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Direito Processual Penal O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 1 www.cursoenfase.com.br Sumário 1. Inquérito Policial ................................................................................................. 2 1.1 Conceito ........................................................................................................ 2 1.2 Presidência .................................................................................................... 4 1.3 Poder de investigação do Ministério Público ............................................... 6 1.4 Características ............................................................................................... 8 1.4.1 Inquisitivo ................................................................................................ 8 1.4.1.1 Princípio do Contraditório ......................................................................... 8 1.4.1.2 Elementos informativos colhidos na fase inquisitiva ................................ 9 1.4.1.3 Discricionariedade ................................................................................... 10 1.4.1.4 Suspeição do Delegado de Polícia ........................................................... 11 1.4.1.5 Incomunicabilidade ................................................................................. 12 1.4.1.6 Habeas Corpus para trancamento de inquérito ...................................... 12 1.4.2 Sigiloso ................................................................................................... 14 1.4.3 Escrito .................................................................................................... 15 1.4.4 Dispensável ............................................................................................ 15 1.5 Formas de Cognição .................................................................................... 16 1.5.1 Cognição imediata ................................................................................. 16 1.5.2 Cognição mediata .................................................................................. 17 1.5.3 Cognição coercitiva ................................................................................ 17 1.6 Início do Inquérito ....................................................................................... 17 1.6.1 Na Ação Penal Pública Incondicionada .................................................. 17 Direito Processual Penal O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 2 www.cursoenfase.com.br Bibliografia TÁVORA, Nestor. Curso de Direito Processual Penal, Ed. Juspodivm; LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal, Ed. Juspodivm; OLIVEIRA, Eugenio Pacelli de. Curso de Processo Penal, Ed. Atlas. 1. Inquérito Policial 1.1 Conceito O inquérito policial é o instrumento de que se vale o Estado, através da polícia judiciária, órgão integrante da função executiva, para iniciar a persecução penal com o controle das investigações realizadas por parte do Ministério Público (trata-se do controle externo da atividade policial). É o instrumento para o desenvolvimento desta primeira etapa da persecução criminal, que por sua vez se dá em dois momentos, quais sejam, a fase pré-processual e a fase judicial. O sistema é predominantemente acusatório a partir da CF/88, precipuamente em face do art. 129, I, CRFB. CRFB, Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: I - promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei; Dentro do sistema acusatório as tarefas são divididas. O juiz não pode se substituir ao delegado, ao MP ou à defesa. Há, portanto, uma atividade jurisdicional que deve ser equidistante, que deve ser provocada. O juiz na primeira fase da persecução penal deve intervir minimamente, pois age como um juiz de garantias. O magistrado é provocado quando houver a necessidade de se atingir de alguma forma a liberdade ou a intimidade, como no caso das medidas cautelares. O principal personagem nesta fase pré-processual é o delegado. O MP é o destinatário do material colhido e o juiz funciona como um garantidor nesta fase. Destarte, o inquérito policial é o principal instrumento que o Estado vai utilizar para desenvolver a persecução criminal na fase pré-processual. Outra forma de defini-lo é tratá-lo como um procedimento investigatório prévio, constituído por uma série de diligências (sequência de atos), cuja finalidade é a obtenção de provas (elementos indiciários/informativos sobre o fato e a sua autoria) para que o titular da ação (MP, na ação pública e o particular/querelante, na ação privada) possa propô-la contra o autor da infração penal. Veja que não se deve mais utilizar a expressão mero procedimento administrativo, em face de disposição legislativa recente trazida pela Lei n. 12.830/13: Lei n. 12.930/13, Art. 1º - Esta Lei dispõe sobre a investigação criminal conduzida pelo delegado de polícia. Lei n. 12.930/13, Art. 2º - As funções de polícia judiciária e o a apuração de infrações penais exercidas pelo delegado de polícia são de natureza jurídica, essenciais e exclusivas de Estado. Direito Processual Penal O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 3 www.cursoenfase.com.br Conforme dispõe a lei, o delegado exerce uma atividade de natureza jurídica essencial e exclusiva de Estado. O inquérito policial, na visão da doutrina, deve ser tratado hoje como procedimento investigatório. O delegado exerce função jurídica não havendo subordinação ao MP. O inquérito policial é atividade específica da Polícia Civil, também chamada polícia judiciária. Polícia civil lato sensu compreende a polícia civil estadual e a polícia federal. O §1º do art. 144 da CF traz um rol de competências da polícia federal nas quais se encontra a apuração de crimes de competência federal: CRFB, Art. 144, § 1º - A polícia federal, instituída por lei como órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em