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LIBERDADE PROVISÓRIA (Atualizado)

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LIBERDA	DE PROVISÓRIA
Fontes: Aula de Danielle + Aury Lopes Jr. + Nestor Távora + Eugenio Pacelli
Com a reforma processual de 2011, nova redação foi dada ao art. 319, do CPP. Esse passou a previr diversas medidas cautelares alternativas à prisão, que passou não mais a ser a regra. Diante disso, hoje, a regra é a liberdade (ou deveria ser), eis que o status de inocência só pode ser ilidido com o advento da sentença condenatória transitada em julgado. Por meio desse artigo, há um amplo regime de liberdade provisória, com diferentes níveis de vinculação ao processo. No topo, temos a liberdade plena, ao passo que, gradativamente, vão aparecendo algumas imposições (medidas cautelares diversas) as quais criam restrições à liberdade do réu. Apenas quando nada disso se mostrar suficiente e adequado, cabe a prisão preventiva. É necessário se perceber que a liberdade provisória, com ou sem vinculação, é, também, uma espécie de medida cautelar, em conjunto com as prisões cautelares e com as cautelares diversas da prisão.
A liberdade provisória, desse modo, consiste na outra face da moeda da prisão, que combate a prisão legal. A liberdade provisória é uma forma de combate às prisões cautelares, sendo uma ferramenta que surge ao lado das outras medidas cautelares diversas da prisão, que podem ser cumuladas com aquela. Consiste em uma forma de evitar que o agente preso em flagrante tenha sua detenção convertida em prisão preventiva, isto é, uma contra-cautela que substitui a prisão em flagrante, desde que o investigado atenda certos requisitos, ficando ou não ele restrito ao cumprimento de certas condições (por isso a liberdade provisória possui natureza cautelar).
A liberdade de um modo geral pode ser visualizada em três situações no processo penal. A primeira ocorre quando há a prisão em flagrante ou a prisão preventiva que possui alguma ilegalidade e, por isso, há o seu relaxamento (art. 5º, LXV, CF). O relaxamento da prisão em flagrante ou prisão preventiva enseja a concessão de liberdade plena ao agente. A segunda ocorre quando a prisão preventiva ou a medida cautelar diversa da prisão não possui mais seu substrato, isto é, os fundamentos que a legitimavam. Desaparecido o fundamento, deve o juiz revogá-las e conceder a liberdade plena ao agente. A terceira decorre do requerimento da liberdade provisória, com ou sem pagamento de fiança (medida cautelar diversa). É sobre essa que esse estudo se ocupa, sendo a liberdade provisória uma forma de evitar que o agente preso em flagrante tenha sua detenção convertida em prisão preventiva. Não cabe, assim, pedir a “revogação” da prisão em flagrante, porque, nessa hipótese da liberdade provisória, há uma liberdade vinculada, condicionada a alguns pressupostos. Agora, quando há prisão em flagrante, servindo de medida preparatória para a decretação da prisão preventiva, e, posteriormente, esse fundamento (periculum libertatis) desaparece, é caso de revogação (nos dizeres de Aury Lopes Jr.). Isso porque o desaparecimento do suporte fático, da situação acautelatória que suporta a prisão preventiva (periculum libertatis), conduz à revogação da medida cautelar.
* Perceba-se que nas duas primeiras hipóteses se trata de liberdade plena, enquanto na terceira se trata de liberdade provisória.
** O “livrar-se solto” (art. 321, CPP): Anteriormente, quando o “capturado” tivesse cometido um crime que não culminasse em pena privativa de liberdade, não cabendo a prisão, nem qualquer medida que vinculasse a sua liberdade, esse réu deveria ser solto, dando-lhe liberdade plena. Hoje, esse instituto foi revogado, mas ainda persiste a liberdade plena, a qual existe nos casos de relaxamento e revogação, bem como nos casos de liberdade provisória sem fiança, e sem nenhuma outra medida condicional.
