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1 2. PARÂMETROS DE MEDIDAS DO ESTADO DA ÁGUA 2.1. Teor em água (H20 %) O teor em água (ou ainda umidade) de um produto mede a hidratação desse produto. Esse teor se expressa em grama de água por 100 g de matéria seca (%H20 s.m.s.) ou para 100 g de matéria úmida (% H2O s.m.u.- sobre matéria úmida). A dosagem de umidade de um produto implica que se define a água que deve ser considerada. Se concorda-se a respeito da dosagem da água líquida existente na forma de soluções (água celular, de inclusão, de inibição, ...), a dosagem da água adsorvida suscita várias controvérsias, particularmente a respeito da definição da água ligada. De um ponto de vista prático, ficaremos com a definição proposta por GUILBOT : "A umidade é a quantidade de água perdida pelo produto quando colocado em equilíbrio verdadeiro com uma pressão de vapor de água nula, em condições nas quais reações de perturbação eventual sejam evitadas." Será então essencial definir um método de referencia (duração, temperatura, granulometria, quantidade, etc.) para a determinação da umidade de cada tipo de produto. A umidade, se ela representa a quantidade de água contida num produto, é insuficiente para informar das múltiplas propriedades funcionais da água como a sua disponibilidade para as reações químicas e bioquímicas. Se é verdade que um aumento de umidade acelera as reações de degradação, não se pode generalizar as observações de um produto a um outro. Assim um cereal à 14 % de umidade é estável quanto um leite em pó com 12 % e certos açúcares com 4 % (!!!) de umidade já pode sofrer várias modificações importantes. Com o objetivo de entender melhor o papel primordial da água nas reações de alteração e as tecnologias de transformação, foi definido um conceito mais qualitativo que dá conta do estado físico da água no produto: a atividade da água, aw. 2.2. Atividade da água A idéia de base da teoria de aw implica que as reatividades independentes e interdependentes dos grupos funcionais químicos que afetam as propriedades dos produtos naturais estão na relação direta com a estrutura do meio ambiente aquoso. Assim no sistema heterogêneo como nos alimentos, a reatividade de cada constituinte é influenciada pela sua afinidade para as moléculas de água e as influencias competitivas dos grupos vizinhos (hidrófilos e hidrófobos) e então a um certo grau, pela arquitetura estrutura - química desse sistema. Qualquer mudança deste meio ambiente que afetará o estado molecular da água poderá modificar as reatividades e propriedades funcionais dos alimentos. As propriedades de um sistema serão influenciáveis pelas energias de ligação água - grupos moleculares específicos e pelas interações entre os constituintes químicos hidrófilos. A atividade da água (aw) é um parâmetro termodinâmico que se define pelo potencial químico da água : µw(P,T) - µ'w(P,T) = R T In aw µw é o potencial químico da água no produto, µ'w é o potencial químico da água pura. Para lembrança, o potencial químico (µi) (GIBBS) representa a variação da energia livre da fase considerada quando o número de moles do componente i varia, à temperatura e pressão constante. µi = δG δni P, T, nj 2 Não se sabe medir experimentalmente as diversas grandezas termodinâmicas G, µi, relativas à um constituinte. Só se sabe medir de fato as variações dessas grandezas moleculares entre um estado dado e um estado de referencia (µref..). ∆ G = µi - µref. = R T ln ai A razão da atividade absoluta sobre a atividade do estado de referência (ai) é chamada "atividade relativa" (número sem dimensão, compreendido entre 0 e 1). No caso que nos interessa aqui, aquele da água, o sistema de referência escolhido é aquele da água pura livre (superfície plane) em equilíbrio com o seu vapor (saturante) à mesma temperatura e pressão que no estado dado (água fixada no sistema). 2.3. Atividade de água e pressão de vapor Se o vapor em equilíbrio com a fase condensada se comporta como um gás perfeito, a razão das atividades absolutas é estritamente igual a razão das pressões de vapor : aw = p (P, T constantes) p' onde p é a pressão parcial de vapor de água no sistema, p' é a pressão de vapor saturante de água pura à mesma T e pressão atmosférica. Por definição, a Umidade Relativa (UR) de uma atmosfera é igual a : U R (%) = p x 100 (número sem dimensão, compreendido entre 0 e 100 %). p’ Se considera-se a umidade relativa da atmosfera em equilíbrio termodinâmico com um produto (fala-se de vez em quando de umidade relativa de equilíbrio ou URE) pode-se escrever : aw = p = U R E % p’ 100 Essa relação é fundamental porque ela dá o único instrumento que permite determinar a atividade de água dos sólidos : é a medida da URE (ver Figura 1). Figura 1. Exemplo de aparelho para medir a atividade da água : Thermoconstanter NOVASINA Humidat - TH2/TH1 3 A atividade de água dá uma escala quantificada da concentração eficaz relativa da água na mistura, em relação a água pura; ela permite medir o potencial da água na maior parte das reações químicas (oxidações, reações de Maillard, denaturações, reações enzimáticas) ou dos processos biológicos (desenvolvimento dos microorganismos) atuando na tecnologia alimentar. É, em particular, um critério muito interessante para apreciar a aptidão de um produto ao armazenar. Pequenas mudanças na temperatura ou outros fatores que influenciam a aw poderão induzir profundas mudanças significativas nas qualidades e estabilidade do produto. 