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Política Medieval

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José Luiz Furtado
Filosofia Política Medieval
§ 01 A Doutrina Cristã e a filosofia ............................................................................................................................................ 2 
Cristianismo e Filosofia pagã .................................................................................................................................................. 2 
1.2. Estatuto político do cristianismo ..................................................................................................................................... 5 
03 § Santo Agostinho ................................................................................................................................................................. 7 
§ 03 PASSAGEM DA IDADE MÉDIA PARA A MODERNIDADE ..................................................................................... 10 
3.1. A produção da verdade ................................................................................................................................................... 10 
3.2. Os Progressos da razão ................................................................................................................................................... 11 
3.3. A racionalização da existência ....................................................................................................................................... 12 
3.4. A nova ordem cósmica ................................................................................................................................................... 13 
§ 01 A Doutrina Cristã e a filosofia
Cristianismo e Filosofia pagã
A medida que o império romano decaía no ocidente, por volta de 3911, a igreja assumia muitas das 
funções sociais e políticas do Estado, ajudando, por esta via, a manter a ordem no meio do caos que se 
generalizava.2 Mas além desta função social as idéias e a prática do cristianismo propiciaram uma base 
nova em termos da concepção medieval da própria humanidade. A prática: "a igreja oferecia uma morada 
comum, na verdade um abrigo universal: o mesmo credo, os mesmos ofícios, as mesmas missas, 
realizadas com os mesmos gestos, na mesma ordem, para o mesmo fim, de um a outro extremo da 
Europa"3. Quanto às idéias centrais do cristianismo - a de lei natural revelada, da necessidade de justiça e 
obediência ao Estado e, por fim, de igualdade universal dos homens - se bem que não sejam 
absolutamente originais, estando de acordo, por exemplo, com as concepções do estoicismo grego e da 
filosofia romana, notadamente Cícero e Sêneca, elas conhecerão, na filosofia cristã, uma nova síntese, 
como veremos.
A epístola de São Paulo aos Coríntios afirma que
“tal como o corpo é um só mesmo tendo muitos membros, e tal como todos os membros do corpo 
formam um só corpo, apesar do número, assim também acontece em Cristo. Nós batizamos a todas as 
pessoas, gregos, judeus, escravos, homens livres, a fim de que formem um só corpo num só espírito. Se o 
pé dissesse, “eu não sou a mão logo não sou corpo” ele seria menos corpo por causa disso? .. Vós sois o 
corpo de Cristo, e vós sois seus membros, cada um por sua parte".4 
Mesmo a campanha lançada pelos apóstolos contra o casamento refletia já, no tempo de Cristo, a 
"tentativa de substituir o grupo de parentesco biológico ou mesmo social pela idéia de família espiritual"5 
selando a aliança entre Deus e o povo: conjunto dos fiéis irmanados pelo mesmo credo. Á mera 
semelhança de espécie acrescentava-se a semelhança espiritual, homonoia ou concórdia entre os homens, 
que caberia à religião despertar por sob a diversidade de costumes, estados e povos.
1 DUBY, G. Idade Média. Idade dos homens. São Paulo: Companhia das Letras, 1989.
2 BURNS, op. Cit. p. 261.
3 MUNFORD, G. A Cidade na História, p. 346.
4 São Paulo, Primeira epístola aos coríntios, VII, 12. Ver também, sobre esse novo humanismo, MATTÉI, J.-F. A Barbárie 
interior. São Paulo: UNESP, 2000, p. 87. “Após o advento do cristianismo, o bárbaro não será mais o outro, no exterior dos 
limites imperiais, mas o civilizado mesmo, no interior do limen da consciência”.
5 BLOCH, R. H. Misoginia Medieval. Rio: Editora 34, 1995, p. 107.
Por esta via o cristianismo apresenta-se como a religião da universalidade, desconsiderando as 
diferenças sociais, de nacionalidade ou pessoais em termos da representação da essência dos indivíduos 
vistos como igualmente pertencentes ao povo de Deus e, assim, igualmente passíveis de receberem a 
salvação das suas almas. Reside aí uma das razões da atração exercida por ele sobre os pobres e 
oprimidos.6
Esta doutrina está plenamente de acordo com o cosmopolitismo de origem estóica segundo o qual os 
homens são cidadãos, não de um país, mas de um mesmo mundo, estando, por isso, submetidos ao 
domínio de uma mesma lei natural, o que se manifesta nas inclinações comuns: busca de tudo o que pode 
contribuir para a conservação e o bem estar de si mesmo. Segundo Plutarco, Zenão de Cicio afirmou, na 
sua “República” que “os homens não devem separar-se em cidades e povos que tenham leis particulares, 
porque todos os homens são concidadãos, já que há para eles um só caminho e uma só ordem de coisas 
(cosmos), como para um rebanho unido sobre uma lei comum”. 7
Deste modo o estoicismo afirma a existência de um vincula natural e universal entre os homens que nos 
futuros estóicos assumirá a forma de uma “charitas geris humani”, muito próxima da idéia cristã de 
“comunidade dos homens irmanados em Cristo”.8
A Epístola de São Paulo aos romanos afirma que “os pagãos (no caso os judeus, JLF) que não têm a lei 
(a legislação dada por Moisés ao povo hebreu, JLF) fazendo naturalmente as coisas que são da lei, 
embora não tenham a lei, a si mesmos servem de lei; eles mostram que objeto da lei está gravado nos seus 
corações, dando-lhe testemunho a sua consciência, bem como os seus raciocínios, com os quais se 
acusam ou se escusam mutuamente”.9
Afirmando a existência de princípios éticos imanentes por si mesmos à razão humana, São Paulo nada 
mais faz do que retomar o princípio estóico segundo o qual todos os homens se encontram vinculados por 
leis naturais, não convencionais, cuja violação, mesmo quando permitida pelas leis positivas, constituem 
um mal, como é o caso da escravidão. Esta oposição constante a autoridade da lei revelada por Deus, de 
que a Igreja é guardiã, e as instituições humanas, abre um certo espaço para a crítica das segundas. 
Mas a afirmaçãodo caráter divino do dever de obediência civil não é menos enfática no interior das 
fontes da doutrina cristã. “Por amor ao senhor sede submissos, pois, a toda autoridade humana, quer ao 
rei quer como ao soberano, quer aos governadores como enviados por eles ...”10, requer Pedro dos 
cristãos.
No mesmo sentido preconiza Paulo que “toda a alma esteja sujeita às potestades superiores; porque não 
há potestade que não venha de Deus ... porque os magistrados não são terror para as boas obras, mas para 
as más”.11 Deste modo não só o dever de obediência é exigido pela lei de Deus como também a doutrina a 
afirma a convergência entre o princípio da autoridade civil e o bem.
Vemos pois que a ideologia cristã tanto serve para justificar a obediência ao poder quanto pode levar à 
ação contestatória quando a constituição ou o exercício do governo são julgados inadequados aos 
ensinamentos de Deus. "Do ponto de vista civil, o indivíduo submete-se necessariamente à autoridade 
social que depende de Deus. Somente, em todo caso, o voltar-se para o alto, para a salvação das almas, 
deixa uma certa liberdade, exigida pelo jogo da conversão, ao exercício individual do pensamento e da 
existência"12. Tal é, por exemplo o caso da defesa do regicídio que em alguns pensadores medievais, 
6 Cf. BURNS, E. M. História da civilização ocidental. Porto Alegre: Globo,1956, p. 257. 
7 La fortuna de Alejandro, cap. VI, citado por BRÉHIER, E. Historia de la filosofia. Buenos Aires: Sudamerica, 1944, p. 
331. Cf. VAZ, H. C. L. Escritos de Filosofia II, ética e cultura, p. 159. Por esta via o cristianismo promoverá o 
aprofundamento da universalidade subjetiva ou da consciência moral do indivíduo - que o constitui como sujeito 
propriamente dito - ou instância interior do dever-ser, em face da universalidade objetiva da lei.