O regime jurídico da liberdade provisória
O regime jurídico da liberdade provisória varia de acordo com a espécie de liberdade provisória em questão. Isso porque 	o regime a ser aplicado varia de acordo com a situação fática. Primeiramente, há de se pensar que a previsão da liberdade provisória está no art. 310, do CPP. Nele constam os passos a serem seguidos pelo juiz ao receber o auto de prisão em flagrante, e, em seu inciso III, prevê a hipótese de concessão de liberdade provisória, com ou sem fiança. Em sucessivo, prevê, em seu parágrafo único, que “Se o juiz verificar, pelo auto de prisão em flagrante, que o agente praticou o fato nas condições constantes dos incisos I a III do caput do art. 23 do Código Penal, poderá, fundamentadamente, conceder ao acusado liberdade provisória, mediante termo de comparecimento a todos os atos processuais, sob pena de revogação”. Esse artigo 23 do Código Penal trata das hipóteses de excludente de ilicitude.
Da leitura do texto legal, então, pode-se extrair que o juiz, ao receber o auto da 	prisão em flagrante, percebendo que essa prisão está formalmente perfeita (se não o tivesse, era caso de relaxamento, por se tratar de ilegalidade), deve visualizar se o imputado cumpre determinados requisitos, para se evitar a conversão da prisão em flagrante em prisão preventiva. Isso porque, nesse artigo 310, constam os três passos a serem seguidos pelo juiz ao receber o auto de prisão em flagrante. Desse modo, como visto, ele pode relaxar o flagrante, se ilegal; verificar se estão presentes os pressupostos e fundamentos para as medidas cautelares e conceder a liberdade provisória cumulada a outra cautelar ou decretar a preventiva. Essa liberdade provisória pode ser concedida, também, sem estar cumulada a alguma cautelar, mas com vinculações, como será visto.
O juiz, então, verifica se há necessidade e fundamento para uma prisão preventiva. Em caso de não haver, possibilitada a liberdade provisória, pode concedê-la mediante fiança ou não; cumulada ou não com alguma das medidas cautelares diversas presentes no art. 319, do CPP. Pontua-se que, para a liberdade provisória ser cumulada às medidas cautelares, os pressupostos dessas devem ser observados.
Desse modo, visualizam-se três situações:
a) liberdade provisória com fiança, cujo valor será fixado nos termos do art. 325 do CPP;
b) liberdade provisória com fiança e outra(s) medida(s) cautelar(es) diversa(s) prevista(s) no art. 319 do CPP, posto que a situação exige a maior restrição e controle da liberdade do réu;
c) liberdade provisória sem fiança, porque o réu não tem condições de pagá-la (art. 350), impondo-lhe as condições dos arts. 327 e 328 e ainda, se necessário, de medida cautelar diversa (isolada ou cumulada com outra medida), prevista no art. 319 do CPP.
Diante das possibilidades fáticas supracitadas, tem-se que, configurada a possibilidade de ser concedida a liberdade provisória, esta poderá ser com fiança, sem fiança, acompanhada de medida cautelar que não a fiança (nos casos em que a fiança é vedada) e vinculada.
A liberdade vinculada se refere às hipóteses nas quais é dispensada a medida cautelar, mas à liberdade são impostas vinculações, que constituem obrigações de comparecer a todos os atos do processo ou comunicar qualquer mudança de domicílio. Essas hipóteses estão no art. 310 e no art. 350. No art. 310, tem-se a hipótese dos excludentes de ilicitude. Diz, então, que se o juiz verificar que o agente agiu sob alguma excludente de ilicitude ou culpabilidade, poderá conceder fundamentadamente a liberdade provisória, mediante o termo de comparecimento a todos os atos processuais, sob pena de revogação. O art. 350, por sua vez, dispõe sobre os casos em que couber a fiança, mas o imputado não tiver condições de pagar. Não possuindo condições econômicas, o imputado estará vinculado às obrigações dos arts. 327 e 328, como comparecer à autoridade sempre que for chamado e não mudar de residência sem prévia autorização da autoridade. Essas obrigações devem ser cumpridas por todos os presos que pagam fiança, mas em razão da hipossuficiência do preso, é dispensada a fiança e imposta apenas essas obrigações acessórias.
