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Un1 Testemunho Autentico Pela pnme1ra veL. na hist6na das revolur;oes que transformaram o mundo, um dos seus lideres de1xa para a Hist6ria seu testemunho. E o fal de maneira inteligente. ousada. dominan- do o fato e o processo que lhe deram causa, numa analise profunda e nota vel de acuidade e percepr;iio da importancia da Revolur;ao de Outubro de 1917. A Hist6rta do Revolucoo Ruua. de Leon Trols- k)', nao consutu1 um desenrolar de fatos e da- tas t um livro de tese. t um livro de interpre- tar;iio poliuca e soc1ol6g•ca. t o hvro de um ob ervador e psic61ogo prof undo, que nos da o quadro revolucionano e a personahdade dos homens-desllno da Revolur;iio de 1917. Eo li- vro de um homem que niio conheceu o medo dos m1tos e das coisas estabelecidas. Um hvro delin1l1vo. "Uma obra imparcial: isto c. racional , objetiva, Clentilica", no dizer do M irroir de /'II inoire. Por ~ua vez, The Times Literary Supplement co menta: " A 1/imirta da Re1·olucoo Russo e descrita por Mall Eastman como a primeira hist6ria cientl- fica de um grande acontecimento ... escrita por um homem 4ue desempenhou um papel domi- nante nele Escrita no edlio mais de dez anos A H I"S T 0 RIA D A REVOL U<;AO R USSA Cole~iio PEN SAM ENTO CRITICO Vol. II Ficha catalogn\fica ( Preparada pelo Centro de Cataloga~iio-na-fonte do SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ) T772h 76-0609 Trotsky, Leon, 1879-1940. A His tori ada Revolu~iio russa; tradu~iio de E. Huggins. 2.ed. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1977. Jv. {Pcnsamento critico, v. 11) Do original em ingles: The history of the Russian Revo- lution Apendices Conteudo.- v.l. A queda do tzarismo.- v.2. A tentativa de contra-revolu~iio. - v.3. 0 triunfo dos sovietes I. Russia- Hist6ria- Revolu~iio, 1917-1921 I. Titulo II. serie COD - 947.084 CDU- 947"1917/1921" EDITORA PAZ E TERRA Conselho Editorial Antonio Callado Celso Furtado Fernando Henrique Cardoso LEON TROTSKY A HIST6RIA DA REVOLU<;AO R USSA TRADU~AO DE E. HUGGINS 8IICJtrJiiDO VOL11MJII Paz e Terra © Copyright by The University of Michigan Press, 1932. Titulo do original em ingles: The History of the Russian Revolution Montagem da capa: Mario Roberto Correa da Silva (sobre original de Maria Luisa Campelo) Dircitos desta ediciio adquiridos pela EDITORA PAZ E TERRA S.A. Rua Andre Cavalcanti, 86 Rio de Janeiro, RJ, que se reserva a propriedade desta traduclio. 1977 lmpresso no Brasil Primed in Brazil Segundo Volume A TENTATIVA DE CONTRA-REVOLU<;AO ~~.~ ~·w ~ ... 0 z~. --l<o: ~UJ:S: <i.i'<( <.<J-~ Introdugflo aos volumes II e III 1-"-..::' Ul'<l-z. 0 "' - COM TAMANBO atraso realiZou a Russia sua revolugiio burguesa, "' que se v!u forgada a transtormd-14 em revolugiio proletlirla, " Em outras palavras: a Russia estava tiio atrasada em rela a ou- 0 tr.os patses, pelo "!mi.Qt~~f!!,~ certos s~~es. !1!1~ tot--· -·lllil: _, tz:gpas§!!:..~. Isto parece abliiTiro:"":A Hlst6rla, en re anto, est re- :0: pleta de parado:z:os semelhante•. A Inglaterra cap!tal!sta ultrapas- '~ sou de tal manelra 08 outros palsea, que se vtu torgado a detzar-se «: ultrapassar, depots, por 'le8. Imaglnam 08 pedantes que a dtaletlca niio passa de simples 16go !ntelectual. Na realldode, ela r~uz o processus do desenvolvlmento que vtve e que se ~tro de ~t!aa!Coes. 0 prime!ro tomo desta obra deverla ezpl!car por que raziio o regime democrdt!co, tard!amente chegado a H£st6rla para subs- tltuir o t2artsmo se revelou totalmente !nvldvel. 0 presente volu- me trata da conqui8ta do poder pelos bolchevlques. A ezpostgiio, alnda aqu!, e baseada em na"attva. 0 leltor deve · procurar nos processus do desenvolvlmento que v!ve e que 8e move dentro de dugoes. 0 autar niio quer diZer em absoluto que tenha evttado as generaliZagoes soclcl6glcas. A H!st6rla niio terta valor algum se n6.o - !~~~~~~~~~~~~io~~~~~~~ \u ..J 'U > e. pot conseguinte~ a ';:: compreensiio tambl!m da humana. Porque pode-se ava- -. liar, provar mesmo, atraves de toda a marcha da Htstliria, que qual ~ quer socledade d!lacerad or antagontsmos tnt consegue ~ esv ar comp e ente, tan o a a anatomiuQ~_o ~q_- pTia ""11111Ui";i>rectsamente em uma ~·EM MO Vi ~e.NTo~ De maneira mals lmedtata, a pre8ente obra deve a1udar a compreenslio do cartiter da Unliio Sovletlca. Nosso tema e atual niio porque se tenha reall2ado a lnsu"eigiio de Outubro aos olhos de uma gerag/io alnda viva - tato que, como e 6bvlo, n6.o dei:z:a de ter lmportdncla - mas pelo tato de que o regime dec=ente &a ln- su"eigdo estd bem vivo, desenvolve-se, e apresenta a humanldade 4IS nOflell enfgma8. 0 problema apresentado pelo pafa dos Sovtetes per- manece, !nvarldvelmente, na ordem do dta do mundo tntetro. Ora, n4o ,. pode conceber com ezattd4o aqu!lo que e, •em ter eluctdado, manetra pela qual Be tormou o que ufate. AB gran- pollttca8 exlgem peropectlva k1Bt61ic4. Para a descrt¢o de otto meses de revolugdo, de feveretro a outubro de 1917, toram necessdrtas dofs volumeo. A crutca, em ge- ral, n4o nos aCUBOU de tlrmos Bldo proltzoa. A amplitude do obra ezpltca-se BObretudo pe!a manetra de conBiderar 08 materialS. Po- de-Be fqfografar uma da8 mdos: ocuparemos uma pdgina com a totogratta. Todovla, para a e:r;pootg4o dos resultados do estudo mt- crooc6ptco do8 tecldos da mdo, serd necessdrta um vvtume. 0 autor em absoluto n4o ae Uude quanto 4 plenitude e ao 1imitado da pes· qufaa por tie realizada. Ndo obstante, intlmeros toram 08 cll808 em que oe vtu obrigado a empregar metodos que mafa ae aprcmmam doo procesm microsc6picoa do que dos aparelh.os totogr4fk08. Em certos momentos, quando percebiamos que estdvamos abu- aando da pacUncia do leltor, BUprimlamoa paaaageno dos depoimen· to• de testemunka8, dos declar~ de co-parflcipantu, de ePI86- dios 8ecunddrtao; em aegulda reinclulamos, freqilentemente, multo do que kavtomos cortado. NeBaa !uta por detalkes, deizdvamo-nos gular pe!a tntengdo de moatrar, o mafa concretamente posrillel, o procesaus meamo da Bevolug4o. Aflgurava-ae-noa lmpoarivel n4o tentar utuizar amp!amente a vantagem not6rta de ter aido eBta a ktst6rta escrita enquanto vtvtda, no pr6prio amblente em que se JITOCeBBatla. Mtlkares e mllkares de livros Bdo !angados cw mercado, anu- almente, a lim de apreaentarem ou uma varlante nova de romance peBaoal, ou a descrlgdo daB incerteza• de algum melanc6Uco, ou a ktst6rta da carretra de certo ambtcioso. Uma qualquer herofna de Prouat prectsa de numerosa8 pdgina8 requtntados para chegar a '""tir que em abaoluto nada oente. Jul(lamos por tsto que pelo me- nos nos asBtste o direito igual de pedir ateng4o para 4rama8 coleti- na HfBt6rta arrancam nada cen e e8 de B~ea kuma!IO!o transtormam o cardter nag6ea e Be !nserem Jl(lra lOlfO o aempre na vida da kumanidade. A ezatiddo dos reterenctaa e dos citag{Jes do primetro tomo ndo /of aU agora contestada por puaoa al(luma; o que, realmen- te, terta aido multo di/icil. Oo adverodrios ae llmltam, malo freqi}.en- temente, a comiderag/Ju em tllrno do tema de a parcialidade pes- soal poder manitestar-<Be atravea da se!egdo artificial e unilateral dos tatos e dos te:J:tos. Indfacuttvel em essencia, esta consideragdo ndo se apltca 4 presente obra, e multo menoa alnda a 88UB proces- sos cienttttcos. Ora, tomamos a Uberdade de fnsiBUr ruolutamente no Jato de o coettciente do sub;letivtsmo estar determinado, Umf- tado e contro!ado, n4o tanto pelo temperamento do ktstoriador, mas pelo cardter de seu metOda. 414 .A escola purarrumte pslcol6glca, que consldera a tecltura dos aconteclmentos como se t6Bse um emaranhado dos liiWes atlt>ldades dos lnd.lvld.uos, ou d.os grup08 d.e lnd.illld.uos, cte!za a mals ampla dos margens d arbttrarled.ade, mesmoquando se ad.mltem as me• lh.ores inten¢es do pesqulsad.or. 0 metoda materlallsta lnstthd dls- clpllna que nos obrlga a tamar como ponto de partld.a 08 tat08 do- mlnantes da estrutura social. As f6rt}(JB eBSencfaiB do proceBSo hiB- t6rlco silo, para ntis, representad.as pelas classes; 86bre estas ap61am- se 08 partld.os politicos; as ld.etas e as pala!Was de ordem apar~em como moeda d.lvlsloncirla d.os lnterlsses objetlvos. Tod.o o and.amen- to do estudo conduz do objetlvo ao subjetlvo, do soctal ao lnd.lllld.tull, do que e fundamental d contuntura. Flcam, par este modo, contra- pastas rlgorOBOS !!mites d arbttrarled.ad.e do autor. Quando um engenl&elro de minas, em certo setor alnd.a n/lo lnvesUgado, descobre, pela sond.agem, mlnerla de ferro magnetlco, pod.e-se sempre supor que se trate d.e feliz acaso: alnd.a n4o he! ln- d.lc4glio para que ae proced.a d escavaglio de um pogo. Quando o mesmo engenhelro, baseado, par eumplo, em desvlot d.a agulll4 lmantad.a, chega d conc!us/lo de que a terra deve encerrar 1asd4as de mlnerlo, e quando, em seguld.a, em dlver808 pontos d.a mesma regl/lo, lie descobre efetlvamente minerlo de ferro, nem mesmo o mals exlgente d.os ceptlcos ousarcl !alar em acaso. 