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DIREITOS DA PERSONALIDADE_REVISTO

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DOS DIREITOS DA PERSONALIDADE NO CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO
	Prof. Natanael Sarmento, Dr. Titular da Unicap
 Resumo: Trata-se de análise crítica dos direitos da personalidade regulados no Livro I, Título I, Capítulo II, artigos 11 a 21, do Código Civil, lei 10.406/2002. Aborda aspectos doutrinários e dogmáticos da nova categoria de direitos da personalidade. Utiliza técnica de fichamento e método bibliográfico, consulta em fontes primárias – leis, jurisprudências - e secundárias – livros, periódicos, artigos. Destina-se a estudantes do curso de direito, especialmente os alunos de direito civil I – Parte Geral – da Universidade Católica de Pernambuco – UNICAP. 
I. Intróito
 Muito a gosto dos jurisconsultos, algumas questões teóricas do tema direitos da personalidade motivam debates doutrinários. É correto falar-se em direitos da personalidade como direitos subjetivos? Qual a natureza jurídica dos direitos da personalidade? Há características de direitos da personalidade explicitadas e outras não na dogmática do código civil? Há paradoxo sistêmico no código civil que assegura direitos da personalidade a entes despersonalizados a teor do próprio código a exemplo de nascituro e do “de cujos”. Afinal, certos direitos - à honra, à imagem, ao nome e à integridade física – integram a personalidade, porém, a lei civil assegura a tutela de tais direitos em face de seres despersonalizados.
 Nos dias correntes, a doutrina jurídica não mais se agita em atribuir estatuto autônomo aos direitos da personalidade. Tratados como direitos da pessoa em si mesma, ganham, a cada dia, mais reconhecimento doutrinal e novas formas de proteção no âmbito legal. Trata-se de uma categoria especial de direitos pela própria configuração ontológica: a tutela pretendida diz respeito ao ser humano em si mesmo. Nele se fundem sujeito e objeto de direitos. A tutela jurídica torna-se indispensável ao desenvolvimento do ser humano como tal. Logo, tais direitos não se confundem com as demais regras que regulam a pessoa em face da sociedade, da família, ou de bens patrimoniais. Nas relações jurídicas estabelecidas com as outras pessoas ou coisas: sociedade, bens, Estado, o titular do direito subjetivo não se confunde com o objeto do direito tutelado. O chamado pomo da discórdia doutrinal consiste no fato de que no direito subjetivo há sempre, “correspondendo ao direito do sujeito ativo, um dever jurídico do sujeito passivo”.� Nas relações jurídicas, estabelece-se um vínculo entre pessoas distintas, o titular do direito subjetivo (sujeito ativo) e a outra pessoa (sujeito passivo). Nesse caso, sujeito/objeto de direitos não se confundem, qual acontece relativamente aos direitos da personalidade. Em razão dessa particularidade, discutia-se na doutrina a natureza jurídica dos direitos da personalidade. Nesse sentido, duas posições se confrontavam: uma, admitindo-se os direitos personalíssimos como direitos subjetivos; outra, negando essa possibilidade. O código civil brasileiro reconhece os direitos da personalidade como direitos subjetivos sistematizados nos artigos 11 a 21 do Livro I da Parte Geral. 
 Cuida-se de direitos próprios dos seres humanos inerentes à pessoa em si mesma. De direitos com características ontológicas por se constituírem do próprio ser humano. Direitos inatos porquanto assegurados desde o momento da concepção. Direitos gerados e desenvolvidos com o ser humano, incorporados à personalidade de cada pessoa e indispensável ao seu desenvolvimento ao longo da vida. 
 A tutela legal dos direitos da personalidade, no Brasil, amplia-se de tal maneira que a codificação civilista afigura-se paradoxal em sentido formal da sistematização dogmática. Isso por alcançar o nascituro ao tempo em que adota a teoria natalista ao reger que a personalidade começa com o nascimento com vida. Mesma incongruência formal e lógica quando proclama que a existência da pessoa termina com a morte, sendo lógico pensar que não há personalidade sem pessoa. No entanto, o código civil assegura direitos da personalidade para depois da morte, haja vista que atribui aos sucessores e herdeiros do morto legitimidade para promover ação de danos morais.