carreira, destina-se a: [...] IV - exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União. A polícia judiciária tem por função a apuração de infrações e sua autoria, cumprindo missões a fim de exercer essa tarefa: CPP, Art. 13. Incumbirá ainda à autoridade policial: I - fornecer às autoridades judiciárias as informações necessárias à instrução e julgamento dos processos; II - realizar as diligências [medidas cautelares, busca e apreensão, interceptação telefônica entre outras] requisitadas pelo juiz ou pelo Ministério Público; III - cumprir os mandados de prisão [preventiva e temporária] expedidos pelas autoridades judiciárias; IV - representar acerca da prisão preventiva [a temporária também que é exclusiva da fase investigatória]. O dispositivo acima colacionado traz funções da polícia judiciária. Trata-se de um rol exemplificativo do que seria a função judiciária. A CRFB só fala de exclusividade (art. 144, § 1º, IV) ao tratar das funções de polícia judiciária da União. Mas veja que não há exclusividade para a apuração de infrações penais e sua autoria. É que, existem outrosórgãos na esfera federal que serão incumbidos dessa apuração, tais como, a CVM, o BACEN e a Receita Federal. Entretanto, estes não funcionarão como polícia judiciária. Exemplo: procedimento investigatório em um tribunal, em que o suspeito é um juiz federal. O TRF tem um setor próprio para desenvolver esse tipo de apuração pré- processual. CRFB, Art. 144, § 4º - às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares. O § 4º trata da polícia civil. De acordo com a Lei n. 12.830 a função da polícia é de Estado, incumbe a apuração de infrações penais salvo as militares, exercer a polícia judiciária no âmbito estadual. O art. 144 da CRFB que fala da segurança pública em geral vai indicar outros órgãos de segurança pública que não vão exercer essa atividade de repressão. A polícia civil e federal são polícias de repressão, isto é, vão atuar após o fato ocorrido para apurá-lo. Noutro giro, a polícia militar e a rodoviária têm a função precípua de prevenção, evitando a prática de infrações penais. Direito Processual Penal O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 4 www.cursoenfase.com.br O art. 4º do CPP reforça esse conceito: Art. 4º, CPP - A polícia judiciária será exercida pelas autoridades policiais no território de suas respectivas circunscrições e terá por fim a apuração das infrações penais e da sua autoria. A atribuição das autoridades policiais é dividida territorialmente. A regra geral é que a divisão seja territorial, mas nada impede que haja uma divisão de tarefas a partir do tipo de matéria que é investigada. Neste âmbito, verifica-se que a policia federal possui a delegacia fazendária, a delegacia previdenciária, ambiental, financeira, que são ramos especializados pela matéria dentro da Superintendência do respectivo Estado. A finalidade constante da parte final do dispositivo (apuração das infrações penais e da sua autoria) constitui a justa causa, suporte probatório mínimo para o titular da ação penal poder iniciar a segunda fase da ação penal (fase judicial). 1.2 Presidência Quem preside o inquérito policial, em regra, é o Delegado de Polícia. Cabe a este a “competência”/atribuição de presidir o inquérito policial. Entretanto, o CPP ressalva: Art. 4º, CPP - Parágrafo único. A competência definida neste artigo não excluirá a de autoridades administrativas, a quem por lei seja cometida a mesma função. O melhor termo é atribuição tendo em vista que competência é o limite da jurisdição. A competência do delegado não excluirá a de autoridades administrativas que a lei estabelecer a função. A autoridade administrativa é regida pelo princípio da legalidade. A lei 8.112/90 prevê a possibilidade do superior hierárquico apurar as faltas cometidas pelo subalterno, o que inclusive pode possibilitar uma possível denúncia ou encaminhamento de peças de informação ao delegado para que seja instaurado inquérito. O art. 83 da Lei n. 9.430/96 diz que as peças de informação serão encaminhadas ao MP depois de esgotado o procedimento administrativo: Art. 83. A representação fiscal para fins penais relativa aos crimes contra a ordem tributária previstos nos arts. 1o e 2o da Lei no 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e aos crimes contra a Previdência Social, previstos nos arts. 168-A e 337-A do Decreto- Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), será encaminhada ao Ministério Público depois de proferida a decisão final, na esfera administrativa, sobre a exigência fiscal do crédito tributário correspondente. A lei n. 12.830/13 traz uma questão importante. O seu contexto histórico foi do julgamento do mensalão, da discussão acerca da legitimidade da atividade investigatória do MP e do questionamento da possibilidade dessa atividade estar usurpando a atribuição da autoridade policial. Outra sinalização clara da disputa entre autoridade policial e MP se encontra na Lei n. 12.850 que é a nova lei de organização criminosa. Esta lei acaba dando mais autonomia ao delegado. Há na Lei n. 12.830/13, portanto, uma tentativa de demarcar este território. Vejamos: Direito Processual Penal O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 5 www.cursoenfase.com.br Lei n. 12.930/13, Art. 1º - Esta Lei dispõe sobre a investigação criminal conduzida pelo delegado de polícia. Art. 2º - As funções de polícia judiciária e o a apuração de infrações penais exercidas pelo delegado de polícia são de natureza jurídica, essenciais e exclusivas de Estado. § 1º - Ao delegado de polícia, na qualidade de autoridade policial, cabe a condução da investigação criminal por meio de inquérito policial ou outro procedimento previsto em lei [tais como, infiltração na organização criminosa, ação controlada, interceptação telefônica], que tem como objetivo a apuração das circunstâncias, da materialidade [no sentindo de existência do crime] e da autoria das infrações penais. § 2º - Durante