscl~ncla das massas de forma tao lnextlrpavel quanto, em 
outros tempos, em outros povos, a Reforma ou a democracla pura. 
Capitulo n 
A ROSSIA TZARIST A E A GUERRA 
A PARTICIPA~iio da Russia na guerra encerrava contradi~oes quer 
nos motlvos quer nos fins. Em verdade, a !uta sangrenta tl-
nha como objetivo o domlnlo mundlal. Neste sentldo ultrapassava as 
possibllldades da Russia. 0 que se denomlnava objetlvos de gueua 
para a Rll.ssla (estreltos na Turqula, Galicia e Armenia) t1nha ape-
nas !mportancla multo relatlva, de carater provlnclano, e s6 pode-
riam ser soluclonados acessorlamente na medlda que convlesse aos 
lnteresses dos principals bellgerantes. 
Ao mesmo tempo, a Russia, na qualldade de grande poti!ncia, 
n&.o podia abster-se de partlcipar da guerra dos palses capitallstas 
mais adlantados, da mesma forma como nao !he fora posslvel, du-
rante a epoca precedente, dispensar a lnstala~ii.o em suas terras de 
usir.as, fabricas, ferrovlas, assim como adqulrlr fuzis de tiro rapido e 
avioes. Freqiientemente, entre os historladores russos da nova esco!a, 
surgem discussCies com o flm de lnvestigar ate que ponte a Russia 
tzarlsta estava amadureclda para uma po!ltica imperiallsta mo-
derna; mas, constantemente, estas oo-ntroversias recaem em escolis-
tlca, porquanto se considera a Russia, no plano lntemaclonal, urn 
elemento lsolado asslm como urn fator lndependente. Ora, a Ru ... la 
niio passou de elo de urn sistema. 
A fndla, de fato e na forma, tomou parte na guerra como co-
lOnia da Inglaterra. A interven~io da China, "voluntiria", no sen-
tide formal, fol, na realldade a lnterven~ilo de urn escravo numa 
rlxa entre senhores. A partlc!pa~iio da Russia tlnha carater mal de-
flnldo, lntermedlarlo entre a partlcipa~iio da Fran~a e a da China. 
pagava asslm a Russia o dlrelto de ser allada de palses mala adlan-
tados, de !mportar capitals e de trocar lnteresses, lsto e, em resumo, 
o dlrelto de ser uma colonia pr!W.leglada dos seus allados; adqul-
rla, porem, concom!tantemente, o dlreito de oprlm!r e espollar a 
Turquia, a Persia e a Galicia e, em geral, os paises mals fracos e 
rnals a trasados do que ela. 0 lmperlalismo equlvoco da burguesla 
russa tlnha, no fundo, o cad.ter de uma agencia a servi~o das malo-
res poti!nclas mund!als. 
0 sistema dos compradores, na China, apresenta o tlpo classl-
co de uma burguesla naclonal funclonando como agi!ncla entre o ca-
pital flnanclador estrangelro e a economla do seu pr6prlo pals. An-
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tes da guerra, a R6ssia oeupava, na hlerarquia mundial dos Estados, 
um Iugar bem mals elevado que o da China. Qual seria o Iugar ocu-
pado pela Russia depols da guerra, caso nao houvesse estalado a 
Revolu~ao - e outra questiio. A autocracia, de um lado, e a bur-
guesla russa, de outro, tlnham caracteristicas cada vez mais defl-
nldas de compradorlsmo: uma e outra vlvlam e subsistiam atravt\s 
dos vlnculos que as Uniam ao lmperlalismo estrangeiro, a cujo ser-
vi~o estavam e niio poderlam manter-se sem que sobre iHes se apol-
assem. Verdade e, port\m, que, no final das contas, naa puderam re-
sistlr, apesar de sustentadas por ele. Da mesma forma que um re-
presentant• que recebe perceniagem flea interessado nos neg6cios 
de seu patrao a burguesia russa, semicompradora da finan~a estran-
geira, tinba interesses imperialistas mundiais. 
0 instrumento de uma guerra e o ext\rcito. Sendo qualquer 
exercito, na mitologia nacionallsta, considerado invencivel, as classes 
dirigimtes da Russia nao tinham motlvo para excetuarem o ext\r-
cito do tzar desse mito. Em verdade este exercito niio representava 
fo~a seria senao dian te das popula~oes semibtirbaras dos vizinhos 
pouco importantes e dos estados em decomposi~ao; em terreno eu-
ropeu este exercito s6 poderia agir como componente de uma coll-
ga~ao; na defesa do pais s6 cumpria a sua missao favorecido pelas 
imensuraveis distancias onde a popula~io era escassa e os cami-
nhos impraticaveis. 0 virtuose do exercito dos mujiques ao tempo 
da servidao foi suvorov. A semi-aboli~ao da servidao e a institui~ao 
do servi~o militar obrigat6rio modernizaram o Exercito tanto quan-
to o pais - ou, por outra, introduziram no Exercito todos os anta-
gonlsmos de uma na~ao que tinba ainda par fazer a sua revolu~ao 
burguesa. A bem dizer, o exercito tzarista se organizava e se armava 
segundo os moldes ocidentais; masisto se relacionava mats com a 
forma do que com o fundo. Entre o nivel cultural do campones sol-
dado e o nivel da tecnica militar nAo havia correspondimcia. Nos 
corpos de oflciais manlfestava-se a lgnorancia crassa, a pregui~a. 
