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A Riqueza na Base da Pirâmide
Por C.K. Prahalad e Stuart L. Hart
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A RIQUEZA NA BASE DA PIRÂMIDE 2
MERCADOS DE BAIXA RENDA OFERECEM UMA GRANDE OPORTUNIDADE
PARA AS GRANDES ORGANIZAÇÕES MUNDIAIS: OBTER RIQUEZA E AO
MESMO TEMPO LEVAR PROSPERIDADE AOS MAIS POBRES.
Com o fim da Guerra Fria, a União Soviética e seus aliados, assim como a China, a Índia e a América
Latina, resolveram abrir seus mercados aos investimentos estrangeiros quase que por impulso,
seguindo uma grande tendência daquela época. Essa significativa mudança socioeconômica abriu
um grande leque de oportunidades para as organizações multinacionais, que até hoje não passou
de uma promessa que ainda está por se realizar.
Isso ocorreu, em primeiro lugar, devido à falsa expectativa (precipitadamente superestimada) de
que haveria milhões de consumidores de classe média nos países em desenvolvimento clamando
por produtos das multinacionais. Para piorar, as crises financeiras da Ásia e da América Latina
diminuíram amplamente a atratividade dos mercados emergentes. Como conseqüência, algumas
organizações multinacionais retraíram seus investimentos e começaram a repensar a estrutura de
riscos e ganhos nesses mercados. Essa retração pode se agravar devido à onda de ataques terroris-
tas nos Estados Unidos em setembro de 2001.
A falta de criatividade que esteve presente durante a última década na maioria das estratégias traçadas
pelas multinacionais para os mercados emergentes não alterou a magnitude dessa oportunidade, que
é realmente muito maior do que se imaginou. A verdadeira promessa do mercado não está na minoria
rica do mundo desenvolvido ou nos consumidores emergentes da classe média: está nos bilhões de
pessoas que estão participando da economia de mercado pela primeira vez.
É hora das organizações multinacionais começarem a rever suas estratégias de globalização e a
adotar a nova lente do capitalismo inclusivo. Para organizações que contam com os recursos e a
persistência necessários para competir na base da pirâmide, os retornos esperados incluem cres-
cimento, lucros e contribuições inestimáveis à humanidade. Países que ainda não possuem uma
moderna infra-estrutura ou produtos para atender às necessidades mais básicas das pessoas são
excelentes “laboratórios” para o desenvolvimento de tecnologias mais sustentáveis e produtos
para o mundo inteiro.
Além disso, o investimento das multinacionais na base da pirâmide significa retirar bilhões de pes-
soas da pobreza e do desespero, prevenindo o declínio das condições sociais, o caos político, o
terrorismo e a deterioração ambiental que certamente permanecerá se a lacuna entre países ricos
e pobres continuar aumentando.
Realizar negócios com os 4 bilhões de pessoas mais pobres do mundo – 2/3 da população mundial
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A RIQUEZA NA BASE DA PIRÂMIDE 3
– exigirá inovações radicais em tecnologia e no modelo de negócios. Para isso, as organizações
multinacionais terão que reavaliar a relação preço-performance de seus produtos/serviços, além
de buscar um novo nível de eficiência do capital e novos métodos para medir o sucesso financeiro.
As organizações serão forçadas a rever seu entendimento de escala – abandonar o mito de que
“quanto maior é melhor” e passar a adotar um sistema altamente descentralizado, com operações
em pequena escala, mas com capacidade de alcance mundial.
Em resumo, a população de baixa renda criou um novo desafio para as grandes organizações
mundiais: ajudar a população de baixa renda a melhorar sua qualidade de vida, produzindo e distri-
buindo produtos/serviços que estejam de acordo com os padrões culturais de cada local e que
sejam, ao mesmo tempo, ecologicamente sustentáveis e economicamente rentáveis.
QUATRO CAMADAS DE CONSUMIDORES
Bem no topo da pirâmide econômica mundial estão os 75 a 100 milhões de consumidores mais
ricos. (Veja figura 1) Esse é um grupo composto pelas pessoas de renda alta e média dos países
desenvolvidos e pelas poucas elites do mundo em desenvolvimento. No meio da pirâmide, nas
camadas 2 e 3, estão os consumidores pobres das nações desenvolvidas e a classe média emergen-
te dos países em desenvolvimento, principais alvos das antigas estratégias para mercados emergen-
tes. Agora considere os 4 bilhões de pessoas na camada 4, na base da pirâmide. A renda per capita
anual - baseada na paridade do poder de compra em dólares americanos - é inferior a $1.500, valor
considerado como mínimo necessário para sustentar uma vida decente. Para mais de um bilhão de
pessoas - aproximadamente 1/6 da humanidade - a renda per capita é inferior a $ 1 por dia. Mais
importante ainda é notar que a desigualdade de renda entre ricos e pobres está aumentando. De
acordo com as Nações Unidas, os 20% mais ricos do mundo possuíam cerca de 70% da renda total
em 1960. Em 2000, esse número aumentou para 85%. Considerando esse mesmo período, a fração
Figura 1. A pirâmide econômica mundial
Renda per capita anual em dólares (*) População em milhõesCamada
Mais de $20.000 75 - 1001
$1.500 - $20.000 1.500 - 17502 & 3
Menos de $1.500 4.0004
(*) Baseado na paridade do poder de compra nos EUA.
Fonte: U.N. World Development Reports
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A RIQUEZA NA BASE DA PIRÂMIDE 4
de renda correspondente aos 20% mais pobres do mundo caiu de 2,3% para 1,1%.