a investigação criminal, cabe ao delegado de polícia a requisição de perícia, informações, documentos e dados [veja que questões que envolvam sigilo e intimidade deverão ser determinadas por decisão judicial, por estarem sujeitas à cláusula de reserva de jurisdição] que interessem à apuração dos fatos. O art. 1º fala em investigação criminal conduzida pelo delegado e não em inquérito policial. Em seguida dispõe que as funções do delegado são de natureza jurídica. Conforme se verifica no §2º o delegado possui poder de requisição de perícia, informações, documentos e dados que interessem à apuração dos fatos, salvo aqueles que estejam sob a cláusula de reserva de jurisdição, v.g., dados fiscais, bancários, conteúdos de comunicações, busca domiciliar. Lei n. 12.930/13, Art. 2º, § 4º - O inquérito policial ou outro procedimento previsto em lei em curso somente poderá ser avocado ou redistribuído por superior hierárquico, mediante despacho fundamentado, por motivo de interesse público ou nas hipóteses de inobservância dos procedimentos previstos em regulamento da corporação que prejudique a eficácia da investigação. § 5º - A remoção do delegado de polícia dar-se-á somente por ato fundamentado. O delegado possui independência funcional ainda que não expressamente prevista no texto constitucional. O § 4º ao tratar da avocação e redistribuição está limitando a possibilidade de manipulação ao tentar retirar determinado delegado da investigação sem que haja motivação para tanto. Como se vê no § 5º o delegado não é inamovível, mas sua remoção se dará por ato fundamentado. Esse fundamento pode ser objeto de impugnação administrativa e alguma ilegalidade pode ser atacada por mandado de segurança. Lei n. 12.930/13, Art. 2º, § 6º - O indiciamento, privativo do delegado o de polícia, dar- se-á por ato fundamentado, mediante análise técnico-jurídica do fato, que deverá indicar a autoria, materialidade e suas circunstâncias. Não é todo suspeito que será indiciado. O indiciamento levará em consideração toda a análise técnico-jurídica do fato. É um ato formal que se dá quando há indícios da prática do ato pelo respectivo indivíduo. Lei n. 12.930/13, Art. 3º - O cargo de delegado de polícia é privativo de bacharel em Direito, devendo-lheser dispensado o mesmo tratamento protocolar que recebem os magistrados, os membros da Defensoria Pública e do Ministério Público e os advogados. Não existe hierarquia ou subserviência do delegado em relação aos outros órgãos acima indicados. Direito Processual Penal O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 6 www.cursoenfase.com.br 1.3 Poder de investigação do Ministério Público Diante da lei n. 12.830 que delimitou o território de atuação do delegado, exsurge analisar o poder de investigação do Ministério Público. Veja que assim como outras autoridades que por lei possuem a mesma função o MP também tem poder de investigação criminal. Esse tema vem sendo debatido e há um julgado bem recente do STJ: PODER DE INVESTIGAÇÃO DO MP. JURISPRUDÊNCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA: "é lícito ao Parquet promover, por autoridade própria, atos de investigação penal, pois esses compõem o complexo de funções institucionais do Ministério Público e visam instrumentalizar e tornar efetivo o exercício das competências que lhe foram expressamente outorgadas pelo próprio texto constitucional". (HC 244.554/SP, DJe 17/10/2012) (AgRg no AREsp 302.750/SC, DJe 15/05/2014) Existe um feixe de funções do MP, dentre elas a possibilidade de investigação direta. O MP como titular da ação pública é o opinio delicti, podendo realizar diretamente os atos investigatórios. Assim, os elementos obtidos pelo parquet diretamente são legitimados pela ordem constitucional. Foi reconhecida a repercussão geral no STF quanto aos poderes de investigação do MP, mas ainda não decisão final do plenário: EMENTA: RECURSO. Extraordinário. Ministério Público. Poderes de investigação. Questão da ofensa aos arts. 5º, incs. LIV e LV, 129 e 144, da Constituição Federal. Relevância. Repercussão geral reconhecida. Apresenta repercussão geral o recurso extraordinário que verse sobre a questão de constitucionalidade, ou não, da realização de procedimento investigatório criminal pelo Ministério Público. (RE 593727 RG, Relator(a): Min. CEZAR PELUSO, PUBLIC 25-09-2009). No que se refere às decisões de turma no âmbito do STF até o presente momento são favoráveis a reconhecer o poder de investigação do MP: A denúncia pode ser fundamentada em peças de informação obtidas pelo órgão do MPF sem a necessidade do prévio inquérito policial, como já previa o Código de Processo Penal. Não há óbice a que o Ministério Público requisite esclarecimentos ou diligencie diretamente a obtenção da prova de modo a formar seu convencimento a respeito de determinado fato, aperfeiçoando a persecução penal, mormente em casos graves como o presente que envolvem a presença de policiais civis e militares na prática de crimes graves como o tráfico de substância entorpecente e a associação para fins de tráfico. É perfeitamente possível que o órgão do Ministério Público promova a colheita de determinados elementos de prova que demonstrem a existência da autoria e da materialidade de determinado delito, ainda que a título excepcional, como é a hipótese do caso em tela. Tal conclusão não significa retirar da Polícia Judiciária as atribuições previstas constitucionalmente, mas apenas harmonizar as normas constitucionais (arts. 129 e 144) de modo a compatibilizá-las para permitir não apenas a correta e regular apuração dos fatos supostamente delituosos, mas também a formação da opinio delicti. O art. 129, inciso I, da Constituição Federal, atribui ao parquet a privatividade na promoção da ação penal pública. Do seu turno, o Código de Processo Penal estabelece que o inquérito policial é dispensável, já que o Ministério Público pode Direito Processual Penal O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 