a venalldade das classes dirigentes da Rlissia. A industria e os trans-
partes !nvarlavelmente mostravam-se incapazes face as exigencias 
concentradas do tempo de guerra. Equipadas como convinha, asslm 
parecia nos primelros elias de hostilldades, as tropas vlram-se logo 
ap6s degprovtdas nao somente de armas mas ate mesmo de botas. 
No decorrer da guerra russo-japonesa o exercito do tzar demons-
trara o que vaua. Por ocasiao da contra-revolu~ao. a Monarqula, 
auxillada pela Duma, abarrotou seus entrepostos de guerra e fez 
no Exerclto inumeros remendos, remendando tambt\m sua reputa-
~io de invenclbilidade. Em 1914 houve ocasiao para nova verlflca-
~llo, e alnda mals penosa. 
Quanto a equipamentos de guerra e as finan~as", a Riissla en-
contrava-se, logo a primelra vista, na dependencia servil de seus 
allados. Isto nao e senao a expressao militar da dependencia geral 
em que vivia relatlvamente aos paises capitallstas mats avan~ados. 
0 auxillo prestado pelos allados nao salvou a situa~ao. A falta de 
mUni~es, niimero lnflmo de lndiistrias que as fabricavam, a defi-
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chincla da ri!de ferrovll>rla que deverla 'dlstrlbui-las traduz!am o 
estado atrasado da Russia na llnguagem clara das derrotas que obrl-
garam os naclonals-llberals russos a se lembrarem de que seus ante-
passados nii.o tlnbam felto uma revolu~ii.o burguesa e que, por con-
segulnte, estava a posterldade em debito com a Hlst6rla. 
Os pr!melros elias da guerra foram os prlme!ros do opr6brlo. 
Ap6s um certo nfunero de catastrofes parclals, fol determlnada a 
retlrada geral na prlmavera de 1915. Os generals vlngaram-se de 
sua lncapacldade crlmlnosa sllbre a popula~i.o civil. Imensos terrl-
t6rlos foram devastados pela vlo!J!ncla. Os gafanhotos humanos eram 
empurrados para a retaguarda a golpes de nagalca. 0 desastre no 
tront completava-se com o desastre Jntemo. 
0 General Pollvanov, mlnlstro, da Guerra, respondendo as per-
guntas anslosas dos seus colegas s6bre a sltua~iio no front, decla-
rava llteralmente: "Conflando na lmensldade do nosso terrlt6rlo, 
contando com os nossos lama~als lnsuperavels, conflo alnda nas boas 
gra~as de Si.o Nlcolau Mlrllklsky, patrono da santa Russia" (8essi.o 
de 4 de agOsto de 1915, no Conselhol. Uma semana depols o Gene-
ral Ruszky contessava para os mesmos mlnlstros: "As exlg~nclas 
modemas da tecnlca mllltar si.o superlores as nossas- possibilidades. 
Ni.o podemos, de modo algum, rlvallzar com os alemaes." Isto ni.o 
era uma brlncadelra. Um tal Stankevlch, oflclal, traduzlu asslm as 
palavras de um chefe de corpo de engenhelros: "A guerra contra 
os alemies e sem esperan~a. pols nio estamos capacltados para fa-
zer 0 que quer que seja. Os DOVOS metodos de !uta transformam-se 
para n6s em causas de reveses!' Exlstem lnumeros testemunhos 
d~sse gAnero. A fmlca colsa que os generals russos conheclam pro-
fundamente era a forma de consegulr came para canhii.o no pais. 