Nestor Távora traz uma classificação objetiva da liberdade provisória em razãoda admissibilidade legal. De acordo com esse enfoque, a liberdade provisória pode ser obrigatória, permitida, ou vedada. A primeira hipótese diz respeito às hipóteses em que, anteriormente à reforma de 2011, o infrator tinha o direito de “livrar-se solto”. Trata-se dos casos, como visto, em que a infração não estipula pena privativa de liberdade ou, quando cominada, não se excedesse a três meses, nos termos do art. 321, CPP, em sua redação anterior. Com a reforma de 2011, esse artigo passou a dispor que estando ausentes os requisitos que autorizam a decretação da preventiva, o juiz deve conceder a liberdade provisória, impondo, se for o caso, as medidas previstas no art 319, do CPP. A liberdade provisória permitida, por seu turno, é admitida quando não estiverem presentes os requisitos da decretação da preventiva e quando a lei não vedar expressamente. Terá cabimento, assim, nos termos do art. 321 e do art. 310, p. ún.
Já a liberdade provisória vedada ocorre quando couber a prisão preventiva e nas hipóteses em que a lei estabelecer expressamente a proibição. Em alguns crimes, a lei estabelece a impossibilidade de concessão de liberdade provisória, como ocorre na Lei dos Crimes Hediondos. A doutrina critica esse instituto, pois veda-se a liberdade independente do caso concreto. O STF costuma entender que a liberdade provisória é vedada nos casos em que o crime é inafiançável. Mas o próprio STF tem entendimentos divergentes, também. Por exemplo, uma turma entende que essa vedação da Constituição impediria a concessão de qualquer outra liberdade provisória. Por outro lado, outra turma entende que não caberia apenas a fiança, mas seria possível a aplicação de outra espécie de liberdade provisória.
Modalidades da liberdade provisória
A liberdade provisória pode ocorrer sob diversas modalidades: com fiança; sem fiança, mas com as vinculações dos arts. 327 e 328 (para os casos de preso pobre ou que agiram sob excludentes de ilicitude/culpabilidade); ou como cautelar diversa da prisão.
A liberdade provisória sem fiança
A partir da reforma de 2011, a ideia é de que a fiança é cabível em todos os casos, exceto os que 	há seletivamente expressa proibição para a sua concessão, como ocorre nos crimes de racismo, tortura, tráfico, terrorismo, hediondos, entre outros; ou nos casos em que o não cabimento da fiança decorre de impedimento legal para a sua concessão, seja por motivos de quebra da fiança, de prisão civil ou militar, seja quando presentes os requisitos para a preventiva (art. 324, CPP). Essa liberdade provisória sem fiança pode ser, também, sem vinculação. Isso quer dizer que a liberdade provisória deve ser concedida compulsoriamente, sem nenhuma imposição ao beneficiado. É o caso, como visto, da liberdade provisória obrigatória, nos casos em que a infração não estipula pena privativa de liberdade, em face de o delito ser de menor potencial ofensivo. Ademais, nesse caso, o juiz entende 	desnecessária ou inadequada a imposição de qualquer medida cautelar do art. 319, CPP, ou a imposição de outra obrigação. É o que decorre do art. 321, CPP. Há outras hipóteses de concessão de liberdade provisória sem fiança e sem vinculação, como a prevista no art. 301 do Código de Trânsito, nos casos de acidente de trânsito, e o da Lei de Tóxicos (Lei nº 11.343/2006), quando se trata do usuário de drogas, onde é lavrado apenas o TCO.
A liberdade provisória sem fiança pode se dar, também, com a vinculação. Trata-se da hipótese de liberdade provisória condicionada. Nela, apesar de não se exigir a fiança, o infrator se submete a determinadas exigências legais. As hipóteses de cabimento foram restringidas com o advento da reforma de 2011, eis que essa proporcionou uma ampliação do instituto da fiança, passando a ser a regra que todo crime seja afiançável. Desse modo, as hipóteses de cabimento dessa liberdade provisória sem fiança e com vinculação podem ser vistas no caso em que há o auto de flagrante, mas com inexistência de autorização da prisão preventiva.
