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DIREITOS HUMANOS G2 MARCIA NINA

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Aula 11 – Rio, 23.09.15 
SISTEMA INTERAMERICANO DE DIREITOS HUMANOS
Utilizamos muito mais este sistema do que o Sistema ONU. Ratificamos o mecanismo de petição antes do que o sistema ONU, além disso, a OEA tem a língua portuguesa, por isso que utilizamos mais este sistema do que o Sistema ONU. 
As OI são aparatos burocráticos, estáveis, permanentes, com personalidade jurídica que permitem a execução de uma série de tarefas, que antes tinham que ser negociadas caso a caso, funcionam também como fórum de deliberação de novas formas e procedimentos. As OI são uma esfera de consolidação e transmissão de valores que são importantes em grande parte do globo e são sujeitos de direitos com personalidade jurídica própria, independente com relação aos Estados, promovendo uma série de dinâmicas no âmbito internacional.
Essas transformações, a partir da segunda metade do século XX, possibilitaram o surgimento das OI, como a ONU, que foi a primeira a surgir. E temos também a formação dos blocos regionais. A OEA é um bloco regional, que segue bastante o sistema da ONU, sendo sistemas bem parecidos. A OEA tem uma série de interesses e objetivos que estão constituídos na Carta da OEA, que é de 48 também. A OEA em grande medida resulta de iniciativas anteriores, mas no formato atual se consolida com esse nome, com essa estrutura normativa e com estes órgãos a partir da Carta da OEA de 1948 e a Declaração Americana dos Direitos e dos Deveres do Homem de 1948.
Tanto quando a DUDH, essa DA enuncia uma série de princípios com relação à proteção dos indivíduos contra o próprio Estado. Como declaração, ela não é vinculante, da mesma forma que a DUDH. A DUDH é bem mais aceitada do que a DA. A DA tem uma relevância importante na região, mas ela não pode ser usada como uma prova de ius cogens, contrariando o que se entende por fontes de direito internacional – existe um entendimento de que a DUDH é obrigatória, mas não pelo fato dos Estados terem assinado aquela declaração, mas sim por causa de uma interpretação de que ela é ius cogens, na medida em que essa declaração seria amplamente aceita, entendida como sendo obrigatória, vai além de uma aspiração a princípios e objetivos que se querem alcançar – certos princípios já são consideradas válidos, independente de uma fonte, de um tratado. Já a DA como é restrita ao continente americano, não tem essa mesma força, mas dentro do âmbito do sistema interamericano ela é bastante forte. 
Art. 106 da Carta da OEA -> Sessão onde estão os órgãos da OEA: AG, Conselho Permanente, Comissão Jurídica Interamericana, Comissão Interamericana de DH – estes órgãos cumprem funções equivalentes aos órgãos específicos da OEA. Temos um órgão enunciado pela Carta com um mandato de proteção de DH, que é a Comissão Interamericana, o que não existe na ONU. A Comissão Interamericana é o órgão encarregado de servir como órgão consultivo e a Carta da OEA propugna pela celebração de uma convenção americana específica de DH, que em um primeiro momento não existia.
Existe um princípio que faz com que se entenda que a teoria das OI já consolidou o princípio que os órgãos constituintes de uma OI tem o poder de instituir os procedimentos e os órgãos necessários que lhe foram atribuídos. A Comissão Interamericana é um destes órgãos, e pode estabelecer o seu regulamento interno, a sua forma de funcionamento interno. Essa Comissão foi criada em 1969, inicialmente por força de uma resolução da AG e também por for dessa resolução foi criado o Estatuto dessa Comissão. Esse estatuto deu forma à comissão e permite que este estabeleça o seu regimento interno. Essa resolução foi votada por Estados, sendo, portanto, soft law, mas resoluções de AG têm uma força bastante grande e dificilmente são descumpridas. Estas resoluções não são tratado, mas se assemelham, pois Estados soberanamente se manifestam com relação aquela resolução e votam “sim” ou “não”. A Comissão é formada por indivíduos especializados em DH, não estando representando Estado nenhum e faz o seu próprio regulamento.
Há também uma Convenção de DH, votada em 69. Essa Convenção Americana de DH, também chamada de Pacto de San José tem uma morfologia interessante. O mandato da comissão interamericana está no art. 41 da convenção. Essa convenção vincula a quem aderiu ou ratificou este pacto, obrigando os Estados que tiverem ratificado ou aderido a esta convenção. Os Estados que fizeram isso são os Estados-membros da OEA, porém não são todos, pois existem Estados da OEA que não aderiram e nem ratificaram o pacto da OEA (EUA e Canadá) – com relação a estes Estados, a convenção pode atuar? Sim, pois a fonte de autorização da competência da Convenção com relação aos Estados membros da OEA é a Carta da OEA. A Comissão foi criada pela Carta da OEA e não pela Convenção (art. 106 da Carta – este artigo se aplica a todos os Estados-membros da OEA, então com relação a todos os Estados a Comissão tem competência). Na Convenção, o mandato da Comissão é mais detalhado, é estabelecido de forma mais detalhada, mas a existência deste órgão e a sua competência geral está estabelecida na Carta da OEA, portanto, vale para todos os Estados-membros da OEA. 
O grande documento, instrumento normativo de proteção DH no âmbito americano é o Pacto de San José. Em grande medida, porque além de existirem os princípios dos arts. 1º ao 32, que são universais, a partir do art. 33 começa a falar do meios de proteção, sendo o mais detalhado sobre estes mecanismos de proteção de DH -> tem dois órgãos: A Comissão e a Corte (que não está na Carta, está apenas na Convenção. Então só pode ser submetido à Corte quem aderiu e ratificou a Convenção/o Pacto). 
Art. 41 (Competência da Comissão), “f” explicita a possibilidade de petições individuais. A Comissão tem outras atividades mais gerais (formular relatórios, ser órgão de consulta). Toda parte contenciosa está na Comissão, a partir destas petições. Temos a Corte, a Comissão prevista na Convenção e temos a Comissão na Carta. 
	
	Situação 1
	Situação 2
	Situação 3 
	Carta OEA
	Estado ratificou
	Estado ratificou
	Estado ratificou a Carta
	CADH = Pacto de San José
	Estado não ratificou
	Estado ratificou a Convenção
	Estado ratificou a Convenção
	Art. 62. I da CADH – Corte IDH
	Não reconheceu a cláusula obrigatória 
	Não reconheceu a competência obrigatória da Corte
	Estado aderiu à cláusula facultativa de resolução obrigatória
Uma vez reconhecida a competência da Corte, ela é obrigatória. Um Estado-parte da convenção pode não reconhecer a competência da Corte. O Brasil em 92 ratificou a convenção e em 98 reconheceu a competência da Corte. 
O mandato da Comissão IDH está na Carta da OEA no art. 106 e na CADH no art. 33 e seguintes.
A competência da Corte IDH está no art. 52 e seguintes da CADH. 
Todo e qualquer caso individual no sistema interamericano começará na Comissão, a Corte não recebe denúncia, ninguém peticiona diretamente na Corte. No final do procedimento da Comissão, se entender que houve violação, o caso pode ser remetido à Corte, caso o Estado não cumpra as recomendações da Comissão. 
A Comissão tem um mandato super extenso além do procedimento de recebimento das petições individuais. Realiza uma série de campanhas de DH, produz relatórios sobre temas específicos de violações de DH e também dá conta dos casos individuais. Mas a Comissão, não é uma Corte, ela é um órgão político, então as suas decisões são todas soft law e não obrigatórias. Já a Corte não é órgão político, mas sim jurisdicional, suas decisões são obrigatórias – art. 62 da CADH e art. 38 do Estatuto de Justiça da ONU – as sentenças dos órgãos jurisdicionais internacionais são obrigatórias, não sendo soft law, mas sim fonte formal de direito. 
A Comissão tem mandato sobre todos os Estados, porque ela foi criada pela Carta da OEA. A diferença da situação 1 para a 2 diz respeito sobre os Estados que não ratificaram a convenção. Mas a prática tem mostrado que na situação 1 e 2 a diferença não foi tão grande, pois existe o princípiode que os órgãos de uma OI podem se regulamentar a partir do tratado constituinte. A comissão é intermanete organizada pelo Estatuto e o Regulamento (estabelecido pela própria Comissão) – e tanto no estatuto quando no regulamento as funções que a comissão desempenha é muito parecido nos Estados na situação 1 e na situação 2. 
Estados como EUA e Canadá (não fazem parte do Pacto de San José) podem ter petições individuais recebidas pelas violações cometidas por estes Estados, que são encaminhadas para a Comissão. Mas neste caso, só pode examinar determinadas violações – direitos estabelecido na DADH, vai examinar apenas estas violações. Diferente da situação 3, em que poderá examinar violações 
Nas situações 1 e 2, estatuto e regulamento criaram a possibilidade da Comissão examinar petições individuais de Estados que não ratificaram a Convenção e nem a Carta. Aqui é a comissão que vai dar a recomendação, não tendo o que se falar em decisão da Corte sobre casos individuais. 
Na situação 3, houve um reconhecimento voluntário da obrigatoriedade da Corte IDH, podendo o caso ser encaminhado para a Corte, que dará decisão obrigatória e não soft law. 
Os casos começam sempre na Comissão Interamericana de DH, que terá procedimento parecido com o devido processo legal judicial - produção de provas, tentativa de conciliação, mas não conseguindo e entendendo haver violação a Comissão vai produzir recomendações e caso estas não sejam cumpridas pelo Estado violador, se for o caso da situação 3, o caso poderá ser levado para a Ct. IDH. 