Essa extrema desigualdade na distribuição de riqueza acaba por reforçar o mito de que os pobres
não podem participar da economia de mercado global, mesmo considerando que eles correspondem
à maioria da população. De fato, dado ao grande tamanho, a camada 4 representa uma oportunida-
de multitrilhonária. De acordo com as projeções do Banco Mundial, a população da base da pirâmi-
de poderá aumentar para mais de 6 bilhões de pessoas nos próximos 40 anos, devido ao cresci-
mento da população mundial. A percepção de que a base da pirâmide não é um mercado viável
também é equivocada por não valorizar a crescente importância da economia informal, que em
algumas estimativas corresponde entre 40 e 60% de toda atividade econômica nos países em
desenvolvimento. A maioria da população inserida na camada 4 mora em aldeias rurais, em bairros
urbanos pobres ou em favelas e normalmente não possui títulos legais de seus ativos (por exemplo,
escritura da casa ou de outra propriedade imóvel ). Essas pessoas têm pouca ou nenhuma educa-
ção formal e lutam por um maior acesso ao crédito e às comunicações. A qualidade e a quantidade
dos produtos/serviços voltados para a camada 4 é geralmente baixa. Portanto, assim como apenas
a ponta do iceberg permanece visível, esse volumoso segmento da população global – e a expres-
siva oportunidade de mercado que ele representa – tem permanecido invisível aos olhos do setor
corporativo. Felizmente, o mercado da camada 4 está largamente aberto a inovações tecnológicas.
Entre as diversas possibilidades de inovação, as organizações multinacionais podem ser líderes em
desenvolver produtos que não repitam os mesmos erros do passado. As multinacionais de hoje
nasceram em uma época em que os recursos naturais eram abundantes, contribuindo para que os
produtos/serviços consumissem muitos recursos e fossem excessivamente poluentes. Os 270 mi-
lhões de americanos - somente 4% da população mundial - consomem mais de 25% dos recursos
energéticos do planeta. Reproduzir esse padrão de consumo nos países em desenvolvimento pode
ser desastroso.
Nós vimos como os menos privilegiados da camada 4 podem desestruturar o estilo de vida e a
segurança dos mais ricos da camada 1 – a pobreza produz descontentamento e extremismos.
Embora uma plena igualdade de renda nos pareça algo utópico, o uso do desenvolvimento comer-cial/econômico como ferramenta para tirar as pessoas da pobreza e dar a elas a chance de uma
vida melhor é algo crítico para assegurar estabilidade e saúde da economia global e para dar
continuidade ao sucesso das organizações multinacionais ocidentais.
A OPORTUNIDADE INVISÍVEL
A grande maioria das “200 maiores” organizações multinacionais do mundo está sediada nos países
desenvolvidos. Dessas duzentas, 82 são corporações americanas e 41 são japonesas, de acordo
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A RIQUEZA NA BASE DA PIRÂMIDE 5
com a lista feita em dezembro de 2002 pelo Instituto de Estudos de Políticas Públicas (Institute for
Policy Studies), sediado em Washington, D.C. Não chega a ser surpresa o fato das multinacionais
estarem focadas nos consumidores da camada 1, devido aos seus conhecimentos e familiaridade
em relação a essa categoria. A competência para perceber oportunidades de mercado está relaci-
onada à maneira como os gestores estão acostumados a pensar e às ferramentas analíticas que eles
utilizam. A maioria das multinacionais automaticamente desconsidera a base da pirâmide porque
julga o mercado de acordo com a renda, priorizando produtos/serviços apropriados aos países
desenvolvidos. Para aproveitar o potencial de mercado da camada 4, as organizações multinacionais
devem analisar uma série de premissas e práticas que exercem grande influência na visão que
temos dos países em desenvolvimento. Nós identificamos alguns mitos como ortodoxias larga-
mente compartilhadas que devem ser reexaminadas:
Mito 1: Os mais pobres não são nosso alvo de consumidores porque não temos como competir
rentavelmente no mercado, respeitando nossa atual estrutura de custos.
Mito 2: Os mais pobres não possuem recursos e não têm necessidade de produtos/serviços
vendidos nos países desenvolvidos.
Mito 3: Somente desejos e necessidades dos mercados desenvolvidos justificam investimentos em
novas tecnologias. Os mais pobres podem utilizar uma geração mais antiga de tecnologia.
Mito 4: A base da pirâmide não é importante para a viabilidade de longo prazo do negócio. Nós
podemos deixar a camada 4 para os governantes e para as organizações do terceiro setor.
Mito 5: Os executivos não ficam entusiasmados com desafios de negócio que envolvam uma
dimensão humanitária.
Mito 6: Intelectuais querem trabalhar nos mercados desenvolvidos. É raro encontrar executivos
de talento que queiram trabalhar na base da pirâmide.
Figura 2. Inovações e as implicações para as organizações multinacionais na camada 4
Forças de inovação Implicações para as multinacionais
Maior acesso à TV e a informações entre pessoas de baixa 
renda.
Diminuição do papel dos governos e do auxílio 
internacional.
Excesso de capacidade e intensa competição nas camadas 
1, 2 e 3.
A necessidade de desestimular a migração para os super 
povoados centros urbanos.
A camada 4 começa a tomar conhecimento de produtos e 
serviços e com isso passa a buscar usufruir dos seus benefícios.
Maior atratividade para investimentos das organizações 
multinacionais em países em desenvolvimento e maior 
cooperação das ONGs.
A camada 4 representa um mercado praticamente 
intocado para o crescimento dos lucros.
Multinacionais devem criar produtos e serviços para as 
populações rurais.
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A RIQUEZA NA BASE DA PIRÂMIDE 6
Cada um desses mitos ignora o valor que existe na base da pirâmide. É como a história da pessoa
que encontra uma nota de $20 na calçada. A sabedoria econômica convencional sugere que se essa
nota realmente existir, alguém a pegará! Assim como a nota de $20, a base da pirâmide também é
uma grande oportunidade para o crescimento dos lucros. Considere as ondas de inovação e as
oportunidades para as organizações na camada 4. (Veja a figura 2) As organizações multinacionais
devem reconhecer que esse mercado corresponde a um grande desafio: como combinar baixo
custo, boa qualidade, sustentabilidade e rentabilidade?Além disso, as multinacionais não podem
explorar essa nova oportunidade sem repensar de forma radical como irão atuar no mercado. A
figura 3 sugere algumas áreas em que uma nova perspectiva é necessária para criar mercados
rentáveis na camada 4.
PIONEIRISMO NA BASE DA PIRÂMIDE
A Hindustan Lever (HLL), subsidiária da gigante Unilever e amplamente reconhecida como a mais
bem administrada companhia da Índia, foi a pioneira entre as organizações multinacionais a explo-
rar mercados na base da pirâmide. Por mais de 50 anos, a HLL serviu à pequena elite indiana que
tinha condições de comprar seus produtos. Em 1990, uma firma local chamada Nirma começou a
oferecer detergentes para consumidores das classes C e D, a maioria habitantes da área rural. De
fato, a Nirma criou um novo sistema de negócio que incluía nova formulação do produto, processo
produtivo de baixo custo, ampla rede de distribuição, embalagens voltadas para compras menores
(feitas diariamente) e preços bem mais acessíveis.
