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Arlindo Ugulino Netto; Luiz Gustavo Barros; Yuri Leite Eloy – HEMATOLOGIA – MEDICINA P8 – 2011.1 177 MED RESUMOS 2011 ELOY, Yuri Leite; NETTO, Arlindo Ugulino. HEMATOLOGIA____________________________ PÚRPURAS (Professora Flávia Pimenta) As prpuras so manifesta es hemorrgicas que se caracterizam por sangramento mucocutneo causados por deficincia das plaquetas (funcional ou numrica) ou dos vasos. Clinicamente, quando se manifestam na pele, acontecem na forma de petquias, localizadas principalmente nos membros inferiores (onde a presso hidrosttica maior), ou na forma de equimoses, que podem ser definidos como sangramentos planos, sem elevao da pele (quando h elevao, denominamos esse sangramento na pele de hematoma – tumor hemático). CONSIDERAES GERAIS Podemos dizer, portanto, que as equimoses e petquias consistem sinais em clnicos que demonstram uma falha da hemostasia primária, acontecendo em decorrncia de distrbios vasculares ou plaquetrios. Os distrbios vasculares ainda podem ser classificados em queda das plaquetas (plaquetopenia) ou disfuno de plaquetas (situao em que o nmero de plaquetas normal, mas existe uma alterao de sua funo como clula hemosttica). Essas altera es da funo das plaquetas (disfuno plaquetria) podem ser divididas em um grupo de patologias hereditárias (como nas trombastenias, doenas em que existe uma alterao da funo das plaquetas por modifica es em suas protenas estruturais) e (2) adquiridas (ocorrendo, por exemplo, por ao medicamentosa, como AAS). Desta forma, sempre devemos reconhecer, logo ao diagnstico, se o sangramento por dficit da hemostasia primria, que pode ocorrer por deficincia da atividade das plaquetas ou por dficit numrico (isto , por simples reduo da populao de plaquetas) ou, ento, por disfuno vascular. Alm disso, a relao do tempo de aparecimento das manifesta es hemorrgicas de grande importncia. Quando os distrbios hemorrgicos ocorrem em face disfuno plaquetria (plaquetopenia ou disfuno vascular – hemostasia primária) o sangramento imediato, logo aps o trauma, como exemplo, aps pequenos procedimentos cirrgicos e odontolgicos. J na deficincia de algum fator da cascata da coagulao (hemostasia secundária) o sangramento no imediato, pois a hemostasia primria est ntegra e, com isso, pode haver, inicialmente, a formao de trombos (promovendo uma certa hemostasia), mas que, no momento da estabilizao do cogulo de fibrina, por deficincia de algum dos fatores da coagulao, a cascata interrompida. Por esta razo, pacientes com distrbios da hemostasia secundria geralmente apresentam sangramento com cerca de 24 horas aps o procedimento cirrgico. Essas considera es gerais so de extrema importncia pois, de acordo com a semiologia hematolgica, pode-se determinar o momento correto em que ocorrer um possvel sangramento em um paciente. OBS1: Quando ocorre um dficit da produo de protenas da coagulao (defeitos na hemostasia secundria), geralmente o sangramento se manifesta sobre a forma de hematoma, podendo ser espontneo (como na hemofilia) ou provocado (traumas ou procedimentos pouco ou muito invasivos). CLASSIFICAO Em resumo, o nosso estudo estar baseado no seguinte esquema classificatrio: Púrpuras vasculares: Hereditrias e Adquiridas. Púrpuras plaquetárias PRPURAS VASCULARES HEREDITRIAS De um modo geral, as prpuras vasculares de origem hereditria acontecem em virtude de altera es no tecido que forma a estrutura dos vasos sanguneos. Dentre as principais prpuras vasculares, temos: Telangiectasia hemorrgica hereditria (Sndrome de Osler-Weber-Rendu) Prpura anafilactide de Henoch-Schoenlein Prpura senil Trombastenias (que sero abordadas em um tpico a parte) TELANGIECTASIA HEMORRAGICA HEREDITARIA (SINDROME DE OSLER-WEBER-RENDU) A telangiectasia hemorrgica hereditria (THH) uma doena autossmica dominante que cursa com displasia fibrovascular mucocutnea e visceral, que usualmente reconhecida pela "trade clssica" de telangiectasias, epistaxes recorrentes e histria familiar da doena. As telangiectasias formam-se pela fragilidade da parede das vnulas, aparecendo na pele, boca, lngua, mucosa nasal e tubo digestivo. a causa gentica mais comum de sangramento vascular, ocorrendo em 1:50.000 nascidos vivos. Arlindo Ugulino Netto; Luiz Gustavo Barros; Yuri Leite Eloy – HEMATOLOGIA – MEDICINA P8 – 2011.1 178 Histórico. Em 1865 Babington descreveu pela primeira vez a epistaxe hereditária, sendo a telangiectasia discutida por Legg em 1876 e por Chiari em 1887. Porém, a primeira descrição compreensiva foi feita por Rendu em 1896. Contribuições subsequentes para o conhecimento da doença foram feitos por Osler em 1901 e Weber em 1907, o que levou a designação de "doença de Rendu-Osler-Weber". Hanes em 1909 denominou "telangiectasia hemorrágica hereditária" definindo assim as três características principais da doença. Sintomatologia. Caracterizam-se pela formação de vasos tortuosos e dilatados localizados principalmente em mucosa oral, lábios, narinas e extremidades das falanges dos membros superiores e inferiores e ainda na mucosa dos órgãos internos, como estômago, intestino etc. Dessa forma, concluímos que os locais mais frequentes de sangramentos são cavidade oral e nasal (epistaxe) e, não menos importante, sangramento do TGI (melena). A doença tem uma característica específica de permanecer oculta até o 6º ou 7º ano de vida da criança, ou seja, sem surgir lesões, quando de forma abrupta as mães relatam o surgimento de extremidades dos dedos arroxeadas nos seus filhos. Em relação à formação desses vasos defeituosos na mucosa das vísceras pode haver formação de fístulas arteriovenosas, que a mais grave é fístula arteriovenosa pulmonar que pode levar a hipertensão pulmonar podendo levar o paciente ao óbito. Em resumo da sintomatologia temos: Epistaxe: manifestação clínica mais comum Sangramento do TGI Anormalidades à radiografia de Tórax: ocorrem quando há hipertensão pulmonar Cefaléia: pode ser a causa de hemorragias intracranianas Convulsão Lesões Cutâneas Progressivas: à medida em que o paciente envelhece Cianose: ocorre de fato quando há hipertensão pulmonar Dor abdominal: deve-se fazer diagnóstico diferencial com quadro de abdome agudo. Características das Lesões. As telangiectasias são definidas clinicamente como pequenos pontos hemorrágicos e devem ser diferenciadas das equimoses e petéquias, pois essas lesões língua não desaparecem na vitro-pressão da, enquanto que as telangiectasias desaparecem. Tratamento. Trata-se de uma doença progressiva, para a qual não há um tratamento específico. Atualmente, para prolongar a vida desses pacientes, utilizam-se inibidores da neovascularização, como um fármaco derivado da talidomida, porém, não é disponível no Brasil. Dessa forma o tratamento desses pacientes passa a ser sintomático, corrigindo a anemia ferropriva que esses possam vir apresentar (reposição de ferro e folato), controle dos sangramentos (inclusive do TGI), etc. No tratamento das malformações vasculares cerebrais são utilizadas as técnicas de neurocirurgia vascular; êmboloterapia; cirurgia radio- estereotáxica. PÚRPURA ANAFILACTÓIDE DE HENOCH-SCHOENLEIN Consiste em uma arterite auto-limitada, aguda geralmente seguindo uma infecção estreptocócica, uso de drogas, doença auto-imune. A lesão é vascular, existindo púrpura por deposição de complexos imunes na parede dos vasos, causada por quinina, penicilina, ácido acetilsalicílico. A púrpura alérgica, uma doença incomum, afeta, sobretudo crianças de baixa idade, mas também pode afetar crianças mais velhas e adultos. Em adultos pode ocorrer devido a doenças reumáticas. Arlindo Ugulino Netto; Luiz GustavoBarros; Yuri Leite Eloy – HEMATOLOGIA – MEDICINA P8 – 2011.1 179 Evolução Clínica e Sintomatologia. caracterizada por um processo inflamatrio das pequenas artrias que, na maioria dos casos, ocorre secundrio a uma infeco. Com isso, na histria clnica, a me relata que a criana apresentou febre, dor de garganta, que abruptamente aparece com equimoses em membros inferiores, podendo ocorrer edema, manchas escuras (cor de vinho) que ascendem at a cintura acometendo a fscia extensora. Essa prpura tem caracterstica de ser progressiva e palpvel, sendo este ltimo dado de extrema importncia para o reconhecimento clnico. Os vasos sanguneos da pele, das articula es, do trato gastrointestinal ou dos rins podem inflamar e romper, caracterizando a sndrome de Henoch-Schoenlein. Clinicamente esses pacientes apresentam poliartralgias, dor abdominal, hematria (nefrites), vmitos e as prpuras caractersticas da doena. A doena pode comear com o surgimento de pequenas manchas violceas (prpura) – mais frequentemente nos ps, pernas, braos e ndegas – quando o sangue extravasa dos vasos para a pele. No decorrer de alguns dias, as manchas purpricas podem tornar-se elevadas e duras; outras manchas podem surgir nas semanas seguintes. comum a ocorrncia de edema de tornozelos, quadris, joelhos, punhos e cotovelos, normalmente acompanhado de febre e dor articular. OBS2: Para crianas que cursam com febre a aparecimento de manchas na pele, a primeira suspeita clnica trata-se de uma meningococemia, sendo por isso, um importante diagnstico diferencial. OBS3: Aproximadamente 50% dos indivduos que apresentam prpura alrgica tm hematria, entretanto poucos evoluem para insuficincia renal. Tratamento. A maioria dos indivduos apresenta recuperao total em um ms, mas os sintomas podem aparecer e desaparecer vrias vezes. Se o mdico suspeitar que a reao alrgica seja causada