2.4.Correlação entre aw e o teor de água : a isoterma de sorção Quando um produto úmido é colocado em uma atmosfera gasosa contendo vapor de água, tem geralmente intercâmbios de calor de vapor de água entre as duas fases, seja que o produto absorve água e se reumidifica ou seja pelo contrário, quando ele perde água ao benefício da atmosfera até alcançar o equilíbrio termo dinâmico; as temperaturas e pressões são constantes e iguais nas duas fases, a água sendo quantitativamente distribuída entre : - primeira parte, a fase solida, onde pode-se definir o teor em água e atividade da água, e - do outro lado, a fase vapor onde pode-se medir a pressão de vapor da água (Figura 1). A temperatura constante, existe para um produto definido em equilíbrio termodinâmico com atmosfera próxima dele, uma relação unívoca entre o teor em água por uma parte, e a aw desse produto ou UR da atmosfera, pela outra parte. Essa relação, que traduz macroscopicamente as afinidades e interações moleculares se exprime por um gráfico chamado "isoterma de sorção"; este expressa geralmente o teor em água no primeiro eixo e a atividade da água no segundo. Essa isoterma de sorção é uma característica fundamental dos alimentos assim como de vários outros produtos. Um exemplo de isoterma de sorção é apresentada na Figura 2 para os alimentos em geral. Se destaca que a maioria da água dos tecidos alimentares tem uma atividade elevada (várias vezes 0,98) (essa ultima só será reduzida se o conteúdo em água é baixado de 50 % ou adicionando solutos). A parte da curva que corresponde a uma umidade inferior à 25 % é detalhada na Figura 2. Nota-se que aw varia fortemente para pequenas mudanças no conteúdo em água. As isotermas de sorção da maioria dos produtos biológicos apresenta uma forma senoidal. Isso traduz a adição de vários fenômenos elementares que se cruzam mais ou menos. Se destingue três regiões que correspondem cada uma a um tipo de ligação da água : água ligada, água interfacial (multicamada + vicinal) e água de solução (água livre, água de inibição, água de inclusão) (cfr. ponto 4. CARACTERISTICAS E PROPRIEDADES DAS CURVAS ISOTÉRMICAS DE SORPÇÃO E DESORPÇÃO). 4 Umidade Conteúdo (gH2O/g sólidos secos) Figura 2. Isotermade adsorção para os alimentos em geral (mo = monocamada de BET) 3. MECANISMO DE FIXAÇÃO DA ÁGUA E SUA INFLUÊNCIA SOBRE a aw Tabela 2. Constantes físicas da água e do gelo a Peso molecular 18.01534 Ponto de fusão à 1 atm. (º0C) 0.000 Ponto de ebulição à 1 atm. (º0C) 100.000 Temperatura crítica (0ºC) 374.15 Pressão crítica (atm.) 218.6 Ponto triplo 0.0099 ºC 4.579 mm Hg Calor latente de fusão à 0ºC 1.436 kcal/mol: 79.71 cal/g Calor latente de vaporização à 100ºC 9.705 kcal/mol: 538.7 cal/g Calor latente de sublimação à 0°C 12.16 kcal/mol: 674.98 cal/g 20ºC 0ºC 0°C(gelo) -20°C(gelo) Densidade (g/cm3) 0.998203 0.999841 0.9168 0.9193 Viscosidade (cp) 1.002 1.787 - - Tensão superficial contra o ar (dynes/cm) 72.75 75.6 - - Pressão de vapor (mm Hg) 17.535 4.579 4.579 0.776 Calor especifico (cal/g °C) 0.99883 1.00738 0.5018 0.4668 (-2.2°C) (-20.8°C) Condutividade térmica (cal/ (sec)(cm2)(ºC/cm) 1.429 1.348 5.35 5.81 Difusibilidade térmica (cm2/sec) 0.0014 0.0013 +/-0.011 +/-0.011 Constante dielétrica estática 80.36 88.00 91 98 à 3.109 Hz 76.7 80.5 3.2 (25°C) (1.5°C) (-l2°C) ______________________________________________________________________________________________________ a. Copson, Microwave Heating, AVI Publ., Westport, Conn., 1962 Dorsey, Properties of (Ordinary Water-Substance, Reinhold, NY, 1940 Weast, Handbook of Chemistry and Physics, 50th ed., Chemical Rubber Co, Cleveand, Ohio, 1969. 5 3.1. A molécula de água : características físico-químicas O exame das propriedades de água (Tabela 2) e das moléculas de peso molecular e de composições atômicas idênticas (CH4, NH3, HF, H2S, H2Se, ...) destaca o comportamento anormal da água pelos valores altos de seus pontos de fusão e de ebulição, a sua tensão superficial, a sua constante dielétrica, o seu calor específico, seus calores latentes de fusão, de evaporação e de sublimação. A sua densidade é relativamente baixa (com um máximo à 3,98 °C). A viscosidade no seu lado é normal. A água apresenta também a particularidade de aumentar de volume quando ela se solidifica. A condutividade térmica da água é elevada se comparada a outros líquidos. Aquela do gelo é todavia menos elevada que aquela de sólidos não metálicos mesmo sendo 4 vezes superior aquela da água. Menciona-se também a importância das difusabilidades térmicas da água e do gelo porque elas indicam a velocidade segundo a qual as substâncias sofrem mudanças de temperaturas (difusibilidade térmica do gelo 9 vezes mais elevada que aquela da água). Essas particularidades de água são de fato o espelho por uma parte das estruturas particulares da água e do gelo, por outro lado das forças de atração elevadas entre as moléculas. Esses se explicam facilmente examinando a natureza de uma molécula e o seu comportamento em grupo. 