7 www.cursoenfase.com.br embasar seu pedido em peças de informação que concretizem justa causa para a denúncia. Há princípio basilar da hermenêutica constitucional, a saber, o dos "PODERES IMPLÍCITOS", segundo o qual, quando a Constituição Federal concede os fins, dá os meios. Se a atividade fim - promoção da ação penal pública - foi outorgada ao parquet em foro de privatividade, não se concebe como não lhe oportunizar a colheita de prova para tanto, já que o CPP autoriza que "peças de informação" embasem a denúncia. (RE 468523, PUBLIC 19-02-2010)1 O inquérito policial é dispensável, assim nada impede que o MP fundamente a sua denúncia nas peças de informação colhidas diretamente por ele. Justificativas para o poder de investigação diretamente pelo MP: 1) Conforme preceitua o art. 129, I, CRFB o MP é titular da ação penal pública e como é destinatário do material colhido possui autonomia para diretamente diligenciar; 2) O MP faz o controle externo da atividade policial à luz do art. 129 da CRFB. Quando os envolvidos são policiais, o MP, no âmbito da sua atividade de controle externo da atividade policial, possui essa legitimidade para investigar conforme acima destacado do material. Normalmente nos casos em que os tribunais superiores aceitam a atividade ministerial na investigação são nas hipóteses em que há envolvimento de determinadas autoridades, inclusive de policiais na prática delituosa. Extrai-se do julgado acima colacionado ainda que a atividade investigatória do MP é excepcional, subsidiária, supletiva, mas é legítima. Por fim, há uma questão importante que se destaca neste julgado referente à teoria dos poderes implícito. O STF adota a teoria dos poderes implícitos, segundo a qual quem concede os fins tem que dar os meios. Assim, se a atividade fim é a promoção da ação penal pública e esta foi outorgada ao MP de forma privativa, o MP terá que ter os meios para a colheita de provas de forma direta para possibilitar a sua promoção. Em resumo, a atividade ministerial investigatória é supletiva, excepcional, normalmente se justifica quando as autoridades policiais estão envolvidas na criminalidade e todas as características e garantias da fase investigatória terão que ser respeitadas também pelo MP. As peças de informação serão tratadas como inquérito extrapolicial, pois desenvolvidas por autoridade diversa da policial. Nesse âmbito, tal como no inquérito se observa a forma escrita, as peças de informação também deverão observá-la. STJ, Súmula nº 234 - A participação de membro do Ministério Público na fase investigatória criminal não acarreta o seu impedimento ou suspeição para o oferecimento da denúncia. O STJ já reconhecia desde 2000 a possibilidade de participação do MP na fase investigatória. Discutia-se se a sua participação na investigação poderia gerar impedimento. O impedimento ocorreria caso o mesmo indivíduo ocupe duas funções no mesmo processo, v.g., quando se é delegado e depois atua como juiz na mesma causa. Ou ainda se geraria suspeição, haja vista que o MP é parte. 1 Conteúdo extraído do material disponibilizado pelo professor. Direito Processual Penal O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 8 www.cursoenfase.com.br Mas o seu desenvolvimento na fase investigatória não o torna impedido ou suspeito deoferecer a denúncia mesmo produzindo o material probatório na fase investigatória já que é o destinatário desta prova. 1.4 Características 1.4.1 Inquisitivo O inquérito é uma investigação inquisitiva, isto é, não vigora o princípio do contraditório na tramitação do inquérito policial para ter validade. Ele é unilateral, não há a dialexidade do contraditório. A autoridade policial procede à pesquisa dos dados necessários à propositura da ação penal, sem intromissão durante a realização dos atos persecutórios de outros indivíduos. 1.4.1.1 Princípio do Contraditório Vale destacar que o princípio do contraditório se encontra insculpido na Magna Carta em seu art. 5º, vejamos: CRFB, Art. 5º, LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes. No inquérito policial não há litigante, acusado ou processo e, portanto não se aplica o princípio do contraditório. É que o contraditório é a garantia de participação no processo como meio de permitir a contribuição das partes para a formação do convencimento do juiz para o provimento final almejado. O delegado não julga somente relata. Além disso, o contraditório exige a observância do princípio da paridade de armas (par conditio), a busca de uma efetiva igualdade processual. Assim, no processo há a necessidade de igualdade de armas, já na investigação criminal não existe essa paridade, o que há é o Estado apurando o fato. Veja que contraditório é diverso de ampla defesa. Ampla defesa será assegurada desde o início. O Princípio do Contraditório visa não só a garantia do direito à informação de qualquer fato ou alegação contrária ao interesse das partes e o direito de reação (contrariedade), mas também que a oportunidade da resposta possa ser realizada na mesma intensidade. No contraditório sempre que é juntado um documento a outra parte deve ter vista dos autos, pois há o direito de informação. No Inquérito Policial (IPL) não há acusado, pois não há denúncia formalizada, nem recebida e tampouco relação processual regularmente constituída por meio da citação. Em regra, a autoridade policial, ao tomar conhecimento da ocorrência de uma infração penal de ação pública, tem o dever jurídico de instaurar o inquérito de ofício, ou seja, sem provocação de quem quer que seja. Destarte, o inquérito não tem contraditório, ele é inquisitivo. Direito Processual Penal O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 9 www.cursoenfase.com.br 1.4.1.2 Elementos informativos colhidos na fase inquisitiva O art. 155 do CPP se refere ao livre convencimento motivado, a verdade real, ao princípio da persuasão racional que orienta o juiz na decisão. A prova, entretanto, deverá ser produzida em contraditório, em