por uma droga, esta deve ser interrompida imediatamente. Os corticosterides (p.ex., prednisona) podem ajudar no alvio do edema, da dor articular e da dor abdominal, mas eles no impedem a leso renal. Como foi dito a evoluo situao mais grave desses pacientes a evoluo para insuficincia renal aguda (IRA). Outras drogas, como as que reduzem a atividade do sistema imunolgico (imunossupressoras), como a azatioprina ou a ciclofosfamida, s vezes so necessrias na presena de leso renal, mas a sua utilidade no conhecida. Entretanto, de uma forma geral, podemos dizer que no existe uma droga propriamente dita indicada para tal patologia. PÚRPURA SENIL Nos indivduos idosos, particularmente naqueles expostos excessivamente ao sol, as equimoses ocorrem comumente no dorso das mos e dos antebraos (prpura senil). Eles so especialmente susceptveis equimose aps impactos e quedas por apresentarem vasos sanguneos frgeis e uma camada mais fina de gordura sob a pele, a qual normalmente serve como um amortecedor que auxilia na proteo contra o traumatismo. Arlindo Ugulino Netto; Luiz Gustavo Barros; Yuri Leite Eloy – HEMATOLOGIA – MEDICINA P8 – 2011.1 180 OBS4: Sobre as prpuras vasculares a suspeita clnica e o raciocnio diagnstico devem ser feito da seguinte forma: manchas em membros inferiores progressivas de acometimento bilateral, pode-se dizer que uma prpura de Henoch-Schoenlein. Ainda sobre as prpuras vasculares, quando o indivduo apresenta histria familiar sugestiva, presena de manchas localizadas na ponta dos dedos, hemorragia digestiva recorrente, pode-se pensar em Telangiectasia Hemorrágica. Dessa forma, conclumos que o diagnstico dessas patologias clnico, no existindo nenhum exame complementar que seja capaz de diferenci-las patologias. Apesar disso, pode-se solicitar hemograma e coagulograma, para afastar plaquetopenia. TROMBASTENIAS Consiste em um grupo de doenas caracterizadas por altera es plaquetrias hereditrias que so denominadas de disfuno, ou seja, esses pacientes no apresentam uma plaquetopenia, entretanto possuem sangramentos frequentes devido altera es nas plaquetas. Existem dois tipos principais de trombastenias (a trombastenia de Glanzmann e a sndrome de Bernard-Soulier), embora ambas sejam consideradas raras. TROMBASTENIA DE GLANZMANN A trombastenia de Glanzmann (TG) uma sndrome hemorrgica autossmica recessiva rara que afeta a linha megacarioctica, caracterizado por dficit de agregao plaquetria. Do ponto e vista molecular, a TG est ligada a anomalias quantitativas e/ou qualitativas na integrina alfa IIb/beta3 das plaquetas (GP IIb/IIIa), o receptor que medeia a ligao das protenas de adeso que asseguram a formao do agregado. Com isso, podemos dizer que esses pacientes vo apresentar uma disfuno na formao do cogulo, mesmo apresentando uma contagem normal de plaquetas (ver OBS5). Por ser autossmica, pode acontecer tanto em homens quanto em mulheres. Sintomatologia. O diagnstico clnico-laboratorial baseia-se na existncia de hemorragia mucocutnea e altera es no teste de agregao plaquetria (em resposta a todos os estmulos fisiolgicos), associada a uma contagem e morfologia plaquetrias normais. Geralmente, esses pacientes podem apresentar sangramentos intensos que podem ocorrer nos primeiros momentos de vida, como no clampeamento do cordo umbilical. Alm disso, pode manifestar epistaxe, hemorragia digestiva, gengivorragias sem histria de trauma. Entretanto, esta sndrome hemorrgica apresenta grande variabilidade clnica: alguns doentes apresentam apenas pequenas equimoses, enquanto outros tm hemorragias frequentes, graves e potencialmente fatais. Os locais de hemorragia na TG esto claramente definidos: prpura, epistaxes, hemorragia gengival e menorragia so caractersticas praticamente constantes. As hemorragias gastrointestinais e a hematria so menos comuns. Quando essas crianas eventualmente sofrem um trauma, podem ocorrer sangramentos intensos podendo levar ao bito. Diagnóstico. Para o diagnstico desta patologia, devemos tomar conhecimento que ela se caracteriza por uma agregao plaquetria defeituosa em resposta ao ADP, colgeno, trombina e adrenalina. O defeito consiste em uma deficincia da glicoprotena Ilb/IIIa. Este receptor fundamental para a ligao do fibrinognio (elemento responsvel por unir uma plaqueta outra em um fenmeno que j descrevemos como agregao). Encontramos em exames de um tempo de sangramento prolongado, ausncia de clamps plaquetrios no esfregao do sangue perifrico e plaquetas que no se agregam in vitro. O tempo de retrao do cogulo tambm est elevado. A plaquetometria normal. Em sntese, temos: Coagulograma: como vimos, o exame responsvel por avaliar parmetros da hemostasia primria (como o tempo de protrombina – TP – e o tempo parcial de tromboplastina ativada – TTPA) e secundria (contagem de plaquetas e tempo de sangramento). Para a trombastenia de Glanzmann, temos: Plaquetometria normal (150.000 a 450.000/mm¦). Retrao do cogulo diminuda (normal entre 45 a 65%), configurando um coágulo hipo-retrátil. Tempo de sangramento elevado (ver OBS5), com cerca de 15 minutos. TP e TTPA normais. Agregação plaquetária: um exame especializado em que o plasma rico em plaquetas do paciente colocado em um meio rico em agonistas da coagulao (colgeno, ADP, adrenalina, etc). O plasma de pacientes com trombastenia de Glanzmann no apresentaro coagulao quando exposto ao ADP. Apesar disso, haver agregao quando expostos Ristocetina (antibitico utilizado antigamente para tratamento de tuberculose, mas que matava pacientes devido aos seus efeitos colaterais, como a formao de tromboses e embolias). Desta forma, em resumo, pacientes com TG apresentaro agregao plaquetria normal diante da Ristocetina, mas apresentaro agregao alterada com ADPe todos os demais agonistas da coagulao. Arlindo Ugulino Netto; Luiz Gustavo Barros; Yuri Leite Eloy – HEMATOLOGIA – MEDICINA P8 – 2011.1 181 Deficiência de alfaII/beta3 plaquetária (GP IIb/IIIa): o exame confirmatrio e especfico para TG, sendo a dosagem feita atravs da utilizao de anticorpos monoclonais e citometria de fluxo. Em resumo, o diagnstico da TG pode ser definido pela presena de hemorragias de mucosa associadas a um tempo de sangramento prolongado e retrao do cogulo diminudo, mesmo com plaquetometria normal. Diante de um coagulograma alterado desta forma, podemos optar por uma investigao especfica atravs do teste de agregao plaquetria (a qual mostra uma resposta diminuda ao estmulo de ADP e normal ao estmulo de ristocetina) ou dosagem da integrina alfa IIb/beta3 plaquetria. OBS5: Justamente, o termo “trombastenias” define as patologias que se caracterizam por um tempo de sangramento muito elevado (normal de 1 a 3 min, segundo o mtodo de Duke) associado a um nmero normal de plaquetas (somente em nmeros abaixo de 50.000, as plaquetas podem alterar o tempo de sangramento), demonstrando que o problema da patologia no est associada a um dficit numrico de plaquetas, mas a uma disfuno das mesmas. Tratamento. O tratamento feito de forma a evitar a aloimunizao plaquetria, e o seguimento teraputico tem que incluir, se possvel, procedimentos hemostticos locais e/ou administrao de DDAVP (vasoconstrictor). Caso estas medidas forem ineficazes ou em caso de condicionamento para cirurgia, sangramentos graves, o seguimento baseia-se em transfus es de concentrados de plaquetas HLA-compatveis, embora a administrao de fator VIIa recombinante seja uma nova alternativa teraputica a ter conta. A TG pode ser uma doena hemorrgica grave, no entanto o prognstico excelente com os cuidados de suporte adequados. SÍNDROME DE BERNARD-SOULIER A sndrome de Bernard-Soulier (SBS) uma doena hemorrgica hereditria rara caracterizada por plaquetopenia, presena de plaquetas gigantes e uma tendncia a sangramento mucocutneos. Com isso, apresenta-se com clnica semelhante s demais trombastenias, diferenciando-se pela sua deficincia que, neste caso, trata-se da glicoproteína Ib, responsvel pela ligao ao fator de von Willebrand durante a adeso plaquetria ao subendotlio. Fisiopatologia. uma doena hereditria autossmica recessiva caracterizada pela falta da glicoprotena Ib na superfcie das plaquetas. Essa glicoprotena o stio de ligao do fator de Von Willebrand e, quando alterada, no permite a ligao deste fator, impedindo a realizao de suas fun es (com a prpria adeso plaquetria). A funo do fator de von Willebrand ligar-se s plaquetas e ao colgeno exposto do endotollio lesado. Essa ligao estar alterada devido s altera es estruturais presentes na glicoprotena Ib. O fator de von Willebrand tem como funo adicional no processo de coagulao impedir a catabolizao do fator VIII, ligando-se a este fator (e, por esta razo, tambm chamado por outros autores de “fator VIII-antgeno”). Sintomatologia. Relacionados disfuno das plaquetas: sangramentos nas mucosas, nas gengivas, epistaxe e gastrointestinais. Pacientes heterozigotos geralmente no apresentam sintomas. Exames laboratoriais. De uma forma geral, os exames laboratoriais da SBS se mostra de forma contrria aos achados da TG: Coagulograma: Contagem de plaquetas apresenta-se abaixo do normal (discreta plaquetopenia). Anlise do esfregao pode revelar a presena de plaquetas gigantes (embora no seja comum) Retrao do cogulo normal (cogulo normoretrtil) Tempo de sangramento: prolongado Agregação induzida pela Ristocetina: no h agregao. PRPURA TROMBOCITOPNICA IMUNE IDIOPTICA (PTI) Como j foi explicado anteriormente, as prpuras consistem em doenas que ocorrem devido a altera es vasculares e plaquetopnicas (estas podem