0 que e convln- cente e o slstema que p6e em unlssono o gera! e o partlcu!ar. As provas d.a objiJtlvld.ad.e clentf/lca devem ser proctWad.as ncie nos olhos do hlstorlad.or, nem nas lnflez6es de sua voe, mas na l6glca intima aa pr6prfa narratlva, se os eplsddlos, os teste• munh08, os d.ados e as clta~lles colncldfrem com as lndlcaglles ge- rais aa agulha lmantad.a da analise social, terti o leltor a maiB se- ria d.as garantlas da solld.ez clentiffea das concluslles. De modo mals concreto: o autor mantem-se ezatamente fie! d objetlvldade nos l!mltes em que o presente trabalho revela, etetlvamente, a lnelu- tabllld.ade d.a lnsurrei~tio de Outubro, e as causas de sua vlt6ria. 0 leitor sabe multo bem que, numa revolu9/lo, n6s procura- mos, antes de mats nada, a tntervenc-iio direta das massas nos_ des- tlnos da soc!edade. Por detrtls dos aconteclmentos, tentamos d.es- cobrir as modlfica~oes da consctencia coletlva. Atastamos as alega- ¢es grossetras concernentes a um movtmento das uf6rr;as espontci- neas", alegat;Oes que, na matoria dos casas, nada explicam e nada en- slnam. As revolu9oes realizam-se de acardo com certas leis. Isto ntio slgnlflca que as massas atuantes tenham a coniciencla nitlda d.as leis da revolu~tio; slgnifica, porem, que as mod.ijica9oes da cons- clencta das massas, em vez de ser•m fortultas, subordinam-se a uma necesstdade objettva, sujeita ao esclarectmento te6rico, e cri· ando dai bases para as previsoes e para a dlre9tio. Alguns historiadores sovteticos, oficiais, tentaram, por mais surpreendente que isto pare~a, crlticar nossa concep9iio, acotman- do-a de ideallsta. o Professor Pokrovsky, por ezemplo, inslstia no fato de termos n6s subestimado os fatores objetlvos da Revolu~o: ·415 "Entre Feverelro e OUtubro produztu-se tormltl4.vel desorganlzagcfa econ6mfca"; "Bntrementes, o campesinato... sublevou-ae contra o CJov§rno Prov186rio"; II precfsamente em semelllantes "delloca- mentos Objettvos", e nlio em processus priqufcos varfdvels, que se- rltJ convenfente reconhecer a fbrt;a motrlz da Bevolui'IJo, G1'agas 4 louvavel clareza em sua manelra de formular as quest/Jes, PokrOvBk7/ deiza tramparecer liD melhor molio posrivel a tncon:llstlncia duma vulgar ezplicagiio econ6mlca da Hlst6rla, bastante freqilentemente imptnglda como sendo marzlsmo. As mudangas radicals que se produzem no decurso de uma revoluglio sliD na realldade provocadas, n4o peloa abaloa epis6dlcos da economla que se produzem no curso dos acontectmentoa, mas pelas modificag/Jes capitals que se acumularam nas pr6prias bases da soctedade durante tllda a llpoca precedents. e absolutamente !ncontestavel - e 1amals perdemos de vista lal tato ~ que, tanto na vespera da depostg4o da Monarqula quanta entre Feverelro e Outubro, a desorganlzaglio econ6mica se agravou constantemente e manteve e agur;au o descontentamento das massas. &erla, entre- tanto, mo multo groaselro 1ulgar que a segunda Bevolug4o se te- nll.a reallzado alto meses ap6s a primelra unfcamente porque a ra- glio de pljo tlvesse rido diminulda durante aquela tase, passando de libra e mela a 3!4 de libra. Durante 01 anos imed!atamente conse- cutlvos d lnsurrelg/io de Outubro, a sltuag4o daB massas, do ponto de vista do abastectmento, piorou contlnuamente. Todavla, as es- peranr;as dos politicos contra-revoluctondrlcs, que . se volta,vam para uma nova lnsurrelg4o, sotrlam decepg/Jes a ..:ada passo. 0 tato pode parecer enjgmdtlco, mas somente para aqulle que lmaglna a su- blevagdo das massas como se f688e movlmento de "t6rgas espanta- neas'', lsto e, como se toase o estouro da bolada Mbllmente apro- veitado pelos seus condutores. Na realldade, as prlvag/Jes nlio bas- tam para e:tpUcar a insurre!Q4o - se assim 16sse, as massaa esta- rlam em perpetua sublevagiio; II preclso que a lncapactdade defi- nltlvamente manifesta do regime soctal tenll.a tornado intolerdve!s as prlvag/Jes e que novas cond!g/Jes e novas idelas tenll.am del:tado entrever a perspecttva de uma salda revoluctondria. Tomando cons- ciblcla de altos desjgnios, as massas sentem-se capazes, em segui- da, de suportar privag/Jes dupla, e mesmo triplamente mals pesadas. A aluslio /elta 4 sublevag4o da closse camponesa, dando-a como segundo "fator Objetivo", denota um alnda mals evldente mal- entendldo. Para o proletarlado, a guerra camponesa era, e Is to se compreende multo bem, uma ctrcumtancta objetlva, na medida que, em geral, os atos de uma classe se tornam impulsao exterior, para a tormagiio da consctmcta de outra classe. "Mas a caU8<1 lmediata da tnsurretgao camponesa prO!>rlamente dita basela-se em modi/1- cag/Jes do estado de esplrlto <!O campo; um dos cap!tulos deste li- vro tot comagrado d pesqulsa da natureza destas modtfjcag/5es. Nlio nos esquegamos de que as revolugl5es s4o feitas por ll.omens, mesmo quando anon!mos. 0 materlallsmo ndo tgnora o ll.omem que sente, 416 que pensa e que age; ele expllca-o. E em que outra cofsa consiste a tare/a do hlstortador? ' Alguns crltlcos do !ado democrtitieo, propensos a operar par meta de provas indiretas, quiseram ver na atitude "ir6nica" do au- tor em rela~4o aos chefes concllladores, a express/io de inadmissi- vel sub1etlvismo que vlvia o cartiter clentifico da exposl~lio. Toma- mos a ztberdade de achar que este crtterto ndo e convincente. 0 prfncf.pio de Sptno2a: "Ntio chorar, nem rir, mas compreender"•, acautela-nos apenas contra o riso intempestivo e contra as ldgrt- mas quando este homem e hlstoriador, de seu dlrelto ao pranto e ao riso, quando lsto se justiffca pela compreenslio adequada de sua pr6prla flnalidade. Uma ironia puramente lndividuallsta que, como tenue nevoa de indiferen~. se estende par t6das as obras e par todas as concep~6es da humanidade, se apresenta com o pior as- pecto do esnobismo: ela e tao talsa em qualquer obra de arte quan- ta em qualquer trabalho hist6rico. Hti, entretanto, uma especie de lr&nia que estti na pr6prla base das rela~6es vitals. A obriga¢o do hlstoriador, tanto quanta a obrtga~lio do artlsta, e a de exterio- nza-ta. A rutura da correla~ao entre o sub1etlvo e o obietlvo e, fa- lando em llnhas gerais, tanto a tonte essenclal do c6mlco quanta a do trtiglco, na vida como na arte. 0 campo da politica, menos alnda que qualquer outro, escapa ao etelto desta lei. Os homens e os par- tldos sao her61cos, au rldieulos, nlio em sf mesmos, nem par sf pr6- prlos, mas pela atftude que mantem dlante das clrcunst/inclas. Quando a Revolu~lio Francesa entrou na tase declsfva, o mals eml- nente girondino tazia lamentavel e ridieula figura ao !ado de qual- quer lnsignlttcante jacoblno. Jean Marie Roland, figura respelttivelcomo lnspetor das manufaturas de Lyon, tem a aparencla de cari- catura quando surge sllbre o tundo do quadro de 179Z. Os ;acobiJIOs, ao contrtirio, est/io d altura das clrcunst/inclas. Podem provocar hostilldade, 6dlo, terror, iamals Ironia. A heroina de Dtckens que procura lmpedlr a subida da mare com o auxillo de uma vassoura e, em conseqllencla da lncomp<~tl bllidade fatal entre o melo e o ttm, um tlpo notOriamente c6mlco. Se dlssermos que esta personagem slmbollzou a politlca dos par- tldas concUiadores na Revolu9da, parecera ezagtro. Ora, Tseretelll, o anlmador real do regime da dualldade de pod§res, conteuava a t. A notiela. d& morte de M:. N. Potrovt~ty, com quem mall de uma ves U~ OCUlAO de travar polAm1ea no decorrer deat& obra, chegou~not quando o traba1ho !6. eatava. termlnad.o. Vlndo para o marxl8lno da f&C91o Uberal, quando j6 .,. um a\blo completamente formado, Potrovak¥ enrlqueeeu a. Uteratura b1st6J:otoa cont.npor&n.ea com trabalhos e com 1Dlclativas preet.oau. mu n1o • apouau com.pietamente do m6todo do materlaltamo dlal6tlco. • de elemental' Ju.ttoa ~tar que Pokrovaky era homem dotado n1o ebmente de acepe1oDa1 erudl• 010 e de grande talento, como tamb6m devotado A. causa. que aema. • 'I'nKakT omtt.tu pe.rte d8llta aentenoa. que completa 6: "NI.o ehon.r, Dllll rlr, nem cleteetar, mu eompreender." [N. Co 2'.] 417 Nabokoo, um dos lideres liberais, apos a insurrei~ao de Outubro: "Tudo o que entlio jfzemos nado mais era que vii t~ntativa de canter, com a ajuda ae alguns pobres gravetos, a destruidora to"ente dos elementos desencadeados." Hd ntsto o tom de sdtira maldosa,· ora, estas sao as mais veridicas palavras que os pr6prios conciliadores pronunciaram a respeito deles mesmos. Abster-se de tazer ironiq. ao descrever "revoluciontirios" que tentam canter a revolu~lio cem gra- vetos seria, para a delicia dos pedantes, detraudar a realidade e taltar com a objetividade. Peter Struve, monarquista outrora marzista, escrevia do exi- lio: "Na Revolu~iio somente o bolchevismo to! que se manteve 16- g!co e fie! d sua pr6pria essencia; e fOi por isto que, na Revolu~ao, ele venceu." FOi aproxtmadamente em tl!rmos andlogos que Millu- koo, lider do llberalismo, se referia aos bolcheviques: "Sabiam aonde iam e marcharam numa unica dire¢o, adotada em definitivo, diri- vida para 0 lim que, a cada nooa experiencia ·malograda dos conci- liadore,~ mais se aproximavam". Enfim, um do8 menos conhectdos emfgrados brancos, ao tentar compreender, a seu modo, a Revolu9do, assim se exprlmia: "Para enveredar por aquele caminho eram im- prescindlveis hom ens de t=o. . . revolucion4rlos 'profissionais', que niio temessem trazer d tona um devorador espirito de rebelcUa." Po- de-se dfzer, dos bolcheviques, com multo mais razao do que dor ta- coblnos: siio adequados d epoca e as taretas dl!les ezlgidas; milhares de maldi~6er tl!m-lhes sido dirig!das; a ironia, porem, nao consegue atingi-los - porque nlio encontra alvo onde ae encravar. No pre/ticio do primeiro volume IOi explicado por que raziio julgou o autor mais adequado falar de si pr6prio, participante dos acontecimentos, na terceira pesroa em vez de taze-lo na primeira ,· i!rte procedlmento litertirio, conservado nos capftulos seguintes, ··niio t em s! mesmo garar,tia contra o subjetivismo; pelo menos nlio jaz ele do subjetivismo vma obriga¢o. Mell>or: traz sempre, d mente, a necesstdade de evttd-lo. Em muitos casas hesttamos baotante porque nao sablamos se deveriamos ou niio citar tal ou tal tufeo de um contempor4neo s6bre o papel do autor diJste llvro na marcha dos acontecimentos. Teria 3ido fticil renunclar a determ!nadas cita~ se se nlio tratasse, aquf, de alguma causa mais lm port ante do que as regras convencionais do bom-tom. 0 autor /Oi pre3ldente do Soolete de Petrogrado ap6s a conquista da maforia pelos bolcheviques; fOi, em segulda, presidents do ComlU Revoluciontirio Mil!tar que organfzou a insurrei¢o de Outubro. Ora, l!le nao pode,. nem deve, apagar semelhantes