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3 ................ Pontos essenciais: - Classificações do megaesôfago: • Preparo pré-operatório; • Tratamento. 1. Conceito Compreende uma afecção caracterizada pela destrui- ção e pela redução quantitativa dos plexos nervosos intra- murais e submucoso do esôfago com conseqüentes alte- rações do peristaltismo e acalásia do Esfíncter Esofágico Inferior (EEI). 2. Epidemiologia Apresenta maior incidência entre os 30 e os 50 anos. As complicações crônicas dos pacientes que adquirem a infec- ção pelo Trypanosoma cruzi costumam ocorrer anos após a fase aguda, com incidência de até 30% dos infectados. As manifestações mais comuns são as cardíacas (27%), segui- das pelas afecções do TGI (6%); destas, o megaesôfago é mais frequentemente observado do que o megacólon cha- gásico. Tais manifestações costumam ser observadas em países subdesenvolvidos, como Brasil, Argentina e Bolívia. Há predominância no sexo masculino (2:1). 3. ~tiopatogenia -Idiopática: causa desconhecida (EUA e Europa); -Chagásica: Trypanosoma cruzi, causando destruição dos plexos nervosos na musculatura lisa de órgãos específicos, por processos auto-imunes que podem desenvolver-se no hospedeiro após infecção aguda pelo protozoário. No Brasil, mais de 90% dos casos de megaesôfago são de etiologia chagásica. Megaesô 4. Fisiopatologia Na doença de Chagas, a destruição dos neurônios ocorre na fase aguda, o que leva à liberação de antí- genos que estimulam o aparecimento de uma resposta auto-imune, a qual pode agravar ou perpetuar a destrui- ção celular. A ausência ou a diminuição acentuada dos plexos nervosos do esôfago leva à perda da transmissão adequada do estímulo da deglutição com conseqüente' contração incoordenada ou ausente do corpo esofági- co. Ao mesmo tempo, o EEI não se abre em resposta à deglutição, mas é permeável à pressão de coluna líqui- da suficientemente elevada. A denervação acarreta hi- persensibilidade da musculatura quando é submetida a estímulos colinérgicos. A aperistalse e a acalásia (que sig- nifica ausência de relaxamento do EEI) levam a estase eso- fágica, que estimula o esôfago a ficar em hipertonia que, no decorrer do tempo, leva a hipertrofia e espessamento da parede esofágica. Mais tardiamente, a estase alimentar enfraquece a parede esofágica, que se adelgaça e perde a tonicidade muscular. As pressões basais elevadas no EEI são detectadas em todos os casos de megaesôfago, e a extensão e a pressão máxima nesse local são semelhantes às dos indivíduos nor- mais. No entanto, não há relaxamento adequado do EEI na deglutição. S. Megaesôfago chagásico e carcinoma o megaesôfago chagásico é condição pré-neoplásica, e a ocorrência de câncer associada ao megaesôfago é de, aproximadamente, 3%. A condição hiponutricional do epitélio mucoso e o processo inflamatório crônico local, associados à doença de Chagas e à estase alimentar, são responsáveis por tal associação. I MEDCEL - PRINCIPAIS TEMAS EM GASTROENTEROLOGIA 6. Diagnóstico A - Quadro clínico ti~ Constituído por disfagia de longa duração (anos) e de instalação lenta, que cede a manobras de elevação da pres- são esofágica com formação de coluna líquida. Quanto mais avançado é o quadro, mais evidente é o sintoma de disfagia. É o primeiro e mais freqüente sintoma. Também são freqüentes o sintoma de regurgitação e a perda de peso devido à impossibilidade de alimentar-se ou ao receio da regurgitação. Os quadros de broncoaspiração e pneumonites são comumente observados. Podemos obser- var, também, em alguns pacientes, as hipertrofias das paróti- das e outras glândulas salivares, podendo haver sialorréia. B - Exames laboratoriais o teste de fixação do complemento descrito por Machado Guerreiro permaneceu como único exame para diagnóstico até a década de 1950. Atualmente, são usados os testes de Elisa, hemaglutinação indireta e imunofluorescência indireta. É necessário resultado positivo em, pelo menos, 2 métodos diferentes para confirmação diagnóstica. c - Exames radiológicos - Raio x de tórax: avalia a condição cardíaca (se há cardio- megalia) e demonstra quadros pulmonares associados. Pode eventualmente demonstrar o relevo do esôfago dilatado e nível hidroaéreo mediastinal. Outros achados