 Outra característica dos direitos da personalidade é que são indisponíveis. O titular desses direitos não pode, voluntariamente, dispor, parcial ou totalmente, de forma livre. Os direitos da personalidade tutelam o próprio ser humano, consideram indispensáveis ao seu desenvolvimento saudável, razão pela qual a lei impõe limitações. Nesse sentido, a rigidez da norma da indisponibilidade abranda-se apenas em face de questões maiores, lícitas, altruístas e plenamente justificáveis, devidamente previstas na lei. Casos de notório interesse público, fins sociais e de acordo com os bons costumes. Portanto, como regra, são direitos irrenunciáveis e intransmissíveis, impenhoráveis e imprescritíveis. Certas características da regra conhecem as respectivas exceções, contanto que previstas na lei, exemplos: a doação de órgãos para transplante em vida ou após a morte e o uso da imagem pessoal, ou do nome, em propaganda, quando autorizado pelo titular. Pela regra, veda-se a disposição do próprio corpo, no todo, ou em parte. Mas a lei excepciona o uso do nome autorizado, bem assim da imagem. Da mesma maneira, a lei civil abranda o direito à imagem diante de circunstâncias legalmente previstas, tais como necessidade de administração da justiça ou manutenção da ordem pública. O direito de imagem, assim, não pode ser alegado para alguém recusar-se ser fotografado para fins de identificação pessoal em documentos oficiais, tais como a carteira nacional de habilitação e a cédula de identidade. 
 Os direitos da personalidade, não raramente de forma assistemática, estão presentes em diversos diplomas legais. No âmbito constitucional, os direitos da personalidade estão consubstanciados nos diversos dispositivos do art. 5º. Assim, quando assegura o direito à vida no “caput” do art. 5º. Em seguida, a Carta Política proclama o direito à vida, à intimidade, à privacidade, à honra e à imagem, no inciso X: “São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito de indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”. Alguns desses direitos reaparecem em outros incisos, como o direito à intimidade, que volta a ser contemplado, expressamente, no inciso LX, que impõe a publicidade dos atos processuais, porém excepcionando tal publicidade ao interesse social e à defesa da intimidade. 
O Código Penal, contudo, sistematiza os direitos concernentes à personalidade sob o título dos crimes contra a pessoa. O código criminal tipifica os respectivos crimes e indica as penas com o desiderato de proteger a pessoa e a sociedade. Nesse sentido, define os crimes contra a vida: homicídio, induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio, infanticídio e aborto, arts. 121 a 128; lesões corporais, art. 129; periclitação de vida e da saúde, arts. 130 a 136; crimes contra a honra, calúnia, difamação e injúria, arts. 138, 139 e 140; crimes contra a liberdade individual: constrangimento ilegal, ameaça, sequestro e cárcere privado, redução à condição análoga à de escravo, arts. 146 a 149; crimes contra a inviolabilidade do domicílio, da correspondência e dos segredos, arts. 150, 152 e 153.
 Outros diplomas legais, editados em conformidade com as novas disposições constitucionais introduzidas pela Constituição de 1988, a exemplo da Lei n. 8078/90 - Código de Defesa do Consumidor, do Estatuto da Criança e do Adolescente, da lei 9.434/97, que regula a remoção de órgãos e transplantes, dentre outras, tutelam direitos subjetivos da personalidade, inclusive a moral e a integridade psicofísica da pessoa humana. 
2. Direitos da personalidade no código civil
O código civil, lei 10.406/2002, sistematiza os direitos da personalidade na Parte Geral, Livro I (das Pessoas), títuloI (das pessoas naturais), capítulo II (direitos da personalidade), regidos pelos artigos 11 a 21.
 O art. 11 da lei civil prevê algumas características dos direitos da personalidade: irrenunciável, intransmissível, ilimitado ou incondicional: “Com exceção dos casos previstos em lei, os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer limitação alguma”.
