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APOSTILA Alfredo Carlos S. D. Barros Apoio MASTOLOGIA BÁSICA BÁSICA 2 ÍNDICE I. PARTE BÁSICA 1. Embriologia e Histologia ______________________________________ 2 2. Anatomia _________________________________________________ 6 3. Fisiologia ________________________________________________ 15 4. Desenvolvimento mamário ___________________________________ 22 5. Anamnese _______________________________________________ 31 6. Exame físico ______________________________________________ 35 II. ALTERAÇÕES BENIGNAS 7. Mastalgia ________________________________________________ 41 8. Macrocistos ______________________________________________ 53 9. Fibroadenoma ____________________________________________ 62 10. Fluxo papilar ______________________________________________ 71 11. Mastites crônicas __________________________________________ 82 III. CÂNCER 12. Epidemiologia e fatores de risco ______________________________ 92 13. Formação e história natural _________________________________ 100 14. Prevenção primária _______________________________________ 120 15. Detecção precoce ________________________________________ 133 16. Diagnóstico ______________________________________________ 148 17. Estadiamento ____________________________________________ 161 18. Tratamento ______________________________________________ 167 19. Fatores prognósticos e preditivos de resposta ___________________ 187 20. Formas especiais _________________________________________ 205 3 I. PARTE BÁSICA 4 As mamas têm origem ectodérmica e podem ser consideradas glândulas sudoríparas modificadas. A sua formação, a mastogênese, inicia-se em torno da 4a semana de idade embrionária, quando se forma a crista láctea e o embrião mede de 2,5 a 3mm. Esta crista surge como dois espessamentos ectodérmicos que se dirigem longitudinalmente de cada lado da axila em direção à região inguinal. Na superfície do tórax por volta da 7a semana de vida, inicia-se a formação do bulbo mamário, a partir de uma protuberância local, enquanto que no restante da crista láctea inicia-se um processo de regressão. O bulbo mamário nada mais é do que uma invaginação ectodérmica para a intimidade do tecido mesenquimal subjacente envolto por tecido adiposo. Mais tarde, em torno de 20 semanas de gestação, esta invaginação se ramifica em ramos secundários e terciários e se canaliza. O desenvolvimento do tecido glandular mamário fetal é estimulado pelos hormônios lactogênio placentário, prolactina e insulina; os estrogênios parecem atuar mais no tecido mesenquimal, porque receptores estrogênicos nas células epiteliais são detectados apenas depois do nascimento. O complexo aréolo-papilar é formado a partir da proliferação mesenquimal. Quando o embrião mede de 15cm a 20cm, começa a se formar a aréola primitiva, com uma depressão central, que primeiro se reduz e depois se eleva nas últimas semanas de gravidez determinando a papila mamária. Antes da puberdade a glândula mamária é simplesmente constituída por poucos ductos galactóforos com suas ramificações que terminam em agrupamentos celulares atrofiados. 1. EMBRIOLOGIA E HISTOLOGIA 5 Na puberdade, em função do estímulo ovariano, ao mesmo tempo em que há aumento de volume mamário e protrusão papilar, ocorre proliferação celular, aumento do número de ductos galactóforos, aumento de tecido conectivo e acúmulo de tecido adiposo. Uma vez bem formada, a mama da mulher apresenta 15 a 25 lobos, dispostos radialmente a partir do mamilo, cada um com seu componente glandular secretor e ducto excretor próprio (ducto galactóforo) que desemboca na papila mamária, onde existem 15 – 25 orifícios com cerca de 0,5mm de diâmetro, correspondentes a cada um dos ductos galactóforos. Portanto, cada mama pode ser considerada, na verdade, como um conjunto de 15 a 25 glândulas exócrinas, com a função precípua de produção de leite para os recém-nascidos. Cada lobo é subdividido em lóbulos, entremeados por tecido conjuntivo, que envolve individualmente as unidades secretoras. O desenvolvimento mamário atinge o máximo por volta dos 20 anos, quando a mama adulta é constituída pelo sistema canalicular dos ductos galactóforos e pela porção secretora lóbulo - alveolar. Os ductos galactóforos na região sub areolar dilatam-se e formam o chamado seio lactífero. Os ductos lactíferos na sua porção final, próxima ao orifício papilar, são revestidos por tecido epitelial estratificado pavimentoso. Logo abaixo, o epitélio ductal se adelgaça, com menor número de camadas celulares do tipo cilíndricas. Na região distal nos ductos terminais, próximos às unidades secretoras, o epitélio é do tipo cúbico simples. Na parede da estrutura ductal existem ainda células mioepiteliais. À microscopia eletrônica, as células que formam o epitélio ductal podem ser classificadas em dois tipos: a maior parte é do tipo colunar circundando a luz ductal, mas existem também células basais distribuídas descontinuamente, que se acredita que possam se diferenciar em células colunares ou mioepiteliais. A unidade secretora correspondente aos lóbulos da glândula mamária, é constituída por túbulos de epitélio cúbico simples que terminam em porções dilatadas, que são os alvéolos ou ácinos, também revestidos por epitélio cúbico simples. 6 Os ácinos são conectados às porções terminais dos dúctulos intra - lobulares, com os quais formam a unidade ductolobular. Os ductos intra - lobulares se fundem para formar um ducto lobular que drena para o sistema ductal extra – lobular, em uma verdadeira rede canalicular em direção ao seio galactóforo. Os lóbulos são formados por ácinos revestidos por camada única de células epiteliais cubóides, as quais são sustentadas por células mioepiteliais esparsas. O estroma intra - lobular é ricamente vascularizado por capilares sanguíneos e linfáticos. Além da função de suporte, fibroblastos do estroma intra - lobular exercem importante atividade hormonal parácrina sobre o epitélio e atenuam o processo de adesão intercelular. Logo abaixo do tecido epitelial e dos fibroblastos existe a membrana basal que separa o tecido epitelial do estroma. A membrana basal é uma lâmina acelular de estrutura bioquímica complexa, composta por colágeno tipo IV, laminina, fibronectina e compostos proteoglicanos. Vale frisar que existem acentuadas modificações histológicas lobulares na segunda fase do ciclo menstrual em função da influência hormonal sinérgica de estrogênio e progesterona. Os lúmens glandulares tornam-se bem evidentes contendo material de secreção apócrina, as células mioepitelias tornam-se mais proeminentes por acúmulo de glicogênio e existe ederma no estroma lobular. Análises ultraestruturais demonstram aumento do retículo endoplasmático e do complexo de Golgi. A proliferação celular (mitose) ocorre tanto na primeira fase do ciclo como na segunda, quando é mais intensa. Na segunda metade do ciclo o volume nuclear das células é máximo, as figuras de mitose são mais freqüentes ao microscópio e atividade proliferativa medida pela porcentagem de células que expressam Ki-67 é maior. Na gravidez, as células dos ductos terminais e dos ácinos proliferam - se, resultando em aumento de volume lobular. Os núcleos tornam-se hipercromáticos.Ocorre hipervascularização no estroma e infiltração de células inflamatórias mononucleares. A expansão glandular é progressiva nos trimestres da gravidez e é acompanhada de diminuição do estroma conjuntivo e do tecido adiposo. 7 Ao final da lactação, inicia-se o processo de involução das modificações gravídicas, que dura aproximadamente três meses. Futuras gestações são novamente acompanhadas das mesmas modificações cíclicas de hiperplasia e involução. Depois da menopausa, com a insuficiência estrogênica, ocorre atrofia epitelial, e redução da celularidade e do número de lóbulos. Ao mesmo tempo passa a ocorrer espessamento da membrana basal e hipertrofia do estroma intralobular com deposição de colágeno. 8 As mamas são órgãos pares situados na região superior da parede anterior do tórax sobre o músculo peitoral maior e separados pelo sulco inter-mamário. Embora possam existir variações, seus limites topográficos são: superior - segundo arco costal; inferior - sexto arco costal; medial – borda do esterno; e lateral – linha axilar anterior. A dimensão da mama é muito variável, dependendo de fatores genéticos, de faixa etária, do peso corpóreo e do número de gestações. Normalmente, na mulher adulta, pesa de 400 a 500g de cada lado, dobrando o peso no ciclo grávido-puerperal. A mama é um conjunto de estruturas glandulares que tem arquitetura canalicular; é recoberta por pele fina e elástica e envolta por camada de tecido adiposo em todos os seus limites, exceto na região sub-areolar. Na região central da superfície cutânea do órgão localiza-se o complexo aréolo - papilar, que compreende duas estruturas, a aréola e a papila. A aréola é um espessamento cutâneo hiperpigmentado, de formato circular, medindo entre 4 e 6 cm, geralmente situado na projeção do 4º arco costal. Na cútis areolar existem saliências denominadas glândulas de Morgani que são glândulas sebáceas modificadas, as quais se hipertrofiam na gravidez, secretando material gorduroso que tem por função lubrificar a papila. As saliências cutâneas destas glândulas hipertrofiadas na gravidez são conhecidas como tubérculos de Montgomery. 