A HLL, num comportamento típico das multinacionais, inicialmente ignorou a estratégia da Nirma.
Contudo, como a Nirma cresceu muito rapidamente, a HLL começou a ver sua concorrente local
ocupando um espaço que estava vazio no mercado. Foi então que a HLL percebeu que estava
perdendo uma grande oportunidade: em 1995, a empresa respondeu com um novo produto para
esse mercado, alterando drasticamente sua estrutura de modelo de negócio.
O novo sabão em pó da HLL, chamado Wheel, foi formulado para reduzir a proporção de óleo em
água quando da utilização do produto, considerando o fato de que os mais pobres freqüentemente
lavam suas roupas nos rios ou em outros sistemas públicos de água. A HLL descentralizou a produ-
ção, o marketing e a distribuição do produto, contribuindo para alavancar o desenvolvimento do
pólo rural da Índia. Rapidamente foram criados novos canais de venda para chegar aos milhares de
pontos de venda onde os consumidores da base da pirâmide costumam comprar. A HLL também
alterou a estrutura de custo do produto, fazendo com que o Wheel pudesse ser introduzido a um
preço baixo.
Hoje, a Nirma e a HLL são competidoras muito próximas no mercado de sabão em pó. De acordo
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A RIQUEZA NA BASE DA PIRÂMIDE 7
com a IndiaInfoline.com, um serviço de inteligência e pesquisa de mercado, cada uma possui 38% de
market share. A análise da própria Unilever a respeito da competição entre as duas empresas no
negócio de sabão em pó revelou algo além do potencial lucrativo do mercado localizado na base da
pirâmide. (Veja figura 4)
Contrariando os mitos populares, os mais pobres podem ser um mercado bastante rentável -
especialmente se as multinacionais estiverem dispostas a alterar seu modelo de negócios. A camada
4 não é um mercado que suporta altas margens; assim, os lucros serão gerados pelo volume e pela
eficiência do capital. As margens devem ser baixas, mas a venda de unidades deve ser extremamen-
te alta. Executivos que focam o lucro bruto operacional irão perder a oportunidade na base da
pirâmide; executivos que inovam e focam o lucro líquido serão recompensados.
A Nirma se tornou uma das maiores marcas de sabão em pó do mundo. Já a HLL foi estimulada
pela sua concorrente e mudou seu modelo de negócio, registrando um crescimento de 20% nas
receitas anuais e 25% de crescimento anual nos lucros entre 1995 e 2000. Dentro do mesmo
período, a capitalização de mercado da HLL cresceu para $12 bilhões - uma taxa de 40% de
crescimento ao ano. A Unilever também se beneficiou da experiência de sua subsidiária na Índia. A
empresa transportou os princípios do novo modelo de negócio da HLL (não o produto ou a
marca) para criar um novo mercado de sabão em pó entre os mais pobres no Brasil, onde a marca
Ala teve um grande sucesso. Mais importante ainda foi o fato da Unilever adotar a base dapirâmide
como uma estratégia corporativa prioritária.
Como pudemos observar no exemplo da Unilever, deve-se partir da seguinte premissa: servir à
camada 4 implica combinar o melhor em tecnologia com uma base de recursos global para se
adaptar às condições do mercado local. Produtos baratos e de baixa qualidade não são o objetivo.
O potencial da camada 4 não pode ser realizado sem uma atitude empreendedora: o desafio
estratégico para os executivos é visualizar um mercado ativo onde hoje só existem pessoas com
baixíssima renda. Isso exige tremenda imaginação e criatividade para criar uma infra-estrutura de
mercado num setor completamente desorganizado.
Servir ao mercado da camada 4 não é a mesma coisa que servir aos atuais mercados de forma mais
eficiente. Primeiramente, os gestores precisam desenvolver uma estrutura comercial voltada aos
desafios e necessidades da camada 4. Criar uma nova infra-estrutura para esse mercado deve ser
visto como um investimento tão importante quanto os investimentos em fábricas, processos, pro-
dutos e P&D.
Além disso, contrariamente às estratégias de investimento convencionais, nenhuma empresa pode
fazer isso sozinha. Muitos outros agentes devem ser envolvidos, incluindo autoridades governa-
mentais locais, organizações não-governamentais (ONGs), comunidades, instituições financeiras e
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A RIQUEZA NA BASE DA PIRÂMIDE 8
outras organizações. Os quatro elementos-chave para obter sucesso no mercado da camada 4 são:
criar poder de compra, formatar aspirações, ampliar o acesso e construir soluções locais.
(Veja figura 5)
Cada um desses quatro elementos exige inovações radicais em tecnologia, modelo de negócio e
gestão de processos. As lideranças dos negócios devem estar dispostas a experimentar, colaborar
e empoderar os agentes locais, criando novas fontes de vantagem competitiva e riqueza.
CRIANDO PODER DE COMPRA
De acordo com o relatório de 2001 da Organização Internacional do Trabalho, quase um bilhão de
pessoas - aproximadamente 1/3 da força de trabalho mundial - está desempregada ou subempregada,
não tendo condições de sustentar a si nem à sua família. Auxiliar o mundo dos países subdesenvol-
vidos a ultrapassar essa linha de miséria é uma oportunidade para ter sucesso fazendo o bem. Para
isso duas intervenções são cruciais: prover acesso ao crédito e aumentar o potencial de ganho dos
mais pobres. Algumas organizações já perceberam isso e começaram essa jornada, obtendo resul-
tados positivos.
O crédito comercial historicamente tem sido negado àqueles que são muito pobres. Mesmo as
pessoas de baixa renda que têm acesso aos bancos, como não possuem garantias para oferecer,
dificilmente conseguem obter crédito do sistema bancário tradicional. Como o economista peru-
ano Hernando de Soto demonstrou em seu trabalho “O Mistério do Capital”, o crédito comercial
está voltado para construir uma economia de mercado. O acesso ao crédito nos Estados Unidos
permitiu às pessoas mais humildes conquistar pouco a pouco sua igualdade e realizar mais aquisi-
ções como casas, carros e educação.
