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1 2 Sumário Introdução 3 A história da morte 5 O medo da morte 8 O impacto da morte 10 A morte e a Medicina 11 A morte e a Psicanálise 12 Modalidades 14 O processo psicológico de luto 16 Bibliografia 17 3 Introdução "A morte é algo que não pode ser descrito, pensado, nomeado, algo frente ao qual não se encontram palavras (...). A própria palavra MORTE não dá conta do que ela seja: cada um de nós tentará enganchá-la em outras palavras, que expressam ideias, fantasias, crenças. Termos tais como FIM, PASSAGEM, ENCONTRO, PARAÍSO (...), tentam aproximar o indivíduo de um esboço de explicação. Mas estas palavras são pobres para descrever o muito que se imagina e o tão pouco que se sabe (...). É isso o que nos aterroriza, o não saber." (CASSORLA, 2003) Tanatologia seria, grosseiramente falando, o estudo da morte. É uma disciplina ainda embrionária, mesmo na atualidade. Tem como escopo o estudo do processo de morrer e, secundariamente, prestar assistência aos pacientes com expectativa de vida limitada, aos familiares e aos profissionais de saúde que cuidem deste paciente. Pode-se dizer que "busca ajudar as pessoas a compreender o processo de morte e morrer" (ROSÁRIO, 2007). Por que as pessoas evitam falar sobre a morte? Por que têm medo de pensar a própria morte? Quando o ser humano passa a refletir sobre a própria morte, começa a ver a vida como grande oportunidade de ser feliz. Tem-se, então, que modificar-se, rever valores e repensar verdades. Segundo Santos (2007), "Não é a morte em si que nos incomoda, mas sim o fato de nos depararmos com a dificuldade de viver bem. (...) Pensar sobre a morte é pensar sobre a vida e responsabilizar-se pelo seu ser hoje, aqui e agora." As situações de terminalidade na área da Saúde são frequentes para os profissionais e muitas vezes inevitáveis, ficando o trabalhador exposto a diversas sensações, porquanto os hospitais são caracterizados como instituições de cura e recuperação, e as Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) como locais reservados para manutenção da vida a qualquer custo. Entretanto, o que se observa nas unidades críticas, em geral, é uma atenção destinada às técnicas, à tecnologia que dá suporte para a manutenção da vida, em detrimento da condição humana e das necessidades emocionais do paciente. Contudo, não podemos esquecer que o ato de cuidar vai muito além do fazer técnico, implica no entrelaçamento das ações de cuidado instrumentais e expressivas, isto é, ligadas à subjetividade do corpo cuidador (LABRONICI, 2002). Assim sendo, espera-se que a equipe de enfermagem, mediante o cuidado profissional, desenvolva suas ações objetivando não somente assistir o ser humano no instante sublime que é seu nascimento, mas se comprometer com esse momento desconhecido em sua essência, ou seja, o momento da morte. Boemer, citado por Lunardi Filho et al., (2001), afirma que, desde a sua formação, o profissional enfermeiro se sente compromissado com a vida, e é para preservação desta que deverá se sentir capacitado. 4 Sua formação acadêmica está fundamentada na cura e nela está a sua maior gratificação. Assim, quando em seu cotidiano de trabalho necessita lidar com a morte, em geral, sente-se despreparado, e tende a se afastar dela. 5 A história da morte Segundo Morin (1997), na pré-história, os mortos dos povos musterenses eram cobertos por pedras, principalmente sobre o rosto e a cabeça, tanto para proteger o cadáver dos animais quanto para evitar que retornassem ao mundo dos vivos. Mais tarde, eram depositados alimentos e as armas do morto sobre a sepultura de pedras e o esqueleto era pintado com uma substância vermelha. O não abandono dos mortos implica a sobrevivência deles. Não existe relato de praticamente nenhum grupo arcaico que abandone seus mortos ou que os abandone sem ritos. (MORIN, 1997) Segundo Kastenbaum e Aisenberg (1983), os egípcios da Antigüidade, em sua sociedade bastante desenvolvida do ponto de vista intelectual e tecnológico, consideravam a morte como uma ocorrência dentro da esfera de ação. Eles possuíam um sistema que tinha como objetivo ensinar cada indivíduo a pensar, sentir e agir em relação à morte. Segundo Áries (1977), na Vulgata, o Livro da Sabedoria (a versão latina da Bíblia), após