tatos da Historia. A tra~ao que atualmente governa a U RSS teve bastante tempo, nestes Ultimos anos, para consagrar uma verdadefra mul- tidao de artigor e nao menos de livr• ao autor da prerente obra, consagrando-os d tare/a de lfemonstrar que a atividade dele tinha 3ido !nvariavelmente d!rig!da contra os lnterl!rres da Revolu~; a questiio de· saber por que razdo o Partido · Bolchevique tomou a de- cistlo de colocar- um "adversdrl.o'' ttlo encarni~ado, durante .os mail crlticor periodos, nos mais pesados postos de responsabilldade, fica, neote caso, totalmente aberta a expl!ca¢es. Deizar completamente 418 em silencto discuss6es retrospecttvas serla, ate certo ponto, renun- ctar ao restabelectmento, em t6da a sua verdade, da marcha dos acontectmentos. Mas com que ttm? Uma especte de desprendtmento e necesstirto somente para aquele que objettva sugertr, em surdtna, ao lettor, conclus6es que nao decorrem dos tatos. Pretertmos cha- mar as cotsas pelo seu proprio nome, em total contormtdade com o vacabularto. Nao ocultaremos que, neste assunto, ndo se trata, para ·nos, apenas do passado. Assfm como os adversdrios, ao atacarem a pesaoa, se estor~am por attngtr o programa, tambem a !uta por determtnado programa obrtga a pessoa a se recolocar no seu Iugar real no meio dos acontectmentos. Se alguem, na !uta pela realtza~lio de grandes tare/as, ou na !uta pela conqutsta de Iugar sob uma bandeira, nao se sentir capaz de perceber cotsa alguma a!em da vatdade pessoal, podemos lamentti-lo mas nlio nos encarregaremos de convence-lo. Todavta, tomamos as medtdas necessO.rtas para que as quest6es "pes- soais" ndo ocupem neste ztvro mator lugar que aqueze a que t~m iliretto de pretender. Alguns amtgos da Unttl'o Sovtettca - e com trequencta nlio passam de amigos das autortdades sovtettcas atuats, e apenas por todo o tempo em que subststtrem estas autortdades - abrtram cam- panha contra o autor em vtrtude de sua atttude crtttca em re~ao ao Partido Bolchevique, ou em rela~lio a alguns de seus ltderes. Nem um deles, entretanto, tentou sequer refutar ou corrtgtr o quadro que apresentamos quanto ao estado do Partido no decorrer dos acon- tectmentos. Para governo de tats "amtgos", que se tulgam concla- mados a defender, contra nos, o papel dos bolchevtques na tnsur- rei~iio de outubro, preventmo-los de que nosso trabalho nao enslna meio algum de se amar tardtamente uma revolu~lio vttortosa, na figura da burocracta que dela resultou, mas s<lmente enstna de que modo se prepara uma revolu¢o, como se processa o seu desenvol- vtmento, e a manetra pela qual ela alcan~a a vtt6rta 0 partido, para n6s, niio e um aparelho cu1a tnfaltbUtdade devesse ser prote- gtda por meio de repress6es governamentats, mas um organtsmo complexo que, como qualquer colsa vtva, se desenvolve dentro de contradi¢es. 0 descobrtmento das contradi¢es e, a partir dessas contradi¢es, os erros e as hestta~/les do estado-maior, absoluta- mente nlio enfraquece, segundo nossa aptnilio, a tmport4ncta do gtgantesco trabalho htst6rico de que o Partido Bolchevfque suportou o fardo, pela prtmeira vez, na Htst6rta mundtal. . L. TRoTsxY Prtnktpo 13 de maio de 1932. P .s. - Os crittcos sempre prestaram o seu trtbuto a tradu~ao de Max Eastman. ~le deu ao seu trabalho nlio somente um dom crta- dor de esttlo, mas tambtlm o cartnho de um amigo. Subscrevo com stncera grattdlio a voz un4ntme dos crittcos. L.T. 419 Capitulo I AS "JORNADAS DE JULHO": Preparatives e lnicio E 11 1915 a guerra custou, ii. Russia, dez bllhties de rubles; 19 bllhties em 1916; no prlmelro semestre de 1917 ja custara 10 bllhties e melo. A divlda publica, em principles de 1918, devla elevar-se a 60 bllhties, lsto e, quase lgualar ii. totalldade do produto nacional bruto, avallado em 70 bllhties. 0 Comite-Executivocentral elabo- rara um projeto de conclama~iio popular a n6vo emprestlmo de guerra, batlzado com o nome sedutor de "Emprestlmo da Llberdade", ao passo que o Governo chegara ii. dedu~iio simpllsta de que, a menos que um n6vo e formidavel emprestlmo externo t6sse con- cedldo ii. RU.Ss!a, ele niio s6mente niio poderia saldar as divldas das encomendas feltas ao estrangeiro como tampouco poderia tazer face As pr6prlas obrlga~ties internas. Crescia constantemente o passive da balan~a comerclal. A Entente dlspunha-se, evldentemente, a abandonar em definitive o ruble ii. pr6pria sorte. No mesmo dia em que a conclama~iio ao Emprestlmo da L!berdade encheu a prlmeira paglna do Izvestia sovletlco, o Vyestnik • anunciou subita queda na cota~iio do ruble. A impressora de papel-moeda ja niio mais podia acompanhar o rltmo da infla~iio. Depois de consumldas as antlgas e s61ldas divisas que ainda havlam conservado vestigios do antigo poder aqulsltlvo, todo mundo se preparava para usar as cl!dulas aver- melhadas, que apenas poderiam servir como r6tulos de garrafas, e que o publico lmediatamente batlzou de "kerenskls". E tanto o burgues como o operarlo davam, cada urn ii. sua manelra, ii.quela alcunha, urn tom desdenhoso. 0 Governo, verbalmente, aceitava o programa de uma regu- lamenta~iio estatal da economia geral e chegou mesmo a crlar, para tal flm, nos ultimos dlas de junho, estorvantes 6rgiios. Mas a pa- lavra e a a~ao, ao tempo do regime de Fevereiro, tal qual a carne e o espirito de qualquer crlstiio devote, achavam-se em confllto ln- cessante. Os 6rgB.os de regulamenta~io, adequadamente selecionados, preocupavam-se mats em proteger os chefes de empresas, contra os caprlchos de um poder governamental oscilante e vacllante, do que • vestntk Praptelstva (Mensagetro ao aoverno) [N. da ed. fr,) 421 em tratar de refrear os lnteresses partlculares. 0 pessoal admlnls- tratlvo e tecnlco da Industria dlferenclava-se; os dlrlgentes, assus- tados com as tendi!nclas nlveladoras dos operarios, passavam reso- lutamente para o !ado dos patroes. Os operarlos olhavam com re- pulsa as encomendas de guerra, com garantla de um ou dols anos de anteclpa~ii.o as lndijstrlas desorganlzadas. Os patroes, porem, lam perdendo o estimulo por um trabalho de produ~ao que mals pro- metla amola~oes do que proveltos. A lnterrup~ao do funclonamento das empresas, premedltada pelos patroes, tomou carater sistema- tico. A produ~ao metalftrglca sofreu redu~ii.o de 40% e a textll de 20%. come~ou a faltar tudo o que constltuia o estrltamente neces- saria a exlsti!ncla. Os pre~os sublam proporclonalmente a lnflaQii.o e a decadencla econ6mlca. Os operarios batalhavam por estabelecer um contrille a6bre o mecanlsmo admlnlstratlvo e comerclal, o qual lhes era dlsslmulado, e do qual dePendla a sorte deles. 0 Mlnlstro do Trabalho, Skobelev, por melo de ma11lfestos prollxos, explicava aos operarlos a lmposslbllldade de uma lntervenQiio dlreta nas em- presas. A 24 de junho o Izvestia anunclou que se projetava fechar certo numero de fabrlcas. Noticlas ldi!ntlcas chegavam das provin- clas. 0 trafego pelas estradas de ferro sofria ainda mals profunda- mente do que a Industria. A metade das locomotlvas tlnha necessl- dade de grandes consertos; grande parte do material rodante se achava no front; o combustive! comeQava a faltar. 0 Mlnlsterio das Vias e COmun!caQ6es niio consegula p6r termo aos conflitos com os empregados e operarlos das estradas de ferro. 0 abasteclmento tor- nava-se dla a dla mas precarlo. Em Petrogrado exlstlam apenas es- toques de trigo para dez ou qulnze dlas; em outros centros as colsas niio andavam melhor. A semlparalisa~ii.o do material rodante e a amea~a de uma greve das estradas de ferro slgnlflcavam que o pe- rlgo da tome era constante. Niio se tinha dlante dos olhos nenhuma perspectiva de evasao. E na.o era isto que os operi.r!os havlam es- perado da Revolu~iio. A sltua~iio era alnda plor, se houvesse posslbllldade de o ser, no terreno da politlca. A lrresoluQiio e o estado de espirito mais pe- noso tanto na vida dos governos, das na~oes, das classes, quanto na dos lndlviduos. A revolu~iio t! o mals lmplacavel dos melos que se possul para resolver as questOes hlst6rlcas. E as escapat6rlas, em ocasliio de revolu~iio, constltuem a mals rulnosa dentre t6das as politlcas. Um partido revoluclonarlo niio deve hesltar mals do tiue o deve um clrurglao que come~a a enterrar o blsturl no corPo de um doente. Ora, o regime do duplo poder, nascldo da lnsurrel~ii.o de Feverelro, era a irresoluQiiO organlzada. Tudo se voltava contra o governo. os amigos condicionais transformavam-se em adversS.rtos, os adversS.rios em inimigos - e os inimigos se armavam. A contra- revolu~ao se mobilizava abertamente, inspirada no comU:.e-central do Partido Cadete, pelo estado-malor politico de todos os que tlnham alguma coisa a perder. 422 0 comlte principal da Unliio dos Oflclals, que funclonava no quartel-general, em Moghllev, e representava, aproxlmadamente, cern mil oflclais descontentes e o Sovlete da unliio das tropas cossacas, em Petrogrado, constituiam as duas principals alavancas mllltares da contra-revolu~iio. A Duma de Estado, apesar da declsiio tomada pelo Congresso dos Sovletes, em junho, decld!u prossegulr em "sessOes secretas". 