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PASSADO E FUTURO DA SÚMULA.VERSÃO FINAL.22jun2005doc

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Passado e Futuro da Súmula
Vinculante: considerações à luz da Emenda Constitucional n. 45/2004 (
Gilmar Mendes
Ministro do Supremo Tribunal Federal do Brasil; Professor de Direito Constitucional nos cursos de graduação e pós-graduação da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília-UnB; Mestre em Direito pelaUniversidade de Brasília — UnB (1988); Mestre em Direito pela Universidade de Münster, República Federal da Alemanha — RFA (1989); Doutor em Direito pela Universidade de Münster, República Federal da Alemanha — RFA (1990). Membro Fundador do Instituto Brasiliense de Direito Público – IDP. Membro do Conselho Assessor do “Anuario Iberoamericano de Justicia Constitucional” – Centro de Estudios Políticos y Constitucionales - Madri, Espanha. Membro da Academia Brasileira de Letras Jurídicas – ocupante da cadeira nº 28.
Sumário: 1. Considerações gerais. 2. Do efeito vinculante. 2.1. Considerações preliminares: notas sobre o efeito vinculante no Direito Comparado. 2.2. Do efeito vinculante no processo objetivo. 3. Da súmula vinculante. 3.1. Considerações gerais. 3.2. Dos requisitos formais da súmula vinculante. 3.3. Da revisão e do cancelamento de súmula vinculante. 3.4. Da autoridade competente. 3.5. Súmulas anteriores e edição de súmulas comuns. 3.6. Obrigatoriedade e limites objetivos e subjetivos da súmula vinculante. 3.6.1. Considerações preliminares: limites objetivos e subjetivos do efeito vinculante. 3.6.2. Limites objetivos e subjetivos da súmula vinculante. 3.7. Da reclamação constitucional. 4. À guisa de conclusão.
1. Considerações gerais
Após longa tramitação�, foi aprovada a Emenda Constitucional n. 45, de 2004, que confere disciplina constitucional à súmula jurisprudencial (agora chamada súmula vinculante), nos seguintes termos:
“Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei.
§ 1º A súmula terá por objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas, acerca das quais haja controvérsia atual entre órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica. 
§ 2º Sem prejuízo do que vier a ser estabelecido em lei, a aprovação, revisão ou cancelamento de súmula poderá ser provocada por aqueles que podem propor a ação direta de inconstitucionalidade.
§ 3º Do ato administrativo ou decisão judicial que contrariar a súmula aplicável ou que indevidamente a aplicar, caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal que, julgando-a procedente, anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial reclamada, e determinará que outra seja proferida com ou sem a aplicação da súmula, conforme o caso”.
É a consolidação de um longo e tortuoso processo legislativo-constitucional.
Como se sabe, a Súmula do Supremo Tribunal Federal constitui uma das mais significativas inovações em termos de racionalização do processo de decisão por parte das nossas Cortes Superiores, tendo sido adotada por norma regimental em 1963.
O Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal assim dispõe sobre o tema:
“Art. 102. A jurisprudência assentada pelo Tribunal será compendiada na Súmula do Supremo Tribunal Federal.
§ 1º A inclusão de enunciados na súmula, bem como a sua alteração ou cancelamento, serão deliberados em Plenário, por maioria absoluta.
§ 2º Os verbetes cancelados ou alterados guardarão a respectiva numeração com a nota correspondente, tomando novos números os que forem modificados.
§ 3º Os adendos e emendas à súmula, datados e numerados em séries separadas e sucessivas, serão publicados três vezes consecutivas no Diário de Justiça. 
§ 4º A citação de súmula, pelo número correspondente, dispensará, perante o Tribunal, a referência a outros julgados no mesmo sentido.
Art. 103. Qualquer dos Ministros pode propor a revisão da jurisprudência assentada em matéria constitucional e da compendiada na Súmula, procedendo-se ao sobrestamento do feito, se necessário”.
Posteriormente, o próprio Código de Processo Civil estabeleceu a seguinte disposição no seu art. 479:
“Art. 479. O julgamento, tomado pelo voto da maioria absoluta dos membros que integram o tribunal, será objeto de súmula e constituirá precedente de uniformização da jurisprudência.
Parágrafo único. Os regimentos internos disporão sobre a publicação no órgão oficial das súmulas de jurisprudência dominante”.
Na sua versão mais moderna�, o art. 557 do Código de Processo Civil também estabelece:
“Art. 557. O relator negará seguimento a recurso manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou em confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Fe​deral, ou de Tribunal Superior.
§ 1º Se a decisão recorrida estiver em manifesto confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior, o relator poderá dar provimento ao recurso”.
Quando se diz que um recurso pode ser provido ou desprovido monocraticamente, com base na jurisprudência dominante, revela-se idéia de decisão com efeito vinculante. Todavia, não há negar que a súmula cria maior clareza e segurança em torno do tema.
Verifica-se, assim, que a legislação processual civil, de certa forma, já admitia a obrigatoriedade das súmulas dos tribunais superiores, ao estabelecer que os recursos que se fundamentassem em tese jurídica contrária às súmulas dos Tribunais Superiores seriam inadmitidos pelo relator.
A edição de súmulas guarda, entre nós, estrita relação com a própria função dos Tribunais Superiores, no sentido de garantir a autoridade e a uniformidade interpretativa da Constituição e das leis federais.
É o que anota Evandro Lins e Silva:
“(...) para os não iniciados, para o público em geral, diremos: Súmula foi a expressão de que se valeu Vitor Nunes Leal, nos idos de 1963, para definir, em pequenos enunciados, o que o Supremo Tribunal Federal, onde era um dos seus maiores ministros, vinha decidindo de modo reiterado acerca de temas que se repetiam amiudamente em seus julgamentos. Era uma medida de natureza regimental, que se destinava, primordialmente, a descongestionar os trabalhos do tribunal, simplificando e tornando mais célere a ação de seus juízes. Ao mesmo tempo, a Súmula servia de informação a todos os magistrados do País e aos advogados, dando a conhecer a orientação da Corte Suprema nas questões mais freqüentes” �.
Observa Victor Nunes Leal que a súmula tem grande significado como método de trabalho, destinado a ordenar e facilitar a tarefa judicante, o que explicaria a sua utilização pelos diversos Tribunais e pela própria administração4�. Nota o eminente mestre que “[…] o conteúdo da súmula passa para segundo plano, quando o comparamos com a sua função de método de trabalho, revestido de alguns efeitos processuais, que contribuem para o melhor funcionamento da justiça”.
Percebeu-se há muito que a súmula não seria apta a resolver, de forma integral, o problema do excesso de recursos, especialmente no contexto de uma sociedade de massas, tendo em vista o seu limitado caráter de obrigatoriedade ou a sua obrigatoriedade indireta (expressão de Victor Nunes).
Assinale-se, por outro lado, que a Constituição de 1988 deu um significativo impulso à chamada crise numérica experimentada pelo Supremo Tribunal Federal. A Constituição conferiu expressiva ênfase à proteção judicial efetiva, emprestando significado ímpar às ações judiciais individuais e coletivas. De resto, o espírito emanado desse texto certamente contribuiu para que aspessoas reivindicassem, com maior intensidade, os seus direitos na Justiça. Como muitos desses pleitos eram pretensões homogêneas — casos de massa, como, v.g., os casos ligados a planos econômicos, questões previdenciárias, FGTS etc. — ninguém haveria de se surpreender com o fato de os feitos processuais terem se multiplicado.
Apenas para que se possa avaliar a questão a partir da perspectiva do Supremo Tribunal Federal, veja-se o quadro abaixo, que retrata a evolução do número de processos recebidos, considerando os últimos cinqüenta anos.
Supremo Tribunal Federal
Movimento Processual nos anos de 1950 a 2004
	Ano
	No. De Processos Recebidos
	Ano
	No. De Processos Recebidos
	1950
	3.091
	1977
	7.072
	1951
	3.305
	1978
	8.146
	1952
	3.956
	1979
	8.277
	1953
	4.903
	1980
	9.555
	1954
	4.710
	1981
	12.494
	1955
	5.015
	1982
	13.648
	1956
	6.556
	1983
	14.668
	1957
	6.597
	1984
	16.386
	1958
	7.114
	1985
	18.206
	1959
	6.470
	1986
	22.514
	1960
	6.504
	1987
	20.430
	1961
	6.751
	1988
	21.328
	1962
	7.705
	1989
	14.721
	1963
	8.126
	1990
	18.564
	1964
	8.960
	1991
	18.438
	1965
	8.456
	1992
	27.447
	1966
	7.378
	1993
	24.377
	1967
	7.614
	1994
	24.295
	1968
	8.612
	1995
	27.743
	1969
	8.023
	1996
	28.134
	1970
	6.367
	1997
	36.490
	1971
	5.921
	1998
	52.636
	1972
	6.253
	1999
	68.369
	1973
	7.093
	2000
	105.307
	1974
	7.352
	2001
	110.771
	1975
	8.775
	2002
	160.453
	1976
	6.877
	2003
	 87.186
	
	
	2004
	 83.667 *
Fonte: Relatórios Anuais e Secretaria de Informática do Supremo Tribunal Federal 
* O decréscimo verificado em 2003 e 2004 decorre, certamente, das medidas tomadas no âmbito da Administração Federal e do encerramento das questões ligadas ao ciclo inflacionário.
Uma das respostas adequadas para essa evolução complexa parecia ser a súmula vinculante, pois teria o efeito não só de impedir os recursos sobre a matéria já sumulada, mas, sobretudo, de fixar uma orientação que deveria ser seguida pelo Poder Judiciário em geral e, especialmente, pela Administração direta e indireta, que, como se sabe, tem tido participação decisiva no aumento de demandas no âmbito dos nossos Tribunais.