A liberdade provisória mediante fiança
Como visto, com o advento da reforma de 2011 o contexto da liberdade provisória mediante fiança mudou. Com a ideia de que a regra geral é que todo crime é afiançável, ressalvadas as hipóteses de vedação expressa e de óbice de indeferimento por falta de requisito objetivo, a liberdade provisória mediante fiança foi uma hipótese bastante alargada. Consiste, assim, uma espécie de direito subjetivo do beneficiário, que atende aos requisitos legais e assume as respectivas obrigações, podendo permanecer em liberdade durante a persecução penal. É, assim, uma contracautela destinada a combater determinadas prisões processuais. Pode haver cumulação, inclusive, com as demais medidas cautelares diversas da prisão, estas previstas no art. 319, do CPP. Sendo acompanhada ou não de outra cautelar, virá acompanhada, em ambas as hipóteses, das vinculações dos arts. 327 e 328.
Há uma divergência doutrinária no sentido de qual seria a natureza jurídica da fiança. Alguns defendem que seria uma espécie de contracautela, eis que a fiança pode substituir primeiramente o flagrante, em face deste ser “trocado” pela liberdade provisória e ainda substituir a conversão da prisão em flagrante em prisão preventiva. No entanto, o caráter de medida cautelar autônoma é mais aceito, sobretudo por estar prevista no art. 319, além de demandar o preenchimento dos requisitos gerais da cautelar, e ter seus próprios fundamentos específicos, estes elencados no inciso VIII, do art. 319.
Busca-se, com a fiança, obter a presença do agente a todos os atos da persecução penal, evitando-se o cárcere preliminar. Em relação ao destino da fiança, quando há a condenação, esse valor da fiança serve para indenizar a vítima, pagar as custas processuais, da prestação pecuniária e de eventual multa, de acordo com o que prevê o art. 336. Além disso, o que sobrar será revertido ao Estado, para o chamado “Fundo Penitenciário”, nos casos em que o condenado não se apresentar voluntariamente para o cumprimento da pena. Do contrário, o réu receberá o valor remanescente, após a quitação de suas obrigações. Se a pretensão executória se extinguir, por sua vez, o valor da fiança seguirá o mesmo destino e, sobrando algo, é devolvido a quem prestou a fiança. Já no caso de absolvição, de extinção da punibilidade antes do transito em julgado e de pedido de arquivamento do inquérito policial, há a integral devolução. Além de servir com esses fins pecuniários, isto é, garantia pecuniária, a fiança serve, também, como inibidor de fuga, considerando o alto valor que pode atingir. Desse modo, enquanto elemento inibidor, busca a garantir a eficácia da aplicação da lei penal em caso de condenação. Guarda, por isso, uma relação de proporcionalidade em relação à gravidade do crime e também em relação às possibilidades econômicas do imputado. Ademais, uma observação deve ser feita acerca desse art. 336:
Art. 336. O dinheiro ou objetos dados como fiança servirão ao pagamento das custas, da indenização do dano, da prestação pecuniária e da multa, se o réu for condenado.
Parágrafo único. Este dispositivo terá aplicação ainda no caso da prescrição depois da sentença condenatória (art. 110 do Código Penal).
É que no caso de o réu ser condenado, mas ser extinta a punibilidade em decorrência da prescrição, a fiança ainda é cabível. O Estado perde o poder de punir, mas isso não isenta o réu das custas do processo e da responsabilidade civil decorrente do delito. Desse modo, a extinção da punibilidade não afeta a pretensão indenizatória, não sendo sequer devolvido o valor remanescente. Às vezes, no entanto, a prescrição ocorre antes mesmo da pretensão executória, quando ainda se está na fase do processo de conhecimento e a pena prescreve. Nesses casos, o juiz leva em consideração a pena máxima culminada em abstrato para o crime, já que não se tem, ainda, a pena em concreto. Nessa hipótese especifica da prescrição da pretensão punitiva antes da pretensão executória, o dinheiro voltará para o afiançado.Com a reforma já mencionada, a fiança precisa ser analisada sob duas dimensões de atuação. A primeira ocorre quando é aplicada no momento da concessão da liberdade provisória (art. 310), funcionando como condição imposta e vinculada à liberdade provisória. A segunda, por seu turno, ocorre quando é imposta como medida cautelar diversa (art. 319), de acordo com a diferenciação trazida por Aury Lopes Jr. Desse modo, quando o juiz recebe o ADPF, como visto, ele pode decretar a prisão preventiva ou conceder a liberdade provisória, com ou sem fiança. É essa a hipótese do art. 310. Já a hipótese do art. 319, VIII, reside na possibilidade de se exigir a fiança como reforço da tutela cautelar, podendo ser aplicada de forma isolada ou de forma cumulada com outra medida cautelar prevista nesse art. 319. Nesse caso, a função é assegurar o comparecimento aos atos do processo.