a morte, o justo irá para o Paraíso. As versões nórdicas do Livro da Sabedoria rejeitaram a idéia de Paraíso descritas no livro original, pois, segundo os tradutores, os nórdicos não esperam as mesmas delícias que os orientais, após a morte. Isso porque os orientais descrevem que o Paraíso tem “a frescura da sombra”, enquanto os nórdicos preferem “o calor do sol”. Estas curiosidades nos mostram como o ser humano deseja, ao menos após a morte, obter o conforto que não conseguiu em vida. Já o budismo, por meio da sua mitologia, busca afirmar a inevitabilidade da morte. A doutrina budista nos conta a “Parábola do Grão de Mostarda”: uma mulher, com o filho morto nos braços, procura Buda e suplica que o faça reviver. Buda pede à mulher que consiga alguns grãos de mostarda para fazê-lo reviver. No entanto, a mulher deveria conseguir estes grãos em uma casa onde nunca houvesse ocorrido a morte de alguém. Obviamente esta casa não foi encontrada e a mulher compreendeu que teria que contar sempre com a morte. Na mitologia hindu, a morte é encarada como uma válvula de escape para o controle demográfico. Quando a “Mãe Terra” se torna sobrecarregada de pessoas vivas, ela apela ao deus Brahma, que envia então a “mulher de vermelho” (que representa a morte na mitologia ocidental) para levar pessoas, aliviando assim os recursos naturais e a sobrecarga populacional da “Mãe Terra”. Segundo Mircea Elíade (1987), os fino-úgricos (povos da região da Península de Kola e da Sibéria Ocidental) têm sua religiosidade profundamente vinculada ao xamanismo. Os mortos destes povos eram enterrados em covas familiares, onde os que morreram há mais tempo recebiam os “recém-mortos”. Assim, as famílias eram constituídas tanto pelos vivos quanto pelos mortos. 6 Esses exemplos nos trazem uma idéia de continuidade em relação à morte, não sendo considerada como um fim em si. Havia uma certa tentativa de controle mágico sobre a morte, o que facilitava sua integração psicológica, não havendo, portanto, uma cisão abrupta entre vida e morte. Isso, sem dúvida, aproximava o homem da morte com menos terror. Apesar da familiaridade com a morte, os antigos de Constantinopla mantinham os cemitérios afastados das cidades e das vilas. Os cultos e honrarias que prestavam aos mortos tinham como objetivo mantê-los afastados, de modo a que não “voltassem” para perturbar os vivos. Por outro lado, na Idade Média, os cemitérios cristãos se localizavam no interior e ao redor das igrejas, e a palavra cemitério significava também “lugar onde se deixa enterrar”. Daí, eram tão comuns as valas cheias de ossadas sobrepostas e expostas ao redor das igrejas. A Idade Média foi um momento de crise social intensa que acabou por marcar uma mudança radical na maneira do homem lidar com a morte. Kastenbaum e Aisenberg (1983) nos relatam que a sociedade do século XIV foi assolada pela peste, pela fome, pelas Cruzadas, pela Inquisição; uma série de eventos provocadores da morte em massa. A total falta de controle sobre os eventos sociais teve seu reflexo também na morte, que não podia mais ser controlada magicamente como em tempos anteriores. Ao contrário, a morte passou a viver lado a lado com o homem, como uma constante ameaça a perseguir e pegar a todos de surpresa. Esse descontrole traz, à consciência do homem desta época, o temor da morte. A partir daí, uma série de conteúdos negativos começa a ser associada à morte: conteúdos perversos, macabros, bem como torturas e flagelos, passam a se relacionar com a morte, provocando um total estranhamento do homem diante deste evento tão perturbador. O homem da atualidade convive com a idéia de que uma bomba pode cair do céu a qualquer momento. Não é de se surpreender, portanto, que o homem, diante de tanto descontrole sobre a vida, tente se defender psiquicamente, de forma cada vez mais intensa contra a morte. “Diminuindo a cada dia sua capacidade de defesa física, atuam de várias maneiras suas defesas psicológicas” (KÜBLER-ROSS, 1997). Mannoni (1995), citando Áries, conta que a morte revelou sua correlação com a vida em diversos momentos históricos. As pessoas podiam escolher onde iriam morrer, longe ou perto de tais pessoas, em seu lugar de origem, deixando mensagens a seus descendentes. A possibilidade de escolha deu lugar a uma crescente perda da dignidade ao morrer, como nos afirma Kübler-Ross (1997): “[...] já vão longe os dias em que era permitido a um homem morrer em paz e dignamente em seu próprio lar.” Para Mannoni, nos dias atuais, 70% dos pacientes morrem nos hospitais enquanto no século passado 90% morriam em casa, perto de seus familiares. Isto ocorre porque nas sociedades ocidentais o moribundo é, geralmente, afastado de seu círculo familiar. 