Esperava-se, assim, afetar o problema da litigância abusiva na sua origem, com o aperfeiçoamento de um instituto original e exitoso, a Súmula do Supremo Tribunal Federal.
O tema foi objeto, inicialmente, de proposta de Emenda no âmbito da Revisão Constitucional de 1994.
Era este o teor da proposta de Emenda recomendada pelo Relator, Nelson Jobim:
“Art. 6º É acrescentado um artigo após o art. 97 da Constituição Fe​deral, renumerando-se os demais, e é acrescentada, na letra ‘a’, do inciso I do art. 102, com a redação dada pela Emenda Constitucional n. 03, de 1993, a expressão ‘e súmula dos Tribunais Superiores’:
Art. 98. Os Tribunais Superiores poderão de ofício ou por provocação, mediante decisão de três quintos dos seus membros, após reiteradas decisões sobre a matéria, aprovar súmula que terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário sujeitos à sua jurisdição e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder a sua revisão ou cancelamento.
Parágrafo único. A aprovação, revisão ou cancelamento da súmula poderão ser feitos mediante provocação dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais Regionais do Trabalho, dos Tribunais Regionais Eleitorais, dos Tribunais de Justiça, do Procurador-Geral da República, do Advogado-Geral da União, de Procurador-Geral da Justiça, de Procurador-Geral ou Advogado-Geral de Estado e do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil”.
Posteriormente, a proposta de súmula vinculante, no âmbito do Supremo Tribunal Federal constou de todos os substitutivos elaborados no contexto da Reforma do Judiciário�.
O quadro abaixo permite uma visão comparativa das várias propostas formuladas no âmbito da Câmara dos Deputados:
Registre-se, ainda, que, em 1995, foi apresentada, pelo Senador Cunha Lima, proposta de Emenda Constitucional, com o objetivo de instituir a súmula vinculante no âmbito do Supremo Tribunal Federal. Aprovada no Senado, a proposta foi contemplada pela Câmara dos Deputados no contexto da emenda da Reforma do Judiciário�.
Observe-se, ainda, que o texto aprovado pela Câmara foi contemplado nos substitutivos apresentados por Bernardo Cabral e José Jorge.
Enquanto a discussão sobre a súmula vinculante desenvolvia-se no Congresso Nacional, experimentava o sistema judicial brasileiro uma significativa evolução no que concerne às decisões proferidas em sede de processos objetivos com efeito vinculante.
2. Do efeito vinculante
2.1.	Considerações preliminares: notas sobre o efeito vinculante no Direito Comparado
É possível que o primeiro esforço de sistematização, no que se refere à eficácia erga omnes e ao efeito vinculante das decisões de Cortes integrantes da chamada jurisdição estatal (Staatsgerichtsbarkeit) ou da jurisdição constitucional (Verfassungsgerichtsbarkeit), tenha-se desenvolvido sob o império da Constituição de Weimar (1919).
A decisão proferida pelo Tribunal Supremo da Alemanha (Reichsgericht) ou pela Corte de Finanças (Finanzgerichtshof), no processo de controle abstrato de normas previsto no art. 13, II, da Constituição de Weimar, tinha força de lei (Gesetzeskraft) (Lei de 8 de abril de 1920, § 3, inc. III).
A doutrina constitucional não era unânime quanto ao significado da força de lei — alguns diziam que o Judiciário ficava investido, nesse caso, de funções legislativas —, e quanto aos seus limites, isto é, se estaria limitada à parte dispositiva�, ou se abrangeria, também, os fundamentos determinantes, o que faria com que a decisão sobre a inconstitucionalidade de uma lei afetasse a validade de leis de conteúdo igual ou semelhante do mesmo Estado ou de outro�.
Sustentou-se, na literatura, que, além de cassar a lei com eficácia erga omnes, a decisão expressava também uma interpretação autêntica da lei fe​deral. Em outros termos, o direito federal vigente não poderia tolerar disposição idêntica à censurada, nem uma disposição futura de igual teor ou de significado idêntico, ainda que integrante do ordenamento jurídico de outro Estado�.
Essa não parecia ser, porém, a orientação dominante na doutrina. Triepel sustentava, ao contrário, opinião segundo a qual os efeitos do julgado limitavam-se à parte dispositiva (Urteilstenor) publicada no Diário Oficial. Os fundamentos de decisão, que não eram publicados, não eram dotados de força de lei (Gesetzeskraft). Assim, o julgado não possuía a força de uma interpretação autêntica�.
Portanto, disposição de teor idêntico, editada por outro Estado-membro, não era de ser considerada inválida, pelo simples fato de os fundamentos da decisão proferida pelo Reichsgericht serem integralmente aplicáveis a ela�.
Não se excluía, inclusive, a possibilidade de que o Estado viesse a promulgar posteriormente lei de conteúdo idêntico ou semelhante ao do texto normativo declarado inconstitucional, uma vez que a força de lei da decisão não alcançava esse novo ato�.
A Lei Fundamental de Bonn, de 1949, consagrou, em seu art. 94, 2, que lei federal poderia dispor sobre os casos em que as decisões da Corte Constitucional alemã seriam dotadas de eficácia erga omnes (Gesetzeskraft).
A Lei Orgânica da Corte Constitucional alemã, de 1951, outorga força de lei às decisões proferidas nos processos de controle abstrato e concreto de normas, nos processos destinados a verificar se determinada regra de Direito Internacional Público é parte integrante do direito federal, nos processos sobre a subsistência de direito pré-constitucional como direito federal, bem como nos processos de recurso constitucional (Verfassungsbeschwerde), quando se declara a constitucionalidade ou inconstitucionalidade de uma lei.
Houve porbem o legislador alemão estabelecer ainda, no § 31, (1) da referida Lei Orgânica, que as decisões da Corte Constitucional vinculavam todos os órgãos constitucionais da União e dos Estados, bem como todos os tribunais e órgãos administrativos (Die Entscheidungen des Bundesverfassungsgerichts binden die Verfassungsorgane des Bundes und der Länder sowie alle Gerichte und Behörden).
Desde então, esforçam-se doutrina e jurisprudência para precisar o significado dos dois institutos, bem como para acentuar-lhes as diferenças.
Se havia dúvida sobre o exato significado do efeito vinculante, é certo que nunca se negou que tal instituto reforçava a eficácia das decisões da Corte Constitucional, tornando-as obrigatórias para todos os órgãos e entes públicos, tivessem eles integrado ou não o processo�.
A Constituição austríaca de 1920, na versão de 1929, estabelece que, declarada a inconstitucionalidade de lei pela Corte, ficam todos os tribunais e autoridades administrativas vinculados à decisão judicial.
Outras Constituições também reconheceram a eficácia geral e obrigatória das decisões proferidas por Cortes Constitucionais, especialmente no controle abstrato de normas. Assim, a Constituição portuguesa, de 1976, consagra que o Tribunal Constitucional aprecia e declara, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade ou a ilegalidade (art. 281º, (1) e (3)). Também a Constituição espanhola, de 1978, dispõe que “as sentenças que declarem a inconstitucionalidade de uma lei ou de uma norma com força de lei e todas as que não se limitem à apreciação subjetiva de um direito revestem-se de plena eficácia geral” (art. 164º (1)).
Embora as referências mais marcantes e elaboradas pareçam provir, no particular, dos chamados sistemas de controle concentrado, assinale-se que o efeito vinculante não é estranho ao sistema difuso.
Tome-se como exemplo o modelo americano. Ali existe o instituto do stare decisis, que vincula os órgãos judiciais inferiores à jurisprudência das Cortes superiores, mormente à orientação da Suprema Corte�.
Também a Constituição mexicana contempla expressamente a possibilidade de uniformização de entendimento pela Suprema Corte de Justiça, no processo de amparo, que vinculará os demais Tribunais ordinários (Constituição, art. 107, XIII).
2.2. Do efeito vinculante no processo objetivo
A noção de efeito vinculante está associada, no sistema constitucional pátrio, a processos objetivos, especialmente à Ação Direta de Inconstitu​cionalidade — ADIn, à Ação Declaratória de Constitucionalidade — ADC e à Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental — ADPF. Nesses casos, a própria decisão do Tribunal ou, pelo menos, a sua parte dispositiva é dotada de efeito vinculante.
O Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal — RISTF, ao disciplinar a chamada representação interpretativa, introduzida pela Emenda n. 7 de 1977�, estabelecia que a decisão proferida na representação interpretativa seria dotada de efeito vinculante (art. 187 do RISTF�). Na mesma época, formalizou-se entendimento no sentido de que as decisões de inconstitucionalidade proferidas em sede de controle abstrato de normas não haveriam de ser submetidas ao Senado Federal, o que implicou reconhecer a eficácia erga omnes do julgado proferido na representação de inconstitucionalidade.
Em 1992, o efeito vinculante das decisões proferidas em sede de controle abstrato de normas foi contemplado em Projeto de Emenda Constitucional apresentado pelo Deputado Roberto Campos (PEC n. 130/1992). No aludido projeto, distinguia-se nitidamente a eficácia geral (erga omnes) do efeito vinculante�.
Tal como assente em estudo que produzimos sobre este assunto, que foi incorporado às justificações apresentadas no aludido Projeto, a eficácia “erga omnes” e o efeito vinculante deveriam ser tratados como institutos afins, mas distintos. Vale transcrever, a propósito, a seguinte passagem da justificação desenvolvida:
“Além de conferir eficácia “erga omnes” às decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal em sede de controle de constitucionalidade, a presente proposta de emenda constitucional introduz no direito brasileiro o conceito de efeito vinculante em relação aos órgãos e agentes públicos. Trata-se de instituto jurídico desenvolvido no Direito processual alemão, que tem por objetivo outorgar maior eficácia às decisões proferidas por aquela Corte Constitucional, assegurando força vinculante não apenas à parte dispositiva da decisão, mas também aos chamados fundamentos ou motivos determinantes (tragende Gründe).