juízo. Sem o contraditório a ação será nula. CPP, Art. 155. O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial [contraditório sempre é judicial], não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas. Parágrafo único. Somente quanto ao estado das pessoas serão observadas as restrições estabelecidas na lei civil. O material colhido na investigação serve para lastrear a inicial. No momento processual os elementos informativos deverão ser refeitos. Existem provas que são irrepetíveis, nesse caso elas devem ser submetidas ao contraditório diferido. O dispositivo ressalva as provas cautelares, antecipadas e não repetíveis. Extrai-se do art. 155 a ideia de que tudo que se puder repetir deverá ser repetido: ouvir as testemunhas, interrogar o réu, prova pericial. A interceptação telefônica, por exemplo, é uma prova cautelar, não pode ser refeita. Existem ações penais que são todas fundamentadas em interceptação telefônica e a condenação é toda lastreada neste material. As provas antecipadas são situações excepcionais. O CPP exige a fundamentação da prova antecipada: Art. 156. A prova da alegação incumbirá a quem a fizer, sendo, porém, facultado ao juiz de ofício: I – ordenar, mesmo antes de iniciada a ação penal, a produção antecipada de provas consideradas urgentes e relevantes, observando a necessidade, adequação e proporcionalidade da medida; Face ao princípio da proporcionalidade para que haja a produção antecipada de prova deve ser demonstrada a urgência e a relevância da medida. Nesse sentido a súmula: STJ, Súmula nº 455 - A decisão que determina a produção antecipada de provas com base no art. 366 do CPP deve ser concretamente fundamentada, não a justificando unicamente o mero decurso do tempo. Veja que segundo o STJ a mera alegação de decurso do tempo não justifica a antecipação de provas e sim, deve ser fundamentada na relevância, na urgência, na necessidade, adequação e proporcionalidade da medida. O art. 366 do CPP trata da suspenção do processo do réu ausente: Art. 366. Se o acusado, citado por edital, não comparecer, nem constituir advogado, ficarão suspensos o processo e o curso do prazo prescricional, podendo o juiz determinar a produção antecipada das provas consideradas urgentes e, se for o caso, decretar prisão preventiva, nos termos do disposto no art. 312. Destarte, os elementos informativos do inquérito não podem sustentar uma sentença, pois são inquisitivos e não amparados pelo contraditório. Esse material, uma vez submetido ao contraditório diferido, à luz do art. 155 do CPP, sobretudo as provas não-repetíveis e antecipadas, corroboradas por outras colhidas no curso da instrução podem lastrear a decisão. Direito Processual Penal O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 10 www.cursoenfase.com.br Sobre o tema o acórdão: O livre convencimento do juiz pode decorrer das informações colhidas durante o inquérito policial, nas hipóteses em que complementam provas que passaram pelo crivo do contraditório na fase judicial, bem como quando não são infirmadas por outras provas colhidas em juízo. (RHC 118516, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, PUBLIC 12-05-2014) O material passa, assim, pelo contraditório diferido e deve ser franqueado as partes para se manifestarem. Exemplo: o material de horas de interceptação telefônica gravada é franqueado à defesa. No que se refere à interceptação telefônica o entendimento que vigora hoje é que é dispensada a sua transcrição integral. Geralmente são transcritos os trechos necessários. 1.4.1.3 Discricionariedade Em virtude da natureza inquisitiva do inquérito, o delegado conduz discricionariamente as investigações, determinando a realização das diligências que lhe pareçam úteis ou necessárias à elucidação do crime e de sua autoria. CPP, Art. 14 - O ofendido, ou seu representante legal, e o indiciado poderão requerer qualquer diligência, que será realizada, ou não, a juízo da autoridade. Excetua-se a hipótese de EXAME DE CORPO DE DELITO (art. 184 do CPP) em que o delegado é OBRIGADO a atender. CPP, Art. 184 - Salvo o caso de exame de corpo de delito, o juiz ou a autoridade policial negará a perícia requerida pelas partes, quando não for necessária ao esclarecimento da verdade. Não existe um rito e sim,um rol exemplificativo de diligências no art. 6º do CPP. CPP, Art. 158. Quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado. Se a infração deixar elementos sensíveis é indispensável o exame de corpo de delito. O exame de corpo de delito é obrigatório por sua natureza, pois diz respeito à materialidade da infração. CPP, Art. 167. Não sendo possível o exame de corpo de delito, por haverem desaparecido os vestígios, a prova testemunhal poderá suprir-lhe a falta. Haverá laudo quando há exame direto feito pelo perito, no caso de haverem vestígios. Desaparecendo os vestígios forma-se indiretamente o corpo de delito sem a necessidade da perícia. Assim, forma-se a materialidade através de outros elementos (prova testemunhal ou qualquer outra prova idônea) que vão confirmar a existência do fato. Enquanto que o exame de corpo de delito é obrigatório, vinculando o delegado, o EXAME DE INSANIDADE MENTAL é a única perícia que o delegado não pode fazer de ofício. O exame de insanidade mental é reservado à cláusula de jurisdição, pois diz respeito à capacidade e integridade mental do suspeito. CPP, Art. 149 - Quando houver dúvida sobre a integridade mental do acusado, o juiz ordenará, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, do defensor, do curador, Direito Processual Penal O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 11 www.cursoenfase.com.br do ascendente, descendente, irmão ou cônjuge do acusado, seja este submetido a exame médico-legal. § 1º - O exame poderá ser ordenado ainda na fase do inquérito, mediante representação da autoridade policial ao juiz competente. 