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1 PRINCÍPIOS DO USO DE ANTIBIÓTICOS E DE OUTROS ANTIINFECCIOSOS 2 RESISTÊNCIA BACTERIANA NA COMUNIDADE 3 FEBRE E DOENÇAS INFECCIOSAS PARTE I ASPECTOS GERAIS 1 PRINCÍPIOS DO USO DE ANTIBIÓTICOS E DE OUTROS ANTIINFECCIOSOS PAULO RENATO PETERSEN BEHAR INTRODUÇÃO O uso criterioso dos antibióticos é um objetivo primário dos profissionais de saúde responsáveis. De acordo com o Centers for Disease Control and Prevention (CDC), metade das 100 milhões de prescrições anuais de antibióticos realizadas em ambu- latórios nos Estados Unidos são desnecessárias, direcionadas para resfriados e ou- tras viroses. Em hospitais, o mesmo problema tem sido comumente relatado. A antibioticoterapia malconduzida pode culminar no desenvolvimento de re- sistência, na emergência de novos patógenos e até mesmo em óbito. Assim, a prescrição racional e responsável de antibióticos ultrapassa a dimensão individual do prescritor, cabendo também aos controles de infecção hospitalar, às sociedades de especialistas e aos órgãos governamentais. Para a prescrição apropriada de antibióticos, são necessários educação, conhecimento e mudança de comporta- mento. Um exemplo disso é a campanha nacional sobre o uso apropriado de antibióticos conduzida pelo CDC (www.cdc.gov). Tal campanha tem como alvo não apenas os profissionais de saúde, mas também toda a população norte- americana, enfatizando orientações relacionadas ao manejo clínico de pacientes com infecções virais e ao uso de antibióticos em infecções comuns, como rinos- sinusites, faringites e bronquites agudas. O sucesso da antibioticoterapia baseia-se no conhecimento que se tem do paciente, da sua doença infecciosa, do agente etiológico e dos medicamentos a serem usados no seu tratamento. São necessárias noções mínimas de farmacologia, de microbiologia, da clínica das doenças infecciosas e da relação médico-paciente. A arte médica e o bom senso são fundamentais nesse contexto, em que a clínica é soberana, e a técnica é cada vez mais complexa, específica e multidisciplinar. Em relação ao médico, o juramento de “primeiro não causar mal” e a postura de cuidado para com a pessoa que é confiada a ele tem significado denso, cheio de letal Realce letal Realce 30 PA RT E I conteúdo e está no centro da atitude de ser médico. Cuidado e cura são palavras relacionadas etimologicamente. O cuidado com o paciente e com sua antibioti- coterapia está intimamente ligado à sua cura. O diagnóstico específico da doença infecciosa é fundamental. Para isso, a anamnese deve ser detalhada, e o exame físico, minucioso. A maior parte dos diagnósticos pode ser feita a partir da história do paciente. Em 1975, pesquisadores avaliaram a contribuição relativa da história, do exame físico e dos exames comple- mentares na obtenção do diagnóstico e concluíram que o valor preditivo foi de, respectivamente, 82%, 9% e 9%. Em 1992, outros autores concluíram que a história contribui em 76% para a elaboração do diagnóstico médico, o exame físico, 12%, e a investigação laboratorial, 11%. O julgamento clínico permanece como um determinante importante para o sucesso do tratamento, por isso o diagnóstico diferencial, a evolução e a interpretação dos exames complementares à luz da clínica precisam ser realizados com cuidado. Com a descoberta da base microbiológica das infecções, no século XIX, e, principalmente, a partir da década de 1930, o princípio número um para manejar pacientes com doença infecciosa é sempre raciocinar a partir do agente etiológico e da doença infecciosa que o microrganismo está causando. É enorme a diferença entre a atitude médica que segue esses princípios e que trabalha com diagnósticos, daquela que toma decisões embasadas apenas em manifestações como febre, leucocitose ou desvio à esquerda. As tomadas de decisão que levam em conta apenas essas manifestações configuram acompanhamento médico inapropriado e oferecem risco ao paciente. O trabalho médico é realizado sobre hipóteses diagnósticas ou de diagnósticos estabelecidos. Não se mudam condutas por causa de persistência de sinais isolados. As