Alguns entendem que a Comissão é um órgão político e outros entendem que é quase judicial. Político porque não é um órgão estritamente judicial, porque suas recomendações não são vinculantes, mas é um órgão quase judicial, porque funciona de forma muito parecida com a Corte nos casos individuais. As recomendações são muito parecidas com as sentenças, se apresentando de forma jurídica, mas o órgão em si não tem natureza estritamente jurídica. Quem compõe este órgão: 7 comissionados especialistas, não sendo representativos dos Estados, com isso são pessoas agindo em nome próprio e não estando dependentes à vontade do Estado, dando a estes órgãos certa independência com relação às políticas externas dos Estados – art. 36 da CADH. Art. 37 da CADH; art. 39 da CADH. 
Art. 44 da CADH: mecanismos de petições individuais -> estabelece a legitimidade ativa: qualquer pessoa ou grupo de pessoa ou entidade governamental. Não precisa ser nacional do próprio Estado para peticionar contra ele e nem residente. Apesar de não estar previsto explicitamente a prática do sistema é pedir uma procuração da vítima – a vítima ou o seu representante tem que autorizar que leve o seu caso. Esse caso passa por uma análise de admissibilidade e mérito – tramitado este caso na Comissão, esta pode determinar que o caso seja enviado para a Corte. Chegando na Corte, se começa um processo judicial estrito senso. 
Art. 52 da CADH: composição da Corte -> mandato de 06 anos, podendo haver recondução. Essa corte produz sentenças no final que são vinculantes. 
A Corte se manifestou com relação à obrigatoriedade das recomendações da Comissão, afirmando que tais recomendações não são obrigatórias, mas afirma que existe um princípio que diz que os tratados devem ser aplicados de boa-fé – então não se pode afirmar que o Estado pode reconhecer o tratado, mas não reconhecer o que a Comissão produz, que é órgão desse tratado, seria violação ao princípio da boa-fé das obrigações do tratado -> estaria violando o tratado, se não cumprisse o que o órgão do tratado estabelece.
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Aula 12 – Rio, 25.09.15
-Sistema Regional -> Sistema regional de proteção de DH da América, que é o sistema OEA. O sistema interamericano tem uma estrutura interna muito parecida com a ONU. 
As razões que guiaram todas essas negociações universais de proteção de DH para a formação desse sistema americano regional: 1)o fato de trabalhar com região facilita a proteção, se está mais próximo dos Estados latinos – um número menor de Estado facilita o consenso; 2)a questão da língua; 3)questão de semelhanças culturais, institucional e histórica (processo de colonização). Isso faz com que seja mais fácil implementar decisões regionais do que globais. Exemplo: Recurso de Amparo – espécie de MS para proteção dos DH (o Brasil não adota este recurso). -> Justificando a criação de sistemas regionais, além disso, cria uma rede mais densa de cooperação entre os Estados, o que facilitaria uma força geopolítica. 
-Corte -> Para que a Corte possa exercer a sua competência contenciosa (também tem uma competência consultiva), os Estados partes da Convenção precisam também concordar com a cláusula do art. 62, I da CADH – ratificar OU aderir a Convenção e explicitamente dizer que reconhece a competência contenciosa da Corte para casos individuais e para a interpretação correta da Convenção. A competência contenciosa é restrita aos Estados-membros da Convenção e que tenham explicitamente reconhecido a competência contenciosa da Corte. 
A competência consultiva – art. 64: quem pode fazer uso da competência consultiva da Corte são os Estados-membros da OEA e qualquer órgão previsto pela Carta da OEA podem pedir a competência consultiva da Corte. A opinião que se pede é sobre a interpretação da Convenção Americana ou de outros tratados concernentes à proteção de direitos humanos dos Estados Americanos. E também há a atribuição da Corte prevista no §2º: análise da compatibilidade de leis internas – é como se fosse uma espécie de controle abstrato da Corte sobre determinada disposição interna de determinado Estado-membro da OEA -> o Estado está na dúvida se certa lei que ele tem é compatível ou não com a Convenção e por isso pede essa consulta. – exemplo: art. 13; art. 13,§2º; art. 13,§3º - artigo que já foi usado para dar opinião consultiva. 
-Processo no sistema interamericano -> art. 44 da CADH: qualquer pessoa pode apresentar à Comissão (CIDH) petições individuais. Esse procedimento está na Convenção (art. 44 a 51) e também no Regulamento da Comissão. 
Art. 44: legitimidade ativa para peticionamento. 
Art. 45: possibilidade de litígio interestatal, resguardada a condição da reciprocidade: os dois Estados têm que autorizar explicitamente essa possibilidade. É o caso de um Estado contra o outro, em que um aponta a violação de DH cometida pelo outro. 
Art. 46: admissibilidade -> §1º, alíneas “a”, “b” e “c” - esgotamento de recursos internos, proibição de litispendência internacional, respeito ao prazo. §2º: “a”: existe recurso, mas na prática aquele recurso não é idôneo; “c”: demora injustificada - houve demora para julgamento; “b”: respeito ao prazo. Este exame de admissibilidade é feito a partir de um contraditório. Isso vai ser enviado para o Estado que vai se pronunciar e devolve. A comissão emite relatório de admissibilidade. 
Art. 48: Quando a petição é admitida ela se transforma num caso e aí começa a se discutir o caso em si. Vão existir audiências, vai se tentar a conciliação. 
Art. 50: Não alcançado a solução amistosa, vai se produzir o relatório de mérito. Faz as primeiras recomendações que os Estados devem seguir e ele é sigiloso, tendo o Estado um prazo para cumprir estas recomendações, sugerindo modificações para que tal situação não se repita – manda confidencialmente para o Estado. 
Art. 51: se no prazo de 03 meses, as recomendações não tiverem sido cumpridas, a Comissão poderá emitir a sua opinião e conclusão. É formulado outro relatório, que pode se tornar público, diferente do relatório do art. 50 e é super temido. É aqui que se faz a diferença entre as Situações 1, 2 e 3. 
Comissão fez o relatório do art. 50 sobre o mérito. Entendeu que houve violações, sugere modificações internas no Estado, para impedir que aquela situação se repita. Não sendo cumpridas as exigências do art. 50, a Comissão tem a seguinte opção: caso o Estado tenha reconhecido a cláusula facultativa, a Comissão envia o casopara o Corte – art. 51, §1º.
Mas se o Estado não tiver reconhecido a cláusula facultativa ou se a Comissão entender que não há necessidade do envio para a Corte, o relatório se torna público, publicando no site e causando constrangimento muito grande para o Estado violador (“naming and shaming”). o que se aplica nas Situações 1 e 2. Quando não quer a competência contenciosa da Corte, mas todos vão saber que você é um violador de DH, porque o relatório vai se tornar público. 
Sendo o caso enviado para a Corte, esta avalia muitas coisas novamente, se iniciando o processo judicial. 
Até 2009, quem litigava era a própria Comissão (quando remetia o caso para a Corte, mudava de papel e passava a ser uma espécie de promotor, processando o Estado violador, passando a ser uma parte interessada) e a vítima tinha pouquíssima atuação. 
Mas a partir de 2009, só a Comissão envia o caso para a Corte, e uma vez recebido o caso, passamos a ter duas figuras no polo ativo: a Comissão e os representantes das vítimas (os peticionários) contra o Estado. Mas o Estado sempre tem mais recursos financeiros e os peticionários são sempre mais pobres para conseguir produzir provas e viajar para Washington e Costa Rica (onde a Corte fica). Não era exatamente 2 contra 1, mas sim 2 pobres contra 1 grande. 
Só que isso deu briga, pois os Estados começaram a falar que era 2x1, ferindo o princípio da paridade das armas e por isso teve outra reforma, que está em vigor. -> A comissão remete o caso para a Corte – remete o relatório do art. 50 para a Corte e os representantes das vítimas (peticionários) é quem vão litigar e fazem a demanda e vão litigar na Corte contra os Estados – representantes das vítimas X Estado. A comissão não litiga mais, apenas cumpre um papel de custos legis, não estando mais no polo ativo. 
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Aula 13 – Rio, 30.09.15
CASO GUERRILHA DO ARAGUAIA 
-Justiça de Transição -> é um termo recente, que começou após a 2ª GM, quando a comunidade internacional se viu diante de toda aquela atrocidade, herança ruim do período nazista e o incomodo de ter que lidar com essas violações de DH. A justiça de transição se preocupa com essa situação de graves violações de direitos humanos, acontecidas durante os períodos ditatoriais e que ficam sem resposta uma vez feita a transição para o regime democrático. É um termo que vem sendo utilizado para a comunidade jurídica. 
Antecedentes dessa discussão -> Críticas aos tribunais de Nuremberg e de Tóquio: foram estabelecidos após os fatos. Temos o princípio máximo de proteção de direitos individuais de que não há crime sem pena anterior que o define, e o arcabouço usado nestes julgamentos não existiam a época dos fatos. Em grande parte o sistema universal de DH é uma resposta a essa inexistência de legislação que permitisse a avaliação desses crimes, com isso diversas convenções surgem para lidar com esses crimes cometidos nos períodos ditatoriais. Essa discussão também foi importante na África do Sul na década de 90 no período do Apartheid – uma das marcas desse período é a falta de transparência desse período, então os mecanismos de comissão da verdade foram criados para saber o que ocorreu nesses períodos obscuros. 
Na América Latina tivemos diversos regimes ditatoriais severos, que produziram efeitos sistemáticos e gravíssimos de violações e as transições para o período democrático foram maios ou menos na mesma época da discussão da África do Sul e então começa a ganhar espaço na discussão a Justiça de Transição – quais foram os processos que contribuíram para que os regimes ditatoriais caíssem e os de democratização se reestabelecessem. Tem formas diferentes para que se discute esta transição democrática -> tem que ver se existe chance de retomada do poder pelo regime anterior; verificar se as instituições democráticas estão funcionando. 