0 comite provis6rio desta Duma servia de cober- tura legal da atlvldade contra-revoluc!onar!a, largamente flnan- clada pelos bancos e pelas emba!xadas da Entente. Os concll!adores vlam-se amea~ados tanto pela esquerda como pela d!relta. Olhando lnqu!etamente para todos os !ados, o Governo dec!dlu asslnar urn cred!to para a organlza~iio de urn servl~ de contra-esplonagem so- cial, lsto e, para a organ!za~iio de uma polic!a politlca secreta. E fol nesta mesma epoca, em meados de junho, que o Govilrno resolveu f!xar para o d!a l'i de setembro as elel~6es a Assemblela Constltu!nte. A lmprensa l!beral, apesar de todos os cadetes partl- c!parem do Govemo, d!rlgla uma campanha encaml~ada contra a data oflc!almente f!xada, cousa em que, allas, n!ngm!m acredltava e defendla aerlamente. A propria lmagem de uma Assemblela Cons- tltulnte, tao nltlda nos prlme!ros d!as de mar~o. la-se apagando, desvanecendo-se. Tudo se voltava contra o Governo, Inclusive contra aa suas raras e anemlcas boas lnten~6es. Fo! sbmentc a 30 de !unho que ele se decld!u a suprlm!r os tutores nobres das alde!as, os zems/qf nach.alnlks,' cuja pr6pr!a denomlna~lio era odlada em todo o pals desde o ella em que foram lnstltuldos por Alexandre m. E esta reforma parcial, for~ada e tardla, lan~ava s6bre o Govemo Pro- vlsOrlo a pecha de uma humllhante covardla. Entrementes, a no- breza se refazla de seus terrores, os proprletarlos dos latltundlos se reagrupavam e retomavam a ofenslva. 0 comlte provls6rlo da Duma exlg!u do Govemo, em fins de ! unho, que tolllasse medldas declslvas para proteger os proprletar!os contra os camponeses lnstlgados por "elementos crlmlnosos". A 19 de juillo ln!clou-se em Moscou, o con- gresso pan-russo, de propr!etarlos rurals, que, em sua esmagadora malorla, eram nobres. Q Govemo safava-se esfor~ando-se por hlp- notlzar, por melo de palavras, ora os muj!ques ora os proprletarlos. Mas era sobretudo no front que as co!sas camlnhavam mal. A ofenslva, que slgnlflcava para Kerensky o liltlmo lance deflnltlvo para entrentar a !uta lntema, revelava apenas alguns mov!mentos convuts!vos. 0 soldado niio querla mals prossegulr na guerra. Os dl- pJomatas do Principe Lvov niio mats ousavam oillar face a face os dlplomatas da Entente. Tlnha-se absolutamente necessldade do em- prestlmo. Para demonstrar for~a. o Governo, lncapaz e de antemiio condenado, dlrlg!u uma o!enslva contra a Flnlandla, a qual, como em todos os assuntos pouco llmpos, Jevou a termo por melo dos so- 1. Oflc11U& nomeados, com pod.er a.dm1ntatratlvoa e JudlclalsObre a populao&o cam· poaesa. local. 423 clallstas. Concomltantemente, o confllto com a Ucrfmla se agravava e amea~ava acabar em rutura declarada. Quii.o longinquos estavam aqueles dlas em que Albert Thomas cantara as loas da radlosa Revolu~ii.o e de Kerensky! Em prlnciplos de julho, Paleologue, embalxador da Fran~a. txcesslvamente lm- pregnado dos odiires dos saloes raputlnlanos, fol substltuido pelo "radical" Noulens. 0 jornallsta Claude Anet apresentou ao niivo em- balxador urn relatOrio lnstrutlvo siibre Petrogrado. Defronte da em- balxada da Fran~a. do outro !ado do Neva, estende-se o balrro de Vyborg. "Iii o quartelrii.o das grandes uslnas, totalmente em mao de bolchevlques. Iii como senhores que Lenlne e Trotsky all rein am." "No mesmo bairro estS.o as casernas do Regimento de M.etralha• dores, cujo efetlvo e de cerca de 10 mil homens, com armamento de mais de mil metralhadores: nem os soclallstas revoluclom1rlos, nem os menchevlques, tern acesso as casernas do reglmento. Os demals re_gimentos, ou s§.o bolcheviques, ou sio neutros." "Se Lentne e TrotskY qulserem tomar Petrogrado, quem os lmpedlra ?" Noulens ouvia com espanto. "Como se explica que o Governo tolere seme- lhante sltua~ii.o?" "Mas que pode ele fazer?", respondeu o jorna- llsta. "It preclso que se compreenda que o Govemo, a seu favor, conta apenas com fOr~a moral, e esta. mesma par,ece-me bastante fraca ... " Por nii.o encontrar saida, a energla das massas, despertada, fraclonava-se em movlmentos espontfmeos, em atos de partl&ans, em tomadas de posl~ao arbltrarlas. Os operarlos, os soldados e os camponeses, tentavam resolver ao menos parclalmente tudo aqullo que lhes recusava o poder por eles pr6prlos crlado. A lrresolu~ii.o dos dlrlgentes e o mals poderoso debllltador das massas. A expec- tatlva ester!! lmpele-as a bater, cada vez mals telmosamente, as portas que se lhes nii.o querem abrlr, ou entii.o leva-as a verdadelras explos6es de desespero. Ja durante o Congresso dos SOvletes, quando os provlnclanos com dlfleuldade eontlveram a mii.o dos lideres que se levantava contra Petrogrado, os operarlos e os soldados tlveram mnltas ocasliies de constatar quais eram os sentlmentos e as lnten- Qiies dos dlrlgentes dos sovletes em relaQii.o a oles. Tseretelll, depols de Kerensk:y, tomara-se personagem nio sOmente estranho como tambem odloso a malorla dos operarlos e dos soldados de Petro- grado. Na perlferla da RevoluQio crescla a lnfluencla dos anarqnlstas, que desempenhavam o papel principal no selo de um comlte revo- luelonarlo arbltrarlamente crlado na vlla Durnovo. Todavla, mesmo as mals dlsclpllnadas eamadas da elasse operarla, e mesmo as amplas esferas do Partido Bolchevlque, comeQavam, ou a perder a paclencla, ou a dar ouvldos aqueles que nii.o mals podlam suportar as colsas. A manlfesta~iio de 18 de junho revelou, abertamente, que o Oovemo nii.o mals dlspunha de qualquer apolo. "Que e que estii.o esperando os Ia de elma ?", perguntavam os spldados e os operarlos, quando se referiam nio s6 aos lideres conciliadores como, agora tambem, as lnstltul~iies dlrlgentes dos bolehevlques. 4Z4 A !uta pelos sal:irlos, devida aos pregos inflacion:irios, ener- vava e extenuava os trabalhadores. Foi este urn problema que se for- mulou com acuidade particular, no decorrer do mes de junho, na gigantesca fabrica de Putilov, na qual trabalhavam 36 mil homens. A 21 de junho, em varios setores da usina, estourou a greve. A este- rilidade desta.s explosOes parciais era demasiado clara para o par- tido. No dia seguinte, a reun!ao d!rlg!da pelos bolchev!ques, con- gregando representantes das principals organiza~oes operar!as e de- legados de setenta usinas, declarou que "o caso dos trabalhadores de Putilov representava a causa de todo o proletariado de Petro- grado" e convidou os trabalhadores de Putilov a· "canter sua legi- tima indignac;ao". Foi adiada a greve. Entretanto, os doze dias que se seguiram nao trouxeram alterac;ao alguma a situac;ao. A massa oper:iria das f:ibricas achava-se em processo de fermentac;B.o pro- funda, a procura de uma saida. Em cada empresa existia urn con- flito, e todos estes conflitos convergiam para cima, para o Governo. Um relatOrio do sind!cato dos meeil.nlcos ferrovilir!os (br!gadas 11- gadas B.s locomotivas), dirigido ao ministro das Vias de Comunica- c;io, dlzia: "Pela Ultima vez declaramos que qualquer pactencia chega ao f!m. Nao nos sentimos ma!s com f6r~as para vlver em se- melhante s!tua~iio ... " Era esta uma queixa que se dir!gia niio s6 contra a m!serla e contra a fome, mas tambem contra a dupl!c!- dade, contra a falta de carater e contra a lmpostura. 0 memorial protestava com particular lndlgna~ao, contra "os lncessantes apelos ao dever clvlco e contra a abstlnencia das barrlgas vazlas". Em mar~o era o poder restltuldo ao Governo Provls6rio pelo Comlte-Executlvo, sob a condl9iio de que as tropas revoluclonarlas nii.o fiissem, de mane!ra alguma, evacuadas da capital. :fi:stes dlas, porem, pertenclam ja a longlnquo passado. A guarn!~ao evolulra para a esquerda e os c!rculos d!rlgentes do Sovlete cam!nharam para a dlrelta. A !uta contra a guarnl~iio estava constantemente na or- dem do dla. Se os contlngentes nii.o eram de uma vez afastados da capital, os mals revoluclonarlos, a pretexto de necessidade estrate- glca, eram slstematlcamente enfraquecldos por me!o de ret!radas de companhlas com destine ao front. Chegavam, ininterruptamente, 3. capital boatos de constantes remodela~oes nas unidades do frOnt, em virtude da insubmissiio, uma vez que se recusava a executar as ordens de combate. Duas divisOes siberianas - h:i pouco tempa ainda ni.o eram os cac;adores stberianos reputados como os melhores? - foram dlssolv!das, tendo sldo necessar!o o emprego de for~a armada. 86 no caso de 59 Exercito, o mats prOximo da capital, que havia recusado, em massa, obedecer as ordens de combate, oitenta e sete oflcla!s e 12.725 soldados foram pronunc!ados perante os tribunals. A guarniGii.o de Petrogrado, verdade!ro acumulador dos desconten- tamentos do front, da aldeia, dos bairros operArios e das casernas, nao parava de agitar-se. QuarentOes barbudos exigiam, com insis- tencia exacerbada, o regresso aos lares para se dedicarem ao tra- balho dos campos. Os reg!mentos acantonados no bairro de Vyborg - 19 de Metralhadores, 19 de Granadelros, Reg!mento Moscovlta, 1801' de Infantaria e ainda outros - achavam-se constantemente submetldos ao jato ardente da vlzlnhan~a proletaria. Mllhares de trabalhadores passavam dlante dos quarteis, e entre ~les grande mimero de infatlgavels agitadores do bolchevismo. Improvlsavam-se comicios quase que lncessantemente sob as muralhas imundas que ae t.ornaram odlosas. A 22 de junho, quando as manlfesta~oes pa- tr16tlcas desencadeadas pela ofensiva alnda niio se havlam extln- guldo, um auto do Comit~-Executivo teve a imprudencia de envere- dar pela Perspectiva Sampsonievsky, a exlbir cartazes: "Avante, Kerensky!" 