3.2. Estrutura da molécula de água A molécula de água é feita de um átomo de oxigênio ligado à 2 átomos de hidrogênio através das ligações σ. A distancia 0-H mede 0.96 Å é o ângulo das duas ligações é de 104º30') (Figura 3). Figure 3. Raios de van der Waals (fase vapor). Esta molécula oferece uma estrutura relativamente tetraédrica, característica do estado de hibridação sp3 dos orbitais eletrônicos do oxigênio (Figura 4). Figura 4. Estrutura da água na descrição pelas ligações de valência utilizando os orbitais sp3 do oxigênio. 6 A forma em V da molécula de água e a polarização das ligações 0-H (Figura 5) implicam uma distribuição assimétrica das cargas e o aparecimento de um momento dipolar de 1,84D para a água (estado de vapor). ↑↑↑↑ δ- ¨ δ- O δ+ δ+ H H Figura 5. Separação das cargas no estado fundamental da água. Este valor elevado do momento dipolar comparativamente dos momentos dipolares das outras moléculas triatómicas é responsável, pelo menos parcialmente, pela interação considerável das moléculas entre elas. As interações elevadas das moléculas de água podem ser explicadas pela atitude da molécula de água ao formar as ligações hidrogênias em um espaço tridimensional. A ligação hidrogênio é uma ligação de natureza eletrostática que se forma entre uma parte um hidrogênio (carga +) ligado por covalência à um primeiro átomo electronegativo (geralmente o oxigênio), e por outra parte a um outro átomo electronegativo tendo um par de elétrons livres (carga -). A ligação H é linear. O seu comprimento varia entre 1.20 Å para H ---- 0 à 2.38 Å para H ---- N. Comparando com as ligações covalentes (energia de ligação na faixa 80 Kcal/mol), as ligações hidrogênios são fracas (menos de 10 Kcal/mol !) e são caracterizadas por distancias maiores e mais variáveis. A ligação hidrogênio com o grupo funcional OH está compreendida entre 3 e 6 Kcal/mol. Como a energia de ligação dos H é principalmente devida às forças eletrostáticas e como o modelo eletrostático da água é simples e leva à uma geometria das moléculas de água tal como ela existe no gelo, a continuação da análise da estrutura de água e do gelo destacam a influência dos efeitos eletrostáticos. Na molécula de água, o oxigênio (fortemente eletronegativo) vai atrair os elétrons da ligação covalente 0-H. Esse levará ao aparecimento de uma carga parcial sobre o átomo de hidrogênio na tela eletrônica. Isto significa que cada átomo de hidrogênio possui certas características do próton. Os estados das ligações 0-H são orientados segundo os eixos de um tetraedro imaginário, pode-se considerar que os eixos representam as linhas de força positiva (sítios doadores de ligação H). Os dois orbitais livres de oxigênio (pares de elétrons livres) orientados segundo os dois eixos restantes do tetraedro imaginário representam as linhas de força negativa (sítios aceitos de ligações H). Assim esquematizada, a molécula de água é capaz de realizar ligações H com um máximo de 4 outras moléculas. Resulta uma arrumação tetraédrica das moléculas (Figura 6). Como cada molécula de água possui 2 sítios doadores e 2 sítios receptores de ligações H, resulta em uma rede regular de ligações H que favorecem a formação de agregados. Isto explica as forças de atração extraordinariamente elevadas das moléculas de água em comparação à de outras moléculas (NH3, HF, ...) com arrumação tetraédrica também. Para essas últimas, as ligações H apenas produzem arrumações irregulares bidimensionais depois do desequilíbrio entre sítios receptores e doadores de ligações H. A aptidão da água a empenhar-se numa rede tridimensional de ligações H fornece uma explicação lógica de suas inúmeras propriedades inesperadas. Os valores elevados do calor específico, pontos de fusão e de ebulição, tensão superficial e calores latentes de fusão, vaporização e sublimação são todas ligadas a sobra de energia fornecida para quebrar as ligações H intermoleculares. A sua constante dielétrica 7 elevada pode ser atribuída a natureza "dipolar" da molécula e à existência de dipolos multimoléculares resultantes da formação das pontes de hidrogênios. Figura 6. Configuração tetraédrica das ligações hidrogênios entre moléculas de água. 3.3. Ionização da água, noção de pH e de pK Se referir ao Capítulo 4 do Lehninger. 3.4. Influência dos solutos sobre a estrutura de água. Mudanças de temperatura e/ou adição de solutos perturba a estrutura de águae modifica a natureza e o tamanho das ligações hidrogênicas. Muitas vezes esses efeitos são analisados em termos de “aumento de estruturação” ou “diminuição de estruturação”. 