2. ANATOMIA 9 A papila é uma formação cilíndrica, com largura e altura aproximadamente de 1 cm, localizada no centro da aréola, onde existem de 15 a 25 óstios, que correspondem cada um a drenagem dos ductos galactóforos principais. Abaixo do complexo aréolo-papilar não existe tecido subcutâneo, e este apóia-se em delgada estrutura muscular lisa, o chamado músculo areolar ou músculo de Meyerholz. Este músculo é formado por dois feixes intricados de fibras, circulares e radiais, com digitações intra-papilares, e tem importante função na ejeção láctea, além de contribuir para a ereção papilar erógena na resposta sexual. O corpo mamário é formado por um sistema glandular canalicular, entremeado por organizado tecido de sustentação, envolto em tecido adiposo contido por lâmina de tecido conjuntivo, a fáscia mamária, que circunda totalmente o órgão, através de seus folhetos anterior e posterior. O sistema glandular é constituído por duas porções: a porção lobular , formada por estruturas saculares denominadas ácinos, que se confluem para determinar os lóbulos, os quais, por sua vez, se reúnem para formar os lobos (15 a 25); e a porção ductal, formada pelos ductos galactóforos principais (15 a 25 – um para cada lobo) que se originam nos dúctulos intra e extra-lobulares e dirigem- se ao complexo aréolo-papilar, em cuja face inferior se dilata formando o chamado seio galactóforo. ESTRUTURAS FASCIAIS Do folheto anterior da fáscia mamária partem projeções ou septações em direção ao parênquima mamário, que se fundem com digitações de tecido fibroso que circundam os lóbulos, formando os ligamentos de Cooper, que vão se fixar na derme, e que podem determinar retrações cutâneas em caso de crescimento tumoral adjacente. A gordura retro - glandular mamária apoia-se no folheto posterior da fáscia mamária. Entre este folheto posterior da fáscia mamária e a fáscia peitoral que recobre o músculo peitoral maior, existe um espaço preenchido por tecido 10 conjuntivo frouxo, denominado espaço retromamário de Chassaignac, de importância prática, porque pode coletar seromas ou abcessos. A fáscia peitoral recobre o músculo peitoral maior e insere-se nos ossos esterno e clavícula, no músculo deltóide e na lâmina anterior da bainha do músculo reto abdominal. Uma fáscia de grande importância cirúrgica na axila é a fáscia costocoracóide que reveste o músculo peitoral menor e envolve artérias, veias, nervos e linfáticos da axila e que deve ser seccionada e removida para a realização da linfadenectomia axilar. A fáscia costocoracóide apresenta três porções: uma superior (clavipeitoral), uma média (bainha do músculo peitoral menor), e uma inferior (ligamento suspensor da axila). A porção superior ou clavipeitoral origina-se da bainha do músculo subclávio, insere-se no processo coracóide da escápula e termina no músculo peitoral menor, onde se divide em duas lâminas para recobri-lo que fornam a bainha do músculo peitoral menor. O ligamento suspensor da axila origina-se na margem lateral do músculo peitoral menor, na região da fusão das lâminas superficial e profunda de sua bainha, insere-se na aponeurose do músculo coracobraquial, no processo coracóide e na aponeurose superficial da base da axila. MUSCULATURA DA PAREDE TORÁCICA Os músculos da parede torácica que têm localização próxima à mama e que têm importância em termos cirúrgicos são: peitoral maior, peitoral menor, latíssimo dorsal, redondo maior, subescapular, coracobraquial, serrátil anterior, subclávio e intercostais. O músculo peitoral maior insere-se na superfície anterior da clavícula e do esterno, na aponeurose do músculo obliquo externo e na forma de um largo tendão no canal bicipital do úmero na crista do tubérculo maior. É formado por 3 feixes de fibras (clavicular, esternocostal e abdominal) que se unem em direção da axila até a inserção umeral. As funções principais deste músculo são 11 movimentação do úmero (flexão, adução e rotação lateral) e auxilio na mecânica respiratória para esforços profundos. É inervado pelo nervo do peitoral maior, proveniente do plexo braquial. O músculo peitoral menor tem forma triangular, origina-se da 3ª à 5ª costela e se insere na forma de um tendão achatado na margem medial e na face superior do processo coracóide da escápula. Não exerce nenhuma função motora importante, sendo auxiliar na rotação da escápula. Sua inervação provém do plexo braquial através do nervo do peitoral menor. O músculo latíssimo dorsal é um grande músculo localizado na face lateral e posterior da parede torácica, cujas fibras têm origem nas 6 vértebras torácicas inferiores, nas 5 lombares e na face posterior da crista ilíaca, e se dirigem para frente e para cima até se inserir na superfície anterior da porção superior do úmero. É inervado pelo nervo toracodorsal, proveniente do plexo braquial e sua irrigação deriva da artéria toracodorsal, proveniente da axilar. O músculo redondo maior inicia-se na parte inferior da margem axilar da escápula e insere-se na parte posterior do sulco bicipital no braço. O músculo subescapular é um músculo triangular originário na porção medial da fossa subescapular da escápula e que se insere no tubérculo menor do úmero e na face anterior da cápsulaarticular do ombro. O músculo coracobraquial é um pequeno músculo que quase não se percebe na dissecção axilar que se insere juntamente com o bíceps no processo coracóide e que está unido através de sua aponeurose com o ligamento suspensor da axila. O músculo serrátil anterior é largo e achatado. Origina-se nas faces anteriores das 8 costelas superiores e da aponeurose dos músculos intercostais. Insere-se na margem medial da escápula. É inervado pelo nervo torácico longo (nervo de Bell). O músculo subclávio está localizado no ápice de axila e tem inserção no terço medial de clavícula e no primeiro arco costal. Sua fáscia é conhecida como ligamento de Halsted. Os 11 pares de músculos intercostais preenchem os espaços intercostais, e são formados por um feixe externo e outro interno de fibras. 12 VASCULARIZAÇÃO O fluxo sangüíneo arterial da mama provém basicamente de duas fontes: ramos mamários de artéria torácica interna e ramos de artéria torácica lateral. Mais da metade (60%) da mama (regiões mediais e região central) é nutrida pela torácica interna e 30% (especialmente a região supero – lateral) depende da torácica lateral que deriva da axilar. Entre os ramos da torácica interna, cuja origem vem da subclávia, vale salientar a importância do seu ramo mais hipertrofiado que parte do segundo espaço intercostal e que é o principal responsável pela circulação do complexo aréolo-papilar. Além destes pedículos, outros de menor importância funcional são o ramo peitoral da toraco-acromial, os ramos de artérias intercostais do 3º, 4º e 5º espaços, e a artéria toraco-dorsal. A artéria toraco-dorsal que nutre fundamentalmente o músculo latíssimo dorsal, e que corre na superfície anterior do músculo redondo maior é continuação da artéria subescapular, que é o ramo arterial mais lateral da axila e que nasce da artéria axilar. Após alguns centímetros de extensão, a artéria subescapular emite um ramo látero-posterior chamado artéria circunflexa da escápula e depois continua-se com o nome de toraco-dorsal. O retorno venoso ocorre através de dois sistemas: o superficial, formado por veias que correm logo abaixo do folheto anterior da fáscia mamária, que vão desembocar através de perfurantes na veia torácica interna e veias do pescoço e jugular interna; e o profundo, constituído por veias que drenam para as veias torácica interna, axilar e intercostais. Em geral o trajeto das veias é semelhante ao das artérias, existindo rica rede anastomótica entre eles e inclusive com as veias intervertebrais e ázigos, muito importantes como via de metastatização. INERVAÇÃO A inervação sensitiva de mama é realizada principalmente por filetes nervosos vindos dos nervos intercostais, do segundo ao 6º espaço. Além destes 13 ramos, a mama recebe ainda um ramo supra clavicular originário do plexo cervical superficial e também ramos torácicos do plexo braquial. A papila mamária especificamente é inervada por ramos do nervo do 4º espaço intercostal. A diferenciada inervação do complexo aréolo-papilar é responsável pela ereção erógena da papila e pela ejeção láctea, mediadas por reflexos neuro- hormonais. Na derme da papila e aréola existem ainda inúmeras terminações nervosas livres e receptores neurais (corpúsculos de Ruffini e Krause) especializados na percepção tactil e pressora (sucção), que estimulam o hipotálamo, que por sua vez regula a produção de ocitocina pela hipófise. A inervação profunda da mama é formada basicamente por nervos que seguem o trajeto das artérias e são destinados à musculatura da parede torácica. Embora não se destinem diretamente à mama, existem