0 Regimento Moscovita ·prendeu os agitadores, rasgou os cartazes e remeteu o autom6vel dos patrlotas ao Regimento de Metralhadores. Os soldados, via de regra, mostravam-se mais lmpacientes que os operarlos: prlmelro porque estavam sob amea~a dlreta de serem enviados ao front; e segundo porque assiml!avam com malor dlflcul- dade as razoes da estrategia poUtica. E alem de tudo mais, cada sol- dado tinha em miio o fuzll e, depois de feverelro, o soldado se mos- trava propenso a superestlmar o poder especiflco daquela arma. Llzdln, velho operario bolchevique, contava, mais tarde, de que modo os soldados da reserva. do 1801' !he havlam falado: "Que fazem os nossos no Pall1cio de Ksheslnskaia?. . . Sera que dormem?. . . Vamos expulsar Kerensky!" Nas reunifies de reglmentos, votavam-se cons- tantemente m~oes referel}teS a necessidade de aglr contra o Oo-verno. Delega~oes de algumas fabrlcas apresentavam-se aos quar- teis, perguntando aos soldados se sairiam as ruas. Os metralhadores envla.vam os pr6prios representantes a outras unidades da guarni- ~iio. convidando-as a. se insurglrem contra o prolongamento da guerra. Mais impacientes que OS outros, alguns delegados acrescen- tavam: "0 Reglmento Pavlovsky, o Regtmento Moscovita e 40 mil operarios de Putllov sairiio 'amanhii' ." As admoestacoes oflciais do COmite-Executivo mostravam-se lneficazes. Cada vez mais preclso desenhava-se o perigo de ver-se Petrogrado, sem apoio do trotrt e das provlncias, derrotado em separadQ. A 21 de junho, Lenlne, no Pravda, concitava os operarios e os soldados de Petrogrado a espe- rarem pelo dia em que os acontecimentos trouxessem volumosas re- serva.s a causa da capital. "Compreendemos a .amargura, compreen- demos a. efervescencia dos operarlos de Piter •. N6s, porem, lhes dize- mos: Camaradas, neste memento a agio direta n.i.o seria raclonal." No dia segulnte, os bolcheviques dirigentes que, aparentemente, se colocavam "mais a esquerda" do que Lenine, concluiram que apesar do estado de esplrito dos soldados e das massas. operarlas niio se devla ainda aceltar a batalha: "Vale mals a pena esperar que os partidos do Ooverno se tenham deflnitlvamente coberto de vergonha, para lniciar a ofenslva. Nesta hora, entiio, teremos a partlda ganha." l!l o que narra Latsls, organlzador de balrro, um dos mals lmpaclentes na.queles di&s. 0 Comlte cada vez mals freqiientemente se via obri- gado a enviar agitadores. as casernas, a fim de evitar uma a~iio pre- • Abrevtatura de SAo Petersburgo. [N. 4o T.] 426 matura. Os bolchev!ques de Vyborg, meneando a cabe~a. confusos, lamentam-se entre sl: "Devemos fazer o papel de pe~a de decora- 9RO." Entretanto, crescem dla a dla os apelos para sa1r as ruas. E muitos dos apelos sao claras provoca9(les. A organlza9iio mllltar dos bolchevlques vlu-se constrangida a dlrlgir um manifesto aos sol- dados e operarlos: "Niio devels dar credlto a. qua.lquer ap~lo !an9ado em nome da orga.nlza~iio mllltar para. salr as ruas. A orga.nlza9ao mllltar nao f~z nenhum a.~lo para. que vos manlfestels". E mals adlante, com malor lnsls~ncla.: Devels eX!glr de qualquer agltador ou orador que vos Incite a. agir em nome da. orga.nlza9ao mllltar, que a.presente um certlflcado asslnado pelo presldente e pelo secreta- rio da Organizac;io." Na. famosa Pra.9a Ya.lrotny, em Kronstadt, onde os anarqulstas levantam cada dla mala ousadamente a. voz, prepara.m-se ultlmatos sabre ultimatos. A 23 de junho, delegados da Pra9a. Yakorny, sem o assentlmento do sovlete de Kronstadt, eX!glram do Mlnlsterlo da Just19a. a llberdade de um grupo de a.narqulstas de Petrogrado, amea9ando, caso nada consegulssem, um assalto il. prlsao, pelos ma- rlnhelros. No dla segulnte, representantes de Oranlenba.um decla- raram ao mlnlstro da. .Justl9a. que a. guarnl9iio, da qual fazlam parte, estava ela tambem perturbada com as prlsaes levadas a. efelto tanto na vlla Durnovo como em Kronsta.dt, e que na guarnl9iio "Ja se a.r- mavam as metralhadoraa." A lmprensa burguesa apanhou no ar essas amea9as e esfr~~gou-as no rosto de seus alla.dos, os conclllado- res. A 26 de junho chegavam da. frente de ba.talha. a.o ba.talhiio de reservas, onde servlam, alguns delegados do Reglmento de Grana- delros da Guarda, trazendo a. segulnte declara.9iio: "0 regimen to esta contra. o Gov~rno Provls6rlo e eX!ge que o poder passe a.os So- vletes; o reglmento recusa-se a partlclpar da ofenslva lnlclada por Kerensky; o reglmento pergunta, com lnqu!eta9iio, se o Comlte-Exe- cutlvo com seus minlstros .so.clallstas tomou o partido dos burgueses." 0 6rgiio do Comite-Executlvo publlcou, a respelto desta vlslta, urn relat6rlo chelo de reprova96es. Grande era a etervescencia. nao apenas em Kronstadt mas tambem em tooa a esquadra do Baltlco, cuja base principal era Helsingfors. 0 mals atlvo elemento bolchevique, na esquadra, era, ln- contestavelmente, Antonov-Ovseenko, o qual, alnda ao tempo em que era jovem oficlal, particlpara do levante de Sebastopol, em 1905; menchevlque durante os anos da rea9iio, emlgrado lnternaclonallsta durante os anos da guerra, colaborador do Trotsky quando da publl- cac;i.o, _em Paris, do jornal Nashe Slovo •, unira-se aos bolcheviques asslm que retornou da emlgra9iio. Pouco flrme em politlca, porem pessoalmente corajoso, impulsive, desorganizado mas capaz de ini- citativa e de improvisar:fio, Antonov-Ovseenko, ainda mal conhecido ila epoca. assumiu, em seguida aos acontecimentos da Revolm;ao, um lugar que longe estava de ser o Ultimo. "Em Helsingfors, no Co- mite do Partido - conta eie nas mem6rias que escreveu - compre- • Noasa Palavra. [N. da E.] 427 endiamos a necessldade de ser paclente e de nos prepararmos com serledade. Recebiamos, alnda, neste sentldo, lnstru~6es do Comlte- central. Tlnhamos, todavla, perfelta conscl~ncla da lnelutabUidade de uma explosao e olhavamos apreenslvos para os !ados de Peters- burgo." Ora, neste !ado acumulavam-se, dla a dla, os elementos ex- ploslvos. 0 29 Reglmento de Metralhadores, mals atrasado do que o 19, votou uma resolu~ao pela transmlssao do poder aos Sovletes. 0 39 R<>glmento de Infantarla nao permltlu que partlssem para o tront quatorze ·companhlas que havlam sldo destacadas. As reunl6es nos quartels assumlam um carater de hora em hora mals tempes- tuoso. Um comiclo reallzado no Regimento dos Granadelros, a 19 de julho, proporclonou a ocaslao para a deten~ao do presldente do co- mite e para que obstrulssem os or adores menchevlques: Abalxo a ofenslval Abalxo Kerenskyl No centro da guarnl~ao estavam os me- tralhadores que abrlram OS diques aS torrentes de jUihO. 0 nome do 19 Reglmento de Metralhadores ja nos passou sob os olhos no curso dos aconteclmentos dos prlmelros meses da Re- vlu~ao. !ate reglmento que, por lnlclatlva pr6prla, se trasladou de Oranlembaun para Petrogrado logo ap6s a lnsurrel~ao, "para de- fender a Revolueao", encontrou lmedlatamente a reslstencla do Co- mlte-Executlvo, o qual tomou a segulnte declsao: agradecer ao Re- glmento e taz~-lo voltar para Oranlembaun. Os metralhadores re- cusaram-se peremptorlamente a delxar a capital. "Os contra-revolu- clonarlos podem lnvestlr contra o sovlete e restabelecer o antigo regime.'' 0 Comlte-Executlvo fol foreado a ceder e multos mllhares de metralhadores permaneceram em Petrogrado e com suas metra- lhadoras. Inatalados na Casa do Povo, nao sablam sequer o que serla d~les. Entre ~lea, entretanto, havla grande nlimero de operarlos de Petrogrado e nao to! slmplesmente por acaso que o Comlte dos bolchevlques se encarregou dos metralhadores. A lnterveneio do Comlt~ assegurou o abasteclmento dos soldados, sendo os viveres re- tlrados da fortaleza de Pedro e Paulo. Estabelecera-se a amlzade. Em breve ela se tornarla lncondlclonal. A 21 de J unho os metralha- dores, em assemb!6!a-geral, tomaram a segulnte resolueao: "Daqul por dlante s6 seriio envlados efetlvos para o front caso a guerra as- soma carater revoluclonSrlo." A 2 de Julho o reglmento organlzou na Casado Povo um comlclo de despedlda dedlcado a "Ultima" com- panhla que era envlada para o front. Nessa ocaslio falaram Luna- charsky e Trotsky: as autorldades, mals tarde, tentaram dar a este lncldente uma excepclonal lmportancla. Em nome do reglmento res- ponderam o soldado ZhUin e um velho bolchevlque, o Suboflclal Las- hevlch. Grande era a excltaeao, estlgmatlzava-se Kerensky, jura- va-se fldelldade a Revoiueao, mas nlnguem propos resolue6es pra- tlcas para um futuro pr6xlmo. Entretanto, Jli. desde alguns dlas, na cidade aguardava-se curiosamente os acontecimentos. As "Jor- nadas de Julho" projetavam, de antem.io, a sua sombra. "Por toda a parte, de todos os lades", escreve Sukhanov em suas notas, "no Sovlete, no Palacio Marllnsky,nos lares, nas pr~as e 4ZB "''s bulevares, nos quartets e nas fabrlcas, falava-se a respelto de c crtas manlfesta~oes prevlstas para qualquer dla. . . Nlnguem sabla Ro certo quem se !ria manifestar, nem como, nem onde. A cidade, porern, sentia-se em vesperas de qualquer explosio." E a manifes- ta~ao realmente se desencadeou. 0 lmpulso partlu de clma, das esferas dlrlgentes. No mesmo dla em que Trotsky e Lunacharsky falavam no Regi- mento de Metralhadores da incapacldade da collga~ao, quatro ml- nistro cadetes, estourando a coliga~ao, abandonavam o Govemo. E: como pretexto, escolheram o fato, para eles inacettavel - em razao das pretens6es que acalentavam de desempenhar papel de grande poder - do compromlsso que ·seus colegas concllladores ha- viam assumido com a Ucrinia. A verdadeira causa desta rutura demonstratlva resldla no fato de que os concllladores nao conse- gulam refrear as massas. A escolha do memento fol sugerlda pelo desastre da. ofenslva, alnda nao confessado oflclalmente, mas que nio ofereeia a menor sombra de dlivida para as conhecedores do assunto. Os liberals julgaram oportuno delxar que os allados de esquerda enfrentassem a derrota e os bolchevlques. 0 rumor da demlssiio dos cadetes propagou-se rapldamente pela capital e per- mltlu uma generallza~ao polltlca de todos os conflltos sob uma ilnlca palavra de ordem, mals exatamente, sob urn s6 grlto de angilstla: e preclso acabar com t6da esta palha9ada de collga9ao! Os soldados e os oped.rlos achavam que t6das as outras quest6es dependlam da solu9ao que fosse dada ao problema do poder, lsto e, dependlam de ser 0 pals govemado ou pela burguesla ou pelos sovletes: salarlos, pre9o do pii.o, obrlga9ii.o de se delxar rna tar no front para fins lgnorados. E .c~esta atltude de expectatlva havla uma certa dose de llusii.o Ja que as massas contavam consegulr, em vlrtude da troca do poder, a solu9ii.o lmedlata de todos os problemas angustlantes. E no final das contas tlnham razao: a questiio do poder determlnava a dlte9ii.o de t6da a Revolu9ao e, por consegulnte, flxava o destlno de cada cldadao em particular. Serla subestlmar dellberadamente Mlllukov supor que os cadetes nao pudessem prever as repercussoes do ato de sabotagem que havlam declarado em re- la9iio aos sovletes. 