 Pelo artigo da lei, voluntariamente, os direitos da personalidade não podem sofrer limitações. O dispositivo é coerente, pois somente as eventuais limitações aos direitos, por ação ou omissão voluntária, caracterizam o ato ilícito civil. Contudo, o legislador, no nosso entender, omitiu algumas das características de direitos da personalidade apontadas pela doutrina. 
 Direitos inerentes à própria pessoa, quais nome, integridade psicofísica, intimidade, vida, honra, imagem, vida privada, privacidade, com efeito, possuem características outras, referidas anteriormente nesse trabalho, não contempladas no Código Civil. Resumidamente, os direitos da personalidade são inatos, inerentes à pessoa, intransmissíveis, irrenunciáveis, inalienáveis, imprescritíveis, não se prestam à garantia, penhora ou execução, não se expropriam. Têm gozo e exercício absoluto, pleno, incondicional, ilimitado, salvo as exceções expressamente previstas em lei. 
 2.1. Tutela legal dos direitos da personalidade 
 A proteção do direito civil aos direitos da personalidade vai da prevenção visando a evitar o dano à indenização reparadora dos prejuízos causados. A indenização civil tem o escopo de obrigar o responsável pelo dono a reparar os prejuízos materiais e morais da vítima, sem prejuízo das demais sanções nos campos penal e administrativo, se for o caso. O art. 12 prescreve que “Pode-se exigir que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei”. Pelo parágrafo único deste artigo, atribui-se a legitimação à ação de indenização de perdas e danos ao cônjuge sobrevivente e aos parentes, em se tratando de morto.
 De fato, a lei procura resguardar os direitos da personalidade amplamente, fazendo cessar a ameaça se os fatos lesivos à personalidade ainda não se consumaram, ou depois de consumada a lesão, garantindo-se à vítima o direito subjetivo de reclamar judicialmente a justa indenização pelos danos sofridos. 
 O ordenamento jurídico dispõe de instrumentos eficazes para exigir que cesse as ameaças. Liminares, tutelas antecipadas, medidas cautelares, conforme melhor solução do caso, atendidos os requisitos processuais respectivos, urgência, verossimilhança do direito, risco de dano irreparável ou difícil reparação e assim por diante. Tais medidas preventivas ou assecuratórias da tutela não prejudicam a ação ordinária de indenização em face das perdas e danos da vítima. Ora, já se disse anteriormente, a indenização civil tem por fim ressarcir prejuízos do titular de direito violado. Nos ilícitos de direitos da personalidade que dizem respeito à pessoa já falecida, a lei civil legitima o cônjuge sobrevivente, os parentes em linha reta e colaterais até o 4º grau. A expressão “sem prejuízo de outras sanções” diz respeito aos reflexos do ato ilícito nos outros ramos do direito, cuja repercussão independe das sanções de natureza civil. Solve-se o dano civil mediante o pagamento do dano ou da indenização de perdas e danos. Mas a ilicitude criminal ou contravencional comportará as sanções criminais previstas no Código Penal, nas demais leis criminais ou na lei de contravenções penais. Em se tratando de ilicitude de agente público, tem-se o processo próprio e as respectivas sanções administrativas. 
 
Direito à vida e direito à integridade psicofísica	
 
 Tem-se a vida humana como o valor maior, o valor fundamental, não somente à própria pessoa como também à sociedade. Nesse sentido, a proteção da vida humana tem recebido especial atenção de todos os ordenamentos jurídicos, inclusive no Brasil. Com efeito, a Constituição Federal/1988 assegura a todos a inviolabilidade do direito à vida (art. 5º, caput). E, coerentemente com esse princípio, veda a pena de morte, salvo em caso de guerra declarada (art. 5º, inciso XLVII, letra “a”). 
 A lei prescreve ser a integridade física e psíquica da pessoa inviolável, não devendo sofrer limitações de qualquer espécie. Nem mesmo necessita ser efetivada, pois a simples ameaça configura-se como ilicitude.