três nervos de importância prática nas cirurgias de dissecção axilar: torácico-longo, toraco-dorsal e intercosto-braquial. O nervo torácico-longo (nervo de Bell) surge na axila na sua região posterior, atrás do plexo braquial e dos vasos axilares. Dirige-se para abaixo, rente ao músculo serrátil anterior. Precisa obrigatoriamente ser preservado nas cirurgias para não atrofiar o músculo serrátil e assim determinar a elevação do ombro (escápula alada). O nervo toraco-dorsal origina-se no plexo braquial e tem direção posterior e inferior, passando na frente do músculo redondo maior até atingir o músculo grande dorsal, do qual é a principal estrutura nervosa. A lesão do mesmo leva à atrofia do músculo grande dorsal, impedindo que seja utilizado em reconstruções mamárias. O nervo intercostobraquial origina-se de ramo lateral do segundo nervo intercostal torácico. Ultrapassa os músculos intercostal e serrátil anterior e cruza a axila em direção ao braço, quase perpendicularmente ao nervo torácico-longo, do qual fica a uma distância aproximada de 2cm no ponto de cruzamento. Destina-se à face medial do braço, e a sua preservação cirúrgica reduz a intensidade e a duração das parestesias no membro. Existem freqüentes variações anatômicas neste nervo: pode ter origem dupla de dois ramos nervosos, um do segundo e outro do terceiro espaço; pode ter origem única e se subdividir em dois ou três 14 ramos; ou, ainda ser duplo, um nervo com origem no segundo espaço e outro no terceiro espaço. DRENAGEM LINFÁTICA A mama tem rico sistema linfático, formado por canais (capilares e vasos coletores) que drenam para os linfonodos regionais. Os capilares e vasos coletores linfáticos de mama podem ser divididos em 3 porções: superficial, intra-mamária e profunda. A porção superficial é formada pelo plexo subcutâneo localizado entre a pele e a fáscia superficial da mama, para onde drena o fluxo da pele e do tecido celular subcutâneo. A direção de fluxo deste plexo é predominantemente central no sentido da aréola, e daí para axila; uma pequena parte do sistema drena diretamente para axila. Na sua porção intra-mamária a rede é constituída por extenso plexo linfático localizado em volta de cada lóbulo e por um plexo linfático peri ductal envolvendo os ductos galactóforos. Esta porção intra - mamária da rede linfática, de qualquer quadrante, converge para região central da mama, para o plexo linfático subareolar (plexo de Sappey) e daí ruma para axila. Na parte mais posterior da mama existe o plexo linfático fascial profundo, para onde drenam as estruturas lobulares mais profundas, e que situa-se sobre a fáscia do músculo peitoral maior. O plexo profundo pode dirigir seu fluxo linfático para o plexo periductal e retroareolar (e daí para a axila), para os linfonodos de Rotter dispostos entre os dois músculos peitorais (rota de Groszman) e daí para a fossa supra clavicular, para a cadeia torácica interna, para linfonodos trans- diafragmáticos (rota de Gerota), ou, ainda, para mais de um local. Estima-se que a cadeia axilar receba 97% do fluxo linfático de mama e a cadeia torácica interna em torno de 3%. A estrutura mamária tem origem embriológica comum, a partir do ectoderma, e a maior parte da glândula mamária e a pele que a recobre podem ser consideradas uma única unidade funcional, que compartilha a mesma rede de drenagem linfática para os linfonodos axilares. Contudo as rotas de drenagem são muito variáveis e é impossível se prever com certeza a direção do fluxo e a via de 15 drenagem com base apenas da localização do tumor na mama, seja em termos de quadrantes, como em situação de profundidade. Existe, inclusive, uma via linfática superficial que drena para a mama oposta, e daí, para axila do outro lado. A cavidade axilar pode ser comparada a uma pirâmide triangular, com o vértice representado pelo ponto onde a veia axilar penetra no tórax (região supero-lateral). Neste espaço estão contidos em média 20 linfonodos, cuja distribuição topográfica foi classificada por Berg em 3 níveis. - Nível I: Contém em média 12 a 15 linfonodos dispostos lateralmente à borda do músculo peitoral menor, que podem ser agrupados em laterais, subescapulares e anteriores . - Nível II: De 4 a 6 linfonodos situados posteriormente ao músculo peitoral menor e que corresponde aos linfonodos centrais da axila. - Nível III: De 3 a 5 linfonodos localizados medialmente ao músculo peitoral menor, entre este e o ápice da axila, e que são denominados linfonodos subclávios. Entre os dois músculos peitorais existe a cadeia linfática de Rotter, com 1 ou 2 linfonodos. Na cadeia torácica interna existem em média 4-6 linfonodos, com distribuição variável nos espaços intercostais , em média um por espaço. No primeiro e segundo espaço os linfonodos geralmente são mediais aos vasos torácicos internos, e nos espaços inferiores ocupam geralmente a borda lateral destes vasos, que localizam-se aproximadamente a 2 cm da borda do osso esterno. Os linfonodos situam-se abaixo do músculo intercostal, entre os arcos costais, logo na frente da lâmina parietal da pleura; algumas vezes localizam-se na face posterior da costela. Aproximadamente 20% das mulheres apresentam linfonodos intra- mamários. Podem estar dispostos em qualquer quadrante e parecem não estar associados às vias usuais de drenagem linfática da mama. A figura 2.1 apresenta desenho da anatomia topográfica da região da mama, ilustrando as vias de drenagem linfática. 16 Figura 2.1 – Vias de drenagem linfática da mama e musculatora da parede torácica. _veia axilar _ linfonodos _supraclaviculares_ _músculo peitoral maior_ _músculo peitoral menor_ linfonodos de cadeia torácica interna____ _plexo linfático de Sappey_ linfonodos __axilares__ 17 As mamas são órgãos específicos dos mamíferos destinados à produção de leite na mulher e nutrição de seus filhos nos primeiros meses de vida. Na espécie humana exerce importante função sexual, tanto na atração do parceiro masculino, como na resposta sexual feminina. Representa um dos maiores encantos da silhueta corpórea da mulher e desempenha papel psicológico fundamental, como fonte de auto-estima e expressão de graça e feminilidade. Para desempenhar suas funções, as mamas requerem intensa estimulação hormonal para os mecanismos de mamogênese, lactogênese, lactopoese e ejeção láctea. FUNDAMENTOS HORMONAIS a) Eixo hipotálamo – hipófise – ovário Localizado na base do cérebro, logo acima da junção dos nervos ópticos, o hipotálamo representa o centro de convergência dos estímulos provenientes do cortéx cerebral via sistema límbico. Pesa em torno de 10g e contém células nervosas que têm características tanto de neurônios como de células endócrinas e que secretam substâncias liberadoras e inibidoras de hormônios, como hormônio liberador de gonadotrofinas (GnRH) e dopamina, respectivamente. A hipófise mede 1x1x 0,5 cm, pesa de 0,5 a 1,0 g, está localizada na fossa hipofisária do osso esfenóide, ou sela túrcica. A hipófise produz na sua porção anterior hormônio de crescimento, prolactina, hormônio adrenocorticotrópico (ACTH), hormônio folículo estimulante 3. FISIOLOGIA 18 (FSH), luteinizante (LH) e tireoestimulante (TSH). Na sua porção posterior, formada por tecido neural diferenciado, são produzidos vasopressina e ocitocina. Por fim, a porção intermediária da hipófise produz hormônio melanotrófico (MSH). Os ovários são órgãos pares, localizados na pelve feminina, que medem de 4-5 cm no seu maior diâmetro, com espessura média de 1,5cm. Apresentam uma porção cortical que contém os folículos ovarianos com os ovócitos e outra medular com tecido conjuntivo e vasos sanguíneos. Ovários adultos pós-puberais apresentam de 300.000 a 500.000 folículos, que conforme o seu estágio de desenvolvimento podem ser classificados em: primordiais, em crescimento, maduros e pré-ovulatórios. Após a ovulação, o folículo roto, após a expulsão do óvulo, sofre processo de luteinização e é denominado corpo lúteo. Os folículos produzem estrogênios (estriol, estrona e estradiol ) e o corpo lúteo estrogênios e progesterona. A vida média do GnRH produzido no hipotálamo e liberado em padrão pulsátil é de apenas alguns minutos. Sua produção precisa ser constante e é mediada por complexo mecanismo de inter-relações tipo ”feed-back” de alça longa, curta e ultra-curta. Na alça longa existe efeito “feed-back” negativo com os estrogênios ovarianos; na retro-alimentação negativa quando eleva-se o estradiol diminui a liberação de GnRH e o contrário ocorre com a diminuição da concentração de estradiol. Na alça curta existe também “feed-back” negativo com as gonadotrofinas hipofisárias (FSH e LH). Na alça ultra-curta existe inibição do GnRH pela sua própria síntese. O GnRH é transportado para a adenohipófise (porção anterior da glândula) pelo sistema capilar porta-hipofisário e estimula a síntese das gonadotrofinas. A dopamina (também conhecida como PIF – (“prolactin inhibiting factor”) também produzida no hipotálamo inibe a produção principalmente de prolactina, mas também de FSH e LH. Os gonadotropos, células das porções laterais da hipófise anterior, produzem FSH e LH, quando possuem adequada concentração de receptores para GnRH, estimulados pela ativina A, que é um peptídeo produzido nas células da camada granulosa do folículo ovariano e houver pulsatilidade de liberação do GnRH hipotalâmico em estreita faixa de freqüência. 