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Introdução a Psicologia Analitica de Carl G. Jung

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1
INTRODUÇÃO À PSICOLOGIA ANALÍTICA DE CARL GUSTAV JUNG 
 
Kathy Amorim Marcondes – Prof. Dept. Psicologia UFES 
 
Carl Gustav Jung nasceu em 1875 na Suíça e faleceu em 1961, aos 85 anos de idade, então 
reconhecido como um dos maiores pensadores do século XX. 
Em 1900 graduou-se com honras em medicina e foi trabalhar como Assistente no Hospital Burgholzli de 
Zurique com Eugen Bleuler - famoso psiquiatra que o convida para integrar sua equipe de pesquisa. Jung 
rapidamente destacou-se na psiquiatria e passa a escrever artigos científicos de grande repercussão. Num 
desses artigos declara a sua admiração por algumas das proposições de Sigmund Freud, que na época estava 
sendo duramente criticado pela comunidade médica. Esse apoio foi decisivo para que Freud o recebesse para 
uma primeira conversa que durou 13 horas ininterruptas! A partir da aproximação inicial tornaram-se grandes 
amigos, de enorme intimidade. Contam-se 357 cartas, viagens, mútuas análises de sonhos e encontros 
familiares. Os debates acerca da Psicanálise aproximaram Jung do círculo de discípulos de Freud, mas é 
bastante conhecida a postura preferencial deste pelo o médico suíço, o qual esperava que fosse o “seu príncipe 
herdeiro”. 
“(...)De início, Freud considerou Jung não só seu discípulo mais bem-dotado como também 
o mais importante, seu príncipe coroado, o homem destinado a levar sua obra adiante no futuro. 
Como Freud costumava a dizer, Jung era Josué para seu Moisés. E desde o começo Freud 
percebeu de imediato as vantagens práticas desse relacionamento. Não só Jung mostrara ser um 
formidável defensor das teorias de Freud, não apenas tinha ele suas próprias pesquisas no 
Burghölzgli, que sustentavam independentemente as teorias freudianas numa época em que Freud 
ainda era discriminado de modo geral no âmbito da comunidade acadêmica, como o fato de Jung 
não ser nem judeu nem austríaco significava que a psicanálise podia se defender com mais 
facilidade das acusações de elitismo intelectual e sectário, podendo atrair o interesse simpático de 
um público bem mais amplo.” (PALMER, 2001, p. 118). 
 
Em 1910 quando a "Associação de Psicanalítica Internacional" foi fundada Jung foi eleito seu 
presidente. Em 1914 Jung renunciou à presidência da Associação e demitiu-se como membro devido as 
enormes divergências teóricas e metodológicas entre o seu pensamento e o de Freud. Esse rompimento 
marcou profundamente a história da psicologia pois Freud e seus seguidores edificariam a Psicanálise da qual 
Jung se afastou irremediavelmente, perdendo assim também o amigo. 
 
“Olhando para trás, posso dizer que sou o único que prosseguiu o estudo dos dois 
problemas que mais interessaram Freud: o dos ‘resíduos arcaicos’ e o da sexualidade. Espalhou-
se o erro que não vejo o valor da sexualidade. Muito pelo contrário, ela desempenha um grande 
papel em minha psicologia, principalmente como expressão fundamental – mas não a única – da 
totalidade psíquica. Minha preocupação essencial era, no entanto, aprofundar a sexualidade, além 
do seu significado pessoal e seu alcance de função biológica, explicando-lhe o seu lado espiritual e 
o sentido numinoso. Exprimia, assim, o que fascinara Freud, sem que este o 
compreendesse”.(JUNG, 1993, p.150). 
 
Jung entra num período de crise pessoal; permitiu-se explorá-la ao máximo como pesquisa de seu 
próprio inconsciente. Dessa crise emergiria com o material básico sobre o qual organizaria sua própria 
psicologia da personalidade. Reunindo sua experiência à reflexão elaborará as bases da Psicologia Analítica. 
Seu temperamento jovial reaparecerá anos mais tarde, mas sua pessoa estaria para sempre marcada pelo 
profundo mergulho ao inconsciente que se permitiu, e do qual emergiu com noções mais precisas sobre a 
estrutura da alma humana. Seu pensamento ultrapassou em muito o determinismo sexual da psicanálise. Jung 
emerge certo de que a vida humana é uma realização particular de uma tendência coletiva, governada pela 
psique, de desenvolvimento a condição do ser durante a sua vida. As crises, sintomas e doenças seriam 
oportunidades de elaboração e enriquecimento psíquico. A esse processo vital de crescimento psíquico 
denominou “processo de individuação”, e em suas memórias autobiográficas comenta que sua história é a 
história de um inconsciente que se realizou, ou seja, de um ser humano que concretizou sua tendência a 
superar-se, progredindo sempre. Estudou a energia psíquica como uma expressão da energia sempre a mesma 
em qualquer dimensão de análise, inclusive na física. Estudou o movimento compensatório de equilibração do 
sistema energético do psiquismo e determinou “tipos psicológicos” baseados em seus conceitos de introversão 
e extroversão energética. A partir das suas observações clínicas, do estudo da mitologia, simbologia, alquimia, 
gnose e religiões comparadas Jung extrapolou o cânone epistemológico positivista, hegemônico em sua época. 
Jung foi eleito vice-presidente da Sociedade Médica Internacional de Psicoterapia (SMIP), em 1930. Foi 
condecorado em 1936, com o título de doutor honoris causa pela universidade de Harvard, EUA. O mesmo 
ocorreu em 1938 quando foi condecorado com o mesmo título pela Universidade de Oxford e na Índia diplomas 
de doutorado: Allahabad, Benares e Calcutá. Em 1945 foi honrado com o título de doutor honoris causa pela 
Universidade de Genebra. Em 1955 Jung fez uma última participação no Congresso Internacional de Psiquiatria 
em realizado em Zurique, onde foi homenageado como celebridade. 
 2
“Eranos” foi o único evento cultural que Jung fez questão de participar até o final de sua vida, reunião 
de pesquisadores de várias áreas do conhecimento humano. Essas conferências representavam uma excelente 
oportunidade para encontrar antigos amigos e conhecer novos intelectuais. Jung participou como conferencista 
de 1933 a 1951. Sua ultima palestra foi sobre o tema “Sincronicidade” – o princípio das relações não-causais. 
 
“Eu só posso esperar e desejar que ninguém se torne “junguiano”. Eu não defendo uma doutrina, 
mas descrevo fatos e chamo atenção para certas opiniões que considero dignas de discussão(...) 
Eu deixo qualquer pessoa livre para lidar com os fatos a seu próprio modo, uma vez que eu 
também reclamo essa liberdade para mim (JUNG, 1999, p. 405) 
 
Contudo, em 1948, foi inaugurado o Instituto Carl Gustav Jung de Zurique. 
Em 1959, Jung participou de um programa de TV da emissora britânica BBC, chamado “Face a Face” 
com “John Freeman. Nessa entrevista, quando questionado sobre a religiosidade e sobre sua crença em Deus, 
Jung proferiu sua resposta mais famosa: “Não acredito, eu sei.” Freeman insistiu na divulgação de um livro 
onde suas idéias pudessem ser expressas para a população não médica. Depois de muito insistir Jung 
idealizou o livro “O homem e seus símbolos”, do qual escreveu apenas um artigo. Jung fez questão que essa 
fosse uma obra coletiva, com seus discípulos mais próximos pois intuía não conseguir terminá-la. Jung adoece 
e na tarde de 6 de julho, e morre aos 86 anos. Suas últimas palavras foram : “Esta noite, vamos tomar um vinho 
tinto realmente muito bom.” 
De temperamento alegre, muitos filhos e muitos amigos, Jung deixou uma contribuição teórica impar 
que passou pelo diálogo interdisciplinar com a filosofia, religião, física quântica, arte, mitologia, ecologia, 
ciências ocultas e outros saberes. Assim a Psicologia Analítica tornou-se conhecida como uma psicologia 
profunda, aberta - como nenhuma outra -, ao pensamento contemporâneo transdisciplinar e como uma 
psicologia de ótica privilegiadamente holística da natureza humana e de suas questões existenciais. 
 
A DINÂMICA PSICOLÓGICA 
A Psicologia Analítica adota uma perspectiva energética da psique humana que é base de seu 
entendimento da dinâmica psíquica. Através deste princípio energético é vedada a possibilidade de se entendera psicologia ou a personalidade humana de forma estanque, contendo compartimentos isolados uns dos outros. 
Os conceitos que envolvem o funcionamento e dinamismo da psicologia humana devem, necessariamente, 
coadunar-se com os princípios de funcionamento e dinâmica energética, como qualquer outro sistema movido à 
energia. Por isso Jung conceitua (no sentido de representar um objeto de estudo através do pensamento) a 
psique e o corpo humano como diferentes níveis de organização de sistemas energéticos; ou seja o “psíquico” e 
o “corporal” sendo ambos movidos por energia, e sendo “energia” a mesma em cada um destes sistemas, 
torna-se forçoso admitir que manteriam várias características de funcionamento necessariamente semelhantes. 
Assim a dinâmica psicológica, para Jung, não é movida por uma energia sexual (a libido freudiana) nem por 
uma entidade conceitual abstrata ou transcendental e sim pela energia comum aos processos vitais. 
 