3.4.1. Efeito dos pequenos íons sobre a estrutura da água O arranjo tetraédrico (estrutura normal) da água pura é perturbada pela presença de solutos dissociáveis. Mesmo que o mecanismo de hidratação dos íons seja ainda polêmico, os íons podem ser agrupados em duas classes: - os íons que, em solução aquosa, diminuem a estruturação da água. Nesse caso a solução virá a ser mais líquida que a água pura (net structure breaking species). - os íons que, em solução aquosa, aumentam a estruturação de água. Nesse caso a solução virá a ser menos líquida que a água pura (net structure forming species). Deve-se destacar que esses dois tipos de íons perturbam a estrutura normal da água. Todos podem, por exemplo, impedir a formação de gelo. A estruturação da água envolve todas as estruturas devidas ou as ligações H normais da água, ou as novas ligações resultantes da presença de íons e de solutos. A aptidão de um íon qualquer à modificar a estruturação da água é aparentemente relacionada ao seu poder polarizante (carga dividida pelo raio) ou mais simplesmente ao seu campo elétrico. - Os íons que são pequenos e/ou multivalentes (principalmente os positivos) como o Li+, Na+, H30+, Ca2+, Ba2+, Mg2+, A13+, F- e OH- (campo elétrico elevado) aumenta a estruturação da água. A nova organização imposta por esses íons compensa certamente a perda correspondente na estrutura normal 8 da água. Esses íons fixam fortemente 4 à 6 moléculas de água vizinhas (essas moléculas ligadas são menos móveis e mais comprimidas que as moléculas H-O-H na água pura). - Os íons volumosos e monovalentes (a maioria dos íons negativos e os íons positivos maiores) como K+, Rb+, Cs+, NH4+,CI-, Br-, N03-, BrO3-, IO3- e ClO4- tem um campo elétrico fraco. Esses íons diminuem a organização de água (o efeito do K+ é muito fraco). A perda da estrutura normal da água devida a presença desses íons não é compensada pela nova organização, implicando na perda de estruturação. Nas soluções salinas concentradas, a estrutura da água existente no caso das soluções diluídas não é mais possível. Só fica a estrutura na proximidade dos íons. Para os íons facilmente hidratáveis, fala-se que a estrutura de água seja equivalente aquela que se encontram nos hidratos cristalinos dos sais. Menciona-se igualmente que todos os efeitos dos íons podem ser modificados até mesmo invertidos em presença de outras substâncias, por exemplo, uma proteína ! 3.4.2. Efeito de solutos capazes de ligações H (compostos polares ou polarizáveis) sobre a estruturação da água. Os principais grupos polares susceptíveis de formar ligações hidrogênio com água são os grupos hidroxila, carboxila, amina (primaria e secundaria) e de forma secundária os grupos aldeído e carbonila. Em princípio, qualquer soluto capaz de realizar ligações H deveria aumentar ou pelo menos deixar constante a estruturação da água. Porém, na maioria dos casos, isso é impossível porque a distribuição e a orientação das novas ligações hidrogênios não são compatíveis com as ligações hidrogênios da estrutura da água pura. Esses solutos terão então efeito destrutivo (por exemplo a uréia). Pelas mesmas razões, esses solutos vão afetar o congelamento. Certos destes solutos não vão afetar em nada o número global de ligações hidrogênios, quer dizer que os números de ligações hidrogênios na solução e na água pura são equivalentes. Isso significa que esses solutos não influenciam a estruturação neutra da água mesmo se eles modificam sua estrutura normal. Essas novas ligações hidrogênios entre a água e o soluto são de primordial importância quando macromoléculas são implicadas. As moléculas de água assim ligadas adquirem as características de uma fase condensada muito densa. Elas interagem entre elas e com o substrato e são organizadas numa rede fixa, mais ou menos ordenada onde elas ocupam posições estaticamente invariáveis (existência de uma zona aquosa e estruturada). É por esse mecanismo que as moléculas de água são adsorvidas sobre as macromoléculas biológicas (polipeptídeos, proteínas, hidratas de carbono) e que a água solubiliza e dispersa os compostos polares a pressão molecular baixa, como os açúcares. 3.5. Importância das interações água - soluto As conseqüências das interações entre as moléculas de água e os grupos polares devem ser examinadas à nível das macromoléculas das quais elas modificam a sua própria estrutura. Globalmente, a afinidade de uma substância biológica para a água é função do número de grupos polares em relação aos grupos apolares de suas acessibilidades estéricas nas moléculas e de suas orientações : assim, por exemplo, os lipídios ou os hidrocarbonos à alta afinidade de grupos apolares, tem pouca afinidade para a água; todavia os glicídios que comportam vários sítios polares são muito higroscópios. Além disso, numa molécula dada, todos os sítios polares não são necessariamente capazes de fixarem água : é assim que, no caso do amido, somente algumas hidróxilas podem fazei-lo. Além das ligações hidrogênios, se faz a intervenção para explicar os fenômenos de coesão da água fazendo referência as forças de natureza iônica, resultando da dissociação de certos grupos, como as forças de Van der Waals. De uma maneira geral, o estado estrutural das macromoléculas, qualquer que seja seu estado físico (liquido, solido, pastoso, gelificado) e seu nível de organização, é essencialmente ligado as interações com a água. 9 3.5.1. Proteínas As interações água - proteínas são de primordial importância. A água e as proteínas são os constituintes principais e vitais da matéria biológica e da nutrição humana. As proteínas influenciam as propriedades da água vizinha e a água por sua vez é responsável para uma boa parte das propriedades das proteínas. As proteínas sem água não são