8 Cf. MONDOLFO, R. O Pensamento Antigo. Rio: Mestre Jou, 1976, II, p. 277.
9 ROMANOS, I, 2, 14.
10 Pedro 2, 13
11 Romanos, 13, 1
12 RUBY, C. Introdução à filosofia política. São Paulo: Unesp, 1998, p. 61.
dependendo do comportamento do rei, assume inclusive a forma de um dever.13 De fato, o homem 
religioso vive um presente perpetuamente trabalhado pela preocupação e pela intenção do futuro, um 
presente não subsistente e não justificável por si mesmo.14
Se o cristianismo, em relação aos três pontos analisados atrás, a saber, a igualdade universal dos homens, 
o dever de obediência simultaneamente referido à lei divina e ao Estado e a crença na existência de leis 
naturais, não apresenta nenhuma verdadeira novidade, sendo que tais conceitos já apareciam no 
cosmopolitismo do pensamento estóico, qual seria então o verdadeiro aporte dessa nova doutrina para a 
história da filosofia?
A primeira resposta a esta questão afirma que a doutrina cristã promoveu uma efetiva revolução na 
concepção de universo herdada da tradição grega. Esta fornece, de fato, uma representação 
essencialmente objetiva do cosmos em cuja contemplação o sujeito se anula. Ao contrário, o cristianismo 
afirma a autonomia da subjetividade cuja atividade não se limita a pensar o universo, tendo vida 
própria – consciência, sentimentos, liberdade, coração - intraduzíveis em termos cosmológicos. “Somente 
em uma civilização cristã pode desenvolver-se o idealismo que faz da natureza íntima do sujeito 
(subjetividade transcendental) o princípio de desenvolvimento de toda a realidade” afirma Brehiér.15
Por outro lado, tendo em vista a concepção grega do tempo a partir da idéia de circularidade, de 
imutabilidade das leis naturais que regem o mundo, o cristianismo introduz a idéia de um Deus que, não 
menos que a physis grega, impera sobre o mundo e os homens, mas através de decisões circunstanciadas 
e imperscrutáveis às quais não faltam, freqüentemente, piedade, ira ou compaixão, como na abertura do 
mar morto aos abreus, ou na destruição de Sodoma e Gomorra. O destino não guia o homem de fora, 
imposto pela natureza, mas se faz na medida da sua obediência ou desobediência às leis divinas e da 
benevolência de Deus. A história se apresenta então como esse drama dos homens em busca da salvação 
dependente das formas, historicamente variáveis e imprevisíveis, de relacionarem-se com Deus.
A segunda tomada de posição em relação ao caráter inovador do cristianismo defende a absoluta 
separação entre esta doutrina e o desenvolvimento do pensamento filosófico, seja para salvaguardar a 
pureza do cristianismo, como é o caso dos historiadores da filosofia de influência protestante, seja para 
resguardar a autonomia do desenvolvimento da razão, para o qual jamais o cristianismo contribuiu 
efetivamente – tal é interpretação inspirada pelo iluminismo.
Segundo Brehéier, nenhuma dessas teses acerca das relações entre o cristianismo e a história da filosofia 
é inteiramente correta. “O que separa cristãos e pagãos não é, de modo nenhum, uma questão de método 
intelectual, mas apenas a submissão aos cultos legais e, em particular, o culto ao imperador”.16 Se há 
verdadeiramente um “ um fato revolucionário” ocorrido na história da Europa Ocidental, tanto no que diz 
respeito à política quanto à filosofia política, relacionado com a ascensão da Igreja, isto é, com a 
transformação da civilização ocidental, a partir de Constantino, em civilização cristã, é a afirmação da 
existência, para além de princípios éticos distintos e mesmo superiores às leis e costumes positivos, de 
uma verdadeira instituição: a Igreja. Ela está credenciada a dirigir os interesses espirituais da 
humanidade independentemente do Estado. 17 Mas esta inovação histórica não é da ordem do 
13 O fato das religiões se apresentarem como ideologias, de uma ou de outra forma, não elimina do seu interior uma certa 
atitude crítica alimentada pela busca de uma sempre maior “pureza religiosa”. “As crenças e cultos são atravessados por 
uma relação crítica si mesmos, pela diferença entre a fé e a credulidade, entre a verdadeira religião e a idolatria.” 
ROBINET, op. cit., p. 52.
14 Cf. ROBINET, J. F. O Tempo do pensamento. São Paulo: Paulus, 2003.
15 Brehéier, 462.
16 Brehéier, p. 463.
17 SABINE, G. História das teorias políticas. Fundo de Cultura: Rio de Janeiro, 1964, p. 186.
pensamento ou da filosofia: é prática e, porque não dizer, pelo menos em suas implicações sociais, 
política.
1.2. Estatuto político do cristianismo
O Cristianismo quis ser, e foi efetivamente, tanto a Religião do homem culto, quanto a Religião do 
Estado civilizado, isto é, do Império Romano. Nesse sentido, o saber helênico foi o contraponto e o 
móvel da realização do primeiro propósito, já que a cultura grego/latina era, na época, o cabedal do 
homem erudito, e o Império Romano o palco do segundo. Através das filosofias grega e romana, o 
cristianismo logrou consolidar-se como doutrina intelectual; seguindo e servindo ao Império, impôs-se 
como Religião oficial.18 Como tal adequou-se ideologicamente aos propósitos imperialistas de Roma, 
permitindo justificar a unificação de vários povos distintos sob um mesmo poder ao remeter as diferenças 
sociais para a igualdade natural de todos homens perante Deus. 
Mas, além da afirmação da igualdade universal e natural dos homens perante Deus, o triunfo do 
cristianismo como religião oficial deveu-se, principalmente, à proclamação da supremacia do reino de 
Deus, ao qual o cristão pertence pelo batismo e pela fé, em relação ao Estado, qualquer que seja sua 
forma ou origem. Como Hegel afirmará mais tarde, a propósito, incentivando, por esta via, o desinteresse 
pela vida pública, o cristianismo justifica qualquer forma de Estado. De fato, a concepção hegeliana da 
doutrina cristã, como escreveu Bourgeois, apóia-se sobrea denúncia do seu caráter privativo ou apolítico. 
O cristianismo seria, segundo o autor, uma religião privada: “para se impor, deve negar o caráter 
privado de seu próprio conteúdo atribuindo-se a forma de uma religião oficial, pública: ele é a 
publicidade de uma religião privada. Assim acolhe dentro de si mesmo a relação dominação-servidão 
constitutiva do Estado não adequado à expressão da essência humana (literalmente: “no qual o homem 
não está em si mesmo”) e, para mantê-lo em seu seio, não hesita em favorecer diretamente sua 
manutenção na esfera política, pois, assim como é o homem na vida política, assim ele é na vida 
religiosa”.19 Portanto o cristianismo é a ideologia da servidão voluntária, a doutrina da degradação do 
império romano - como já fora do povo judeu - exprimindo e ao mesmo tempo justificando essa 
degradação refletida na impotência do homem diante do seu destino originário de “edificador de 
cidades”; compensando-a, por fim, no ideal de uma felicidade futura oferecida aos homens por Deus.20
Já esboçada a partir da obra de Sêneca, a doutrina da superioridade das virtudes “subjetivas”, tais como as 
da misericórdia, bondade, caridade, benevolência, tolerância e amor, em relação às virtudes cívicas e 
políticas, isto é, públicas; desaguava na crença, genuinamente cristã, de que a atitude contemplativa em 
relação à vida deveria substituir a anterior, de origem grega, segundo a qual a mais alta virtude consistia 
em participar da vida política do Estado.21
18 SPINELLI, M. HELENIZAÇÃO E RECRIAÇÃO DE SENTIDOS. IN: DISSERTATIO, N. 11, UFPEL, 
PELOTAS, 1998. O cristianismo foi, sobretudo uma religião teológica, como assinala Robinet, e, por isso, 
“intelectualista”. “Nem todas as religiões elaboraram uma teologia. Algumas foram hostis a toda tentativa de 
justificação racional. Foi sobretudo o cristianismo que desenvolveu um discurso teológico, apoiando-se nas 
categorias ontológicas elaboradas pelos filósofos gregos”. ROBINET, op. cit., p. 69.