7 O médico não aceita que seu paciente morra e, se entrar no campo em que se confessa a impotência médica, a tentação de chamar a ambulância (para se livrar do “caso”) virá antes da idéia de acompanhar o paciente em sua casa, até o fim da vida. (MANNONI, 1995) Outro aspecto comportamental do ser humano em relação à morte é que antigamente se preferia morrer lentamente, perto da família, onde o moribundo tinha a oportunidade de se despedir. Atualmente, não é raro se ouvir dizer que é preferível uma morte instantânea do que o longo sofrimento causado por uma doença. Entretanto, segundo Kovács (1997), contrariando o senso comum, o tempo da doença justamente ajuda a assimilar a idéia de morte e a conseguir tomar decisões concretas, como a adoção dos filhos ou a resolução de desentendimentos. 8 O medo da morte O medo da morte não é inato, mas é introjetado desde a infância e atinge a todos os seres humanos. Dependendo do nível de ansiedade da pessoa, o medo da morte se torna aterrorizante. Dependendo da maturidade psicológica ou do envolvimento religioso e filosófico, o medo pode se tornar menos intenso. O que se teme, na realidade, não é tanto a morte, mas sim o processo de morrer: a dependência, a impotência, o sofrimento, o desconhecido. A morte é uma realidade diária. Sabemos que morremos todos os dias, um pouquinho. Mesmo assim, vivemos como a morte do outro. Sobre a “a minha morte” eu me preocupo amanhã. Na verdade, o que mais preocupa o ser humano não é o “quando”, mas o “como” e “do quê” vai morrer. De acordo com Almeida e Nascimento (2007), o sentimento de medo está presente em todas as fases da vida humana e a experiência deste medo se constitui em mortes diárias, tenham os homens consciência disto ou não. O homem morre a cada respiração, a cada apego, a cada fuga, a cada perda, a cada dia quando dorme, a cada crença de que abre mão. Dimensão física Começa na concepção e vai até os seis meses de idade, fase do desenvolvimento em que todo o registro é sensorial. O objetivo deste período é crescer com saúde e segurança. O medo desta fase, assim, é o de danos que possam ameaçar a vida física. Dimensão emocional É o segundo estágio do desenvolvimento humano, vai dos seis meses aos seis anos. O propósito desta fase é relacionar-se, amar e ser amado. O medo básico desta fase é o abandono e a rejeição. Dimensão intelectual Estágio do desenvolvimento compreendido entre os seis anos e a adolescência, onde o homem busca o aprimoramento do pensamento e da racionalidade. O propósito desta fase é compreender a si mesmo e ao mundo. O medo característico desta fase é, portanto, o medo do desconhecido, do insondável e do inquestionável. Dimensão espiritual Estágio do desenvolvimento que tem início na adolescência e continua até momentos antes da morte física. O objetivo desta fase engloba a vontade se saber ouvir a voz interior, ainda que muitas vezes nos vários níveis de inconsciência, com o propósito de alcançar a unidade. Assim, o medo desta fase é o de submeter-se. O homem encara a submissão como humilhação, fraqueza e perda. 9 Não é preciso aguardar a proximidade da morte física para o homem entrar em contato com estes medos. Morte e vida passam a ser um único aspecto, um continuum, quando o ser humano é um ser inteiro, uno. 10 O impacto da morte Todos sabemos, desde cedo, e com certeza absoluta, que um dia iremos morrer. Mesmo assim, o ajustamento à morte nos parece mais difícil do que a qualquer outra situação da vida a ser experenciada por nós. O impacto que a morte causa no Sistema Familiar é imenso e, muitas vezes, prolongando, criando um impasse no ciclo de vida atual. Em épocas passadas, o cuidado com o doente e com o ato de morrer, ficava sob a responsabilidade da família, recaindo, geralmente, nos ombros das mulheres. Com as mudanças decorrentes no contexto político, cultural, social e econômico, as