ocorrer por disfuno das plaquetas, ou seja, plaquetopatias). A definio da prpura trombocitopnica imune (PTI) de doena causada por mecanismos de auto-imunidade na qual ocorre a diminuio de contagem de plaquetas e sangramentos, na maioria das vezes, com manifesta es hemorrgicas leves ou moderadas, limitadas pele e mucosas. A PTI pode ser primria (idioptica) ou secundria (associada a alguma doena de base) e aguda ou crnica (neste caso com mais de seis meses de durao). Arlindo Ugulino Netto; Luiz Gustavo Barros; Yuri Leite Eloy – HEMATOLOGIA – MEDICINA P8 – 2011.1 182 Tem uma incidncia de 1,6/10.000 ano. A forma idioptica citada anteriormente corresponde a 50 a 60% dos casos. Algumas vezes a causa da PTI se apresenta aps anos de acompanhamento do paciente, por exemplo, artrite reumtica, LES, linfoma. Alm disso, pode ser secundria a viroses como o caso da hepatite B e C, HIV. Com isso, na suspeita de uma PTI deve-se sempre conduzir o paciente com uma investigao diagnstica importante, isto , avaliando o perfil reumtico desse paciente, solicitao de sorologias. Dessa forma evita-se tratar a PTI sem tratar a doena de base, que muitas vezes corresponde causa da prpura. FISIOPATOLOGIA A habitual depurao das plaquetas no fgado e, principalmente, no bao acelerada quando as plaquetas esto revestidas por auto-anticorpos da classe IgG que ligam-se aos receptores Fc expressos em macrfagos teciduais. Como consequncia, em alguns indivduos produz-se um aumento compensatrio na produo de plaquetas na medula ssea, ao passo que, em outros, a produo diminui por destruio intramedular das plaquetas por macrfagos, ou por inibio da hematopoese megacariocitria. Os nveis de trombopoietina no se elevam o que traduz a quantidade normal de megacaricitos presentes na medula. Na PTI a fisiopatologia semelhante anemia auto-imune. Algum fator determina a produo de anticorpos, mais especificamente do tipo IgG. Esses anticorpos por sua vez se fixam nas plaquetas, sensibilizando-as. As plaquetas revestidas por anticorpos, ao passarem pelo bao e fgado, so reconhecidas pelos macrfagos esplnicos e sofrem fagocitose e destruio. Com isso, podemos dizer que na PTI h uma produo normal de plaquetas pela medula ssea, porm uma retirada precoce por parte do bao. Parece existir uma base gentica para a ocorrncia da PTI, que tem sido identificada com maior freqncia em gmeos monozigticos e em certos grupos familiares nos quais existe uma maior tendncia para a produo de auto-anticorpos. FORMAS CLÍNICAS PTI Aguda. uma forma de apresentao abrupta. Nesses casos o paciente nem sempre possui uma plaquetopenia severa, mas apresenta manifesta es hemorrgicas graves – gengival, nasal (nas formas crnicas ocorre o contrrio, ou seja, os pacientes apresentam uma plaquetopenia severa, porm no possui hemorragias graves). Tem um pico de incidncia entre 2-6 anos de idade. Geralmente est associada exposio a agentes infecciosos e ps-vacinao, incluindo as viroses como Hepatite e HIV. As doenas infecciosas virais so agudas, ou seja, resfriados, gripais etc. Tambm pode ocorrer aps campanhas de vacinao como o caso do vrus influenza. Provoca uma trombocitopenia que ocorre em um perodo inferior a 6 meses. O quadro clnico desses pacientes em boa parte dos casos benigno, e em 80% dos casos tem resoluo espontnea. PTI Crônica. Acomete com uma maior freqncia em pacientes adultos, com predominncia para o sexo feminino. Pode ser secundria a alguma doena de base, como a doena reumtica. No h associa es com agentes infecciosos. Possui um quadro clnico de incio insidioso com evoluo mais grave e remisso espontnea incomum, devido doena secundria. Nesses pacientes percebem-se episdios recorrentes de sangramento (menos graves). DIAGNÓSTICOCLÍNICO O diagnstico clnico pode ser feito atravs da anlise de sangramentos cutneo-mucosos na forma de equimoses e petquias, podendo haver tambm epistaxes, gengivorragias, altera es menstruais (hipemenorragia). As prpuras so denominadas midas quando ocorrem associadas a sangramentos de mucosa como: epistaxe, gengivorragia, hemorragia digestiva. Essas formas so mais graves e necessitam de internao hospitalar. A prpura seca aquela em que h somente equimoses e petquias, ou seja, nesses casos o paciente no apresenta perda sangunea to ampla. Quando aguda tem uma remisso espontnea. Arlindo Ugulino Netto; Luiz Gustavo Barros; Yuri Leite Eloy – HEMATOLOGIA – MEDICINA P8 – 2011.1 183 Alm disso, o mdico deve estar atento a sinais e sintomas como: queda do estado geral, visceromegalias, adenomegalias, sudorese ou sintomas no hemorrgicos. Essas altera es no esto presentes na PTI, e quando presentes, o mdico deve pensar em uma possvel doena de base para a PTI. EXAMES COMPLEMENTARES Hemograma: Plaquetopenia isolada, sem altera es em lmina de sangue perifrico. Macroplaquetas: ocorre devido a um “turn-over” acelerado de formao plaquetria pela medula ssea. Mielograma: necessrio para realizao do diagnstico diferencial de aplasia medular e leucemias. Pode mostrar na PTI uma hiperplasia megacarioctica ou medula normal Identificação de anticorpos: abaixo de 18 anos ou acima de 60 anos. TRATAMENTO Indicações. Os pacientes que merecem tratamento so aqueles que se enquadram nos seguintes critrios abaixo: PTI aguda: Plaquetopenia < 10.000 ou < 25.000 com sangramento mucoso PTI Crnica: Plaquetopenia < 20.000 ou < 30.000 com sangramento Formas Terapêuticas. 1ª linha: corticide (Prednisona 1mg/kg/dia), que deve ser mantido at a normalizao das plaquetas. Geralmente esses pacientes apresentam uma normalizao em um tempo no superior a 1 semana. Depois disso, o corticide deve ser retirado de forma gradativa. 2º Linha: Esplenectomia. Deve ser indicada para aqueles pacientes que foram tratados com corticides, e aps sua retirada houve recorrncia da doena. Isso importante, pois esses pacientes so fortes candidatos a desenvolver uma PTI crnica. Deve-se lembrar que pacientes esplenectomizados devem ser vacinados para preveno de infeco por germes encapsulados. 3º Linha: Imunossupressores, terapia com Rituximab ou Danazol. Mesmo com a retirada do bao e o paciente ainda apresente plaquetopenia, pode-se indicar algum dos imunossupressores citados anteriormente. Geralmente esses pacientes so aqueles que possuem uma PTI crnica. Transfusão de Plaquetas. Os pacientes em que a transfuso necessria so aqueles que apresentam a PTI mida, ou seja, com eventos hemorrgicos como: epistaxe, gengivorragias, hemorragia digestiva. Esses pacientes tm risco de desenvolver hemorragias do SNC. Por isso, aqueles pacientes com prpuras na vigncia de sangramentos fatais so candidatos a transfuso. Nesses pacientes indica-se 1 unidade/10kg de peso diariamente, at que a plaquetometria seja estabilizada. Tratamento de Urgência. Pacientes com manifesta es graves (sinais de choque) devem ser internados e submetidos a pulsoterapia com Metilprednisolona 1g/dia por 3 dias. Alm disso, recomendada a administrao de imunoglobulina humana 400mg/kg/dia por 5 dias ou 1g/kg/dia durante 2 dias. A imunoglobulina atua ocupando o receptor Fc no bao, impedindo o reconhecimento e destruio das plaquetas sensibilizadas. PRPURA TROMBOCITOPNICA TROMBTICA (PTT) uma doena mais rara que, quando se manifesta, na maioria das vezes, evolui com bito do paciente. A prpura trombocitopnica trombtica (PTT) uma sndrome caracterizada pela presena de anemia hemoltica microangioptica, trombocitopenia, sintomas neurolgicos e psiquitricos, insuficincia renal e febre. O diagnstico e a teraputica precoce da PTT so essenciais para a sobrevivncia do paciente nessas situa es. Com isso, podemos dizer que uma patologia que acomete a microcirculao, onde haver formao de trombos. A formao de trombos dificulta a passagem das hemcias, causando leso da camada lipdica das hemcias e com isso, alterando a forma das hemcias deixando-as “esquisitas”, por isso, denomina-se de esquizcitos. FISIOPATOLOGIA No plasma sanguneo existe uma protena denominada de ADAMTS 13, que responsvel pela proteo dos multmeros do fator de Von Willebrand. Com isso, altera es dessas protenas acarretam na formao e agregao das plaquetas na microcirculao, havendo assim a formao dos trombos plaquetrias. Arlindo Ugulino Netto; Luiz Gustavo Barros; Yuri Leite Eloy – HEMATOLOGIA – MEDICINA P8 – 2011.1 184 A formação do trombo plaquetário vai determinar três alterações básicas: Grande consumo dessas células, manifestando-se com isso uma plaquetopenia. Isquemia tecidual, especialmente no sistema nervoso central e rins. Anemia Hemolítica microangiopática devido à lesão da camada lipídica das hemácias (formando os esquizócitos). ACHADOS CLÍNICOS E LABORATORIAIS Plaquetopenia Anemia Hemolítica Microangiopática (esquizócitos): devido à anemia espera-se encontrar reticulócitos aumentados. DHL elevada Alterações neurológicas: irritação, ansiedade, agressividade, não reconhecimento dos familiares. Função Renal diminuída: uréia e creatinina elevada. Febre Coombs direto negativo TP e TTPA (são utilizados para diagnóstico diferencial com CIVD): na PTT, encontram-se normais (e alterados na CIVD). Algumas condições associadas ou predisponentes para esta doença são: doenças virais prévias, HIV, drogas, gravidez, doenças auto-imunes, história familiar. TRATAMENTO Aqueles pacientes que são atendidos com febre, com níveis de uréia e creatinina elevada, alterações neurológicas e hemograma demonstrando anemia microangiopática com reticulocitose (e presença de esquizócitos) e trombocitopenia muito provavalmente são portadores de Púrpura Trombocitopênica Trombótica. Para