19 BOURGEOIS, B. O Pensamento político de Hegel. Santa Maria: UNISINOS, 2002, p. 36.
20 Idem, p. 46.
21 Ver SABINE, op. cit., p. 184. Ainda sobre as tendências anti-políticas dos primeiros cristãos, desesperançados do mundo 
terreno, ver RUBY, C. Introdução à Filosofia política. São Paulo: UNESPE, 1998, cap. II. Na verdade o desinteresse pelas 
coisas mundanas e pelas instituições da vida finita está presente no fundo de todo sacrifício religioso. Através do sacrifício e 
do ascetismo o homem religioso pretende testemunhar a transcendência do ser e da vida verdadeiras destruindo ou 
Mas se todos os homens se irmanam no Pai absoluto, a humanidade constitui, perante Deus, uma grande 
família. Como em toda família, há hierarquia entre as partes e membros. A doutrina não pode evitar, por 
isso, uma certa reflexão sobre o exercício do poder de alcance político, propriamente falando, malgrado 
uma certa tendência à despolitização. De fato, parte do povo é composta pelos fiéis clérigos, outra, pelos 
laicos, formando os primeiros a parte direita do “corpo” de Cristo que reina sobre a segunda. Os clérigos 
cuidam dos assuntos espirituais (poder apostólico), os leigos tratam das coisas terrestres e necessárias à 
vida social (poder imperial).22 Ambos foram instituídos por Deus, mas o papa rege em toda parte os 
primeiros, e o rei aos leigos do seu reino particular. Desde então uma questão surge: quem deve dirigir o 
povo de Deus? A igreja, ou o rei? O cristão deve dar a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus. 
Mas o que é de um e de outro? Em outros termos, quais os limites do exercício das duas formas 
medievais de poder?
O Direito canônico visa justamente instituir no seio da comunidade formada pelos fiéis uma ordem que 
traduza a lei divina, servindo de modelo para a organização ideal do Estado e da sociedade. Deste ponto 
de vista o bom governo só pode existir sob a tutela de Igreja, representante legítima de Deus na terra, 
fonte absoluta de toda autoridade.
Por isso o problema político não fica restrito ao das formas de aliança entre o povo e os príncipes, porque 
o primeiro, uma vez compreendido como conjunto dos indivíduos irmanados pelo mesmo credo, fiéis da 
mesma igreja, torna-se índice da possibilidade da redenção do gênero humano como um todo em sua 
unidade perante Deus, e não perante o rei, sob o julgo do qual se constitui como uma particularidade 
determinada, cultural e politicamente. De fato, as prerrogativas do povo hebreu, escolhido por Deus, 
podem ser estendidas pela igreja, através do batismo, a toda humanidade, mas nenhum Estado pode 
pretender estender sua constituição, costumes e leis a todos os homens: somente aos seus cidadãos.23 Por 
esse caminho a vida de um povo se explica por uma aliança com Deus não menos importante do que a 
mesma aliança com o rei enquanto seu representante político. A legitimidade da aliança entre o rei e o 
povo passa a depender do acordo entre a ordem da salvação eterna, que se inscreve no tempo total da 
história permeada pela planificação da inteligência divina, e as exigências do exercício do poder político 
em um contexto particular, surgindo daí a teoria dos dois corpos do rei, a saber, místico e carnal, 
universal e particular, representante da vontade de Deus – eventualmente do papa – e do espírito de um 
povo determinado.24 
De acordo com uma teoria muito difundida durante toda a Idade Média, o reinado político implica a 
existência de dois pactos. No primeiro, entre Deus e o rei, institui-se a obediência religiosa do 
governante; no segundo, entre o rei e o povo, instaura-se a obrigação de governar justamente dando a 
cada um o que lhe é de direito, conforme as leis. “Os príncipes são ungidos por Deus, mas estabelecidos 
pelo povo”.25Assim se expressa a respeito, com clareza, um dos mais famosos juristas medievais: “se o 
monarca não deve se sujeitar a nenhum outro homem, deve subordinar-se a Deus e à lei, visto que a lei o 
manifestando seu desprezo pelo mundo. Outra caracterísitcza importante da Ética cristão consiste na transformação em 
pecado de costumes, sentimentos e opiniões pessoais, às quais as religiões pagãs ofereciam uma larga margem de tolerância. 
Entre os pagãos era impensável que um cidadão fosse condenado por suas “atitudes íntimas”.
22 HUGES DE SAINT-VICTOR (1096-1141) De Sacramentis christiane fidei, liv. II, parte II; trad. Marcel PACAUT, p. 
249.
23 “Somente o Pontífice romano pode reinar universalmente”. Les Dictatus Papae de Grégoire VII (1075); Arquillière, Saint 
Grégoire VII, Paris, 1934, p. 131. In: IMBERT, op. cit., p. 83.
24 LEFORT, C. Permanence du théologique-politique? In: Essais sur la politique. Paris: Seuil, 1986, pp. 251-300. Ver 
também o comentário de RICHIR, M. Phénomenologie et politique, in: Les Cahiers de philosophia, Hiver, 1994/1995, n. 18. 
Pp. 9-41.
25 Iunius BRUTUS, Vindiciae contra tyrannos (1574-1576), cit. In IMBERT (et alli), p. 176.
faz monarca. Por conseguinte, que ele dê à lei o que a lei lhe dá, isto é, domínio e poder, pois não há 
soberano onde governa a vontade e não a lei”.26
Assim a filosofia política medieval promoverá a transformação dos poderes em conflito em momentos 
teóricos de um sistema de pensamento. A divisão dos poderes transformar-se-á na relação de 
desigualdade entre instâncias hierárquicas e conflitantes, não entre dimensões apenas distintas 
entre si, da mesma forma de poder. Até o século XII o pensamento político medieval lançou mão de 
recursos parafilosóficos, (1) de origem alegórica e naturais (“sol e lua”, “duas espadas”), (2) 
antropológicos (corpo e alma); (3) organológicos tal como o corpo político/humano do rei cuja alma é o 
sacerdócio.27 Por último encontraremos na obra de Agostinhoa idéia de uma relação funcional, a potestas 
espiritualis conduzindo o homem ao seu fim, a salvação eterna, Poir esta via caberá à potestas temporalis 
exercer a sua função política como auxiliar material, ainda que indispensável, do poder espiritual. “O 
poder temporal cumpre por meio da força o que o poder espiritual não pode fazer por meio da palavra.”28 
A partir da teoria funcional, elaborada em termos teológicos aristotélicos, notamos em Agostinho a 
presença dos diferentes modelos causais na leitura da relação conflitante dos dois poderes que se liberta 
assim das alegorias, metáforas ou hermenêuticas bíblicas.
03 § Santo Agostinho 
Ainda que a teoria dos dois gláudios seja central na filosofia política medieval, ela não é originária, 
resultando da aplicação dos conceitos filosóficos e teológicos na análise dos conflitos fáticos entre igreja 
e Estado. Esta análise levou a conceber os dois poderes históricos como “duas figuras teóricas em 
relação”, ambas inseridas no interior de um sistema de pensamento onde as relações conflituosas entre os 
dois poderes recebem uma solução filosófica.29 Portanto a teoria dos dois gláudios encontra-se calcada na 
impossibilidade da igreja ocidental substituir o Estado ou de conjuminar em uma só pessoa, o sacerdote e 
o rei como nos Estado pagãos anteriores.