mulheres iniciaram sua jornada de trabalho para além dos limites da sua casa, trazendo modificações em todos os estágios do ciclo de vida. Para se reequilibrar, o Sistema Familiar (tentando diminuir a culpa, a ansiedade, a depressão e o estresse) teve que “terceirizar” a morte, deixando o doente entregue aos cuidados de hospitais ou casas de repouso, médicos, psicólogos, enfermeiros, damas de companhia, voluntários, conselheiros pastorais e agentes funerários. Quando a morte acontece numa idade mais avançada é entendida como um processo natural e lógico no ciclo de vida familiar, mas quando o mesmo evento acontece a uma criança ou a um jovem saudáveis, a morte é considerada como a maior tragédia humana – os chamados “golpes do destino” – para a maioria das pessoas. Por outro lado, quando a morte é causada por uma doença crônica, fatal e prolongada, pode ser uma alívio para os membros desta família, não importando se o doente for criança, jovem ou adulto. Mesmo sabendo que a morte é certa e inevitável, este saber nem sempre está presente, consciente, daí o paradoxo da morte (in) esperada. 11 A morte e a Medicina A missão tradicional do médico é aliviar o sofrimento humano; se puder curar, cura; se não puder curar, alivia; se não puder aliviar, consola. Ao pensar na morte, seja a simples idéia da própria morte, ou a expectativa mais do que certa de morrer um dia, seja a idéia estimulada pela morte de um ente querido ou mesmo de alguém desconhecido, o ser humano maduro normalmente é tomado por sentimentos e reflexões. As pessoas que se regozijam em dizer que não pensam na morte, normalmente têm uma relação mais sofrível ainda com esse assunto, tão sofrível que nem se permitem pensar a respeito. Esses pensamentos, ou melhor, os sentimentos determinados por esses pensamentos variam muito entre as diferentes pessoas, também variam muito entre diferentes momentos de uma mesma pessoa. Podem ser sentimentos confusos e dolorosos, serenos e plácidos, raivosos e rancorosos, racionais e lógicos, e assim por diante. Enfim, são sentimentos das mais variadas tonalidades. Isso tudo pode significar que a morte, em si, pode representar algo totalmente diferente entre as diferentes pessoas, e totalmente diferente em diferentes épocas da vida de uma mesma pessoa. 12 A morte e a Psicanálise Desde muito cedo, ainda bebês, quando passamos a distinguir nosso próprio corpo do corpo da mãe, somos obrigados a aprender a nos separar de quem ou daquilo que amamos. A princípio, convivemos com separações temporárias como, por exemplo, a mudança de escola. Mas chega uma hora em que acontece a nossa primeira perda definitiva: alguém que nos é muito querido, um dia se vai para sempre. É justamente esse “para sempre” o que mais nos incomoda. Porém, quanto mais conscientes estivermos de nossas mortes diárias, mais nos preparamos para o momento da grande perda de tudo que colecionamos e nutrimos durante a vida: desde toda a bagagem intelectual, todos os relacionamentos afetivos, até o corpo físico. Com o distanciamento cada vez maior do homem em relação à morte, cria-se um tabu, como se fosse desaconselhável ou até mesmo proibido falar sobre este tema. Segundo Bromberg (1994), “[...] como aprendemos em nossa cultura, evitamos a dor, evitamos a perda e fugimos da morte, ou pensamos fugir dela [...]”. Esse quadro atual nos revela a dimensão da cisão que o homem tem feito entre vida e morte tentando se afastar ao máximo da idéia da morte, considerando sempre que é o outro que vai morrer e não ele. Então nos lançamos à questão da angústia e do medo em relação à morte. Uma das limitações básicas do homem é a limitação do tempo. Segundo Torres (1983), “[...] o tempo gera angústia, pois, do ponto de vista temporal, o grande limitador chama-se morte [...]”