tomadas de decisão são realizadas quando a evolução do paciente não coincide com a história natural da doença infecciosa, modificada pelo tratamento. Quando uma superinfecção acontece de modo sub- seqüente e, em parte, concomitante à primeira doença, o primeiro diagnóstico não deve ser esquecido, e o segundo tratamento deve ser adicionado, e não substituído. Por exemplo, um paciente interna com diagnóstico presuntivo de pneumonia necrosante por anaeróbios e inicia o tratamento com penicilina, dose para anaeróbios, associada à gentamicina. É hospitalizado após três dias e adquire sepse hospitalar por E. coli produtora de β-lactamase de espectro ampliado (ESBL), sensível a ciprofloxacino e o imipenem. O procedimento, nesse caso, é manter a penicilina para completar o tratamento da pneumonia por anaeróbios, iniciar o uso de ciprofloxacino para o tratamento da sepse por E. coli e ter a gentamicina suspensa. Os princípios do uso de antibióticos e de outros antiinfecciosos não são princí- pios isolados, formam um conjunto de conhecimento, o qual pode ser analisado do ponto de vista temporal, desde o momento do primeiro atendimento ao pacien- te até a sua alta médica. Tal visão dos princípios do uso de antibióticos, a “aborda- gem por passos”, é apresentada no texto a seguir e no Quadro 1.1. Este capítulo utiliza termos mais relacionados ao tratamento de infecções bacterianas, porém os princípios aqui discutidos, guardadas as devidas diferenças, valem também para as outras doenças infecciosas. PR IN C ÍP IO S D O U SO D E AN TI BI Ó TI C O S letal Realce letal Realce letal Realce letal Realce letal Realce 31 PA RT E I Quadro 1.1 ANTIBIOTICOTERAPIA: ABORDAGEM POR PASSOS Passo Estudo (tempo ideal) Paciente microbiológico Antibiótico 1 (o tempo Anamnese do primeiro Dado epidemiológico atendimento) Exame físico Exame complementar ↓ Possibilidade da doença infecciosa ↓ Determinação do foco infeccioso Coleta do e/ou da porta de entrada espécime ↓ clínico Diagnóstico anatômico do processo infeccioso ↓ Diagnóstico da síndrome infecciosa ↓ Hipótese diagnóstica em relação à etiologia ↓ Diagnóstico presuntivo da Gram, pesquisa doença infecciosa de BAAR, direto ↓ para fungos, etc. Indicação do antibiótico e demais manejos de escolha ↓ para a Tratamento empírico principal ↓ hipótese Plano para monitorar a atividade do tratamento ↓ 2 (6h, 12h, Evolução 24h, 48h e 72h ↓ após coleta Diagnóstico etiológico Cultura, do espécime ↓ ↓ antibiograma, clínico) Manutenção Modificação sorologia, etc. do tratamento ↓ 3 Tratamento etiológico de escolha ↓ 4 (história natural) Evolução Complicações Intercorrências Medidas de suporte ↓ Reavaliação ↓ 5 Tempo de antibioticoterapia Suspensão ↓ Alta PR IN C ÍP IO S D O U SO D E AN TI BI Ó TI C O S 32 PA RT E I ANTIBIOTICOTERAPIA: ABORDAGEM POR PASSOS Segundo textos clássicos, vários fatores importantes devem ser considerados na escolha do antibiótico. Primeiro, a identidade do microrganismo infectante deve ser conhecida, ou, no mínimo, é preciso que se chegue a uma escolha estatística razoável em relação à etiologia, tendo como base a informação clínica. Segundo, deve haver informação tão acurada quanto possível sobre a sensibilidade do microrganismo aos antibióticos. Finalmente, devem ser considerados os fatores relacionados ao hospedeiro. A seguir, são detalhados os passos necessários para uma escolha antibiótica apropriada. A anamnese e o exame físicodevem ser detalhados, incluindo perguntas específicas dirigidas para evidenciar algum possível dado epidemiológico que possa sugerir o agente etiológico. Em seguida, deve-se diagnosticar a síndrome infecciosa, determinar o foco infeccioso e a porta de entrada. Após os diagnósticos anatômico e sindrômico, deve-se estabelecer a hipótese diagnóstica em relação à etiologia, coletando espécimes clínicos para o estudo microbiológico. Com o resultado do Gram, do diagnóstico sindrômico e da hipótese etiológica, completa- se o diagnóstico presuntivo (p. ex., pneumonia pneumocócica no lobo inferior direito). Nesse ponto, a indicação do antibiótico e os demais manejos do paciente