Tudo isto encontra-se implicado nas propostas de renovação do império depois da queda de Roma. A 
primeira prposta, Bizantina, considera Constantinopla como nova e segunda Roma, por ser o ponto 
central do império e da Igreja e, além disso, uma capital sem tradição pagã e sem as manchas do sangue 
cristão. A proposta bizantina pautava-se por uma teologia política centrada na figura do imperador, ao 
mesmo tempo papa e governante do Estado. A segundo proposta de solução veio do papado romano. 
“Frente ao cesaropapismo bizantino, que concebe a igreja como uma sorte de face interna da vida política 
do Estado, o papado romano propôs a contrafigura do unitarismo bizantino: a teocracia. Para esta a igreja 
inclui dentro de si o poder político e lhe outorga sua origem e legitimidade”.30 “Se para os bizantinos o 
imperador era a máxima autoridade da igreja porque era imperador, para leão I o papa era senhor 
temporal porque era o primeiro sacerdote”,31 a superioridade dos fins determinando a submissão do poder 
político ao sacerdotal.
A Terceira proposta virá da filosofia de Santo Agostinho.
26 CARLYLE, R. W. A History of Medieval Political Theory in the West, 6 vols. London, 1903-1936. Cit. In SABINE, op. 
cit. p. 223.
27 BERTELLONI, p. 23.
28 Isidoro de Sevilha, séc, VII, cit. In: BERTOLLONI, p. 24..
29 Idem, p. 16.
30 BERTOLLINE, op. cit., p. 20.
31 Idem, p. 21
Agostinho escreve sua obra de maior teor político, A Cidade de Deus, imediatamente após o saque de 
Roma, cidade considerada eterna, perpretado pelo bárbaro ALARICO, chefe dos visigodos, em 410. O 
objetivo imediato é apologético: defender o cristianismo da acusação de ter sido o responsável pelo 
enfraquecimento de Roma e sua conseqüente derrocada. Segundo uma opinião comum na época a 
derrocada do império deveu-se ao abandono da religião romana, por causa da adoção do cristianismo 
como doutrina oficial, e a conseqüente separação entre a autoridade religiosa e política, ocasionando, por 
isso, a rejeição da autoridade do imperador.
Tendo isto em vista Agostinho procura estabelecer, partindo de uma visão metafísico/teológica da 
história, a verdadeira relação existente entre religião e política, Igreja e Estado, poder político e poder 
pastoral, sociedade (dos homens unidos pelos negócios, pelo trabalho, família, leis etc) e comunidade 
cristã dos homens unidos pela mesma fé. Agostinho procede à elucidação do estatuto teológico/metafísico 
dessas relações entre entidades empíricas referindo-as às idéias de “Cidade de Deus” e “Cidade dos 
homens”.
 A Cidade dos homens – que teve no fratricida Caim o primeiro fundador - tem por finalidade organizar a 
vida social de tal modo que cada um possa realizar seus interesses particulares, apesar do egoísmo, 
buscando o bem-estar terreno. Sendo Deus todo-poderoso, a providência divina abarca a totalidade dos 
seres, inclusive a Cidade dos homens. O Estado é uma instituição adaptada à natureza pecaminosa dos 
homens. Mediante sua regência o ele torna possível satisfazer os impulsos ou inclinações primordiais dos 
homens à convivência pacífica, proporcionando-lhes segurança, saúde e bem –estar, bens inferiores mas 
tornados necessários aos homens por Deus. Aqui o exercício do poder e sua obediência são o caminho 
para a paz social e o desfrute dos bens terrenos. Ao contrário da obediência política, a religiosa, na 
Cidade de Deus, guia o cristão em sua viagem rumo à vida celestial. O verdadeiro cristão busca a 
beatitude da vida eterna, devendo estar orientado para ela por uma dupla relação de dependência e 
obediência ao padre e à Igreja. Na Grécia a cidadania e a virtude estabeleciam-se a partir da relação de 
dependência mútua que ligava o Estado ao cidadão virtuoso que aprendeu, habitualmente, a dominar suas 
paixões fazendo com que suas ações fossem dirigidas pela razão. Dependência que não se resolvia 
mediante a simples obediência do cidadão às leis ou à sua submissão ao poder. O princípio da isonomia 
baseava-se na alternância da posição dos cidadãos nos cargos de mando. Os cidadãos formam uma 
comunidade política na medida em que são igualmente capazes de mandar e obedecer. A simples 
capacidade de obedecer não é uma virtude por si só.
Ao contrário, na Idade média a obediência (para os gregos ela era a prerrogativa dos escravos) torna-se 
uma virtude ao mesmo tempo em que se desdobra numa dupla ordem de dependência. O cidadão é 
simultaneamente membro da comunidade política (Estado) e da comunidade de credo (Igreja) 
devendo obediência à autoridade do rei e do padre que conhece seus pecados e dirige sua consciência 
para o caminho da libertação dos pecados inerentes à miséria insuperável - pelo menos nesta vida - da 
condição humana decaída.32
Assim, a Cidade de Deus tem na Igreja sua legítima representante terrena e ancora-se sobre o dom da 
graça divina. Apenas no seu interior o homem pode orientar sua vontade para a felicidade verdadeira. E 
os homens participam da verdadeira justiça, isto é, a justiça divina, enquanto membros da igreja. 
Por esta via o Estado é um meio para a realização das finalidades estabelecidas pela providência divina. 
Quando, por orgulho, egoísmo ou ganância, a cidade dos homens se desvia dessa condição de meio, 
quando a vontade de poder assume a direção da política, o Estado torna-se cúmplice da decadência e os 
cristãos encontram-se mesmo desobrigados de servi-lo. Segue-se daí que o Estado deve subordinar-se à 
Igreja pois somente a obediência aos preceitos religiosos pode garantir que ele não irá desviar-se dos 
32 São fontes de autoridade os ensinamentos da história (exemplos de governantes virtuosos), a teologia revelada, e os 
princípios derivados das doutrinas dos filósofos. BERTELLONI, F. Quando a política começa a ser ciência. Analytica, vol. 
09, número 1, Rio, 2005, p. 13.
verdadeiros fins assinalados ao homem por Deus.33 O Estado deve ser uma comunidade de paz e justiça 
que, servindo à segurança da vida e ao bem estar material, existe como uma comunidade terrena a partir 
da qual se torna possível uma vida voltada para a comunidade celestial. O governante deve assegurar a 
difusão do cristianismo, a segurança da igreja e a moralidade dos costumes de acordo com a lei natural 
expressa nos dez mandamentos. O Estado se destrói quando se entrecruza com as religiões pagãs, quando 
se desinteressa do bem estar e da moral públicos, quando se degrada moralmente considerando-se a si 
mesmo, isto é, a manutençãodo poder o último valor.34 
Segundo Agostinho não há maior nem menor glória em vencer ou perder uma guerra. “Que importa sob 
qual autoridade vive o homem?”, pergunta, se sob o julgo do dominador ou sob as graças do vencedor? 
Diante da grandeza infinita da glória eterna as misérias, riquezas e benefícios obtidos na cidade dos 
homens se anulam. A prova da necessidade de orientação espiritual da igreja, em relação ao Estado é 
justamente a sabedoria prática que somente ela pode cultivar e difundir. Desejosos de paz na vida terrena 
os homens fazem a guerra ignorando que verdadeira paz consiste no triunfo eterno das almas sobre o 
pecado e da justiça divina sobre o mundo.
