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visitá-los regularmente — para depois 'se lembrar' a tempo de me afastar com tamanha violência que quase caí na rua. Ela saiu galopando pela entrada da Colet House e fechou a porta com um estrondo. Afastei-me de Francis Roles sem rancor de parte a parte, e ele gentilmente me disse que devia manter contato pessoal com ele, comunicando-lhe qualquer acontecimento interessante em minha vida. Devia escrever para sua casa, não por intermédio de sua secretária na Obra — um privilégio raro, pois os demais só podiam se comunicar com ele por meio de Helen. Na verdade, porém, nossa correspondência logo se tornou agressiva, cessando a seguir. Pak Subuh era um homem muito sensual. Percebi isto logo que assisti à sua primeira palestra. Suas mãos acariciavam constantemente o interior de suas coxas, e havia algo em sua expressão e postura que me dava certas idéias. Seu tema básico dizia que o homem precisa da ajuda do nível superior se deseja progredir e ocupar sua posição no mundo, cumprindo seu verdadeiro destino. Seu livro, Susila Budhi Dharma, escrito sob seu verdadeiro nome, Muhammad Subuh Sumohadiwidjojo, significa Caminho da submissão à vontade de Deus. Sugere que o intelecto e a imaginação formam um obstáculo ao caminho da 'submissão', e que é necessária a completa entrega do 'eu'. Boa parte do livro é dedicada a uma discussão das relações sexuais como modo de liberar e realizar a natureza divina no ser humano. Sua história pessoal, que geralmente contava em suas palestras, dizia que ele fora escolhido para 'abrir' as pessoas ao poder de Deus. Quando jovem, procurou um mestre em seu país. Em todo lugar que ia, era rejeitado com as palavras "Não sou seu mestre. Seu mestre irá até você". Um dia, em sua casa, ele experimentou uma hora de iluminação. Percebeu que seu mestre entrara nele. Agora, podia abrir o caminho para sua mulher, sua família e os outros que viessem. A 'abertura' era um processo bastante nebuloso. Inicialmente, parecia tão inócua quanto a 'escuta de Deus' ou a auto-recordação. Contudo, os efeitos eram bem diferentes. Diziam-nos de antemão que era essencial separar homens e mulheres para essa prática. Ambos não deviam ficar no mesmo cômodo, sequer no mesmo prédio ao mesmo tempo. O latihan dos homens, com Bapak, ocorreria num certo horário; o das mulheres, com Ibu, bem antes ou depois, para evitar qualquer encontro fortuito no caminho ou na escola de bale. Fui com Madame K. e Lesbia, que já estava em condições de ser uma das 'abridoras'. Contudo, foi Ibu quem me 'abriu'. Quando saímos do vestíbulo onde deixamos nossos casacos e seguimos por um corredor até o longo salão dotado de barra para as alunas de balé, um forte aroma de incenso tomou de assalto meu nariz. Presumi que deveria haver bastões queimando em algum lugar. Mas não vi nenhum. Havia umas 30 mulheres reunidas no salão vazio. As que seriam 'abertas' foram levadas a Ibu. As outras ficaram caminhando à vontade ou se sentaram no chão, esperando. Ao comando 'início', as mulheres começaram a se concentrar em seus próprios sentidos. Isso logo levou o grupo a movimentos ondulatórios ou a perambulações pelo salão, algumas com os braços erguidos ou esticados. Começou um canto em voz baixa e desordenada, formando um som curioso mas não de todo desarmônico, cujo tom foi aumentando gradualmente, sem que fosse possível identificar alguma melodia. Era algo claramente espontâneo e agradável de se ouvir. Durante uns dez minutos, o canto sem palavras continuou a subir e baixar. O movimento de algumas alunas se assemelhava ao das danças do templo de Kathakali; em outras, a danças gregas ou ao balé russo. Algumas ficaram sentadas, de pernas cruzadas, olhos fechados, apenas movendo os