A grande maioria dos pobres nos países
em desenvolvimento opera em uma eco-
nomia informal ou “paralegal” em fun-
ção do alto tempo e custo necessários
para a regularização de seus ativos ou
registro de seus microempreendimentos.
Países em desenvolvimento vêm tentan-
do, sem muito sucesso, obter subsídios
governamentais para livrar os cidadãos
mais pobres do ciclo da pobreza. Mes-
mo que os mais pobres recebam benefí-
cios do governo para iniciarem seus pró-
Figura 3. Novas estratégias para a base da 
pirâmide
Percepção de Valor 
(Relação Preço-Performance)
• Desenvolvimento de produtos
• Produção
• Distribuição
• Novos formatos de distribuição
• Criação de produtos resistentes 
a condições adversas 
(aquecimento, pó etc)
• Redução na intensidade de 
uso dos recursos
• Reciclagem
• Energias renováveis
• Intensidade do investimento
• Margens
• Volume
Percepção de Qualidade
Sustentabilidade Rentabilidade
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A RIQUEZA NA BASE DA PIRÂMIDE 9
prios negócios, sua dependência de agiotas locais, cobrando altas taxas de juros, torna a continuida-
de do negócio inviável. Agiotas indianos em Mumbai (ex-Bombaim), Índia, cobram taxas de juros de
20% ao dia. Isso significa que um vendedor de legumes, que toma emprestado 100 rúpias indiana
(equivalente a R$6) na parte da manhã, deve retornar 120 rúpias indiana (R$7,20) à noite. Estender
o crédito aos mais pobres para que possam melhorar seu padrão de vida não é uma idéia recente.
A I.M Singer & Company, fundada em 1851, forneceu crédito para milhões de mulheres comprarem
máquinas de costura. Pouquíssimas dessas mulheres poderiam pagar o elevado valor de R$ 300,
correspondente ao preço à vista da máquina, mas a maioria poderia arcar com um pagamento de
R$15 por mês.
O mesmo raciocínio se aplica em maior escala na camada 4. Considere a experiência do Grameen
Bank, em Bangladesh, um dos primeiros no mundo a aplicar o conceito de microcrédito num banco
comercial. Criado há apenas 20 anos por Muhammad Yunus, um professor do departamento de
economia na Universidade de Chittagong em Bangladesh, o Grameen Bank foi pioneiro em ofere-
cer um serviço de empréstimos aos mais pobres e inspirou milhares de outros microemprestadores,
atendendo 25 milhões de clientes pelo mundo, em países em desenvolvimento e nações ricas,
incluindo Estados Unidos e Inglaterra.
O Grameen Bank surgiu para solucionar os problemas do acesso ao crédito pela população de baixa
renda: sem garantias, com alto índice de risco e facilmente sujeita à coação contratual. Dos 2,3 milhões
de clientes, 95% são mulheres, as quais tradicionalmente sustentam as famílias nas comunidades rurais e
oferecem menos riscos do que os homens. Os candidatos aos empréstimos devem apresentar propos-
tas, que serão analisadas e avaliadas por cinco membros integrantes da comunidade. Os colaboradores
do banco visitam as comunidades freqüentemente, conhecendo pessoalmente as mulheres que fizeram
empréstimos e os projetos nos quais pretendem investir. Seguindo esse processo, o empréstimo é
realizado sem a tradicional burocracia e linguagem enigmática do Ocidente.
Com 1.170 agências,
o Grameen Bank hoje
provê serviço de
microcrédito em
mais de 40.000 comu-
nidades, mais da me-
tade delas em
Bangladesh. Em 1996,
o Grameen Bank al-
cançou uma taxa de
95% de adimplência,
Figura 4. Nirma versus HLL no mercado 
indiano de sabão em pó (1999)
Fonte: Apresentação feita por John Ripley, vice presidente da Unilever, 
no encontro da Academy of Management em Agosto/1999.
Total de vendas 
($ milhões de dólares)
Margem Bruta (%)
Retorno sobre 
Investimentos (ROI) (%)
150
18
121
100
18
93
180
25
22
Nirma HLL (Wheel) HLL (outros produtos)
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A RIQUEZA NA BASE DA PIRÂMIDE 10
mais alta do que a de qualquer outro banco no continente indiano. Contudo, a popularidade desse
serviço fez com que surgissem outras iniciativas parecidas, diminuindo os lucros da atividade.
Além disso, a taxa de retorno do Grameen Bank não é fácil de ser calculada. Historicamente, o
banco era completamente manual, operando por meio de instalações físicas, uma estrutura que
diminuía a sua eficiência. Atualmente, empresas ligadas ao Grameen Bank como o Grameen Telecom
(provedor de serviços telefônicos locais) e o Grameen Shakti (criador de fontes de energia renovável)
estão ajudando o Grameen Bank a construir uma infra-estrutura tecnológica para automatizar
seus processos. Assim que o banco desenvolver seu modelo de negócio virtual, a lucratividade
deverá aumentar radicalmente, deixando clara a importância da tecnologia de informaçãona revo-
lução acelerada do microcrédito. Talvez a mais pertinente medida do sucesso do Grameen Bank
seja a expansão global do interesse institucional pelo microcrédito, que foi estimulado em todo o
mundo. No sul da África, onde 73% da população ganha menos de 5.000 rands (equivalente a
R$1.380 reais) por mês, de acordo com um estudo de 2001 do Banco Mundial, os serviços bancá-
rios de varejo destinados à população de baixa renda estão se tornando a atividade mais competi-
tiva e de maior crescimento. Em 1994, o Standard Bank da África do Sul, líder dentre os bancos
comerciais na África, montou um negócio eletrônico de baixo custo, específico para grande volume
de operações, chamado AutoBank E, aumentando suas receitas por meio da prestação de serviços
bancários aos mais pobres. Com 2.500 máquinas automáticas e 98 centros de auto-atendimento, o
Standard tem agora maior presença nas cidades e outras áreas de serviço do que qualquer outro
banco doméstico. Até abril de 2001, o Standard atendeu quase 3 milhões de consumidores de baixa
renda e está adicionando aproximadamente 60.000 clientes por mês, de acordo com o Sundays
Times da África do Sul.