Se for lícita a comparação entre a Igreja e o Estado, a cidade de Deus e a terrena, se deixam conceber 
como dois órgãos do mesmo grande organismo que representa o império cristão, exercendo distintas 
funções hierarquizadas. No entanto, por mais problemática que fosse tal relação, é ponto passivo, para 
Agostinho e para todos os pensadores medievais em geral, seus sucessores, que a independência da 
igreja em assuntos espirituais e do governo em assuntos internos à sua jurisdição, deviam ser 
respeitados. A junção dos dois poderes em uma só instituição ou pessoa era considerada 
tipicamente pagã.35
Mas o exercício eficaz do poder político deve estar submetido aos deveres do povo e do governante 
para com Deus e Igreja. O rei deve “preferir dominar suas próprias paixões más em detrimento da 
intenção de dominar não importa qual nação”. Deve “empenhar todo seu poder a serviço da Majestade 
divina a fim de estender o mais possível o culto de Deus”. Deve, por fim, “preferir o reino dos céus onde 
não se importarão de se reconhecer entre iguais”.36 Como bem assinalou Parkinson37 Agostinho encontra-
se mais preocupado em traçar o perfil do verdadeiro governante cristão, que, como tal, segue a 
orientação, como todos os outros sócios da sua mesma fé, da Igreja, do que em elaborar as diretrizes de 
uma política eficaz. Ao contrário, ele situa os deveres morais e religiosos acima das necessidades do 
exercício do poder. Daí a atribuição ao príncipe do dever de combater os hereges, mesmo pela força, 
porque a violência, neste caso, é apenas a palavra da salvação abrupta.
Fica pois claro que o Estado, depois do advento do cristianismo, só será justo com a condição de ser 
também cristão, servindo à comunidade cristã unida pela fé e servindo ao ideal cristão de vida segundo o 
qual os interesses espirituais situar-se-iam acima dos demais. Tal Estado deve servir à propagação da fé 
nesse mundo e contribuir para a busca da salvação eterna.
33 Em uma carta escrita em 1081, o papa Gregório afirma, radicalizando as concepções de Santo Agostinho, que reis e 
governantes “tiveram origem entre aqueles que, ignorando Deus, erigiram-se, por cega ganância e insuportável presunção, 
em senhores dos seus iguais, isto é, dos homens, por meio do orgulho, da violência, da má-fé, do assassínio e de quase todos 
os tipos de crime, (tendo sido) incitados a cometê-los pelo príncipe deste mundo, o demônio?”. Cit in SABINE, 255.
34 “Se consideramos felizes certos imperadores cristãos, não é porque reinaram longamente, ou morreram em paz deixando o 
reino aos seus herdeiros, ou porque dominaram os inimigos do Estado .... Tudo isso nada mais é do que consolações desta 
vida miserável que qualquer ser demoníaco teria suficientemente mérito para também desfrutar ... Assim quis a misericórdia 
de Deus para que os que nele crêem não desejassem as vantagens terrenas como se elas representassem o bem soberano” 
(Cidade de Deus, Livro V, Cap. XV. Tradução adaptada por mim.
35 SABINE, G. H. História das teorias políticas. Lisboa: Fundo de cultura, 1964, I, p. 201.
36 Cidade de Deus, liv. V, Cap. XV.
37 Op. cit., p. I, 327.
Agostinho concebe a história enquanto movimento teológico. A história tem um sentido, isto é, uma 
orientação (providência divina) e uma significação (a salvação dos justos). Na medida em que o 
sentido da história se inscreve no devir espiritual da comunidade dos crentes da igreja, ou seja, na 
salvação das almas e na ressurreição dos corpos, o triunfo da igreja não mais depende da sua união 
com o poder político. Ao contrário o triunfo da igreja é espiritual, realizando-se na ressurreição dos 
justos que constituíram a comunidade de fé que a própria igreja organiza e dirige. Por este prisma o 
militantismo da fé cristã traduz-se na luta pela salvação da alma independente do poder político, embora 
a vida na terra não seja possível sem este último, como já afirmamos.
§ 03 PASSAGEM DA IDADE MÉDIA PARA A MODERNIDADE
3.1. A produção da verdade
Do mesmo modo como a autoridade política não depende mais da aliança direta com Deus, apoiando-se 
doravante, de direito, numa competência própria, também a produção da verdade irá desprender-se da 
necessidade de uma revelação divina prévia. A idéia de aliança - dos homens com Deus e do governante 
com o povo - é substituída, na modernidade, pela de acordo dos homens entre si, ou seja, pela idéia de 
contrato, e a idéia de verdade revelada é substituída, por sua vez, pela noção de método.
De fato, a condenação de Galileu como herege deveu-se menos à sua afirmação de que a Terra gira em 
torno do Sol, do que à nova maneira como ele procedia a fim de desvendar as leis da natureza, afirmando 
que ela é um grande livro aberto e oferecido diretamente à observação e à razão humanas. Deste modo, 
uma vez preparada pelo conhecimento dos caracteres matemáticos com os quais este livro está escrito, a 
razão pode, por si mesma, desvendar os seus segredos.
"Não era, na verdade, esclarece Cassirer, a nova cosmologia a que as autoridades eclesiásticas se 
opuseram com todas as suas forças, posto que, como hipótese puramente matemática, podiam 
aceitar tanto o sistema copernicano como o ptolomáico. O que não toleravam, porque ameaçava os 
pilares do sistema eclesiástico, era o novo conceito de verdade enunciado por Galileu. Junto à 
verdade da revelação se apresenta agora uma verdade da natureza, autônoma, própria, radical. Esta 
verdade não se nos oferece na palavra de Deus, mas em sua obra, não descansa no testemunho da 
Escritura ou da tradição, mas, ao contrário, está constantemente diante dos nossos olhos".38
38 CASSIRER, E. La Filosofia de la ilustracion. Trad. Eúgenio Imaz. México: Fondo de cultura económica, 1984, p. 60. 
Apesar dessa nova forma de produzir a verdade, Horkheimer afirma que não há verdadeiramente nenhum litígio entre o 
cristianismo e a filosofia racionalista nascente no que concerne à natureza do ser absoluto. “O problema de fundo consistiu 
em saber se a revelação ou a razão, a teologia ou a filosofia, deveriam ser o instrumento da determinação da verdade 
última”(Eclipse de la raison. Paris: Payuot, 1974, p. 26).
Citando a tese de Santo Agostinho segundo a qual nenhuma proposição pode ser considerada contrária a 
fé sem ter sido objeto de uma refutação racional39, Galileu conclui que os sentidos conferidos à Sagrada 
Escritura pela exegese seriam falsos quando não concordassem com as verdades racionalmente 
demonstradas40. A demonstração racional ocupa, então, o lugar de critério hermenêutico a garantir a 
veracidade das opções sempre que houver algum conflito das interpretações. 
Assim, a experiência fundamental da modernidade, refletida nas filosofias de Punfedorf, Grocius, La 
Boétie, Maquiavel, Hobbes, Rousseau e Kant, para citar apenas estas, consiste na idéia de que não há 
fundamento transcendente para a organização social e política da humanidade, seja para determinar o 
progresso ou uma suposta decadência da história humana. O homem é livre, senhor do seu destino sobre a 
terra, para bem ou para o mal. A racionalidade, se existe, é doravante pensada como imanente à práxis 
humana. Cabeao homem, não só deliberar sobre os meios de realizar o que é melhor para sua vida, como 
também acerca das finalidades que lhe convém perseguir.
A natureza torna-se, na modernidade, um grande mecanismo despido de qualquer finalidade que não seja 
a utilidade que o homem lhe empresta, e que é de sua exclusiva responsabilidade. Deste modo a 
modernidade se encontra obrigada a desenvolver, não só uma teoria acerca da possibilidade do 
conhecimento científico da natureza (epistemologia), mas também uma teoria da possibilidade da razão 
obter de si mesma a determinação dos princípios puros capazes de legitimarem as finalidades que impõe 
ao mundo a à vida da humanidade. A modernidade alimenta-se da fé de que, através da reflexão, o 
homem pode determinar por si mesmo seus fins próprios e, segundo seu arbítrio, subordinar a totalidade 
da natureza á realização desses fins41.