No direito, essa discussão entende que é preciso saber o que aconteceu no passado para entender o presente. Junto com a história e a filosofia, o direito discute na justiça de transição 04 grandes temas: a memória, a verdade, a justiça e a reparação. Esses temas marcam preocupações diferentes com relação a essa questão de revisitar o passado para seguir a diante. 
Quando se fala da verdade como um dos pilares do período de transição se quer abrir a caixa preta que é a marca desses períodos – uma das marcas do autoritarismo é a falta de transparência, de publicidade, fazendo oposição ao período democrático. Descobrir a verdade sobre esse período é fundamental. Quem é o titular do direito de ter a verdade? Dualidade: 1)aqueles que viveram diretamente esses episódios da repressão - vítimas (na sua própria pele ou um familiar); 2)para a sociedade – é do interesse de todo brasileiro saber o que aconteceu. 
A discussão sobre a memória é conectada com a discussão sobre verdade. Memória tem a ver não só com identificar os fatos, memória diz respeito a políticas públicas de memória, que são contrárias às políticas públicas de esquecimento, que é algo deliberado. As políticas públicas de memória são modos de se lembrar o que aconteceu para que não se repita. São as políticas que visam institucionalizar a ideia de que precisamos lembrar dos nossos traumas sociais, para que eles não se repitam – política de criação de memoriais, monumentos. Política de memória tem como oposição política de esquecimento, então é uma opção política, podendo o Estado optar por lembrar e esquecer, e se entende que é mais saudável para a sociedade lembrar. 
Quando discuto justiça, essa conjunto de medidas de justiça, eu posso falar de uma justiça que surge da revelação da verdade (descobri o nome do sujeito que torturou, quem colocou a bomba na OAB), remediando feridas que ficaram abertas. É próprio deste campo da justiça quando se fala desses quatro pilares é a investigação e percepção criminal de eventos/crimes identificados. As políticas de verdade não conseguem exercer essa justiça propriamente dita. As comissões de verdade funcionam por um certo período de tempo e tem instrumentos limitados, não tendo o objetivo de serem juízos. Então investigação criminal, que vai dar origem a uma ação criminal em si elas tem um efeito muito especifico com relação a verdade, pois revelam a verdade de forma mais detalhada e tem um efeito em termos de justiça. Quem é o titular dessa justiça: as vítimas e familiares, mas também a sociedade. 
A discussão sobre reparação (nem todos concordam que este é um dos pilares, seria apenas um dos efeitos importantes da discussão de justiça de transição) contempla a discussão sobre justiça em grande medida e vem sempre associada de políticas de verdade e memória, devendo reparar as injustiças no sentido estrito e no sentido público – questão da reparação inclui as medidas de não repetição, então além de reparar a própria vítima, tem que instituir medidas para que tais atos não se repitam -> determinados pela Corte, que inclui estas medidas de não repetição, de reparação. Temos uma titularidade específica/individual (vitimas) e difusa (sociedade). 
Preciso repensar o passado, a História não trata só do passado, pois para entender o presente, tem que saber o que aconteceu no passado. Sempre que se omite capítulos da História, se está produzindo efeitos no presente. O que a História vem descobrindo quando fala sobre aça, gênero e períodos ditatoriais é que as políticas de esquecimento e de falta de transparência, qualquer relação de poder produz efeitos de esquecimentos sobre certos fatos – passa por cima de certos fatos para continuar tendo poder, é como se determinado fato não tivesse existido. A política de esquecimento é uma forma de impedir o acesso à informações. Um dos métodos para descobrir tais fatos é o testemunho e a tradição moral. 
-Caso Guerrilha do Araguaia
A corte é um dos grandes órgãos institucionais para falar sobre justiça de transição, pelo fato de ser uma corte internacional, judicial, sendo as suas decisões vinculantes. O primeiro caso que a Corte decidiu sobre justiçade transição é o caso Barrios Altos vs. Peru; depois teve o caso de La Cantuta; posteriormente teve o caso Almonacid-Aurellano vs. Chile; depois Gomes Lund vs. Brasil (Araguaia); Guelman vs. Uruguai .
No caso Araguaia é precipuamente sobre desaparecimento forçado e não tanto sobre tortura, genocídio. A grande novidade da Corte é a decisão de controle de convencionalidade. 
Capítulo 6 e 7 da Sentença do caso -> A Guerrilha do Araguaia ocorreu na década de 70. Na época não sabia que estava acontecendo, por causa da censura. Mas em 74 começou a ter maior circulação de informações sobre o caso, sobre tortura e desaparecimento forçado, passando a ocorrer as negociações de transição, passando de um regime ditatorial para o democrático. 
Lei da Anistia: objetivo de trazer de volta para o país os brasileiros que tinham sido exilados forçadamente ou voluntariamente e trazer de volta à vida civil aqueles que estavam vivendo de forma clandestina. 
Transição democrática no Brasil -> começa a funcionar ordem democrática no Brasil novamente. Diferente do que aconteceu na Argentina, nós não discutimos o período ditatorial na nossa transição. Com o governo FHC duas leis importantes foram aprovadas, que simbolizaram a nossa anistia: lei que cria a comissão da anistia (10.559) e a lei que criou a comissão dos mortos e desaparecidos (91/40). A lei que criou a comissão de mortos e desaparecidos teve como primeira demanda a investigação dos desaparecidos e o Brasil até então não tinha produzido medidas, sem promover nenhuma ação para revelar a verdade. Tendo estas comissões a intenção de investigação e de reparação, declarando que as pessoas que estavam ali listadas pelas ONGs de familiares foram declaradas mortas e desaparecidas pelo Estado brasileiro, produzindo importantes efeitos jurídicos (inventário, etc.). 
As comissões da anistia conseguiu fornecer muitos dados em termos de memória, mas que tipo de dado são esses? Até então só tínhamos as perspectiva dos familiares, mas com a comissão passamos a saber o que o Estado brasileiro tinha feito – era uma caixa preta até recentemente e isso é importante na discussão sobre a reparação, sendo essa uma invenção brasileira bastante importante. Mas se por um lado essas comissões revelaram e repararam coisas importantes, por outro lado passou a se questionar porque teria que investigar esses crimes se estas pessoas já estavam sendo reparadas e indenizadas? 
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Aula 14 – Rio, 02.10.15
-O Caso Julia Gomes Lund e outros vs. Brasil:
Esse caso nos ajuda a discutir o que é desaparecimento forçado; a discussão sobre lei de anistia; sobre controle de convencionalidade; e em função disso tudo que tipo de reparação pode dar conta dessas temáticas. Sendo tais pontos relativos ao mérito. 
Processualmente temos aspectos interessantes sobre a competência da Corte (ratione temporis) e a discussão sobre um argumento do Estado, que é a famosa fórmula da quarta instância. Tudo isso é apresentado no que chamamos de exceções preliminares. 
1)Fatos do Caso -> golpe militar, governo ficando mais repressivo contra os militantes, iniciando os desaparecimentos. A Guerrilha do Araguaia é um movimento de resistência armado do Partido Comunista contra o governo militar, sendo estes militantes de diferentes partes do país e foram para a selva amazônica para iniciar a guerrilha, pois a resistência urbana não estava surtindo os efeitos que se pretendia, querendo ter o treinamento de guerrilha e conscientizar os camponeses também sobre o que estava acontecendo. Isso foi feito no momento em que havia enorme censura com relação à imprensa, então as pessoas não sabiam, não havia repercussão, sem nem os familiares dos jovens guerrilheiros saber exatamente onde eles estavam.
Foi no governo Médici. Nos primeiros anos dos regimes militares 50 mil pessoas foram detidas, 354 pessoas mortas e desaparecidas e centenas de camponeses foram mortos. Teve a lei de segurança nacional, junto com o AI 5, institui pena de morte, prisão perpétua, que estabeleceu medidas muito mais duras de acessos à informações, documentos e arquivos, restringindo direitos civis e políticos. No governo Médici teve a mudança de estratégia de morte para o desaparecimento forçado, havendo esse movimento também na Guerrilha. A repressão com relação à Guerrilha do Araguaia -> no início da Guerrilha existiam 70 opositores ao regime e contra eles um efetivo de 3 a 10 mil do exército. Começaram a queimar e executar os corpos para que não ficasse nenhum vestígio. 
Já no período da redemocratização passaram a queimar, destruir todos os documentos sobre a Guerrilha. Depois já com a democratização, começaram a criar as Comissões de Verdade, a fim de se saber o que havia acontecido naquele período e onde estavam aqueles guerrilheiros, mas com o desaparecimento de todos os documentos sobre o período, ficou bem difícil. 
Teve também uma política de esquecimento, que teve como marco a Lei da Anistia. Com isso começou um movimento dos familiares e de vítimas da guerrilha, a fim de tentar trazer à tona tudo que aconteceu durante a Guerrilha do Araguaia, ocorreram diversas mobilizações. 
2)Argumentos processuais -> os fatos ocorreram de 72 a 75. O problema que isso traz com relação à competência da corte é que a Convenção só foi aderida (adesão é um ato que é capaz de já gerar responsabilidade internacional) pelo Brasil em 1992 e a competência do reconhecimento contencioso da Corte em 1998. Então como poderia a Corte estar examinando os fatos de 72? A Corte afirma que crimes continuados (desaparecimento) vão gerando efeitos até que eles sejam resolvidos – quando um desaparecimento forçado termina? Quando ele deixa de gerar efeitos? Quando o corpo, ou os restos mortais ou a indicação precisa do local é revelada, tem que ter a informação detalhada do que aconteceu com aquela vítima. O crime de desaparecimento forçado com relação ao Araguaia continua surtindo efeitos até hoje, alcançando período posterior a 92 e a 98, podendo a Corte se pronunciar sobre ele.