eles, como primeira conduta, devemos realizar plasmaferese (troca do plasma). Entretanto, nos serviços em que a PF não é disponível, podemos utilizar somente a infusão de plasma fresco congelado (PFC) como alternativa terapêutica temporária. Depois disso, realizamos a plasmaferese (PF) com reposição de PFC associada à corticoterapia. Concomitantemente o paciente deve ser monitorizado com dosagem da Hb, DHL, plaquetas e esquizócitos. Depois disso devemos analisar as condições clínicas laboratoriais (Hb, DHL, palquetas) do paciente: Arlindo Ugulino Netto; Luiz Gustavo Barros; Yuri Leite Eloy – HEMATOLOGIA – MEDICINA P8 – 2011.1 185 Normalização: continuar plasmaferese por 3 dias. Depois disso, suspende-se a corticoterapia e plasmaferese. Não-normalização: manter plasma plasmaferese e corticóide. Caso ainda não haja melhora deve-se pensar em alternativas terapêuticas como esplenectomia e vincristina. A plasmaferese deve ser realizada retirando-se diariamente todo o plasma do paciente (40ml/Kg), trocando-o por unidades de plasma fresco congelado (este deve conter a proteína ADAMTS 13 e ser pobre em fator de von Willebrand). As trocas devem continuar até a completa estabilização do paciente e normalização dos exames laboratoriais. O período médio é de 10 dias. Vale ressaltar que a transfusão de plaquetas é formalmente contra-indicada na PTT, pelo risco de aumentar a formação dos microtrombos, piorando a função neurológica e renal. Arlindo Ugulino Netto; Luiz Gustavo Barros; Yuri Leite Eloy – HEMATOLOGIA – MEDICINA P8 – 2011.1 186 MED RESUMOS 2011 NETTO, Arlindo Ugulino. HEMATOLOGIA COAGULOPATIAS HEREDITÁRIAS (Professora Angelina Cartaxo) As coagulopatias hereditrias so doenas hemorrgicas resultantes da deficincia quantitativa e/ou qualitativade um ou mais fatores da coagulao, envolvidos na fisiologia da hemostasia secundria. CONSIDERAES SOBRE A HEMOSTASIA No que diz respeito hemostasia (revisando o que foi visto em captulos anteriores), a conceituamos como o processo fisiolgico encarregado de estancar um sangramento e iniciar o reparo tecidual. Do ponto de vista didtico, podemos dividir este processo em dois grandes momentos: • Hemostasia primária: formao do tampo plaquetrio pela adeso e agregao plaquetria; Vasoconstrio. • Hemostasia secundária: formao do cogulo para estabilizar o trombo plaquetrio; Reparo tecidual. A rede de fibrina, formada neste processo de hemostasia, tem apenas a funo de estabilizar o instvel tampo plaquetrio, de modo que toda a cascata da coagulao tem como funo principal formar estruturas que estabilizem e fixem o tampo plaquetrio no local da leso at que o endotlio seja reparado. Quando h uma leso endotelial, trs eventos simultneos acontecem: (1) liberao de substncias vasoconstrictoras (entre elas, as tromboxanas e tromboplastina); (2) adeso de plaquetas no local exposto da leso; (3) desencadeamento da cadeia de coagulao, no intuito de estabilizar o agregado de plaquetas no local da leso. Durante todos estes eventos, h a liberao de fatores de crescimento que induzem o reparo do tecido lesado. HEMOSTASIA PRIMÁRIA caracterizada pela formao do tampo plaquetrio, que se d por meio de trs processos: (1) a adesão plaquetária no local da leso, fazendo com que haja uma (2) ativação dessas plaquetas, o que culmina na (3) secreo de substncias que promovem a agregação plaquetária. Esse processo de d de maneira cclica, de modo que um grupo de plaquetas promova, cada vez mais, a agregao de outros grupos. A adeso iniciada pela leso endotelial do vaso que, imediatamente, exp e o colgeno subendotelial s plaquetas circulantes. Esta adeso mediada pela interao entre a glicoprotena Ia/IIa (GP Ia/IIa) da membrana das plaquetas com as fibrilas do colgeno (presente na tnica mdia do vaso, exposto a partir da separao das clulas endoteliais que se d na leso). Esta ligao estabilizada por uma protena plasmtica denominada de Fator de von Willebrand (sua carncia gera a Doença de von Willebrand, abordada neste captulo), que fundamental no na coagulao sangunea, mas que age apenas na fase de adeso plaquetria (hemostasia primria), se ligando a GP Ib Portanto, os fatores que estimulam a adeso plaquetria so: colgeno e o Fator de von Willebrand. Como fatores que a inibem, temos: NO e prostaciclinas, duas substncias vasodilatadoras. Na medida em que as plaquetas vo passando pelo processo de adeso ao local lesionado, ocorre o processo de agregao, de modo que ocasiona uma intensa modificao estrutural nas plaquetas, as quais emitem pseudpodes (o que facilita o contato entre as plaquetas e a melhor exposio de seus receptores) e liberam o contedo dos seus grnulos. Receptores presentes na membrana da plaqueta iro favorecer tanto a sua adeso ao endotlio lesado como a agregao com outras plaquetas para que conjuntamente ocorra a formao do trombo plaquetrio. Esta ativao mediada pela adeso e subsequente agregao promove a liberao dos constituintes dos grnulos plaquetrios. Os principais componentes so: ADP, serotonina, Fator V, trombospondina. Estas substncias, ao se ligarem aos seus receptores plaquetrios, ativam a cascata da cicloxigenase, levando a produo de tromboxana (TXA2). A produo de tromboxana ativa a liberao de clcio. A liberao de clcio, por sua vez, ativa a glicoproteína IIb/IIIa, o que favorece a agregao plaquetria e o incio da cascata da coagulao, pois estas glicoprotenas interagem com uma molcula de fibrinognio, aderindo as plaquetas entre si. Arlindo Ugulino Netto; Luiz Gustavo Barros; Yuri Leite Eloy – HEMATOLOGIA – MEDICINA P8 – 2011.1 187 HEMOSTASIA SECUNDÁRIA - CASCATA DA COAGULAÇÃO Uma vez expressas as proteínas IIb/IIIa e realizada a agregação plaquetária, tem-se o início da cascata da coagulação, no intuito de formar uma malha de fibrina capaz de estabilizar o agregado constituído pelas plaquetas. A cascata da coagulação é um sistema de amplificação biológica no qual o fibrinogênio solúvel é convertido em uma rede de fibrina insolúvel, com a função de estabilizar o tampão plaquetário. A cascata da coagulação é dividida em duas vias (via intrínseca e via extrínseca), cujas etapas finais são exatamente as mesmas. Via extrínseca: é ativada quando há um dano tecidual e se inicia com a liberação de fatores teciduais chamados de tromboplastina. Esta é responsável por clivar o fator VII (inativo) em fator VIIa (ativo e apresentando como co-fatores o cálcio e os fosfolipídeos de membrana da plaqueta). Este apresenta alta afinidade pelo fator X (também inativo), clivando-o e formando fator Xa. O fator Xa (apresentando como co-fatores: cálcio, fator V liberado pelos grânulos da plaqueta, fosfolipídios de plaquetas), forma ativa do fator X, cliva a protrombina, dando origem aos passos tardios da cascata da coagulação: a protrombina (que é o fator II), clivada pelo fator Xa, forma a trombina, que age e ativa o fibrinogênio (fator I), convertendo-se em fibrina (que forma uma rede não tão densa), que é estabilizada pelo fator XII (tornando-se densa; ver OBS2). Via intrínseca: ocorre quando há uma lesão vascular, o que expõe as fibras de colágeno subendotelial. Esta exposição faz com que o fator XII (inativo) seja convertido em fator XIIa, que por sua vez, ativa o fator XI, convertendo-o em fator XIa. Este (utilizando o cálcio como co-fator), cliva o fator IX em fator IXa, que é a forma ativa. Este fator IXa (que tem como co-fatores o cálcio, o fator VIII e os fosfolipídeos das plaquetas), cliva o fator X em fator Xa, que culmina nos mesmo passos tardios da via pré-citada: o fator Xa cliva a protrombina em trombina, responsável por converter o fibrinogênio e fibrina. OBS1: Ao observar o tempo em que uma amostra de plasma do paciente reage com uma aplicação de tromboplastina, verifica-se o chamado tempo de protrombina, que avalia, portanto, a via mais fisiológica da cascata da coagulação. OBS2: Observe no esquema que a trombina, além de clivar o fibrinogênio em fibrina, ativa o fator Va e o fator VIIIa, que agem como co-fatores do fator Xa e do fator IXa, respectivamente. Ela é responsável ainda por clivar o fator XIII, convertendo-o em fator XIIIa. Este é responsável por promover uma agregação maior da rede de fibrina, estabilizando e fortalecendo a rede de fibrina previamente formada. Arlindo Ugulino Netto; Luiz Gustavo Barros; Yuri Leite Eloy – HEMATOLOGIA – MEDICINA P8 – 2011.1 188 CLASSIFICAO DAS COAGULOPATIAS HEREDITRIAS As coagulopatias hereditárias podem estar relacionadas com a carência de qualquer um dos fatores envolvidos nesta fisiologia da hemostasia. Elas podem ser classificadas, basicamente, em: Deficiência de fibrinogênio (fator I), que se subdivide em: Afibrinogenemia Hipofibrinogenemia Disfibrinogenemia Deficiência de protrombina (fator II) Deficiência de fator V Deficiência de fator VII Deficiência de fator VIII - Hemofilia A Deficiência de fator IX - Hemofilia B Deficiência de fator X Deficiência de fator XI Deficiência de fator XII Deficiência do fator estabilizador da fibrina (fator XIII) Doença de von Willebrand HEMOFILIA A hemofilia é o nome de diversas doenças genéticas hereditárias que incapacitam o corpo de controlar sangramentos (hemostasia). Logo, quando um vaso sanguíneo é danificado, um coágulo não se forma e o vaso continua a sangrar por um período excessivo de tempo. O sangramento pode ser externo, se a pele é danificada por um corte ou abrasão, ou pode ser interno, em músculos, articulações ou órgãos. Ahemofilia é decorrente da falta dos fatores de coagulação (a hemofilia A tem falta do fator de coagulação