“A delimitação do conceito de energia psíquica nos coloca diante de certas dificuldades, porque 
não temos nenhuma possibilidade de separar o psíquico do processo biológico em geral. O 
biológico comporta um ponto de vista energético, do mesmo modo que o psíquico, desde que o 
biólogo considere semelhante ponto de vista como útil e valioso. Da mesma forma que o psíquico, 
assim também o processo vital, em geral, não guarda para com a energia psíquica nenhuma 
relação de equivalência rigorosamente demonstrável.” ( JUNG, 1971, p. 16) 
 
Compreendendo que quaisquer processos energéticos são movidos por aquilo que conceituamos 
“energia”, Jung não difere a energia dos processos físicos, biológicos ou psíquicos. Assim, a adjetivação 
“energia psíquica”, por exemplo, caracterizaria apenas o processo e o uso da energia naquele determinado 
sistema. 
Assumindo o princípio básico de que qualquer processo energético é efeito de polaridades antagônicas 
em movimento relativo de um a outro pólo, Jung entenderá os dinamismos da psique humana como um 
fenômeno energético manifesto através das polaridades básicas “inconsciente” e “consciência” e de todos os 
derivativos típicos do campo da psicologia. 
Jung aceita o “princípio da equivalência” energética entre os sistemas psíquicos (considerando a psique 
um sistema parcialmente fechado, pois há trocas com o meio ambiente, embora estas façam variar pouco o 
valor energético médio total do psiquismo) que, essencialmente relacionado ao “princípio da compensação” 
energética (pelo qual o deslocamento de valores energéticos no consciente, por exemplo, são compensadas 
necessariamente com o mesmo valor de deslocamento para o inconsciente), são os princípios básicos de 
funcionamento da psique humana. Dessa forma o dinamismo psíquico busca manter o equilíbrio energético da 
psique através destes princípios que, funcionando de forma saudável, produzem a interação criativa entre o 
subsistema consciente e o inconsciente proporcionando uma vida adaptada e produtiva. Quando estes 
dinamismos não se dão de forma harmônica e sim desequilibrada, pode-se perceber estes efeitos nos quadros 
psicopatológicos então produzidos. 
 3
Além dessa perspectiva energética é fundamental para a Psicologia Analítica a perspectiva evolutiva da 
psique humana. Por este prisma Jung compreende que em seu funcionamento milenar a psique humana foi 
aprimorando e marcando certos modelos interativos e reativos. Diferentemente da concepção freudiana que 
entendia que “abaixo” da consciência humana haveria um depositário inconsciente do material proveniente da 
própria vivência daquela pessoa, Jung acreditava que, ainda mais profundamente, a psique era provida de um 
inconsciente não pessoal, coletivo, herdado filogeneticamente como bagagem humana, provindo de toda a 
experiência de desenvolvimento da espécie. 
 
“Uma camada mais ou menos superficial do inconsciente é indubitavelmente pessoal. Nós a 
denominamos inconsciente pessoal. Este porém repousa sobre uma camada mais profunda, que já 
não tem sua origem em experiências ou aquisições pessoais, sendo inata. Esta camada mais 
profunda é o que chamamos inconsciente coletivo. (...) contrariamente à psique pessoal ele possui 
conteúdos e modos de comportamento, os quais são ‘cum grano salis’ os mesmos em toda parte e 
em todos os indivíduos. Em outras palavras são idênticos em todos os seres humanos, 
constituindo portanto um substrato psíquico comum de natureza psíquica suprapessoal que existe 
em cada indivíduo.” (JUNG, 2000, p. 15) 
 
Logo, segundo a Psicologia Analítica, cada ser humano é único, autônomo, direcionado e criativo, mas 
dispõe de um conjunto de sistemas psíquicos, energeticamente ativados e mantidos, que visam ampará-lo na 
realização de sua potencialidade plena e que, parte deste sistema, é patrimônio coletivo, inconsciente, 
suprapessoal e apresenta conteúdos universais. 
 
O inconsciente coletivo é uma parte da psique que pode distinguir-se de um inconsciente pessoal 
pelo fato de que não deve sua existência à experiência pessoal, não sendo portanto uma aquisição 
pessoal. Enquanto o inconsciente pessoal é constituído essencialmente de conteúdos que já foram 
conscientes e no entanto desapareceram da consciência por terem sido esquecidos ou reprimidos, 
os conteúdos do inconsciente coletivo nunca estiveram na consciência e portanto não foram 
adquiridos individualmente, mas devem sua existência apenas à hereditariedade. Enquanto o 
inconsciente pessoal consiste em sua maior parte de complexos, o conteúdo do inconsciente 
coletivo é constituído essencialmente de arquétipos.(JUNG, 2000, p.53). 
 
Os conteúdos do inconsciente pessoal são principalmente os “complexos” de tonalidade emocional, 
conteúdos afetivamente acentuados, que constituem o aglomerado energético relativo a experiências da 
intimidade pessoal da vida subjetiva. Os complexos possuem um núcleo que exerce uma força consteladora 
sobre certos conteúdos psíquicos. "A força consteladora do núcleo corresponde à sua intensidade ou à sua 
energia."(JUNG, 1971, p. 11) Assim vivências traumáticas repetidas em relação à figura materna, por exemplo, 
acabarão por incorporar-se e fortalecer um complexo materno que, de fato, terá muito a ver com as 
experiências individuais daquela psique com a maternidade (papéis maternos, a própria mãe, exercício da 
própria maternidade). 
Ao contrário, os conteúdos do inconsciente coletivo, denominados “arquétipos”, são tipos arcaicos 
primordiais, estruturas do inconsciente impessoal que representam todas as grandes situações humanas 
vivenciadas ao longo do desenvolvimento da espécie humana e não se relacionam essencialmente a vivência 
imediata de uma pessoa apenas. 
Para Jung o arquétipo funcionaria como um nódulo de energia psíquica potencial, que, quando ativada, 
expressar-se-ia sob forma de imagens arquetípicas; por tanto, o que teríamos acesso pela alegoria de um 
sonho, por exemplo, seria na verdade a imagem pessoal ligada a um arquétipo virtual. O arquétipo em si é 
totalmente inacessível, mas as imagens arquetípicas que podem eventualmente ser produzidas pela psique e 
que estão gravadas no patrimônio cultural da humanidade, podem falar da ressonância de um arquétipo. “O 
arquétipo é uma tendência para formar [certas] mesmas representações de um motivo - representações que 
podem ter inúmeras variações de detalhe - sem perder sua configuração original.”(JUNG, 1993, p. 67). Haveria, 
assim, tantos arquétipos quantas situações típicas na vida. Jung considera que intermináveis repetições de 
certas situações e experiências imprimiram essas experiências na constituição psíquica, com o objetivo de 
poderem ser ativadas na experiência pessoal de cada ser se houvesse essa necessidade. Quando uma 
situação energética da psique corresponde ou pode ser equilibrada pela constelação de um arquétipo, então 
este é ativado e surge uma compulsão que se impõe a modo de uma reação instintivacontra toda razão e 
vontade. 
 
“Afora as recordações pessoais, existem em cada indivíduo as grandes imagens “primordiais”,(...) 
ou seja, a aptidão hereditária da imaginação humana de ser como era nos primórdios. Essa 
hereditariedade explica o fenômeno, no fundo surpreendente, de alguns temas e motivos de lendas 
se repetirem no mundo inteiro e em formas idênticas, além de explicar por que os nossos doentes 
mentais podem reproduzir exatamente as mesmas imagens e associações que conhecemos dos 
textos antigos. (...) Isso não quer dizer, em absoluto, que as imaginações sejam hereditárias; 
 4
hereditária é apenas a capacidade de ter mais imagens, o que é bem diferente. (...) Essas imagens 
ou motivos, denominei-os arquétipos (ou dominantes).” (JUNG, 1981, p. 57) 
 
Os arquétipos seriam subsistemas dinâmicos e autônomos, mas não estariam separados ou 
independentes no inconsciente coletivo. Estas imagens virtuais poderiam se fundir ou compor entre si ou junto a 
outros elementos psíquicos, de acordo com a vivência subjetiva de cada um ou com a situação a ser 
ultrapassada. Assim, embora a estrutura arquetípica seja herdada (no sentido de uma tendência a construir 
representações análogas ou semelhantes), a imagem e o uso individual que o ser faria dela em sua vida 
psíquica, dependem tanto do dinamismo dado pelo inconsciente coletivo, quanto da dinâmica pessoal que lhe 
permita o surgimento. 
No entendimento de Jung seria através da imagem arquetípica que a psique coletiva operaria sua 
influenciação sobre o psiquismo individual. Isso representaria uma possibilidade de crescimento e 
amadurecimento pessoal devido à incorporação de elementos coletivos atualizados na vivência pessoal. 
Assim, os arquétipos permanecem “velando” pelo desenvolvimento humano e “emergem” na 
consciência quando o indivíduo compromete seu equilíbrio psíquico. Nestes momentos, o funcionamento 
arquetípico se inicia a fim de tentar uma nova equilibração psíquica baseada no funcionamento autônomo do 
arquétipo. Esta situação é a neurose (quando o ego, centro regulador da consciência movido pela 
racionalidade, está sob a influência de fatores inconscientes) e, em graus muito adiantados, a psicose (quando 
o ego já não tem mais nenhum controle sobre a personalidade). A aproximação arquetípica é tanto mais 
perigosa quanto mais longe de sua meta de desenvolvimento pessoal profundo o indivíduo está, como veremos 
adiante ao estudarmos o “processo de individuação”. 
Quando muito desequilibrada energeticamente estiver a psique, maior a força de fascinação dos 
arquétipos. Para Jung o fascínio desses elementos pode ser percebido não só na atratividade facilmente 
percebida nas pessoas por seus sonhos e produções artísticas, mas também na história das civilizações 
(através de seus mitos e lendas) e na produção intelectual (leis e ciências) da humanidade que, para a 
Psicologia Analítica, também apresenta um desenvolvimento arquetípico. 
 