A declaração de nulidade de uma lei não obsta à sua reedição, ou seja, a repetição de seu conteúdo em outro diploma legal. Tanto a coisa julgada quanto a força de lei (eficácia erga omnes) não lograriam evitar esse fato. Todavia, o efeito vinculante, que deflui dos fundamentos determinantes (tragende Gründe) da decisão, obriga o legislador a observar estritamente a interpretação que o tribunal conferiu à Constituição. Conseqüência semelhante se tem quanto às chamadas normas paralelas. Se o tribunal declarar a inconstitucionalidade de uma Lei do Estado A, o efeito vinculante terá o condão de impedir a aplicação de norma de conteúdo semelhante do Estado B ou C (Cf. Christian Pestalozza, comentário ao § 31, I, da Lei do Tribunal Constitucional Alemão (Bundesverfassungsgerichtsgesetz) in: Direito Processual Constitucional (Verfassungsprozessrecht), 2ª edição, Verlag C. H. Beck, Munique, 1982, pp. 170/171, que explica o efeito vinculante, suas conseqüên​cias e a diferença entre ele e a eficácia seja inter partes ou erga omnes)”�.
A Emenda Constitucional n. 3, promulgada em 16 de março de 1993, que, no que diz respeito à ação declaratória de constitucionalidade, inspirou-se direta e imediatamente na Emenda Roberto Campos, consagra que “as decisões definitivas de mérito, proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, nas ações declaratórias de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal, produzirão eficácia contra todos e efeito vinculante, relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e do Poder Executivo” (art. 102, § 2º).
O novo texto constitucional provocou algum dissenso doutrinário e jurisprudencial, tendo em vista a referência às decisões de mérito proferidas em sede de ação declaratória de constitucionalidade. Indagava-se, então, se o efeito poderia ou não abranger as decisões proferidas em ação direta de inconstitucionalidade.
Partindo-se do pressuposto de que a ação declaratória configura uma ação direta de inconstitucionalidade com sinal trocado, tendo ambas caráter dúplice ou ambivalente, afigura-se difícil não admitir que a decisão proferida em sede de ação direta de inconstitucionalidade tenha efeitos ou conseqüências diversos daqueles reconhecidos para a ação declaratória de constitucionalidade.
Argumentava-se que, ao criar a ação declaratória de constitucionalidade de lei federal, estabeleceu o constituinte que a decisão definitiva de mérito nela proferida — incluída aqui, pois, aquela que, julgando improcedente a ação, proclamar a inconstitucionalidade da norma questionada — “produzirá eficácia contra todos e efeito vinculante, relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e do Poder Executivo”�.
Portanto, afigurava-se correta a posição de vozes autorizadas do Supremo Tribunal Federal, como a de Sepúlveda Pertence, segundo o qual, “quando cabível em tese a ação declaratória de constitucionalidade, a mesma força vinculante haverá de ser atribuída à decisão definitiva da ação direta de inconstitucionalidade”�.
Nos termos dessa orientação, a decisão proferida em ação direta de inconstitucionalidade contra lei ou ato normativo federal haveria de ser dotada de efeito vinculante, tal como ocorre com aquela proferida na ação declaratória de constitucionalidade. Observe-se, ademais, que, se entendermos que o efeito vinculante da decisão está intimamente vinculado à própria natureza da jurisdição constitucional em dado Estado democrático e à função de guardião da Constituiçãodesempenhada pelo Tribunal, temos de admitir, igualmente, que o legislador ordinário não está impedido de atribuir essa proteção processual especial a outras decisões de controvérsias constitucionais proferidas pela Corte.
Em verdade, o efeito vinculante decorre do particular papel político-institucional desempenhado pela Corte ou pelo Tribunal Constitucional, que deve zelar pela observância estrita da Constituição nos processos especiais concebidos para solver determinadas e específicas controvérsias constitucionais.​
De certa forma, esse foi o entendimento adotado pelo Supremo Tribunal na ADC n. 4�, ao reconhecer efeito vinculante à decisão proferida em sede de cautelar, a despeito do silêncio do texto constitucional.
A Lei n. 9.868, de 1999, estabeleceu, no art. 28, parágrafo único, que:
“A declaração de constitucionalidade ou de inconstitucionalidade, inclusive a interpretação conforme a Constituição e declaração parcial de inconstitu​cionalidade sem redução de texto, têm eficácia contra todos e efeito vinculante em relação aos órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública federal, estadual e municipal”.
Assim, o legislador assumiu nítida posição com o objetivo de interpretar o efeito vinculante, que, na referida fórmula, passava a abranger não só as decisões proferidas na ação declaratória de constitucionalidade, mas também aquelas adotadas na ação direta de inconstitucionalidade.
Como era de se esperar, o tema foi objeto de argüição de inconsti​tucionalidade�. Em sessão de 7-11-2002, o STF pacificou a discussão sobre a legitimidade da norma contida no parágrafo único do art. 28 da Lei n. 9.868/99, que reconhecia efeito vinculante às decisões de mérito proferidas em sede de ação direta de inconstitucionalidade.
A alegação era a de que a Constituição somente previra o efeito vinculante para a ação declaratória de constitucionalidade. O Tribunal entendeu, porém, que, “todos aqueles que forem atingidos por decisões contrárias ao entendimento firmado pelo STF, no julgamento do mérito proferido em ação direta de inconstitucionalidade, sejam considerados como parte legítima para a propositura de reclamação”�.
Observe-se ainda que, segundo a jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal Federal, as decisões concessivas de cautelares em ação direta de inconstitucionalidade e ação declaratória de constitucionalidade são, igualmente, dotadas de efeito vinculante.
É certo, ademais, que a Lei n. 9.882/99 reconheceu o efeito vinculante das decisões proferidas em sede de ADPF em seu art. 10, § 3º:
“Art. 10. 	
§ 3º A decisão terá eficácia contra todos e efeito vinculante relativamente aos demais órgãos do Poder Público”.
Vê-se, assim, que, enquanto tramitava a proposta de Emenda Constitucional que pretendia atribuir efeito vinculante e obrigatório às súmulas do Supremo Tribunal Federal, a ordem jurídica evoluiu para reconhecer o efeito vinculante das decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal no âmbito dos processos objetivos.
3. Da súmula vinculante
3.1. Considerações gerais
O efeito vinculante das decisões de Tribunais Superiores sobre os atos de instâncias inferiores não configura novidade. Nelson de Sousa Sampaio apresenta-nos uma boa resenha da tendência para o precedente judicial vinculante�. Segundo o autor, no desempenho de sua missão, o Judiciário pode praticar ato que vai desde a sentença clássica até atos propriamente legislativos. Assim é que, quanto à crescente extensão de seus efeitos, os atos dos juízes se escalonariam em sentença clássica, precedente, sentença normativa, jurisprudência vinculante, atos quase legislativos e plenamente legislativos.
É de Kelsen o esclarecimento de que a função criadora do direito dos tribunais, existente em todas as circunstâncias, surge com particular evidência quando um tribunal recebe competência para produzir também normas gerais por meio de decisões com força de precedentes. Conferir a tal decisão caráter de precedente é tão-só um alargamento coerente da função criadora de direito dos tribunais. Se aos tribunais é conferido o poder de criar não só normas individuais, mas também normas jurídicas gerais, estarão eles em concorrência com o órgão legislativo instituído pela Constituição, e isso significará uma descentralização da função legislativa�.
O precedente vinculativo, que se caracteriza pelo fato de a decisão de um alto tribunal ser obrigatória, como norma, para os tribunais inferiores, tem as nações anglo-americanas, a exemplo da Inglaterra, Canadá e Estados Unidos, como reputado ambiente natural, por serem elas de direito de criação predominantemente judicial. Isso, no entanto, não impede de se ver o precedente vinculante também em países de tradição romanista, embora aí mais formalizado, como referido.
Sobre a Súmula do Supremo Tribunal Federal e o Restatement of the Law�, do direito americano, observou Victor Nunes Leal:
“Entretanto, duas objeções fundamentais lhes têm sido feitas. Em primeiro lugar, como consolidação particular, carecem de autoridade legislativa ou judiciária. Em segundo, é trabalho meramente expositivo do direito vigente, o qual poderia concorrer para o seu desenvolvimento, se tivesse sentido crítico e prospectivo.
Pelo motivo da primeira objeção, ficou bem reduzida sua eficácia. Mesmo quando os Tribunais aplicam o Restatement a força vinculativa do princípio formulado não resulta dele, mas dessas decisões posteriores, que terão de ser compendiadas para novas citações. Dar normatividade obrigatória ao Restatement, por ato do Legislativo, seria transformá-lo num Código, e essa conseqüência encontra resistência na tradição jurídica norte-americana.
Nesse ponto da nossa análise comparativa é que está a superioridade prática, para nós, da Súmula do Supremo Tribunal, porque, não sendo ela um Código, também não é um simples repositório particular de jurisprudência. E uma consolidação jurisprudencial autorizada, com efeitos processuais definidos, porque a inscrição de enunciados na Súmula, como a sua supressão, depende de formal deliberação do Supremo Tribunal. E a autoridade do Supremo Tribunal para assim proceder deriva dos seus poderes regimentais, tanto expressos como imanentes, e da prerrogativa, que lhe confere a Constituição, de uniformizar o entendimento do direito federal.
A jurisprudência da Súmula, embora não obrigatória para os outros Tribunais e Juízes, é indiretamente obrigatória para as partes, porque o interessado poderá fazê-la observar através do mecanismo dos recursos, enquanto não alterada pelo próprio Supremo Tribunal. E quanto a este a Súmula funciona como instrumento de autodisciplina propiciando tão alto grau de simplificação dos seus trabalhos que seria inviável ou prejudicial tentar alcançar o mesmo resultado por outro meio.