 No tocante à integridade psicofísica, o código civil rege nos artigos 13, 14 e 15 as seguintes disposições. 
 Art. 13, verbis: “Salvo por exigência médica, é defeso o ato de disposição do próprio corpo, quando importar diminuição permanente da integridade física, ou contrariar os bons costumes.
Parágrafo único. O ato previsto neste artigo será admitido, para fins de transplante, na forma estabelecida em lei”.
A disposição de partes do corpo de pessoa viva, no direito nacional, só tem o amparo da lei para finalidades terapêuticas e de transplante, expressamente, previstas. O doador, voluntariamente, manifestará, por escrito, a vontade de disponibilizar parte de seu corpo. Ademais, a lei exige necessidade do tratamento e que a retirada do órgão, tecido ou parte do corpo não importe risco de vida, não comprometa as funções vitais ou contrarie os bons costumes.
	Em matéria penal, define-se como lesão corporal a ofensa à integridade corporal ou à saúde. Qualquer dano à normalidade funcional do corpo humano, físico ou psíquico. Estabelece distinção entre a natureza das lesões – leves e graves – e as respectivas penas (CP, art.129). 
 De acordo com a redação original da lei 9434/97, antes das modificações introduzidas pela lei 10.211/2001, doutrina e jurisprudência agitavam-se em face do consentimento presumido à utilização de órgãos de “doador” morto. Pela dicção originária do texto legal, não havendo declaração expressa de não doador (na Carteira Nacional de Habilitação, art. 4), presumia-se a autorização de doação de tecidos, órgãos ou partes do corpo humano para finalidades de transplantes ou terapêuticas post mortem. O escopo da lei na doação presumida era aumentar o número de doadores fornecedores de órgãos e reduzir as filas de espera dos recebedores donatários. Nesse sentido, o poder público, a pretender defender o interesse social, decidia-se pela universalidade da doação. Assim, na sociedade brasileira, todos seriam doadores salvo expressa manifestação de vontade em contrário.
Em que pese o fim elevado do dispositivo legal, produziu-se um efeito contrário, e a regra da doação presumida, tornada alvo de fortes críticas, terminaria revogada em sede de Medida Provisória (MP), portanto fundado nos pressupostos de “urgência” e “relevância” no ano seguinte, 1998. O governo recuava de sua decisão ousada sobre a matéria. Apontam-se diversos fatores, quais sejam: falha na comunicação, resistências de ordem culturais, desconfianças da população (receava-se, em geral, que órgãos de pessoas indigentes fossem retirados antes da morte encefálica para favorecer pessoas ricas), como os “carrascos” da doação de órgãos presumida. Importa saber que o governo foi obrigado a retroceder e desfazer em caráter de urgência a norma editada por ele um ano antes, tamanha a impopularidade e oposição recebida. Pela MP revogadora da doação presumida, a doação de órgãos do morto passava a depender de autorização dos familiares. Assim, pela nova regência, aos membros da família do morto transferia-se a responsabilidade da doação dos órgãos do falecido. A nova dicção apaziguaria os ânimos, inclusive de ilustres juristas que viam a regência anterior como draconiana, inconstitucional, coisas que tais, porém, a nova e pacificadora redação, de fato, retirou da sociedade (ou do poder público, pelo menos) o processo decisório da questão. Esse é o teorda norma vigente, lei 10.211/2001, alteradora da lei 9.434/97. No art.4, verbis “A retirada de tecidos, órgãos e partes do corpo de pessoas falecidas para transplante ou outras finalidades terapêuticas, dependerá de autorização do cônjuge ou parente maior de idade, obedecida a linha sucessória, até o segundo grau, inclusive, firmada em documento subscrito por duas testemunhas, presentes à verificação da morte”.
 Sobre a disponibilidade do corpo para depois da morte, o código civil, no artigo 14 estabelece: “É válida, com objetivo científico ou altruístico, a disposição gratuita do próprio corpo, no todo ou em parte, para depois da morte.
Parágrafo único. O ato de disposição pode ser livremente revogado a qualquer tempo”.