3.2. Os Progressos da razão
É uma idéia moderna por excelência a de que nada deve limitar a propensão humana para o 
desenvolvimento constante das suas capacidades naturais, impulsionado pela razão.42 Ao contrário de 
decadência, a partir de um estado de sabedoria e paz originárias43 a história é vista como evolução moral, 
técnica e teórica do gênero humano. A negação da possibilidade de conhecer toda a história do mundo 
caminha junto com o distanciamento das origens que se perdem no tempo e no horizonte de um olhar 
voltado, acima de tudo, para o futuro, depositando a esperança nas obras vindouras da razão 
emancipada.44
O homem é, doravante, pensado como ser cujas causas da existência não ultrapassam a natureza. Este 
naturalismo opõem-se respectivamente:
1) à dependência de toda ordem sobrenatural, transcendente, imaterial, invisível 
2) a toda determinação contingente da história que o homem não possa ultrapassar por si mesmo e 
 dominar através do uso da razão. 
De acordo com este novo ponto de vista, o homem pode conhecer teoricamente e dominar 
tecnicamente, a partir da teoria, sua natureza interna e personalidade, os processos sociais e o 
39 Genesis ad literam, liv. 1, caps. 18 e 19.
40 Cf. GALILEU, G. Carta a Cristina de Lorena. Trad. Carlos Arthur Ribeiro do Nas cimento. In: Cadernos de História e 
Filosofia da ciência, n. 5, 1983.
41 Cf. Giannotti, J. A. In: História universal do ponto de vista cosmopolita. São Paulo, Brasiliense, l989, p. 67.
42 Esta é notadamente a posição de Condorcet que resumiremos apoiados em HABERMAS, J. Teoria de la acción 
comunicativa I; racionalidad de la acción y racionalización social. Madrid: Taurus, 1987, pp. 200-203.
43 Aí se inclui também, sem dúvida, o próprio conceito de tradição pois “o passado é concebido como algo que foi outrora 
sagrado, dotado de uma qualidade sobrenatural explicável por referência às ações dos deuses, ou a um acordo com idades 
virtuosas parcial ou totalmente perdidas”(MACRAE, D. G. As idéias de Weber. São Paulo: Cultrix, 1988, p. 75). De fato a 
tradição não pode ser considerada depositária de uma sabedoria gerada no passado sem que isto torne legítima a pretensão 
ao acesso aos meios, fontes e faculdades humanas utilizados para construir aquela sabedoria, mas a partir do próprio 
presente.
44 Cf BRUCKNER, P. L’euphorie perpétuelle. Paris: Brasset, 2000.
desenvolvimento histórico, do mesmo modo como domina a natureza material externa. Além disso o 
programa iluminista crê que o progresso da ciência também acarretará o aperfeiçoamento moral do 
homem. “Não existe sistema religioso nem extravagância sobrenatural que não se funde sobre a 
ignorância das leis da natureza”.45 Desta idéia de autonomia humana resulta a esperança na capacidade da 
difusão do saber científico penetrar a opinião pública através da educação confiada aos sábios. Os 
progressos da civilização aparecem como resultados da difusão do saber racional e da reforma da 
educação em geral. Por último espera-se que o progresso científico impulsione a evolução da própria 
civilização contribuindo para erradicar a criminalidade ou superando a miséria através dos procedimentos 
médicos e higienistas, do urbanismo científico etc.
3.3. A racionalização da existência
Como vimos46 as sociedades primitivas apoiavam a divisão do trabalho, as relações de poder e a 
repartição da riqueza, sobre as instituições ligadas às relações de parentesco (divisão sexual do trabalho, 
proibição do incesto, troca de mulheres). As sociedades tradicionais, mais complexas, desenvolvem sua 
organização social a partir da centralização do exercício do poder monopolizado pelo Estado. Além disso 
fazem com que as diferentes classes sociais, referidas à posição ocupada pelos indivíduos no interior das 
relações de produção, tornem-se dominantes em contraposição aos laços familiares. Por fim, como as 
sociedades primitivas, inclui entre suas funções a esfera simbólica, dos mitos, tradições, normas morais 
etc. com o objetivo de legitimar ideologicamente as estratégias sociais de dominação de classe.47
Nessas sociedades é possível distinguir, seguindo a Habermas48, duas esferas de comportamento: a da 
ação instrumental ( trabalho ou ação racional teleológica), e da escolha racional. A ação instrumental tem 
por critério de racionalidade a eficácia na realização dos objetivos perseguidos. Quando incompetente ou 
ineficaz, a ação instrumental conduz ao fracasso. A escolha racional define-se essencialmente pelo caráter 
dogmático das escolhas que realiza, na medida em que pretende deduzi-las de normas e axiomas 
assumidos como pontos de partida indiscutíveis (é o que ocorre no comportamento religioso, por 
exemplo). A partir dela são gerados os comportamentos “desviados” aos quais são imputados sanções ou 
castigos estipulados por convenção e que, portanto, não derivam da ação diretamente considerada, a partir 
dos seus meios ou resultados.
Nas sociedades tradicionais, tal como a sociedade feudal, as tradições culturais são encarregadas de 
estabelecer a legitimidade da organização social como um todo. As relações econômicas de produção 
dependem da reprodução da ordem social hierarquizada – camponeses, nobreza, clero – e a validade 
cultural das tradições intersubjetivamente partilhadas, que legitimam a estrutura social da dominação 
política, apresenta-se como inquestionável.49 Como mostrou Marx o modo capitalista de produção é 
essencialmente inovador e mesmo revolucionário, tanto no que concerne ao desenvolvimento tecnológico 
das forças produtivas, quanto no tangente às instituições sociais em geral (idéias religiosas, arte, 
educação, costumes, sistemas jurídicos etc). Com o advento do capitalismo “tudo o que antes parecia 
sólido desmancha-se no ar”. A verdadeira novidade, neste caso, é o estado evolutivo das forças 
45 CONDORCET, cit in: HABERMAS, idem, p. 202.
46 Vol. I, cap. 1.
47 Max Weber considerava a necessidade de legitimar, isto é, de justificar nossa obediência e submissão espontâneas ao 
poder político (Estado) uma característica universal das sociedades humanas. Evidentemente o problema da legitimidade se 
põe principalmente a propósito das sociedades nas quais se trata de reconhecer a autoridade do Estado, embora mesmo o 
poder coercitivo busque legitimar-se; tanto quanto aqueles que ele oprime buscam também uma justificativa para sua própria 
sina (Cf. La Boétie, Discurso da servidão voluntária). Quanto à autoridade do Estado ela pode basear-se na tradição, na 
autoridade racional-jurídica ou na liderança carismática. Cf. MACRAE, D. O Pensamento de Max Weber. São Paulo: 
Cultrix, 1998, p. 75.
48 HABERMAS, J. Técnica e ciência como ideologia. Porto: edições 70, 1987, p. 44.
49 Idem, p. 62.
produtivas que tende a estendera lógica dos subsistemas de ação racional teleológica à totalidade da 
sociedade, impugnando, deste modo, a forma que as culturas superiores têm de legitimar a dominação 
mediante interpretações cosmológicas do mundo – míticas, religiosas ou metafísicas - que obedecem 
ainda à lógica dos contextos da interação simbolicamente mediatizada, ou seja, aos jogos de linguagem, 
aos processos de argumentação.