0 lider do llberallsmo evldentemente esfor9ava- se por arrastar os concllladores a uma sltua9ao critlca, totalmente sem vias de salda, a nao ser pelo emprego de balonetas: naqueles dlas, Julgava <He plamente que alnda era possivel salvar a s1tua9ao por melo de uma sangria desatada. A 3 de Julho, ja pela manhli, varlos mllhares de metralhadores, lnterrompeqdo bruscamente uma reunlao dos comlt!s das pr6prlas companhlas e do reglmento, elegeram presldente um dos compa- nhelros e exlglram que se pusesse em discussao, lmedlatamente, o assunto da manlfesta9ii.o armada. 0 meeting logo tomou aspecto tumultuoso. A questiio da partlda para o front se entrecruzava com a crise governamental. 0 bolchevlque Golovin, presldente da assem- blela, tentava !rear a agtta9ii.o por melo de proposta de entendl- mento prevlo com as outras unldades do Exerclto e com a Organ!- 4Z9 za9iio mllltar. Mas qualquer alusiio a adlamentos enfurecla os sol- dados. Fol nesta reunliio que surglu o anarqulsta Blelchman, perso- nagem apagado, porem que se destacara no quadro de 1917. Pos- suldor de bem modesta bagagem de !deias, porem de faro seguro perante a massa; slncero em seu espirlto llmitado, porem sempre lntlamado; o blusao aberto ao pelto, a cabelelra cacheada e hlrsuta, Blelchman consegula despertar nos comiclos mimero apreclavel de simpatlas melo lronlcas. Os operarlos olhavam-no, e bern verdade, com reservas e com certa lmpacU!ncla - sobretudo os metahirglcos. Os soldados, porem, sorrlam alegremente aos dlscursos dele, cutucan- do-se uns aos outros e estlmulando o orador com expressoes mor- dazes: sentlam-se evldentemente com boa dlsposl9iio a favor dele, em vlrtude de sua aparencla excentrlca, de seu tom resoluto de homem de pouco raclociulo e por seu sotaque judeu-amerlcano actdo como vlnagre. Em fins de junho, Blelchman nadava por toda a sorte de meeting lmprovlsados, tal como um pelxe dentro d'agua. Exprlmla sempre a mesma oplnliio quanto a. declsiio a ser tomada: sair, de armas nas mlios. A organlza9iio? "Iii a rua que nos organl- zara." 0 flm em vista? "Derrubar o Governo Provlsorlo, tal como jli. se derrubou o tzar, se bem que, ate entiio, nenhum s6 partido se tlvesse manlfestado neste sentldo." Arengas semellmntes, no mo- mento, correspondlam plenamente as dlsposl96es dos metralhadores, e niio apenas doles. Numerosos eram os bolchevlques que niio ocultavam a satlsfa~iio de ver a base desprezar as admoestaQ6es oflclais que eles mesmos fazlam. Os operarlos de vanguarda lem- bravam-se de que, em Feverelro, os dlrlgentes se havlam preparado para dar 0 sinal de retlrada, justamente a.s vesperas da vltorla; de que, em marQo. a jornada de trabalho de otto horas fora con- qulstada por !nlclatlva da base; e que, enflm, em abrll, Ml!lukov tlnha sldo derrubado pelos reglmentos que espontiineamente havlam saido a rua. A recordaQiio di!stes fatos Ia ao encontro da opiuliio das massas, opiuliio Ja por demals tensa e lmpaclente. A Organ!za9iio mllltar dos bolchevlques, !nformada lmedlata- mente da efervescencla que relnava no meeting dos metralhadores, envlou a reunliio, um apos outro, dlversos agltadores. Cedo chegou. em pessoa, o proprio Nevsky, dlrlgente da OrganlzaQiio milltar e multo estlmado pelos soldados. Parece que !he deram ouvldos. Mas, como o meeting se prolongava lntermlnavelmente, as dlsposl~oes do audltorlo lam mudando, asslm como a sua composl9iio. "Fol para n6s grande surpri!sa", narra Podvolsky outro dlrlgente da OrganlzaQiiO mllltar, "quando, as 7 horas da nolte, chegou a galope um estafeta para nos anunclar que. . . os metralhadores havlam novamente decldldo manlfestar-se." Em substltul~ao ao antigo co- mite do regimento, eJegeram um comite revoluciorui.rio provis6rio, constando de dols homens por companhla, sob a presldencla do Subtenente Semashko. Delegados espectalmente deslgnados lnlcia- ram a ronda pelos reglmentos e pelas fabrlcas a flm de solicltar apoio. E clara que os metralhadores n&o se esqueceram de enviar iambem emissarlos a Kronstadt. Di!ste modo, num plano abalxo das 4311 organiza~es oflclals e parclalmente sob a oobertura dela.s, se es- terullam novos la~os temporBrios entl"e as m&ia exasperadas usiBa8 e os reglmentos. As massas nio tenclonavam romper como Soviete; ao cont.-arlo, desejavam ela• que ele se apoderasse do poder. MUlto' menos alnda estavam elas dlspostas a romper com o Partido Bol- chevlque. Mas este partido parecla-lhes !rresoluto. Elas desejavam silmente dar um empurrii.o, amea~ar o Com!te-Executlvo e !mpeilr os bolchevlques para a frente. Foram !mprovlsadas delega~es, foram crlados novas pontos de llga~ii.o e centl"os de a~o, nii.o permanentes, mas a.daptados ao caso presente. As c!rcunstf&nclas e os estados de oolnlii.o modlflcam-se tii.o raplda e tii.o bruscamente que mei!Dlo a mals flexivel organlza~ii.o, como a dos sovietes, lnevitavelmente se atrasavam, obrlgando as massas a !mprovisar, a cada passo, cirgii.os a11Xillares destlnados a resolver as necessldades do mom en to. Em semelhantes !mprovlsa~oes, multo freqiientemente, lnslnuam-se de surpresa elementos ocaslonals nem sempre multo seguros. Os anar- qulstas jogavam lenha na fogue!ra, no que eram lm!tados por al- guns novi~os do bolchevlsmo, tamb<!m presas de lmpaclencla. Indu- bltavelmente lncorporaram-se ao movimento alguns provocadores, talvez meamo agentes da Alemanha, e sem dlivlda sobretudo agentes da oontl"a-esplonagem da rea~ii.o russa. Como desemaranhar, flo a flo, o complexo tecldo dos movimentos de massas? 0 carater geral dos aconteclmentosdesenha-se, nii.o obstante, com toda a. sua clareza. Petl"ogrado adqulrla oonsclencla da p•6pria fllr~a. tomava lmpulso, esquecendo de olhar para tl"as, para. as provlnclas, ou para a frente, para o tront. E o pr6prio Partido Bolchevlque ja nii.o era mals capaz de moderar a capital. Nesta oonjuntura silmente a ex- perlencla poderla ajudar. Ao chamar os reglmentos e os operarlos para a rua, os dele-· gados dos metralhadores nii.o se esqueclam de acrescentar que a manlfesta~ii.o devia ser armada. Slm, e como fazer de outro modo? 1!: clara que nlnguem val, desarmado, expor-se aos golpes dos adver- sarlos. Alem dlsto, e talvez fosse lsto o essenclal, era preclso mos- tl"ar a pr6prla fOr~a; ora, soldado que nii.o tern fuzU lamals e fOr~a. Neste ponto, porem, todos os reglmentos e todas as uslnas tlnham a mesma oplniio: caso se procedesse a manifestaQi.o, nio se po ... derla presclndlr de munl~oes. Os metralhadores nii.o perdlam tem- po: comprometldos em negciclo de vulto, devlam leva-lo a termo o mals depressa possivel. Os autos do processo caracterlzaram, algum tempo depols, os atos do Segundo-Tenente Semashko, urn dos prln- clpsls dlrlgentes do regimen to, nos segulntes termos: " ... Requlsltou autom6vels as fabrlcas; armou os veiculos com metralhadoras, envlou-os ao Palacio de Taurlde e a outros locals, determ!nando os ltlnerarlos de cada urn; ele em pessoa fez o reglmento salr da caserna para leva-lo a cldade; dirlglu-se ao batalhii.o de reserva do Reglmento Moscovlta a flm de convenc@-lo a manlfestar-se, o que consegulu; prometeu aos soldados do reglmento de metralha- dores o apolo dos reglmentos da Organlza~ii.o mllltar; manteve-se em llga~ii.o constante com aquela organlza~ii.o, sedlada na casa de 4Jl Kshes!nskala e com o Iider dos bolchev!ques,. Len!ne; env!ou pa- trulhas para guardar a sede da refer!da OrgahlzaQio." A lns!nua- ~ao feita aqui contra Lenine visa completar o quadro: Lenlne, nem naquele d!a, nem nos d!as precedentes, se achava em Petrogrado - por mot!vo de doen9a, desde 29 de Junho passara a resjd!r em uma v!venda na F!nlan,dla. Quanto ao ma!s, o estllo conc!so do, func!onar!o da Just!Qa MWtar traduz com prec!sii.o a aglta~ii.o febrU qae se apoderara dos metralhadores durante os preparat!vos. No patio do quartel trabalhava-se com ardor semelhante. Dlstrlbulam.- se fuzis aos soldados nio armadas; granadas a alguns outros; e, em cada camlnhao !qrnecldo pelas !abr!cas, colocavam-se tr6s me- tralhadoras com as respect!vas guarn!96es. 0 reglmento devla salr a rua em formaQiio de combate. Nas !O.br!cas ocorr!a aproxlmadamente a mesma co!sa: che- gavam delegados, ora do quartel dos metralhadores, ora de qualquer flibr!ca das vlzlnhanQas, procurando sempre atralr os operflrlos pata a man!festa9ii.o. Dlr-se-la que os elnlss8lr1os eram de ha multo esperados: suspend!a-se Imed!atamente o trabalho. Conta um ope- rilr!o da uslna Renault: "Depols do alm69o chegaram apressada- mente numerosos metralhadores que nos ped!ram que lhes entre- gassemos camlnhoes. Apesar do protesto de nossa coletivldade bolchevlque, fol prec!so ceder os camlnhoes ... A t6da pressa !ns- talaram metralhadoras Maxim nas vlaturas e salram em d!sparada, rumo da Nevsky. Dal por d!ante tomou-se lmposslvel conter nossos operilrtos. . . Todos salram das oflclnas, abandonando as ocupa96es, com as vestes de trabalho, envergando os aventals ... " Devemos acredltar que os protestos dos bolchevlques nas fabrlcas nem sempre eram multo lnslstentes. Fo! nas fabrlcas de Putllov que a !uta mats se prolongou. Perto das duas horas da tarde correu pelas oflc!nas a noticla de que uma delega~iio de metralhadores chegara e estava convocando um meeting. cerca de 10 mil oper8.rios reuntram-se d!ante dos locals da adm!n!stra~ii.o. Aclamados, os metralhadores revelaram que havlam recebldo ordem de partir, a 4 de julho, para. o tront, mas que tinham resolvido "marchar, nio contra o prole- tarlado alemii.o, em dlreQilo ao tront alemilo, mas contra seus pr6- prlos m!n!stros cap!tallstas". Cresceu o entus!asmo geral. "Para a !rente! Para !rente!" - gr!taram os trabalhadores. 