	Atente-se que a proteção legal do corpo humano prolonga-se post mortem. O estatuto criminal tipifica os crimes de subtração ou ocultação de cadáver (art. 211) e vilipêndio a cadáver (212), cominando, respectivamente, às penas de reclusão e de detenção de 1 a 3 anos. Mas a lei confere validade, com fundamento nos princípios da vontade e da licitude, à disposição em parte, ou no todo, do próprio corpo após a morte. Exige a norma que a destinação seja terapêutica (transplante) ou científica (estudo), ressalvada a revogabilidade da disposição a qualquer tempo pelo doador. 
	Mas cadáveres em poder das autoridades públicas e não reclamados podem ser destinados para fins de ensino e pesquisa. Trata-se dos corpos de “cadáveres sem dono” ou “indigentes”, dos quais não se tem informações relativas a parentes ou endereço. Assim, sem possibilidade de identificação, qual o destino a ser dado ao cadáver? A lei 8.501, 30/11/1992 tem por objeto exatamente a utilização de cadáver não reclamado para fins de estudos e pesquisas científicas. 
	Relativamente à regência dos direitos da personalidade específicos da integridade psicofísica, dispõe o art. 15, verbis: “Ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a tratamento médico ou a intervenção cirúrgica”. 
O dispositivo funda-se nos princípios da autonomia e da beneficência. Pelo primeiro, a intervenção e as ações do profissional da medicina devem ter o consentimento do paciente civilmente capaz ou do responsável legal do incapaz. Importa dizer que é responsabilidade médica dizer o real estado da saúde do paciente e o tratamento por ele indicado. Ao paciente, devidamente esclarecido do tratamento a que será submetido, cabe decidir se aceita, ou não, tal tratamento. Para a segurança e a garantia de ambas as partes, médico e paciente devem documentar suas posições e vontades. Pelo princípio da beneficência, o médico deve adotar o melhor e mais eficaz tratamento tendo em vista o melhor para a saúde do paciente. Tem o paciente o direito de não submeter-se a terapias de elevados riscos de morte ou constrangedoras.
A nosso ver, a regra do artigo 15, em tese correta na perspectiva do direito, enfrenta problemas sérios na sua implantação prática. Se, por um lado, visa coibir a “ditadura médica” e assegurar a dignidade da pessoa sob tratamento, por outro lado, nem mesmo o princípio da autonomia é absoluto. Observe-se que estamos tratando de uma norma vigente em país que não legitima a eutanásia. Tomemos como exemplo alguém a quem se recomenda tratamento vexatório, constrangedor, mas indispensável à preservação da vida. Se o paciente recusar-se ao tratamento, a atuação do médico do ponto de vista ético e legal resolve-se em se documentar para uma eventual defesa judicial e deixar o paciente morrer? Se o médico, a despeito da opinião contrária do paciente, realizar a intervenção necessária do ponto de vista médico para salvar a vida daquele paciente contra a vontade deste paciente que vem a falecer ou sobreviver com sequelas graves? Os parentes do de “de cujos” ou o paciente sequelado obterá êxito numa eventual demanda judicial contra o médico em ações no âmbito civil, criminal e administrativo? 
Direita à imagem, direito ao sigilo e direito autoral
 O código civil possibilita interpretações ampliadas do direito à imagem. Não poderia ser diferente face aos inúmeros significados da expressão imagem da pessoa. Ao ampliar o leque de proteção, a noção de imagem compreende a imagem propriamente da física da pessoa, o sigilo e o direito autoral. O legislador pretendeu laçar muitos bois com uma só laçada. Como resultado, o art. 20 do código civil, um primor de confusionismo, verbis: “Salvo se autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se destinarem a fins comerciais. 
Parágrafo único. Em se tratando de morto ou de ausente, são partes legítimas para requerer essa proteção o cônjuge, os ascendentes e os descendentes”. 
Com uma só cajadada, o legislador hercúleo buscou proteger o direito autoral dos escritos, a transmissão da palavra, a publicação de escritos, a imagem da pessoa e, reflexamente, a honra da pessoa. Antes do tombo, trata de ressalvar os casos devidamente autorizados pela própria pessoa ou a sua revelia, quando necessário à administração da justiça ou mantença da ordem pública. 