VIII; a hemofilia B tem falta do fator de coagulação IX; a hemofilia C tem falta do fator de coagulação XI). A hemofilia A é a mais comum, ocorrendo em mais de 80% dos casos. HISTÓRICO A hemofilia é, muitas vezes, associada à história da Monarquia na Europa. A rainha Vitória passou a doença ao seu filho Leopoldo, e através de várias das suas filhas, a várias famílias reais Europeias, incluindo as famílias reais da Espanha, Alemanha, e Rússia. O filho do Czar Nicolau II da Rússia, Alexei Romanov, foi um dos descendentes da Rainha Vitória que herdou a doença. O termo hemofilia apareceu pela primeira vez em 1828 por Hopff da Universidade de Zurique. Em 1937, Patek e Taylor, dois médicos de Harvard descobriram a globulina anti- hemofílica. Pavlosky, um médico de Buenos Aires, separou a Hemofilia A e Hemofilia B laboratorialmente. Este teste era feito transferindo o sangue de um hemofílico para outro hemofílico. O fato corrigia o sangramento, comprovando que havia mais de um tipo de hemofilia. HEMOFILIA A A hemofilia A é uma doença recessiva ligada ao cromossomo X causada pela deficiência do fator VIII que se transmite por um gene localizado na posição 2,8 do braço longo do cromossomo X da mãe, aparentemente normal. Esta alteração no cromossomo X gera, portanto, uma deficiência no fator VIII, que funciona como um efetivo co-fator para a ativação do fator X pelo fator IXa, participante da via intrínseca da coagulação. É uma patologia quase que exclusiva aos homens, uma vez que se trata de uma herança ligada ao cromossomo X (e uma vez que, na mulher, o outro cromossomo X consegue suprir o mau funcionamento do cromossomo alterado; o que não acontece no homem). Esta é a razão que explica o fato de a mulher ser uma simples portadora da doença. Epidemiologia. Registra-se 01 caso de hemofilia para cada 20.000 nascidos. 80% destes casos, corresponde à hemofila A, sendo esta, portanto, o tipo mais comum de hemofilia. Quase que exclusiva ao sexo masculino 30 a 40% dos casos não têm história familiar de sangramentos Em cerca de 25%-30% dos casos de hemofilia A, o evento genético é novo (mutação de novo), acontecendo a partir da geração do indivíduo acometido (sem histórico pregresso familiar). Arlindo Ugulino Netto; Luiz Gustavo Barros; Yuri Leite Eloy – HEMATOLOGIA – MEDICINA P8 – 2011.1 189 Transmissão genética. A hemofilia, exceto sua variante "C", referida como uma doena recessiva ligada ao cromossomo X ("doena ligada ao sexo"), o que significa que o gene defeituoso est localizado no cromossomo feminino ou cromossomo X. Um homem possui um cromossomo X e um Y. Uma mulher, dois X. Como o defeito est no cromossomo X, raro uma mulher que carregue o defeito, pois seu outro cromossomo X pode produzir os fatores de coagulao necessrios. Entretanto, o cromossomo Y do homem no tem genes para os fatores de coagulao, portanto, se um homem apresentar defeito no cromossomo X, ele desenvolver a doena. Partindo-se do pressuposto que um homem recebe o seu cromossomo X da me, o filho de uma portadora silenciosa tem 50% de chance de ter a doena e 50% de chance de ser sadio. Uma mulher para desenvolver a doena precisa receber dois cromossomos X defeituosos, um do pai e outro da me. Por isso a doena mais comum em homens do que em mulheres. Portanto, como mostra a figura ao lado, um casal composto por um homem sadio e uma mulher portadora pode ter uma criana do sexo masculino sadia e um hemoflico, ou uma criana do sexo feminino sadia e outra portadora. O grande problema se configura na mulher portadora, a qual no manifesta a doena, mas transmite seu cromossomo X defeituoso para suas gera es futuras, afetando a segunda gerao deste casal. Duas situa es podem estar associadas ao nascimento de meninas hemoflicas: A unio de um pai hemoflico e uma me portadora pode gerar, alm de filhas portadoras, filhos hemoflicos e filhas hemoflicas. A eventual inativao embrionria de um cromossomo X sadio (lionizao), de modo que o gene defeituoso localizado no outro cromossomo X se expressa normalmente. Classificação da hemofilia A. Leve: dosagem do Fator VIII > 5% Moderada: dosagem do Fator VIII entre 1%-5% Grave: dosagem do Fator VIII inferior a 1% HEMOFILIA B A hemofilia B (doena de Christmas) caracterizada pela falta do fator de coagulação IX, cujo gene responsvel tambm localizado no brao longo do cromossomo X. menos frequente e menos grave que o tipo A: sua incidncia 10 vezes inferior a hemofilia A (incidncia de 1:30.000 a 1:50.000). MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS O espectro clnico da doena varia de acordo com a gravidade da hemofilia – se o paciente for um hemoflico grave, ele apresentar sinais hemorrgicos mais frequentes e de forma mais espontnea; o paciente portador de hemofilia moderada apresentar uma apresentao varivel, podendo acontecer de forma espontnea ou decorrente de traumas; j o paciente portador de uma forma leve de hemofilia apresentar sintomas apenas quando submetido a trauma. As manifesta es da doena podem ocorrer logo no primeiro ano de vida do paciente sob a forma de equimoses. Alm destas, outros sinais podem caracterizar a doena: Hemartrose: responsvel por 70 a 80% dos sangramentos. decorrente do sangramento espontneo dos vasos sinoviais que se dirigem cpsula articular. Locais mais comumente acometidos: joelho, tornozelo, cotovelo, ombro e coxo-femoral. Surgem geralmente de sangramentos espontneos. Sinais e sintomas: dor, aumento do volume da articulao, calor, limitao de movimento. Arlindo Ugulino Netto; Luiz Gustavo Barros; Yuri Leite Eloy – HEMATOLOGIA – MEDICINA P8 – 2011.1 190 Antes da instalao da hemartrose, comum o paciente passar por um perodo semelhante a uma “aura”, apresentando manifesta es inespecficas como inquetao, formigamento, ansiedade e, posteriormente, aumento da articulao acometida e calor local. Aps tratamento cessa o sangramento, porm a absoro total do sangue no ocorre Surgem rea es inflamatrias crnicas na membrana sinovial que se torna espessada e vascularizada, formando dobras e vilosidades que propicia a novos sangramentos. O sangramento decorrente justamente por rompimento dos vasos da sinvia. A cartilagem articular evolui com eros es, degenerao fibrilar, crescimento irregular e alterao da formao ssea. Artropatia hemofílica crônica: sua gravidade proporcional ao nmero de hemartrose ocorridas, pois consiste em uma complicao desta patologia. As principais caractersticas da artropatia so a perda ou limitao da movimentao articular, contratura fixa em flexo e intensa atrofia muscular, secundria ao desuso. A radiografia simples capaz de mostrar a destruio da articulao, caracterizando a artropatia crnica, como mostra a figura ao lado. Hematomas: a segunda causa mais comum de sangramento em hemoflicos graves, podendo ser espontneos ou causados por traumas leves. Podem ser pequenos e autolimitados, causando apenas dor, a graves, chegando a dissecar a musculatura, resultando em compresso de estruturas nobres (sndrome compartimental). O local do sangramento se d na musculatura, sendo mais frequentes em panturrilha, coxa, glteos e antebrao. A complicao mais comum destes hematomas o surgimento da sndrome compartimental, com aumento da presso no segmento envolvido e compresso de vasos e nervos. Hematomas do ileopsoas: pode ser confundida com apendicite aguda (quando o hematoma se instala no ileopsoas do lado direito), sendo necessrio solicitar USG abdominal para esclarecimento diagnstico. Hematúria: ocorre em 2/3 dos casos. prudente solicitarexames como urina I e USG renal (para estabelecer diagnstico diferencial com clculo renal). Sangramento gastrointestinal: hematmese ou melena. A origem, na maioria dos casos, se d por gastrite ou por lceras gstricas. Entretanto, uma condio no muito frequente. Sangramento intracraniano: hematoma subdural, epidural ou intracerebral que pode surgir de forma espontnea ou aps traumas. Em pacientes hemoflicos, podemos sugerir um sangramento intracraniano na presena de cefalia duradoura (por mais de 4 horas), tontura, perda da conscincia, etc. Pseudotumor hemofílico: pouco frequente, porm grave. Hematoma persiste em forma de leso cstica encapsulada. Podem causar compresso e destruio dos msculos, nervos e ossos. DIAGNÓSTICO O diagnstico deve ser sugerido logo que uma criana apresenta sangramentos anormais durante atividades rotineiras, principalmente em mucosas, articula es e hematomas em grupos musculares. Alm disso, comum relatos familiares de hemofilia. Arlindo Ugulino Netto; Luiz Gustavo Barros; Yuri Leite Eloy – HEMATOLOGIA – MEDICINA P8 – 2011.1 191 Podemos lanar mo ainda dos seguintes parmetros complementares: Hemograma: pode se apresentar normal, ou mostrar anemia, a depender da perda de volume sanguneo. Coagulograma TTPA: alargado Tempo de sangramento (TS), tempo de coagulao (TC), Tempo de trombina (TP), Ativao de protrombina (AP): normais Dosagem do fator VIII e IX: diagnstico definitivo da doena. TRATAMENTO No h cura para a hemofilia. Controla-se a doena com inje es regulares dos fatores de coagulao deficientes (o uso de plasma no mostrou resultados eficientes). Alguns hemoflicos desenvolvem anticorpos (chamadas de inibidores) contra os fatores que lhe so dados atravs do tratamento (ver OBS4). Concentrado de Fator VIII e IX: concentrado liofilizado, obtido atravs do plasma humano. Submetido a pasteurizao, calor seco e calor mido. Vida mdia fator VIII: 12h (portanto, para hemofilia A, faz-se concentrado de fator VIII de 12/12 horas). Vida mdia fator IX: 24h (portanto, para hemofilia