1.4.1.4 Suspeição do Delegado de Polícia O delegado pode ser suspeito de parcialidade. O CPP trata das exceções, que na verdade são objeções tendo em vista que, não são levantadas somente pela defesa. Assim, segundo a doutrina a melhor expressão é objeção, pois podem ser arguidas também pelo MP. As objeções são questões que podem ser pré-processuais, mas que geralmente são processuais, pois envolvem a regularidade do processo. Portanto, são, por natureza, relativas ao processo. Não há exceção de suspeição na fase investigatória. CPP, Art. 107. Não se poderá opor suspeição às autoridades policiais nos atos do inquérito, mas deverão elas declarar-se suspeitas, quando ocorrer motivo legal. CPP, Art. 254. O juiz dar-se-á por suspeito, e, se não o fizer, poderá ser recusado por qualquer das partes: I - se for amigo íntimo ou inimigo capital de qualquer deles; II - se ele, seu cônjuge, ascendente ou descendente, estiver respondendo a processo por fato análogo, sobre cujo caráter criminoso haja controvérsia; III - se ele, seu cônjuge, ou parente, consangüíneo, ou afim, até o terceiro grau, inclusive, sustentar demanda ou responder a processo que tenha de ser julgado por qualquer das partes; IV - se tiver aconselhado qualquer das partes; V - se for credor ou devedor, tutor ou curador, de qualquer das partes; Vl - se for sócio, acionista ou administrador de sociedade interessada no processo. Como consequência da natureza inquisitiva do inquérito, não se pode opor suspeição ao delegado de policia, embora deva ele declarar-se suspeito quando houver motivos. Caso o delegado não se declare suspeito quando deveria o inquérito não poderá ser declarado nulo por esse motivo, somente se demonstrado o prejuízo. O delegado suspeito que não se declare suspeito corre o risco de prevaricar (art. 319, CP). CP, Art. 319 - Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá- lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal: Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa. A questão pode ser levada à Corregedoria ou ao MP, mas não é possível no inquérito opor exceção, já que não existe esse incidente no inquérito. O procedimento de exceção de suspeição prejudicaria a marcha do inquérito. Por outro lado, haveria no mínimo uma falta disciplinar do delegado que pode ser apurada pela Corregedoria. Segundo a Lei n. 12.830 a autoridade somente pode avocar ou redistribuir o inquérito fundamentada em questão de ordem pública ou quando o Direito Processual Penal O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 12 www.cursoenfase.com.br delegado não se conduzir de acordo com os termos legais. Não necessariamente serão nulos os atos do inquérito nestes casos. Segundo a jurisprudência dos tribunais superiores essa irregularidade do inquérito (delegado suspeito que assim não se declare) não necessariamente contamina a ação penal subsequente. 1.4.1.5 Incomunicabilidade O art. 21 do CPP trata da incomunicabilidade do preso, mas esse dispositivo é incompatível com a ordem constitucional. Art. 21, CPP - A incomunicabilidade do indiciado dependerá sempre de despacho nos autos e somente será permitida quando o interesse da sociedade ou a conveniência da investigação o exigir. De acordo com o entendimento dominante da doutrina e pacífico na jurisprudência, o instituto da incomunicabilidade não foi recepcionado pela CRFB/88. Tratava-se de verdadeira restrição imposta ao indiciado e que se justificava pela própria natureza e finalidade do Inquérito Policial, a fim de permitir que a autoridade policial achasse vestígios e provas que seriam do interesse do responsável destruir. Prevalece o entendimento de que o art. 21, CPP não se harmoniza com a atual ordem constitucional. A Constituição atual veda a incomunicabilidade do preso durante a vigência do estado de defesa (art. 136, § 3º, IV), além de assegurar-lhe a assistência da família e de advogado (art. 5º, LXIII). Se no momento excepcional do estado de defesa é vedada a incomunicabilidade com muito mais razão no momento de normalidade o preso não pode ser tornado incomunicável. Em oposição, Damásio utilizando-se do próprio art. 136, CRFB sustenta a possibilidade de incomunicabilidade. Para o referido doutrinador o constituinte vedou a incomunicabilidade por se tratar de uma situação excepcional, que é o estado de defesa, isto é, em momentos excepcionais as regras são excepcionais. Assim, na normalidade, fora da situação excepcional deverá haver a incomunicabilidade. Mas esse é um argumento minoritário e sua posição é isolada. 1.4.1.6 Habeas Corpus para trancamento de inquérito Não se admite, em regra, HABEAS CORPUS para “trancar” inquérito (HC trancativo) porque o judiciário não pode paralisar o exercício regular da atividade policial e tampouco subtrair do MP, titular da ação pública, a opinio delicti. De acordo com a recente jurisprudência da Segunda Turma do STF: A simples notitia criminis não caracteriza, por si só, constrangimento ilegal ao direito de locomoção do paciente, sanável via habeas corpus. (HC 119172, Seg. Turma, 05-05- 2014) Notitia criminis é aquela que origina o inquérito. O fato de haver uma investigação não é por si só nenhum constrangimento ilegal a fim de ser sanado via habeas corpus. Direito Processual Penal O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudênciados Tribunais. 