19 No ciclo menstrual normal bifásico, a secreção de gonadotrofinas depende do mecanismo de retrocontrole exercido pelos hormônios esteróides ovarianos. Concentrações crescentes de estradiol estimulam a secreção de FSH e LH e a progesterona, quando atua associada aos estrogênios, também é estimulante das duas gonadotrofinas. Alguns peptídeos sintetizados nas células granulosas do folículo ovariano interferem também no processo: a inibina inibe a secreção do FSH, a ativina estimula a produção de FSH e a sua ação no ovário e a folistatina suprime a atividade do FSH. A prolactina é um hormônio heterogêneo secretado pela adenohipófise, que pode ser sintetizado sob diversas variedades de diferentes pesos moleculares. O mecanismo de controle de liberação de prolactina é fundamentalmente de inibição, que é exercido pela dopamina, neurotransmissor hipotalâmico, que atua sobre receptores específicos nas células produtoras de prolactina. O hormônio de liberação da tireotrofina (TRH) e a serotonina, produzidos no hipotálamo, exercem ação estimulante da liberação de prolactina. A liberação de prolactina é pulsátil no ciclo menstrual, sendo maior durante o sono, e aumenta muito na gravidez, relacionando-se com a função de lactogênese. b) Resposta ovariana e esteroidogênese Os folículos ovarianos que começam a se desenvolver no início do ciclo menstrual devem apresentar receptores de gonadotrofinas para serem estimulados. FSH e LH atuam nas membranas celulares através do mecanismo da adenilciclase, para depois interagir com os receptores intra-nuclares, sendo que a ativina favorece a ligação do FSH comcélulas da camada granulosa folicular que envolve o óvulo, aumentando a concentração de receptores. Ao final do desenvolvimento folicular, o folículo maduro apresenta na sua superfície as tecas, externa (predominantemente formada por tecido conjuntivo) e interna, rica em células epiteliais e muito vascularizada. 20 O folículo produz androgênios nas células da camada da teca (sob estímulo de LH), que são convertidos em estrogênios nas células da camada granulosa, por aromatização induzida pelo FSH. No processo de ovulação, o óvulo deixa o folículo. O folículo se transforma em corpo lúteo, no qual as células da camada granulosa e da teca interna transformam-se em células luteínicas, que produzem progesterona e estrogênios. Para a síntese dos hormônios esteróides a substância básica é o colesterol, produzido no folículo e presente no sangue. No primeiro passo da esteroidogênese, o colesterol é convertido em pregnenolona. Esta, por sua vez, pode ser transformada em 17- hidroxipregnenolona, através da via delta 5, que ocorre predominantemente no folículo, sob ação de 17-alfa-hidroxilase, ou em progesterona, pela via delta 4, no corpo lúteo, sob mediação da 3-beta-ol-desidrogenase e delta 4,5 isomerase. Depois de passos intermediários, o produto final das duas vias é a androstenediona, que pode ser aromatizada em estrona, que se interconverte em estradiol, ou ser transformada em testosterona, que também pode se converter em estradiol. REGULAÇÃO HORMONAL DO DESENVOLVIMENTO MAMÁRIO Para o desenvolvimento mamário, ou mamogênese, é necessário intenso processo de estímulo de vários hormônios no tecido mamário rudimentar pré- puberal. Atuam sinergicamente estrogênios, progesterona, prolactina, hormônio de crescimento, cortisol, tiroxina e insulina. Os estrogênios são fundamentais no crescimento mamário na puberdade. Estimulam a expressão de genes relacionados com a produção de peptídeos estimulantes da proliferação celular, especialmente determinando a formação do sistema ductal e do tecido fibroso. São potencializados pela insulina, pelo hormônio de crescimento e pela prolactina. Na ausência de estrógenos ovarianos que ocorre, por exemplo, na agenesia genadal, não existe desenvolvimento mamário. 21 Com o amadurecimento endócrino da adolescente aparecem os ciclos ovulatórios, e o tecido mamário passa a sofrer influência também da progesterona, que atua principalmente diferenciando a estrutura lóbulo-alveolar. REGULAÇÃO HORMONAL DA LACTAÇÃO Para que a lactação normal ocorra são necessários os processos de lactogênese (início da produção do leite), de lactopoese (manutenção da produção do leite) e de ejeção láctea (saída do leite pelo mamilo). O hormônio principal para a lactogênese é a prolactina, que atua através de proteínas receptoras específicas nas células alveolares e produz RNAm de proteínas do leite. Durante a gestação, a secreção de prolactina aumenta progressivamente e atinge o máximo próximo ao dia do parto; acredita-se que estrogênios e progesterona placentários impeçam a produção hipotalâmica da dopamina que inibe a liberação de prolactina. De maneira aparentemente paradoxal, mas de grande importância fisiológica, os próprios estrogênios e a progesterona bloqueiam a nível da célula alveolar, a ação da prolactina, formando apenas colostro e impedindo a produção do leite antes do parto. Após o parto, em decorrência da saída da placenta, os níveis circulantes de estrogênio e progesterona decrescem abruptamente; no quinto dia de puerpério os níveis são inferiores a aqueles verificados no ciclo menstrual. O hormônio lactogênio placentário também tem rápida redução de produção com a dequitação e igualmente inibe a ligação da prolactina com receptores das células alveolares mamárias. Os níveis de prolactina são máximos próximos ao parto, começam a se reduzir no trabalho de parto e decrescem no puerpério. A prolactina é o principal evento hormonal responsável pela lactogênese e participa, também, da lactopoese. Ao lado da prolactina, participam na produção do leite: hormônio de crescimento, insulina, cortisol e hormônios tireoidianos. Este estímulo hormonal integrado converte células alveolares, pré-secretoras, em células ativas, que 22 secretam e liberam o leite, o que só vai acontecer em abundância a patir do 3o dia de puerpério. Inclusive mães adotivas com intenso desejo de amamentar podem conseguir. Para isto devem receber fundamentalmente progesterona desde algumas semanas antes do período esperado de lactação, complementada por metoclopramida para estimular a produção de prolactina. Além de motivação pessoal e da preparação hormonal exógena, a sucção mamilar exercida repetidamente pelo bebê é essencial para a indução da lactação não gravídica. Para a lactogênese se efetivar é preciso que ocorra o desbloqueio da progesterona sobre os receptores de prolactina nas células alveolares. Nos primeiros dias após o parto a quantidade de colostro produzida aumenta e por volta do terceiro dia de puerpério as mamas tornam-se muito engurgitadas, doloridas e hipertérmicas. Sob efeito da prolactina formam-se glóbulos de leite dentro das células alveolares que ultrapassam a membrana celular e são armazenados nas luzes dos lóbulos. Este fenômeno é denominado apojadura do leite e dura em torno de 24 horas. A manutenção da produção do leite é denominada lactopoese. Nesta etapa os hormônios mais importantes são prolactina e ocitocina, cuja síntese e liberação são dependentes do estímulo aferente de sucção, resposta hipotalâmica e ação hipofisária. Dez dias depois do parto a concentração basal de prolactina sérica oscila em torno de 90ng/ml; aos 90 dias está por volta de 60ng/ml; e se mantida a lactação, 6 meses depois está ao redor de 30ng/ml, portanto dentro já da faixa de normalidade. Mas estes valores basais praticamente duplicam nas fases de pico induzido pela sucção, com duração aproximada de uma hora cada pico. Níveis elevados de prolactina não são necessários para a manutenção da lactação. A ocitocina, por sua vez, é liberada pela hipófise devido a estímulos relacionados com o choro do bebê, tato, estímulo visual e, principalmente, sucção. Quando o bebê suga, ocorre excitação de receptores sensoriais localizados na base e no interior da papila, que geram impulsos transmitidos ao longo de fibras nervosas do IV, V e Vl nervos torácicos até as raízes dorsais da medula espinhal e daí alcançam os núcleos paraventriculares e súpra-óticos do hipotálamo, onde células nervosas modificadas e especializadas produzem 23 ocitocina. A ocitocina é transportada pelos axônios até o lobo posterior da hipófise, onde fica armazenada até que novos impulsos aferentes induzam novamente a sua liberação. Pela corrente sanguínea a ocitocina atinge as células mioepiteliais da mama, que se contraem, ejetando o leite reservado nos espaços ductais, que se exterioriza pelo óstios mamilares (ejeção lactea). Enquanto durar a lactação, existem picos de secreção e liberação de ocitocina. Como a vida média deste hormônio é de 1 a 2 minutos, e o reflexo é imediato, a amamentação deve ser efetuada logo a seguir aos primeiros estímulos de sucção. 