B, faz-se concentrado de fator IX de 24/24 horas). Drogas anti-fibrinolíticas: so importantes para impedir a degradao natural da fibrina, de modo que ela auxilie, de certa forma, no controle de sangramentos. Podemos lanar mo de: Ácido Transexâmico - TXA (Trasamim®), 10mg/kg dose EV ou mg/kg VO 3x dia; ou Ácido épsilon-aminocapróico - EACA (entretanto, o Trasamim bem mais potente que o cido aminocaprico). A reposio dos fatores de coagulao leva em conta a magnitude do sangramento e o local deste sangramento. Podemos lanar mo das seguintes frmulas (considerando que, a cada unidade de concentrado de fator VIII administrada, aumentamos 2 unidades deste fator no sangue; enquanto que para cada unidade de fator IX administrada, aumentamos apenas uma unidade no sangue): Unidades internacionais (UI) de CFVIII = Peso x Porcentagem (Δ) necessria de fator VIII 2 Unidades internacionais (UI) de CFIX= Peso x Porcentagem (Δ) necessria de fator VIII A apresentao farmacutica destes fatores se d na forma de frascos de 150 e de 500 unidades. A porcentagem necessria para reposio dos fatores se apresentam em valores pr-estabelecidos a depender da sede e da intensidade do sangramento. Desta forma, para cada tipo especfico de sangramento, temos: Epistaxe: Tamponamento em dedo de luva cido epsilon 200mg/kg 6/6h por 3 a 7 dias CFVIII ou IX: Δ=30% (ver OBS3) Hemartrose: CFVIII (Δ=30%), por 3 a 5 dias Realizar compressa fria (gelo) local, para induzir uma vasoconstrio. Hematoma Panturrilha, antebrao, iliopsoas Sem comprometimento neurolgico (sem sndrome compartimental): Δ=50%; 12/12h (para hemofilia A) ou 24/24h (para hemofilia B); 3 a 5 dias Com comprometimento neurolgico: Δ=100% 12/12h, de 3 a 5 dias, independente se for hemofilia A ou B. Pescoo e assoalho da lngua: Δ=80% no primeiro dia e, depois, Δ=40%, por 3 a 5 dias. Retroperitneo: Δ=80% primeiro dia e, depois, Δ=40% 12/12h, por 10 a14 dias Hematria: nesta situao, nunca utilizar drogas anti-fibrinolticas, como o TXA ou o EACA, pois a formao de cogulo em nvel renal pode promover obstru es tubulares. Utilizar Δ=30% de 24/24h at desaparecer. Solicitar USG ou TC para acompanhar o comprometimento renal. Hemorragia TGI: Δ=80% de 24/24h + EACA 100mg/kg VO 6/6h. TCE: Pequena monta: Δ=50% 24/24h Sangramento maior confirmado pela TC: Sem sinais neurolgicos: Δ=100% na primeira infuso e, depois, Δ=50% de 24/24h por 14 dias. Arlindo Ugulino Netto; Luiz Gustavo Barros; Yuri Leite Eloy – HEMATOLOGIA – MEDICINA P8 – 2011.1 192 Com sinais neurolgicos: Δ=100% na primeira infuso e, depois, Δ=50% 12/12h por 6 dias, mantendo, depois deste perodo, Δ=50% de 24/24h at completar 14 dias. Realizar TC de crnio e se houver melhora, fazer Δ=50% 24/24h at 14 dias. Cirurgias de pequeno porte: Δ=50% antes imediatamente a cirurgia e 30% no ps-operatrio 24/24h 2 a 3 dias. Cirurgias de médio porte: Δ=100% no pr-operatrio Δ=50%12/12h at 3 dia Δ=40% 12/12h at 7 dia Δ=30% 12/12h at 14 dia Cirurgias de grande porte: Pr-operatrio: Δ=100% Ps-operatrio: Δ=80% 12/12h at 3 dia Δ=50% 12/12h 4a 7dia Δ=40% 12/12h 8 a 14 dia Δ=30% 12/12h 15 a 21 dia OBS3: Para melhor entendimento do clculo de unidades de concentrado necessrias para o paciente com hemofilia, tomemos como exemplo um paciente de 60kg portador de hemofilia A que apresenta epistaxe. Para determinar a quantidade de unidades, temos: 60 x 30/2 60 x 15 CFVIII = 900 UI. Desta forma, podemos prescrever o seguinte tratamento para este paciente: Concentrado de Fator VIII, 2 frascos em bolus (sabendo que existem frascos de 500 unidades, podemos aproximar este valor). OBS4: Na hemofilia A, o paciente pode vir a desenvolver anticorpos contra o fator VIII, o que pode complicar a utilizao deste elemento durante o tratamento das complica es da hemofilia. Nestes casos, quando se administra fator VIII, o paciente desenvolve aloanticorpos contra este fator, diminuindo o aproveitamento dos concentrados de fator VIII. Devemos suspeitar desta condio quando o paciente se apresentar refratrio ao tratamento com concentrado de FVIII ou quando necessitar de doses cada vez mais frequentes de FVIII. Para confirmar, podemos realizar a dosagem destes anticorpos. Para driblar esta situao, podemos abrir mo da diviso (por 2) durante o clculo da dosagem do concentrado de FVIII para hemofilia A, estimando a dose total apenas multiplicando o peso do paciente e a porcentagem necessrio de FVIII para aquele tipo de sangramento. Alm das altas doses de FVIII, podemos utilizar ainda complexo de pr-trombina ativado (Prothromplex¥) ou administrao de fator VII. DOENA DE VON WILLEBRAND A doença de von Willebrand uma doena hemorrgica hereditria (autossmica dominante, na maioria dos casos) causada por uma diminuio ou uma disfuno da protena chamada de fator de von Willebrand (FvW). Isto ocorre devido mutao no cromossomo 12 e caracterizada por deficincia qualitativa ou quantitativa do fator de von Willebrand. A doena foi descrita pela primeira vez em 1925 pelo mdico finlndes Erik Adolf von Willebrand. A diversidade de muta es leva ao aparecimento das mais variadas manifesta es clnicas possibilitando a diviso dos pacientes em vrios tipos e subtipos clnicos. A coagulopatia se manifesta basicamente atravs da disfuno plaquetria associada diminuio dos nveis sricos do fator VIII coagulante. Existem tambm casos raros de doena de von Willebrand adquirida (mais comum em pacientes com mielopatias, como linfomas, em que se desenvolvem anticorpos anti-FvW). EPIDEMIOLOGIA a doena hemorrgica mais comum Atinge cerca de 2% da populao mundial Acomete igualmente ambos os sexos, porm mulheres tm mais probabilidade de ter a doena diagnosticada pelas manifesta es durante a menstruao. FATOR DE VON WILLEBRAND O fator de von Willebrand (FvW) um multmero que circula no plasma sanguneo em uma concentrao aproximada de 10mg/ml. Ele sintizado por clulas endoteliais e megacaricitos. Tem duas fun es principais: Mediar a adeso das plaquetas ao subendotlio lesado: funciona como uma ponte entre receptores da plaqueta (glicoprotena Ib, principalmente) e o subendotlio lesado. Para que ocorra a adeso s plaquetas necessario a presena de grandes multmeros do FvW. Manter os nveis plasmticos do fator VIII (protena procoagulante): o FvW liga-se a fator VIII, alentecendo (evitando) sua degradao. Arlindo Ugulino Netto; Luiz Gustavo Barros; Yuri Leite Eloy – HEMATOLOGIA – MEDICINA P8 – 2011.1 193 Portanto, em casos de deficiência de FvW, independente da causa (hereditária ou não), o fator VIII passa a circular de forma desprotegida, podendo cursar com deficiência deste fator, simulando sangramentos que outrora vimos como típicos da hemofilia (hemartrose, epistaxes, etc.). CLASSIFICAÇÃO Tipo 1: é o tipo mais comum, entre 60-80% dos casos. É um defeito quantitativo leve, em que a concetração do FvW fica entre 20-50% do valor normal. Causa sangramentos de leve a moderado. Tipo 2: é um defeito qualitativo (funcional) e acomete entre 20-30% dos casos. Neste caso, o indivíduo apresenta quantidades normais de FvW, mas que não funciona corretamente. Possui 4 subtipos: 2A: subtipo mais comum. Neste caso o FvW tem dificuldade de unir-se às plaquetas e há diminuição da presença de grandes multímeros. 2B: o FvW tem grande afinidade de união às plaquetas, por isso diminui a circulação livre do FvW. 2M: não há ausência dos grandes multímeros porém eles não tem a mesma capacidade de ligação às plaquetas. 2N: o FvW perde a capacidade de ligação com o Fator VIII (cursando com características clínicas semelhantes à hemofilia, sendo necessário diagnóstico diferencial com esta patologia). Tipo 3: é o tipo mais grave, caracterizado pela deficiência total do FvW. O paciente tem sangramentos profundos. Doença de von Willebrand Adquirida: está relacionada a outras patologias como doenças linfóides, mieloma múltiplo, macroglobulinemia, doenças mieloproliferativas, alguns tumores, algumas doenças autoimunes entre outras. De um modo geral ela pode ser ocasionada por anticorpos anti-FvW ou não. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS Sangramentos de leve a moderado que variam com a intensidade da doença. Hematomas Sangramentos menstruais prolongados (menorragia) Sangramentos nasais Sangramentos excessivos após pequenos cortes Sangramentos após extração dentária ou outra cirurgia. Gengivorragia, equimoses frequentes DIAGNÓSTICO Deve-se levar em conta a presença dos sintomas, história familiar (já que a doença é de herança genética) e estudos laboratoriais. Seu diagnóstico laboratorial é difícil principalmente no que diz respeito a classificação. Testes auxiliares: o TTPA (tempo de tromboplastina parcialmente ativado): encontra-se prolongado nos casos de deficiência de FvW (em alguns casos devido a baixa de fator VIII) assim como tempo de sangramento. o Tempo de sangramento: estará aumentado. o Dosagem de fator VIII: como o FvW protege o fator VIII, sua falta ocasionará a degradação deste fator e, consequente, sua diminuição. Porém a simples dosagem baixa de fator VIII não diagnostica definitivamente a doença de von Willebrand, já que o Fator VIII diminui nos casos de hemofilia A. o Contagem de plaquetas: geralmente apresenta-se normal a todos os tipos, com exceção do tipo 2B que tem uma leve diminuição. Arlindo Ugulino Netto; Luiz Gustavo Barros; Yuri Leite Eloy – HEMATOLOGIA – MEDICINA P8 – 2011.1 194 Testes específicos: o Dosagem de antígeno de von Willebrand: se mostra reduzido, de uma maneira geral. A dosagem é feita por ensaio imunológico este teste apresenta boa resposta