proteínas porque a estrutura nativa e as suas propriedades funcionais normais não existem na ausência de água. Isso justifica a importância dos estudos realizados para analisar em detalhes a relação água - proteína. Intuitivamente estamos na expectativa de uma evolução seguinte no caso da fixação de água pelos grupos de aminoácidos: grupos iônicos > grupos polares > grupos não-polares. Essa evolução foi confirmada pelos trabalhos de KUNTZ (1971) usando polipeptídeos sintéticos homogêneos e a técnica da RMN (Ressonância Magnética Nuclear). Usando esses valores e a composição em aminoácidos e de algumas proteínas globulares, Kuntz conseguiu calcular uma hidratação teórica de revelação teórica que se mostrou muito parecida com os valores experimentais. Tabela 3 : Hidratações dos aminoácidos dos polipeptídeos calculado sobre a base dos estudos de RMN a Aminoácido Água ligada (moles de água/mol de aminoácido) Iônico Asp- 6 Glu- 7 Tyr- 7 Arg+ 3 His+ 4b Lys+ 4 Polar Asn 2 Gln 2 Pro 3 Ser, Thr 2 Trp 2 Asp 2 Glu 2 Tyr 3 Arg 3 Lys 4 Apolar Aa 1 Gly 1 Phe 0 Val 1c Ile, Leu, Met 0 aKuntz (1971) ; Kuntz and Kauzmann (1974). Synthetic polipeptídeos (várias vezes formado de um único tipo de aminoácido) temperatura -35°C, pH controlado. b Suposto, é igual a valor de Lys+ c Valor suposto. Baseado sobre uma molécula de água por amido mais uma molécula de água por cadeia lateral apolar. 10 As interações entre as moléculas de água e os solutos hidrófilos (grupos iônicos e grupos polares) são facilmente visualizáveis porque elas implicam principalmente as interações dipolo - dipolo e íon - dipolo. Resultando, portanto numa arrumação espacial que depende da distribuição das cargas. O cloreto de sódio é uma boa ilustração disso (Figura7). Uma arrumação similar será observada para os grupos iónicos das proteínas (-NH3+, -COO-). Figura 7. Arrumação das moléculas de água adjacentes aos cloretos de sódio (Lewin, 1974) No que diz respeito as proteínas, existe um número elevado de grupos susceptíveis de estabelecer ligações hidrogênias com água (hidróxila, amina, carbonila, amido, imina, ...). A estrutura da proteína pode influenciar a afinidade para a água, por exemplo no diz respeito a acessibilidade dos sitos polares. Os sais são também um dos fatores determinantes na fixação de água pelas proteínas. A hidratação de uma proteína (indiretamente a sua solubilidade) é também determinada pelos processos de desnaturação e de agregação. A desnaturação das proteínas pode ser definida como uma modificação maior da estrutura secundária, terceira e quaternária sem quebra das ligações covalentes. Os efeitos da desnaturação das proteínas sobre sua hidratação podem ser divididos em duas categorias : - os fatores positivos (aumento de hidratação) : 1° quebra das ligações hidrogênias entre solutos (Figura 8.a). 2° quebra das ligações iónicas (Figura 8.b), 3° quebra das ligações mediadas pela água entre os grupos hidrófobos e o grupo hidrófilos (Figura 8.c), 4° dissociação das interações hidrofóbicas (Figura 8.d). Resultando em : 1° Um aumento da superfície interfacial da proteína; 2° Uma diminuição das interações proteína - água; 3° Um aumento das interações proteína - água. - Os fatores negativos (diminuição da hidratação). 1° . Perda da água das regiões interfaciais durante o desenrolamento da proteína; 2°. Agregação das moléculas de proteína desnaturadas tendo como conseqüência a substituição de ligações proteína - água por ligações proteína - proteína. 11 Figure 8. Fatores que favorecem a hidratação da proteína. a- Quebra das ligações H soluto - soluto. b- Quebra das ligações iónicas. c- Quebra das ligações mediadas pela água entre os grupos hidrófobos e hidrófilos. d- Dissociação das interações hidrofóbicas (Lewin, 1974). 3.5.2. Açúcares (poliolosídeos) Os açúcares fazem parte dos constituintes maiores dos vegetais. Eles são tanto elementos estruturais como a celulose quanto elementos de reserva como o sacarose (cana de açúcar , beterraba) ou o amido, principalmente sintetizados á nível das sementes (cereais), dos grãos (leguminosas), de certas frutas e dos tubérculos. As interações açúcares - água apresentam certas analogias com aquelas das proteínas; porem, de forma geral, a dessecação total não denatura os açúcares (ao contrário das proteínas). Pode ter em particular interações hidrofóbicas por rotação das pontes O-glicosicas das cadeias de polissacarídeos. 12 Foi possível demonstrar que os sítios de adsorção de água nos polímeros glucidicos são essencialmente as hidroxilas OH (ver Figura 9). O esqueleto molecular dela mesma não tem nenhuma influência sobre a adsorção. Figura 9. Saturação das hidroxilas de um ciclo glucidico por moléculas de água (c- posição equatorial . a- posição axial ) A ligação é do tipo seguinte: H O H--------------O C H 3.5.3. Lipídeos Os lipídeos mostram pouquíssima afinidade para a água. As interações com os grupos polares levam estruturas particulares (micelas, vesícula, multicamadas). Ver Lehninger (Figura 12-2) para ilustração e texto sobre a formação de micelas. 13 4. CARACTERISTICAS E PROPRIEDADES DAS CURVAS ISOTÉRMICAS DE SORPÇÃO E-DESORPÇÃO. 