Para abrir uma conta no Standard não se exige renda mínima do cliente, embora seja necessário
que ele possua uma renda regular. Pessoas que nunca haviam usado um banco podem abrir uma
conta com um depósito de 8 dólares (equivalente a 24 reais, utilizando uma taxa de conversão de
3,00 reais/dólar). Os clientes são atendidos por pessoas que falam uma variedade de dialetos
africanos e recebem um cartão eletrônico e informações de como utilizá-lo. Uma pequena taxa fixa
é cobrada para cada transação eletrônica efetuada. Uma conta de poupança é automaticamente
vinculada a cada conta corrente visando a incentivar os mais pobres a pouparem. As taxas de juros
pagas são baixas, mas já é melhor do que guardar o dinheiro debaixo do colchão. Segundo o “The
Sunday Times”, o Standard Bank está considerando a possibilidade de lançar um programa de
empréstimo para clientes de baixa renda. Os serviços computadorizados de microcrédito não
apenas tornam as operações mais eficientes, mas também possibilitam alcançar várias pessoas,
emprestando dinheiro a quem não possui nenhuma garantia para oferecer e nem endereço formal.
Por ter menos despesas gerais e menos burocracia, os custos do AutoBank são de 30 a 40%
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A RIQUEZA NA BASE DA PIRÂMIDE 11
menores do que os custos das agências tradici-
onais.
Na Conferência sobre Microcrédito de 1999,
as Nações Unidas, em conjunto com as maio-
res organizações multinacionais, como o
Citigroup e a Monsanto, estabeleceram como
objetivo oferecer o serviço de microcrédito a
100 milhões de famílias pobres no mundo até
2005. Infelizmente, o sucesso dessa meta está
comprometido devido a altos custos de tran-
sação, falta de automatização e carência de in-
formações e infra-estrutura de comunicação nas
áreas rurais.
Para lidar com essas questões e acelerar o pro-
cesso de desenvolvimento do microcrédito, o
banqueiro francês Jacques Attali, presidente fundador do Banco Europeu para Reconstrução e
Desenvolvimento e ex-conselheiro do presidente francês François Mitterand durante a década de
80, criou o PlaNet Finance. Esse website, www.planetfinance.org, interliga milhares de grupos de
microcrédito numa rede para ajudá-los a compartilhar soluções e diminuir custos.
O desenvolvimento de uma solução automatizada para localizar e processar milhões de pequenos
empréstimos associados ao microcrédito é possível. Se os custos de processamento e das transa-
ções foram bastante reduzidos, eles podem ser agrupados e vendidos no mercado secundário para
instituições multinacionais financeiras como o Citigroup. Isso deverá aumentar o capital disponível
para o microcrédito, indo além dos atuais doadores e do governo.
Nos Estados Unidos, o microcrédito também se enraizou durante a década passada em comunida-
des pobres. Por exemplo, o ShoreBank Corporation, inicialmente South Shore Bank, demonstrou a
lucratividade de um banco para os mais pobres na região problemática do sul de Chicago. O
projeto Enterprise, um programa localizado em Nova York ao estilo do Grameen, tem como públi-
co alvo os empreendedores pertencentes às minorias. Vários bancos multinacionais estão come-
çando a oferecer serviços em países em desenvolvimento. O Citigroup, por enquanto, está fazendo
uma experiência em Bangalore, Índia, com serviços 24 horas para clientes com depósitos de 25
dólares (R$75). Os resultados iniciais são muito positivos.
Figura 5. A infra-estrutura comercial 
na base da pirâmide
Criando poder 
de compra: 
acesso ao 
crédito; geração 
de renda
Ampliando o 
acesso: sistemas 
de distribuição; 
links de 
comunicação.
Formatando 
aspirações: 
educação do 
consumidor; 
desenvolvimento 
sustentável.
Construindo 
soluções locais: 
desenvolvimento de 
produtos sob 
medida; inovação na 
base da pirâmide.
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A RIQUEZA NA BASE DA PIRÂMIDE 12
FORMATANDO ASPIRAÇÕES
Inovações de produto iniciadas na camada 4 e promovidas pela educação dos consumidores irão
não apenas influenciar positivamente a escolha das pessoas na base da pirâmide, mas remodelar o
estilo de vida das pessoas da camada 1. De fato, em 20 anos é possível que olhemos para trás e
percebamos que a camada 4 proveu o impulso de mercado a tecnologias revolucionárias que terão
substituído as tecnologias não-sustentáveis dos países desenvolvidos e promovido o sucesso das
empresas multinacionais mais visionárias. Por exemplo, a HLL (subsidiária da Unilever) desafiou-se
a solucionar a carência, na Índia, de uma refrigeração que fosse prática, barata e de baixo consumo
de energia. O laboratório da HLL desenvolveu um método radicalmente diferente de refrigeração,
que possibilitou transportar os sorvetes pelo país em caminhões não-refrigerados padronizados.
O novo sistema gerou uma grande redução no consumo de eletricidade e tornou desnecessário o
uso de fluidos refrigeradores perigosos e poluidores. Como um bônus, o novo sistema é mais
barato na construção e no uso.
Eletricidade, água, refrigeração e muitos outros serviços essenciais são grandes oportunidades em
países em desenvolvimento. Uma ONG americana, a Solar Electric Light Fund (SELF), adaptou
criativamente a tecnologia e aplicou o microcrédito para levar serviços de eletricidade para comu-
nidades remotas da Ásia e da África que, de outra maneira, gastariam dinheiro queimando querose-
ne, vela, madeira ou esterco para obter luz e comida. O sistema de eletrificação rural da SELF está
baseado na pequena escala e no poder da geração local de energia utilizando recursos renováveis.
Um fundo de empréstimos fornece aos habitantes da comunidade o apoio financeiro para que eles
mesmos possam operar o sistema, também criando empregos. Desde que foi fundada em 1990, a
SELF lançou projetos na China, Índia, Sri Lanka, Nepal, Vietnã, Indonésia, Brasil, Uganda, Tanzânia,
África do Sul e Ilhas Salomão.