para os tipos 1 e 3, ja que nem sempre os casos do tipo 2 apresentam baixa na concentração de FvW. o Agregação induzida pela Ristocetina reduzida (teste de adesão plaquetária com Ristocetina): o plasma rico em plaquetas do paciente é colocado em contato com a ristocetina (um antibiótico que facilita a liberação de estoques de fator VIII); o paciente normal apresenta agregação; quando há deficiência do FvW, há falta de de agregação, sendo que o tipo 2B tem aumento na sensibilidade de aglutinação mesmo em concetrações menores. TRATAMENTO Evitar drogas antiplaquetárias (qualquer comprimido que contenha AAS) Crioprecipitado: é um componente do sangue rico em FvWB, tendo a desvantagem do risco maior de transmissão infecciosa, mas a vantagem do baixo custo. DDAVP ou desmopressina (0,3mg/kg diluido em 50ml SF): análogo do hormônio vasopressina cuja função é aumentar o nível plasmático do FvW através da libertação dos depósitos endoteliais do mesmo. Concentrados de Fator VIII: sabendo que este fator pode estar diminuído frente à carência de FvW, podemos lançar mão de seu uso. Complexo de pró-trombina ativado (Prothromplex®) Drogas antifibrinolíticas: podem ser suficientes para permitir que um paciente possa fazer pequenas cirurgias dentárias, por exemplo. O ácido epsilon-aminocapróico (EACA, 6g VO 6/6h durante 3-4 dias após o procedimento) e o ácido tranexâmico (TXA, 25mg/Kg VO 6/6h) são os dois mais utilizados. Essas drogas inibem a ativação do plasminogênio aderido à fibrina, sendo mais eficazes contra hemorragias na mucosa oral. Arlindo Ugulino Netto; Luiz Gustavo Barros; Yuri Leite Eloy – HEMATOLOGIA – MEDICINA P8 – 2011.1 195 MED RESUMOS 2011 NETTO, Arlindo Ugulino. HEMATOLOGIA COAGULOPATIAS ADQUIRIDAS (Professora Flávia Cristina Fernandes Pimenta) As coagulopatias adquiridas estão associadas a múltiplas alterações da coagulação (no que diz respeito, portanto, ao mecanismo de hemostasia secundária), sendo que a deficiência de Vitamina K e as hepatopatias se configuram entre as mais comuns em animais. O diagnóstico se dá pelas características clínicas e pelos resultados dos testes como tempo de pró-trombina (TP), tempo de tromboplastina parcial ativado (TTPA) e tempo de trombina (TT). Ao se estabelecer o diagnóstico de uma coagulopatia, se faz necessário diferenciá-la sob o ponto de vista etiopatogênico (se é hereditária ou adquirida; ver OBS1) e, não menos importante, diferenciá-la de distúrbios que envolvem a hemostasia primária (como as púrpuras, por exemplo; ver OBS2). As coagulopatias adquiridas se diferenciam das hereditárias em vários pontos. Enquanto as desordens hereditárias possuem características clínicas típicas de uma coagulopatia e anormalidades características no coagulograma, as coagulopatias adquiridas geralmente cursam com anormalidades múltiplas na hemostasia, às vezes associadas à trombocitopenia. Muitas vezes, o sangramento é apenas mais uma das complicações da doença de base que levou ao distúrbio hemostático. OBS1: O diagnóstico das coagulopatias adquiridas inicia-se pela anamnese, através da análise da história clínica do paciente, com relação principalmente à ocorrência de sangramentos anteriores. Isto é importante pois, para pacientes atendidos com queixas de sangramento, o médico tem por obrigação saber diferenciar se a coagulopatia é de origem hereditária e adquirida. O relato de sangramentos anteriores, ou ainda na ocasião do nascimento/infância, falam a favor de coagulopatia hereditária. OBS2: Outra forma importante de diferenciar as coagulopatias, do ponto de vista diagnóstico, se faz com relação às púrpuras, uma vez que estas estão envolvidas com distúrbios da hemostasia primária, enquanto que as coagulopatias, de um modo geral, estão relacionadascom distúrbios da hemostasia secundária. As coagulopatias, geralmente, se apresentam na forma de sangramentos tumorais (hematomas, hemartroses, sangramentos articulares, etc.); as púrpuras, por sua vez, se apresentam mais comumente na forma de sangramentos planos (petéquias e equimoses). MECANISMOS FISIOPATOLGICOS Identificada a coagulopatia adquirida e feita a sua diferenciação com distúrbios hereditários e distúrbios da hemostasia primária, a próxima etapa é saber classificar a coagulopatia quanto a sua etiopatogenia, analisando os seguintes mecanismos: Deficiência de vitamina K: a deficiência de vitamina K pode ocorrer por problema gastrintestinal crônico como má absorção e administração por longo tempo de terapia com sulfanilamida e antibióticos de amplo espectro de ação. Pode ocorrer também em pacientes que não nascem em ambiente hospitalar, e que por isso, não são submetidos à reposição de vitamina K (o que seria importante para evitar a doença hemorrágica do RN, visto que o bebê tem deficiência relativa de fatores da coagulação). Hepatopatias: cursam com consumo de todos os fatores da coagulação, já que o fígado participa direta ou indiretamente da formação de todos os fatores de coagulação. Anticoagulantes circulantes: ocorre comumente naqueles pacientes que são portadores de hemofilia e, que de tanto repor o fator VIII, deficiente para seu tipo específico de hemofilia, experimenta a formação de anticorpos contra este fator, e passa a não responder mais à terapia. Consumo exagerado: característico em pacientes politraumatizados com sangramentos intensos, hemorragias digestivas difusas e intensas. DEFICINCIA DE VITAMINA K A vitamina K é um co-fator fundamental para a gamacarboxilação hepática dos fatores D, VII, IX e X, além dos anticoagulantes endógenos proteína C e proteína S. Sem a vitamina K estes fatores têm o seu efeito prejudicado pela falta da terceira carboxila nos resíduos de ácido glutâmico. Este radical é fundamental para a interação com o fosfolipídio plaquetário e com o cálcio ionizado. FISIOLOGIA DA VITAMINA K A vitamina K apresenta três formas de apresentação: Fitoquinona (K1); Menaquinona (K2); e Menadiona (K3). Apresenta como fonte alimentos de origem animal, como a carne e fígado. Sua absorção acontece no intestino delgado. Sua importância da coagulação diz respeito aos fatores II, VII, IX e X, proteína C e S são dependentes da vitamina K para sua atuação através da gamacarboxilação. O que ocorre é que os fatores II, VII, IX e X, são monovalentes e, com isso, não se ligam ao cálcio (co-fator fundamental durante toda a cascata da coagulação). Para que o cálcio se liga a estes fatores, é necessário uma nova carboxilação, o que torna a molécula bivalente e possibilita a ligação com o cálcio. Essa reação química é proporcionada pela vitamina K. Arlindo Ugulino Netto; Luiz Gustavo Barros; Yuri Leite Eloy – HEMATOLOGIA – MEDICINA P8 – 2011.1 196 Dessa forma, na deficincia de vitamina K, os fatores II, VII, IX e X, a protena C e S, so produzidos, mas no participam da cascata de coagulao uma vez que eles no se tornam bivalentes e no se ligam ao clcio, o que configura uma situao que impede a passagem entre as fases da cascata da coagulao. OBS3: Como veremos adiante, este mecanismo leva a altera es no tempo de pr-trombina (TP), responsvel por avaliar a funo do fator VII, sendo este o primeiro exame que se altera. OBS4: No tratamento das tromboses, os medicamentos utilizados, como os Cumarnicos (Warfarin – Marevan¥; Dicumarol), determinam uma inibio da gamacarboxilao dos fatores II, VII, IX e X, e protena C e S. ETIOLOGIA Condi es clnicas relacionadas com a deficincia da vitamina K. O recm-nato, por exemplo, tem baixas reservas de vitamina K e fica propenso sua carncia, principalmente se for prematuro e alimentado exclusivamente com leite materno (pobre em vitamina K). A doena hemorrgica do recm-nato (como chamada esta entidade) pode ser prevenida ou tratada pela aplicao parenteral de vitamina K 1mg. Baixa ingesto de fontes de vitamina K: fgado, vegetais de folhas verdes (espinafre, couve-flor, repolho), leite, tomate, arroz integral, ervilha, leos vegetais, sementes de soja, ch verde, gema de ovo, aveia, trigo integral, batatas, aspargos, pepinos, manteiga, queijo, carne de vaca e de porco, presunto, cenouras e milho. Baixa absoro: Sndrome de m absoro: altera es anatmicas ou fisiolgicas que acometem o intestino delgado. Colelitase, coledocolitase, fstula biliar: por ser uma molcula lipossolvel, as doenas que afetam as vias biliares determinando uma obstruo a sada dos sais biliares, determina uma absoro deficiente de vitamina K. Por isso, esses pacientes apresentam deficincia de vitamina K, e antes do procedimento cirrgico deve-se realizar um coagulograma e repor vitamina K se necessrio. Antibioticoterapia oral prolongada: alteram as bactrias intestinais. Uso de Cumarnicos: Warfarin. DIAGNÓSTICO Nesses pacientes a principal forma de realizar o diagnstico atravs do tempo de atividade de protrombina (TAP ou TP) que avalia o fator VII, sendo o primeiro parmetro que se altera no coagulograma. Como o fator VII o fator de menor meia-vida, logo fica deficiente na carncia de vitamina K. Assim, o TP alarga mais (alcanando um nvel de INR acima do limite esperado para o normal que 1,2) e muito antes do TTPA, devendo ser o parmetro utilizado para a suspeita diagnostica e controle teraputico. Depois, a deficincia dos fatores II (hipoprotrombinemia), IX e X fazem alargar tambm o TTPA (o que menos comum nesta deficincia). TRATAMENTO O tratamento a reposio da vitamina 10mg parenteral, restaurando a hemostasia em 10-12h. A via pode ser subcutnea ou venosa. A administrao intramuscular pode acarretar na formao de hematoma. O plasma fresco congelado utilizado