Ademais, é necessária a distinção da fiança concedida pelo delegado e a fiança concedida pelo juiz. Esta última, inclusive, seria a medida cautelar por excelência, por ser judicializada. Quando é concedida pelo delegado, não se pode enquadrar como medida cautelar por excelência, em razão de que o delegado não é autoridade jurisdicional. Desse modo, a fiança que é concedida pelo delegado é uma garantia real, uma vez que irá incidir sobre objetos ou dinheiro.
Modos de prestação da fiança
De acordo com o art. 330, do CPP, “a fiança, que será sempre definitiva, consistirá em depósito de dinheiro, pedras, objetos ou metais preciosos, títulos da dívida pública, federal, estadual ou municipal, ou em hipoteca inscrita em primeiro lugar”. Se for em dinheiro, o valor será entregue e recolhido na instituição financeira oficial, em conta vinculada à autoridade, com incidência de juros e correção monetária; ou entregue ao depositário público. Nos lugares em que não for possível realizar o depósito, em caso de feriados ou finais de semana, quando não há expediente bancário, os valores serão entregues ao escrivão (ou ao diretor de secretaria da vara), que terá 3 dias para depositar no banco oficial. No caso de ser dado como fiança a hipoteca inscrita em primeiro lugar (não pode haver outra hipoteca), a execução será promovida no juízo cível pelo Ministério Público (art. 348, CPP). Na hipótese das pedras, objetos ou metais preciosos, ou hipoteca, deverá haver, ainda, a avaliação do bem dado em garantia por perito nomeado pela autoridade. Já quando a hipótese é dada em moeda estrangeira, alguns defendem que deve haver a conversão pelo câmbio do dia (Távora e Nucci) e há quem defenda que deve ser tratado como metal precioso (Mirabete).
O valor da fiança e critérios para o arbitramento
A reforma de 2011 tornou mais lógica a imposição e a forma de cálculo da fiança. Agora, o valor será fixado pela autoridade que a conceder conforme dois limites estabelecidos pelo art. 325, I e II, do CPP. O primeiro limite se refere à faixa de 1 (um) a 100 (cem) salários mínimos, quando se tratar de infração cuja pena privativa de liberdade, no grau máximo, não for superior a 4 (quatro) anos. O segundo limite se refere à faixa de 10 (dez) a 200 (duzentos) salários mínimos, quando o máximo da pena privativa de liberdade cominada for superior a 4 (quatro) anos.
Além desse critério objetivo de cálculo, exige-se, ainda, um critério subjetivo, qual seja a situação financeira do afiançado. Desse modo, nem a fiança pode ser um fardo impagável, nem pode ser branda demais. Essa análise pode ser feita tanto pelo juiz como pelo delegado. Assim, esse valor encontrado de acordo com os critérios objetivos pode ser reduzido em até 2/3 ou aumentado em até 1.000 vezes, a teor do inciso III, do § 1º, do art. 325 do CPP. Além das faixas de valor, definidas pelo art. 325 do CPP, o art. 326 elege outros critérios para que a autoridade arbitre a fiança, quais sejam a natureza da infração (qualificadoras e causas de aumento e diminuição da pena), as condições pessoais de fortuna, a vida pregressa, a periculosidade, e a importância provável das custas. Esses são os critérios de fixação.
Sucede que, além desse critério geral estabelecido, há algumas situações que o não segue. É o caso do Código de Defesa do Consumidor, que estabelece que a fiança seja arbitrada pelo magistrado ou pela autoridade que preside a investigação entre 100 (cem) e 200 (duzentas), mil vezes o valor do BTN, ou qualquer outro índice que venha a substitui-lo. Ademais, em razão da situação econômica do imputado, pode ser reduzida até a metade do seu mínimo valor, ou exasperada judicialmente em até vinte vezes. 