13 www.cursoenfase.com.br Entretanto, existem algumas exceções. A jurisprudência do STF firmou-se no sentido de que a extinção de inquéritos e ações penais de forma prematura, via habeas corpus, somente se dá em hipóteses excepcionais, quando patentemente demonstrada (prova pré-constituída): a) a manifesta atipicidade da conduta. Um exemplo seria o que prevê a súmula vinculante 24 do STF. STF, Súmula vinculante nº 24 - não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art. 1º, incisos I a IV, da Lei nº 8.137/90, antes do lançamento definitivo do tributo. Esta súmula vinculante trata o lançamento definitivo do tributo nos crimes materiais contra a ordem tributária como elemento normativo. Sem o elemento normativo o crime não se tipifica. A instauração do inquérito seria ilegal, portanto o constrangimento pode ser afastado via HC. b) a ausência de indícios mínimos de autoria e materialidade delitivas. Ocorre quando não se sabe quem é o investigado ou qual é o fato. Deve haver uma vinculação mínima da autoria e da existência do fato; c) a presença de causa extintiva da punibilidade. Um exemplo é o art. 83 da Lei n. 9.430/96. Art. 83. A representação fiscal para fins penais relativa aos crimes contra a ordem tributária previstos nos arts. 1o e 2o da Lei no 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e aos crimes contra a Previdência Social, previstos nos arts. 168-A e 337-A do Decreto- Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), será encaminhada ao Ministério Público depois de proferida a decisão final, na esfera administrativa, sobre a exigência fiscal do crédito tributário correspondente. Quando há o lançamento, se encontra satisfeita a questão do elemento normativo, isto é, a condição objetiva de punibilidade. Mas se o investigado juntar a guia de recolhimento ao inquérito demonstrando que a pagou e ainda assim, o delegado continuar a apurar a sonegação pela fraude e não pelos prejuízos seria possível impetrar o habeas corpus. Isto porque o Estado abre mão de punir quem paga. Pelo menos na via estreita do habeas corpus, segundo o Supremo, os fatos objeto de investigação possuem relevância jurídica para o âmbito penal, razão pela qual se torna ilegítimo suprimir, desde logo, as funções institucionais dos órgãos competentes pela investigação criminal. STF. HC 94835/SP: O inquérito policial somente deve ser trancado quando for manifesta a ilegalidade ou patente o abuso de autoridade. Um exemplo relativo a este acórdão acima colacionado seria no caso de flagrante forjado, quando haveria manifesto abuso de autoridade. Essa é uma concretização dos elementos dados anteriormente como manifesta atipicidade da conduta, ausência de indícios mínimos de autoria e materialidade e extinção da punibilidade, que na prática vão redundar nestes dois elementos: manifesta ilegalidade ou abuso de autoridade. O STJ, concordando com o Supremo, firmou o entendimento de que: STJ. RHC Nº 14.076/RJ: O trancamento de inquérito cabe apenas nas hipóteses excepcionais em que, prima facie, mostra-se evidente a ATIPICIDADE DO FATO, a Direito Processual Penal O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 14 www.cursoenfase.com.br INEXISTÊNCIA DE AUTORIA por parte do indiciado ou alguma CAUSA DE EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. 1.4.2 Sigiloso CPP, art. 20 - A autoridade assegurará no inquérito o sigilo necessário à elucidação do fato ou exigido pelo interesse da sociedade. Importante fazer um paralelo com a ação penal: CRFB, Art. 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios: IX todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação; Veja que segundo estabelece a Constituição a ação penal é pública, regida pelo princípio da publicidade. Isso porque há um interesse público à informação. A exceção na ação penal é o sigilo (“podendo a lei limitar...”). Já o inquérito busca indícios de autoria e da infração penal, o que não se tem em um primeiro momento. Assim, ao conferir ampla publicidade ao inquérito policial poder- se-ia estar atentando contra a imagem do investigado, pois pode ocorrer de ao final o inquérito ser arquivado por inexistência de fatos criminosos contra aquele indivíduo. Neste caso ele teria sido prejudicado moralmente, gerando a perda de sua credibilidade sem que tivesse cometido qualquer fato ilícito. Destarte, é interesse da sociedade o sigilo do inquérito para preservar a imagem das pessoas investigadas. Além disso, o sigilo do inquérito é fundamental para a elucidação do fato, para o sucesso da investigação. O delegado não precisa dar publicidade aos atos de investigação para que eles tenham validade, diversamente do que ocorre com a sentença que somente ao ser publicada passa a ter validade (art. 389), assim como no caso dos atos processuais que também necessitam de publicidade. O sigilo visa evitar que a publicidade, em relação às provas já colhidas e àquelas que a autoridade pretende obter, prejudique a apuração do ilícito. Não confundir sigilo com segredo. A lei das interceptações telefônicas estabelece que a interceptação deve ser sigilosa e ainda, que o juiz assegurará o segredo das diligências, gravações e transcrições respectivas. O juiz pode decretar o segredo de justiça sob o material colhido. Tanto a autoridade policial quanto o MP terão que franquear o acesso do inquérito ao advogado do investigado, representado, suspeito, no que se refere aos elementos de prova já documentados. Nesse sentido a súmula: STF, Súmula Vinculante 14 - É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa. O sigilo do inquérito não é oponível ao advogado constituído ao defensor público. Direito Processual Penal O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 15 www.cursoenfase.com.br 1.4.3 Escrito O inquérito é escrito, formal, ou sistemático, sendo regido pelo princípio da escritura. Essa é uma formalidade extrínseca do inquérito. Todas as diligências serão documentadas. CPP, art. 9º - Todas as peças do inquérito policial serão, num só processado, reduzidas a escrito ou datilografadas e, neste caso, rubricadas pela autoridade. Já no que tange ao processo penal o procedimento é eminentemente oral. Hoje a regra no processo é a oralidade. Todos os procedimentos na ação, sumário e sumaríssimo, do júri são oralizados. Neste sentido o CPP: CPP, Art. 405. Do ocorrido em audiência será lavrado termo em livro próprio, assinado pelo juiz e pelas partes, contendo breve resumo dos fatos relevantes nela ocorridos. (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008). § 1º - Sempre que possível, o registro dos depoimentos do investigado, indiciado, ofendido e testemunhas será feito pelos meiosou recursos de gravação magnética, estenotipia, digital ou técnica similar, inclusive audiovisual, destinada a obter maior fidelidade das informações. O § 1º faz menção ao indiciado indicando que o delegado se possível deverá gravar o interrogatório e os depoimentos para manter a maior fidelidade. A oralidade confere maior fidelidade ao depoimento. Mas isso não dispensa a escritura do inquérito. Atendendo à sua finalidade de prestar informações ao titular da ação penal, não se concebe a existência de inquérito policial oral. As investigações devem ser documentadas nos autos do inquérito, em ordem lógica, a fim de que se possa fazer uma reconstrução probatória dos fatos. 