nos casos de urgncia hemorrgica. Caso o paciente apresente uma condio no muito grave (como por exemplo, uma colelitase), e o procedimento cirrgico est prximo de ser realizado, pode-se fazer uma reposio intramuscular de vitamina K. Caso necessite de uma atividade mais imediata, pode-se realizar a administrao da forma hidroflica, por via IV. Entretanto, nas duas formas de administrao, os fatores sero produzidos somente depois de 24 horas. Arlindo Ugulino Netto; Luiz Gustavo Barros; Yuri Leite Eloy – HEMATOLOGIA – MEDICINA P8 – 2011.1 197 ENFERMIDADE HEMORRÁGICA DO RECÉM-NASCIDO A enfermidade hemorrágica do RN consiste em uma condição de deficiência de vitamina K, em que o RN não recebe uma dose profilática de vitamina K logo após o nascimento. Geralmente apresentam sintomas nos primeiros dias de nascimento através de sangramentos no coto umbilical. O diagnóstico diferencial é feita principalmente com coagulação intravascular disseminada (CIVD) e infecções neonatais. Laboratorialmente, o hemograma se mostra normal para o RN, mas, no coagulograma, percebe-se uma elevação do tempo de protrombina. O tratamento consiste na reposição da vitamina nos casos leves; nos casos em que há sangramentos generalizados e hemorragias digestivas, pode ser necessária a administração de complexos pró-trombínicos (que consiste em um hemoderivado que possui os fatores II, VII, IX e X). HEPATOPATIAS O hepatócito sintetiza todos os fatores da coagulação. Portanto, quando há sofrimento hepático, poderá se desenvolver uma coagulopatia por deficiência de diversos fatores, da via intrínseca (IX, XI, VIII), extrínseca (Vil) e comum (I, II, X, V) da coagulação. A gama-carboxilação dos fatores do complexo protrombínico (II, VII, IX, X) está deficiente, especialmente do fator VII, razão pela qual predomina o alargamento do TP, como acontece na deficiência de vitamina K e no uso de cumarínicos. Como também é o fígadoque sintetiza os anticoagulantes endógenos anti trombina III, proteína C e proteína S, estes encontram-se depletados na insuficiência hepática, predispondo à trombose e à CIVD. Finalmente, a não- depuração hepática do tPA (ativador do plasminogênio tecidual), pode determinar um estado de hiperfibrinólise primária (ver adiante). A esplenomegalia congestiva também pode justificar uma trombocitopenia moderada. HISTÓRIA CLÍNICA A história clínica destes pacientes revela histórico de hepatopatia crônica. Geralmente, esses pacientes apresentam fenômenos vasculares, ginecomastia, telangiectasias, atrofia testicular, hipertensão portal, varizes esofagianas, entre outros achados que sugerem uma insuficiência hepática. ACHADOS LABORATORIAIS Os exames a serem solicitados incluem o hemograma, o coagulograma e dosagem de fibrinogênio para realização do diagnóstico diferencial com CIVD (pois nos hepatopatas, esta está normal). Plaquetopenia no hemograma Deficiência de fatores de coagulação: altera tanto o tempo de protrombina (TP) como tempo de tromboplastina parcial ativado (TTPA). Sendo esta uma forma de diferenciação da coagulopatia por vitamina K, já que nesta observa-se somente uma elevação da TP. Exacerbação da fibrinogenólise, com tendências ao sangramento Tendência trombótica: deficiência de Antitrombina, proteínas C e S TRATAMENTO Reposição de vitamina K; Complexo protrombínico (Prothromplex®): quando o paciente apresenta sangramentos ativos. Plasma fresco congelado: para casos de hemorragia grave e com sangramento digestivo com risco de choque. INIBIDORES CIRCULANTES DOS FATORES DA COAGULAO O aparecimento de auto-anticorpos anti-fator VIII (do tipo IgG) pode ocorrer em algumas circunstâncias da prática médica, tal como (1) o hemofílico A que recebeu componentes do sangue; (2) na puérpera; (3) no lúpus eritematoso sistêmico; e (4) em algumas imunodeficiências. Este anticorpo inativa o fator VIII, provocando uma diátese hemorrágica, às vezes, bastante grave A presença de anticoagulantes circulantes é comum em pacientes hemofílicos que são submetidos à reposição dos fatores deficiências (VIII para hemofilia tipo A; IX para hemofilia tipo B) e que apresentam a formação de anticorpos contra estes fatores. ETIOLOGIAS Presença de inibidores na hemofilia: o uso crônico dos fatores de coagulação estimula a formação de anticorpos contra os fatores que são infundidos no paciente. Doenças auto-imunes: LES Uso de medicamentos: principalmente penicilina e eventualmente a procainamida. Arlindo Ugulino Netto; Luiz Gustavo Barros; Yuri Leite Eloy – HEMATOLOGIA – MEDICINA P8 – 2011.1 198 DIAGNÓSTICO O diagnstico pode ser sugerido diante de um quadro de paciente hemoflico com sangramentos de difcil controle e refratrios reposio de fator VIII. O coagulograma revela um TTPA bem alargado e um TP normal ou alargado. O quadro pode ser agudo e auto-limitado ou se cronificar. TRATAMENTO Sabe-se, portanto, que o paciente no responde reposio de crioprecipitado, plasma fresco congelado ou fator VIII purificado, pois o anticorpo inibe o fator VIII exgeno tambm. A alternativa mais vivel a infuso do concentrado de complexo protrombnico – o Prothromplex – por conter pequenas quantidades dos fatores II, IX e X ativados, “desviando” a utilizao do fator VIII na cascata da coagulao. Entre os hemoderivados, somente o Prothromplex controla a hemorragia destes pacientes. A plasmaferese e o uso de imunossupressores (ex.: ciclofosfamida) pode ser necessrio nos casos crnicos e refratrios. COAGULAO INTRAVASCULAR DISSEMINADA A coagulao intravascular disseminada (CIVD) configura uma expresso clnica de diversas doenas sistmicas graves. Trata-se de uma grave desordem adquirida da hemostasia, relacionada a doenas no menos graves, como a sepse bacteriana por Gram negativos (ex.: meningococo, enterobactrias, pseudomonas), as complica es obsttricas (descolamento prematuro de placenta, feto morto retido, embolia amnitica), neoplasias malignas (adenocarcinoma mucinoso, LMA promieloctica - M3), politrauma, grande queimado, hemlise intravascular aguda etc. Como o prprio termo sugere, a CIVD caracterizada pela formao de trombos principalmente na microcirculao sistmica levando ao consumo de todos os fatores da coagulao, ou seja, uma coagulopatia adquirida por consumo de fatores. A CIVD abordada neste captulo pois ela tambm considerada uma coagulopatia adquirida, caracterizada pelo consumo de fatores da coagulao. Na fase inicial, caracteriza uma doena pr-trombtica, induzindo a trombose generalizada. Nesta fase, no existem exames laboratoriais que possam sugerir CIVD, da a importncia das correla es clnicas do paciente (quando diagnosticada em fase inicial, o tratamento pode ser feito com anticoagulantes, como a heparina). IMPORTÂNCIA EPIDEMIOLÓGICA Estima-se que 4 em cada 1.000 admiss es hospitalares apresentam CIVD, tendo uma alta incidncia em pacientes hospitalizados e em UTI. Faz parte da trade da morte uma patologia grave que, se no diagnosticada na sua fase preventiva, leva o paciente ao bito muito frequentemente. Est associada a dezenas de situa es clnicas FISIOPATOLOGIA A CIVD uma sndrome adquirida caracterizada por coagulação intravascular sistêmica, em que h uma deposio intravascular de fibrina, a qual recruta plaquetas e forma microtrombos em vasos de pequeno e mdio calibre, acarretando em isquemia de diversos rgos, podendo cursar com falência múltipla de órgãos. Alm disso, essa ativao sistmica da coagulao vai produzir uma depleo de plaquetas e fatores da coagulao, predispondo a fenmenos hemorrgicos, podendo levar ao bito. Quando o diagnstico feito na fase hemorrgica, mesmo que haja controle desta, j houve uma isquemia generalizada e, com isso, j existem altera es irreversveis. Arlindo Ugulino Netto; Luiz Gustavo Barros; Yuri Leite Eloy – HEMATOLOGIA – MEDICINA P8 – 2011.1 199 Em resumo, a sequncia fisiopatolgica da CIVD consiste em: Ativao macia da coagulao (a coagulao sempre caracteriza o evento inicial) Formao de mltiplos trombos de fibrina Isquemia tecidual Processo persistente – depleo de fatores da coagulao e plaquetas Coagulopatia Hemorragias diversas ©bito (se o processo no for interrompido) ETIOPATOGENIA Infec es diversas com sepse grave: causa mais comum Complica es obsttricas (descolamento de placenta, embolia de lquido amnitico, reteno de feto morto) Malignidades (leucemia mielide aguda M3, neoplasia gstrica, prstata, pncreas, pulmo, clon, etc ) Politrauma Grande queimado Acidentes ofdicos Cirrose heptica avanada M-forma es vasculares Hemangioma cavernoso gigante - Sndrome de Kasabach-Merrit Anafilaxia Pancreatite Aguda Hipotermia QUADRO CLÍNICO O quadro clnico desses pacientes extremamente heterogneo, j que ocorre microtromboses de forma disseminada, ou seja, h isquemia de praticamente todos os sistemas do corpo (diferentemente dos casos de TVP, por exemplo, em que geralmente ocasionam sinais clnicos locais como dor em membros inferiores, edema, varizes etc). Por isso, a necessidade de se ter uma avaliao clnica mais apurada com os achados laboratoriais desses pacientes. Clinicamente, podemos identificar duas fases da CIVD: Fase isquêmica: isquemia e necrose de extremidades com gangrena Fase hemorrágica: sangramentos diversos e difusos, espontneos ou no. “O paciente sangra por todos os orifcios, tubos e drenos“. ACHADOS LABORATORIAIS Hemograma: demonstra uma plaquetopenia (trombocitopenia), uma vez que a formao de trombos levou ao consumo exagerado de tais clulas. Pode mostrar tambm anemia hemoltica microangioptica, com esquizcitos
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