4.1.Macromoléculas (estruturas amorfas ou parcialmente organizadas) As curvas de sorpção desses produtos apresentam em geral uma forma senoidal, classicamente descrita como tendo três regiões, correspondendo à diferentes mecanismos de retenção das moléculas de água (Figura 10). Os limites dessas regiões se baseiam em parte sobre a estrutura, a mobilidade, as energias de dissociação e a atividade de água. Figura 10. Isoterma de sorpção característica dos alimentos. 4.1.1. Zona 1 (aw compreendido entre 0 e 0,25 aproximadamente) A primeira parte da isoterma corresponde à água de constituição também chamada de água de monocamada ou monocamada de BET. As moléculas de água são fortemente fixadas por várias ligações hidrogênio de forte energia sobre os sítios primários de adsorção (grupos polares). É a água dos carboidratos, água participante das ligações hidrogênias com um grupo iônico ou um dipólo (como a ligação amida das proteínas). As principais propriedades dessa água são : - não congelável, - não disponível como solvente ou reagente, - mobilidade muito reduzida, - energia de ligação de 8 à 10 Kcal/mol. De um ponto de vista quantitativo, essa água representa apenas uma fraca quantidade (máximo 7 g/100 g s.m.s. não lipídica). 4.1.2. Zona 2 (aw compreendida entre 0.25 e 0.75 aproximadamente) A segunda parte, mais ou menos linear e compreendida entre dois pontos de ângulo, corresponde a água interfacial. É a água implicada nas ligações hidrogênio água - água e água - soluto nas camadas diretamente adjacentes ao soluto (água vicinal : 1 até 2 camadas de moléculas de água) ou situadas em um raio maior (água de multicamada : as camadas de moléculas de água compreendidas entre água vicinal e água da solução). Como é praticamente difícil de distinguir água vicinal e água de multicamada, preferiu- 14 se falar de água interfacial. A zona 2 do isoterma de sorpção compreende igualmente água dos poros dos alimentos (microcapilares < 1 µm). As principais propriedades dessa água são : - congelamento difícil até impossível, - disponibilidade reduzida como solvente e reagente, - mobilidade é ligeiramente modificada, - energia de ligação superior aquela da água normal. De um ponto de vista quantitativo, essa água pode atingir 30 g/100 g s.m.s. num alimento. 4.1.3. Zona 3 (aw compreendida entre 0.75 e 0.99 aproximadamente) A terceira parte, quase assintota, corresponde à água livre (água de suspensão diluída) e à água aprisionada (água dos sistemas celulares). A água dos sistemas celulares é fortemente mantida no lugar, principalmente pelas forças físicas. A fração de água correspondendo à esta 3a fase é suficientemente móvel para participar das reações bioquímicas, para servir de meio solvente. O calor de sorção é quase nulo. Ela pode formar localmente, em estruturas complexas, soluções saturadas, interações hidrofóbicas ao redor dos grupos apolares, géis, redes cristalinas de gelo à temperatura muito baixa. Um coeficiente angular da isoterma elevado nesta zona traduz a presença de concentrações elevadas de elementos solúveis, uma grande porosidade do substrato ou a presença de paredes semi-permeáveis (células viventes dos grãos ou dos microorganismos, por exemplo). De um ponto de vista quantitativo, a água da zona 3 representa a maior parte de água dos alimentos frescos ou tratados (não desidratados). Sendo as energias implicadas na ligação de água da zona 3 muito fracas, a retenção desta água é fortemente influenciada por inúmeros fatores, que implicam o caráter pouco repetitivo das medidas de aw nesta região. ========================================================================== A variação de capacidade de retenção de água (water holding capacity) pelo músculo durante diversos tratamentos (prensagem, aquecimento, trituração, etc.) constitui um bom exemplo. Esta capacidade de retenção de água pode ser facilmente medida por prensagem ou centrifugação. Como a capacidade de retenção de água influência diretamente as propriedades organolépticas da carne (caráter suculento, gosto, maciez, cor, ...), ela é de um interesse prático considerável diante de sua transformação. No músculo, a água da solução é aprisionada numa matriz de filamentos. O músculo contém 75 % de água, cujo aproximadamente 5 % é provavelmentede água ligada. O arrumação especial dos filamentos protéicos parece ser na origem da alta retenção da água. O inchamento da matriz protéica aumentaria a retenção de água, quanto a sua retração levaria ao contrário. Isso é ilustrado na Figura 12. Uma interação forte (muitos ligações entre os filamentos protéicos) leva à uma contração da matriz protéica e à uma capacidade fraca de retenção de água. A maioria da água é livre (Figura 12 a). Um número restrito de ligações resultam em um inchamento da matriz protéica. A maioria da água é aprisionada na matriz protéica (Figura 12 b). Na ausência de ligação entre os filamentos protéicos, não se observa nenhuma retenção de água. Isso corresponde a formação de um « solo » (tem dissolução). 