O art. 340 prevê o “reforço da fiança”. Como o valor da fiança é fixado de início, com base no crime que a autoridade policial de logo capitulou, o Ministério Público pode não levar em consideração o tipo penal e ajuizar a ação penal lastreado em tipo diverso. Além disso, pode haver o que se chama de “mutatio libelli”, quando há a inovação na classificação do delito. Nessas hipóteses, o valor da fiança deverá ser reforçado, eis que a mudança do tipo pode implicar na alteração da faixa na qual o crime se encontra. Essa hipótese também serve quando a fiança é paga em títulos da dívida pública, os quais possuem valor oscilante. Caso o réu não reforce a fiança, esta se tornará sem efeito, sendo o réu recolhido à prisão. O pedido dessa prisão deve ser fundamentado, não sendo ela automática. 
Vedações legais à admissibilidade da fiança
No art. 5º, da CF, há a previsão de algumas infrações inafiançáveis, quais sejam os crimes de racismo, tortura, tráfico, terrorismo, crimes hediondos e na ação de grupos armados civis ou militares contra a ordem constitucional e o Estado de Direito. Essas vedações aparecem, no Código de Processo Penal, estão em seu art. 323, que soma tanto as previsões constitucionais, como as oriundas de legislação extravagante.
Já no art. 324, há as restrições infraconstitucionais à admissibilidade da fiança, por incompatibilidade lógica entre o instituto e a situação apresentada. Assim dispõe:
Art. 324. Não será, igualmente, concedida fiança:
I - aos que, no mesmo processo, tiverem quebrado fiança anteriormente concedida ou infringido, sem motivo justo, qualquer das obrigações a que se referem os arts. 327 e 328 deste Código;
II - em caso de prisão civil ou militar;
III - (revogado);
IV - quando presentes os motivos que autorizam a decretação da prisão preventiva (art. 312).
A primeira hipótese é o da quebra de fiança, pois quem quebra com a fiança rompe o vínculo de confiança com a autoridade, e naquele mesmo processo, não será admitido a novamente gozar do instituto. De todo o modo, pode o agente pleitear a liberdade provisória sem fiança, ainda assim. Não obsta, também, pleitear a fiança em outro processo. A segunda hipótese se refere às prisões que tem caráter nitidamente obrigacional ou objetivam o reestabelecimento imediato da ordem. Essa é a razão da vedação. Nada impede, no entanto, que tais prisões sejam questionadas e combatidas quanto à sua legalidade, por meio do habeas corpus. Por fim, se as hipóteses de decretação da preventiva estão presentes, a fiança está obstaculizada. Além desses dois artigos, há uma série de vedações à fiança, em face de algumas infrações, como no Estatuto do Desarmamento, no crime organizado, nos crimes contra o sistema financeiro, e na lavagem de dinheiro.
A respeito dessas situações de inafiançabilidade, Aury Lopes Jr. diz que, a despeito de haver a previsão constitucional para situações de inafiançabilidade, nelas não foi contemplada a ideia da prisão cautelar obrigatória. Desse modo, ainda que alguém seja preso em fragrante por crime tido como inafiançável, cabe a liberdade provisória. Se presentes os requisitos da preventiva, esta deve ser decretada. Mas ausentes os requisitos, deve conceder a liberdade provisória sem fiança e, considerando a gravidade do fato, determinar a aplicação de uma ou mais das medidas cautelares diversas. Nessa ideia, percebe-se que a liberdade provisória e a fiança são institutos distintos, inclusive porque há a possibilidadede se aplicar a fiança autônoma. Portanto, quando se veda a fiança, não se proíbe, necessariamente, a concessão da liberdade provisória. Desse entendimento, comunga Eugenio Pacelli.
Outra situação trazida pelo o autor se refere às vedações à concessão da liberdade provisória trazidas pelas legislações supramencionadas. Ele pontua a necessidade de se ter em mente que tendo sido preso o agente em flagrante delito, pode ser concedida a liberdade provisória nos crimes hediondos, tortura, tráfico ilícito de substâncias entorpecentes e terrorismo, do mesmo modo que pode ser decretada a prisão preventiva. Varia de acordo com a existência ou não dos requisitos para a preventiva.
