Buscar

Anticorpos e antígenos Imunologia

Prévia do material em texto

LUCAS VIEIRA – MEDICINA T3 
 
Anticorpos e Antígenos 
 
Os anticorpos, as moléculas do MHC e os receptores de antígenos dos linfócitos T são as três 
classes de moléculas usadas pelo sistema imune adaptativo para a ligação a antígenos. Dessas três, os 
anticorpos, que são proteínas circulantes produzidas em resposta à exposição a antígenos, reconhecem 
a maior gama de estruturas antigênicas e se ligam aos antígenos com maior afinidade. 
Os anticorpos são extremamente diversos e específicos em sua capacidade de reconhecimento 
de estruturas moleculares não-próprias e são os mediadores primários da imunidade humoral contra 
microorganismos. Eles existem em duas formas: ligados à membrana de linfócitos B, funcionando como 
receptores de antígenos, ou secretados, residentes na circulação e/ou nos tecidos, onde eliminam 
microorganismos. 
Os linfócitos B são as únicas células que sintetizam anticorpos. Quando há reconhecimento de 
um antígeno por anticorpos ligados à membrana de linfócitos B, estes se diferenciam em plasmócitos e 
passam a secretar anticorpos. Os anticorpos secretados se ligam a antígenos e, através de vários 
mecanismos efetores, eliminam-nos. Dentre as funções efetoras mediadas por anticorpos estão: 
neutralização de microorganismos ou produtos microbianos tóxicos; ativação do sistema complemento; 
opsonização de patógenos, aumentando a fagocitose; citotoxidade mediada por células dependente de 
anticorpos e ativação de mastócitos mediada por anticorpos. 
OBS.: Como a maioria dos anticorpos faz parte do grupo de proteínas plasmáticas 
gamaglobulinas, são também chamados imunoglobulinas. 
 
1) Estrutura do Anticorpo 
 
Características Gerais da Estrutura dos Anticorpos 
Todos os anticorpos compartilham as mesmas características estruturais básicas, mas 
apresentam enorme variabilidade na região de ligação aos antígenos. 
Uma molécula de anticorpo apresenta estrutura central simétrica composta por duas cadeias 
leves idênticas e duas cadeias pesadas idênticas. As cadeias leves e pesadas e as duas cadeias pesadas 
são covalentemente ligadas por pontes dissulfeto. 
Essas cadeias contêm unidades homólogas repetidas que se dobram independentemente em uma 
forma globular chamada domínio Ig. Um domínio Ig apresenta duas camadas de lâminas β-pregueadas, 
cada uma composta por 3 a 5 fitas de cadeias polipeptídicas antiparalelas. As duas camadas são unidas 
por uma ponte dissulfeto, e as fitas de cada lâmina β são conectadas por alças curtas. Os aminoácidos 
de algumas alças são mais variáveis, sendo importantes para o reconhecimento do antígeno. 
Os domínios Ig são classificados como símile a V ou símile a C com base em sua homologia às 
regiões V ou C das imunoglobulinas. Os domínios V são formados por um polipeptídeo mais longo que os 
domínios C e contêm duas lâminas β a mais. 
As cadeias pesadas e leves são compostas por regiões aminoterminais variáveis (V), que 
participam do reconhecimento do antígeno, e regiões carboxiterminais constantes (C), que medeiam as 
funções efetoras das moléculas de anticorpos. 
LUCAS VIEIRA – MEDICINA T3 
 
As regiões variáveis são assim chamadas por apresentarem áreas de variabilidade na seqüência 
de aminoácidos. São essas variações que diferem anticorpos sintetizados por um clone de linfócitos B 
de anticorpos produzidos por outros clones. 
A região V de uma cadeia pesada (VH) e a região V de uma cadeia leve (VL) formam o sítio de 
ligação ao antígeno. Assim, cada anticorpo apresenta, pelo menos, dois sítios de ligação ao antígeno. 
A região C das cadeias pesadas interage com outras moléculas efetoras e células do sistema 
imune, mediando a maioria das funções biológicas dos anticorpos. 
 
 
 
Características Estruturais das Regiões Variáveis dos Anticorpos 
A maioria das diferenças de seqüência e da variabilidade entre diferentes anticorpos deve-se a 
três curtos segmentos localizados na região VH e a três curtos segmentos localizados na região VL. Tais 
segmentos são chamados segmentos hipervariáveis e correspondem a três alças que conectam fitas 
adjacentes das lâminas β que formam os domínios V das cadeias pesadas e leves das Ig. 
As três regiões hipervariáveis do domínio VL e as três regiões hipervariáveis do domínio VH são 
unidas, formando a superfície de ligação ao antígeno, que é conhecida como Região Determinante de 
Complementariedade (CDR). 
As diferenças seqüenciais entre os CDR de diferentes anticorpos contribuem para a geração 
das especificidades de cada anticorpo. Além disso, o confinamento da variabilidade aos CDR permite 
que todos os anticorpos compartilhem a mesma estrutura básica. 
 