A autoridade, que nos foi possível atribuir à Súmula — e que falta ao Restatement dos norte-americanos — não é inspiração do acaso ou da livre imaginação. As raízes dessa fórmula estão na abandonada tradição luso-brasileira dos assentos da Casa da Suplicação e na moderna experiência legislativa dos prejulgados”�.
Vê-se, pois, que a Súmula do Supremo Tribunal Federal, que deita raízes entre nós nos assentos da Casa de Suplicação, nasce com caráter oficial, dotada de perfil indiretamente obrigatório. E, por conta dos recursos, constitui instrumento de autodisciplina do Supremo Tribunal Federal, que somente deverá afastar da orientação nela preconizada de forma expressa e fundamentada.
Essas diretrizes aplicam-se também à súmula vinculante consagrada na Emenda n. 45/2004. É evidente, porém, que a súmula vinculante, como o próprio nome está a indicar, terá o condão de vincular diretamente os órgãos judiciais e os órgãos da Administração Pública, abrindo a possibilidade de que qualquer interessado faça valer a orientação do Supremo, não mediante simples interposição de recurso, mas mediante apresentação de uma reclamação por descumprimento de decisão judicial (CF, art. 103-A).
3.2. Dos requisitos formaisda súmula vinculante
Nos termos do art. 103-A, a súmula vinculante deverá ser aprovada por maioria de dois terços dos votos do Supremo Tribunal Federal (oito votos), havendo de incidir sobre matéria constitucional que tenha sido objeto de decisões reiteradas do Tribunal.
A norma constitucional explicita que a súmula terá por objetivo superar controvérsia atual sobre a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas capaz de gerar insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos.
Estão abrangidas, portanto, as questões atuais sobre interpretação de normas constitucionais ou destas em face de normas infraconstitucionais.
Tendo em vista a competência ampla do Supremo Tribunal Federal, essas normas tanto poderão ser federais, como estaduais ou municipais.
É possível, porém, que a questão envolva tão-somente interpretação da Constituição e não de seu eventual contraste com outras normas infra-constitucionais. Nesses casos, em geral submetidos ao Tribunal sob alegação de contrariedade direta à Constituição (art. 103, III, a), discute-se a interpretação da Constituição adotada pelos órgãos jurisdicionais.
Outro requisito para edição da súmula vinculante diz respeito à preexistência de reiteradas decisões sobre matéria constitucional. Exige-se aqui que a matéria a ser versada na súmula tenha sido objeto de debate e discussão no Supremo Tribunal Federal. Busca-se obter a maturação da questão controvertida com a reiteração de decisões. Veda-se, deste modo, a possibilidade da edição de uma súmula vinculante com fundamento em decisão judicial isolada. É necessário que ela reflita uma jurisprudência do Tribunal, ou seja, reiterados julgados no mesmo sentido, é dizer, com a mesma interpretação.
A súmula vinculante, ao contrário do que ocorre no processo objetivo, como foi visto, decorre de decisões tomadas em casos concretos, no modelo incidental, no qual também existe, não raras vezes, reclamo por solução geral. Ela só pode ser editada depois de decisão do Plenário do Supremo Tribunal Federal ou de decisões repetidas das Turmas.
Esses requisitos acabam por definir o próprio conteúdo das súmulas vinculantes.
Em regra, elas serão formuladas a partir das questões processuais de massa ou homogêneas, envolvendo matérias previdenciárias, administrativas, tributárias ou até mesmo processuais, suscetíveis de uniformização e padronização.
Nos termos do § 2º do art. 103-A da Constituição, a aprovação, bem como a revisão e o cancelamento de súmula, poderá ser provocada pelos legitimados para a propositura da ação direta de inconstitucionalidade, sem prejuízo do que vier a ser estabelecido em lei.
Autorizou-se, assim, ao legislador, ampliar o elenco de legitimados. Parece altamente recomendável que dentre aqueles que venham a ser contemplados com essa legitimação, por decisão legislativa, estejam tribunais e juízes, uma vez que eles lidam, cotidianamente, com os processos que podem dar ensejo à formulação de súmulas.
Como consectário de seu caráter vinculante e de sua “força de lei” para o Poder Judiciário e para a Administração, requer-se que as súmulas vinculantes sejam publicadas no Diário Oficial da União. Procura-se assegurar, assim, a sua adequada cognoscibilidade por parte de todos aqueles que lhe devem obediência.
3.3. Da revisão e do cancelamento de súmula vinculante
Nos termos da Emenda Constitucional n. 45/2004, tal como a edição, o cancelamento ou a revisão da súmula poderá verificar-se mediante decisão de dois terços dos membros do Supremo Tribunal, de ofício ou por provocação de pessoas ou entes autorizados em lei, dentre eles os legitimados para a Ação Direta de Inconstitucionalidade (art. 103-A, caput e § 2º).
Note-se que cabe à lei disciplinar o procedimento de revisão ou cancelamento de súmula. A Emenda trouxe a possibilidade de a lei regulamen​tadora aumentar o rol de legitimados para cancelamento ou revogação da súmula. Abre-se, assim, a possibilidade de a sociedade participar, pelos seus diversos segmentos, do processo de atualização, de revisão e de cancelamento das súmulas vinculantes.
Afigura-se recomendável que os próprios juízes e tribunais possam submeter ao Supremo Tribunal Federal proposta de revisão ou de cancelamento de súmula. E, nesse caso, o tema, que não mereceu disciplina direta pelo legislador constituinte, poderá ser objeto de regulação no plano da legislação ordinária.
Faz-se necessário, primeiramente, diferençar revisão de súmula de cancelamento de súmula.
Por revisão entende-se alteração no próprio conteúdo da Súmula, na matéria por ela tratada. A alteração torna-se necessária em razão de uma mudança no entendimento jurídico sobre o tema, em virtude de uma alteração na legislação, ou nas próprias circunstâncias fáticas.
Já o cancelamento é a retirada do sistema da súmula vinculante, a sua revogação. O cancelamento da súmula vinculante faz-se necessário quando ela não se mostra mais apta a solucionar uma determinada questão, ou em virtude de drásticas alterações na legislação, na interpretação de uma determinada norma constitucional ou, até mesmo, em decorrência de modificações ou avanços na sociedade que inviabilizam a sua permanência no sistema.​
Sobre a revisão ou cancelamento da Súmula é interessante rememorar a lição de Victor Nunes Leal:
“[...] Cuidando ainda da Súmula como método de trabalho — aspecto em relação ao qual seria até indiferente o conteúdo dos seus enunciados —, é oportuno mencionar que estes não devem ser interpretados, isto é, esclarecidos quanto ao seu correto significado. O que se interpreta é a norma da lei ou do regulamento, e a Súmula é o resultado dessa interpretação, realizada pelo Supremo Tribunal.
Deve, pois, a Súmula ser redigida tanto quanto possível com a maior clareza, sem qualquer dubiedade, para que não falhe ao seu papel de expressar a inteligência dada pelo Tribunal. Por isso mesmo, sempre que seja necessário esclarecer algum dos enunciados da Súmula, deve ele ser cancelado, como se fosse objeto de alteração, inscrevendo-se o seu novo texto na Súmula com outro número.
A emenda regimental de 1963, que criou a Súmula, era bem explícita:
Art. 8º Sempre que o Plenário decidir em contrário ao que constar da Súmula: I — Será cancelado o respectivo enunciado (...).
Art. 11. Permanecerão vagos, para o caso de eventual restabelecimento, os números dos enunciados que forem cancelados (...).
O atual Regimento é bem claro, no art. 102, quando diz:
§ 2º Os verbetes cancelados ou alterados guardarão a respectiva numeração com a nota correspondente, tomando novos números os que forem modificados.
Interpretando corretamente o sentido da disposição, assim regulou o assunto o art. 114 do Regimento do Tribunal Federal de Recursos:
§ 4º Ficarão vagos, com a nota correspondente, para efeito de eventual restabelecimento, os números dos enunciados que o Tribunal cancelar ou alterar, tomando os que forem modificados novos números da série.
Por essa forma, a citação de um dos verbetes da Súmula corresponderá sempre a um texto único, evitando confusões no correr do tempo. Ainda que se lhe mude uma só palavra, o novo texto deverá ser identificado com numeração própria, de modo que, em qualquer tempo, sendo necessário, se possam confrontar o texto novo e o revogado.
Nem sempre — a nosso ver, infelizmente — tem sido essa prática seguida no Supremo Tribunal. Mais de uma vez tem havido interpretação de súmula, com acréscimo ou supressão de palavras, conservando-se o mesmo número”2�
Essas lições devem ser relembradas no contexto da disciplina que se está a conferir à súmula vinculante. Não só a edição, mas também a revisão e cancelamento de súmula hão de ter regras adequadas de organização e procedimento, tendo em vista o oferecimento de segurança jurídica para todos aqueles que lhe devem observância.
Digna de realce afigura-se também a recomendação de Victor Nunes no sentido de que eventual “esclarecimento” do conteúdo de súmula há de se fazer medianteedição de novo enunciado, elidindo, assim, possíveis perplexidades que poderiam surgir com a proliferação de significados (normativos) atribuíveis ao seu texto.
Traduz-se, assim, a relevância da mudança de entendimento jurisprudencial no contexto da súmula vinculante.
Talvez um dos temas mais ricos da teoria do direito e da moderna teoria constitucional seja aquele relativo à evolução jurisprudencial e, especialmente, à possível mutação constitucional. Se a sua repercussão no plano material é inegável, são inúmeros os desafios no plano do processo em geral e, em especial, do processo constitucional.