0 secretar!o do com!te da uslna, um bolchevtque, apresentava objeQ6es e propunha que se consultasse a op!nlilo do Partido. Romperam protestos gene- ralizados: "Abalxo, Abalxo! Deseja!s cont!nuar a arrastar lndeflnl- damente a questio!... Nio se pode mats conttnuar a viver ass!m! .. " Por volta das 6 horas chegaram representantes do Comlte- Execut!vo, porem estes foram a!nda menos bern sucedldos na ten- tativa de convencer os operarlos. o meeting cont!nuava, aquele lnterm!navel, nervoso, obstlnado meettng de uma massa de mllhares de homens em busca de uma saida e que nilo adm!tia absolute- mente que !he dlssessem que tal saida lnexlstia. Fol proposto o envio de uma delega9iio ao Comlte-Execut!vo, port!m esta med!da era nOvo protelamento. A assemblela mantinha-se em sessao per- 432 manente. Entrementes, um grupo de operarlos e soldados velo anunclar que o balrro de Vyborg Ja se movlmentara em dlre~ao ao Palacio de Taurlde. Impossivel obstacullzar por mals tempo. Decldlram marchar. Um certo Eflmov, operarlo da Putllov, correu ao comlte de balrro do Partido para pergun tar: "o que e que Vamos fazer?" Responderam-lhe: "Nio nos malltfestaremos, mas nio po- demos abandonar OS operarlos a pr6pr1a sorte; e e por ISSO que marchamos com eles". Naquele memento surgiu Chudtn, membro de um comite de bairro, anunciando que em todos os bairtos os operarios se punham em marcha e que os mllitantes do Partido deverlam "manter a ordem". Foi assim que os bolchevtques se viram atraidos e arrastados ao movlmento, se bern que procurassem justi- flcar os pr6prios atos, porque estes se chocavam com a. declsao oficlal do Partido. A vida Industrial da capital cessara. completamente Ia pelas 7 horas da nolte. Uma ap6s outra., sublevavam-se as U.brlcas, for- mavam-se fllelras e destacamentos de guardas-vermelhos arma- vam-se. "Naquela massa de mllhares de operarlos", conta Metelev, mllltante de Vyborg, "lam e vlnham, e fazendo estalar ruldosa- mente o gatllho dos fuzls, centenas de jovens guardas. Uns lntro- duziam pentes de munl~oes nas armas, outros a.pertavam correlas, outros, alnda, prendiam aos cinturoes cartuchelras e cantls, ou enti.o armavam as baionetas; e os operarlos que nao possuiam arma.s ajudavam os guardas a. equlpar-se ... " A Perspectiva Samp- sonevsky, principal arteria do bairro de Vyborg, regurgitava. de gente. A direita e a esquerda - colunas cerradas de trabalhadores. No meio da rua desfilava o Regimento de Metra.lhadores, esplnha dorsal do cortejo. A frente de cada companhia - os camlnhoes com as Maxims. Atras do Regimento de Metralhadores - os oper:i.- rios. A retaguarda, cobrindo a manlfesta~ii.o - unidades do Regi- mento Moscovita. Aclma de cada. destacamento, urn estandarte: "Todo o poder ao Soviete". 0 cortejo de funerals reallzado em mar~o. ou a. manlfesta~ao de 19 de Malo, provavelmente havlam sido mats concorridos. Mas o desfile de julho fot incompar8.velmente mals impetuoso, mats ameac;ador e. . . de compostc;S.o mats homo- genes. "Sob as bandeiras vermelhas marcham operRrios e soldados", escreve urn dos participantes. "Niio se v~ os distlntivos de funcio- narlos, nem os botoes clntllantes dos estudantes, nem os chapeus de 'senhoras slmpatizantes' - lsto e, tudo aquilo que se vlu quatro mesea antes, em fevereiro - mas, no movtmento ctesse dia, nada de semelhante; hoje marcham sOmente os sombrios escravos do capital." Corrtam pelas ruas, em diversas dire~6es, autom6veis car- regados de trabalhadores e de soldados armados: delegados, a.gita- dores, batedores, agentes de ligac;iio, efetivos encarregados de re- crutar operS.rios e regimentos. Todos empunham fuzis. Os cami- nhOes, erictados de baionetas. reproduziam o quadro das Jornadas de Feveretro,eletrizando alguns e aterrorizando outros. Escrevia o cadete Nabokov: "Sempre as mesmas faces de dementes embrute- oidas, bestials, de que nos lembramos constantemente desde as 433 jornadas de feverelro", lsto e, desde as jomadas daquela mesma revolu~iio que os liberals oflclalmente havlam chamado de glorJosa e lncruenta. Perto das 9 horas, sete reglmentos dlrlglam-se para o Palacio de Tliurlde. Durante o percurso receberam a adesiio das colunas proven!entes das flibrlcas e de novas unldades mll!tares. 0 movlmento do Reglmento de Metralhadores revelara formldlivel poder de contagia. Estavam abertas as "Jornadas de Julho". Aqul e all lmprovlsavam-se meetings. De um e de outro !ado ouvlam-se tlros. Segundo o operarlo Korotkov, "na Lltelny, retlra- ram de uma adega uma metralhadora e um oflcial, que fol morto imedlatamente". Rum6res de t6da sorte precedem a manlfesta&io e esta dlfunde, em torno de sl, um terror que se lrradla em todas as dlre~oes. Quanta fantasia niio tol certamente transmltlda atraves dos telefones dos quartelroes centrals amedrontados! Uma das comun!ca~oes, por exemplo, dlzla que as 8 horas da nolte um auto- move! armado chegara a toda velocldade A esta~iio de Vars6vla, A procura de Kerensky, que exatamente neste dla partla para o front; o carro porem chegara tarde demals, ap6s a partlda do trem, e a prlsiio nao se efetuara. li:ste epls6dlo fol menclonado em segU!da, por mats de uma vez, como prova da consplra~ii.o. Quem, preclsa- mente, se encontrava no automovel, e quem havla descoberto as lnten~oes mlsterlosas dos seus ocupantes? Nunca nlnguem soube. Naquela tarde, carros chelos de homens armadas corrlam em todas as dlre~oes e e multo provavel que tambem tlvessem andado pelas lnredla~oes da esta~ii.o de VarB6vla. Invectlvas em calii.o, contra Kerensky, ecoavam em multos lugares. Esta deve ter sldo, provA- velmente, a origem da lenda, supondo-se que ela niio tenha. sldo totalmente forjada. 0 I2vestla tra~ava. o segU!nte esquema. dos aconteclmentos de 3 de julho: "As 5 horas da. tarde sairam A rua, armadas: o 19 de Metralhadores, um contlnge~e do Reglmento Moscovlta, um con- tlngente de granadelros e um contlngente do Regimento Pavlovsky. Juntaram-se a eles massas de operarlos.. . As olto da. nolte come- ~aram a. reunlr-se em tomo do Palacio Ksheslnska.la diferentes un!dades de regimentos, armadas dos pes II._ cab~a. exiblndo ban- delras vermelhas e cartazes que exlglam a. transmlssii.o do poder ao Sovtete. Do alto das sacadas pronunclavam-se discursos ... As 10 horas e mela, na praca frontelra ao PalAcio de Taurlde, reallzou-se um comlclo.. . As unldades 'elegeram uma deputa~iio ao Comlte- Exeeutlvo-Central Panrusso, a qual, em nome delas, formulou as segulntes relvlnclica~oes: Abalxo os dez \Uinlstros burguesesl Todo o poder ao Sovlete! Pa.rar com a ofens/va! Conflsco das oflclnas dos jornals burgueses! · Naclonallza~ao da terra! Controle da. pro- duc;iio!" Postos ao Iado, .acrescimos de 'nteresse secundB.rio: "unida- des de regimentos", em vez de "regtlhentos"; "massas de opera .. rios", em vez de "f8.bricas inteiras" -:-\ poder:se-ia dizer que o 6rgiio oficioso de TseretelU e Dan, no conj~to, nao altera absolutamente o que se passou e, em particular, assinala exatamente os dois focos da manlfestacii.o: o palacete particular de Ksheslnska.la e o Palacio 434 de TiiUride. Moral e materlalmente, o movlmento glrava em tOrno daqueles dols centros antagonicos: na. mansii.o Ksheslnskala lam procurar indica~Oes, uma direc;io, uma palavra. inspiradora; no Palacio de Tauride lam formular relvlndlca~oes e, mesmo, amea~ar pela for~ que representavam. As 3 horas da tarde, perante a conferencla-g ... al dos bolche- vlques da capital reunlda naquele dla no Palacete Ksheslnskala, dots delegados dos metralhadores chegaram para comunlcar a de- clsii.o que o reglmento toma.va, de se manlfestar. Nlnguem esperava por Is to. Tomsky declarou: "Os reglmentos que se puseram em mo- vlmento niio aglram com esplrlto de camaradagem porque niio convldaram o Comlte do nosso Partido a dlscutlr a questii.o. 0 comlte-centraJ propoe A conferencla: 19 - publicar um manifesto destlnado a conten~iio das massas; 29 - elaborar um memorial ao Comlte-Executlvo, propondo que se assuma o poder. Naquele momenta nii.o se podia falar de manlfesta~ao sem desejar nova revolu~iio." Tomsky, antigo operario bolchevlque, cuja fidelida.de ao Partido era testemunhada por multos anos de prlsiio, e conhecl- do em segulda como dlrigente dos slndlcatos, era, pela propria for- ma9iio do carater, mals favoravel a lmpedlr as manlfesta~oes do que a provoca-las. Desta vez, porem, ele nada mals fazla que d.e- senvolver o pensamento de Lenlne: "Niio se poderla falar de ma.- nl!esta9iiO neste momento, sem que houvesse o desejo de nova revolu~ii.o." POrque, ate a propria tentatlva de manlfesta~iio pacifica de 10 de junho filra conslderada pelos concllladores como cons- plra~ao! A esmagadora malorla da Conferencla solldarlzava-se com Tomsky. Era preclso adlar o desenlace, a qualquer pre~o. A ofen- slva no front mantem o pals lntelro em suspense. 