A Fórmula da 4ª Instância é o uso do TPI como um tribunal de alçada, como recurso das decisões internas dos Estados. O sistema interamericano tem que ser usado de forma subsidiária. Este é o argumento do Estado brasileiro, de que a Corte não pode deixar que representantes das vítimas se utilizem daquela instância como sendo mais uma instância recursal em respeito ao princípio da soberania. O Brasil diz que nesse caso os peticionários estavam tentando fazer da Corte uma 4º instância, porque não haviam se esgotados as instâncias internas e ainda havia a possibilidade de ingressar com uma ADPF. Se a tese da 4ª instância fosse acolhida, a corte não teria competência para analisar o caso em razão da matéria, pois o Estado brasileiro já controlou tais violações por meio das reparações devidas, não tendo porque a Corte se intrometer nos assuntos internos já resolvidos do Estado. Os peticionários não esgotaram os recursos internos, porque não utilizaram e ADPF e agora essa ação já foi decidida pelo STF e os peticionários estariam tentando utilizar a Corte como 4ª instância. A Corte responde que não está analisando uma inconstitucionalidade, não tem nada a ver com a CRFB de 88, mas sim realizar um controle de convencionalidade – quem ratifica ou adere tratados de DH assume a obrigação de controle de convencionalidade: seus órgãos internos tem que zelar pela conformidade entre atos internos e a convenção que foi assinada – no caso da Convenção de DH tem a Corte que dá decisão definitiva sobre isso. 
Esgotamentos dos recursos internos -> Ação Ordinária de 82 (iniciada por familiares de algumas vítimas – por 19 anos não foi resolvida em primeira instância), Ação Civil Pública (só em 2007 foi procedente para que se formassem grupos para localizar os restos mortais e entrega dos documentos) e ADPF de 2008 (proposta pelo Conselho Federal da OAB e decidida em 2010). Com isso se pode dizer que houve esgotamento dos recursos internos, pois a AO e a ACP -> PRÓXIMA AULA.*
Lei de Anistia -> a grande discussão é o nó dessa decisão. Todos os argumentos contrários à revisão destes fatos partem da Lei da Anistia. Há uma polêmica gigante com relação a sua legitimidade ou não. 
Quando está havendo uma resistência ao regime, sendo claro que se passará para um regime democrático em breve, se negocia uma lei de anistia sem que aqueles que participaram do regime sofram qualquer tipo de represália. A nossa lei da anistia tem sido usada para impedir qualquer tipo de processamento – tem argumentos jurídicos e políticos que resistem a essa legitimidade. A perspectiva preponderante na visão de DH é pela revisão da Lei da Anistia. 
Os argumentos contra a revisão da lei de anistia: prescrição; a não tipificação (princípio da anterioridade – esses crimes quando ocorridos não eram tipificados como crimes); prova (em geral a revisão das leis das anistias acontecem anos depois dos fatos ocorridos). / Argumento político: 
Desaparecimento forçado (mérito) -> é um crime permanente e continuado e não foi tipificado no CP e nem na Convenção. Os artigos violados são os arts. 3, 4, 5, 7 da Convenção Americana. NA ONU existe um relator e uma convenção para desaparecimento forçado. É continuado, pois seus efeitos só cessam quando sabe a localização do corpo os se acham os restos mortais. 
Além disso, muitos direitos são violados (ofensa múltipla) e ele possui certas características: direito à liberdade pessoal (a pessoa é detida ilegalmente); essa pessoa está sofrendo ofensas a sua integridade física, moral e psicológica; direito à vida (depois de tanto tempo desaparecida, pode-se presumir que esta pessoa morreu. Condições para que aquela vida seja exercida dignamente); direito à personalidade jurídica (os familiares tem problemas com relação a bens, à guarda, para sair do país, dificuldade de receber benefícios, pois aquelas pessoas desapareceram). Existe também compreensão de que o desaparecimento forçado inclui violações de direitos a todos os familiares das vítimas, então os familiares também são incluídos como vítimas. É um crime de natureza múltipla e continuada, com isso a Corte responde o problema da ratione temporis, tendo a Corte competência para analisar o caso da Guerrilha do Araguaia. 
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Aula 15 – Rio, 07.10.15
-Exceções preliminares -> competência da Corte. A Corte quando examina os fatos já tem certos eventos destes fatos que estão preventos – a Corte pode apreciar fatos, mas não vai incorporar novos fatos que não foram incorporados pela Comissão. 
São todas as questões que permitem o exame de mérito pela Corte. Sobre isso falamos sobre a competência da Corte.
* Com relação ao esgotamento de recursos internos, este princípio da preclusão é chamado de “Stoppel” – se não teve o esgotamento de recursos internos ou não preencheu os requisitos de admissibilidade, o direito do Estado precluiu – a informação que não foi apresentada em determinado momento processual, não pode ser oferecida mais adiante pela Comissão. A corte não pode receber novos fatos que caracterizam a admissibilidade. 
A Ação Ordinária e a própria Lei da Anistia caracterizam os requisitos de admissibilidade – art. 46 da Convenção: para que uma petição seja admitida será necessária que sejam interpostos e esgotados os recursos internos -> requisitos de admissibilidade. Quais são os argumentos dos peticionários para sustentar que houve o cumprimento destes requisitos? Os peticionários lançaram mão da lei da anistia e de uma ação declaratória ordinária, declarando a responsabilidade do Estado pela morte e desaparecimento de uma vítima (ação que até 95 não havia sido julgada). 
Quais argumentos podem ser formulados em favor das vítimas? Art. 46, 2, “c” -> com relação à Ação Ordinária, podemos falar na demora injustificada para julgamento da demanda -> não se aplicam o prazo de 06 meses e nem o cumprimento de esgotamento dos recursos internos em caso de demora injustificada do Estado sem dar uma sentença. 
Com relação à Lei da Anistia, a relevância dela é que ela impedia que qualquer ação criminal fosse instaurada. Essa lei impediu também que ações ordinárias seguissem em diante. Dificuldade de lidar com qualquer questão desse período, pois a lei de anistia impedia qualquer tipo de tramitação da lei interna. Então para os crimes da ditadura, não havia remédios que pudessem ser utilizados contra aqueles que perpetraram crimes contra a humanidade. 
Estes foram os argumentos de admissibilidade colocados pelos peticionários. Mas quando chegou na Corte, houve uma novidade apresentada pelo Estado: por que os peticionários não se utilizaram da ADPF? Pois independente da AO e da Lei da Anistia, poderiam utilizar a ADPF como recurso interno. Porém, os familiares das partes não têm legitimidade para ingressar com esta ação, além disso, uma ADPF não foi feita para responsabilizar violadores de direitos humanos, ela não é ação própria para poder investigar e sancionar os perpetradores de crimes que caracterizam violação de crime internacional. E o Estado não informou dessa possibilidade no momento em que a ação foi ajuizada em 95, o Estado não avisou que havia o esgotamento de recursos internos por não ter sido utilizada ações como a ADPF, então seria o argumento do Stoppel aqui utilizado. Sendo estas as respostas da Corte para tais argumentos colocados pelo Estado. 
Desaparecimento forçado -> direitos violados: personalidade jurídica, vida, integridade psicológica e física e liberdade pessoal. É um crime que tem natureza múltipla, pois são várias violações em único contexto e é continuado (os efeitos se perpetuam até que a pessoa apareça ou os restos mortais sejam localizados – até lá, o desaparecimento forçado continua acontecendo). 
Leis de Anistia -> Lei 6683/79 – houve movimentação pela anistia aqui no Brasil no final da década de 70, surgindo Comitês de Anistia formados por mulheres. A OAB redigiu o projeto de lei e a lei foi aprovada, permitindo a volta de todos que estavam fora do país, sendo um momento fundamental na História Brasileira. O slogan disso se transformou na impossibilidade de rever qualquer ato também praticados pelos agentes políticos da época. 
A ADPF 153 proposta pelo Conselho Federal da OAB menciona rapidamente o direito internacional, mas ela se centra na interpretação com relação aos crimes conexos. Crimes conexos praticados por dissidentes políticos seriam os de falsidade ideológica, assalto a um banco para depois sequestrar o embaixador, mas a interpretação que foi dada é que aqueles crimes da repressão contra os dissidentes teriam sido conexos com os crimes políticos – autoria diferente, não é preparatório para outro crime que seja política, mas há uma conexão que exista politicamente, mas não materialmente com relação à produção daquele crime propriamente. 
Se alguém tem em casa livros marxistas e é preso por isso e quando chega nos porões da ditadura e começa a ser torturado isso já não veio explicito na lei de doutrina de segurança nacional – seria um crime, mas é conexo, pois estaria agindo na repressão dos dissidentes da ditadura. Não podendo examinar nenhum dos fatos que aconteceram aquele período, nem com relação aos próprios dissidentes e nem com relação aos agentes de estado. 
 O grande argumento do Eros Grau foi histórico: a lei serviu para um momento histórico, então ele defendeu que se ação fosse ser revista isso não deveria ser feito pelo judiciário, mas sim pelo legislativo – argumento histórico e de separação dos poderes. O STF criticou a OAB por ter feito o projeto de lei e agora querer fazer a revisão e a OAB responde que quer rever sim, pois o que fez anteriormente foi o máximo que pôde fazer naquela época, foi o que deu para fazer como solução e conseguir a redemocratização. 
Além disso, teve a nossa política de esquecimento. Muita gente não tem interesse em abrir essa caixa preta e saber o que realmente aconteceu. 
A grande preocupação da Corte era enfrentar a decisão do STF. 