Nesse sentido, vale registrar a douta observação de Larenz:
“De entre os factores que dão motivo a uma revisão e, com isso, freqüentemente, a uma modificação da interpretação anterior, cabe uma importância proeminente à alteração da situação normativa. Trata-se a este propósito de que as relações fácticas ou usos que o legislador histórico tinha perante si e em conformidade aos quais projectou a sua regulação, para os quais a tinha pensado, variaram de tal modo que a norma dada deixou de se ‘ajustar’ às novas relações. É o factor temporal que se faz notar aqui. Qualquer lei está, como facto histórico, em relação actuante com o seu tempo. Mas o tempo também não está em quietude; o que no momento da gênese da lei actuava de modo determinado, desejado pelo legislador, pode posteriormente actuar de um modo que nem sequer o legislador previu, nem, se o pudesse ter previsto, estaria disposto a aprovar. Mas, uma vez que a lei, dado que pretende ter também validade para uma multiplicidade de casos futuros, procura também garantir uma certa constância nas relações inter-humanas, a qual é, por seu lado, pressuposto de muitas disposições orientadas para o futuro, nem toda a modificação de relações acarreta por si só, de imediato, uma alteração do conteúdo da norma. Existe a princípio, ao invés, uma relação de tensão que só impele a uma solução — por via de uma interpretação modificada ou de um desenvolvimento judicial do Direito — quando a insuficiência do entendimento anterior da lei passou a ser ‘evidente’”�.
Daí afirmar Larenz:
“A alteração da situação normativa pode assim conduzir à modificação — restrição ou extensão — do significado da norma até aqui prevalecente. De par com a alteração da situação normativa, existem factos tais como, sobretudo, modificações na estrutura da ordem jurídica global, uma nítida tendência da legislação mais recente, um novo entendimento da ratio legis ou dos critérios teleológico-objectivos, bem como a necessidade de adequação do Direito pré-constitucional aos princípios constitucionais, que podem provocar uma alteração de interpretação. Disto falámos nós já. Os tribunais podem abandonar a sua interpretação anterior porque se convenceram que era incorrecta, que assentava em falsas suposições ou em conclusões não suficientemente seguras. Mas ao tomar em consideração o factor temporal, pode também resultar que uma interpretação que antes era correcta agora não o seja”.
Por isso, conclui Larenz de forma lapidar:
“O preciso momento em que deixou de ser ‘correcta’ é impossível de determinar. Isto assenta em que as alterações subjacentes se efectuam na maior parte das vezes de modo contínuo e não de repente. Durante um ‘tempo intermédio’ podem ser ‘plausíveis’ ambas as coisas, a manutenção de uma interpretação constante e a passagem a uma interpretação modificada, adequada ao tempo. É também possível que uma interpretação que aparecia originariamente como conforme à Constituição, deixe de o ser na seqüência de uma modificação das relações determinantes. Então é de escolher a interpretação, no quadro das possíveis, segundo os outros critérios de interpretação, que seja agora a única conforme à Constituição” �.
No plano constitucional, esse tema mereceu uma análise superior no trabalho de Inocêncio Mártires Coelho sobre interpretação constitucional�.
No Capítulo 4 da obra em referência, que trata das conseqüências da diferença entre lei e Constituição, propicia-se uma releitura do fenômeno da chamada mutação constitucional, asseverando-se que as situações da vida são constitutivas do significado das regras de direito, posto que é somente no momento de sua aplicação aos casos ocorrentes que se revelam o sentido e o alcance dos enunciados normativos. Com base em Perez Luño e Reale, enfatiza-se que, em verdade, a norma jurídica não é o pressuposto, mas o resultado do processo interpretativo ou que a norma é a sua interpretação.
Essa colocação coincide, fundamentalmente, com a observação de Häberle, segundo a qual não existe norma jurídica, senão norma jurídica interpretada (Es gibt keine Rechtsnormen, es gibt nur interpretierte Rechtsnormen), ressaltando-se que interpretar um ato normativo nada mais é do que colocá-lo no tempo ou integrá-lo na realidade pública (Einen Rechssatz “auslegen” bedeutet, ihn in die Zeit, d.h. in die öffentliche Wirklichkeit stellen — um seiner Wirksamkeit willen). Por isso, Häberle introduz o conceito de pós-compreensão (Nachverständnis), entendido como o conjunto de fatores temporalmente condicionados com base nos quais se compreende “supervenientemente” uma dada norma. A pós-compreensão nada mais seria, para Häberle, do que a pré-compreensão do futuro, isto é, o elemento dialético correspondente da idéia de pré-compreensão�.
Tal concepção permite a Häberle afirmar que, em sentido amplo, toda lei interpretada — não apenas as chamadas leis temporárias — é uma lei com duração temporal limitada (In einem weiteren Sinne sind alle — interpretierten — Gesetzen “Zeitgesetze” — nicht nur die zeitlich befristeten). Em outras palavras, o texto, confrontado com novas experiências, transforma-se necessariamente em um outro. 
Essa reflexão e a idéia segundo a qual a atividade hermenêutica nada mais é do que um procedimento historicamente situado autorizam Häberle a realçar que uma interpretação constitucional aberta prescinde do conceito de mutação constitucional (Verfassungswandel) enquanto categoria autônoma.
Nesses casos, fica evidente que o Tribunal não poderá fingir que sempre pensara dessa forma. Daí a necessidade de, em tais casos, fazer-se o ajuste do resultado, adotando-se técnica de decisão que, tanto quanto possível, traduza a mudança de valoração. No plano constitucional, esses casos de mudança na concepção jurídica podem produzir uma mutação normativa ou a evolução na interpretação, permitindo que venha a ser reconhecida a inconstitucionalidade de situações anteriormente consideradas legítimas. A orientação doutrinária tradicional, marcada por uma alternativa rigorosa entre atos legítimos ou ilegítimos (entweder als rechtmässig oder als rechtswidrig), encontra dificuldade para identificar a consolidação de um processo de inconstitucionalização (Prozess des Verfassungswidrigwerdens). Prefere-se admitir que, embora não tivesse sido identificada, a ilegitimidade sempre existira.
Daí afirmar Häberle:
“O Direito Constitucional vive, prima facie, uma problemática temporal. De um lado, a dificuldade de alteração e a conseqüente duração e continuidade, confiabilidade e segurança; de outro, o tempo envolve agora mesmo, especificamente, o Direito Constitucional. É que o processo de reforma constitucional deverá ser feito de forma flexível e a partir de uma interpretação constitucional aberta. A continuidade da Constituição somente será possível se passado e futuro estiverem nela associados”�.
Häberle indaga:
“O que significa tempo? Objetivamente, tempo é a possibilidade de se introduzir mudança, ainda que não haja a necessidade de produzi-la”� .
Tal como anota Häberle, “o tempo sinaliza ou indica uma reunião (ensemble) de forças sociais e idéias. (...) A ênfase ao ‘fator tempo’ não deve levar ao entendimento de que o tempo há de ser utilizado como ‘sujeito’ de transformação ou de movimento (...). A história (da comunidade) tem muitos sujeitos. O tempo nada mais é do que a dimensão na qual as mudanças se tornam possíveise necessárias (...)” �.
Certamente, a revisão da jurisprudência e da Súmula mediante decisão do próprio Tribunal pode ser provocada por eventual interessado em algum processo específico. É o que até aqui tem permitido a revisão da Súmula do Supremo Tribunal Federal ou até mesmo o cancelamento de seus enunciados.​
A possibilidade de revisão ou cancelamento de súmula é de extrema relevância quando se tem em vista que é da natureza da própria sociedade e do Direito estar em processo de evolução contínua. Nesse sentido, faz-se imprescindível a possibilidade de alteração das súmulas vinculantes, para que elas possam ser adequadas a essas necessidades, também de índole prática. Todavia, do mesmo modo que a adoção de uma súmula vinculante não ocorre de um momento para o outro, exigindo que a matéria tenha sido objeto de reiteradas decisões sobre o assunto, a sua alteração ou modificação também exige uma discussão cuidadosa.
À evidência, não procede o argumento de que a súmula vinculante impede mudanças que ocorrem por demanda da própria sociedade e do próprio sistema jurídico, uma vez que há previsão constitucional da revisão e revogação da mesma.
Ademais, a revisão da súmula propicia ao eventual requerente maiores oportunidades de superação do entendimento consolidado do que o sistema de recursos em massa, que são respondidos, também, pelas fórmulas massificadas existentes hoje nos Tribunais.
Tal questão foi objeto de pronunciamento do Ministro Sepúlveda Pertence, em pronunciamento perante a Câmara dos Deputados:
“É muito mais fácil prestar atenção a um argumento novo, num mecanismo de revisão de súmula, do que num dos 5 ou 6 mil processos a respeito que subam num determinado ano ao Supremo Tribunal Federal, até porque a sentença que contém o argumento novo tem de ser sorteada, porque não dá para conferir mais do que por amostragem”. 
A solenidade do processo de revisão da súmula vinculante permite que o Tribunal confira a atenção devida à proposta de alteração.
3.4. Da autoridade competente
A Emenda Constitucional n. 45/2004 outorgou a competência para editar súmulas vinculantes exclusivamente ao Supremo Tribunal Federal, o que significa que as súmulas vinculantes ficaram adstritas unicamente à matéria constitucional, seja sobre a interpretação das próprias normas constitucionais, seja sobre a interpretação das leis infraconstitucionais em face da Constituição.
Não se conferiu ao Superior Tribunal de Justiça e ao Tribunal Superior do Trabalho a autorização para editar súmulas vinculantes. Tendo em vista a importância dessas Cortes na uniformização do direito federal, nas respectivas áreas de atuação, afigura-se recomendável que se discuta o tema, uma vez mais, no âmbito do processo de reforma do Judiciário, agora sob apreciação da Câmara dos Deputados. 