0 ma!Ogro era prevlsto, asslm como a lnten~ii.o do Governo era de lan~ar sobre os bolchevlques a regponsabllldade da derrota. I!: preclso dar aos concllladores o tempo necessaria para que se comprometessem lrre- medlavelmente. Volodarsky, em nome da Conferencla, respondeu aos metralhadores, dlzendo-lhes que o reglmento devla submeter- se a declsiio do Partido. Os metralhadores retlraram-se protestando. As 4 horas, o COmlte-Central con!lrmou a declsiio da Conferencla. seus membros dlspersaram-se pelos balrros e pelas fabrlcas, a flm de lmpedlrem a manlfesta~iio das massas. No mesmo sentldo, !ol envlado ao Pravda um manifesto para ser Impressa na primelra paglna da ma.nhii segulnte. Stalin fol encarregado de lnformar a Assemblt!la unlflcada dos comltes-executlvos sabre a declsii.o do Partido. As lntenQoes dos bolchevlques niio delxam. por consegulnte, Iugar a qualquer duvlda. o Comlte-Executivo dlriglu um manifesto a.os operarlos e aos soldados: "Alguns desconhecldos... concltam- vos a descer armados para as ruas", assegurando, atraves d~ste documento, que o apelo niio provlnha de qualquer partido sovlt!tico. Mas os comites centrals. de partldos e de sovletes, propunham, ao passo que as massas dlspunham. La pelas 8 horas da nolte, o Reglmento de Metralhadores e, atras dele, o Reglmento Moscovlta, aproxlmaram-se do Palacio de 435 Kshesinskaia. Bolcheviques populares, Nevsky, Lashevich, Podvoisky, tentaram, do alto da sacada, convencer os regimentos de que de- viam voltar para os quarteis. Respondiam-lhes de baixo: Abaixo! Da sacada dos bolcheviques ainda nao haviam sido ouvidos seme- lhantes gritos partidos dos soldados: era, portanto, urn sintoma inquietador. Atras dos regimentos apareceram as f:ibricas: "Todo o poder aos sovietes!" "Abaixo os dez minlstros capltalistas!" Eram as bandeiras de 18 de junho. Agora, entretanto, apresentavam-se enquadradas por baionetas. A manlfesta~iio tornara-se urn fato que se impunha. Que fazer? Seria concebivel que os bolcheviques se mantlvessem afastados? Os membros do comlte de Petrogrado, jun- tamente com os delegados da Conferencia e representantes dos regimentos e das fibricas, decidiram o seguinte: rever a questao; p6r fim as crispa~oes estereis; dirlglr 0 movlmento desencadeado no sentido de convence-lo de que a crise governamental serta re- solvida de acordo com os interesses do povo; com este fim, convi- dar os soldados e os operarlos a marchar pacificamente em dire~iio ao Palacio de Tauride, a eleger delegados e, por intermooio destes, formular as reivindica~oes de cada urn perante o Comite-Executlvo. os membros do Comlte-Central presentes naquele momenta sanclo- naram a modiflca~ao de tatica. A nova decisiio, proclamadado alto da sacada, foi acolhida com aclama~oes e com o canto da Marse- tnesa. 0 Partido legallzara o movimento: os metralhadores ja po- diam respirar com alivio. Uma parte do regimento entrou imediata- mente na fortaleza de Pedro e Paulo para trabalhar a guarni~iio e, se necessaria ftisse, proteger contra qualquer golpe trai~oeiro o Palacio Kshesinskaia, que esta separado da fortaleza pelo estreito canal de Kronvenvsky. Os destacamentos que encabe~avam a manlfesta~iio !nsinua- ram-se pela Nevsky, arteria da burguesia, da burocracia, e do corpo de oficials, tal como se esttvesse em pais estranho. Das :;acadas, das janelas, das cal~adas, mllhares de olhos maldosos espionavam com circunspe~iio. A cada fabrlca segue-se um regimento; a cada reglmento segue-se outra fabrica. Incessantemente surgem novas massas. TOdas as bandelras, Jetras douradas em fundo vermelho, clamam o mesmo apeJo: "Todo o poder aos sovietes!" 0 desfile se apossa da Nevsky e, como torrente lrreslstivel, transborda stibre o PaJB.cio de TB.uride. Os cartazes "Abatxo a guerra!" provocam a mats viva hostilidade dos ofletais, entre os quais numerosos !.nv8.- lldos. A gestlcular, a esbaforir-se, o estudante, a estudante, o fun- cionario, tentam persuadir os soldados de que os agentes da Ale- manha, que estiio por detras dos operarlos, desejam apenas que as tropas de Guilherme tenham acesso a Petrogrado para asfixiar a liberdade. Os oradores acham que seus pr6prios argumentos sio irresistiveis. ":&:les esti.o sendo enganad<Js por espiOes!", dizem os funcion:irios a respeito dos trabalhadores, que respondem em tom irritado. "Arrastados por fanatlcos!", insistem os mais lndulgentes. "Ignorantes!" - e neste ponto uns e outros se mostram de acOrd&. os operArtos medem as coisas a sua manetra. Nio foi com esp16es 4J6 alemiies que @les aprenderam a compreender as ld<!las que hole os levam para as ruas. Os manlfestantes afastam, sem qualquer urbanldade, os admoestantes lmportunos, e seguem para a frente. Isso exaspera os patrlotas da Nevsky. Orupos de choque, comanda- dos quase todos por lnvalldos e por cavalelros de Sao Jorge, lan- ~am-se contra certos destacamentos de manlfestantes para arran- car-lhes as bandelras. Conflltos explodem aqul e all. A atmosfera esquenta. Espoucam tlros de urn e de outro !ado. De uma janela? Do Palacio Anlchkln? A rua responde com uma sa iva de tlros para o ar, sem destlno certo. Durante algum tempo toda a rua flea em polvorosa. Conta urn operarlo da fabrlca Vulcan que Ia pela mela- noite, no momento exato em que o reglmento de granadelros pas- sava pela Nevsky, nas lmedla~oes da blblloteca pUblica, espoucou uma fuzllarla, niio se sabe orlunda de onde, e que durou alguns mlnutos. Estabeleceu-se o panlco. Os operarios espalharam-se pelas ruas adjacentes. Os soldados, expostos ao fogo, lan~aram-se por terra: niio tlnha sido em viio que grande numero d@les havia passado pela escola de guerra. Aquela Avenida Nevsky da meia- noite, onde os granadeiros da guarda se mantlnham deltados de bru~os na pista, sob a fuzllaria, apresentava fantastlco espetaculo. Nem Pushkin, nem Gogo!, que tanto celebraram a Nevsky, Jamals a teriam representado assim! Aquela fantasmagorla, entretanto, era realidade: sabre o cal~amento flcaram mortos e ferldos. VIVIA o Palacio de Tauride, naquele dia, sua vida peculiar. Ap6s os cadetes haverem apresentado pedido de demissiio do Oo- v@rno, os dols comit@s-executivos, o dos operarios-soldados e o dos camponeses, passaram a discutir, em comum, o relat6rio de Tsere- telll sobre a questiio de achar urn meio de llmpar a pel!ca da coali- zao sem molhar o p@lo. 0 segr@do de semelhante opera~ii.o terla sido descoberto, com toda a probabllldade, ao fim de certo tempo, se os arrabaldes turbulentos n9.o o tivessem impedido. As comunica- ~Oes telef6nicas anunctadoras da movimenta~ii.o do Regimento de Metralhadores, que estava sendo preparada, fazem surgir rictus de c6lera e de contrariedade na flslonomla dos dirlgentes. Sera possi- vel que os soldados e os opertirios nio sej am capazes de esperar que os jornais lhes comuniquem uma declsiio salutar. A malorla olha os bolcheviques com animosidade. Desta vez a manifesta~ao ainda era imprevista para os pr6prios bolcheviques. Kamenev e outros representantes do Partido ali presentes coneordam em se dirigirem, ap6s a sessio do dia, para as fabricas e para os quarteis, a flm de tentarem conter as massas. :llsse gesto foi, mals tarde, lnterpretado pelos concllladores como um estratagema. Os comit@s- executtvos aprovaram com urgencia um manifesto que declarava, como sempre, que quaisquer manifesta(:Oes significaria trai(:§.o ·a Revolu~iio. Entretanto, como salr da crise de poder? Foi achada a •aida: manter o Ministerlo truncado tal qual estava, adlando o 437 exame d.a questao, em seu conjunto, ate a convoca-;i.o dos membros provincials do Comlte-Executlvo. Protelar, ganhar tempo para salr de exclta96es, nao sera, por acaso, a mats sabla de tQdas as po- litlcas? Era somente no terreno da !uta contra as massas que os con- cllladores julgavam lnadmissivel a perda de tempo. o aparelho oflcial fol posto lmedlatamente em movimento contra a insurrel9iio - porque foi assim que se denomlnou, desde o inicio, a manifes- tagao. Os lideres procuravam, com afinco, fOr9a armada para a prote~iio do Governo e do Comlte-Executivo. Asslnadas por Cheldze e por outros membros do presidium, foram envladas, a dlversas instltul~oes mllltares, tntlma~oes no sentldo de que mandassem ao Palacio de Tauride carros blindados, canhoes de tres polegadas e munl~oes. Concomitantemente, quase todos os reglmentos recebe- r.am ordem de envlar destacamentos armados para a defesa do palacio. Entretanto, niio se limltaram apenas a lsso. Apressou-se o biro, no mesmo dla, a telegrafar ao front, para o 59 Exerclto - o mais proximo da capital - a lmposl9iio de "envlar a Petrogrado uma dlvlsiio de cavalarla, uma brlgada de lnfantarla e carros blin- Eiados". 0 menchevlque Voltlnsky, encarregado de zelar pela segu- ran~a do Comlte-Executlvo, declarava mals tarde, francamente, numa exposl9iio retrospectlva: "Todo o dla 3 de julho fol empre- gado em reunlr tropas para fortlflcar o Palacio de Taurlde ... lfossa tare fa era a de reunlr pelo me nos algumas companhlas. . . Durante curto lapso de tempo faltaram-nos as filr~as completamente. A en- trada do Palacio de Taurlde havla uma patrulha de sels homens que niio podlam conter a multldiio ... " Continua ele, depots: "No prlmelro dla da manlfesta~ao, possuiamos apenas cem homens a nossa d!sposl9iio - e niio tlnhamos outras ffi~as com que contar. Envlamos emlssarlos a todos os reglmentos, rogando-lhes que nos fornecessem soldados para a guarda... Oada reglmento, porem, observava os outros, para ver como se conduziam. Era precise, a qualquer prec;o, acabar com semelhante escft.ndalo; apelamos para as tropas do front." Serla dlficU, mesmo lntenclonalmente, lnventar contra os conciUadores uma s8tlra mats venenosa que essa. Cente- nas de mllhares de manlfestantes exlglam que o poder passasse aos sovletes. Cheldze, colocado il. frente dos sovietes, e, por conse- gulnte, candldato ao p()sto de prlmelro-mlnlstro, procurava for9a armada para lanc;B.-la contra os manlfestantes. E o movimento grandloso, desencadeado para entregar o poder il. democracla, era declarado pelos seus llderes CQmo sendo um ataque de bandos ar- madas contra a democracla. No mesmo Palacio de Tli-urlde reunlra-se, ap6s Iongo Inter- regno, a se~iio operarla do Soviete, a qual, durante OS ultlmos dols meses, por melo de elel96es parclals nas fabrlcas, havla de tal modo podldo renovar seu efetivo, que o ComtUl-Executivo temia, e nio sem raziio, ver nela predomlnarem os bolcheviques. A reunlao da se9iio, artlflclalmente protelada, flxada enflm pelos pr6prlos con- cllladores
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