“Pode-se perceber a energia específica dos arquétipos quando se tem ocasião de observar o 
fascínio que exercem. Parecem quase dotados de um feitiço especial. Qualidade idêntica 
caracteriza os complexos pessoais; e assim como os complexos pessoais têm a sua história 
individual, também os complexos sociais de caráter arquetípico têm a sua. Mas enquanto os 
complexos individuais não produzem mais do que singularidades pessoais, os arquétipos criam 
mitos, religiões e filosofias que influenciam e caracterizam nações e épocas inteiras.” (Grifos 
nossos. JUNG, 1992, p. 79) 
 
OS PROCESSOS DE AUTO-REGULAÇÃO DA PSIQUE 
Uma das mais importantes contribuições da Psicologia Analítica é a concepção de diversos 
mecanismos de auto-regulação da psique. As diferenciações dos níveis consciente e inconsciente pessoal e 
coletivo, que vimos acima, e os processos energéticos de balanceamento entre estes níveis psíquicos operam, 
segundo Jung, de forma auto-regulada. Não apenas a volição, que marca as escolhas do ego de um sujeito e 
que representam a sua vontade consciente, determina mudanças, opções, tendências, pendores, atitudes ou 
comportamentos. Outros “mecanismos” psíquicos também interferem na dinâmica global com o objetivo auto-
regulador: os SONHOS, a PRODUÇÃO ARTÍSTICA e cultural, a PARTICIPAÇÃO RELIGIOSA ou social e o 
próprio impulsivo SINTOMA NEURÓTICO são tentativas auto-regulatórias da psique. Essa percepção permite 
visualizar claramente que tanto as escolhas que buscam a satisfação conscientemente orientada, quanto os 
dinamismos inconscientes e culturais são formas positivas de contribuição para o equilíbrio psíquico global e 
para o crescimento psicológico daquela pessoa humana em particular. Nestes “mecanismos” podemos perceber 
as interações dos diferentes níveis psíquicos atuando, muitas vezes, conjuntamente. 
 
OS SONHOS 
Para Jung os “(...)sonhos são a reação natural do sistema de auto-regulação psíquica.(JUNG, 1990d, p. 
121) trabalhando com imagens e com a carga emocional dessas sem nenhuma interferência da consciência e 
de seus valores. Assim a expressão de impulsos, fantasias ou soluções naturais à psique podem ser 
elaboradas pela psique sem a censura ou limitação egóica. O “(...)sonho deve ser tratado como um fato a 
respeito do qual não se fazem suposições prévias, a não ser a de que eles têm um certo sentido; em segundo 
lugar, é necessário aceitarmos que o sonho é uma expressão específica do inconsciente. (JUNG, 1992, p. 32) 
A análise junguiana do sonho admite a investigação tanto da causalidade quanto da finalidade deste. 
Na primeira abordagem chega-se a complexos inconscientes que carregados de energia geram atividades 
psíquicas. O sonho exerce, então, uma função compensatória de energia psíquica entre os sistemas consciente 
e inconsciente oportunizando: reações de defesa, manifestação de complexos, redução de elementos 
supervalorizados, valorização de elementos conscientemente desprezados, etc. A análise da finalidade dos 
sonhos constitui a maior novidade da abordagem dos sonhos por uma teoria psicológica. Este entendimento 
baseia-se num inconsciente que ultrapassa as barreiras de uma ação por estímulo-reposta ou por memória 
pessoal. O inconsciente junguiano dispõe de todo o acúmulo de informações e sabedoria da espécie ao lidar 
 5
com determinadas situações típicas e que, no caso específico de um sujeito humano, pode aparecer como num 
sonho com uma finalidade, ou seja, num sonho cujo fundamento não é reagir ou recordar, mas alertar e dirigir. 
Essa função prospectiva do sonho, mesmo não sendo propriamente “profética” (já que origina-se do 
inconsciente que dispõe de muitas diferentes fontes de entendimento dos problemas humanos), freqüentemente 
aponta caminhos ou prevê acontecimentos muito antes da consciência ser capaz de fazê-lo. Em ambos os 
casos, quando um sonho é fenômeno causado por uma vivência pessoal ou quando cumpre uma finalidade 
para o sonhador, vemos aí o exercício de funções auto reguladoras do psiquismo. 
 
“Trata-se das mesmas relações que existem entre os sonhos e a consciência de um homem 
normal em estado de vigília. A conexão é, em substância, uma relação compensatória. Os 
conteúdos do inconsciente, com efeito, trazem à superfície tudo aquilo que é necessário, no 
sentido mais amplo do termo, para a totalização, isto é, para, a totalidade da orientação consciente. 
Se o indivíduo conseguir enquadrar harmonicamente na vida da consciência os fragmentos 
oferecidos ou forçados pelo inconsciente, resultará então, numa forma de existência psíquica que 
corresponde melhor à personalidade individual, e, por isso, também elimina os conflitos entre a 
personalidade consciente e inconsciente. É neste princípio que se baseia a moderna psicoterapia, 
na medida em que pode se libertar do preconceito histórico segundo o qual o inconsciente só 
abriga conteúdos infantis e inferiores. Nele certamente existe um recantoinferior, um quarto de 
despejo de segredos impublicáveis que não são propriamente inconscientes, mas dissimulados e 
apenas semi-esquecidos. Mas isto tem tanto a ver com o conteúdo, tomado como um todo, quanto, 
por exemplo, um dente cariado com a personalidade total. O inconsciente é a matriz de todas as 
afirmações metafísicas, de toda a mitologia, de toda a filosofia (desde que não seja meramente 
crítica) e de todas as formas de vida que se baseiam em pressupostos psicológicos. (Grifos 
nossos. JUNG, 1990c, p. 558 ) 
 
O PROCESSO ARTÍSTICO E A OBRA DE ARTE 
A arte representa para a Psicologia Analítica outra possibilidade de autoregulação psíquica por ter suas 
raízes no mais profundamente obscuro e ainda humano do homem, ou seja, no inconsciente coletivo. Pode-se 
perceber a importância da arte nessas poucas palavras em latim que Jung não economizava: “Ars totum requirit 
hominen” (JUNG, 1988, p. 112) que significam: a arte regula o homem inteiro. O efeito regulatório adviria da 
própria atividade artística que, além de ser uma produção criativa, ou seja, movida pela energia criativa do 
inconsciente e não como resposta de simples adaptação, constitui-se numa possibilidade das mais visíveis de 
simbolização do material reprimido no inconsciente pessoal e da imagens arquetípicas do inconsciente coletivo. 
Entretanto, como a amplitude da significação de uma obra de arte é imensa e expande-se sobre vários 
domínios intelectivos, isto não torna mais fácil sua discussão dentro do domínio psicológico que não é o 
domínio próprio da arte. 
Para fazer justiça à obra de arte, a Psicologia Analítica deverá despojar-se totalmente do preconceito 
médico, pois a obra de arte não é uma doença e requer, pois orientação totalmente diversa. (...) Com relação a 
obra de arte é supérfluo investigar o condicionamento anterior. É preciso perguntar pelo sentido da obra. O 
condicionamento prévio só interessa na medida em que facilitar a melhor compreensão do sentido. A 
causalidade pessoal tem tanto a ver com a obra de arte, quanto o solo tem a ver com a planta que dele brota. 
(...) A insistência no pessoal, surgida da pergunta sobre a causalidade pessoal, é totalmente inadequada em 
relação à obra de arte, já que ela não é um ser humano mas algo suprapessoal. É uma coisa e não uma 
personalidade e, por isso não pode ser julgada por um critério pessoal. A verdadeira obra de arte tem inclusive 
um sentido especial no fato de poder se libertar das estreitezas e dificuldades insuperáveis de tudo o que seja 
pessoal, elevando-se para além do efêmero do apenas pessoal. (JUNG, 1985, p. 60) 
Assim, fica claro que não é a natureza pessoal da manifestação artística que orienta o entendimento 
junguiano sobre a arte. Isto seria uma REDUÇÃO do próprio do artístico à uma causalidade psicológica, 
impensável dentro da Psicologia Analítica. 
 
(...)Essas obras praticamente se impõem ao autor, sua mão é, de certo modo assumida, sua pensa 
escreve coisas que sua própria mente vê com espanto. A obra traz em si sua própria forma; tudo 
aquilo que ele gostaria de acrescentar, será recusado; e tudo aquilo que ele não gostaria de 
aceitar, lhe será imposto. Enquanto seu consciente esta perplexo e vazio diante do fenômeno, ele 
é inundado por uma torrente de pensamentos e imagens que jamais pensou criar e que sua própria 
vontade jamais quis trazer à tona. Mesmo contra a sua vontade tem de reconhecer que nisso tudo 
é sempre o seu “si-mesmo” que fala, que é a sua natureza mais íntima que se revela por si mesma 
anunciando abertamente aquilo que ele nunca teria coragem de falar. Ele apenas pode obedecer e 
seguir esse impulso aparentemente estranho; sente que sua obra é maior do que ele e exerce um 
domínio tal que ele nada lhe pode impor. Ele não se identifica com a realização criadora; ele tem 
consciência de estar submetido à sua obra. (JUNG, 1985, p. 61-2. Grifos nossos) 
 (...) A obra nos oferece uma imagem elaborada no sentido mais amplo. Esta imagem, enquanto a 
pudermos conhecer como símbolo, é passível de análise. Mas se não conseguirmos descobrir nela 
um valor simbólico, estaremos constatando que ela nada mais significa, pelo menos para nós, do 
 6
que aquilo que ela diz abertamente, ou seja: que ela é para nós nada mais do que aquilo que 
aparenta. Digo “aparenta” – pois é possível que nossa própria parcialidade não nos permita 
maiores idéias. (JUNG, 1985, p. 68) 
 
Jung distingue, por tanto, obras de arte não simbólicas e obras de arte simbólicas. As primeiras fluem 
do manancial do inconsciente pessoal, de material reprimido, ou seja, artificialmente mantidos abaixo do limiar 
da consciência; mantêm seu caráter regulatório de qualquer forma pois possibilitam, ainda assim, muito maior 
transito energético entre os sistemas psíquicos. A arte com simbologia, a obra de arte propriamente dita, 
ultrapassa em muito as questões pessoais de seu autor. Antes esse é por ela utilizado para erigir-se; melhor 
dizendo, a obra se utiliza do autor para fazer-se. O espírito do artista “serve” a sua própria construção enquanto 
artista, o que significa construir-se enquanto homem criador e não repetidor ou adaptador. O ser do artista se 
faz no ser arte. 
 