3.5. Súmulas anteriores e edição de súmulas comuns
As súmulas anteriores do Supremo Tribunal Federal poderão adquirir efeito vinculante, desde que votadas por dois terços dos ministros do Supremo Tribunal Federal.
Tem-se, pois, que a Emenda Constitucional n. 45/2004 não conferiu efeito vinculante imediato às súmulas já existentes do Supremo Tribunal Federal, dispondo apenas sobre a faculdade de o Tribunal assim fazê-lo, desde que por voto de dois terços dos ministros, em procedimento em tudo assemelhado à edição de uma nova súmula.
Tem-se que as súmulas anteriores devem preencher os requisitos previstos na Constituição para serem dotadas do efeito vinculante. Daí a necessidade, estabelecida pela própria Emenda Constitucional, de as mesmas serem submetidas à nova apreciação do próprio Supremo Tribunal Federal.
Embora talvez não tenha mais relevância prática, a possibilidade de edição de súmula vinculante não afasta a admissibilidade das súmulas comuns, disciplinadas no regimento interno do Tribunal (art. 103 do RISTF).
3.6.	Obrigatoriedade e limites objetivos e subjetivos da súmula vinculante
3.6.1.	Considerações preliminares: limites objetivos e subjetivos do efeito vinculante
A Corte Constitucional alemã tem interpretado o efeito vinculante (Bindungswirkung), previsto no § 31, I, da Lei Orgânica, como instituto mais amplo do que a coisa julgada (e do que a “força de lei”, por conseguinte) exatamente por tornar obrigatória não apenas a observância da parte dispositiva da decisão, mas também dos chamados fundamentos determinantes (tragende Gründe). Os órgãos e autoridades federais e estaduais, bem como os juízes e Tribunais, estariam, assim, vinculados às assertivas abstratas (abstrakte Rechtsaussagen) da Corte constitucional. A decisão não resolveria apenas caso singular, mas conteria uma determinada concretização jurídica da Constituição para o futuro�.
A concepção de efeito vinculante consagrada pela Emenda n. 3/93, está estritamente vinculada ao modelo germânico disciplinado no § 31, (2), da Lei Orgânica da Corte Constitucional. A própria justificativa da proposta apresentada pelo Deputado Roberto Campos não deixa dúvida de que se pretendia outorgar não só eficácia erga omnes, mas também efeito vinculante à decisão, deixando claro que estes não estariam limitados apenas à parte dispositiva da decisão. Embora a Emenda n. 3/93 não tenha incorporado a proposta na sua inteireza, é certo que o efeito vinculante, na parte que foi positivada, deve ser estudado à luz dos elementos contidos na proposta original.
Assim, parece legítimo que se recorra à literatura alemã para explicitar o significado efetivo do instituto. A primeira indagação, na espécie, refere-se às decisões que seriam aptas a produzir o efeito vinculante. Afirma-se que, fundamentalmente, são vinculantes as decisões capazes de transitar em julgado�. Tal como a coisa julgada, o efeito vinculante refere-se ao momento da decisão. Alterações posteriores não são alcançadas �.
Problema de inegável relevo diz respeito aos limites objetivos do efeito vinculante, isto é, à parte da decisão que tem efeito vinculante para os órgãos constitucionais, tribunais e autoridades administrativas. Em suma, indaga-se, tal como em relação à coisa julgada e à força de lei, se o efeito vinculante está adstrito à parte dispositiva da decisão ou se ele se estende também aos chamados fundamentos determinantes, ou, ainda, se o efeito vinculante abrange também as considerações marginais, as coisas ditas de passagem, isto é, os chamados obiter dicta�.
Enquanto em relação à coisa julgada e à força de lei domina a idéia de que elas hão de se limitar à parte dispositiva da decisão, sustenta o Tribunal Constitucional alemão que o efeito vinculante se estende, igualmente, aos fundamentos determinantes da decisão�.
Segundo esse entendimento, a eficácia da decisão do Tribunal transcende o caso singular, de modo que os princípios dimanados da parte dispositiva e dos fundamentos determinantes sobre a interpretação da Constituição devem ser observados por todos os tribunais e autoridades nos casos futuros�.
Outras correntes doutrinárias sustentam que, tal como a coisa julgada, o efeito vinculante limita-se à parte dispositiva da decisão, de modo que, do prisma objetivo, não haveria distinção entre a coisa julgada e o efeito vinculante�. A diferença entre as duas posições extremadas não é meramente semântica ou teórica�, apresentando profundas conseqüências também no plano prático.
Enquanto o entendimento esposado pelo Tribunal Constitucional alemão importa não só na proibição de que se contrarie a decisão proferida no caso concreto em toda a sua dimensão, mas também na obrigação de todos os órgãos constitucionais de adequar a sua conduta, nas situações futuras, à orientação dimanada da decisão�, considera a concepção que defende uma interpretação restritiva do § 31, I, da Lei Orgânica do Tribunal Constitucional que o efeito vinculante há de ficar limitado à parte dispositiva da decisão, realçando, assim, a qualidade judicial da decisão�.
A aproximação dessas duas posições extremadas é feita mediante o desenvolvimento de orientações mediadoras, que acabam porfundir elementos das concepções principais.
Assim, propõe Vogel que a coisa julgada ultrapasse os estritos limites da parte dispositiva, abrangendo também a “norma decisória concreta” �. A norma decisória concreta seria aquela “idéia jurídica subjacente à formulação contida na parte dispositiva, que, concebida de forma geral, permite não só a decisão do caso concreto, mas também a decisão de casos semelhantes”�. Por seu lado, sustenta Kriele que a força dos precedentes, que presumivelmente vincula os Tribunais, é reforçada no direito alemão pelo disposto no § 31, I, da Lei do Tribunal Constitucional alemão�. A semelhante resultado chegam as reflexões de Bachof, segundo o qual o papel fundamental do Tribunal Constitucional alemão consiste na extensão de suas decisões aos casos ou situações paralelas�.
Tal como já anotado, parecia inequívoco o propósito do legislador alemão, ao formular o § 31 da Lei Orgânica do Tribunal, de dotar a decisão de uma eficácia transcendente�. É certo, por outro lado, que a limitação do efeito vinculante à parte dispositiva da decisão tornaria de todo despiciendo esse instituto, uma vez que ele pouco acrescentaria aos institutos da coisa julgada e da força de lei. Ademais tal redução diminuiria significativamente a contribuição do Tribunal para a preservação e desenvolvimento da ordem constitucional�.
Aceita a idéia de uma eficácia transcendente à própria coisa julgada, afigura-se legítimo indagar sobre o significado do efeito vinculante para os órgãos estatais que não são partes do processo. Segundo a doutrina dominante, são as seguintes as conseqüências do efeito vinculante para os não-partícipes do processo:
“(1) ainda que não tenham integrado o processo os órgãos constitucionais estão obrigados, na medida de suas responsabilidades e atribuições, a tomar as necessárias providências para o desfazimento do estado de ilegitimidade;
(2) assim, declarada a inconstitucionalidade de uma lei estadual, ficam os órgãos constitucionais de outros Estados, nos quais vigem leis de teor idêntico, obrigados a revogar ou a modificar os referidos textos legislativos�;
(3) também os órgãos não partícipes do processo ficam obrigados a observar, nos limites de suas atribuições, a decisão proferida, sendo-lhes vedado adotar conduta ou praticar ato de teor semelhante àquele declarado inconstitucional pelo Bundesverfassungsgericht (proibição de reiteração em sentido lato: Wiederholungsverbot im weiteren Sinne oder Nachah​mungsverbot)�. A Lei do Tribunal Constitucional alemão autoriza o Tribunal, no processo de recurso constitucional (Verfassungsbeschwerde), a incorporar a proibição de reiteração da medida considerada inconstitucional na parte dispositiva da decisão (§ 95, I, 2)”�.
No que concerne aos órgãos estatais que, de alguma forma, integraram o processo, assume o efeito vinculante o seguinte significado:
(1) Os órgãos estatais que integraram o processo no qual foi proferida a decisão estão, nos termos do § 31, I, obrigados a observar e a executar o julgado, devendo empreender todas as medidas necessárias ao restabeleci​mento de um estado de legitimidade (imperativo de revogação e de anulação: Gebot der Selbstaufhebung und Rückabwicklung), exigências essas que não decorrem diretamente da coisa julgada material�.
(2) Eles estão vinculados, igualmente, à orientação estabelecida pelo Tribunal no que diz respeito à conduta futura, de modo que do efeito vinculante decorre — tal como da coisa julgada material — uma proibição de repetição ou de reiteração (Wiederholungsverbot)�.
(3) Portanto, se a parte dispositiva contiver expressa censura a uma ação legislativa ou administrativa dos órgãos constitucionais, ficam eles obrigados não só a afastar a lesão, como também a evitar que ela se repita. Identifica-se aqui, dentre outros, um dever de abstenção (Unterlassungspflicht). Ao contrário, se a decisão exigir uma conduta ativa — v.g, se a parte dispositiva contiver uma censura a uma omissão legislativa —, então deve o órgão estatal atuar com vistas a sanear a situação ilegítima�.
E quanto aos limites subjetivos do efeito vinculante?
Do prisma estritamente processual, a eficácia geral ou erga omnes da declaração de constitucionalidade obsta, em primeiro plano, a que a questão seja submetida novamente ao Tribunal. Não se tem, porém, uma mudança qualitativa da situação jurídica. Enquanto a declaração de nulidade importa na cassação da lei, não dispõe a declaração de constitucionalidade de efeito análogo.
A validade da lei não depende da declaração judicial e a lei vige, após a decisão, tal como vigorava anteriormente�. Não fica o legislador, igualmente, impedido de alterar ou mesmo de revogar a norma em questão.