consistem no tratamento empírico ou inicial. Segundo os princípios da antibioti- coterapia, com ou sem o Gram, deve-se dirigir a escolha para a melhor hipótese etiológica. Para isso, também é necessário pensar na possível sensibilidade do agente etiológico – dados locais são fundamentais nessa etapa. O primeiro atendi- mento é finalizado com a formulação de um plano para monitorizar a efetividade do tratamento a ser iniciado. Segue a primeira parte da evolução, na qual se dispõe de mais tempo para complementar dados de anamnese, de exame físico e de exames complementares. Obtém-se o resultado do exame cultural e do teste de sensibilidade, chegando ao diagnóstico definitivo ou etiológico. O tratamento definitivo é dirigido pelo antibiograma, embasado nos princípios da antibioticoterapia. Pode ser diferente do tratamento inicial e deve ser ajustado e instituído tão logo estejam disponíveis o exame cultural e o antibiograma. Por motivos ecológicos, pela crescente resistência aos antibióticos – problema de saúde pública mundial –, mesmo que o paciente esteja melhorando, a escolha antibiótica deve ser ajustada segundo os princípios da antibioticoterapia. O antibió- tico precisa ser mudado para o de menor espectro, com menor toxicidade e custo, desde que garanta a mesma eficácia. Muitas vezes, a troca garante maior eficácia, pois altera-se para o antibiótico de escolha para a doença diagnosticada e seu agente etiológico. Na segunda parte da evolução (acompanhamento no período do tratamento definitivo), deve-se comparar a evolução do paciente com a evolução teórica possível: a história natural da doença modificada pelo tratamento. Reavalia-se o paciente com freqüência relacionada ao diagnóstico e à gravidade do caso, preven- do complicações, que devem ser tratadas precocemente. Pacientes com doença infecciosa aguda devem ser acompanhados com proximidade. PR IN C ÍP IO S D O U SO D E AN TI BI Ó TI C O S 33 PA RT E I Para cada diagnóstico sindrômico e etiológico, existe um tempo de antibioti- coterapia preestabelecido; completado esse tempo, procede-se à suspensão do antibiótico. Quando o tratamento permanece empírico até o fim, outros critérios de suspensão podem ser utilizados, como a resolução dos sinais sistêmicos e os locais de infecção há pelo menos 4 dias. De acordo com o quadro clínico, após observação de 24 a 48 horas da suspensão, efetua-se a alta médica. É sempre possível chegar ao diagnóstico sindrômico e às hipóteses etiológicas da infecção e, portanto, ao tratamento empírico. Por vezes, o diagnóstico etioló- gico (definitivo) não é alcançado; nesses casos, após a instituição do tratamento empírico, alguns passos devem ser considerados. Se a evolução for a esperada, mantém-se o antibiótico; se a febre persistir por 2 a 3 dias, deve haver reavaliação clínico-laboratorial e, caso haja piora clínica, o antibiótico deve ser mantido. Se existir evidência de progressão da doença, deve-se considerar a sua fisiopatogenia e a síndrome da resposta inflamatória sistêmica, o déficit imunológico, a aquisição de superinfecção ou de resistência, as doenças que cursam com febre prolongada e a margem de erro possível no momento da elaboração da hipótese diagnóstica. Deve-se procurar afastar ou tratar intercorrência clínica ou cirúrgica não-infecciosa, coleções purulentas ou corpos estranhos, febre como paraefeito de antibiótico, litíases, seqüestros, e adequar as medidas de suporte. Recomenda-se cuidado na interpretação da febre: isoladamente, esse sinal é insuficiente para indicar uma tomada de decisão; se acompanhada de outras evidências de progressão da doen- ça, adquire outro significado. A falência terapêutica pode ser decorrente de proble- mas na escolha ou no tempo do início do antibiótico; entretanto, ela pode ocorrer na vigência do tratamento e do tempo apropriados. Tratada a intercorrência e afastadas e consideradas essas possibilidades, se houver boa evolução, mantém-se o antibiótico. No caso de má evolução, o anti- biótico é considerado ineficaz, sendo associado ou substituído, de acordo com o quadro clínico e o melhor diagnóstico da