 (...)quem fala através de imagens primordiais, fala como se tivesse mil vozes; comove e subjuga, 
elevando simultaneamente aquilo que qualifica de único e efêmero na esfera do contínuo devir, 
eleva o destino pessoal ao destino da humanidade e com isso também solta em nós todas aquelas 
forças benéficas que desde sempre possibilitaram a humanidade salvar-se de todos os perigos e 
também sobreviver a mais longa noite. 
 Este é o segredo da ação da arte. O processo criativo consiste (até onde nos é dado segui-lo) 
numa ativação inconsciente do arquétipo e numa elaboração e formalização da obra acabada. De 
certo modo a formação da imagem primordial é uma transcrição para a linguagem do presente, 
pelo artista, dando novamente a cada um a possibilidade de encontrar o acesso às fontes mais 
profundas da vida que, de outro modo, lhe seria negado. É aí que está o significado social da obra 
de arte: ela trabalha continuamente na educação do espírito da época, pois traz à tona aquelas 
formas das quais a época mais necessita. Partindo da insatisfação do presente, a ânsia do artista 
recua ter encontrar no inconsciente aquele imagem primordial adequada para compensar de modo 
mais efetivo a carência e unilateralidade do espírito da época. Essa ânsia se apossa daquele 
imagem e, enquanto a extrai da camada demais profunda do inconsciente, fazendo com que se 
aproxime do consciente, ela modifica sua forma até que esta possa ser compreendida por seus 
contemporâneos. (...) a arte representa um processo de autoregulação espiritual na vida das 
épocas e das nações. (JUNG, 1985, p. 70-1) 
 
Por tanto, é com muita reserva que Jung vê a possibilidade de uma psicologia discursar sobre uma obra 
de arte visionária. 
Então se torna lícito perguntar que contribuição a Psicologia Analítica poderia dar à compreensão ou 
admiração do problema central da criação artística? Para Jung como toda a ciência, também a psicologia tem 
apenas a modesta contribuição para o melhor e mais profundo conhecimento dos fenômenos da vida, mas está 
tão longe do saber absoluto quanto todas as outras ciências irmãs ou especulações das mais variadas. 
 
“Falamos tanto sobre o sentido e significação da obra de arte, que já não podemos ocultar a dúvida 
que nos assalta em princípio: será que a arte realmente “significa”? talvez a arte nada signifique e 
não tenha nenhum “sentido”, pelo menos não como falamos até aqui sobre sentido. Talvez seja 
como a natureza que simplesmente é e não “significa”. Será que “significação” é necessariamente 
mais do que simples interpretação, que “imagina mais do que nela existe” por causa da 
necessidade de um intelecto faminto de sentido? Poder-se-ia dizer que arteé beleza e nisso ela se 
realiza e se basta a si mesma. Ela não precisa de sentido. A pergunta sobre o sentido nada tem a 
ver com a arte. Se me colocar dentro da arte, tenho que submeter-me à verdade desta afirmação. 
Quando, porém, falamos da relação da psicologia com a obra de arte, já estamos de fora da arte e 
nada mais nos resta senão especular e interpretar para que as coisas adquiram sentido, caso 
contrário, nem podemos pensar sobre o assunto. Precisamos reduzir a vida e a história, que se 
realizam por si mesmas, em imagens, sentido e conceitos, sabendo que, com isso, estamos nos 
afastando do mistério da vida. Enquanto estivermos presos ao próprio criativo, não vemos nem 
entendemos, e nem devemos entender, pois nada é mais nocivo e perigoso para a vivência 
imediata do que o conhecimento.” (JUNG, 1985, p. 66.) 
 
É certo que Jung não vê a essência da obra de arte constituída pelas particularidades pessoais e, ao 
contrário, pensa que sua particularidade é a de elevar-se muito acima do aspecto pessoal: “(...)provinda do 
espírito e do coração, fala ao espírito e ao coração da humanidade.” (1985, p.89). Por isso não se pode esperar 
que o artista seja o intérprete de sua própria obra. 
 
(...)Configurá-la foi sua tarefa suprema. A interpretação deve ser deixada aos outros e ao futuro. 
Uma obra-prima é como um sonho que apesar de todas as suas evidências nunca se interpreta a 
si mesmo e também nunca é unívoco. (...)quem se aproxima da obra de arte deixando que esta 
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atue sobre ele, tal como ela agiu sobre o poeta. Pode compreender seu sentido, é preciso permitir 
que ela nos modele, do mesmo modo que modelou o poeta. (JUNG, 1985, p. 93) 
 
A PARTICIPAÇÃO RELIGIOSA 
A Psicologia Analítica compreende a religião como fenômeno humano de dimensões psicológicas 
profundas. Jung empreendeu vasta pesquisa relativa aos simbolismos religiosos e, assim, concluiu estarem ali 
representados e manifestos importantes processos psicológicos. 
 
(...)O estudo da psicologia dos primitivos, o folclore, a mitologia e a ciência comparada das 
religiões abre a perspectiva de um horizonte mais amplo da psique humana e nos oferece os meios 
indispensáveis para a compreensão dos processos inconscientes. (JUNG, 2000c, p. 91) 
 
Jung entende como dinamismos regulatórios da psique tanto a produção arquetípica dos fundamentos 
religiosos quanto o tipo de participação que a ritualização dos mesmos permite ao indivíduo, dentro do amplo 
espectro de diferentes possibilidades religiosas. 
Ao participar de um mito pela fé (monoteísta, politeísta ou, disfarçadamente, científica) ou pelo rito de 
uma organização religiosa, o homem entra em contato com um tipo de organização que lhe precede a 
existência embora, muitas vezes e por seu maior objetivo, lhe concede a compreensão do sentido da sua 
própria existência. 
Jung sabia, como nós ainda hoje, a impopularidade de se considerar seriamente a religião dentro do 
saber científico. Entretanto, este homem de mente aberta e descontraída não se importou muito com as 
convenções formais e sua esterilidade. Investigou e correlacionou cuidadosamente a psicologia e religião sem 
ver nisso um risco de contágio maldito. Longe disso, sua investigação séria e escrupulosa o levou a uma atitude 
cada vez mais tolerante e respeitosa para com toda a forma religiosa. Desde as manifestações religiosas dos 
povos mais selvagens às centenas de subdivisões internas do cristianismo, desde o culto antigo a Zeus 
antropomórfico ao deus sem face do ascendente islamismo, desde o politeísmo ao ateísmo de algumas 
religiões orientais, desde o cumprimento da função religiosa através da crença indiscriminada na ciência ou nos 
demônios... Jung via - em qualquer destas formas numinosas - o poder do mito religioso: a experiência íntima 
de que algo exterior ao percebido como “eu”, rege e dá sentido à existência deste “eu”. 
Para Jung a religião era “uma das expressões mais antigas e universais da alma humana” (JUNG, 
1990c, p. 1). É preciso esclarecer que de nenhum modo a Psicologia Analítica adota ou privilegia determinado 
conjunto de valores religiosos supostamente verdadeiros ou promulgados por uma igreja qualquer de forma 
superiormente legítima em relação a outra igreja qualquer. Outra consideração reiterada por Jung em muitas 
oportunidades é a de que seus escritos não constituiriam uma versão teológica e nem sequer versariam sobre a 
teologia do ponto de vista teológico. 
Para Jung era esclarecedor que o vocábulo latim religio, provável origem da palavra religião, derivasse 
do verbo religare ou relegere. O primeiro significa algo próximo de “ligar de novo, reatar”. O segundo significa 
“cuidado e atenção minuciosa para a observação do numinoso”. Talvez esses verbos tenham dotado o 
vocábulo do cunho de religiosidade entendida como os detalhes a serem observados na ritualística dos cultos 
que objetivavam, em última instância, novamente reunir o homem ao divino. Podemos nos aproveitar destas 
idéias para construir uma tradução simples do termo como “re-ligação” e, a partir daí, perceber a religião como 
tentativa de re-fazer a reunião do que havia sido separado, reintegrando uma unidade perdida. 
Esta religação seria uma tarefa de regulação psíquica visando o desenvolvimento da psique global. 
Historicamente os confrontos da humanidade com o numinoso foram sendo imortalizados em rituais e 
símbolos religiosos. A manutenção psíquica desta lembrança respondia a uma finalidade evolutiva. Como o 
numinoso era (e é) sempre discriminado como algo externo à consciência que o percebia e, além disso, sentido 
de forma misteriosa e reverente, o efeito desta percepção nos primórdios de estruturação da consciência 
humana, era o de insuflar-lhe a energia da numinosidade: discriminando o numinoso a consciência participava 
da numinosidade. Assim, lentamente essa consciência foi sendo afastada de sua inconsciência natural e 
pretérita, diminuindo sua ampla ignorância de si e do mundo, possuindo e reverenciando a numinosidade 
criadora. 
Entretanto, este confronto era também arriscado. Concluiu, por tanto, que a religião constituir-se-ia em 
um dos mecanismos preventivos da possibilidade de colapso individual frente ao confronto com um símbolo: 
uma pauta pré-estabelecida e padronizada de confronto com o numinoso em que as consciências individuais 
correriam menos risco. Assim, a finalidade evolutiva de ampliação da modificação da consciência pretendida 
pela confrontação com o numinoso continuaria possível, benéfica e, sobretudo, mediada de forma segura. A 
necessidade destes mecanismos reguladores fazem da religiosidade, praticamente, uma função psíquica 
inconsciente importante. Podemos encarar a religião, por tanto, como uma forma institucionalizada de evitar 
riscos psíquicos a fim de que cada novo membro do grupo humano não tenha que enfrentar, perigosamente 
sozinho e desamparado: nem os poderes naturais que desconheça, nem os sentimentos avassaladores da 
experiência humana do viver e do morrer, nem o alarmante esvaziamento de sentido própria existência e nem o 
medo petrificante do que lhe seja sobrenatural. 
Ainda que grande parte dos riscos psíquicos viessem da própria psique, o homo religiosus os projetou 
para fora de si - no mito, e os controlou desde fora de si - no rito. 
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Para Jung todas as representações religiosas baseiam-se em fundamentos arquetípicos. As religiões 
mantiveram vivos dogmas e rituais que representam processos psíquicos de emergência e/ou vivência dos 
arquétipos, porém, como vimos, de forma mais segura. Através dos rituais e guardados pelos dogmas, a 
poderosa força inconsciente desponta na consciência, possibilita a experiência do numinoso, porém, não abala 
a estrutura da consciência. A demarcação da interface entre a consciência e a experiência numinosa, isto é, o 
ofício religioso, tem a “(...)finalidade evidente de substituira experiência imediata por um grupo adequado de 
símbolos envoltos num dogma e num ritual fortemente organizados. A Igreja Católica os mantém por força de 
sua autoridade absoluta. A Igreja Protestante (...) os mantém pela ênfase na fé da mensagem evangélica.” 
(JUNG, 1990c, p. 42) 
Os símbolos religiosos mantêm o vigor e a respeitabilidade das formações arquetípicas nem 
perigosamente desmesuradas nem perigosamente esquecidas (o que, via de regra, poderia provocar um 
contra-ataque poderoso do inconsciente através dos mecanismos de compensação energética, deixando a 
consciência subjugada). Os arquétipos produzidos pela repetição da experiência humana estão traduzidos nas 
representações simbólicas da religiosidade. Cumprem suas funções psíquicas influenciando confortavelmente a 
consciência desde fora de si mesma, através do símbolo. 
 