Esta forma de enquadramento institucional de uma sociedade baseada na linguagem ordinária, 
intersubjetivamente partilhada por todos os indivíduos, tem o mérito de resguardar ainda um espaço 
simbólico que pode ser reapropriado, em sua rigorosa oposição à racionalidade instrumental, como 
espaço crítico e emancipador. Uma idéia religiosa, mesmo dogmática, pode ser contestada, uma teoria 
cientificamente desenvolvida e comprovadamente eficaz, não. Como vimos, na Idade Média o indivíduo 
submete-se necessariamente à autoridade social que depende de Deus. Mas a obrigação de voltar-se para 
o alto, para a salvação da alma, deixa uma certa liberdade, exigida pelo jogo da conversão, ao exercício 
individual do pensamento e da existência.50
3.4. A nova ordem cósmica
“A dissolução do cosmos me parece ser a revolução 
mais profunda realizada ou sofrida pelo espírito 
humano desde a invenção do Cosmos pelos gregos”51
A cosmologia moderna distingue-se da medieval nos seguintes aspectos essenciais:
1. Exclusão do mundo sensível52 como objeto de explicação científica. A ciência moderna irá 
separar, através das noções de qualidade primária e secundária, as propriedades sensíveis das 
propriedade objetivas das coisas, sendo apenas estas últimas consideradas suscetíveis de um 
conhecimento racional. “A natureza de um corpo em geral, afirma Descartes, não consiste em que ele 
seja uma coisa dura, pesada, colorida, ou que toque nossos sentidos de qualquer outra forma, mas sim 
em que ele seja uma substância extensa em comprimento, largura e profundidade”.53 Estas qualidades 
só podem ser concebidas e existir enquanto predicados de uma substância material (res extensa). 
Newton dá a seguinte lista de propriedades essenciais da matéria, ou qualidades primárias: extensão, 
dureza, impenetrabilidade, mobilidade e inércia. Estas propriedades têm em comum o fato de nos 
serem dadas empiricamente e não poderem aumentar nem diminuir.54
Em geral as propriedades primárias são aquelas que podem ser medidas e devidamente quantificadas 
a fim de poderem integrar uma equação matemática. O comprimento de uma barra de ferro não varia 
de acordo com o sujeito que a percebe, enquanto sua cor, temperatura, enfim seus aspectos sensíveis, 
sendo subjetivos, variam de acordo com o sujeito percipiente.
2. Concepção mecanicista em oposição à concepção finalista da causalidade. 
 De acordo com a tradição aristotélica explicar um fenômeno físico consistia em determinar as suas 
causas, em número de quatro. São elas: causa material, eficiente, formal e final. De acordo com o já 
conhecido exemplo da estátua de Afrodite, a causa material é, no caso, o bloco de mármore a partir 
do qual será esculpida, a causa eficiente é a força e habilidade do escultor, a causa formal a idéia da 
50 Cf. RUBY, C. Introdução à filosofia política. São Paulo: Unesp, 1998, p. 61.
51 CANGUILHEN, J. Ensaios de História do pensamento científico. Rio: Forense, 1987, p. 155.
52 Segundo Bloch, aos olhos dos intelectuais medievais, o mundo sensível consistia num conjunto de sinais, remetendo a 
uma “realidade mais profunda” que ele tinha por função expressar. Deste modo, em detrimento da observação, cabia à 
ciência apenas interpretar. (A Sociedade Feudal, p. 106).
53 Descartes, cit. in Koyré, op. cit., p. 101.
54 Cf. Koyré, p. 165.
estátua que, inicialmente, ele tem na cabeça; a causa final é a responsável pela destinação da estátua: 
o templo de Afrodite cuja construção fora decidida pela polis.
 A explicação mecanicista exclui qualquer referência às causas formal e final. “Era perfeitamente 
suficiente supor apenas que essas forças – físicas ou metafísicas – atuassem segundo leis matemáticas 
estritas (suposição plenamente confirmada pela observação de fenômenos astronômicos e também 
por experiências bem interpretadas) e tratar essas forças como variáveis matemáticas e não reais.” 55 
Trata-se de explicar, como e por que, e não para que ocorre um determinado fenômeno. Por 
exemplo, dentro da concepção científica moderna não chove para .... para molhar as plantas, por 
exemplo. Chove porque uma variação meteriológica, independentemente da necessidade que os seres 
do mundo possam vir a ter de água, provoca a precipitação do líquido contido nas nuvens.
 A ciência abandona assim todo esforço filosófico para conhecer o ser definido em sentido metafísico 
como suporte substancial de qualidades acidentais.
3. Determinismo e previsibilidade. O conceito de observação experimental casa o que a tradição até 
então havia rigorosamente separado: o empirismo e a lógica, o conceito e a intuição. Nessa 
perspectiva nova o possível, agora transformado em previsível, torna-se, também, o ser necessário. 
Mas, enquanto a filosofia medieval reduzia a determinação do ser necessário aos princípios lógicos, 
isto é, aos princípios formais do pensamento (por exemplo, é possível o que pode ser pensado sem 
contradição), a ciência o concebe a partir das condições da experiência, quer sejam elas formais ou 
materiais (leis físicas). Não se vai do que pode ser pensado sem contradição ao real, e sim do 
fenômeno que pode ser conceituado segundo uma teoria consistente, sendo assim pré-visível, à 
experiência real. Uma vez matematicamente demonstrada a possibilidade da maior trajetória de uma 
bala de canhão, através do ângulo de inclinação do cano (no caso 45º), afirma Galileu, não será 
necessário disparar nenhum tiro para confirmar ou não a previsão.
2. A natureza como objeto de uma vontade de domínio, o conhecimento como poder a seu serviço. 
ordem exemplar, o conhecimento como poder.
3. Matematização do espaço: homogeneidade, descentramento, o centro do mundo, já em Nicolau de 
Cusa, é metafísico e não físico. 
4. abandono da idéia de hierarquia cósmica: “um todo no qual a hierarquia de valor determinava a 
hierarquia e a estrutura do ser, erguendo-se da terra escura, pesada e imperfeita para a perfeição cada 
vez mais exaltada das estrelas e das esferas celestes”.56
5. A hierarquia do mundo, sua arquitetônica, espelhava a inteligência e vontade de Deus criador, sua 
bondade e perfeição. Mesmo a invenção do telescópio celeste “mostrava possuir um alcance superior 
à descoberta de simples fatos astronômicos ...na imensidade do espaço povoado por um número 
incontável de sistemas astronômicos, desvanecia-se como fantasma toda hierarquia de esferas e 
corpos celestes”.57 Ordem harmoniosa que o "De Consideratione" de São Bernardo representa de 
forma admirável, considerando o mundo uma "casa" arrumada em caráter definitivo. "A casa de 
Deus, escreve, que se crê ser una, é, na verdade, dividida em três: uns rezam, outros combatem e 
outros trabalham. Estas três partes coexistem sem disjunção; os serviços prestados por um são a 
condição das obras dos outros dois; cada um se encarrega, por sua vez, de aliviar o conjunto. Assim 
esta tríplice conjunção não é, por isso, menos una; sendo assim que a lei triunfa e o mundo todo goza 
da paz"58.