24 DESENVOLVIMENTO NORMAL A herança genética de dois cromossomos “X” na mulher determina a influência gonadale bioquímica que será exercida sobre o tecido mamário, especialmente na embriogênese e na puberdade. Esta influência depende de diversos hormônios de origem hipofisária, ovariana e supra-renal, como hormônio de crescimento a prolactina, estrogênios e progesterona que são reconhecidamente mamotróficos, induzindo ao alongamento e ramificação dos ductos mamários e à diferenciação lobular. Os estrogênios ovarianos são os principais responsáveis pelo desenvolvimento ductal. O crescimento e a formação dos ácinos dependem do efeito da progesterona combinada com os estrógenos, sempre em sinergia com os estímulos da prolactina e do hormônio de crescimento. Além destes, a tiroxina e a insulina exercem influência indireta no desenvolvimento da glândula mamária, através de processos metabólicos de produção de energia para as transformações teciduais. Mas o desenvolvimento normal da glândula mamária na mulher não depende só da produção e liberação dos hormônios mamotróficos; faz-se necessário sua interação celular local, através da síntese de fatores de crescimento, como IGF1 (“insunlin like growth factor–1”), EGF (“epidermal growth factor”), TGF–beta (“transforming growth factor–beta”), FGF (“fibroblast growth factor”) e peptídeos de família do gene Wnt. Estudos experimentais em 4. DESENVOLVIMENTO MAMÁRIO 25 camundongos indicam que estas substâncias estão intimamente relacionadas com a morfogênese ductal e lobular. Na puberdade ocorre o desenvolvimento das características sexuais secundárias da mulher. Intensas modificações de forma e volume mamários passam a ocorrer especialmente entre 10 e 12 anos. Em 80% das meninas a manifestação inicial da puberdade é a telarca (desenvolvimento das mamas), seguida da pubarca (aparecimento de pelos pubianos) e por último, da menarca (primeira menstruação). FASES DO DESENVOLVIMENTO MAMÁRIO O desenvolvimento da mama feminina pode ser dividido em 4 etapas: recém – nascimento, infância, puberdade e maturidade. No recém-nascido de ambos os sexos a mama é semelhante, sendo reconhecidos a aréola e o mamilo. Normalmente constata-se uma discreta porção de tecido mamário à palpação, provocada pelo estímulo hormonal via placentária que desaparece em torno de 15 dias de vida. De duas semanas de vida até o início da puberdade, a mama infantil passa longo período de inatividade; caracteriza-se apenas pela proeminência papilar e pela reduzida aréola que a circunda, com pouca pigmentação. Não se palpa parênquima mamário ou acúmulo adiposo. Na puberdade a mama começa a se elevar na superfície torácica devido ao acúmulo de tecido celular subcutâneo. As aréolas crescem e se hiperpigmentam. Torna-se possível palpar um botão glandular em desenvolvimento. Na maioria das vezes, o início do crescimento é bilateral e simétrico, mas pode ser assimétrico; nestes casos, a segunda mama deve passar a se desenvolver até 6 meses depois da primeira. Com a menarca ocorre novo estirão de crescimento mamário, com aumento de volume glandular e deposição de tecido gorduroso de forma organizada e harmônica. Na mama da mulher adulta o mamilo se apresenta mais proeminente e adquire capacidade de ereção. A mama bem desenvolvida adquire suas formas definitivas, acomodadas no coxim gorduroso. As glândulas sebáceas e 26 sudoríparas da aréola completam seu desenvolvimento. Estruturas pilosas desenvolvem-se também, especialmente justa-areolares. O desenvolvimento das mamas sob o ponto de vista morfológico externo, do padrão infantil ao adulto, termina geralmente aos 18 anos de idade. Tanner, em 1962 propôs uma classificação em estágios de desenvolvimento mamário na puberdade, que está discriminada no quadro 1d.1. DESENVOLVIMENTO LOBULAR A evolução e a diferenciação dos lóbulos com o passar da idade e da sensibilidade a eventos hormonais efetores permitem que os mesmos sejam classificados em subtipos: Lóbulo tipo I: É o tipo de lóbulo mais indiferenciado encontrado em nulíparas depois da puberdade. Existem 6–11 dúctulos em cada lóbulo deste tipo. Estes lóbulos apresentam alta taxa de proliferação celular e elevada concentração de receptores estrogênicos e de progesterona. Neste tipo de lóbulo inicia-se a maior parte dos carcinomas ductais de mama. Lóbulo tipo II: Com o processo de diferenciação , passam a existir numerosos dúctulos por lóbulo e começa a arborização lobular. Deve-se ao estímulo hormonal cíclico dos ovários. Lóbulo tipo III: Nos lóbulos tipo III existem em média 80 dúctulos ou pequenos alvéolos por lóbulo. Esta arborescência é fruto do estímulo hormonal da gravidez e é conseguida na etapa do segundo trimestre de gestação. Lóbulo tipo IV: Observado no final da gestação e durante a lactação, é caracterizado pela grande distensão lobular. É importante salientar que as mamas com lóbulos mais diferenciados e com menor número de lóbulos tipo I são aquelas menos suscetíveis à carcinogênese, como já foi comprovado clinica e experimentalmente. 27 DESENVOLVIMENTO ANORMAL Agenesia A agenesia é a ausência congênita de mama decorrente de mastogênese anômala. Pode ser unilateral ou bilateral, sendo que as anormalidades bilaterais são extremamente raras e quase sempre objetos de publicação. São descritas duas formas de agenesia: -completa ou amastia: ausência total de todas as estruturas mamárias. -incompleta: ausência de tecido mamário, mas com aréola e papila (amasia), ou ausência de papila e/ou aréola, mas com tecido mamário (atelia). A amastia pode ser familiar, e estar associada a outras malformações congênitas de tórax ou membros. Existe uma síndrome que é caracterizada por displasia ectodérmica, lipoatrofia, diabetes mellitus e amastia (AREDYLD síndrome: “acrorenal ectodermal dysplasia with lipotrophic diabetes”) Hipomastia Hipomastia ou hipoplasia é o desenvolvimento incompleto de uma ou das duas glândulas mamárias podendo ser congênita ou adquirida. Nestes casos, tipicamente o tecido mamário é formado por estroma fibroso e estrutura ductal rudimentar, sem diferençiação lóbulo-acinar. A deficiência hormonal estrogênica é a causa comum de hipoplasia mamária. É o caso da disgenesia gonádica, dos estados intersexuais, da insuficiência ovariana ou hipofisária e da síndrome adrenogenital congênita. Porém, na maior parte dos casos de hipomastia os ovários são funcionantes e existe perturbação (hipossensibilidade ) da resposta efetora tecidual ao estímulo hormonal. A síndrome de Poland é uma anomalia congênita caracterizada por hipomastia (ou amastia), ausência dos músculos peitorais e malformações no membro superior ipsilateral, como encurtamento ósseo e sindactilia. A hipoplasia 28 mamária ainda pode estar associada ao nevus de Becker que é uma lesão hiperpigmentada com pelos. Telarca Prematura Telarca prematura é o desenvolvimento mamário antes dos 8 anos de idade, em meninas que não apresentam outros sinais de puberdade precoce. Na grande maioria dos casos o quadro ocorre antes dos dois anos de vida da criança . Nestas pacientes, as gonotrofinas hipofisárias (FSH e LH) têm concentração sérica normal, e a resposta hipofisária ao teste de sobrecarga com LH – RH é também normal, ou seja, na telarca prematura o eixo hipotálamo - hipófise - ovariano apresenta-se normal. Da mesma forma não existe hiperprolactinemia e acredita-se que o quadro se deva a uma hipersensibilidade do tecido mamário aos estrogênios ainda que sejam secretados em reduzida quantidade na infância. Felizmente, na maior partedos casos de início precoce, o fenômeno é passageiro e a telarca regride espontaneamente com os anos, sem conduta específica. Hipermastia Hipermastia ou macromastia é o aumento excessivo do volume mamário, uni ou bilateral. Existem várias formas clínicas, provocadas por diferentes etiologias. A hipertrofia puberal (virginal) ocorre nos dois primeiros anos da adolescência, determinando mamas extremamente volumosas, que não regridem posteriormente. O aumento de volume é geralmente simétrico e bilateral. Histologicamente a alteração principal é hipertrofia do estroma. Seu tratamento é cirúrgico, através de mamoplastia redutora. A hipermastia gravídica, também conhecida por gigantomastia gravídica, desenvolve-se rapidamente no início da gestação. Trata-se de evento raro, estimado em um caso para cada 10.000 gestações. Ocorre mais 29 freqüentemente em primíparas, embora possa surgir, às vezes, na segunda ou terceira gestação. É grande a fibrose do estroma e a hiperplasia pseudoangiomatosa do estroma é muito proeminente. O quadro é atribuído à hipersensibilidade ao ambiente hormonal gravídico, provavelmente em especial à gonodotrofina coriônica, e quando ocorre em uma gestação, costuma repetir em outras subseqüentes. A terapia é a cirurgia plástica que em casos extremos de desconforto, inclusive respiratório, deve ser realizada durante a gestação. Após a plástica redutora o quadro ainda pode recidivar em futura gestação. A necrose isguêmica da pele pode levar à infecção secundária no órgão, que às vezes pode requerer até uma mastectomia para tratamento. Terapia medicamentosa com tamoxifeno ou bromoergocriptina