falência do tratamento utilizado. Para isso, novas tentativas de alcançar o diagnóstico específico devem sempre ser realizadas. AVALIAÇÃO POR TÓPICOS Outra abordagem consiste na avaliação dos princípios do uso de antibióticos por tópicos, como os descritos a seguir: ◗ Faixa etária: permite fazer a hipótese diagnóstica etiológica e embasar o tratamento empírico nos dados estatísticos da literatura que correlacionam o diagnóstico sindrômico aos microrganismos mais freqüentemente en- contrados nas diferentes idades. ◗ Dados demográficos e epidemiológicos: local de nascimento, procedência, viagens a zonas endêmicas, profissão, atividade sexual, uso de drogas, con- tato com doentes, exposição a animais ou a seus produtos e uso de imu- nossupressores também podem sugerir a etiologia. ◗ Noções mínimas da clínica das doenças infecciosas: o reconhecimento da síndrome infecciosa é importante para o diagnóstico clínico. A toxemia é PR IN C ÍP IO S D O U SO D E AN TI BI Ó TI C O S letal Realce 34 PA RT E I um sinal infeccioso importante para reconhecer a gravidade da infecção e permite que se façam algumas hipóteses em relação à etiologia. Além dos sinais sistêmicos, podem existir sinais de localização ou sinais locais, referen- tes aos órgãos envolvidos. O reconhecimento da síndrome infecciosa de origem bacteriana evita o uso de antibióticos para a “febre” do paciente. Há doenças bacterianas febris em que o antibiótico não está indicado, como a leptospirose no período das localizações. S. aureus, Leptospira spp. e M. tuberculosis podem causar doença com febre prolongada sem significar falha de tratamento. Febre acompanhada de boa evolução clínica e com melhora do leucograma não significa ineficácia do antibiótico, nem indica substituição ou associação de outro. Febre após 48 a 72 horas de antibio- ticoterapia não pressupõe ineficácia do antibiótico, mas antes deve ser des- cartada a possibilidade de coleção purulenta, corpo estranho e erro diagnós- tico. Outras causas de febre devem ser reconhecidas, como doenças do colágeno, hipertireoidismo, neoplasias (como rim e fígado), doenças he- matológicas, intoxicações, paraefeito de antibióticos e causas infecciosas não passíveis de antibioticoterapia, como viroses, e as parcialmente sensíveis, como malária e toxoplasmose. Deve-se diferenciar ainda febre de hiperter- mia. ◗ Sítio da infecção: relaciona-se com o agente etiológico, auxiliando na esco- lha do antibiótico, na dose e na via de administração: – Sistema nervoso central: aminoglicosídeos e cefalosporinas de 1a geração não alcançam níveis adequados nesse sítio, mesmo por via intravenosa. – Vegetações de endocardite bacteriana, ossos, tecido desvitalizado: a pe- netração pode ser inadequada, necessitando de altas doses de antibióti- co por tempo prolongado. – Pus: inativa aminoglicosídeos e polimixinas.– Hematoma: torna penicilinas e tetraciclinas menos efetivas. – Corpo estranho (válvula cardíaca, implante de articulação): freqüente- mente a cura da infecção requer sua remoção. ESCOLHA DA VIA DE ADMINISTRAÇÃO ◗ Oral: em geral é escolhida nas infecções leves ou moderadas. Nem todos os antibióticos podem ser administrados dessa maneira (p. ex., vancomicina, polimixinas e aminoglicosídeos). ◗ Intravenosa: usada para antibióticos que não são absorvidos no trato gas- trintestinal e para infecções graves. ◗ Intramuscular: útil para aminoglicosídeos e polimixinas, exceto para infec- ções com risco de vida, em que a via intravenosa é preferida. AGENTE ETIOLÓGICO A etiologia da quase totalidade das doenças infecciosas é um ser vivo, um (mi- cro)organismo; na dependência da interação entre estes seres, o hospedeiro e PR IN C ÍP IO S D O U SO D E AN TI BI Ó TI C O S letal Realce letal Realce letal Realce 35 PA RT E I o(s) agente(s) etiológico(s), a doença pode ou não ocorrer. Essa interação vai desde a simbiose e a comensalidade até doenças que evoluem para a destruição ou para o controle do agente etiológico (a cura), para a morte dos dois (hospedeiro e agente), ou ainda para o óbito do paciente e a sobrevivência do agente etiológico em outro hospedeiro (contágio). A variabilidade biológica tem de ser considerada, para que se possa vislumbrar completamente todos os aspectos que envolvem o assunto. A prescrição de antibióticos tem implicações diretas mais amplas do que apenas o tratamento da doença infecciosa de um determinado paciente. Os mi- crorganismos estão presentes na natureza: no meio ambiente, nos animais e nas plantas. Muitas espécies fazem parte da microbiota humana normal, sendo encon- trados nas superfícies mucosas (respiratória, gastrintestinal e do trato genital) e/ ou na pele; até mesmo tecidos anteriormente considerados estéreis, como o sistema nervoso central, os pulmões e os músculos, podem conter microrganismos vivos e quiescentes. O uso de antibióticos e de imunossupressores pode alterar essa convivência, desencadeando o processo infeccioso. HIPÓTESE ETIOLÓGICA O raciocínio sobre a etiologia da infecção diminui o uso inapropriado de antibióti- cos, os custos e os efeitos adversos desses medicamentos, os óbitos por superin- fecção e a freqüência de trocas posteriores de antibióticos. COLETA DE ESPÉCIME CLÍNICO PARA ESTUDO MICROBIOLÓGICO Deve ser realizada em doenças infecciosas, moderadas ou graves, sempre que houver material disponível: sangue, liquor, escarro, outras secreções, urina, fezes, escarificados de pele ou mucosa ou biópsia de tecido. O estudo microbiológico para doença bacteriana consiste em Gram ou Ziehl-Nielsen (pesquisa de BAAR), cultura e antibiograma. COLONIZAÇÃO, INFECÇÃO E DOENÇA Para um manejo terapêutico apropriado, é fundamental que se faça diferenciação desses termos. Doença pressupõe dano tecidual ou reação inflamatória causada pelo microrganismo, com clínica correspondente. Por exemplo, toxoplasmose e tuberculose infecção são diferentes de toxoplasmose ou tuberculose doença; para as primeiras, não está indicado tratamento. Colonização é simplesmente a presença de um microrganismo em superfície corporal, fluido corporal ou corpo estranho implantado. INFECÇÃO ADQUIRIDA NA COMUNIDADE E ADQUIRIDA NO HOSPITAL Essa discriminação também é importante. A infecção é hospitalar quando a doença inicia 48 a 72 horas após a hospitalização. PR IN C ÍP IO S D O U SO D E AN TI BI Ó TI C O S 36 PA RT E I NOÇÕES DE MICROBIOLOGIA MÉDICA ◗ Conhecer a microbiota humana normal, os patógenos primários e os oportu- nistas e a sua quantidade e proporção em cada sítio (estatística microbiológica). ◗ Conhecer a ecologia da comunidade e do hospital, quando for o caso. ◗ Conhecer os padrões de sensibilidade e resistência local e mundial, mas principalmente o padrão local. ◗ Gram versus cultura: o Gram, quando realizado com critérios, fornece o diagnóstico presuntivo, e a cultura, o diagnóstico definitivo, desde que o germe isolado corresponda ao agente etiológico, e não a um colonizante. O ideal em antibioticoterapia é coletar o material disponível, ao final da anamnese e do exame físico, no primeiro atendimento, realizar o Gram e, só então, prescrever o antibiótico. O resultado do Gram deve ser correlacio- nado com a cultura e com o quadro clínico. VIRULÊNCIA VERSUS RESISTÊNCIA Infecções muito graves podem ocorrer por bactérias pouco resistentes. Pacientes com sepse estafilocócica grave adquirida na comunidade, por exemplo, com todas as suas complicações possíveis, podem estar infectados por cepa sensível à oxa- cilina, cefalotina, gentamicina ou mesmo penicilina. Já outro paciente com infecção hospitalar por estafilococo sensível apenas à vancomicina pode fazer apenas um abscesso de antebraço após punção venosa e curar-se sem antibioticoterapia, após drenagem cirúrgica. ANTIBIÓTICO FOCADO NO PATÓGENO, NÃO NA INFLAMAÇÃO O antibiótico é um fármaco com mecanismo de ação específico para um dado microrganismo (agente etiológico) e não para a manifestação clínica da invasão. Por exemplo, penicilina G em pneumonia lobar para o pneumococo, não para a inflamação pneumônica. ANTIBIÓTICO DE ESCOLHA Usar sempre o fármaco de primeira escolha para cada agente etiológico, que pode variar de local para local nos diferentes países, Estados, hospitais ou nas diferentes unidades de um mesmo