Mal o inconsciente nos toca e já o somos, na medida em que nos tornamos inconsciente de nós 
mesmos. Este é o perigo originário que o homem primitivo conhece instintivamente. (...)Uma onda 
do inconsciente pode facilmente arrebatá-lo e ele se esquecer de quem era, fazendo coisas nas 
quais não se reconhece. (...)Todo esforço da humanidade concentrou-se por isso na consolidação 
da consciência. Os ritos serviam para esse fim, assim como as représentations colletives, os 
dogmas; eles eram os muros construídos contra os perigos do inconsciente. (...) São esses muros 
erigidos desde os primórdios que se tornaram mais tarde os fundamentos da Igreja. Portanto, são 
esses os muros que desabam quando os símbolos perdem a sua vitalidade. Então o nível das 
águas sobe, e catástrofes incomensuráveis se precipitam sobre a humanidade. (JUNG, 2000, p.32) 
 
Podemos concluir que os sistemas religiosos possuem uma função preventiva à catástrofes 
psicológicas na medida em que permitem que circule energia entre os diferentes dinamismos da psique. 
Outra função bastante relacionada a função preventiva é a terapêutica, pois os males psíquicos não 
podem de todo serem evitados, mas podem ser combatidos quando estão em dimensões ainda recuperáveis do 
ponto de vista do balanceamento energético da psique. Por tanto, quando os sistemas religiosos tecem 
significações precisas para a dor e o sofrimento humanos, estabelecendo para os momentos excepcionalmente 
difíceis da vida humana uma possibilidade de entendimento, aceitação e re-significação, acabam tratando 
feridas que de outra forma, ou seja, que sem fé, poderiam ser incuráveis. 
 
O que são religiões? São sistemas terapêuticos. E o que fazemos nós, psicoterapeutas? Tentamos 
curar o sofrimento da mente humana, do espírito humano, da psique, assim como as religiões se 
ocupam dos mesmos problemas. Assim, Deus é um agente de cura, é um médico que cura os 
doentes e trata dos problemas do espírito; faz exatamente o que chamamos psicoterapia. (JUNG, 
1990d, p.168) 
 
Segundo a Psicologia Analítica os sistemas religiosos organizam experiências que podem ser 
consideradas curativas em determinados momentos para determinadas pessoas. O caráter curativo de tais 
experiências adviriam da revitalização e/ou reorientação que podem promover no indivíduo sofredor. Essa 
“cura” dos sofrimentos pode advir de várias das funções religiosas isoladas ou combinadas. 
Portanto, entre as possibilidades curativas do exercício de uma fé religiosa encontra-se: - a re-
equilibração energética entre aspectos ocultos e manifestos da psique individual que podem ser projetados em 
aspectos de uma imagem coletiva ou num símbolo, isto é, em aspectos sentidos como exteriores ao próprio 
indivíduo; - o sentimento de pertencimento a uma comunidade religiosa que apóia o indivíduo solitário; - o 
entendimento do sofrimento como purificação, libertação ou aperfeiçoamento individual e, assim, o torna 
suportável e angaria forças psíquicas para seu enfrentamento e até superação; - as vantagens de atitudes 
psicológicas simplificadoras de conflitos e valorizadas religiosamente como o arrependimento e o perdão das 
ofensas; - a mais valia sentida em relação a si mesmo quando o indivíduo percebe-se instrumento de uma 
vontade divina, entre outras... 
Em quaisquer dessas possibilidades de contribuição para a cura do sofrimento humano deverá haver 
um entendimento de um “deus todo poderoso” que sustentará a fidedignidade da experiência individual curativa. 
Estando muito além da vontade ou sentimentos humanos, este deus pode - se quer e se o indivíduo o procura e 
o honra - preservá-lo do mal ou atribuir-lhe uma nova significação aceitável. Neste deus há uma face curativa e 
outra criativa, simultaneamente. 
 
A religião é uma terapêutica “revelada por Deus”. Suas idéias provêm de um conhecimento pré-
consciente, que se expressa sempre e por toda parte, através de símbolos. Embora nossa 
inteligência não as apreenda, elas estão em ação porque nosso inconsciente as reconhece como 
expressão de fatos psíquicos de caráter universal. Por isso basta a fé, quando existe. Toda a 
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ampliação e fortalecimento da lógica racional, entretanto, leva-nos para longe e para fora dos 
símbolos. É a sua prepotência que impede a compreensão de tais símbolos. (JUNG, 1990c, p. 200) 
 
A potencialidade curativa de tais experiências vem do contato que permitem entre a totalidade da 
psique individual (consciência e inconsciente) com os símbolos ancestrais da psique coletiva. Este contato 
fortalece o indivíduo pois lhe restaura, com segurança, o canal de comunicação entre o ego e o si-mesmo 
dispostos no sistema consciente e inconsciente da psique, respectivamente. Este eixo ego-si-mesmo é de 
fundamental importância em determinados momentos do processo de individuação. 
 
(...)Como pode um homem ser Filho de Deus e ter nascido de uma Virgem? Isto é como que uma 
bofetada em plena face. (...)mas se tomarmos essas coisas como são, isto é, como símbolos, 
teremos forçosamente de admirar sua verdade profunda e declarar-nos gratos àquela Instituição 
que não somente as conservou mas também as desenvolveu através de dogmas. (JUNG, 1990c, 
p. 200) 
É indiferente o que pensa o mundo sobre a experiência religiosa: aquele que a tem, possui, qual 
inestimável tesouro, algo que se converteu para ele numa fonte de vida, de sentido, de beleza, 
conferindo novo brilho ao mundo e à humanidade. (JUNG, 1990c, p. 105) 
 
A antiga necessidade psicológica deus permanece, ainda que nossa racionalidade a desencante e a 
desloque para outros espaços dessacralizados. 
 
(...) A nível primitivo, o homem teme magos e feiticeiros. Modernamente, observamos os micróbios 
com igual medo. No primeiro caso, todos acreditam em espíritos; no segundo, acredita-se em 
vitaminas. Antigamente as pessoas eram possuídas do demônio; hoje elas o são, e não menos, 
por idéias etc. 
O fator subjetivo é constituído, em última análise, pelas formas eternas da atividade psíquica. 
(...)Nossa fatalidade são as ideologias, que correspondem ao AntiCristo há tanto tempo esperado. 
O nacional-socialismo (Nazismo) se assemelha tanto a um movimento religioso quanto qualquer 
outro movimento a partir de 622 dC. O comunismo tem a pretensão de instaurar o paraíso na terra. 
Estamos, de fato, mais protegidos contra as más colheitas e epidemias, do que criança nossa 
miserável inferioridade espiritual, que parece oferecer tão pouca resistência às epidemias 
psíquicas. (JUNG, 1990c, p. 492-3) 
 
E se pode ser verdade que são representações de deus a sustentar ideologias até mesmo atéias, 
também é verdade que os atributos que usamos para qualificar a divindade vêem de nossas próprias 
possibilidades individuais e culturais. Deus e homem mantém a mesma relação compensatória que já 
abordamos entre a consciência e o inconsciente. 
As imagens de deus atraem, convencem e fascinam pois são criadas a partir da matéria originária da 
revelação da divindade. Estas proporcionam ao homem o pressentimentodo divino ao mesmo tempo que o 
protege da experiência direta com o divino. 
 
“Toda pregação teológica é um mitologema, uma série de imagens arquetípicas que se destina a 
dar uma descrição mais ou menos exata da totalidade transcendência inimaginável...” (JUNG, 
2000c, pg. 261) Por tanto, podemos concluir que até mesmo o conceito de deus é psiquicamente 
necessário e que, por essa generalidade, “não insiste em um nome determinado, mas pode ser 
chamado de razão, energia ou mesmo de eu”. (JUNG, 1990c, p.312 ) 
(...) Esta realidade psíquica e extremamente poderosa tem sido chamada de “Demônio” ou “Deus”, 
em todas as épocas, com exceção dos últimos tempos, em que nos tornamos de tal modo 
recatados em assuntos de religião (ainda bem!) que falamos, aliás acertadamente, de 
“inconsciente”, pois Deus se tornou algo realmente inconsciente. Aliás isto acontece sempre e em 
relação a todas aquelas coisas que são interpretadas, explicadas e dogmatizadas por longo tempo, 
até ficarem a tal ponto recobertas de imagens e palavras humanas que já não é mais possível 
enxergá-las. (...) “Deus” é uma experiência primordial do ser humano, e desde épocas imemoriais o 
homem se entregou ao esforço inaudito de expressar de algum modo esta experiência inefável, de 
integrá-la em sua vida mediante a interpretação e o dogma, ou então negá-la. (Jun, 1990c, p. 323) 
 