foi tentada sem sucesso, por alguns autores. Vários medicamentos podem induzir à hipermastia, como, por exemplo, a penicilamina usada em artrite reumatóide e o anti-viral indinavir empregado em mulheres portadoras do vírus da imunodeficiência humana. Polimastia A polimastia é caracterizada pela presença de uma ou mais mamas supranumerárias. Resulta do desenvolvimento do tecido mamário ectópico em segmentos da crista mamária primitiva. Na sua forma mais comum a alteração é bilateral e o tecido mamário situa-se na região anterior da axila, mas é sabido que o tecido mamário pode desenvolver-se em qualquer ponto da crista mamária, entre a axila e a virilha e, excepcionalmente, até na vulva. Mamas supranumerárias ocorrem em aproximadamente uma para cada 100 mulheres, considerando-se as suas várias formas, que são: a) arremedo completo de mama, com tecido lobular, ductos e papila mamária; b) tecido glandular isolado, sem papila; e c) parênquima mamário rudimentar, com papila. Podem existir no sexo masculino, mas são mais raras que nas mulheres. Além de desconforto estético que freqüentemente justifica a remoção do tecido ectópico, as mamas supranumerárias podem ser foco de fenômenos 30 dolorosos funcionais cíclicos, podem engurgitar e inflamar no ciclo grávido puerpural e ainda ser sede de neoformação carcinomatosa. O tecido ectópico não é especialmente predisposto à carcinogênese, mas como qualquer tecido mamário pode sofrer transformação. Por tudo isto, a conduta deve ser individualizada, mas a indicação de retirada do tecido ectópico tem sido cada vez mais liberal. Politelia Denomina-se politelia a presença de pelo menos uma papila supranumerária. Os mamilos acessórios também podem se desenvolver em qualquer segmento da crista mamária, e é mais comum no tórax, principalmente na região logo abaixo do sulco infra-mamário. Sua freqüência é de aproximadamente um caso para 50 crianças. A politelia é assintomática e não implica em risco de transformação neoplásica e sua remoção obedece a critérios unicamente estéticos. Assim como na polimastia, homens e mulheres com politelia, são propensos a apresentar também malformações de áreas de vias urinárias, principalmente nos ureteres. Ginecomastia O desenvolvimento exagerado da glândula mamária no homem é denominado ginecomastia. Decorre de inúmeros fatores causais: constitucionais, metabólicos, hormonais, tumorais e iatrogênicos. Sua incidência tem sido crescente nos últimos anos, talvez em função do uso de anabolizantes em praticantes de musculação. Estabelecida a etiologia de cada caso, deve-se considerar a remoção cirúrgica do tecido sempre que houver repercussão estética. A cresce-se a este fato, o conhecimento de que ginecomastia representa um fator de risco para câncer de mama no homem. 31 Transformação Transsexual Outra forma anormal de desenvolvimento mamário é a transformação transsexual do órgão, obtida, através do uso de substâncias hormonais para adotar formas mamárias compatíveis com as do sexo oposto Homens usando estrogenioterapia ou castração química com ciproterona (bloqueio dos receptores androgênicos) conseguem silhueta mamária de aspecto feminino, com desenvolvimento intenso da estrutura lobular, tendo sido já referidos casos de carcinoma de mama em mamas deste tipo. 32 Quadro 1d.1. Estágios do desenvolvimento mamário propostos na classificação de Tanner. ESTÁGIOS IDADE CARACTERÍSTICAS Estágio I Mama Infantil pré-puberal Discreta proeminência do mamilo; ausência de tecido glandular palpável e de pigmentação areolar. Estágio II Broto mamário 11,1 + 1,1 anos O mamilo e a mama incipiente elevam-se na superfície do tórax; palpa-se pequena quantidade de tecido glandular. Estágio III Elevação da mama 12,2 + 1,09 anos Acúmulo de tecido glandular palpável, com aumento do volume mamário e do tamanho da aréola e início da pigmentação areolar; o contorno da mama e o mamilo ficam no mesmo plano. Estágio IV Aumento da mama e elevação do CAM 13,1 + 1,15 anos Aumento do tamanho da mama e da aréola e da pigmentação areolar e mamilar; o complexo areolar-mamilar forma uma pequena elevação em relação ao plano da superfície da mama. Estágio V Mama adulta 15,3 + 1,7 anos Forma globosa e esférica, mamilo proeminente e ereto, glândulas sudoríparas e sebáceas acessórias areolares formadas. 33 O processo de anamnese representa a essência da arte médica. Apesar de todo o desenvolvimento da tecnologia diagnóstica, a anamnese persiste sendo fundamental. Neste procedimento, desenvolve-se o conhecimento mútuo, a empatia e a confiança, o qual deve ser realizado com cordialidade e tranqüilidade. A paciente expressa suas sensações, demonstra as suas reações frente ao problema e fornece bases para o diagnóstico diferencial e orientação da propedêutica complementar. A anamnese sempre deve ser completa, com o objetivo de enfocar o pacientes como um todo, e não ser dirigida exclusivamente para a patologia mamária. A abordagem global auxilia na compreensão e orientação do caso, e muitas vezes detecta outras condições clínicas que requerem encaminhamento. A anamnese é subdividida em etapas: a) identificação; b) queixa e duração; c) história da moléstia atual; d) prevenção do câncer de mama; e) antecedentes; f) interrogatório sobre os diversos aparelhos; g) hábitos e estilo de vida. IDENTIFICAÇÃO São colhidas as seguintes informações: nome, idade, sexo, estado civil, profissão, procedência, endereço, número de telefone, fax e e-mail. 5. ANAMNESE 34 QUEIXA E DURAÇÃO A paciente explica o motivo da consulta, que pode ser destinada paraexames preventivos de rotina ou para atendimento de queixa específica. Se existe queixa, por exemplo, presença de nódulo, deve-se em seguida caracterizar há quanto tempo. HISTÓRIA DA MOLÉSTIA ATUAL Neste item, procura-se caracterizar o quadro para que se consiga, em função das informações, direcionar o diagnóstico. Por exemplo: interessa saber quantos cm mede um nódulo, se o mesmo está crescendo, se é acompanhado de fluxo papilar ou se existe linfadenomegalia axilar. Outro exemplo: frente a uma queixa de mastalgia é importante investigar a sua intensidade, o ciclismo, a influência do sistema nervoso, o uso de analgésicos, etc. É importante se pesquisar também se o sinal ou sintoma referido, já foi apresentado no passado, se foi tratado, como e qual o sucesso obtido com o tratamento prévio, ect. PREVENÇÃO DO CÂNCER DE MAMA Este tópico é tão importante na anamnese mastológica que merece ser enfocado à parte. Deve ser perguntado à paciente se ela faz mamografia regularmente, quando foi a última e qual seu resultado. De preferência os exames devem ser observados e analisados. A realização prévia de ultrassonografia mamária também deve ser pesquisada. Pergunta-se se a mulher tem o hábito de fazer auto-exame das mamas e se já foi treinada e estimulada a fazê-lo. 35 Pergunta-se também sobre quando foi o último exame físico feito por médico e sobre qual foi o resultado. ANTECEDENTES 1. Antecedentes mamários História de sinais e sintomas mamários prévios, e seus tratamentos. Já fez biópsia de mama anteriormente? Quantas? Qual a técnica de biópsia empregada e quais foram os resultados histopatológicos? Já amamentou? Quantas vezes e por quanto tempo? A amamentação foi normal ou aconteceram intercorrências? 2. Antecedentes ginecológicos Idade da menarca, tipo de ciclos menstruais e idade da menopausa. Deve-se perguntar sobre uso de métodos anticoncepcionais e de terapia de reposição hormonal: qual, por quanto tempo e aceitação. Tem feito exame de Papanicolaou e ultrassonografia pélvica? É pesquisada também a presença de doenças ginecológicas anteriores, seus tratamentos, especialmente se já fez histerectomia e por que. A atividade sexual tem sido satisfatória? Há repercussão do sintoma mamário sobre a libido, sexualidade e desempenho sexual? 3. Antecedentes obstétricos Número e evolução de gestações e partos prévios. Tipo de partos. É importante se pesquisar a idade da primeira gestação de termo, um dos parâmetros utilizados no cálculo do índice de risco de Gail. 4. Antecedentes pessoais Deve ser pesquisado o histórico de saúde da paciente, se já foi internada para tratamento clínico ou cirúrgico alguma vez e se há história de alguma patologia clínica e de tratamento medicamentoso crônico. Pela sua elevada 36 freqüência na população, hipertensão e diabetes precisam ser sempre interrogados. Já teve depressão? Faz uso de antidepressivos? Em casos de resposta positiva, qual medicamento, qual dose, e qual tem sido o efeito. 5. Antecedentes familiares Neste tópico pesquisa-se fundamentalmente a ocorrência de câncer de mama, ovário e útero nos familiares de primeiro grau e demais. A idade em que foram diagnosticados os tumores é importante, e deve ser sempre que possível obtida com precisão. Em casos de mamas acessórias ou de ginecomastia deve ser pesquisada a presença do evento nos pais e irmãos. INTERROGATÓRIO SOBRE OS DIVERSOS APARELHOS São repassados todos os órgãos e sistemas para um completo conhecimento do organismo do indivíduo, procurando-se identificar alterações que possam estar interferindo com a queixa mamária ou que mereça orientação ou encaminhamento a outro especialista. HÁBITOS E ESTILO DE VIDA Procura-se caracterizar a qualidade de vida da pessoa no seu ambiente doméstico, familiar, profissional e social. Prática de esportes, lazer e nível de estresse precisam ser avaliados. Tipo de dieta e condição de alimentação também são considerados. Pesquisa-se fumo, alcoolismo e uso de drogas. 