são duplo contorno cardíaco à direita, alargamento de mediastino e ausência de bolha gástrica. Figura 1-Radiografia simples de tórax em paciente com megaesô- fago chagásico: notar a área hipotransparente à direita da mediasti- no, com nível hidroaéreo superior, sugestiva da ajecção - EED (exame contrastado do esôfago, estômago e duo- deno): é o exame mais importante e o primeiro a ser iMedcel solicitado no paciente com disfagia. Demonstra a dilata- ção e o alongamento do esôfago, a imagem em "cauda de rato" de acalásia e a ausência de bolha gástrica, que ocorre pelo impedimento da passagem de ar deglutido para o estômago pela estase alimentar. Também pode ajudar a identificar contrações terciárias e a presença de nível hidroaéreo no esôfago. As classificações mais anti- gas baseavam-se apenas no EED. D - Exames endoscópicos - Endoscopia digestiva alta: não é boa para avaliar dilata- ção esofágica ou acalásia. É, principalmente, solicitada para o diagnóstico diferencial ou para afastar a presen- ça de câncer. Com esse propósito, deve-ser sempre feita com cromoscopia, utilizando-se corantes como o lugol ou o azul de toluidina. O achado de áreas hipocoradas com o lugol ou hipercoradas pelo azul sugere a presença de alta replicação celular, podendo corresponder a áreas de displasia ou câncer. E - Exames funcionais - Manometria esofágica: permite diagnóstico das altera- ções mataras mesmo antes da ocorrência de sinais radio- lógicos de megaesôfago. É o método preferencial para o diagnóstico precoce da doença. Pela manometria, pode- se definir o grau de comprometimento da mobilidade esofágica pela presença de acalásia, aperistalse, hipoto- nia ou atonia, o que ajuda na classificação da doença e na escolha do tratamento mais adequado. Figura 2 - EED - Megaesôfago chagásico G IV: notar a dilatação do órgão, o afilamento em "cauda de rato", a presença de nível hidroa- éreo esojáçico. a ausência de bulha gástrica e a presença de ondas terciárias no terço distal do esôfago iMedcel -~::~ MEGAESÔFAGO 7. Diagnóstico das afecções associadas -Cardiopatia: é encontrada em 50% dos casos de mega- esôfago. No ECG, as alterações mais freqüentes são os bloqueios de ramo direito e bloqueios divisionais ânte- ro-superiores. Alguns pacientes têm cardiopatias mais graves e são portadores de marca-passo; - Gastropatia: a acalásia do piloro aparece em, aproxi- madamente, 20% dos casos e deve ser pesquisada com exames de tempo de esvaziamento gástrico (o normal é de 2 horas). Tal exame pode ser realizado com radiogra- fia contrastada, cintilografia ou, mais raramente, ultra- sonografia; - Megaduodeno: ocorre em 1,5% dos casos e aparece no EED; - Litíase biliar: ocorre em 10% dos casos e deve ser pes- quisada com USG de abdome. Decorre de alteração da motilidade da vesícula por acometimento da inervação vagal; - Megacólon: ocorre em 40 a 70% dos casos. Como o tra- tamento é clínico nos casos sem complicações, só deve ser pesquisado na presença destas, por meio do enema opaco; - Câncer de esôfago: ocorre em cerca de 3% dos casos. O carcinoma espinocelular (CEe) é o tipo histológico en- contrado. O prognóstico dessa associação é ruim, devi- do à dificuldade diagnóstica, tendo em vista a dilatação esofágica e os sintomas do próprio megaesôfago. Deve ser pesquisado por EDA com cromoscopia em todos os casos, com repetição anual do exame, mesmo depois do tratamento cirúrgico; - Hérnia de hiato: tal associação ocorre em 3,6% dos ca- sos e deve ser pesquisada nos examesde manometria e endoscopia, a fim de ajudar na escolha da conduta te- rapêutica. 8. Diagnóstico diferencial Todas as afecções que cursam com disfagia, como: - Estenose cáustica ou por refluxo; - Divertículos esofágicos; - Esclerodermia; - Neoplasia (do esôfago ou extrínseca). 