Características Estruturais das Regiões Constantes dos Anticorpos 
Com base nas diferenças estruturais de suas regiões C das cadeias pesadas, os anticorpos 
podem ser classificados nos isótipos: IgA, IgD, IgE, IgG e IgM. As regiões C das cadeias pesadas de 
LUCAS VIEIRA – MEDICINA T3 
 
todos os anticorpos de um isótipo têm a mesma seqüência de aminoácidos. Essa seqüência é diferente 
em anticorpos de outros isótipos. 
Como a maioria das funções efetoras dos anticorpos é mediada pela ligação das regiões C da 
cadeia pesada a receptores de Fc em diferentes células, diferentes isótipos de anticorpos realizam 
diferentes funções efetoras. Isso porque isótipos de anticorpos apresentam diferentes regiões C e, 
portanto, ligam-se a diferentes células e/ou moléculas, executando funções efetoras também 
diferentes. 
 
As moléculas de anticorpos são 
flexíveis, o que permite que as mesmas 
orientem seus sítios de ligação. Essa 
flexibilidade é conferida pela região de 
dobradiça localizada entre CH1 e CH2. 
 
 
 
Existem duas classes, ou isótipos, de cadeias leves: κ e λ. Em seres humanos, 60% das moléculas 
de anticorpos apresentam cadeias leve κ. Não existem diferenças conhecidas entre a função de 
anticorpos contendo cadeias κ ou λ. 
 
Anticorpos secretados e associados à membrana 
apresentam diferentes seqüências de aminoácidos na 
porção carboxiterminal da região C da cadeia pesada. Na 
forma secretada, a porção carboxiterminal é hidrofílica. 
Nos anticorpos ligados à membrana, o segmento 
carboxiterminal apresenta uma α-hélice hidrofóbica e um 
segmento intracelular de carga positiva, que auxiliam a 
ancoragem da proteína na membrana. 
 
 
 
 Forma secretada Função 
IgA Geralmente 
dímero 
Imunidade de Mucosa 
IgD Não é secretada Receptor de antígeno de linfócito B naive 
IgE Monômero Defesa contra helmintos; hipersensibilidade 
IgG Monômero Opsonização, ativação do sistema complemento, citotoxidade mediada por células 
dependente de anticorpos, imunidade neonatal, autoinibição do linfócito B 
IgM Pentâmero ou 
Hexâmero 
Receptor de antígeno do linfócito B naive, ativação do sistema complemento 
LUCAS VIEIRA – MEDICINA T3 
 
 
OBS.: Todas as moléculas de Ig de membrana são monômeros (contêm duas cadeias pesadas e 
duas leves). Os complexos multiméricos são formados quando duas ou mais unidades estruturais básicas 
(monômero) se unem por interações entre as regiões Fc. As formas multiméricas se ligam aos antígenos 
com maior avidez do que as formas monoméricas. 
Anticorpos de diferentes espécies e de diferentes indivíduos de uma mesma espécie diferem 
entre si quanto às regiões C e partes estruturais das regiões V. Quando uma variante polimórfica 
encontrada em alguns indivíduos da mesma espécie pode ser reconhecida por um anticorpo, ela é 
chamada alótipo, e o anticorpo que a reconhece é chamado anticorpo antialotípico. 
As diferenças entre as regiões V dos anticorpos são relacionadas aos CDR e constituem os 
idiótipos dos anticorpos. Um anticorpo que reconhece diferençasnos CDR de outros anticorpos é 
chamado anti-idiotípico. 
 
Anticorpos Monoclonais 
Um tumor de plasmócitos (mieloma) é dito monoclonal porque produz anticorpos de uma única 
especificidade. A fusão de linfócitos B de um animal imunizado com uma linhagem celular de mieloma 
leva à formação de hibridomas (células fundidas). Essas células são cultivadas em condições em que 
células normais não fundidas e tumorais não podem sobreviver, o que provoca a “seleção” dos 
hibridomas. Cada hibridoma produz apenas um tipo de anticorpo. Os anticorpos secretados por muitos 
clones de hibridomas são separados conforme sua ligação ao antígeno de interesse. O clone com 
especificidade desejada é selecionado e expandido. Os produtos destes clones são os chamados 
anticorpos monoclonais. 
Os anticorpos monoclonais apresentam muitas aplicações: identificação de marcadores 
fenotípicos de determinados tipos celulares, levando ao reconhecimento de populações celulares; 
imunodiagnóstico; detecção de tumores, usando anticorpos monoclonais específicos contra tumores; 
terapia, usando anticorpos monoclonais direcionados a células e moléculas envolvidas na patogênese de 
muitas doenças; análise funcional de moléculas, uma vez que anticorpos monoclonais se ligam às 
moléculas de superfície celular, estimulando ou inibindo suas funções 
 