TRAZER EQUIPAMENTOS MODERNOS DE TI PARA AS COMUNIDADES DA
CAMADA 4 VIABILIZA APLICAÇÕES COMO TELEDUCAÇÃO, TELEMEDICINA,
BANCO DE MICROCRÉDITO E SERVIÇOS AGRÍCOLAS DE EXTENSÃO.
O sucesso da SELF e de outras ONGs especializadas em soluções de distribuição de energia em
pequena escala chamou a atenção de empresas ocidentais como a norte-americana Plug Power
(células de combustível) e a Honeywell (microturbinas). Elas conseguiram enxergar a lógica de
entrar no mercado inexplorado da camada 4 em vez de tentar forçar prematuramente sua tecnologia
em aplicações para mercados desenvolvidos, onde instituições e pessoas obstruem seu caminho.
Com alguns bilhões de consumidores potenciais ao redor do mundo, investimentos em tais inova-
çõesdeveriam ser mais valorizados.
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A RIQUEZA NA BASE DA PIRÂMIDE 13
AMPLIANDO O ACESSO
Como as comunidades da camada 4 são normalmente isoladas (física e economicamente), melho-
res sistemas de distribuição e conexões providas pela comunicação são essenciais para o desenvol-
vimento da base da pirâmide. Poucos dos países com grande mercado emergente possuem siste-
mas de distribuição que alcançam mais da metade da população. Isso justifica a contínua dependên-
cia dos consumidores mais pobres em relação aos produtos/serviços locais e aos agiotas. Conse-
qüentemente, poucas organizações multinacionais projetaram seus sistemas de distribuição para
atender as necessidades dos consumidores pobres na área rural.
Empresas locais criativas, no entanto, são líderes em distribuição rural eficaz. Na Índia, por exemplo,
a Arvind Mills introduziu um novo sistema de entregas para blue jeans. A Arvind, o quinto maior
produtor mundial de denim, considerava limitadas as vendas domésticas desse tecido na Índia.
Custando entre 40 e 60 dólares cada calça, o jeans não era acessível às massas e o sistema de
distribuição existente alcançava apenas algumas cidades e comunidades. Foi então que a Arvind
introduziu a “Ruff & Tuf” jeans - um kit com os componentes do jeans (denim, zíper, rebite e
remendo) do tipo “faça você mesmo” e com preço em torno de 6 dólares. Os kits foram distribu-
ídos por meio de uma rede de milhares de costureiros(as) locais, muitos em pequenas cidades e
comunidades rurais, cujo interesse próprio os motivou a vender os kits amplamente. O jeans Ruf &
Tuf atualmente lidera as vendas de jeans na Índia, superando facilmente a Levi’s e outras marcas dos
Estados Unidos e Europa.
As multinacionais também podem atuar na distribuição do que é produzido na camada 4 para os
mercados da camada 1, possibilitando aos empreendimentos da base da pirâmide seus primeiros
contatos com os mercados internacionais. De fato, é possível alavancar as tradicionais bases de
conhecimento por meio de parcerias, a fim de que sejam feitos produtos mais sustentáveis e até
melhores (em alguns casos) para os consumidores da camada 1.
Anita Roddick, CEO da The Body Shop, demonstrou o poder dessa estratégia no começo dos anos
90 por meio de um programa de sua empresa chamado “trade not aid” (ou seja, um programa de
comércio, não de ajuda ou auxílio), que buscava matérias-primas e produtos dos povos indígenas.
Mais recentemente, a Starbucks, cooperando com a organização ecologista Conservation
International, foi pioneira em um programa para buscar café diretamente dos fazendeiros na região
de Chiapas, no México. Essas fazendas cultivam grãos de café de forma orgânica, utilizando
sombreamento, que preserva o hábitat dos pássaros. A Starbucks comercializa o produto para os
consumidores norte-americanos como um café “premium”, de alta qualidade; os produtores mexi-
canos se beneficiam economicamente do acordo de fornecimento, que elimina intermediários do
modelo de negócios. Essa relação direta também melhora a compreensão e o conhecimento dos
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A RIQUEZA NA BASE DA PIRÂMIDE 14
fazendeiros locais a respeito do mercado e das expectativas dos consumidores na camada 1.
O maior obstáculo para o desenvolvimento sustentável pode ser a pobreza de informação. Mais da
metade da humanidade nunca fez uma simples ligação telefônica. Contudo, nos lugares em que já
existem telefones e conexões de Internet, pela primeira vez na história é possível imaginar um
único mercado, interconectado, ligando os mais ricos aos mais pobres de todo o mundo na busca
por um verdadeiro desenvolvimento econômico sustentável. Esse processo poderia transformar o
“apartheid digital” em uma “integração digital”.
Dez anos atrás, Sam Pitroda, atual presidente do conselho e CEO da Worldtel (Londres), empresa
resultante de uma união na área de telecomunicações para difundir o desenvolvimento da teleco-
municação nos mercados emergentes, veio para a Índia com a idéia de “telefones rurais”. Sua
concepção original era criar um telefone comunitário, operado por um empreendedor (de prefe-
rência mulher), que cobraria uma taxa pelo uso do telefone e reteria uma porcentagem como
remuneração para manter o telefone. Hoje é possível ligar para qualquer parte do mundo das mais
diferentes partes da Índia.
Outros empreendedores introduziram serviços de fax e alguns estão testando o e-mail/acesso à
Internet de baixo custo. Essas conexões providas pela comunicação alteraram dramaticamente a
forma como as comunidades funcionam e a maneira como estão conectadas ao resto do país e do
mundo. Com a emergência de conexões de banda larga mundiais, as oportunidades na camada 4
para os negócios baseados na informação se expandirão significativamente.
Novos negócios como a CorDECT (Índia) e a Celnicos Communications (América Latina) estão
desenvolvendo tecnologia de informação e modelos de negócio adequados às necessidades espe-
cíficas da base da pirâmide. Por meio de modelos de acesso compartilhado (por exemplo, os
quiosques de Internet), infra-estrutura sem fio e desenvolvimento de tecnologia sob medida, as
empresas estão reduzindo dramaticamente o custo do “estar conectado”. Por exemplo, a conexão
de voz e informação custa normalmente para as empresas entre 850 e 2.800 dólares por linha nos
países desenvolvidos; a CorDECT reduziu esse custo para menos de 400 dólares por linha, com o
objetivo de chegar a 100 dólares cada linha, o que levaria as telecomunicações a alcançar qualquer
um nos países em desenvolvimento.