9. Classificação A classificação mais adequada considera aspectos clíni- cos, radiológicos e manométricos. Assim, pode-se classificar o megaesôfago em: -Incipiente: dilatação pequena ou ausente e alterações manométricas representadas basicamente por acalásia. Podem aparecer alterações no corpo esofágico. O princi- pal sintoma é a disfagia baixa; - Não-avançado: dilatação do esôfago de até 7cm com es- tase, mas com o órgão ainda em seu eixo. A ausência de peristaltismo e acalásia são freqüentes, com amplitude e duração dos complexos alterados. Além da disfagia, o paciente passa a ter regurgitação; - Avançado: diâmetro superior a 7cm com perda do eixo longitudinal do órgão, associado a alterações manomé- tricas importantes, como hipotonia ou atonia e ondas terciárias. O órgão passa a ter uma função de acúmulo de alimentos, não de transporte. Há melhora da disfagia e piora da regurgitação de alimentos não-digeridos, sen- do comuns os quadros respiratórios por aspiração. - Há uma outra classificação que só leva em conta parâ- metros do EED, ou seja: • Grau 1: esôfago até 4cm; • Grau 2: de 4 a 7cm; • Grau 3: de 7 a 10cm; • Grau 4: acima de 10cm ou dolicomegaesôfago. -A correlação das 2 classificações fica: • Incipiente = Grau 1; • Não-avançado = Graus 2 e 3; • Avançado = Grau 4. 10. Tratamento Visa, fundamentalmente, ao alívio da disfagia. O trata- mento clínico pré-operatório é feito com o objetivo de me- lhorar as condições gerais do paciente: dieta hiperprotéica, vitaminas, suporte enteral/parenteral. Após a avaliação clínica e nutricional, devem ser solici- tados, rotineiramente, os seguintes exames: EED, EDA com cromoscopia, manometria esofágica, eletrocardiograma, ra- diografia do tórax, ultra-sonografia de abdome e tempo de esvaziamento gástrico. O uso discutível de drogas, como os bloqueadores de canais de cálcio e o dinitrato de isossorbida, visa ao con- trole temporário dos sintomas. O tratamento definitivo depende do estado geral do paciente e da classificação do megaesôfago: - Dilatação hidrostática: megaesôfago incipiente, em pacientes de alto risco cirúrgico ou em gestantes até o nascimento. Os índices de complicações desse método são baixas (de 2 a 3%), e os resultados são bons, porém há controvérsias quanto aos resultados em longo pra- zo. O índice de recidiva da doença após dilatação é de cerca de 50%; - Cardiomiectomia e fundoplicatura (Operação de Heller/ miocardiotomia à Heller): megaesôfago não-avançado e - ~------ - ----- - - - -- MEDCEL - PRINCIPAIS TEMAS EM GASTROENTEROLOGIA - - iMede incipiente. Consiste na lise da musculatura do esfíncter inferior do esôfago, com a retirada de uma faixa muscu- lar e confecção de válvula anti-refluxo parcial anterior. É, preferencialmente, feita pela via laparoscópica. A cardiomiectomia deve ter extensão de, mais ou menos, 9cm (6cm de esôfago e 3cm de estômago); - Esofagectomia: megaesôfago avançado, de preferência pela via abdominal sem toracotomia (via transmedias- tinal). A acalásia do piloro e a litíase biliar devem ser tratadas juntamente com o megaesôfago através de piloroplastia e co- lecistectomia pela via laparoscópica. Quadro 1- Tratamento sugerido para o megaesôfago chagásico Classificação I Tratamentos do megaesôfago possíveis Incipiente - Medicamentoso: paciente oligossintomáticos? - Dilatação endoscópica: tratamento transitório, pacientes de alto risco; - Cardiomiectomia e fundoplicatura: tratamen- to definitivo, pacientes de baixo risco. Não-avançado - Cardiomiectomia e fundoplicatura. Avançado - Cardiomiectomia e fundoplicatura: pacien- tes idosos, pacientes de alto risco; - Esofagectomia: equipe treinada, pacientes em boas condições clínicas. 11. Tratamento das afecções associadas - Megaduodeno: duodenojejuno anastomose látero-Iate- ral entre a 2ª porção duodenal e a 1ª alça jejunal; - Megacólon: corrigir primeiro a afecção mais sintomáti- ca. No caso de ambas serem equivalentes, dá-se prefe- rência para o tratamento do megaesôfago; - Câncer de esôfago: deve ser tratado conforme o trata- mento do câncer de esôfago; - Hérnia hiatal: deve ser corrigida no ato operatório com hiatoplastia. 12. Causas de recidiva - Refluxo evoluindo com estenose; - Técnica inadequada, ou seja, operação de cardiomiecto- mia em megaesôfago avançado; - Cardiomiectomia incompleta: os feixes musculares não são seccionados completamente e, portanto, a acalásia persiste; - Cicatrização da miotomia: às vezes, no processo cicatri- cial, as bordas da miotomia aproximam-se novamente. Isso ocorre, principalmente, quando não se faz a fundo- plicatura ou quando há perfuração inadvertida da muco- sa esofágica no momento da miotomia.
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