Economlzou-se multo mals a carne de bol e de porco. As nulldades 
que se encontravam ii. frente do estado-malor - Yanushkevlch, sob 
o comando de Nikolai Nikolaievich, e Alexeiev, sob as ordens do 
tzar - tapavam tOdas as brechas com novas m<>blllza~es, e en-
eontravam consolai.QiO, para si e para os seus allados, em allnhar 
colunas de numeros quando o que faltavam eram colunas de com-
batentes. C~rca de 15 mllhiies de homens foram moblllzados, en-
chendo dep6sltos, os quartels, os acantonamentos, multldio tumul-
tuosa que patlnhava no mesmo Iugar, plsando-se nos pes, multldiies 
em desespero que proferlam maldl~iies. Se para o tront esta massa 
humana tlnha valor llus6rlo, na retaguarda ela fol um fator atlv<> 
de desagrega~i<>. Houve, mais ou monos, 5,5 mUhiies de v!tlmas, en-
tre mortos, ferldos e prlslonelros. 0 numero de desert<>res aumen-
tava. Ja n<> mes de julho de 1915 os mlnlstros desmanchavam-se em 
lamenta~iies: "Pobre Russia! Ate o teu exerclto que, outrora, en-
cheu o mundo com o canglor de suas vlt6rlas .... hoje em ella se 
comp6e apenas de covardes e desertoresl" 
Os pr6prlos mlnlstros, gracejando em seu estllo chlstoso, rldl-
cularlzavam "a bravura dos generals ao bater em retlrada" e per-
dlam horas e horas dlscutlndo s6bre se evacuarlam ou ni.o as rell-
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qulas de Kiev. 0 tzar achava que nlio era lndlspensavel, porquanto 
"os alemies nio ousariam tocar nelas e, no caso de se arrlscarem, 
se darlam multo mal!" 0 Slnodo, entretanto, ja empreendera a 
evacua9iO: "Partin do", declarou, "levamos o que nos e mats pre-
closo." Isto se passava nio na epoca das Cruzadas, mas no seculo XX, 
quando as derrotas da RUssia eram anuncladas pelo radio. 
Oa sucessos obUdos pela RUssia s6bre a Austrla-Hungrla provl-
nham mals da sttua~iio desta lllUma que da propria RUssia. A mo-
narqula dos Habsburgos, em putrefa~iio, reclamava de hi multo o 
seu covelro, sem exlglr mesmo que fOsse altamente qualiflcado. A 
RUssia, mesmo no passado, consegulra o dominlo de Estados em 
decomposl~ilo, ta1s como a Turqula, a Po!Onla e a Perala. 0 front do 
sudoeste das tropas russas, dlrlgldo contra a Austria, obteve gran-
des vltorlas, o que o fez sobressalr perante as demals frentes. Ali 
destacaram-se multos generals que, a bem dlzer, niio demonstra-
ram de modo algum suas apUdoes de guerrelros, mas que, em todo 
caso, niio estavam saturados do fatalismo que caracterlza os capl-
tiies lnvarlavelmente derrotados. Deste melo fol que salram, mals 
tarde, alguns "her61s", dentre os Brancos, na guerra civil. 
Procurava-se a quem responsablllzar, por tOda parte. Acusava-
se de esplonagem a todos os judeus, sem exceeio. Davam como sus-
peltos todos cujo nome de familia fosse alemio. 0 estate do Griio-
Duque Nikolai Ntkolalevlch mandou fuzllar o Coronel Myasoyedov, 
da Policla, como esplio alemio - 0 que provavelmente nilo era. 
Prenderam o mlnlstro da Guerra, Sukhomlinov, hom:em lnslgnlfl-
cante e tarado, acusando-o, niio sem fundamento talvez, de alta 
traleilo. 0 mlnlstro dos Neg6clos Estrangelros da Gri-Bretanha, 
Grey, declarou ao presldente da delega~ilo parlamentar da RUssia 
que o Govemo do tzar aglrla temeril.rlamente caso resolvesse em 
plena guerra lnculpar de alta traleao seu proprio mlnlstro da Guer-
ra. 0 estado-malor e a Duma·· acusavam a cOrte Imperial de germa-
nofilia. Todos estavam lnvejosos dos allados e entretant<> os detes-
tavam. 0 comando frances poupava as suas tropas utlllzando, em 
prlmelro Iugar, os so!dados russos. A Inglaterra preparava-se len-
tamente. ·Nos sa!iies de Petrogrado e nos estados-malores do front 
davam-se ao prazer de lnocentes pllho!rlas. "A Inglaterra - dlzlam 
- jurou reslsUr ate a u!Uma gOta de sangue. . . do soldado russo." 
Tals pllherlas se lnslnuavam nos nivels lnferlores e eram repetldas 
no front. "Tudo pela guerra!" - dlzlam os mlnlstros, os deputados, 
os generals, os jomalistas. "Sim - comeeou a dlzer o soldado nas 
trlnchelras - estio prontos para guerrear ate a ultima g6ta ... 
do meu sangue." 
0 Exerclto russo, no decurso da guerra, sofreu as malores per-
das que qualquer outro dos exercltos envolvldos no massacre: mals 
ou menos 2,5 mllhoes de homens mortos, ou seja, 40% das perdas 
sofrldas pelos exercltos da Entente. Durante os prlmelros meses, 
os soldados ca!am so'b os projetels sem refleUr ou com pouca re-
f!exio. De um dla para o outro porem, a experlencla deles crescla, 
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a amarga experlencla das camadas lnferlores que nlnguem 6 capaz 
de comandar. m!es medlam a lmensldade da desordem crlada pelos 
generals atrav6s das lnutels marchas e contra-marchas executadas 
sObre a sola do& sapatos gastos, segundo alnda o nftmero de refel-
~oes que delxavam de fazer. Na sangrenta debacle dos homens

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