15 Figura 13. Influência das ligações entre os filamentos protéicos sobre o inchamento e a retenção de água do músculo (Hamm, 1975). Diversos fatores podem influenciar o inchamento e a retração da matriz protéica : as características do animal tal como a espécie, o sexo, a idade e o tipo de músculo, o pH, o fenômeno « rigor mortis », a maturação e os sais. 1. Os efeitos do pH (Figura 13.) A capacidade de retenção de água atinge um mínimo num pH na faixa de 5, pH isoelétrico da actomiosina (constituinte principal do músculo postrigor). Se o pH aumenta acima de 5, a capacidade de retenção de água aumenta. O mesmo fenômeno se observa para os pH inferiores ao ponto isoelétrico até o pH de +/- 3,5. A diminuição de retenção de água para os pH inferiores à 3,5 ou superiores à 10 resultaria numa desnaturação da proteína. Figura 13. Efeito do pH sobre a capacidade de retenção de água de um homogenado de músculo de boi (Hamm, 1960). O comportamento nos valores intermediários pode ser explicado pela evolução da carga das moléculas protéicas. 2. Os efeitos de rigor mortis e da maturação (Figura 14). 16 Figura 14. Efeito do tempo de maturação postmortem da carne sobre a capacidade de retenção de água (a), o pH (b) e a solubilidade das proteínas miofibrilares (c) (Brendi e Klein, 1970). 2.1o. Rigor mortis (primeiro dia postmortem). Durante o primeiro dia, se assiste à uma diminuição substancial do pH até +/- 5,5, à uma diminuição da solubilidade das proteínas miofibrilares e à uma redução considerável da retenção de água. Este decréscimo da retenção de água é o resultado por 1/3 de uma diminuição do pH (ver acima) e para 2/3 da degradação do ATP. 2.2o. Maturação : Observa-se um crescimento lento do pH, da solubilidade das proteínas miofibrilares e da retenção de água. 3. Os efeitos do pH e dos sais. Os efeitos do pH e dos sais sobre a retenção de água da carne moída estão ilustrados na Figura 15. Nos pH superiores ao ponto isoelétrico, o cloreto de sódio aumenta a retenção de água da carne quando ele atua de forma contrária à um pH inferior. Figura 15. Efeito do cloreto de sódio (2 %) combinado ao efeito do pH sobre a capacidade de 17 retenção de água de um homogenado de músculo de boi (Hamm, 1960). Figura 16. Influência do cloreto de sódio sobre a capacidade de retenção de água da carne moída de boi; o --- sem adição de água. •••• --- com adição de 60 % de água (Hamm, 1957). É bom insistir enfim que a capacidade de retenção de água é fortemente influenciada pela força iônica do meio (Figura 16). ========================================================================= 4.2. Curvas de sorção de misturas: aditividade e riscos de interações Na medida que não tem interações entre as partes constitutivas de uma mistura, as curvas de sorção são aditivas : a curva de sorção duma mistura é a média ponderada, proporcionalmente as massas, das curvas de sorção das diversas frações constituintes da mistura. Assim é possível calcular aproximadamente a aw de uma mistura conhecendo a aw das partes constituintes. Se pelo contrario existe qualquer interação entre as frações da mistura, a curva de sorção final é totalmente imprevisível. Por exemplo, enzimas e microorganismos, apesar que eles sejam ponderavelmente negligentes, podem modificar profundamente o substrato pela sua atividade biológica, e isso ainda mais rapidamente que a aw é mais elevada. Portanto, tem modificação progressiva do substrato e a parte da curva correspondente aos U.R. elevados pode ser assim profundamente modificados. 4.3. Influência da temperatura. 4.3.1. Consideração geral. A temperatura perturba a mobilidade das moléculas de água e, portanto o equilíbrio dinâmico entre as fases vapor e adsorvida. A Figura 17 ilustra os efeitos da variação da temperatura sobre os teores em água e aw. 18 Figura 17. Representação esquemática do efeito da temperatura sobre aw e sobre o teor em água. Si aw é mantida constante, um aumento da temperatura tem como conseqüência uma diminuição da quantidade de água adsorvida. O alimento virá a ser menos higroscópico. Esse comportamento é imposto pela relação termodinâmica, ∆G = ∆H - T∆S. Como ∆G < 0 (a adsorção é um processo espontâneo) e ∆S < 0 (a água adsorvida perde graus de liberdade), ∆H < 0. Então , um aumento da temperatura é desfavorável para adsorção de água e o inverso também. Um comportamento diferente é observado no caso de certos açúcares e outros constituintes de baixo peso molecular dos alimentos que viram a ser mais higroscópicos à temperaturas elevadas pelo fato da sua dissolução na água. Os deslocamentos da isoterma de sorção devidos a temperatura pode ter efeitos práticos importantes com relação as reações químicas e microbiológicas e então sobre a deterioração da qualidade de um alimento conservado num recipiente fechado. Para um teor em água constante, um aumento da temperatura leva ao aumento da aw com o risco de colocar o alimento em condições favoráveis as reações de degradação. Nota-se que uma redução da temperatura leva a um deslocamento da fronteira entre as zonas 1 e 2 (ponto de inflexão) à um valor correspondente à uma umidade elevada e aw mais fraca. Isso significa que para obter uma aw dada, necessitará de menos desidratar se o produto é conservado à baixa temperatura. Também, para uma umidade dada, aw será ainda mais fraca quando o produto é armazenado à baixa temperatura. É importante insistir que o ponto ótimo para a umidade, é dizer o teor em água que corresponde à estabilidade ótima do produto, muda com a temperatura. É difícil extrapolar para diferentes temperaturas, sobretudo quando as trocas de temperatura são importantes. Com efeito, a estabilidade leva em consideração a velocidade de crescimento dos microorganismos e as velocidades das diversas reações químicas, cada uma sendo afetada à diversos graus pelas variações de temperatura. 