A questão suscitou controvérsias na Alemanha. A “força de lei” (Gesetzeskraft) da decisão do Bundesverfassungsgericht que confirma a constitucionalidade revelar-se-ia problemática se o efeito vinculante geral, que se lhe reconhece, impedisse que o Tribunal se ocupasse novamente da questão�.
Se se considera a “força de lei”, tal como a doutrina dominante, como instituto especial de controle de normas e, por isso, como um instituto de índole processual�, não expressa ele mais do que a idéia de que o Tribunal não pode, num novo processo, proferir decisão discrepante da anteriormente proferida�.
Questão relevante é a concernente à dimensão subjetiva do efeito vinculante referir-se à possibilidade de a decisão proferida vincular ou não o próprio Supremo Tribunal Federal. Embora a Lei Orgânica do Tribunal Constitucional alemão não seja explícita a propósito, entende a Corte Constitucional ser inadmissível construir-se aqui uma autovinculação. Essa orientação conta com aplauso de parcela significativa da doutrina, pois, além de contribuir para o congelamento do direito constitucional, tal solução obrigaria o Tribunal a sustentar teses que considerasse errôneas ou já superadas�.
Não se pode cogitar, portanto, de superação ou de convalidação de eventual inconstitucionalidade da lei que não teve a sua impugnação acolhida pelo Tribunal �.
Se o instituto da eficácia “erga omnes” entre nós, tal como a força de lei no direito tedesco, constitui, também, categoria de direito processual específica do processo de controle abstrato de constitucionalidade, afigura-se lícito indagar se seria admissível submeter a norma confirmada, uma vez mais, ao juízo de constitucionalidade do Supremo Tribunal Federal.
Analisando especificamente o problema da admissibilidade de uma nova aferição de constitucionalidade de norma declarada constitucional pelo Bundesverfassungsgericht, considera Hans Brox possível, desde que satisfeitos alguns pressupostos:
“Se se declarou, na parte dispositiva da decisão, a constitucionalidade da norma, então se admite a instauração de um novo processo para aferição de sua constitucionalidade se o requerente, o Tribunal suscitante (controle concreto) ou o recorrente (recurso constitucional = Verfassungsbeschwerde) demonstrar que se cuida de uma nova questão. Tem-se tal situação se, após a publicação da decisão, verificar-se uma mudança do conteúdo da Constituição ou da norma objeto do controle, de modo a permitir supor que outra poderá ser a conclusão do processo de subsunção. Uma mudança substancial das relações fáticas (Lebensverhältnisse) ou da concepção jurídica geral pode levar a essa alteração”�.
Em síntese, declarada a constitucionalidade de uma lei, ter-se-á de concluir pela inadmissibilidade de que o Tribunal se ocupe, uma vez mais, da aferição de sua legitimidade, salvo no caso de significativa mudança das circunstâncias fáticas (BVerfGE 33, 199; 39, 169) ou de relevante alteração das concepções jurídicas dominantes�.
Também entre nós se reconhece, tal como ensinado por Liebman com arrimo em Savigny�, que as sentenças contêm implicitamente a cláusula rebus sic stantibus�, de modo que as alterações posteriores que afetem a situação normativa, bem como eventual modificação da orientação jurídica sobre a matéria podem tornarinconstitucional norma anteriormente considerada legítima — inconstitucionalidade superveniente�.
Portanto, a eficácia erga omnes não obsta a que se submeta nova argüição de inconstitucionalidade de norma já declarada constitucional, desde que presentes os pressupostos que permitam essa reapreciação.
A fórmula adotada pela Emenda n. 3/93 parece excluir também o Supremo Tribunal Federal do âmbito de aplicação do efeito vinculante. A expressa referência ao efeito vinculante em relação “aos demais órgãos do Poder Judiciário” legitima esse entendimento.
De um ponto de vista estritamente material também é de se excluir uma autovinculação do Supremo Tribunal aos fundamentos determinantes de uma decisão anterior, pois isso poderia significar uma renúncia ao próprio desenvolvimento da Constituição, afazer imanente aos órgãos de jurisdição constitucional.
Todavia, parece importante, tal como assinalado por Bryde, que o Tribunal não se limite a mudar uma orientação eventualmente fixada, mas que o faça com base em crítica fundada do entendimento anterior que explicite e justifique a mudança�. Ao contrário do estabelecido na proposta original, que se referia à vinculação dos órgãos e agentes públicos, o efeito vinculante, consagrado na Emenda n. 3/93, ficou reduzido, no plano subjetivo, aos órgãos do Poder Judiciário e do Poder Executivo.
Proferida a declaração de constitucionalidade ou inconstitucionalidade de lei objeto da ação declaratória, ficam os Tribunais e órgãos do Poder Executivo obrigados a guardar-lhe plena obediência. Tal como acentuado, o caráter transcendente do efeito vinculante impõe que sejam considerados não apenas o conteúdo da parte dispositiva da decisão, mas a norma abstrata que dela se extrai, isto é, a proposição de que determinado tipo de situação, conduta ou regulação — e não apenas aquela objeto do pronunciamento jurisdicional — é constitucional ou inconstitucional e deve, por isso, ser preservado ou eliminado�. É certo, pois, que a não-observância da decisão caracteriza grave violação de dever funcional, seja por parte das autoridades administrativas, seja por parte do magistrado (cf., também, CPC, art. 133, I).
Em relação aos órgãos do Poder Judiciário, convém observar que eventual desrespeito à decisão do Supremo Tribunal Federal legitima a propositura de reclamação, pois estará caracterizada, nesse caso, inequívoca lesão à autoridade de seu julgado (CF, art. 102, I, l).
Assim, se havia dúvida sobre o cabimento da reclamação no processo de controle abstrato de normas�, a Emenda Constitucional n. 3/93 encarregou-se de espancá-la, pelo menos no que respeita às decisões proferidas na ação declaratória de constitucionalidade.
Sobre os limites objetivos do efeito vinculante, A posição do Tribunal sobre o tema está bem sintetizada na ementa da decisão na Reclamação n. 2.143 (Agravo Regimental), da relatoria de Celso de Mello, verbis:
“Reclamação — alegação de desrespeito a acórdão do Supremo Tribunal Federal resultante de julgamento proferido em sede de controle normativo abstrato — inocorrência — seqüestro de rendas públicas legitimamente efetivado — medida constritiva extraordinária justificada, no caso, pela inversão da ordem de precedência de apresentação e de pagamento de determinado precatório — irrelevância de a preterição da ordem cronológica, que indevidamente beneficiou credor mais recente, decorrer da celebração, por este, de acordo mais favorável ao poder público — necessidade de a ordem de precedência ser rigidamente respeitada pelo poder público — seqüestrabilidade, na hipótese de inobservância dessa ordem cronológica, dos valores indevidamente pagos ou, até mesmo, das próprias rendas públicas — Recurso Improvido. EFICÁCIA VINCULANTE E FISCALIZAÇÃO NORMATIVA ABSTRATA DE CONSTITUCIONALIDADE — LEGITIMIDADE CONSTITUCIONAL DO ART. 28 DA LEI N. 9.868/99. As decisões consubstanciadoras de declaração de constitu​cionalidade ou de inconstitucionalidade, inclusive aquelas que importem em interpretação conforme à Constituição e em declaração parcial de inconstitucionalidade sem redução de texto, quando proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, em sede de fiscalização normativa abstrata, revestem-se de eficácia contra todos (‘erga omnes’) e possuem efeito vinculante em relação a todos os magistrados e Tribunais, bem assim em face da Administração Pública federal, estadual, distrital e municipal, impondo-se, em conseqüência, à necessária observância por tais órgãos estatais, que deverão adequar-se, por isso mesmo, em seus pronunciamentos, ao que a Suprema Corte, em manifestação subordinante, houver decidido, seja no âmbito da ação direta de inconstitucionalidade, seja no da ação declaratória de constitucionalidade, a propósito da validade ou da invalidade jurídico-constitucional de determinada lei ou ato normativo. Precedente. O DESRESPEITO À EFICÁCIA VINCULANTE, DERIVADA DE DECISÃO EMANADA DO PLENÁRIO DA SUPREMA CORTE, AUTORIZA O USO DA RECLAMAÇÃO. O descumprimento, por quaisquer juízes ou Tribunais, de decisões proferidas com efeito vinculante, pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, em sede de ação direta de inconstitucionalidade ou de ação declaratória de constitucionalidade, autoriza a utilização da via reclamatória, também vocacionada, em sua específica função processual, a resguardar e a fazer prevalecer, no que concerne à Suprema Corte, a integridade, a autoridade e a eficácia subordinante dos comandos que emergem de seus atos decisórios. Precedente: Rcl 1.722/RJ, Rel. Min. Celso de Mello (Pleno). LEGITIMIDADE ATIVA PARA A RECLAMAÇÃO NA HIPÓTESE DE INOBSERVÂNCIA DO EFEITO VINCULANTE. — Assiste plena legitimidade ativa, em sede de reclamação , àquele — particular ou não — que venha a ser afetado, em sua esfera jurídica, por decisões de outros magistrados ou Tribunais que se revelem contrárias ao entendimento fixado, em caráter vinculante, pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento dos processos objetivos de controle normativo abstrato instaurados mediante ajuizamento, quer de ação direta de inconstitucionalidade, quer de ação declaratória de constitucionalidade. Precedente. A SIGNIFICAÇÃO CONSTITUCIONAL DA NECESSIDADE DE EXPEDIÇÃO DOS PRECATÓRIOS JUDICIÁRIOS. O regime constitucional de execução por quantia certa contra o Poder Público, qualquer que seja a natureza do crédito exeqüendo (RTJ 150/337) - ressalvadas as obrigações definidas em lei como de pequeno valor