2) Síntese, Montagem e Expressão das Moléculas de Ig 
As cadeias pesadas e leves das Ig são sintetizadas por ribossomos ligados à membrana do 
retículo endoplasmático rugoso. O enovelamento adequado das cadeias pesadas e sua montagem com as 
cadeias leves são regulados por proteínas do retículo endoplasmático chamadas chaperoninas. Após a 
montagem, as moléculas de Ig são transportadas até o complexo de Golgi, onde seus carboidratos são 
modificados e onde são empacotadas em vesículas. Dentro das vesículas, as Ig são, então, enviadas à 
membrana plasmática. 
A maturação dos linfócitos B é acompanhada por alterações na expressão do gene da Ig. 
Linfócitos B maduros expressam em sua superfície IgM e IgD, que atuam como receptores e, ao 
interagirem com antígenos, iniciam a ativação do linfócito B. Quando estes são ativados, diferenciam-se 
em plasmócitos e passam a produzir mais Ig secretada (em vez da forma presa à membrana) e passam a 
expressar outros isótipos de cadeia pesada. 
LUCAS VIEIRA – MEDICINA T3 
 
 
Meia Vida dos Anticorpos 
Diferentes isótipos têm meia vida diferente. Enquanto IgA, IgE e IgM têm meia vida bastante 
curta, a IgG tem meia vida de 21 a 28 dias. Essa meia vida longa está associada ao “seqüestro 
intracelular” de IgG. Esta, pinocitada, liga-se a receptores neonatais de Fc (FcRn), os quais não 
direcionam a IgG para o lisossomo, mas a seqüestram por um período e a devolvem à circulação. 
OBS.: O FcRn é responsável pelo transporte da IgG da circulação materna através da barreira 
placentária e pela transferência de IgG materna pelo intestino dos neonatos. 
 
3) Ligação entre Anticorpos e Antígenos 
Antígeno é qualquer substância que pode ser especificamente ligada a uma molécula de 
anticorpo ou a um receptor de linfócitos T. Os anticorpos podem reconhecer como antígenos quase 
todos os tipos de moléculas biológicas, desde moléculas simples, como açúcares e lipídios, até 
macromoléculas, como carboidratos complexos, fosfolipídios, ácidos nucléicos e proteínas. 
Embora todos os antígenos sejam reconhecidos por linfócitos e anticorpos, apenas alguns 
estimulam a resposta imunológica. Os que o fazem são chamados imunógenos. Por exemplo, apenas 
macromoléculas podem ativar linfócitos B, pois a ativação dos mesmos requer ligação cruzada de 
múltiplos receptores com seus antígenos protéicos. Assim, pequenas moléculas de antígenos não são 
capazes de ativar os linfócitos B. Porém, várias cópias de tais pequenas moléculas podem ser ligadas a 
uma proteína ou a um polissacarídeo. Esse complexo hapteno-carreador (molécula pequena-
macromolécula) pode, então, atuar como imunógeno. 
Como as macromoléculas geralmente são muito maiores do que as regiões de ligação ao antígeno 
dos anticorpos, estes se ligam a apenas uma porção da macromolécula. Porção esta chamada 
determinante ou epítopo. Normalmente, as macromoléculas têm vários determinantes. A presença de 
múltiplos determinantes idênticos em um antígeno é chamada polivalência. 
A disposição espacial dos determinantes em um antígeno pode influenciar a ligação dos 
anticorpos. Caso os determinantes sejam espaçados (não-sobrepostos), dois ou mais anticorpos podem 
se ligar a um mesmo antígeno. Se os determinantes são próximos (sobrepostos), a ligação de um 
anticorpo a um pode interferir na ligação de outro anticorpo ao outro. 
Epítopos formados por resíduos de aminoácidos adjacentes são ditos determinantes lineares. 
Estes podem ser inacessíveis, quando não podem se ligar a receptores na conformação nativa, surgindo 
apenas quando a proteína é desnaturada; ou acessíveis, quando podem ser identificados já na forma 
nativa. Epítopos formados por resíduos de aminoácidos que não estão em seqüência, mas que passam a 
ser espacialmente justapostos na proteína dobrada, são ditos determinantes conformacionais. 
Determinantes neoantigênicos são epítopos que surgem após modificações que alteram a estrutura de 
uma proteína. 
OBS.: Epítopos conformacionais são reconhecidos por linfócitos B, mas não por T. 
 