O Caso Barrios Altos vs. Peru é um caso deMassacre -> grupo paramilitar associado a uma ditadura de direita e empreendeu uma guerra contra os marxistas. Houve uma chacina que passou a ser investigada e uma juíza acolheu a denúncia. No Peru, promulgaram uma lei de um dia para o outro que impedia que a justiça comum examinasse crimes daqueles fatos. A juíza entendeu que a lei não se aplicava aos processos cursos, mas dias depois . A Corte decidiu aqui pela primeira vez sobre lei da anistia. Outro caso falando sobre lei de anistia no Peru foi o La Cantuta, mas que não traz novidades com relação a argumentos jurídicos. 
Caso Velasquez vs. Rodrigues -> entendimento da Corte sobre desaparecimento forçado, mas não trata sobre lei da anistia. A Corte entendeu que é uma violação múltipla, continuada, os direitos que são violados com o desaparecimento forçado. E tudo isso foi aproveitado pela ONU, que depois foi aprimorando o conceito sobre este crime.
Depois veio o caso Almonacid vs. Chile, em que Almonacid foi assassinado logo nos primeiros anos de ditadura no Chile. O Chile nem pode ingressar com inquérito, pois surgiu lei de anistia. O Chile ainda não havia ratificado os tratados internacionais relevantes na época da morte do Almonacid, o Chile só foi ratificar no início da década de 80 e os fatos são de 74, então como pode analisar a responsabilidade do Estado por fatos que ocorreram antes da Corte ter competência para isso? A Corte examinou como poderia lei de anistia em contexto que não houve ratificação – para resolver isso colocou o argumento do ius cogens. -> Se a gente consegue entender que certos crimes são violações a ius cogens (genocídio, crime contra a humanidade, desaparecimento forçado, tortura etc.), a contrário senso a proibição da revisão da lei de anistia também é ius cogens. 
No caso Bairros Altos, a Corte colocou o argumento de auto-anistia -> O Estado perdoando a si próprio – se permitimos isso, se entendemos que isso é possível, colocamos em risco toda a relevância desse ramo do direito internacional que se concretizou com tanto custo: direitos humanos. DH trata de violações cometidas pelo Estado, políticas públicas do Estado que possuem graves efeitos de violação de DH. Com isso, estamos enfraquecendo o ramo de direito internacional de DH, pois estamos falando das violações mais graves de D, que é o cerne de toda essa criação de DH. 
No Caso Araguaia a Corte examina o papel das cortes constitucionais -> o STF é a única Corte Constitucional chamada a revisar uma lei de anistia e que não o fez. Além disso, a Corte diz que o STF não cumpriu o papel de Controle de Convencionalidade -> A Corte Suprema não cumpriu com o Controle de Convencionalidade, que é uma obrigação que todos os Estados assumem a aderir ou ratificar determinado tratado – tais obrigações passam a ser obrigatórias, se comprometendo o Estado a proteger os DH e esse compromisso é compartilhado por todas as instâncias estatais que tenha conteúdo decisório. Então como os órgãos do Estado tenham que realizar controle de legalidade e constitucionalidade, eles também tem que realizar controle de convencionalidade, agindo conforme as obrigações das convenções. -> Passamos a reconhecer que a Corte Interamericana de DH é o principal órgão de interpretação da Convenção Americana de DH, e este órgão decidiu em diferentes precedentes que leis de anistia violavam a Convenção Americana, com isso o STF se furtou a realizar o seu controle de convencionalidade e a Corte está então fazendo tal controle. Há, então, uma briga de forças entre a Corte o STF. Vemos a resistência dos nossos órgãos e agentes de estado a cumprir as decisões da Corte, violando o controle de convencionalidade. 
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Aula 16 – Rio, 09.10.15
-Caso Bairros Altos vs. Peru 
O caso diz respeito à execução extrajudicial de 15 pessoas, perpetrada em novembro de 1991, por agentes militares de inteligência membros do chamado “Grupo Colina”, que atuavam como esquadrões de eliminação ligados a um programa de contra insurgência. O massacre teria ocorrido como uma forma de repressão contra supostos membros do grupo “Senedero Luminoso”. 
Durante o processo de investigação iniciado para apurar os fatos do caso, em 1995, foi sancionada a lei nº 26479, que “exoneraba de responsabilidad a lós miliatres, polícias, y también a civiles, que hubieran cometido, entre 1980 y 1995, violaciones a lós derechos humanos o participado en esas violaciones”. A lei exonerava quem tivesse cometido vilações de DH explicitamente.
A lei não foi anunciada publicamente ou debatida, mas imposta - aprovada e promulgada no mesmo dia em que foi apresentada. Ela foi imposta, promulgada de um dia para outro. 
A juíza responsável pelo caso desse massacre entendeu que lei de anistia não se aplicava para aqueles processos que não estavam em curso e resolveu continuar. 
As decisões da Corte foram: estabeleceu que são inadmissíveis as disposições de anistia, as disposições de prescrição, os estabelecimento de excludente de responsabilidade daqueles que cometeram violações de DH. O primeiro ponto importante é que existem certas normas de DH que são irrevogáveis. Esse núcleo de direitos fundamentais de DH que não podem ser violados pelos Estados, é chamado de ius cogens, cuja validade independe da ratificação do tratado pelo Estado. 
O segundo ponto é que as leis de autoanistia conduzem à impossibilidade de defesa das vítimas e perpetuam a imunidade e por isso são incompatíveis com a letra da lei e espírito da Convenção Americana. Como consequência tais leis carecem de efeitos jurídicos e não podem seguir representando os fatos do caso. Cabe ressaltar que a Corte não estabeleceu que tais leis devem ser revogadas, mas fica claro que fica a critério de cada Estado decidir como que o seu ordenamento jurídico interno seja óbice às obrigações previstas na Convenção Americana, é soberania do Estado decidir como isso vai se dar. O mecanismo que cada Estado vai adotar para que essa lei deixe de fazer efeito é uma questão soberana de cada Estado. O Estado vai decidir pelo Congresso, pelo legislativo, vai suspender. A corte não tem esse tipo de competência, o que ela pode dizer é que o Estado deve impedir a alegação de que o seu ordenamento interno é óbice para que cumpra as obrigações de direito internacional. 
-Caso Almonacid Arellano vs. Chile
O caso tratada da execução extrajudicial de Almonacid Arellano, perpetrada por agentes do Estado em 16 de setembro de 1973, poucos dias após a instauração da ditadura militar no Chile.
Uma investigação penal se iniciou para apurar os fatos, mas foi suspensa em 1974.
Em abril de 1978, foi sancionado o Decreto Lei 2191, que concedeu anistia a todas as pessoas que praticaram crimes entre 11 de setembro de 1973 e de 10 março de 1978.
A lei foi aprovada durante a vigência do regime Pinochet, configurando uma auto-anistia. 
Quando a Corte fala em auto-anistia tem a ver com a ideia de perdão para aqueles que foram marginalizados pudessem voltar a conviver, à ordem normal jurídica naquele Estado. Tem esse sentido de perdão por crimes políticos, mas também tem a ver com a ideia de esquecimento. Mas o Estado não pode se auto-anistiar e esquecer das violações que cometeu e tem que investigar e punir estas violações para que isso não volte a acontecer.
Após a reabertura do processo penal em 1992, o processo foi transferido para a Corte. 
Crimes contra a humanidade não podem ocorrer, pois são ius cogens. Na época da execução de Almonacid Arellano, a proibição do cometimento de crimes contra a humanidade já havia alcançado o status de norma ius cogens. Os crimes contra a humanidade produzem violação de uma série de direitos inderrogáveis garantidos na CADH e não podem ficar impunes. 
O Chile não tinha ratificado a convenção naquele momento e a discussão aqui não foi sobre o art. 4º (direito à vida), mas sim os arts. 8º e 25 *. O art. 1º lista as obrigações gerais de respeito e que não podem ser violados. No art. 2º da CADH, está estabelecido o dever de adotar disposiçõesdo direito interno – c/c o Estado deve aplicar os tratados de boa-fé e art. 28 da Convenção de Viena diz que o Estado não pode alegar impedimento interno para deixar de cumprir suas obrigações internacionais -> obrigação dos Estados que ratificaram a Convenção, tem que transformar o direito interno para cumprir as obrigações dos tratados que aderiu e ratificou – é o caso que se deu com a Lei Maria da Penha. teve que mudar o procedimento interno com relação à violência doméstica para cumprir as obrigações assumidas internacionalmente. 
As leis de anistia se constituem per se uma forma de violação da CADH e geram responsabilidade internacional do Estado. Consequentemente, a lei de anistia chilena carece de efeitos jurídicos. O fato de que as leis de anistia teriam sido adotadas conforme o ordenamento jurídico interno ou contra este é indiferente para determinar se estas leis violam a CADH. A Corte busca a ratio legis da lei mais do que o processo de adoção ou autoridade que a emitiu: “aministiar lós graves hechos delictivos contra el derecho internacional cometidos por el régimen militar”. 
Controle de convencionalidade. Aplicação da lei como violação. do ponto de vista do direito internacional os Estados não são obrigados a ratificar tratado nenhum, mas a partir do momento que ratificam, tem que cumprir aquelas obrigações e se aderiram a cláusula facultativa de jurisdição obrigatória passam a ter a obrigação extra de reconhecer a competência obrigatória da Corte. 
*As violações aos arts. 8º e 25 continuam fazendo efeito até que se investigue adequadamente – interpretação parecida com o caso de desaparecimento forçado já visto. 
-Caso Gelman vs. Uruguay
O caso trata da detenção e desaparecimento forçado de María Claudia García, detida em 1976 junto com seu marido, com 19 anos, em estado avançado de gravidez. Claudia García foi privada de sua liberdade por agentes militares. 