O SINTOMA NEURÓTICO 
Conforme vimos todos os movimentos energéticos da psique visam, em última instância, recompor o 
equilíbrio que permita o desenvolvimento harmônico daquele ser humano. Tanto coletivamente, na forma de 
nossas expressões culturais, sociais, artísticas e religiosas, quanto pessoalmente na forma de nossos sonhos, 
imaginação criadora e produções sintomáticas (psicossomáticas ou psiconeuróticas). Então podemos entender 
que o sintoma neurótico também é mais uma das tentativas autoreguladoras da psique. 
Não sou totalmente pessimista em relação a uma neurose. Em muitos casos deveríamos dizer: 
´Graças a Deus, ele decidiu ficar neurótico`. Essa é uma tentativa de autocura, bem como qualquer 
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doença física também o é. Não se pode mais entender a doença como um ens per se, como uma 
coisa desenraizada, como há um tempo atrás se julgava que fosse. A medicina moderna, a clínica 
geral por exemplo, concebe a doença como um sistema composto de fatores prejudiciais, e de 
elementos que levam à cura. O mesmo se dá com a neurose, que é uma tentativa do sistema 
psíquico auto-regulador de restaurar o equilíbrio, que em nada difere da função dos sonhos, sendo 
apenas mais drástica e pressionadora.(JUNG, 1990d, p. 174) 
 
Jung estabelece importantes diferenciações etiológicas e teleológicas entre as manifestações de 
desordem mental conforme o grau de comprometimento da adaptabilidade da pessoa ao seu mundo e ao grau 
de invasão arquetípica no controle das funções da consciência. A psicose constituiria-se numa total 
incapacidade egóica de adaptar-se a realidade visto que a manifesta vivência arquetípica em seu estado 
selvagem natural sobrepô-se totalmente às estruturas conscientes e, por tanto, dialogais. A neurose sendo uma 
manifestação da perda da harmonia psíquica entre os sistemas, poderia se mostrar mais ou menos 
comprometedora das funções egóicas de adaptação à realidade conforme envolvesse mais ou menos energia 
psíquica movimentada pelos complexos pessoais desarmonizados. 
 
A neurose é uma dissociação da personalidade devido à existência se complexos. Ter complexos 
é, em si, normal; mas se os complexos são incompatíveis, a parte da personalidade que é por 
demais contrária à parte consciente, se separa. E se a fissura atingir a estrutura orgânica, a 
dissociação será uma psicose, uma condição esquizofrênica, como o termo pode denotar. Então 
cada complexo passa a ter vida própria e isolada, sem que a personalidade possa uni-los. Os 
complexos divididos, por serem inconscientes, encontram apenas meios indiretos de expressão, ou 
seja, através de sintomas neuróticos. Ao invés de sofrer um conflito psicológico, a pessoa sofre de 
neurose. Qualquer incompatibilidade de personalidade pode causar dissociação, e uma separação 
muito grande entre o pensamento e o sentimento, por exemplo, já constitui uma ligeira neurose. 
Quando não nos sentimos totalmente equilibrados m relação a um determinado assunto, 
aproximamo-nos da condição neurótica. A idéia de dissociação psíquica é a maneira mais segura 
com que consigo definir uma neurose.(JUNG, 1990d, 173) 
 
Continuando seu refinamento no entendimento do material psicopatológico gerador do sintoma 
neurótico, Jung não considerará que as crises, sintomas e doenças poderiam ser meros ecos do lixo 
inconsciente a gritar em rebeldia ou desordem pura e simples. Ao contrário, Jung entendia conforme seus 
longos estudos do material de pacientes psicóticos e atendimentos de pacientes sofredores de neuroses, que o 
inconsciente construía oportunidades ricas e criativas de elaboração e enriquecimento psíquico através da 
simbolização que a doença se tornava. Em outras palavras: o inconsciente teria uma razão própria e bastante 
forte para, rompendo o equilíbrio com a consciência, ser mapeado numa condição geradora de sintoma 
neurótico. 
Para a Psicologia Analítica quando um desequilíbrio energético se apresenta na forma de “sintoma”, 
isso é entendido como a manifestação de uma força, uma tendência ao aperfeiçoamento daquele ser, em plena 
atuação. O inconsciente está atuando visando a recuperação de uma harmonia que permita o crescimento 
pessoal segundo os interesse mais íntimos, nem sempre conscientes, daquela pessoa humana. Assim, não é o 
aspecto destrutivo ou repressivo do sintoma o seu principal sentido. O sintoma simplesmente denuncia e 
sinaliza com implacabilidade que está em curso uma rota contrária a individuação (realização plena da 
subjetividade) e que a vigilante psique está em ação para que essa rota seja retomada. Assim há uma 
infinidade de manifestações sintomáticas neuróticas, tantas quantas são as possibilidades de escolhas 
humanas, diárias e cotidianas, e que podem rápida ou demoradamente ir nos afastando de nossa marcha 
própria para a realização plena de si mesmo. 
 
“(...)por mais diversas que sejam essas patologias, todas têm uma causa e uma cura comuns: elas 
resultam da perturbação do equilíbrio psíquico, de uma disrupção do fluxo de energia libidinal, o 
que só pode ser restaurado mediante a integração de ambas as partes da psique, a consciência e 
o inconsciente, numa unidade dinâmica e recíproca. Neste sentido, portanto, seja qual for a forma 
que tome, a neurose aponta para sua própria terapia: ela abre o mundo interior da psique e traz a 
superfície os elementos que vão estabelecer um novo equilíbrio na personalidade.” (PALMER, 
2001, p. 141) 
 
São os erros e desvios acumulados ao longo da vida e/ou as extremas dificuldades vivenciais porque 
passam os pacientes e que não são devidamente simbolizadas é que rompem o equilíbrio psíquico e acabam 
por produzir o sofrimento cristalizado na forma de um sintoma. Logo, a proporção da dor do sintoma nos mostra 
a proporção de nosso distanciamento de quem verdadeiramente somos e não estamos podendo exercer. 
 
“(...) a psiconeurose, em última instância, é o sofrimento de uma alma que não encontrou o seu 
sentido. Do sofrimento da alma é que brota toda a criação espiritual e nasce todo homem enquanto 
espírito: ora, o motivo do sofrimento é a estagnação espiritual, a esterilidade da alma. (...) o enfermo 
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procura aquilo que o empolgue e venha conferir, enfim, ao caos e à desordem de sua alma neurótica, uma 
forma que tenha sentido. 
Estará o médico à altura dessa tarefa? Ele poderá encaminhar seu paciente, antes de tudo, a um 
teólogo ou filósofo, ou abandoná-lo às incertezas e perplexidades de sua época. Enquanto médico, sua 
consciência profissional evidentemente não o obrigaa abraçar determinada concepção de mundo. Mas o 
que acontecerá quando perceber, com inelutável clareza, as causas do mal de que o seu paciente sofre, 
isto é, que ele é carente de amor e não possui senão a sexualidade; que lhe falta a fé, porque ele receia a 
cegueira; que vive sem esperança, porque a vida e o mundo o decepcionaram profundamente; e que 
atravessa a existência mergulhado na ignorância, porque não soube perceber sua próprio significação? 
Numerosos pacientes cultos se recusam categoricamente a procurar um teólogo. Quanto ao 
filósofo, nem sequer querem ouvir falar a respeito. (...) Onde encontrar os grandes sábios da vida e do 
mundo que não se limitem a falar do sentido da existência, mas que também o possuam? Aliás não se 
pode imaginar qualquer sistema ou verdade que tragam ao doente aquilo de que necessita para a vida, a 
saber, a crença, a esperança, o amor e o conhecimento. 
Estas quatro conquistas supremas do esforço e das aspirações humanas são tantas outras graças 
que não podem ser ensinadas ou aprendidas, nem dadas ou tomadas, nem retiradas ou adquiridas, pois 
estão ligadas a uma condição irracional que foge ao arbítrio humano, isto é, à experiência viva que se 
teve. Ora, é completamente impossível fabricar tais experiências. Elas ocorrem, não de modo absoluto, 
mas infelizmente, de modo relativo. Tudo o que podemos dentro de nossas limitações humanas, é tentar 
um caminho de aproximação rumo a elas. Há caminhos que nos conduzem à proximidade das 
experiências, mas deveríamos evitar de dar a estas vias o nome de “métodos”, pois isto age de maneira 
esterilizante sobre a vida, e além disso, a trilha que leva a uma experiência vivida não consiste em um 
artifício, mas em uma empresa arriscada que exige o esforço incondicional de toda a personalidade. 
(JUNG, 1990c, p.332-3) 
 