. A Psicanálise Existencial, apontada por Torres (1983), revela a dimensão da angústia da morte: “A angústia mesma nos revela que a morte e o nada se opõem à tendência mais profunda e mais inevitável do nosso ser”, que seria a afirmação do si mesmo. Mannoni (1995) busca em Freud palavras que falem da angústia do homem diante da morte: “[...] Freud a situa ou na reação a uma ameaça exterior, ou como na melancolia, ao desenrolar de um processo interno. Trata-se sempre, porém, de um processo que se passa entre o eu e a severidade do super-eu.” Segundo Kastenbaum e Aisenberg (1983), o ser humano lida com duas concepções em relação à morte: a morte do outro, da qual todos nós temos consciência, embora esteja relacionada ao medo do abandono; e a concepção da própria morte, a consciência da finitude, na qual evitamos pensar, pois para isto temos que encarar o desconhecido. É a angústia gerada ao entrar em contato com a fatalidade da morte que faz com que o ser humano se mobilize a vencê-la, acionando para este fim diversos mecanismos de defesa, expressos por intermédio de fantasias inconscientes sobre a morte. Muito comum é a fantasia de existir vida após a morte; de existir um mundo paradisíaco, 13 regado pelo princípio do prazer e onde não existe sofrimento; de existir a possibilidade de volta ao útero materno, uma espécie de parto ao contrário, onde não existem desejos e necessidades. Ao contrário dessas fantasias prazerosas, existem aquelas que provocam temor. O indivíduo pode relacionar a morte com o Inferno. São fantasias persecutórias que têm a ver com sentimentos de culpa e remorso. Além disso, existem identificações projetivas com figuras diabólicas, relacionando a morte com um ser aterrorizante, com face de caveira, interligado a pavores de aniquilamento, desintegração e dissolução. O homem é o único animal que tem consciência de sua própria morte. Segundo Kovács (1998), “[...] o medo é a resposta mais comum diante da morte. O medo de morrer é universal e atinge todos os seres humanos, independente da idade, sexo, nível sócio- econômico e credo religioso.” Para a Psicanálise Existencial, enunciada por Torres, (1983), “[...] o medo da morte é o medo básico e ao mesmo tempo fonte de todas as nossas realizações: tudo aquilo que fazemos é para transcender a morte.” E complementa esse pensamento afirmando que “todas as etapas do desenvolvimento são na verdade formas de protesto universal contra o acidente,da morte.” Segundo Freud (1917), ninguém crê em sua própria morte. Inconscientemente, estamos convencidos de nossa própria imortalidade. Nosso hábito é dar ênfase à causação fortuita da morte – acidente, doença, idade avançada – desta forma, traímos um esforço para reduzir a morte de uma necessidade para um fato fortuito. 14 Modalidades A maior abrangência de informações sobre a morte tem trazido à população geral e também entre os profissionais de saúde, uma confusão relacionada aos termos técnicos que englobam a abreviação da vida e suspensão dos tratamentos médicos (PEREIRA et al, 2oo8). De acordo com Pessini (2001), o processo de abreviação da vida pode ser dividido nas seguintes modalidades: Eutanásia ativa Ocorre quando há um acordo entre médico, família e paciente com o objetivo de terminar com a vida do último. Seja por meio de uma droga letal ou da retirada de aparelho de respiração, a interferência de outra pessoa é ativa. Eutanásia passiva Ocorre quando o médico ou qualquer pessoa do convívio do paciente lhe provê todo o material necessário ao suicídio, mas não realiza ativamente o ato final. Tanto a eutanásia ativa quanto a passiva são legalmente proibidas no Brasil e legalizadas em alguns países europeus, como a Holanda. Distanásia Ocorre quando opta-se pela persistência em um tratamento que não curará ou melhorará o estado de saúde do paciente. É considerado antiético. Esta prática prolonga uma dor e pode ser comparada à tortura. Assim, é a obstinação terapêutica em que a tecnologia médica é usada para prolongar penosa e inutilmente o processo de agonia e morrer. Ortotanásia Ocorre quando, deliberadamente, suspende-se o tratamento de uma doença incurável que só prolongaria o sofrimento do paciente. É a atuação correta frente à morte (Pessini, 2001), a abordagem adequada diante do paciente que está morrendo, implica garantir a este paciente sua dignidade e individualidade. Mistanásia Ocorre normalmente fora das instituições hospitalares. Trata-se de uma morte miserável, antes da hora. É uma categoria que nos permite refletir sobre o fenômeno da maldade humana. Divide-se em três situações: A grande massa de doentes e deficientes que, por motivos políticos, sociais e econômicos, não chegam a ser pacientes, pois não conseguem ingressar efetivamente no sistema de saúde médico; Doentes que conseguem ser