Na Lei de Tóxicos, por sua vez, o STF entendeu inconstitucional a vedação existente à liberdade provisória, contida no art. 44. Isso porque a Corte entendeu que o legislador não pode restringir o poder de o juiz analisar a possibilidade de conceder ou não a liberdade provisória. Com relação ao Estatuto do Desarmamento, Lei n. 10.826, o art. 21 foi declarado inconstitucional pela ADIn 3.112-1, em 02/05/2007. Do mesmo modo, a proibição de concessão de fiança e liberdade provisória é flagrantemente inconstitucional, e o mesmo raciocínio deve ser aplicado a leis similares. Já no crime de lavagem de dinheiro, também há a vedação à liberdade provisória, esta contida em seu art. 3º, Lei nº 9.613/98. Essa restrição legislativa, sob o mesmo argumento acima, também seria inconstitucional.
Quem pode conceder?
A fiança pode ser concedida tanto pela autoridade judicial, como pela autoridade policial. Além disso, pode ser interposta em qualquer fase da investigação ou do processo (até o trânsito em julgado da sentença). A fiança interposta pela polícia, no entanto, é mais restrita, e encontra a sua previsão no art. 322, do CPP, sendo possível nos crimes com pena máxima cominada em abstrato de até 4 anos, que são justamente os casos em que não se cabe a prisão preventiva. Nesse caso, incidem as majorantes e minorantes. Antes da reforma de 2008, o parâmetro não era a pena máxima cominada em abstrato, mas, sim, a fiança pela autoridade policial era cabível a prisão simples ou a detenção. Agora, então, o critério é apenas quantitativo, e não qualitativo, porque, na prática, a gravidade do crime não está ligada necessariamente à modalidade, quer seja de reclusão ou detenção. Em caso de recusa ou demora da autoridade, deve se peticionar ao juiz competente a requerendo, conforme prevê o art. 325.
Se a situação é de concurso de crimes, ou de crime tentados, ou em que incidem um caso de aumento de pena, como se calcula esse limite? No caso do concurso, somam-se as penas máximas desses limites, mesmo que eles isoladamente permitissem que a autoridade policial concedesse a fiança. No caso da tentativa, calcula-se a pena máxima do crime com a diminuição mínima possível, por ser tentativa, que no caso é de 1/3, já que o Código Penal prevê uma diminuição de 1/3 a 2/3.
Há algumas situações excepcionais, no entanto, como no Código de Defesa do Consumidor, por exemplo, há crimes de pequena lesividade, mas que, por outro lado, são punidos com penas, em geral, de 5 anos. Por isso, jurisprudencialmente e doutrinariamente, defende-se que a autoridade policial possa arbitrar a fiança nesses casos, do mesmo modo que se excepciona o CDC em relação ao valor da fiança.
Outro ponto é que também há quem defenda que os delegados possam dispensar a fiança quando o crime seja de até 4 anos, e seja caso de dispensa, isto é, pobreza. Não teria sentido que se tivesse que encaminhar para a autoridade judicial, já que uma pessoa ficaria presa podendo estar solta. É uma posição atualmente minoritária, mas que vem ganhando força. Hoje, o delegado não pode dispensar o imputado com outra cautelar, apenas a liberdade provisória mediante fiança. Defende-se, assim, que o legislador adote o posicionamento da possibilidade de que essa autoridade policial conceda outras medidas cautelares, o que hoje não é permitido. 