LUCAS VIEIRA – MEDICINA T3 
 
 
Base Estrutural e Química da Ligação ao Antígeno 
O reconhecimento do antígeno pelo anticorpo envolve a formação de uma ligação não-covalente e 
reversível, como pontes de hidrogênio, forças eletrostáticas, forças de van der Waals e interações 
hidrofóbicas. 
A força da ligação entre um sítio de combinação de um anticorpo e um epítopo do antígeno é 
chamada afinidade. Devido à flexibilidade conferida pela região de dobradiça e também devido à 
formação de complexos multiméricos de anticorpos, estes podem se ligar a um antígeno por mais de um 
sítio de ligação. A força de ligação do anticorpo ao antígeno, chamada avidez, deve levar em conta a 
interação de todos os sítios com todos os epítopos (afinidades). 
Caso um antígeno polivalente seja 
combinado ao seu anticorpo específico, eles 
interagem, formando um complexo imune. Em 
concentração correta, na chamada zona de 
equivalência, os anticorpos e antígenos formam 
uma extensa rede de ligações cruzadas. Os 
complexos imunes podem ser dissociados em 
agregados menores por aumento da 
concentração do antígeno (moléculas antigênicas 
livres deslocam as ligadas ao anticorpo) ou por 
aumento da concentração de anticorpo (Ig livres 
deslocam as ligadas aos determinantes 
antigênicos). 
 
 
4) Relação entre Estrutura e Função nas Moléculas de Anticorpo 
 
Características Relacionadas ao Reconhecimento do Antígeno 
Todas as características de reconhecimento do antígeno estão relacionadas às propriedades 
das regiões V (variáveis) dos anticorpos. 
LUCAS VIEIRA – MEDICINA T3 
 
Especificidade: Anticorpos podem ser muito específicos para os antígenos, distinguindo-os por 
pequenas diferenças em sua estrutura química. Esse alto grau de especificidade é necessário para que 
os anticorpos gerados em resposta aos antígenos de um microorganismo não reajam com moléculas 
próprias de estrutura similar. Porém, alguns anticorpos produzidos contra um antígeno podem se ligar a 
antígenos diferentes (reatividade cruzada). 
Diversidade: Um indivíduo é capaz de sintetizar um número enorme de anticorpos 
estruturalmente distintos, cada um com uma especificidade diferente. A capacidade dos anticorpos de 
se ligar de forma específica a um grande número de diferentes antígenos é chamada diversidade; e a 
coleção completa de anticorposcom diferentes especificidades representa o repertório total de 
anticorpos. 
Maturação da Afinidade: Durantes as respostas imunes humorais, ocorrem mutações nos 
linfócitos B estimulados por antígenos. Essas mutações fazem surgir novas estruturas nos domínios V, 
sendo que alguns se ligam aos antígenos com mais afinidade do que os domínios originais. Esses 
linfócitos B produtores de anticorpos de alta afinidade têm preferência na ligação aos antígenos e, por 
seleção, passam a ser os clones dominantes a cada exposição ao antígeno. Esse processo, chamado 
maturação de afinidade, aumenta a afinidade de ligação dos anticorpos aos antígenos durante a 
evolução da resposta imune humoral. 
 
Características Relacionadas às Funções Efetoras 
Muitas das funções efetoras das Ig são mediadas pelas porções Fc das mesmas, sendo que 
isótipos de anticorpos que diferem quanto a esta região desempenham funções diferentes. Para que as 
funções efetoras sejam realizadas, é preciso que as regiões C da cadeia pesada, que formam a porção 
Fc, se liguem a outras células e proteínas plasmáticas. 
Por exemplo, a IgG recobre microorganismos, tornando-os alvo de fagocitose, porque sua região 
Fc se liga a um receptor de Fc específico presente em neutrófilos e macrófagos. Outro exemplo é a 
ligação da proteína C1q a porções Fc de IgG ou IgM complexadas ao antígeno, o que ativa o sistema 
complemento pela via clássica. 
As funções efetoras dos anticorpos são iniciadas apenas por moléculas que já se ligaram a 
antígenos, e não por Ig livres. Isso ocorre porque, para desencadear os sistemas efetores, é necessária 
a ligação não apenas de uma região Fc de um anticorpo, mas sim de várias regiões Fc de anticorpos 
adjacentes. 
Quando os linfócitos B são ativados por antígenos, podem passar por um processo chamado 
mudança de classe (ou de isótipo), em que passam a produzir anticorpos com região CH diferente, mas 
com mesma especificidade. Essa mudança permite que os linfócitos B, que originalmente expressam IgM 
e IgD, possam sintetizar isótipos de anticorpos mais adequados à eliminação do antígeno. 
OBS.: As regiões C da cadeia pesada dos anticorpos também determinam a distribuição 
tecidual das moléculas de Ig. 
 
LUCAS VIEIRA – MEDICINA T3

Outros materiais

Materiais relacionados

Perguntas relacionadas

Perguntas Recentes