Em 1986, já na democracia, o parlamento Uruguaio aprovou a Ley de Caducidad, com base no acordo político feito entre as FFAAS e os partidos políticos em 1984 de modo a concluir a transição democrática. A lei determinou que o exercício da pretensão punitiva para militares e policiais que cometeram crimes até março de 1985 haviam caducado. Foi declarada a constitucionalidade da lei.
Em 2009, a Corte Suprema declarou a inconstitucionalidade da lei, mas teve um plebiscito e a população declarou a lei constitucional. 
Em 2010, a Corte se manifestou novamente pela inconstitucionalidade da lei. O judiciário declarou a inconstitucionalidade e parte da população foi a favor da lei.
A falta de investigação das graves violações de DH revelam o não cumprimento das obrigações assumidas pelo Estado. A lei uruguaia carece de efeitos jurídicos – mesmo que a lei tenha sido respaldada por uma cidadania, não concede automaticamente legitimidade no âmbito internacional. A corte interamericana elabora conceito de democracia interessante, em que a maioria não pode desrespeitar o direito das minorias. Nem tudo pode ser decidido pelo argumento da maioria, pois se tem que levar em consideração o direito das minorias. 
-Caso Araguaia
A Corte discute em especial a ideia de controle de convencionalidade. A Corte reitera o argumento de que a nossa lei é uma lei de autoanistia e com isso viola regras de DH. OS órgãos de Estado são responsáveis por controle de convencionalidade e examina a decisão do STF na ADPF 153. 
A lei da anistia impedia a realização dos artigos que a Corte considerou que foram violados – é a interpretação que a Corte faz desde o caso Bairros Altos -> o interessante é a importância que ela deu ao papel do STF – é importante que seja cumprido o papel de convencionalidade e a Corte é o órgão máximo de interpretação da Convenção e o STF deveria ter levado isso em consideração. A Corte percebeu que o controle de convencionalidade não foi cumprido pelos órgãos do Estado, deixando o Estado brasileiro de observar as suas obrigações internacionais e por isso tendo cometido violações. 
A Corte fala também do effeto utile, que é um padrão, um standard, que é dar efetividade às normas de DH – os tratados não podem ser apenas algo informal, eles têm que produzir efeitos no Estado, não interessando criar políticas públicas que só ficam no papel, tem que implementar e concretizar as políticas públicas assumidas e isso passa por todos os órgãos do Estado, inclusive pelo STF. 
Implementação da decisão da Corte de IDH
O Estado deve conduzir eficazmente, perante a jurisdição ordinária, a investigação penal dos fatos do presente caso a fim de esclarecê-los, determinar as correspondentes responsabilidades penais e aplicar efetivamente as sanções e consequências que a lei preveja. Não está escrito explicitamente que o Estado deve revogar a lei de anistia. 
O Estado deve realizar todos os esforços para determinar o paradeiro das vítimas desaparecidas e, se for o caso, identificar e entregar os restos mortais a seus familiares. 
O Estado deve oferecer o tratamento médico e psicológico ou psiquiátrico que as vítimas requeiram e, se for o caso, pagar o montante estabelecido.
O Estado deve realizar um ato público de reconhecimento de responsabilidade internacional a respeito dos fatos do presente caso.
O Estado deve realizar as publicações ordenadas da sentença.
O Estado deve adotar em um prazo razoável as medidas que sejam necessárias para tipificar o delito de desaparecimento forçado de pessoas em conformidade com os parâmetros interamericanos. 
O Estado deve continuar desenvolvendo as iniciativas de busca, sistematização e publicação de toda a informação sobre a Guerrilha do Araguaia, assim como da informação relativa a violações de direitos humanos ocorridas durante o regime militar, garantindo o acesso à mesma.
O Estado deve pagar as quantias fixadas a título de indenização por dano material, por dano imaterial. 
A lei de anistia não pode ser um impedimento para que se analise outros casos de violação de DH. 
O conceito de reparação transcende a mera indenização pecuniária. Reparar uma violação de DH não é apenas reparar o dano pessoal que aquela pessoa teve, pois tem uma série de medidas que o Estado tem que cumprir: medidas econômicas (indenização, pagamento das despesas com tratamento psicológico), reparações simbólicas (medidas de memória, que a Corte determina que o Estado crie memorais, placas, monumentos, que o Estado publique a sentença da Corte de forma resumida nos jornais de grande circulação e as medidas que a Corte determina), medidas de não repetição (são medidas de políticas públicas. São as mais difíceis de serem implementadas – ensejam mudanças de políticas públicas bastante contundentes, pois tem que criar órgãos novos, criar protocolos de atendimentos às vítimas daquela violação e tem o componente do Pacto Federativo que complica também) – exemplo: não ter leis de anistia, conseguir fazer uma lei de desaparecimento forçado, a Lei Maria da Penha – elas não podem ser apenas uma letra morta, mas devem surtir os seus efeitos de forma efetiva. 
Sobre as implementações realizadas no Brasil, a sentença da Corte diz o seguinte: 
Recebe a notícia de que há no Brasil gestões para uma comissão da verdade, mas isso não exime o Estado brasileiro da responsabilidade da justiça, continua sendo responsável pelas violações.
O Estado brasileiro continua sendo responsável pelas violações e essa responsabilidade só seria sanada por uma investigação penal, não sendo a Comissão da Verdade capaz de sanar isso. 
Foi criada a lei de acesso à informação – art. 13. A Comissão da Verdade foi uma ótima medida, mas não realiza plenamente as nossas obrigações.
O MPF deve promover as investigações e por isso foi criado um grupo de trabalho para criar uma estratégia para isso – decidiram que estes crimes continuam acontecendo (os de desaparecimento forçado) e por isso não são incluídos pela lei de anistia, sendo essa uma tese muito interessante e que foi acolhida. 
Houve um relatório de supervisão de sentença em que a Corte parabeniza oBrasil pelos esforços, pela criação da Comissão da Verdade, pelas atitudes de MPF, mas a Corte estabeleceu que o Brasil continua em violação de DH, enquanto permanecer a vigência da Lei da Anistia.
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Aula 17 – 21.10.15 – Anotações Julia Gutman
Sobre o texto de Judith Buttler - o limbo de Guantánamo 
Guantánamo é um território cubano que os EUA arrendou em 1903, um arrendamento americano para fins militares e de mineração de uma parte da ilha cubana.
Voltou a discussão no pós 11 de setembro. Havia uma enorme discussão acerca da legitimação dos prisioneiros de Guantánamo como prisioneiros de guerra.
Em 1949 a sociedade internacional assinou as Convenções de Genebra, logo depois da Segunda Guerra Mundial. Então as Convenções de Genebra versam sobre as diferentes figuras não combatentes em tempos de guerra e as proteções que elas merecem em períodos de regime militar. Essa proteção inclui uma série de garantias, inclusive a de sempre retornar ao seu país de origem.
O que acontecia em Guantánamo era feito sempre de forma muito sigilosa, ninguém sabia bem o que está acontecendo pois os EUA não deixava. Houve uma enorme manifestação internacional, se fazia uma comparação de Guantánamo com os campos de concentração do nazismo.
Guantánamo era considerada como um limbo jurídico, a pressão internacional gerou uma série de respostas do Estado americano - exemplos: muitos presos estavam presos em segredo, as técnicas de interrogatório eram especiais muitas vezes e também haviam casos em que os presos não faziam ideia do porque estarem presos, não havia tido denúncia, etc.
Em 2004 uma série de habeas corpus foram impetrados para liberar os presos, mas todos esses quase 300 HC foram rejeitados, os EUA alegavam que os presos não estavam em território americano mas sim cubano. Mas no final de 2004 um desses habeas corpus foram parar na Suprema Corte que aceitou.
Em 2005 se criou um procedimento de criação de uma lei, as comissões militares passam a se submeter a um certo procedimento e os presos passam a ter acesso a um advogado mas continuam sem acesso ao poder judiciário.
Em 2006 foi pedido o fechamento de Guantánamo, mas isso não ocorreu.
Em 2009, Obama promete a desativação de Guantánamo, um processo que ainda não se concluiu e que se mostrou muito mais difícil do que se achava.
Os arts. 3° e 4° da 3° Convenção de Genebra são os que Judith Buttler discute em seu artigo. O art. 4° trata do conceito de prisioneiros de guerra (ver).
O art. 5° da Convenção estabeleceu que se houver algum tipo de dúvida quanto ao status de prisioneiros de guerra, o Estado deve considerar eles como prisioneiros de guerra até que algum órgão verifique isso.
Qual o problema dessa Convenção? O modelo de guerra que se discute é a guerra ao terror, que foi estabelecido a partir de 11 de setembro de 2001. Esse modelo é o que rege, Bush criou esse modelo de guerra ao terror na época. Qual a diferença dessa regra de hoje e da guerra atual? 
Buttler analisa como, através do discurso, vão sendo construídos consensos que geram práticas importantes. Ela fala sobre a replicação de estratégias.
Em seu texto Buttler fala da questão da civilização. Ela fala também de uma guerra que não é entre dois Estados mas entre forças do Estado, que é uma forma ilegítima de violência. Então uma guerra entre Estados seria uma violência legítima, já uma guerra não vinculada à Estados especificamente são ilegítimas, são destituídas de um fim, de um contexto histórico que a justificasse, então só quem poderia se legitimar através da violência seriam os Estados, qualquer outro tipo de uso da força seria considerado como ilegítimo. Então ela fala de neutralização de todo um aspecto político de utilização da violência que seja fora dos Estados. Há então aí um forte cunho político.