pacientes para, em seguida, tornarem-se vítimas de erro médico por imprudência, imperícia ou negligência; 15 Pacientes vítimas de má-prática por motivos econômicos, científicos e sociopolíticos (morte em experiências científicas, laboratoriais e farmacêuticas-, pelo tráfico de entorpecentes, abuso sexual, latrocínio, etc.). Aborto O aborto é definido como a finalização da gestação antes da 20ª semana ou a expulsão do objeto da concepção menor que 500 gramas de peso. Berkow e Fletcher (1995), em sua obra, classificam o aborto em precoce quando ocorre até a 12ª semana de gestação, ou tardio de 12ª a 20ª semanas. No Brasil, atualmente, o código penal encara o aborto como crime contra a vida e prevê punição de um a três anos de detenção. São autorizados apenas os abortos em caso de gravidez decorrente de estupro ou na impossibilidade de salvar a vida da mãe. Assim, o aborto legal é restrito no Brasil. Tramita o projeto de lei que autorizaria a prática do aborto em caso de crianças anencéfalas, o que gera várias discussões. Aproximadamente um milhão de abortos clandestinos ocorrem anualmente no Brasil, gerando taxa de morbimortalidade materna elevada. Tal prática mostra-se mais frequente nas regiões Norte e Nordeste, chegando ao dobro dos casos nas regiões sul e sudeste. Para a Igreja Católica, a vida se inicia no momento da concepção, portanto, o aborto é considerado um crime contra a vida. O Papa Bento XVI, em 2010, numa conversa com alguns bispos do Brasil, afirmou que a descriminalização deste procedimento representa traição dos ideais democráticos, e qualificou o aborto e a eutanásia como “ações intrisecamente más” (SCHWARTZMAN, 2010). 16 O processo psicológico de luto Todos temos histórias para contar sobre perdas de pessoas queridas, laços desfeitos, amores perdidos, vidas despedaçadas, mortes repentinas. Para KOVÁCS (2002) a morte como perda supõe um sentimento, uma pessoa, um tempo. É a morte que envolve basicamente, a relação entre as pessoas. Se ocorre de maneira brusca e inesperada tem uma potencionalidade de desorganização, paralisação e impotência. Exprimir os sentimentos de tristeza e pesar é fundamental para a elaboração do luto. O luto é uma vivência de crise, que a família enlutada tenta resolver, colocando todo o sistema familiar em movimento, mexendo em toda a sua organização. BOWLBY (1985) refere-se a quatro fases do luto: Fase de choque que tem a duração de algumas horas ou semanas, e pode vir acompanhada de manifestações de raiva ou desespero. Fase de desejo e busca da figura perdida, que também pode durar meses ou anos. Fase de desorganização e desespero. Fase de alguma organização. O luto pode ser considerado normal quando a família consegue aceitar a perda definitiva do morto, aceitar as mudanças no núcleo familiar, falar sobre o morto como alguém importante que está guardado para sempre no coração e quando a dor se transforma numa “doce saudade”. O luto patológico apresenta um medo exagerado de morrer, agressividade, sintomas de identificação (sentimentos iguais aos do morto), depressão ou ansiedade persistentes, culpa e/ou raiva exacerbadas, nenhuma expectativa ou planos de futuro. Pode-se dizer que um luto foi bem elaborado quando a família: reconhece a perda com sofrimento suportável. reorganiza o sistema familiar. apresenta novos padrões de funcionamento. modificação no mundo interno e relacional. possibilidades de construir novos vínculos. atitudes positivas quanto ao futuro. esperança e confiança reconquistadas. 17 Bibliografia ARIÈS, P. O homem diante da morte. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1977. BOWLBY, J. Apego, perda e separação. São Paulo: Martins Fontes, 1985. BROMBERG, Maria Helena P.F. A Psicoterapia em situações de perdas e luto. São Paulo, Editora Psy, 1998. PEREIRA, FS et al. A humanização da assistência prestada pelo enfermeiro no processo de morrer. Monografia. Rio Verde (GO): Faculdade Objetivo/ Instituto de Ensino Superior de Rio Verde, 2008. CASSORLA, RMS in KOVÁCS, MJ. Educação para a morte: Desafio na formação de profissionais de saúde e educação. São Paulo: Casa do Psicólogo/FAPESP, 2003. P. 13. ALMEIDA, CF e NASCIMENTO, MFC in CLEMENTE, APP E PIMENTA, WJD. Tanatologia. Lavras: UFLA/FAEPE, 2007.
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