37 O exame físico das mamas e de suas vias de drenagem linfática pode ser subdividido em 2 tempos: o primeiro tempo com a paciente sentada e o tempo seguinte com a paciente deitada. No primeiro tempo, com a paciente sentada, são executadas as manobras de 1. inspeção estática; 2. inspeção dinâmica; 3. palpação das mamas; 4. palpação das axilas e fossas supraclaviculares. No segundo tempo, com a paciente deitada, são executadas manobras de: 1. Palpação das mamas; e 2. Expressão do complexo aréolo-papilar. PRIMEIRO TEMPO - PACIENTE SENTADA 1. Inspeção estática A paciente deve estar sentada e dispor os braços estendidos ao lado do corpo (figura 1.1). Procura-se observar a simetria, o aspecto geral da pele, a presença da rede venosa superficial, a pigmentação do complexo aréolo-papilar, o aspecto das papilas, o tamanho, o contorno e forma das mamas e, especialmente, busca-se identificar áreas de abaulamento ou retração. 2. Inspeção dinâmica Alguns movimentos podem salientar assimetrias, abaulamentos ou retrações, em função de aderência de um tumor à musculatura da parede torácica, ou aos ligamentos de Cooper. São eles: a) elevação lateral dos braços; 6. EXAME FÍSICO 38 b) compressão manual da cintura e contração do músculo peitoral maior; c) inclinação do corpo para frente para que as mamas fiquem pendentes (figura 1.2). 3. Palpação das mamas É praticada de forma uni ou bi-manual pela palpação e compressão do tecido mamário entre os dedos do examinador, através da manobra de “pinça digital”, que permite investigar a mobilidade das mamas e a palpação dos diferentes quadrantes (figura 1.3). Esta manobra é especialmente útil para a identificação de lesões císticas profundas, próximas ao espaço retro-mamário. Através da “pinça digital”, tomando-se o tumor palpável entre o indicador e o polegar e o deslocando para trás, pode-se observar a pele sobre o tumor. Nos casos de tumores malignos, a retração do tegumento sobre o nódulo costuma ficar evidente, enquanto que nos benignos a retração geralmente não ocorre. Uma outra manobra que pode tornar perceptíveis lesões pequenas e profundas é a palpação das mamas pendentes, com a paciente inclinando seu corpo para frente, estendendo suas mãos para apoiá-las na mão de um auxiliar (figura 1.4). 4. Palpação das axilas e das regiões supraclaviculares e subclaviculares A palpação destas vias de drenagem linfática da mama é fundamental para a identificação de linfonodos suspeitos de envolvimento, anotando-se suas características: número, volume, consistência, mobilidade, coalescência e sensação dolorosa. No câncer de mama os linfonodos tendem a serem duros e não dolorosos e em casos avançados costumam estar aderidos à pele ou ao plano muscular profundo e, às vezes, coalescentes. Em processos benignos acompanhados de linfadenopatia, os linfonodos geralmente tem consistência amolecida e podem ser dolorosos ao tato. O correto exame de axila exige técnica adequada,com completo relaxamento do braço. Recomendamos a técnica na qual a mão esquerda do 39 examinador palpa a axila direita, repousando-se o braço da paciente flexionado sobre o braço do examinador, fazendo-se o mesmo do lado oposto (figura 1.5). O examinador introduz seus dedos, até o ápice da axila, abaixo do músculo peitoral maior e vem deslizando as polpas digitais contra a parede torácica em direção inferior, com delicadeza e atenção. A fossa supraclavicular e a região subclavicular são palpadas com o examinador na frente da paciente, aplicando-se a face palmar de seus dedos em movimentos de dedilhamento e de deslizamento, primeiro para cima da clavícula e depois para baixo. Quando se palpa a fossa supraclavicular esquerda solicita-se que a paciente gire seu rosto para a direta, e vice-versa (figura 1.6). Na região subclavicular, raramente se identificam linfonodos, o que ocorre apenas quando aqueles localizados no ápice da axila tornam-se muito aumentados e endurecidos, e podem ser percebidos apesar da interposição das fibras e músculo do peitoral maior. SEGUNDO TEMPO - PACIENTE DEITADA 1. Palpação das mamas Solicita-se à paciente que se deite com as mãos sob a cabeça, de forma a distender suas mamas sobre a parede torácica. Sempre que possível este exame deve ser feito na primeira fase do ciclo menstrual, quando os tecidos estão menos engurgitados e sensíveis à dor, facilitando a identificação de pequenas nodulações. A palpação das mamas é o tempo principal do exame físico mamário. Quando há história de nódulo, inicia-se palpando a mama considerada normal e depois a afetada. Com primeiro tempo, palpa-se a mama através da manobra de dedilhamento bimanual, semelhante ao ato de se tocar piano conhecida como método palpatório de Bloodgood (figura 1.7). A mama é dedilhada inteiramente, parte por parte, inicialmente na região central, e depois através de movimentos circulares concêntricos, a partir da aréola, incluindo toda a mama, e o seu prolongamento axilar (cauda de Spence). 40 Depois, realiza-se a palpação bimanual bipalmar, em que se comprime o tecido mamário contra a parede torácica, e novamente a mama é palpada parte por parte (figura 1.8). Um recurso opcional é a manobra de deslizamento digital com o auxílio de substância gelatinosa ou solução hidratante, que facilita o reconhecimento de lesões muito pequenas. Termina-se a palpação palpando-se especificamente o mamilo, que deve ser sentido entre os dedos polegar e indicador. O principal achado da palpação das mamas é o nódulo, que é uma lesão tridimensional, que quando identificado deve ser bem caracterizado, analisando-se diversos parâmetros. - Número. Anota-se o nódulo é único ou se existe multiplicidade. - Tamanho. Expressa-se as dimensões do nódulo em cm, devendo ser citadas as duas maiores dimensões em eixo perpendicular, recurso útil para cálculo da área tumoral para monitorização de tratamento neoadjuvante. - Localização. Deve-se referir a região da mama onde se situa a lesão: súpero-lateral, súpero-medial, ínfero-lateral, ínfero-medial ou central. - Forma. Verificar se a forma é arredondada, esférica ou irregular. - Superfície. Lisa (aspecto encapsulado ou não) ou irregular. Lesões ulceradas devem ser palpadas usando-se luvas. - Consistência. Dura, fibroelástca ou cística. - Delimitação. Limites precisos ou imprecisos. - Mobilidade. Caracteriza-se a lesão como móvel, parcialmente móvel ou imóvel, em decorrência de aderência à pele ou planos profundos. - Sensação dolorosa. Deve ser referido se o nódulo é doloroso ou não à palpação. Não existe nenhum achado palpatório patognomônico de malignidade ou de benignidade, mas um examinador experiente ao integrar todas as informações, tem elevado índice de acerto quando à natureza da lesão. Os nódulos malignos tendem a ter formato e superfície irregulares, consistência dura, limites imprecisos, pouca mobilidade e serem indolores; os benignos costumam ter características opostas. 41 2. Expressão do complexo aréolo-papilar Comprimindo-se entre os dedos, indicador e polegar, o complexo aréolo- papilar, procura-se observar a saída de material pelos orifícios da superfície cutânea da papila. A expressão precisa ser delicada, evitando-se traumatizar os tecidos, e causar desconforto ou hemorragia. Inicia-se com a expressão mais superficial da região subareolar. Depois, faz-se a expressão a partir das regiões mais profundas, trazendo-se os dedos centripetamente até o mamilo (figura 1.9). Deve-se anotar oposição na papila onde há extravazamento de líquido e, quando isto ocorre, através da palpação digital radial, no setor tido como afetado, deve-se procurar o “ponto do gatilho”, ou local a ser pressionado para se conseguir provocar a descarga papilar. Sabe-se que o fluxo papilar significante é o espontâneo, mas a saída de qualquer material, ainda que provocado pela expressão pode ter importância clínica quando o mesmo for unilateral, hemorrágico ou cristalino, principalmente se associado à alteração palpatória ou mamográfica. 