1.4.4 Dispensável O inquérito policial não é obrigatório, pois é peça meramente informativa, a fim de permitir ao titular do direito de ação iniciar persecução em juízo, oferecendo a denúncia ou a queixa com base nesses elementos. CPP, Art. 12 - O inquérito policial acompanhará a denúncia ou queixa, sempre que servir de base a uma ou outra. A contrário senso, o inquérito será dispensável sempre que existirem outros elementos informativos que sirvam de base para a denúncia ou a queixa. Entretanto, o inquérito policial é indispensável quando a infração penal deixar vestígios. O art. 158 do CPP preceitua que quando a infração deixar vestígios será necessário o exame de corpo de delito, não suprindo a confissão. CPP, Art. 158. Quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado. Se o crime deixar vestígios, os seus elementos materiais dependerão do exame direto ou indireto de corpo de delito que será realizado no inquérito (art. 158 c/c art. 12, ambos do CPP). A ação penal pode ser proposta com base em peças de informação, que demonstrem a existência de provas de autoria e materialidade. Como a finalidade do IPL é Direito Processual Penal O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 16 www.cursoenfase.com.br colher tais indícios, se o titular do direito de ação já dispõe dos mesmos, torna-se desnecessária sua instauração. Outra prova da dispensabilidade do inquérito diz respeito à delatio criminis, que é levada diretamente ao MP: CPP, Art. 27 - Qualquer pessoa do povo poderá provocar a iniciativa do Ministério Público, nos casos em que caiba a ação pública [incondicionada], fornecendo-lhe, por escrito, informações sobre o fato e a autoria e indicando o tempo, o lugar e os elementos de convicção. No caso de ação penal pública condicionada à representação é possível que o MP dispense o inquérito no seguinte caso: CPP, Art. 39, § 5º - O órgão do Ministério Público dispensará o inquérito, se com a representação forem oferecidos elementos que o habilitem a promover a ação penal, e, neste caso, oferecerá a denúncia no prazo de 15 (quinze) dias. O início do prazo para oferecer a denúncia conta-se a partir da data em que o membro do MP receber as peças de informação (na delatio criminis) ou a representação (na ação penal pública condicionada): CPP, art. 46, § 1º - Quando o Ministério Público dispensar o inquérito policial, o prazo para o oferecimento da denúncia contar-se-á da data em que tiver recebido as peças de informações ou a representação. Em regra, não se instaura inquérito no JECRIM, mas não é vedada a sua instauração. O termo circunstanciado faz às vezes do inquérito policial. Lei n. 9.099/95, Art. 77, § 1º - Para o oferecimento da denúncia, que será elaborada com base no termo de ocorrência referido no art. 69 desta Lei, com dispensa do inquérito policial, prescindir-se-á do exame do corpo de delito quando a materialidade do crime estiver aferida por boletim médico ou prova equivalente. Lei n. 9.099/95, Art. 69. A autoridade policial que tomar conhecimento da ocorrência lavrará termo circunstanciado e o encaminhará imediatamente ao Juizado, com o autor do fato e a vítima, providenciando-se as requisições dos exames periciais necessários. Nas infrações de menor potencial ofensivo, em regra, não haverá inquérito policial. O termo circunstanciado de ocorrência funciona como um substitutivo do inquérito policial. 1.5 Formas de Cognição Segundo a doutrina existem três formas de cognição, isto é, existem três caminhos pelos quais o delegado pode tomar conhecimento do fato: 1.5.1 Cognição imediata Quando a autoridade policial diretamente em sua atividade rotineira toma conhecimento da infração penal. Neste caso, de ofício, se for ação pública incondicionada, instaura o inquérito policial. O delegado age de ofício, face ao princípio da oficiosidade. Direito Processual Penal O presente material constitui resumo elaborado por equipe de monitores a partir da aula ministrada pelo professor em sala. Recomenda-se a complementação do estudo em livros doutrinários e na jurisprudência dos Tribunais. 17 www.cursoenfase.com.br 1.5.2 Cognição mediata Ocorre quando a autoridade policial sabe do fato por meio de requerimento da vítima ou de quem possa representá-la, requisição da autoridade judiciária (consta na lei, mas não foi recepcionada) ou do órgão do ministério público ou mediante representação ou requisição do Ministro da Justiça. 1.5.3 Cognição coercitiva No caso de prisão em flagrante, em que o autor do fato é apresentado à autoridade policial. CPP, Art. 8º - Havendo prisão em flagrante, será observado o disposto no Capítulo II do Título IX deste Livro. 1.6 Início do Inquérito O tema é tratado pelo art. 5º do CPP. Para uma melhor compreensão o referido dispositivo deverá ser separado em partes. 1.6.1 Na Ação Penal Pública Incondicionada O delegado de ofício (art. 5º, I, CPP) instaura o inquérito policial. CPP, Art. 5º - Nos crimes de ação pública o inquérito policial será iniciado: I - de ofício; Autoridade policial é obrigada (princípio da obrigatoriedade da ação penal pública incondicionada) a instaurar o IPL de ofício (por iniciativa própria) sempre que tomar conhecimento da ocorrência de crime por meio de suas atividades de rotina. A portaria é o instrumento legal que inicia esse inquérito.
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