Formas de extinção da fiança
A quebra de fiança
O “quebramento” da fiança ocorre quando o afiançado é quem dá causa à quebra, caso descumpra qualquer das vinculações do art. 327 e 328, bem como qualquer das medidas cautelares impostas cumulativamente com a fiança, ou quando pratica nova infração dolosa. De um modo geral, a quebra pode ser entendida como efeito do descumprimento injustificado das obrigações do afiançado (se for justificado, não enseja essas consequências). Por ter rompido esse laço de confiança, há a sanção imposta pelo Judiciário, que pode determinar a quebra de ofício ou por provocação (art. 343, do CPP). Como consequência, esse artigo traz:
- A perda de metade do valor caucionado, que será recolhido ao fundo penitenciário, depois de deduzidas as custas e demais encargos a que o acusado estiver obrigado. A outra parte será devolvida. Mesmo que ao final o réu seja absolvido, a quebra não é revertida. Assim, fica apenas com 50% do que prestou a título de fiança;
- A imposição de outras medidas cautelares pelo juiz ou, se for o caso, a decretação da prisão preventiva, com recolhimento ao cárcere, efetivando-se a prisão que foi evitada pela prestação de fiança, ou restabelecendo-se aquela previamente existente. Percebe-se que a quebra da fiança não implica no recolhimento imediato ao cárcere. Naturalmente, na fase investigativa, a decretação da preventiva como consequência da quebra dependerá de provocação judicial (art. 311, CPP). Enquanto o réu não for preso, o processo segue à sua revelia;
- A impossibilidade, naquele mesmo processo, de nova prestação de fiança (art. 324, I, CPP).
A perda da fiança
Quando há o transito em julgado da sentença condenatória que imprima ao réu pena restritiva de liberdade, ele deve se recolher ao cárcere para iniciar o cumprimento dessa pena, independente do regime ser fechado, aberto ou semiaberto. Se não o fizer, estará frustrando a efetivação da punição, de modo que a fiança será julgada perdida.
A cassação da fiança
A regra é de que a fiança seja cassada quando é concedida equivocadamente. Seria, assim, um instrumento de retificação de um erro, em razão da admissão da fiança em uma situação na qual não comportava. Essa cassação só pode ser realizada pelo Judiciário, e pode ser feita tanto de ofício como por provocação. O erro também pode decorrer de inovação na tipificação do delito, como ocorre na “mutatio libelli”. Por exemplo, inicialmente, o preso foi afiançado e respondeu em liberdade, mas posteriormente, ao se realizar a emenda da inicial, transforma-se o crime em homicídio complexo, que, por ser hediondo, é inafiançável. Deve, desse modo, ser cassada a fiança e o valor devolvido ao agente, uma vez que o erro ocorreu por parte da autoridade.
Recursos
Da decisão que concedeu a liberdade provisória mediante fiança, comporta recurso em sentido estrito pelo Ministério Público.
Da decisão que negou o pedido de liberdade provisória, caberá apenas o Habeas Corpus, não comportando o recurso em sentido estrito. Por outro lado, se a decisão negar especificamente a fiança, caberá o recurso em sentido estrito, nos termos do art. 581, I.
* Nesse sentido, cabe a distinção trazida por Aury Lopes Jr. Quando o juiz nega o pedido de liberdade provisória da defesa, homologa a prisão em flagrante, e decreta a prisão preventiva atendendo ao pedido do Ministério Público, o habeas corpus impetrado será para obter a concessão da liberdade provisória e não para a revogação da prisão preventiva. Por outro lado, quando há a prisão em flagrante, servindo de medida preparatória para a decretação da prisão preventiva, e, posteriormente, esse fundamento (periculum libertatis) desaparece, é caso de revogação dessa prisão preventiva. Da mesma forma, quando não existe prisão em flagrante, mas com base na investigação preliminar e no pedido do Ministério Público, o juiz decreta a prisão preventiva, o habeas corpus interposto será para a revogação da prisão e reestabelecimento da liberdade plena.
A decisão pela quebra da fiança,sendo interlocutória, comporta recurso em sentido estrito (art. 581, VII, CPP), que terá efeito suspensivo apenas quanto ao perdimento da metade do valor prestado em garantia (art. 584, § 3o, CPP). Esse recurso pode ser interposto até mesmo pelo terceiro que prestou fiança em favor de outrem.
A decisão que decreta a perda privativa, pelo juiz, campana recurso em sentido estrito (art. 581, VII, CPP). Da mesma forma, tem efeito suspensivo quanto à destinação do valor remanescente (art. 584, caput. CPP).
A decisão de cassação da fiança, tendo natureza interlocutória, comporta recurso em sentido estrito (art. 581, V, CPP), sem efeito suspensivo. O recolhimento ao cárcere não é mais imediato, dependendo de decisão fundamentada do juiz que o determine, caso não seja adequada medida cautelar diversa da prisão.

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