42 II. ALTERAÇÕES BENIGNAS 43 Mastalgia, ou dor mamária, é o principal sintoma das alterações funcionais benignas das mamas (AFBM) que representam a condição clínica caracterizada por mastalgia e/ou espessamento mamário, que surge no início do menacme, geralmente exibe reforço pré-menstrual e tende a desaparecer com a menopausa. É do conhecimento geral que a dor mamária apresenta alta freqüência, sendo queixa muito comum nos ambulatórios, e ainda mais, que grande parte das mulheres que padecem de sintomas leves jamais procuraram tratamento médico, o que dá uma dimensão maior à sua prevalência. No Brasil, foi efetuada por uma investigação epidemiológica visando pesquisar a prevalência de mastalgia em população universitária feminina constituída por 1.079 estudantes da Universidade de Santo Amaro, com idade entre 17 e 45 anos. Constatou-se que a prevalência de mastalgia foi de 66,2% (715 casos), portanto, acometendo aproximadamente dois terços das mulheres na idade do menacme. Além disto, neste estudo, através de classificação de intensidade sintomática empregada ficou evidenciado que a grande maioria dos casos ocorre na forma leve, onde embora a sensação dolorosa seja perceptível, não há repercussões na qualidade de vida das mulheres. O quadro 7.1 apresenta os resultados desta pesquisa e discrimina os graus de intensidade da mastalgia verificados. Geralmente a mastalgia inicia-se no começo do menacme, por volta dos 20 anos, e nesta fase costuma não apresentar alterações palpatórias importantes. A sensação dolorosa é quase sempre de leve intensidade, raramente é severa e, na grande maioria das vezes, apresenta reforço sintomático pré-menstrual com sinais de engurgitamento local. Mais tarde, geralmente em torno dos 30 anos, existe tendência à dor ser acompanhada por espessamento de parênquima. Evidenciam-se irregularidade e nodularidade do tecido, principalmente nos quadrantes súpero-laterais, que se 7. MASTALGIA 44 apresentam como áreas granulosas à palpação. Pequenos nódulos agrupados tendem a formar placas de espessamento endurecido. Às vezes a acentuada fibrose determina um nódulo dominante, com três dimensões – altura, comprimento e largura – que chega a simular umaneoplasia. É muito comum nas AFBM o fluxo papilar. Nesta circunstância o fluxo é quase sempre bilateral, exteriorizando-se por vários orifícios de cada lado, e de forma não espontânea, isto é, ocorre apenas mediante expressão. Apresenta coloração esbranquiçada, amarelada, acastanhada, esverdeada. FISIOPATOLOGIA As AFBM são resultado da interação dos fatores hormonais desencadeantes, com outros fatores agravantes nutricionais, metabólicos e emocionais (figura 7.1). As AFBM ocorrem no menacme, geralmente obedecem a um ciclismo com reforço pré-menstrual, são mais freqüentes em mulheres com baixa paridade, regridem com a menopausa e tendem a reaparecer com a terapia de reposição hormonal: é lógico se supor que tenha origem hormonal. Uma ação predominante estrogênica sobre o tecido epitelial da mama, sobre o qual promove alongamento e dilatação dos ductos, induz à proliferação e à retenção de sódio e água, o evento fisiopatológico principal. Embora se reconheça que o estrogênio seja condição necessária para o aparecimento da dor mamária cíclica e cistos é bem sabido que a concentração de estradiol plasmático das mulheres com mastalgia não difere do grupo controle e também que nestas mulheres não existe insuficiência progesterônica. Inúmeros estudos comprovam esta assertiva. Ao que tudo indica a relação estrogênio e mastalgia não depende de hipersecreção ou hiperfunção, mas de tempo de estimulação prolongado. Ou seja, considerando-se que as mulheres que têm múltiplas gestações e filhos são menos propensas à dor mamária, e que ao contrário, aquelas que experimentam um número maior de ciclos menstruais – por não estarem grávidas, - são mais predispostas pode-se imaginar que a repetição dos ciclos menstruais, que em última análise significa população folicular ovariana produzindo e lançando 45 estradiol na circulação mensalmente, signifique a condição facilitadora para o estímulo intenso e repetitivo. Além disso a flutuação cíclica de estradiol cria gradiente local nos pequenos ductos mamários (abrir e fechar) também repetitivo e cíclico que propicia a formação dos cistos. As inter-relações entre os esteróides ovarianos e a secreção de prolactina são complexas, porém sabe-se que o hiperestrogenismo tende a se acompanhar de hiperprolactinemia, se não for compensado por aumento do tônus central dopaminérgico, frenador da liberação de prolactina. A associação entre prolactina e AFBM também não é bem compreendida, mas existe liberação facilitada de prolactina nas mulheres com mastalgia cíclica e drogas com ação antiprolactínica promovem alívio significativo da dor mamária quando comparadas a placebo. Porém, não existe hiperprolactinemia na grande maioria das mulheres com mastalgia. Demonstrou-se que existem nas AFBM alterações cronobiológicas no ritmo circadiano normal da prolactina, com picos noturnos mais elevados, valores anormais pela manhã nos dias correspondentes à fase lútea do ciclo menstrual e redução da amplitude de variação normal circanual. O estado de estresse pode interferir na determinação de disfunção neuroendócrina, caracterizada pela inapropriada resposta do tônus dopaminérgico. A tensão emocional tem capacidade de promover liberação cerebral de opióides endógenos e de fatores neuroendócrinos, como a serotonina, que reconhecidamente reduzem a liberação de dopamina. A mastalgia não é evidentemente um problema psiconeurótico, todavia as emoções podem desempenhar papel agravante, potencializando as reações ao incômodo mamário. Estudos psicológicos demonstraram que as mulheres com mastalgia são mais ansiosas e, outrossim, apresentam mais depressão e problemas sociais do que as demais. No passado, foi sugerido que existia insuficiência progesterônica associada a mastalgia, mas acabou sendo demonstrado que esta insuficiência não existe. Uma relação aumentada entre ácidos graxos saturados e insaturados produz uma condição de hipersensibilidade hormonal aos estrogênios e à prolactina, provavelmente devido à dificuldade na síntese de prostaglandina E1, que é um modulador da ação hormonal. A deficiência na ingestão de ácidos 46 graxos essenciais insaturados, como o linolênico, diminui a formação de ácido aracdônico e prostaglandina E1. As metilxantinas existentes no café, chá, chocolate e refrigerantes (coca- cola), quando ingeridas em excesso, facultam maior sensibilidade do tecido efetor mamário ao estímulo hormonal. As metilxantinas têm a propriedade de elevar os níveis de adenosina monofosfato cíclico (AMPc) na célula mamária, em resposta à liberação de catecolaminas. Estudos em animais informam também que a ingestão exagerada de cafeína causa elevação de prolactina sérica. Não existem trabalhos conclusivos a respeito da retenção hídrica, que parece atuar como fator agravante da mastalgia. Por um lado sabe-se que a água corpórea total nas mulheres com mastalgia cíclica não está elevada na segunda fase do ciclo, mas, por outro, se pode aventar que um eventual edema intramamário neste período poderia ocorrer. Na prática observa-se com certa freqüência inchaço mamário pré-menstrual coincidente com mastalgia, especialmente em mulheres com tensão pré-menstrual. A ação hormonal, principalmente o efeito estrogênico repetitivo, leva a alterações microscópicas no tecido epitelial da árvore glandular mamária, que atua como órgão alvo dos estímulos hormonais. O substrato tecidual das AFBM é representado pelas alterações fibrocísticas, tipicamente evidenciadas por fibrose de estroma, cistos e proliferação epitelial leve (até quatro camadas de células epiteliais revestindo os ductos). A figura 7.2 apresenta uma visão microscópica. Não se acredita que a ocorrência de AFBM aumente o risco da mulher para desenvolver câncer de mama. Em importante trabalho que ficou reconhecido como marco referencial no estudo da associação alteração funcional e câncer, Dupont e Page em 1985, apresentaram os resultados de seguimento de 3.303 pacientes que se submeteram à biópsia de mama e cujos laudos histopatológicos revelaram lesões fibrocísticas. Estas pacientes foram acompanhadas por um período médio de 17 anos. Segundo estes autores, não há elevação de risco de câncer de mama diante de adenose, metaplasia apócrina, microcistos, macrocistos, proliferação leve (entre duas e quatro camadas de células epiteliais), ectasia ductal, fibrose de 47 estroma e metaplasia escamosa. O risco relativo de câncer de mama se eleva discretamente (1,5 a 2) na hiperplasia moderada (com mais de quatro camadas celulares acima de membrana basal, seja na forma de epiteliose ou na de papilomatose) e na adenose esclerosante. O risco relativo é alto apenas nas hiperplasias atípicas (4 a 5), chegando a 9 dos casos de hiperplasia atípica com história familiar de câncer de mama. É importante ficar bem claro que a hiperplasia atípica, esta sim um marcador de risco importante, não guarda relação com o sintoma de mastalgia. Pode ser identificada eventualmente coincidentemente com o quadro de AFBM, mas quase sempre aparece após biópsia orientada por mamografia, devido a alterações mamográficas. DIAGNÓSTICO O diagnóstico de AFBM é realizado basicamente pela história clínica e pelo exame físico, que evidenciam mastalgia e nodularidade na palpação. A propedêutica complementar representada pelos métodos de diagnóstico por imagem e exames citológicos e histopatológicos, pode ser indicada com a finalidade precípua de excluir a concomitância de câncer. Com este intuito a mamografia é solicitada de rotina a partir de 35 anos (basal) e depois de 40 anos anualmente
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