Essa diferenciação entre violência legítima e ilegítima, praticada pelos Estados e pelos grupos terroristas respectivamente, gera um processo de desumanização. Essa criação ocidental foi fruto de conceitos ditos universais, mas isso é discutível.
Hoje em dia há uma seletividade do estado democrático de direito, hoje o terrorista é o traficante, e toda essa contração é carregada politicamente, é uma política de Estado. Essa reprodução de determinados conceitos gera uma neutralização e invisibilização de determinadas camadas da sociedade.   
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Aula 18 – 23.10.15 - Faltei! Pegar aula. 
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Aula 19 – 28.10.15 - Faltei! Pegar aula. 
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Aula 20 – 30.10.15 - Anotações Julia Gutman
Qual a bandeira do feminismo? Igualdade ou diferença?
Dados sobre o patriarcado: 51,5% da população é feminina, mas há apenas 1 juíza para cada 3 magistrados; 1 ministro par cada 5 ministros em tribunais superiores; 51 deputadas dentre 513 parlamentares na câmara; 12 senadoras de 81 parlamentares; homens ganham 30% a mais do que as mulheres de mesma idade e nível de instrução; dentre outros dados. Os postos de tomadas de decisão são tomados majoritariamente por homens brancos, que ocupam o tipo da pirâmide, não só no Brasil mas no mundo todo. Por que isso acontece é uma grande discussão.
Teorias feministas: Início da década de 60, junto com o movimento negro, que começou a questionar a desigual oportunidade dos homens e mulheres dentro de um discurso de universalidade que não ocorria na prática. 
O movimento feminista começou a levar a questão da violência contra mulher para o público, antes estava só no aspecto privado. 
Há uma distinção importante também entre sexo e gênero. A naturalização de se tratar diferentemente quem possui um órgão sexual distinto, uma justificativa biológica para tratar diferentemente os homens e as mulheres. Não é porque sou mulher que tenho que estar em um determinado espaço, trabalhar nisso, etc. A mulher é quem ela quiser e faz o que quiser, tem esse direito garantido por lei.
Isso tudo são evidências do patriarcado, ideia essa que foi combatida por essa primeira onda feminista, que é bem liberal, consagrava a ideia do universalismo.
Mais na década de 70 essa bandeira ganhou um novo slogan: o direito das mulheres também é direitos humanos. 
Esse movimento liberal feminista foi bem importante mas muito criticado pela segunda onda feminista, que ressaltava a diferença. Os homens e mulheres não são iguais. A noção de mundo foi criada por uma visão masculina, e ignorar isso seria também uma violência contra a mulher. Final da década de 70, início de 80 mais ou menos essa segunda onda do feminismo (feminismo da diferença). Há de fato diferenças ontológicas entre homens e mulheres, mas isso não implica em desigualdade, subordinação, hierarquia. Então homens homens e mulheres são diferentes mas possuem os mesmos direitos. Então a noção entre homens e mulheres deve ser vista a partir das diferenças e não da igualdade, o que não implica em desigualdade ou diferença de direitos ou garantias. 
Uma autora chamada Robin West fala que isso se relaciona com a possibilidade de gravidez e também de estupro que é da mulher. Outra autora que fala do feminismo da diferença é Carol Gilligan que descobriu que os testes de QI eram formulados a partir de uma forma de mundo androcêntrica (ótica de mundo masculina), o fato é que homens e mulheres desde sempre são criados e moldados para serem diferentes.
Carol Gillian também fala que nós mulheres somos socializadas para desenvolver a ética do cuidado e os homens para desenvolver a ética do direito ou da justiça. As mulheres são mais treinadas a fazer com que exista uma harmonia dos ambientes, maior cuidado das crianças e idosos, maior sensibilidade e intuição, maior pessoalidade, visão mais micro do mundo. E os homens têm uma visão mais macro do mundo, pensamento mais linear.
A violência do patriarcado é que somos tratados e formatados de forma diferente mas depois vemos que essa forma não é boa, não fomos treinadas para uma série de coisas que são valorizadas como competir,mas sim a ser emotiva, carinhosa, etc.
O pensamento liberal e o feminismo geram a promoção de uma série de dicotomias, há uma série de binômios que são típicos do pensamento liberal e são criticadas pela segunda onda do feminismo. Algumas dicotomias como: ego x alterego; sujeito x objeto; indivíduo x comunidade; verdade x erro; mente x corpo; razão x emoção; masculino x feminino. Há não só uma dicotomia radical entre esses conceitos mas também uma hierarquia entre essas dicotomias. As mulheres foram sempre associadas a estes segundos conceitos, assim como os negros e negras, que são associados a trabalhos manuais, ao corpo, por exemplo. O masculino se refere aos primeiros conceitos e o feminino aos segundos.
A solução desse feminismo maternal ou cultural ou relacional (da diferença) seria acabar com a hierarquia, não eliminando as diferenças, mas valorizando as mulheres, inclusive no âmbito das instituições. Isso produziria espaços públicos mais acolhedores às mulheres, o que às fariam se desenvolver mais e melhor. 
Mas esse feminismo da diferença também possui críticas, pois ele reforça estereótipos de gênero. 
A terceira onda feminista critica a existência dessas dicotomias, diz que existem além de duas muitas outras oportunidades. Existe uma série de operações discursivas que vão normalizar essa internalização pelo sujeito de toda uma cultura que não necessariamente lhe é favorável. 
O patriarcado seria essa não essas operações discursivas reiteradas que normalizam o que é homem e o que é mulher, aqui a crítica vai além de sexo, mas de corpo, identidade de gênero, orientação sexual, comportamento social e comportamento sexual. O homem normal e a mulher normal tem corpos diferentes, orientação heterossexual, comportamento sexual viril no caso do homem e comportamento hetero.
A teoria que diz que há mil possibilidades corporais que ainda que não sejam equivalentes não devem ser desprezíveis, isso pode gerar um problema muito grande ao sujeito. Então existem inúmeras possibilidades de identidade de gênero, identidade sexual, comportamento sexual e até corpos biológicos. Essa teoria está dentro dos movimentos pós estruturalistas, que tem Judith Buttler como uma de suas adeptas.
Essa normalização é o patriarcado, que se dá através se operações/práticas discursivas, inclusive através do direito. Para Buttler o gênero não é o que você é mas o que você faz. O discurso científico também é um grande discurso normalizador. Ex: até pouco tempo atrás os gays eram considerados como doença, hoje foi comprovado que isso não está correto.
Violência Doméstica - Características:
- Seriedade da agressão; 
- Situação de continuidade; 
- Intimidade entre vítima e agressor; 
- Estereótipos de gênero; 
- Fracasso do Estado.
Fonte: Bonita Meyersfeld
É uma epidemia. É a maior causa de morte das mulheres e só 5% dos homens. 50 mil mulheres são violentadas no Brasil por ano. ONU: 7 em cada 10 mulheres foram ou serão violentadas ao longo da vida. OMS: 35% dos assassinatos de mulheres são cometidos por parceiros íntimos.
Campanha #meuprimeiroassedio. Assédio sexual não é a mesma coisa que violência doméstica, pode ocorrer dentro de casa e por pessoas conhecidas ou não.
Márcia falou também da cultura do estupro. Existem diversos tipos de violência doméstica como material, psicológico, físico, etc. 
Essa característica de relação de continuidade das violações torna a violência doméstica mais grave. Isso pode gerar um isolamento muito grave também.
Informe 54 da Lei Maria da Penha. Lei Maria da Penha se aplica só às mulheres e isso foi uma enorme discussão. O homem pode sim sofrer violência doméstica, mas não é nas mesmas circunstâncias, isso é muito raro e é muito mais fácil o homem sair desse tipo de situação.
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Aula 21 – 04.11.15
-Feminismo 
Feminismo da igualdade, que é liberal, que se usa das categorias do Estado Democrático de direito: igualdade, racionalidade, que é atribuído ao sujeito, que não tem gênero, que não tem corpo. Mas as feministas perceberam que não era bem assim, pois diversos corpos foram excluídos, entenderam que as mulheres eram naturalmente menos aptas a ocupar os postos de trabalhos. Na década de 60 se quis eliminar essas barreiras que eram jurídicas á participação da mulher na vida social. 
Diversos ordenamentos mantinham essas desigualdades, as mulheres eram subordinadas às vontades dos seus maridos. Uma série de normas que impediam o seu acesso no mercado de trabalho. Essas normas foram caindo gradativamente nas décadas de 60 e 70 – aqui no Brasil só se operou com a Constituição. 
Os papeis sociais passam a ser entendidos como algo construído socialmente e não como algo natural. Essa separação permitiu a crítica social aos papeis atribuídos pelos homens e mulheres.
O feminismo liberal passa a ser criticado por outras correntes feministas, que vão ressaltar as diferenças.
A primeira crítica é que o feminismo liberal não cumpriu tudo que prometeu e que trouxe um ônus para as mulheres. O mundo é criado a partir de uma visão androcêntrica (masculina), que fazia com que a mulher tivesse que se moldar para se adaptar a essa visão que não será a sua visão de mundo . As mulheres para alcançar o mercado de trabalho tinha que se transformar em algo que não era. O problema da questão de gênero era elas serem desvalorizadas.
Outra crítica é que vai ressaltar as desigualdades entre homens e mulheres. Existem muitas formas de ser homem e de ser mulher e viver plenamente a minha identidade sem que ela seja totalmente alinhada a uma visão. O patriarcado heterossexual impõe um padrão, tem que ter uma mulher hetero, um comportamento gentil, doce, sexy – uma série de características que não precisa estar alinhada, é um pensamento mais estruturalista dessa matriz. Posso ter mulheres mais masculinas e heteros, pode ter mulher gay. Existem mil formas de ser mulher e homem. Além disso, pode querer não se definir como homem ou mulher, pode ser trans, travesti, crossdressed. E todas essas visões são discriminadas pela visão hetero, que entende que todas essas formas são patológicas e precisam ser erradicadas. É a visão da Judith Buttler, que entende que o que o hetero quer é manter estes padrões. Esses desvios que devem ser corrigidos explicam as formas de violência que existem – homofobia, violência contra a mulher. 