hospital. O antibiótico de escolha pode ser encontrado em livros clássicos de Medicina Interna e Infectologia. HIPÓTESE ETIOLÓGICA Escolher o antibiótico para a melhor hipótese etiológica no tratamento empírico. INÍCIO DA ANTIBIOTICOTERAPIA Deve ser empírico e precoce nas urgências; em outras circunstâncias, deve-se aguardar o diagnóstico etiológico para então iniciar o tratamento. PR IN C ÍP IO S D O U SO D E AN TI BI Ó TI C O S 37 PA RT E I ANTIBIOTICOTERAPIA PROLONGADA (> 15 DIAS) Principalmente com medicamentos antianaeróbios, substâncias de amplo espectro, associações de drogas ou drogas com alguma ação contra anaeróbios (cefalos- porinas de 3a geração e vancomicina) predispõem à superinfecção por germes multirresistentes e à sepse de origem endógena, como candidose sistêmica. PRESSÃO SELETIVA Existe correlação entre o grau de uso de antibióticos e a prevalência de mutantes geneticamente desreprimidos em várias áreas de um hospital de modo estável. Está claramente demonstrada a importância da pressão seletiva causada por ce- falosporinas e a disseminação secundária da resistência dentro do hospital. Isso também ocorre na comunidade. ANTIBIÓTICOS INDUTORES DE RESISTÊNCIA Tem-se demonstrado correlação entre uso de antibióticos em grande escala (princi- palmente as novas cefalosporinas) e o surgimento de multirresistência, mas a magnitude desse problema é freqüentemente subestimada. Os fármacos envolvi- dos são todas as novas cefalosporinas, cefamicinas, monobactâmicos e penicili- nas de espectro ampliado. Os mais potentes indutores de β-lactamases são cefoxi- tina e imipenem; indutores menores incluem cefuroxima, cefotaxima, cefopera- zona, ceftriaxona, ceftazidima, carbenicilina, ticarcilina, aztreonam e ácido clavulâ- nico. ASSOCIAÇÃO DE ANTIBIÓTICOS Pode ser usada para prevenção de emergência resistentes (claramente documen- tada apenas para a tuberculose e para o HIV), infecções polimicrobianas, tratamen- to empírico inicial de infecções graves ou para obtenção de sinergismo ou adição de efeito (endocardite enterocócica, endocardite por S. viridans e criptococose). Apesar de haver informação proveniente de ensaios humanos limitados deque ocorra sinergismo com o uso de β-lactâmico antipseudomonas mais aminogli- cosídeo para infecções por Pseudomonas spp., essa forma de tratamento ainda não foi sujeita a um estudo controlado definitivo. A associação de antibióticos para infecções por Pseudomonas spp. também não garante o não surgimento de resistência durante o tratamento. ANTIBIÓTICO PARA O TRATAMENTO DA DOENÇA INFECCIOSA, NÃO PARA OUTROS OBJETIVOS ◗ Evitar o uso de antibiótico como “medida de conforto para o médico”, como se a prescrição do antibiótico eliminasse a necessidade da atenção meticulosa aos detalhes da história e do exame físico, de reexaminar fre- qüentemente o paciente e de acompanhá-lo criteriosamente. PR IN C ÍP IO S D O U SO D E AN TI BI Ó TI C O S 38 PA RT E I ◗ Evitar a prescrição do antibiótico como “ansiolítico para o médico”, no desejo de não deixar nenhum patógeno descoberto, ou como se o antibióti- co substituísse o correto acompanhamento do paciente. REFERÊNCIAS SUGERIDAS Bartlett JG. Clinical management of patients with infectious diseases. In: Harvey McG, edi- tor. The principles and practice of medicine. 22th ed. Norwalk: Appleton and Lange; 1988. Lietman PS. Use and misuse of antimicrobial agents. In: Harvey McG, editor. The principles and practice of medicine 22th ed. California: Appleton e Lange; 1988. Moellering RG. Principles of anti-infective therapy. In: Mandell GL, Bennett JE, Dolin R, editors. Mandell, Douglas, and Bennett´s principles and practice of infectious diseases. New York: Churchill Livingstone; 2004. Wilkoske CJ. General principles of antimicrobial therapy: Simposium on antimicrobial agents: Part I. Mayo Clin Proc 1991; 66: 931-41. Young L. Antimicrobial therapy. In: Wyngaarden JB, Smith LH, Bennett JC, editors. Cecil textbook of medicine 19th ed. Philadelphia: W.B. Saunders; 1994. PR IN C ÍP IO S D O U SO D E AN TI BI Ó TI C O S
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