19 Figura 18. Influência da temperatura sobre a isoterma de sorção de batatas (Görling, 1958). A Figura 18 ilustra um exemplo típico do efeito da temperatura sobre a isoterma de sorção de sorpção de batatas. Nesse caso, observa-se uma separação neta das isotermas. Isso não é sempre o caso, como já mencionado antes. Desvios importantes são igualmente observadas quando mudanças irreversíveis ocorrem num alimento quando a temperatura aumenta. Neste caso as equações de predição das isotermas são apenas aplicáveis nas temperaturas baixas. O interesse de equação que permite a transposição das isotermas de sorção para uma grande gama de temperatura é obvio. Com efeito, a disponibilidade das curvas de sorção à diferentes temperaturas tem uma utilidade prática imediata porque ela permite definir (com certas limitações) os valores ótimos de aw (aqueles que correspondem a uma maior estabilidade) para os alimentos que são expostos à diferentes temperaturas durante o processo de transformação e/ou de conservação. Conhecendo duas isotermas de sorção à duas temperaturas diferentes, podem extrapolar aquelasque correspondem à outras temperaturas pela aplicação da equação de CLAPEYRON-CLAUSIUS. 4.3.2. Isoterma de adsorção à temperaturas inferiores à 0°C. Pode-se também estabelecer isotermas de adsorção de água para as temperaturas inferiores à 0°C. Nesse caso, o estado de referencia é aquele da água em surfusão (Tabela 4). Experimentalmente, foi demonstrado que a pressão parcial de vapor de água de um alimento congelado é igual a pressão de vapor do gelo nas mesmas condições de temperatura. Então é basta conhecer a temperatura do produto para calcular o valor de aw. Na presença de gelo, aw depende unicamente da temperatura, qualquer seja os solutos presentes e independentemente do tipo de alimento. 20 Tabela 4. Pressão de vapor e atividade da água de um alimento à temperaturas inferiores à 0°C Temperatura Água líquida Gelo ou alimento aw (°C) (mm Hg) congelado (mm Hg)b (pgelo/págua) 0 4.579a 4.579 1.00c - 5 3.163a 3.013 0.953 -10 2.149a 1.950 0.907 -15 1.436a 1.241 0.864 -20 0.941b 0.776 0.82 -25 0.605b 0.476 0.79 -30 0.382b 0.286 0.75 -40 0.142b 0.097 0.68 -50 0.048b 0.030 0.62 a valores observados (Weast, 1969) b valores calculados (Mason, 1957) c água pura 4.4. Histeresis da isoterma de sorpção A histeresis é o fenômeno responsável da não-superposição das curvas de desorpção e de adsorpção (Figura 19). A curva obtida na desorpção por secagem progressivo de um produto inicialmente saturado em água corresponde sempre, para uma mesma atividade da água, a um teor em água superior aquela obtida na adsorpção por umidifição progressiva de um produto seco. Esta diferencia de teor em água, de 1 até 5% segundo os casos, confirma que o estado de equilíbrio aparente obtido depende do histórico do produto. Figura 19. Representação do fenômeno de histeresis das isotermas de adsorção-desorção Atualmente, nenhuma explicação clara pode explicar este fenômeno. Varias razões foram avançadas como explicações da histeresis : - as interações entre os constituintes não-aquosos durante a desorpção leva a perda irreversível de sítios para a adsorpção; - os fenômenos de capilaridade nas estruturas porosas (teoria da garrafa de tinta). Esta teoria tem base na equação de KELVIN : R T ln p/p’ = - 2 σ V cos θ / rm 21 onde σ é a tensão superficial V é o volume molar do líquido rm é o raio médio de curva do menisco θ é o angulo de contato (θ = 0 corresponde a adição de água total). No caso da teoria da garrafa de tinta (Figura 20), a perda da água dos pores se realizará apenas quando : pd = p’ exp (- 2 σ V / r1 R T) (Supõe-se uma adição de água total, θ = 0). Na pressão de vapor pd, a totalidade do poro vai se vazar. Figura 20. Teoria da garrafa de tinta para a histeresis. No lado direito, representação de um poro na realidade. - as mudanças de estado assim como a supersaturação, a cristalização; - o enchimento da matriz macromolecular. Este fenômeno de histeresis é de uma importância tecnológica considerável para as operações de secagem e de conservação. Com efeito, segundo que as condições de equilíbrio foram obtidas a partir duma umidade fraca (adsorpção) ou elevada (desorpção), pode-se esperar diferenças de propriedades dos sistemas considerados. Figura 21. Degradação enzimática da lecitina (à 2%) numa mistura de malte de cevada à distintas umidades relativas e à 30°C; depois de 48 dias, as amostras estão colocadas numa U.R. de 70% (Acker & Kaiser, 1969). 22 Figura 26. Variação da atividade enzimática duma lipase de centeio em função do teor em água e da temperatura (Rothe, 1958). Figura 27. Degradação enzimática da lisina e escurecimento de leite em pó em função da atividade de água (Loncin et alii, 1965).
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