ombros, braços e mãos. Todas pareciam contentes, exceto uma senhora de meia-idade que começou a soluçar e depois a chorar ruidosamente. Uma das 'abridoras' foi consolá-la, acalmando-a e evitando perturbações indevidas. Enquanto isso, aguardei minha vez, até ficar diante da senhora indonésia. Ela estava trajando uma roupa oriental; era grande, de feições algo rudes, cujo interesse pelas alunas parecia um pouco superficial. Não recebi qualquer instrução, exceto a de ficar de pé à sua frente, aberta e submissa ao poder. Ela começou a respirar depressa, seus grandes seios subindo e descendo. Sem saber muito bem o que esperar, fiquei apenas pronta. Na verdade, depois, tive a impressão de que não aconteceu nada. Não senti poder ou presença alguma, nada fora do normal. Pouco depois, disseram-me que havia sido 'aberta', e sugeriram que circulasse com as outras. Os cantos e danças tinham efeito levemente hipnótico. A única instrução que Lesbia me dera de antemão foi para que eu procurasse não me empolgar. Em Coombe Springs, onde não se exercia qualquer restrição, as pessoas se atiraram pela sala, gritando e berrando, batendo com as mãos ou até com a cabeça nas paredes e no chão, na aparente tentativa de se livrarem de mil demônios. Com certeza, o 'exercício' era uma espécie de processo de liberação ou limpeza. A violência ou não da reação dependeria da natureza do indivíduo. Basil Fenwick, os Hoare e os Kadleigh achavam que o efeito 'liberador' do latihan era enormemente benéfico, produzindo um efeito de catarse quase imediato. Mas podia ser usado com muito mais proveito por aqueles que tinham experiência com a 'auto-recordação' e que já estavam adquirindo autoconhecimento, do que pelos recém-chegados às práticas esotéricas ou espirituais, e que ficavam 'doidões'. Tinham-me aconselhado a não fazer o latihan sozinha no início. Os novos iniciados deviam comparecer à reunião comunitária apenas uma ou duas vezes por semana. Este número seria aumentado, e a prática solitária seria permitida, quando a pessoa já estivesse adequadamente estabelecida na arte. Durante várias semanas, a única coisa que experimentei foi um relaxamento agradável, a gostosa sensação de ser capaz de dançar e cantar como uma criança desinibida, sem me fazer de tola. Isso, e o aroma de incenso. Descobri que não havia incenso. Apesar de sentir seu forte odor em quase todas as ocasiões, não havia uma só vareta de incenso queimando. Ao discutir o problema com os outros, fiz uma descoberta curiosa. Alguns sentiam o aroma do incenso num dia, não sentiam no outro; alguns o sentiam quando eu mesma nada detectava. Além disso, algumas pessoas sentiam outros odores. Essência de rosas era comum; também mimosa, lírio e outros aromas florais. Uma mulher descobriu que sempre sentia o aroma do perfume L'Aimant, da Coty. Estranho foi uma moça gorda e grande, que me disse que normalmente sentia o cheiro de bacon com ovos fritos! A partir disso, cheguei à conclusão experimental de que as pessoas sentiam o cheiro que queriam. Se o alimento para o corpo era mais importante do que o alimento para a mente, o coração, o espírito, era isso que o nariz parecia receber. Este curioso fenômeno me levou de volta em pensamento ao livro de Mallory, Morte D 'Arthur (Morte de Artur). As lendas arturianas associam o Cálice Sagrado a aromas e a comidas. As moças levavam o Santo Graal até o salão onde os cavaleiros se reuniam. Ele era acompanhado por 'suaves aromas'. E, em pelo menos um relato, cada cavaleiro descobriu à sua frente o prato que mais gostava. Mais tarde, quando estava com o iogue Maharishi Mahesh, aprendi muito mais a respeito das chamadas 'camadas sutis' dos sentidos. Assim como o ouvido humano só consegue detectar uma gama relativamente pequena