Reconhecendo uma enorme oportunidade de negócio e desenvolvimento, a Hewlett-Packard con-
cebeu a visão de “world e-inclusion” (inclusão mundial por meio da Internet), com foco em prover
tecnologia, produtos e serviços apropriados às necessidades dos mais pobres no mundo. Como
parte dessa estratégia, a HP entrou em um projeto com o MIT Media Lab e com a Foundation for
Sustainable Development of Costa Rica - liderada pelo presidente José Maria Figueres Olsen - para
desenvolver e implementar “tele-centros” em comunidades de áreas remotas. Esses centros urba-
nos digitais fornecem equipamento moderno de TI, com conexão rápida de Internet, a um preço
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A RIQUEZA NA BASE DA PIRÂMIDE 15
acessível, por meio de instrumentos de crédito, no nível local.
Trazer essa tecnologia para as comunidades da camada 4 viabiliza uma série de aplicações, dentre
elas a teleducação, a telemedicina, os bancos de microcrédito, os serviços agrícolas de extensão e
o monitoramento ambiental. Todas elas ajudam a estimular microempreendimentos, desenvolvi-
mento econômico e acesso a mercados mundiais. Espera-se que esse projeto, chamado Lincos,
espalhe-se amplamente a partir dos pilotos atuais, localizados na América Central e Caribe, para a
Ásia, África e Europa Central.
CONSTRUINDO SOLUÇÕES LOCAIS
Nesse começo de século, as vendas em conjunto das 200 maiores organizações multinacionais
equivalem a aproximadamente 30% do PIB mundial. Contudo, essas mesmas organizações empre-
gam menos de 1% da força de trabalho mundial. Das 100 maiores economias mundiais, 51 são
economias internas de empresas. No entanto, os indicadores do Terceiro Mundo sofreram, em
termos absolutos, estagnação ou declínio.
Se as multinacionais pretendem prosperar no século 21, elas precisam expandir sua base econômi-
ca e dividi-la com um maior número de agentes. Elas precisam desempenhar um papel mais ativo
no preenchimento da lacuna entre ricos e pobres. Isso não será alcançado se essas empresas
produzirem apenas os chamados produtos globais de consumo, principalmente para consumidores
da camada 1. Elas precisam cultivar mercados e culturas locais, alavancar as soluções locais e gerar
riqueza nos níveis mais baixosda pirâmide. Essas organizações se tornarão referência quando
passarem a “produzir riqueza dentro da BdP” (localmente) em vez de “extrair riqueza da BdP”.
Para isso, as multinacionais precisam combinar sua tecnologia de ponta com profundos “insights”
locais. Considere a questão da embalagem, por exemplo. Os consumidores de países que estão na
camada 1 possuem renda e espaço disponível para comprar a granel (por exemplo, caixas de vinte
quilos de detergente de grandes lojas como a Sam’s Club) e ir às compras menos freqüentemente.
Eles utilizam o dinheiro que dedicam a consumo para assegurar a “conveniência de estoque”. Já os
consumidores da camada 4, com pouco dinheiro para gastar e espaço habitacional limitado, compram
todo dia, mas em menor quantidade. Eles não podem armazenar itens na dispensa de casa nem ser
altamente seletivos em relação ao que compram; eles buscam embalagens avulsas (unitárias). Por
outro lado, os consumidores com poucos recursos dispõem do benefício da experimentação. Expos-
tos a uma grande quantidade de produtos, podem trocar de marca a cada nova compra.
Na Índia, 30% dos produtos de higiene pessoal e outros bens de consumo duráveis, como xampu,
chá e medicamentos para gripe já são vendidos em embalagens unitárias. A maioria custa em torno
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A RIQUEZA NA BASE DA PIRÂMIDE 16
de 1 rúpia indiana (equivalente a 0,06 reais). Sem a inovação na embalagem, entretanto, essa ten-
dência poderia resultar em um grande volume de lixo sólido. A Dow Chemical e a Cargill estão
testando um plástico orgânico que seria totalmente biodegradável. Esse tipo de embalagem certa-
mente trará muitos benefícios para a camada 4, mas poderá também revolucionar os mercados nas
quatro camadas da pirâmide global.
Para as organizações multinacionais, a melhor abordagem é somar as capacidades e o conhecimen-
to de mercados locais às melhores práticas globais. Ainda que a iniciativa envolva a entrada de uma
multinacional na camada 4 ou de um único empreendedor da camada 4, os princípios de desenvol-
vimento permanecem os mesmos: novos modelos de negócio devem preservar a cultura e o estilo
de vida da comunidade local. É preciso uma combinação efetiva de conhecimento local e global em
vez de uma mera reprodução do sistema ocidental.
O desenvolvimento da indústria de leite na Índia traz muitas lições para as organizações multinacionais.
A transformação começou por volta de 1946, quando a Cooperativa de Leite do Distrito de Khira,
localizada no estado de Gujarat, estabeleceu sua própria unidade de processamento sob a lideran-
ça de Verghese Kurien e criou a marca Amul, uma das mais reconhecidas no país atualmente.
Ao contrário das grandes fazendas produtoras de leite no Ocidente (fortemente industrializadas),
na Índia o leite procede de muitas pequenas comunidades. Os produtores locais possuem, cada um,
apenas dois ou três búfalos ou vacas e trazem seu leite duas vezes ao dia para o centro de coleta
comunitário. Eles são pagos todo dia pelo leite que entregam, levando-se em conta o índice de
gordura e o volume. Veículos utilitários refrigerados transportam o leite para unidades de
processamento centrais, nas quais ele é pasteurizado. Em seguida, transportam o leite para os
principais centros urbanos.
Toda a cadeia de valor é cuidadosamente gerida, desde a produção local de leite até as instalações
de processamento em grande escala. A Cooperativa do Distrito de Khira provê serviços para os
produtores como assistência veterinária e ração para o gado. Ela também gerencia a distribuição
do leite pasteurizado, leite em pó, manteiga, queijo, comida para bebês e outros produtos. O dife-
rencial dessa cooperativa é que ela combina produção descentralizada com as eficiências de um
processamento e infra-estrutura de distribuição modernos. Como resultado, produtores locais de
leite que antes estavam excluídos (à margem da economia local), hoje recebem uma renda regular
e estão sendo transformados em participantes ativos do mercado.