55 Koyré, 21.
56 KOYRÉ, ª Do Mundo fechado ao universo infinito. Rio: Forense, 1979, p. 14.
57 MONDOLFO, R. Idéias e figuras da filosofia da renascença. Rio: Mestre Jou, 1967, p. 45.
58 Livro IV; trad. R. Aigrain, Les plus belles pages de saint Bernard, Paris: Flammarion, 1929, p. 189.
6. Evolução: história natural. No séc. XIX a história “torna-se a viauniversal de explicação, chegando a 
conquistar o mundo da natureza. A regra: “o passado explica o presente” se estende à cosmologia, 
geologia, à biologia. O conceito de evolução torna-se conceito-chave”.59
7. Deus. “O Deus de um filósofo e seu mundo sempre se correspondem. Ora o Deus de Descartes, em 
contraposição à maioria dos Deuses anteriores, não é simbolizado pelas coisas que ele criou; ele não 
se expressa nelas. Não existe analogia entre Deus e o mundo, não há qualquer imagines ou vestigia 
Dei in mundo”60 A ciência dispensou a necessidade de Deus como fator de explicação do universo 
como um todo. O fato do plano divino parecer agora mais inescrutável não tornava a situação mais 
tranqüilizadora. A importância das causas finais, a sua origem divina, não autorizava a pensar que 
fossem adequadas aos desígnios humanos. Um criador engenhoso não tem que ser necessariamente 
bondoso. Mas apesar disso, e contrariamente à idéia de queda, acreditou-se que a terra fora destinada 
à felicidade terrena dos homens. Os cristãos modernos desviaram sua atenção da idéia de pecado 
original e a deslocaram para a de providência divina que veio subsidiar a idéia de progresso na 
dominação de um mundo naturalmente hostil, através do conhecimento racional.
8. Desde Aristóteles a verdadeira ciência distinguia-se fundamentalmente da prática na medida em que 
visava o conhecimento das coisas sobre as quais não cabia deliberação humana, ou seja, das causas ou 
primeiros princípios que não poderiam ser modificados. Por exemplo, o médico delibera acerca dos 
meios de curar, não se a cura é ou não necessária pois a saúde é, por natureza, superior (em si) e 
preferível (para nós) à doença. Sendo assim o conhecimento científico seria meramente 
contemplativo, não decorrendo dele nenhuma transformação da ordem do mundo.
Ao contrário a ciência moderna desenvolve um saber essencialmente tecnológico, destinado a servir 
de fundamento racional da intervenção modificadora e dominadora do homem sobre a natureza e 
mesmo sobre si mesmo e a sociedade. 
Na verdade as teorias científicas não tiveram inicialmente nenhuma aplicação industrial e as primeiras 
máquinas foram construídas por artesãos que nada entendiam da física galileniana e newtoniana. Mas 
elas funcionaram como caução ideológica para a vontade de poder moderna ao demonstrarem que a 
natureza era intrinsecamente determinística sendo assim, em princípio, totalmente desvendável e 
previsível pela inteligência humana. Deste modo nem o interesse prático gerou a ciência moderna – 
caso em que, como assinala Koiré, teria sido criada pelos engenheiros romanos61 - nem a ciência 
moderna forneceu à vontade de domínio da natureza um instrumental adequado.62
Desde o século XIII a filosofia política medieval pretendeu apresentar-se como ciência, ou seja, partir 
não da tradição ou da opinião vigente e sim de princípios verdadeiros e evidentes. 
Em geral a Filosofia política medieval caracteriza-se por três preocupações nucleares: 1) Teoria das 
relações e essência dos dois poderes, religioso e político; 2) Resulta da interpretação dos conflitos 
históricos da época entre dois poderes, “com recursos rigorosamente conceituais”;63 3) estes recursos 
conceituais foram, principalmente, de origem filosófica e teológica.
59 Canguilhen, op. cit., p. 372.
60 Idem, p. 100.
61 KOIRÉ, op. cit., p. 68.
62 Para que a ciência surja e se desenvolva é preciso, segundo Koiré três condições: que haja pesquisadores disponíveis, ou 
seja, uma classe ociosa como na Grécia clássica; que entre esses homens haja quem encontre satisfação na pesquisa e 
compreensão teóricas e; por fim, que a atividade científica seja socialmente valorizada, como é o caso das Academias do 
século XVII (op. cit., p. 376).
nem a ciência criou a máquina a vapor, nem esta criou o capital. Sem a divisão manufatureira do trabalho não haveria como 
empregar uma força motriz central
63 BERTELLONI, F. Quando a política começa a ser ciência. Analytica, vol. 09, número 1, Rio, 2005, p. 15, grifado pelo 
autor.
BIBLIOGRAFIA
PARKINSON, C. N. L Évolution de la pensée politique, Paris: Gallimard, 1958, Vol. I.
BLOCH, R. H. Misoginia Medieval. Rio: Editora 34, 1995.
WULF, M. Philosophie Médiévale. Louvain: Vital Decoster, 1924.
LIBERA, A. A Filosofia medieval. São Paulo: Difel, 1987.
LEFORT, C. Permanence du théologique-politique? In: Essais sur la politique. Paris: Seuil, 1986.
BONI, L. A. Razão e mística na Idade Média; in: Uma História da filosofia, vol. II. São Paulo: EDUSP, 
1987.
MONDOLFO, R. Idéias e figuras da filosofia da renascença. Rio: Mestre Jou, 1967.
As religiões cuidavam da fazer o que mais tarde a filosofia reinvidicará para si: acalmar a angústia do homem diante do seu 
próprio ser e seu destino no mundo.
To theion eu vejo as coisas divinas para viver é preciso conhecer o mundo para os gregos a ordem do mundo era divina 
kosmos
O homem deve encontrar seu justo lugar no seio da ordem cósmica
Dois modos de desafiar a morte: ações gloriosas, heróicas, belas e a procriação filosofia terceira via
O divino e o logos será encarnado numa pessoa: em /cristo
A fé toran-se, em oposição à razão a faculdade teórica por excelência do cristão o que conta não é mais a inteligência mas 
Ca confiança dada à palavra de Deus cristo
Seremos salvos pela fé e não por nossas ações
Não é mais a sabedoria dos filósofos mas a humildade das pessoas simples
Idéia moderna de humanidade livre arbítrio se torna fundamento da moral o que é moral o imoral é o modo como 
utilizamos livremente das nossas faculdade e não essas consideradas em si a força a inteligência dons herdados podem ser 
usados tanto para o bem quento para o mal
e noção de igual dignidade gregos hierarquia
o fórum íntimo, a consciência interior (caso da adultera apedrejada) mais importante do que a observância das leis do Estado
a liberdade em face da qual somos todos iguais. Ninguém é mais ou menos livre do que outro. Os homens possuem 
difeerentes habilidades e dons, naturais ou não, mas o que importa é o livre arbítrio, o uso dessas faculdades
John Done
A nova filosofia torna tudo incerto
O elemento fogo está completamente extinto
O sol se perdeu e a terra; e ninguém hoje
Pode mais nos dizer onde encontrá-la
Tudo está em pedaços, toda coerência desaparecida
Nenhuma relação justa, nada se ajusta mais
Ver do mundo fechado
Ciência não residirá mais na contemplação da harmonia do kosmo mas no trabalho, na elaboração de teorias que possam dar 
ao mundo desencantado uma ordem que ele não mais possui
Kant saber como a ciência elabora as leis que estabelecem ligações coerentes entre fenômenos dos quais a ordenação não é 
mais dada, tendo que ser introduzida de fora, por nós
	 SPINELLI, M. Helenização e Recriação de Sentidos. in: Dissertatio, n. 11, UFPEL, Pelotas, 1998. O cristianismo foi, sobretudo uma religião teológica, como assinala Robinet, e, por isso, “intelectualista”. “Nem todas as religiões elaboraram uma teologia. Algumas foram hostis a toda tentativa de justificação racional. Foi sobretudo o cristianismo que desenvolveu um discurso teológico, apoiando-se nas categorias ontológicas elaboradas pelos filósofos gregos”. ROBINET, op. cit., p. 69.
	José Luiz Furtado
	§ 01 A Doutrina Cristã e a filosofia
	Cristianismo e Filosofia pagã
	1.2. Estatuto político do cristianismo
	03 § Santo Agostinho 
	§ 03 PASSAGEM DA IDADE MÉDIA PARA A MODERNIDADE
	3.1. A produção da verdade
	3.2. Os Progressos da razão
	3.3. A racionalização da existência
	3.4. A nova ordem cósmica

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