impõe a necessária extração de precatório, cujo pagamento deve observar, em obséquio aos princípios ético-jurídicos da moralidade, da impessoalidade e da igualdade, a regra fundamental que outorga preferência apenas a quem dispuser de precedência cronológica (prior in tempore, potior in jure). A exigência constitucional pertinente à expedição de precatório - com a conseqüente obrigação imposta ao Estado de estrita observância da ordem cronológica de apresentação desse instrumento de requisição judicial de pagamento - tem por finalidade (a) assegurar a igualdade entre os credores e proclamar a inafastabilidade do dever estatal de solver. os débitos judicialmente reconhecidos em decisão transitada em julgado. (RTJ 108/463), (b) impedir favorecimentos pessoais indevidos e (c) frustrar tratamentos discriminatórios, evitando injustas perseguições ou preterições motivadas por razões destituídas de legitimidade jurídica. PODER PÚBLICO - PRECATÓRIO - INOBSERVÂNCIA DA ORDEM CRONOLÓGICA DE SUA APRESENTAÇÃO. A Constituição da República não quer apenas que a entidade estatal pague os seus débitos judiciais. Mais do que isso, a Lei Fundamental exige que o Poder Público, ao solver a sua obrigação, respeite a ordem de precedência cronológica em que se situam os credores do Estado. - A preterição da ordem de precedência cronológica - considerada a extrema gravidade desse gesto de insubmissão estatal às prescrições da Constituição - configura comportamento institucional que produz, no que concerne aos Prefeitos Municipais, (a) conseqüências de caráter processual (seqüestro da quantia necessária à satisfaçãodo débito, ainda que esse ato extraordinário de constrição judicial incida sobre rendas públicas), (b) efeitos de natureza penal (crime de responsabilidade, punível com pena privativa de liberdade - DL 201/57, art. 1º, XII) e (c) reflexos de índole político-administrativa (possibilidade de intervenção do Estado-membro no Município, sempre que essa medida extraordinária revelar-se essencial à execução de ordem ou decisão emanada do Poder Judiciário - CF, art. 35, IV, in fine). PAGAMENTO ANTECIPADO DE CREDOR MAIS RECENTE - CELEBRAÇÃO, COM ELE, DE ACORDO FORMULADO EM BASES MAIS FAVORÁVEIS AO PODER PÚBLICO - ALEGAÇÃO DE VANTAGEM PARA O ERÁRIO PÚBLICO - QUEBRA DA ORDEM CONSTITUCIONAL DE PRECEDÊNCIA CRONOLÓGICA - INADMISSIBILIDADE. - O pagamento antecipado de credor mais recente, em detrimento daquele que dispõe de precedência cronológica, não se legitima em face da Constituição, pois representa comportamento estatal infringente da ordem de prioridade temporal, assegurada, de maneira objetiva e impessoal, pela carta Política, em favor de todos os credores do Estado. O legislador constituinte, ao editar a norma inscrita no art. 100 da Carta Federal, teve por objetivo evitar a escolha de credores pelo Poder Público. Eventual vantagem concedida ao erário público, por credor mais recente, não justifica, para efeito de pagamento antecipado de seu crédito, a quebra da ordem constitucional de precedência cronológica. O pagamento antecipado que dai resulte - exatamente por caracterizar escolha ilegítima de credor - transgride o postulado constitucional que tutela a prioridade cronológica na satisfação dos débitos estatais, autorizando, em conseqüência - sem prejuízo de outros efeitos de natureza jurídica e de caráter político-administrativo -, a efetivação do ato de seqüestro (RTJ 159/943-945), não obstante o caráter excepcional de que se reveste essa medida de constrição patrimonial. Legitimidade do ato de que ora se reclama. Inocorrência de desrespeito à decisão plenária do Supremo Tribunal Federal proferida na ADI 1.662/SP.”�.
Cabe ressaltar ainda as decisões na Reclamação nº 1880 (Agravo Regimental e Questão de Ordem), da relatoria de Maurício Corrêa, assim ementadas:
“ QUESTÃO DE ORDEM. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. JULGAMENTO DE MÉRITO. PARÁGRAFO ÚNICO DO ARTIGO 28 DA LEI 9868/99: CONSTITUCIONALIDADE. EFICÁCIA VINCULANTE DA DECISÃO. REFLEXOS. RECLAMAÇÃO. LEGITIMIDADE ATIVA. 1. É constitucional lei ordinária que define como de eficácia vinculante os julgamentos definitivos de mérito proferidos pelo Supremo Tribunal Federal em ação direta de inconstitucionalidade (Lei 9868/99, artigo 28, parágrafo único). 2. Para efeito de controle abstrato de constitucionalidade de lei ou ato normativo, há similitude substancial de objetos nas ações declaratória de constitucionalidade e direta de inconstitucionalidade. Enquanto a primeira destina-se à aferição positiva de constitucionalidade a segunda traz pretensão negativa. Espécies de fiscalização objetiva que, em ambas, traduzem manifestação definitiva do Tribunal quanto à conformação da norma com a Constituição Federal. 3. A eficácia vinculante da ação declaratória de constitucionalidade, fixada pelo § 2º do artigo 102 da Carta da República, não se distingue, em essência, dos efeitos das decisões de mérito proferidas nas ações diretas de inconstitucionalidade. 4. Reclamação. Reconhecimento de legitimidade ativa ad causam de todos que comprovem prejuízo oriundo de decisões dos órgãos do Poder Judiciário, bem como da Administração Pública de todos os níveis, contrárias ao julgado do Tribunal. Ampliação do conceito de parte interessada (Lei 8038/90, artigo 13). Reflexos processuais da eficácia vinculante do acórdão a ser preservado. 5. Apreciado o mérito da ADI 1662-SP (DJ de 30.08.01), está o Município legitimado para propor reclamação. Agravo regimental provido.”�
“ AGRAVO REGIMENTAL. QUESTÃO DE ORDEM. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. JULGAMENTO DEFINITIVO. EFICÁCIA VINCULANTE. CONSEQÜÊNCIAS PROCESSUAIS. RECLAMAÇÃO. LEGITIMIDADE. INCIDENTE DE INCONSTITUCIONALIDADE 1. Solução de questão de ordem cujo pressuposto é a eficácia vinculante assegurada aos julgamentos definitivos em ação direta de inconstitucionalidade. Parágrafo único do artigo 28 da Lei 9.868/99. 2. Incidente de inconstitucionalidade do referido dispositivo legal suscitado por um dos Ministros. Necessidade de prévia oitiva do Procurador-Geral da República (RISTF, artigo 176). Julgamento suspenso até o pronunciamento do titular do Ministério Público Federal.”�
Nesses termos, resta evidente que o efeito vinculante da decisão não está restrito à parte dispositiva, mas abrange também os próprios fundamentos determinantes. É certo, por outro lado, que qualquer pessoa afetada ou atingida pelo ato contrário à orientação fixada pelo Supremo Tribunal Federal disporá de legitimidade para promover a reclamação.
Com o efeito vinculante, pretendeu-se conferir eficácia adicional à decisão do Supremo Tribunal Federal, outorgando-lhe amplitude transcendente ao caso concreto. Os órgãos estatais abrangidos pelo efeito vinculante devem observar, pois, não apenas o conteúdo da parte dispositiva da decisão, mas a norma abstrata que dela se extrai, isto é, que determinado tipo de situação, conduta ou regulação — e não apenas aquela objeto do pronunciamento jurisdicional — é constitucional ou inconstitucional e deve, por isso, ser preservado ou eliminado.
Com a positivação dos institutos da eficácia erga omnes e do efeito vinculante das decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal na ação declaratória de constitucionalidade e na ação direta de inconstitucionalidade, deu-se um passo significativo no rumo da modernização e racionalização da atividade da jurisdição constitucional entre nós.
3.6.2. Limites objetivos e subjetivos da súmula vinculante
Os limites objetivos da súmula vinculante são fornecidos pelo enun​ciado que resulta de sua formulação.
É evidente que esse enunciado poderá ser melhor compreendido à luz das referências da súmula, isto é, dos julgados que forneceram a base para a decisão sumulada.
Assim, não raras vezes ter-se-á de recorrer às referências da Súmula para dirimir eventual dúvida sobre o seu exato significado. Tais referências são importantes também no que diz respeito a eventual distinção ou distinguishing que se tenha que fazer na aplicação da súmula vinculante.
Desde já, afigura-se inequívoco que a súmula vinculante conferirá eficácia geral e vinculante às decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal sem afetar diretamente a vigência de leis porventura declaradas inconstitucionais no processo de controle incidental. É que não foi alterada a cláusula clássica, constante hoje do art. 52, X, da Constituição, que outorga ao Senado a atribuição para suspender a execução de lei ou ato normativo declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal.
Não resta dúvida de que a adoção de súmula vinculante em situação que envolva a declaração de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo enfraquecerá ainda mais o já debilitado instituto da suspensão pelo Senado. É que a súmula vinculante conferirá interpretação vinculante à decisão que declara a inconstitucionalidade sem que a lei declarada inconstitucional tenha sido eliminada formalmente do ordenamento jurídico (falta de eficácia geral da decisão declaratória de inconstitucionalidade). Tem-se efeito vinculante da súmula, que obrigará a administração a não mais aplicar a lei objeto da declaração de inconstitucionalidade (nem a orientação que dela se dessume), sem eficácia erga omnes da declaração de inconstitucionalidade.
Mais uma razão para que se reveja a interpretação que se confere, tradicionalmente, ao disposto no art. 52, X, da Constituição.
Como se sabe, a ampliação do sistema concentrado, com a multiplicação de decisões dotadas de eficácia geral, acabou por modificar radicalmente a concepção que dominava entre nós sobre a divisão de poderes, tornando comum no sistema a decisão com eficácia

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