Percebemos, por tanto, que a terapia, na visão junguiana, é uma tentativa ativa e cuidadosa de 
estabelecimento de uma parceria e diálogo com o cliente a fim de que este se reoriente em seu próprio 
caminho. A relação psicoterapêutica tenta investigar profundamente o inconsciente do paciente, aprofundar o 
entendimento das vivências geradoras de conflito e desequilíbrio e tentar estabelecer passos de construção de 
novos significados, valores e atitudes mais condizentes com sua realização plena. 
Se nos perguntamos o que é esta plenitude no caminho daquele ser, podemos dizer, dentro da 
Psicologia Analítica, que é a verdade daquela existência. Para Jung a “verdade é aquilo que nos ajuda a viver – 
a viver adequadamente.” (JUNG, 1990b, p.288) 
Se, como dissemos antes, os arquétipos auxiliam no encaminhamento da vivência equilibrada dos 
seres humanos, os “caminhos aplainados” pelo psicoterapeuta que forem respaldados nas vivências 
arquetípicas universais, estarão em sintonia com os esforços internos, inconscientes da psique daquele 
paciente, visando o mesmo que o terapeuta: o desenvolvimento da personalidade, a adequação ao processo de 
individuação ou, em outras palavras, a cura. 
Por tanto, a “doença” é uma expressão simbólica do drama daquele ser com vínculos na experiência 
universal; seu drama é correlato com outros tantos já expressos coletivamente pelos mitos da civilização. 
Nestes mitos, em seus ritos e imagens evocadas, estão formas ancestrais de enfrentamento das questões 
humanas que se modificam ao longo da história das culturas apenas de forma periférica, mantendo, no fundo, 
as estruturas similares. Em todas as civilizações as alegrias e sofrimentos humanos passam pelos sentimentos 
em torno ou da origem da vida, de deus, do sentido da morte, da saudade das perdas, da conquista das 
virtudes, do lamento aos vícios, da complementaridade do masculino e do feminino, da necessidade de 
conhecer, conquistar, resguardar ou transmitir. Enfim, somos humanos e nossos sofrimentos são humanos. O 
que nos torna psiquicamente doentes são nossos sofrimentos e necessidades. Estes mesmos sofrimentos e 
necessidades estão expressos no conhecimento acumulado pela vivência de inúmeras gerações que nos 
precederam. 
Para Jung, por tanto, os mitos relatam os dramas arquetípicos da espécie humana e podem ser 
orientadores do psicoterapeuta na busca do significado mais profundo do sintoma neurótico de seu paciente 
desenrolado no seu drama particular. “Os arquétipos aparecem nos mitos e contos de fadas, bem como no 
sonho e nos produtos da fantasia psicótica. (...) No indivíduo, os arquétipos aparecem como manifestações 
involuntárias de processos inconscientes, cuja existência e sentido só pode ser inferido; no mito, pelo contrário, 
trata-se de formações tradicionais de idades incalculáveis.” (JUNG, 2000, pg.155). 
Mas o que haveria de terapêutico neste entendimento dos mitos e de todos os seus correlatos? 
Obviamente a história pessoal jamais se repete, somos singularidades, mas as situações pelas quais a 
singularidade deverá transcorrer para desenvolver-se são estruturalmente arquetípicas. Virá das imagens 
arquetípicas impregnadas de sabedoria universal, possibilidades dialogais psicoterapeuticamente interessantes. 
Para Jung a “(...)razão se torna um contra-senso quando ela se afasta do coração; e uma vida psíquica sem 
idéias universais sofre de desnutrição.”(JUNG, 1990b, p.311) Antes de qualquer resposta individual às questões 
humanas momentaneamente nomeadas como sintomas de uma patologia psíquica, a aproximação com os 
grandes temas universais localiza o homem dentro de sua grande família humana, dimensiona seus problemas 
como problemas humanos. 
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Quando o terapeuta ajuda o paciente a elaborar as imagens universais expressas nos símbolos de 
seus sonhos, nas histórias que o terapeuta sugere ou lê, nas imagens ou leituras de obras de arte 
plástica, literária ou musical e, principalmente, na desarmonia que seu sintoma neurótico denuncia 
e propõe reverter, a consciência pode desfrutar do conforto da longevidade daquelas experiências 
e reutilizá-las no seu próprio enquadramento particular. Este enquadramento pode restaurar o 
equilíbrio das energias psíquicas transitando entre os sistemas inconscientes e conscientes. Este é 
o caminho da “cura” significativa. Em outras palavras podemos dizer que o terapeuta ajuda o 
paciente a ler a metáfora do instrumento que está utilizando seja este seu próprio sintoma, um 
livro, um quadro ou um sonho. Para Jung um “(...) conteúdo arquetípico sempre se expressa em 
primeiro lugar metaforicamente.” (JUNG, 2000, p. 158). 
 
É importante compreender que Jung não pretende de forma alguma “explicar” para o paciente seu 
sintoma, ou seu sonho, ou o mito que lhe é semelhante. Ao contrário só o que é produzido pela consciência do 
paciente pode ser usado na reequilibração entre essa mesma consciência e o inconsciente que se expressa 
pela metáfora. Inclusive as próprias metáforas do inconsciente sequer permanecem as mesmas também 
sofrendo alterações conforme a atitude da consciência frente aos símbolos sugeridos. Um mito, um sonho ou 
um sintoma jamais poderiam sofrer essa espécie de redução a questões psicológicas que poderiam ser 
decifradas e seguidas como orientações morais de conduta orientadas por um terapeuta sem perderem assim, 
definitivamente, seu potencial curativo. “É qualidade específica do mito fabular e querer dizer o incomum, o 
extraordinário e até mesmo o impossível. (...)Mas o que mito realmente quer dizer, disso não temos a menor 
idéia. Ele expressa fatos e situações psíquicas, exatamente como o sonho normal e as delusões de um doente 
mental. Descreve fatos psíquicos de modo figurado, cuja existência não pode ser desfeita por meio de simples 
explicação.” (JUNG, 2002, p. 167) 
 
O PROCESSO DE INDIVIDUAÇÃO 
A Psicologia Analítica é, definitivamente, uma psicologia de perspectiva evolutiva. O referencial que usa 
para abordar as questões psicológicas fundamenta-se na evolução da espécie humana, respeita os marcosdesse desenvolvimento e percebe as ressonâncias desta evolução disponíveis em cada novo membro da 
espécie. Essa psicologia do desenvolvimento considera que o inconsciente primitivo diferenciou-se 
gradualmente conforme a necessidade de adaptação e a criatividade no relacionamento com o mundo real. “(...) 
O inconsciente é a mãe criadora da consciência. A partir do inconsciente é que se desenvolve a consciência 
durante a infância, tal como ocorreu nas eras longínquas do primitivismo, quando o homem se tornou homem.” 
(JUNG, 1988, p. 120). E, tal como ocorreu, ficou indelevelmente marcado na humanidade e é novamente 
refeito, no mesmo caminho, para cada novo membro. Para a Psicologia Analítica, portanto, cada 
desenvolvimento individual, ontogenético, rememora a filogênese de toda a sua espécie. Assim, como a 
sociedade humana desenvolveu a linguagem oral em seu alvorecer, também nossas crianças aprendem a se 
comunicar oralmente em tenra idade. Replicamos em nosso desenvolvimento individual, porém muito 
rapidamente, o longo caminho de desenvolvimento de nossa família humana. 
Como vimos, o inconsciente coletivo é, pois, uma herança da espécie impulsionando e modelando a 
possibilidade de desenvolvimento individual de seus novos membros. Contudo, cada novo ser terá a sua 
disposição essa estrutura psicológica interativa entre sistemas conscientes e inconscientes para impulsioná-lo 
até o ponto de sua maturidade física. Então, no ápice da vida impõe-se mais uma escolha arquetípica: a de 
trilhar um caminho absolutamente próprio ou seguir em frente dentro da média ou na medida do seu caminho 
até ali. Neste ponto a natureza humana pode inovar, alternar, construir, experimentar, avançar e a 
decisão/construção não está tomada a priori, nem é fácil, nem tem modelos ou amparos. É a derradeira 
aventura de ser completamente humano: um encontro com o divino criador dentro de si. 
Aos que forem bem sucedidos em sua realização de si mesmo será oportunizado experimentar a sua 
contribuição particular ao desenvolvimento humano. A Psicologia Analítica acredita que a totalidade dos 
modelos arquetípicos coletivos e dos processos psicológicos pessoais vividos até ali, visam amadurecer o ser 
humano para capacitá-lo para a realização desta conquista. A este importante momento de “virada” e “escolha” 
a Psicologia Analítica designou de “metanóia” e ao longo percurso na busca da realização plena do existir de 
“processo de individuação”. 
Como vimos anteriormente, as dimensões psíquicas, diferenciadas a partir do inconsciente original, 
passaram a operar relações regidas pela dinâmica energética assim como qualquer outro fenômeno energético. 
A energia tem seus padrões próprios de realização e os princípios energéticos de compensação e equivalência, 
conforme apresentados acima, determinam o relacionamento entre os sistemas psíquicos conscientes e 
inconscientes. A fim de manter o equilíbrio deste dinamismo a psique pode colocar material inconsciente numa 
posição de influência ou determinação em relação à consciência. Isso se dá, pois o material e a experiência 
psíquica do inconsciente coletivo sendo muito mais abrangente e anterior a experiência pessoal de um 
indivíduo, pode lhe ser útil na solução de suas questões ou problemas de caráter psicológico, colocando-lhe 
algumas possibilidades que não seriam produzidas por sua racionalidade (mesmo sendo este o processo 
dominante da consciência!). Os sonhos, as obras de arte e a produção cultural, os rituais e a sabedoria 
religiosa, bem como a própria produção de sintomas neuróticos, podem ser considerados instrumentos dos 
mais variados graus de interação entre o inconsciente e a consciência em busca de caminhos para o 
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desenvolvimento. Também vimos anteriormente que a compreensão destes caminhos de autoregulação 
psíquica nos permite perceber a importância do acervo cultural e simbólico da humanidade para o 
desenvolvimento de cada pessoa em particular. Veremos agora que o motor, a direção e a meta destes 
fenômenos, bem como da própria existência humana, é o processo de individuação. Este conceito possibilita o 
entendimento mais detalhado da interação processual entre o desenvolvimento coletivo da humanidade (com 
seu saldo em forma de herança arquetípica) e o desenvolvimento individual, (que ganha importante autonomia 
sob completa responsabilidade pessoal das escolhas realizadas) justamente no cume da realização deste 
processo. 
O processo de individuação é um dos conceitos mais originais da Psicologia Analítica central para 
entendimento do funcionamento da psique humana. Consideramos que “(...) o processo de individuação é o 
eixo da Psicologia Junguiana.”(NISE, 1981, p. 101). 
O desenvolvimento do processo de individuação pode ser visualizado na imperiosa marcha permanente 
rumo a superação da condição anterior que é característica do ser humano. Assim como a humanidade evoluiu 
lenta e inexoravelmente, o ser nascido se torna humano por desenvolver essa sua tendência a crescer e 
“evoluir” (entendido aqui como a superação do estágio anterior quer seja de imobilidade, ignorância, inoperância 
ou enfado perceptual). O processo de individuação se expressa fundamentalmente como a busca pela 
mobilidade, conhecimento, habilidade e destreza, novos estímulos e novas configurações de formas e 
padrões... ou seja, em outras palavras: a busca da autosuperação. O ser humano sairá, através do processo de 
individuação, da imersão caótica e sem autopercepção em que se encontrava para buscar experiências; então, 
ele as registrará e aprenderá, primeiro conforme os padrões de sua espécie. Uma vez conquistada a 
autopercepção e o autoreconhecimento começará a aprender também segundo suas próprias pesquisas, 
desenvoltura e determinação. Assim o ser humano se diferenciará da totalidade psíquica (estado de 
indiferenciação) de onde partiu em busca da experiência maior de tornar-se Si-mesmo. 
 