A violência contra a mulher é disciplinadora, quer manter a mulher naquele papel social. Enquanto que a homofobia é uma violência que se quer erradicar, que retirar aquele sujeito do mundo. 
Como cria essa figura do homem e da mulher normais? J. Buttler diz que eles são criados a partir de performances. O gênero não é algo que tenho, que eu sou, mas é algo que faço, ele é o resultado de uma ação. Que performances são essas? Elas são praticadas através de atos de falas reiterados – existem vários discursos que estamos inseridos e eles reiteram realizações e performances – discurso religioso, jurídico, cultural. Todos estes discursos são influenciados pela prática e produzem a prática. Mas sempre que reitero certo discurso, todos aqueles discursos reiterados se concretizam ali naquele momento. Exemplo: mulher é fútil, gosta de usar cartão de crédito – repito toda uma tradição que deixa de ser passado e se torna presente. Isso não só é produzido porque muitas mulheres realmente são assim, mas tem um efeito de construção da subjetividade: as mulheres passam realmente a agir assim, como se sempre usassem muito o cartão de crédito.
Outro exemplo disso é a violência doméstica. As mulheres que sofrem isso acham que realmente está certo passar por isso, por causa dessa ideia do discurso que é tão repetido. As mulheres tem dificuldade de ver que estão num relacionamento abusivo. 
A violência doméstica não precisa ser só física. Pode ser moral, psicológica, econômica. 
A lei Maria da penha no art. 5º diz que é considerado ação ou omissão baseado no gênero que cause qualquer dano físico, patrimonial, moral, psicológico à mulher, quando isso se dá noambiente doméstico, numa relação intima de afeto ou numa relação de parentesco. Pode ser um parente com quem não habito, uma namorado ou ex-marido, o marido da minha prima que mora comigo (não tem nenhuma relação de afeto ou parentesco, mas habita a casa). O art. 7º define os tipos de violência: sexual, física, moral, psicológica, econômica.
O STF decidiu pela constitucionalidade da lei no dia 8 de fevereiro de 2012. Os argumentos que as câmaras e o TJ usaram para decidir se uma ação é ou não baseada no gênero são: não tem que ser contra a mulher apenas, mas tem que ser uma violência de gênero, tendo cada uma dessas instâncias decidido o que era gênero para eles. 
Estamos falando sobre direito como discurso normalizador, mas vamos falar sobre violência de forma bem ampla. Tem a violência doméstica, a violência praticada pelo Estado (violências praticadas contra mulheres sob custódia do Estado mulheres encarceradas, em hospitais públicos, menores que estão em abrigos, estupro como uma arma de guerra) e a forma de violência contra mulher perpetrada pela própria comunidade (passar ferro nos seios, cortar o clitóris). 
A violência doméstica tem essa marca de que não por definição cometida pelo Estado, mas sim pelo particular. É cometida por alguém que tem uma relação íntima com a vítima; pode ser uma dependência econômica, que também caracteriza uma relação íntima. 
Pode ter um homem vítima de violência doméstica, mas é muito interessante que estaticamente que esse tipo de violência contra o homem é muito pequena. A violência de gênero é essa análise de discussão a partir dos estereótipos de gênero. Existem vários elementos estruturais porque os homens negros, de classe social mais baixa que explica porque eles sofrem muito mais violência policial. O homem pode sofrer violência doméstica, mas isso não é resultado de um sistema, de uma hierarquia de patriarcado, diferente do que acontece no caso de violência doméstica contra a mulher, pois é algo estrutural.
A violência doméstica é algo muito comum do patriarcado. É um problema gritante na questão do gênero. A mulher morre mais de violência doméstica do que de AIDS, câncer e guerra e isso só foi percebido pelo Estado recentemente. A campanha de mulheres foi uma luta para que o Estado reconhecesse. A política era que em briga de marido e mulher ninguém mete a colher, mas a partir da década de 70 o Estado passou a perceber que isso era uma questão que ele deveria intervir sim. 
Surge a lei 9099/95 dos juizados, que julgavam casos de lesão leve. A maioria dos casos de violência doméstica que se encaixavam nessas lesões leves acabavam sempre nas transações e o sujeito apenas tinha que pagar com uma cesta básica, e a mulher retornava para aquele ambiente de violência sem ter coragem de denunciar e prosseguir com a ação. Isso só começou a mudar com o caso da Maria da Penha. O crime foi levado à comissão interamericana de direitos humanos por demora de julgamento nos recursos internos e o Brasil ficou totalmente mudo. O Brasil recebeu uma série de recomendações para que o nosso ordenamento fosse alterado para o tema da violência doméstica fosse melhor tratado juridicamente no direito interno. Em 2001 saiu esse relatório e o Brasil não respondeu. Em 2002 o comitê feminino se reuniu para fazer pressão no Brasil, a fim de que as recomendações fossem cumpridas. Isso foi levado até o STJ e o STF determinou que fosse julgado, devendo o Brasil dar a resposta à comissão interamericana. Mais tarde o CN aprovou a lei, que é considerada a lei mais democrática depois da CRFB/88. 
O problema é que os operadores do direito parecem simplesmente ignorar essa luta que durou 30 anos, nunca tiverem o interesse de ler sobre essa histórica, as estatísticas, nada disso é mencionado pelos tribunais, que começam a dar uma nova interpretação à lei. Isso ficou claro pela leitura dos 138 julgados sobre violência doméstica. Os tribunais começaram até a levantar a questão de que a lei era inconstitucional, mas o STF julgou que era constitucional, sendo uma espécie de ação afirmativa em relação às mulheres. O STF também entendeu que lesão corporal leve em contexto de violência doméstica não é resolvido pelo juizado, mas pelo juizado especial de violência contra a mulher. 
Se o caso for de violência geral, o caso vai para a Vara Criminal. Mas quando a violência é cometida contra a mulher, o caso vai para o juizado especial de violência contra a mulher. O TJ entende que sexo e gênero são realidades diferentes – não basta ter corpo físico de mulher, a conduta é típica quando é perpetrada em razão do gênero. 
A partir da leitura de casos constatou-se que a maior parte é de homens agredindo mulheres. Além disso, as decisões para definir se havia ou não o componente de gênero, os magistrados olhavam para as características de gênero da pessoa agredida para ver se havia ali um componente de gênero. 
Em muitos casos não bastava a vítima ser mulher, tinham que ficar configurados a hipossuficiência, fragilidade, vulnerabilidade da vítima. Pode ser fragilidade física, dependência econômica ou emocional, ou seja, qualificando estes termos. Também estavam presentes expressões como dominação intencional do agressor sobre a vítima, relação de dominação/submissão.
Com isso se conclui que a maior parte dos julgados se refere ao sexo da vítima ou a argumentos biologizantes para determinar se há violência de gênero (e não à relação de subjulgação). Apesar da súmula falar que não deveria se calcar nesse elemento biológico, de que não deveria ser determinante apenas a questão do sexo, mas também a do gênero, isso pareceu ser ignorado nos julgados. 
Argumentos culturais formulados explicitamente emulam argumentos biológicos (vulnerabilidade, fragilidade feminina). Ficou claro que para que o tribunal aplique a lei, a vítima tem que ser enxergada como frágil, vulnerável, senão não será aplicada a lei Maria da penha. 
O problema desse efeito normalizador do direito é que reforça os estereótipos de fragilidade. Por isso que o caso Luana Piovani teve dificuldade de ser aceito. Se a mulher não é frágil e dependente, ela não será protegida pela lei. A questão de ter que ver sexo e gênero era com o objetivo de ampliar os casos, porém isso passou a restringir mais os casos. O que precisam entender é que existe toda uma estrutura social que faz com que a violência exista, não depende da mulher ser frágil, forte – a situação se impõe independente desse atributo pessoal que a mulher tenha. A ocorrência da violência doméstica não pode ser medido pelo poder e força pessoal que a mulher tenha ou não. Existem muitas pessoas empoderadas e ricas que ainda assim sofreram perseguição e foram mortas. O sistema cria hierarquias sociais, opressões, criando condições mais difíceis para uns do que para outros. 
A mulher passa a entrar no mundo do direito, mas acaba sendo incorporada por esse ótica mais vitimizadora e desempoderadora, como se ela tivesse que ser um certo tipo de mulher para poder ter a proteção jurídica. Este é um exemplo de discurso normalizador do direito. 
Outro achado é de que não existe distinção entre sexo e gênero – é aquilo que foi colocado equivocadamente pelas feministas no incício – toda vez que vou definir gênero acaba recorrendo a alguma coisa biológica ou pseudobiológica.
A argumentação da Buttler não é que não existe gênero, mas que é a nossa compreensão sobre o sexo é determinada pelas nossas visões sociais. O que definimos e sabemos e descrevemos como sexo masculino e sexo feminino são determinadas pelos nossos olhares sobre o gênero. Quem disse que mulher é mais vulnerável e frágil que o homem? Para algumas coisas sim, mas para outras não – as mulheres têm muito mais resistência a gripes e outras formas de doença; tem uma série de atributos físicos da mulher que são de força e poder, mas não retratamos dessa maneira. 
Outro discurso normalizador do direito é sobre licença maternidade e paternidade. As mulheres têm direito a 4 ou 6 meses de licença e os homens têm direito a 5 dias

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