 Tem-se, assim, como direitos conexos à intimidade: o direito ao sigilo e o direito autoral a não divulgação de palavra, escrita ou falada, e direito à honra e à boa fama. A nosso ver, o legislador disse de menos; melhor faria se dedicasse um artigo específico sobre cada um dos direitos tutelados ou remetesse a matéria à legislação específica. 
 O direito de imagem em sentido corporal ou físico compreende qualquer tipo ou forma de reprodução da imagem da pessoa: fotografias, desenhos, pinturas, charges, cartazes, filmes. Representações ou qualquer forma de expressão como própria voz humana, escritos, músicas, documentos particulares, diários, papéis pessoais, símbolos ou signos capazes de identificar uma pessoa em sua individualidade. 
Para fazer face à ameaça ou ao dano à imagem, o titular do direito ameaçado ou efetivamente lesado tem a indenização pelos danos materiais e morais.
Direito à privacidade
A definição legal das esferas da vida privada e da pública, do justo equilíbrio entre ambas, afigura-se, historicamente, variável e complexa. No entanto, preservar a vida íntima ante a corrosão da vida privada pelo abuso de poder tem acompanhado a história humana. Nas civilizações mais antigas do mundo ocidental, Roma e Grécia, dessa tensão público/privado se ocuparam legisladores, reis, filósofos, cidadãos pacatos e insurretos. 
A problemática agiganta-se diante das novas tecnologias capazes de captar e transmitir imagens de satélites espaciais até pequenos aparelhos celulares de bolso. René Dotti utiliza uma expressão lapidar para caracterizar esse avanço em detrimento da vida privada: “erosão da privacidade” (DOTTI,1980) .
 Um desenvolvimento humano saudável não se confunde com sobreviver de qualquer forma. Desenvolver-se como ser humano pressupõe-se ter-se assegurado a dignidade da vida humana. Nessa dignidade, compreende-se a identidade pessoal, a honra e a privacidade. Pedro Frederico Caldas sintetiza essa concepção: “a ninguém compraz, mesmo que preservada a vida, viver sem honra, sem identidade ou sem um mínimo de privacidade” (CALDAS, 1997). 
 O direito à privacidade tem a tutela constitucional na garantia da inviolabilidade do lar; no direito ao sigilo das comunicações telefônicas; no sigilo fiscal e bancário; no sigilo profissional. Sobre o sigilo profissional, Tércio Ferraz considera além da privacidade do indivíduo por alçar a privacidade de terceiros e envolver a segurança do Estado (FERAZ: 1992).
Em linhas gerais, pode-se afirmar que o direito à intimidade limita ou restringe a publicidade indesejável, obsta o devassamento do que não diz respeito ao públicoem geral e impede a divulgação pessoal considerada confidencial. Trata-se de direito defensivo e contrário à invasão da vida privada, por terceiros não autorizados, inclusive, o poder público.
Tais direitos da personalidade destinam-se a proteger a privacidade do indivíduo, da família, dos negócios contra divulgações e publicidades indevidas e indesejadas, contra indiscrições de pessoas desautorizadas. Diz-se que o âmbito do direito à privacidade é mais amplo do que o do direito à intimidade. Segredos, confidências, informações sigilosas, decisões secretas e dados pessoais, cartas íntimas, recordações, memórias, diários, relações familiares, vida sentimental, vida conjugal, lazer pessoal, costumes domésticos, a sepultura e o estado de saúde, enumera BITTAR, (1989: 70). 
O código civil encerra o capítulo com o art. 21: “A vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário a essa norma”.
Para assegurar a efetividade dessa proteção legal, a autoridade judicial, a pedido do interessado, poderá conceder em sede de cautelares ou liminares, além de condenar o causador do ilícito a ressarcir a vítimas pelos danos materiais e morais.
 
� Wald, Arnald.Curso de Direito Civil Brasileiro, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, v.1 p.114.

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