“O conceito de individuação não representa papel de somenos em nossa psicologia. De modo 
geral, pode-se dizer que a individuação é o processo de constituição e particularização da essência 
individual, especialmente, o desenvolvimento do indivíduo – segundo o ponto de vista psicológico – 
como essência diferenciada do todo, da psicologia coletiva. A individuação é, portanto, um 
processo de diferenciação cujo objetivo é o desenvolvimento da personalidade individual. A 
necessidade de individuação é natural, enquanto o impedimento da individuação por uma 
normalização exclusiva ou preponderante, de acordo com os padrões coletivos, será prejudicial 
para a atividade vital do indivíduo, para a sua vivência pessoal”. (JUNG, 1991. p. 525) 
 
Para Jung a meta da individuação, ou seja, tornar-se si mesmo diferenciado da totalidade psíquica 
originária, é uma meta para atingir-se gradualmente e em longo prazo. Por isso a individuação é considerada 
um processo em curso do nascimento até a morte e que, como qualquer processo, atravessa etapas, 
intercursos, acelerações e esvaziamentos... O que caracterizaria a saúde psíquica é a permanência seqüencial, 
gradual e cumulativa de experiências que permitam o desenvolvimento constante de cada um, ao encontro de 
sua própria realização. (...)Individuação significa tornar-se um ser único na medida em que por “individualidade” 
entendermos nossa singularidade mais intima, última e incomparável, significando também que nos tornamos o 
nosso próprio si-mesmo. Podemos, pois traduzir “individuação” como “tornar-se si-mesmo” ou “o realizar do si-
mesmo”. (JUNG, 1981, p. 163) 
Para atingir este desenvolvimento pleno da personalidade Jung entendeu ser muito importante que a 
oposição consciência e inconsciente não se tornassem demasiadamente rivais ou desprezíveis uma para 
outras. Ao contrário, explorando fortemente a concepção de que a vida psíquica é determinada pela 
movimentação de contrários opostos, Jung compreendeu que a interaçãodos diferentes sistemas psicológicos 
– contrapondo-se para apoiarem o processo de individuação – era condição de equilíbrio psíquico e 
produtividade psicológica. 
A energia psíquica desta interação pode seguir um movimento progressivo ou regressivo. A progressão 
se dá quando o ego consciente está ajustando, de forma satisfatória e produtiva, as exigências sociais e as 
inconscientes (incorporando criativamente suas tendências e pendores). A antítese desse processo é a 
regressão que ocorre quando desequilíbrios energéticos, devido a causas externas ou internas, impedem o 
fluxo de energia para o exterior, e a libido retorna para o inconsciente. Como vimos, Jung não acreditava que 
esse fosse um processo exclusivamente negativo, por quanto a energia investida no inconsciente podia, muitas 
vezes, reativar núcleos ou estruturas arquetípicas que detinham o conhecimento acumulado de muitas 
gerações das formas e alternativas possíveis para as dificuldades que o indivíduo enfrenta naquele momento. 
Mas, na direção progressiva ou regressiva, a meta a ser atingida é a individuação; o processo de individuação 
dá-se na continuidade das experiências adaptadas e felizes e também nos retrocessos e engasgos que fazem 
com que outros recursos, melhores e mais eficientes, até mesmo inconscientes, sejam incorporados a 
percepção consciente e integrados a totalidade psíquica da pessoa humana. Este é o processo de individuar-
se: rico e trabalhoso. 
Portanto, o desenvolvimento da individualidade não pode dar-se apenas mediante as relações 
interpessoais do indivíduo (conforme a maioria de outras teorias psicológicas da personalidade), mas 
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necessariamente também pelo desenvolvimento e intercâmbio dos vários elementos dos diferentes sistemas 
psíquicos. 
Se, por um lado, admite a importância dos acontecimentos passados na explicação da estrutura atual 
da personalidade (não só na vida individual, mas também na evolução da humanidade), a teoria junguiana, 
também compreendeu, por outro lado, que a estrutura psíquica está constantemente progredindo atraída por 
um centro que não lhe é a princípio muito claro ou compreensível. Essa compreensão é gradual, conforme o 
indivíduo avance no seu amadurecimento psicológico. Para cada etapa da vida haverá um tipo de preocupação 
predominante e que fará sentido para o projeto total de uma existência. Assim o egocentrismo infantil, o 
destemor juvenil e a determinação prudente da vida adulta constituem atitudes psicológicas diferenciadas e 
apropriadas em diferentes momentos da vida. Entretanto, após a meia idade, um novo horizonte de 
preocupações será mais adequado à nova etapa do desenvolvimento humano. Em qualquer destes momentos 
porém, tanto as condições causais quanto as finalistas estão atuando na marcha inexorável rumo a superação 
das dificuldades para estabelecer uma consciência de si mais ampla e plena de sentido. 
Embora a individuação seja uma tendência instintiva a realizar plenamente as potencialidades inatas do 
ser é importante não se confundi-la com o desenvolvimento do individualismo, nem com a busca da perfeição. 
Ao contrário de tudo isso, individuar-se seria o processo de "completação", no sentido de aceitação de nossos 
opostos e contrários, de nossas fraquezas e forças, de nosso papel e tempo no mundo. Sobretudo a 
individuação busca permitir a experiência de doação de si para o mundo, um sacrifício dos interesses 
meramente individuais e absolutamente transitórios como a existência individual, por uma doação e compaixão 
para com as outras pessoas, para com a vida e para consigo mesmo. 
Para Jung esse processo de mudança do centro da personalidade deslocando-se do ego extrovertido 
para o eixo que liga o ego (individual) ao Si-Mesmo (nossa ligação com o transcendente) tende a ocorrer na 
meia idade, quando o indivíduo tem seus interesses e objetivos da juventude substituídos por interesses mais 
culturais, filosóficos e/ou espirituais. Essa transição é um acontecimento decisivo na vida do indivíduo tanto pela 
sua possibilidade que crescimento e transcendência, quanto pela possibilidade de um prejuízo psíquico enorme 
se a transferência não se der de forma a envolver toda a energia utilizada nos investimentos anteriores. 
 
Vários são os caminhos que levam à conscientização, mas eles obedecem a certas leis. 
Geralmente a mudança começa com o início da segunda metade da vida. O meio da vida é um 
tempo de suma importância psicológica. (...) O meio da vida é um tempo de desenvolvimento 
máximo, quando a pessoa ainda está operando e trabalhando com toda a sua força e todo o seu 
querer. Mas neste momento tem início o entardecer, e começa a segunda metade da vida. A 
paixão muda de aspecto e passa a ser dever, o querer transforma-se inexoravelmente em 
obrigação (...). Em vez de olhar para a frente, muitas vezes olha-se para o passado; principia-se a 
prestar contas sobre a maneira pela qual a vida se desenvolveu até o momento. Procura-se 
encontrar motivações verdadeiras e surgem descobertas. O indivíduo consegue conhecer sua 
peculiaridade por meio da consideração crítica de si próprio e de seu destino. Mas estes 
conhecimentos não lhe são dados de graça. Chega-se a tais conhecimentos por abalos violentos. 
(JUNG, 1988, p. 198-9) 
 “A integração (ou processo de tornar-se homem) é preparada pelo lado da consciência, como já 
indicamos, ou pela tomada da consciência das pretensões egoísticas; o indivíduo percebe os seus 
motivos e procura formar uma idéia objetiva e o mais completa possível de sua própria natureza. 
Trata-se de um ato de reflexão sobre si mesmo, da concentração daquilo que se achava disperso e 
cujas partes nunca foram colocadas adequadamente numa relação de reciprocidade, de confronto 
consigo mesmo, visando a conscientização (...), uma operação consciente e voluntária do eu, e, 
por outro lado significa também um aflorar espontâneo do si-mesmo que já existia. A individuação 
aparece como a síntese de uma nova unidade que se compõe de partes anteriormente dispersas, 
e também com manifestação de algo que preexistia ao eu e é inclusive seu pai ou criador, e sua 
totalidade. Com a conscientização dos conteúdos inconscientes, nós, de certo modo, criamos o si-
mesmo, e neste sentido ele é também nosso filho. “ (JUNG, 1990c, p. 267) 
 
Jung descreve arquetipicamente as etapas da metanóia (a crise no ápice do desenvolvimento físico, 
decisiva para o amadurecimento psicológico e rejuvenescimento do sentido da existência humana) iniciando 
pelo desmascaramento da Persona (o arquétipo que impele à adoção de atitudes aceitáveis socialmente, 
mesmo que reprováveis eticamente). Nestes momentos o ser vai diferenciando-se da máscara que usa para 
adaptar-se socialmente, e entra em contato com suas expressões mais íntimas. É preciso ter coragem de 
desmascarar-se a si próprio e perceber a penúria de sentido para a vida que nos obriga a ir além das 
aparências até o despertar da felicidade autêntica de existir. Na individuação a Persona passa a ser utilizada 
como um sistema de defesa e percebida como uma capa de revestimento diferenciada da realidade interior e 
própria do ser. Numa segunda etapa o indivíduo deve entrar em contato e perceber sua Sombra (arquétipo que 
nos impele a extirpar de nossa autoconsciência os aspectos reprováveis e miseráveis de nós mesmos), ou seja, 
seus aspectos menos cúmplices da boa imagem que tem de si. Como a Sombra aglomera complexos 
reprimidos, pequenas fraquezas e até forças e traços maléficos, acaba constantemente negada como parte da 
pessoa; suas manifestações são quase sempre inconscientes. O valor de reconhecê-la está na possibilidade de 
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aclaramento de sua influência, e/ou no descobrimento de certos aspectos positivos que pode também conter e 
que não teriam energia suficiente para ultrapassar as convenções mais ordinárias. As virtudes da compaixão 
pelos outros e o contato profundo

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