Há vinte anos, havia pouca oferta de leite na Índia. Hoje, a Índia é o maior produtor mundial de leite.
De acordo com o India’s National Dairy Development Board, a rede nacional de cooperativas de
leite possui atualmente 10 milhões e 700 mil membros (pequenos produtores), atinge 96 mil comu-
nidades, inclui 170 associações de produtores de leite e atua em mais de 285 distritos. A produção
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A RIQUEZA NA BASE DA PIRÂMIDE 17
de leite aumentou 4,7% ao ano desde 1974. A disponibilidade de leite per capita na Índia aumentou,
em 20 anos, de 107 gramas para 213 gramas ao dia.
COLOCANDO TUDO JUNTO
Os quatro elementos da infra-estrutura empresarial para atender à base da pirâmide estão inter-
relacionados. São eles: criar poder de compra, formatar as aspirações, ampliar o acesso e construir
soluções locais. Inovações em um deles alavancam inovações nos demais. As empresas são apenas
um dos atores; as organizações multinacionais precisam trabalhar junto com ONGs, governos
locais/estaduais e comunidades.
Ainda assim, alguém tem que assumir o desafio de fazer essa revolução acontecer. A pergunta é: por
que esse alguém deve ser a organização multinacional?
Mesmo que os gestores das multinacionais estejam emocionalmente convencidos, nada garante
que as grandes empresas tenham reais vantagens sobre as pequenas organizações locais. As
multinacionais talvez nunca sejam capazes de superar o custo ou a capacidade de resposta rápida
dos empreendedores locais. De fato, empoderar os empreendedores e incentivar os empreendi-
mentos locais é fundamental para desenvolver os mercados da camada 4. Ainda assim, há várias
razões convincentes para as organizações multinacionais adotarem essa direção:
Recursos: Construir uma infra-estrutura empresarial complexa para a base da pirâmide é uma
tarefa que exige bastante em termos de recurso e gestão. Desenvolver produtos e serviços
ambientalmente sustentáveis requer pesquisas significativas. É caro desenvolver e manter canais de
distribuição e redes de comunicação. Poucos empreendedores locais possuem os recursos gerenciais e
tecnológicos para criar esta infra-estrutura.
Alavancagem: As multinacionais podem transferir conhecimento de um mercado para outro - da
China para o Brasil ou Índia - como a Avon, a Unilever, o Citigroup e outras fizeram. Embora as
práticas e os produtos devam ser customizados para atender às necessidades locais, as organiza-
ções multinacionais, com sua notável base de conhecimento global, apresentam uma vantagem que não é
facilmente acessível para os empreendedores locais.
Intermediação: As multinacionais podem ser os “nós” na construção da infra-estrutura empresa-
rial, provendo acesso ao conhecimento, imaginação gerencial e recursos financeiros. Sem as
multinacionais como catalisadoras, as ONGs, comunidades, governos locais, empreendedores e até
mesmo agências de desenvolvimento multilaterais, embora bem intencionadas, continuarão a fracas-
sar em seus esforços de levar desenvolvimento à base. As organizações multinacionais estão melhor
posicionadas para unir os vários atores necessários para desenvolver o mercado da camada 4.
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A RIQUEZA NA BASE DA PIRÂMIDE 18
Transferência: Não apenas as organizações multinacionais podem alavancar a aprendizagem so-
bre a base da pirâmide, como também possuem a capacidade de transferir inovações por todo o
mercado, incluindo a camada 1. Como vimos, a camada 4 é uma base de testes para a vida susten-
tável. Muitas das inovações feitas para a base podem ser adaptadas para uso nos países desenvolvidos
(mercados intensivos em recurso e energia).
É imprescindível, contudo, que os gestores reconheçam a natureza da liderança empresarial exigida
no âmbito da camada 4. Criatividade, imaginação,tolerância à ambigüidade, perseverança, paixão,
empatia e coragem podem ser tão importantes quanto a capacidade analítica, a inteligência e o
conhecimento. Os líderes precisam de uma compreensão profunda das complexidades e sutilezas
do desenvolvimento sustentável no contexto da camada 4. Por último, os gestores devem possuir
competências interpessoais e interculturais para trabalhar com uma variedade grande de organiza-
ções e pessoas.
As multinacionais precisam construir uma infra-estrutura organizacional para lidar com as oportu-
nidades na base da pirâmide. Isso significa construir uma base local de suporte, reorientar a área de
P&D para focar as necessidades dos mais pobres, formar novas alianças, aumentar a intensidade de
emprego e reinventar as estruturas de custo. Estes cinco elementos organizacionais estão clara-
mente inter-relacionados e se reforçam mutuamente.
Construir uma base local de suporte: Empoderar os mais pobres constitui uma ameaça à
estrutura de poder existente. A oposição local pode emergir muito rápido, como no caso da Cargil,
que fez da semente de girassol um negócio na Índia. O escritório da Cargill foi duas vezes incendi-
ado e os políticos locais acusaram a organização de destruir os negócios locais relacionados à
semente. Mas a Cargill persistiu. Através de investimentos realizados pela organização na educação
dos fazendeiros, em treinamento e fornecimento de suplementos agrícolas, os produtores melho-
raram significativamente sua produtividade por acre de terra. Atualmente, a Cargill é vista como
organização amiga do produtor. A oposição política desapareceu.
Para superar problemas similares, as organizações multinacionais precisam construir uma base
local de suporte político. Como a Monsanto e a General Electric podem atestar, é essencial o
estabelecimento de uma coalizão entre ONGs, líderes comunitários e autoridades locais que possa
fortalecer interesses. Formar esse tipo de coalizão pode ser um processo muito lento. Cada ator
tem uma agenda diferente; as organizações multinacionais precisam compreender essas agendas e
gerar aspirações compartilhadas. Na China, esse problema é menos grave: os burocratas locais são
também os empreendedores locais, fazendo com que enxerguem mais facilmente os benefícios
para seus empreendimentos e, simultaneamente, para suas comunidades, cidades ou províncias. Em
países como a Índia e o Brasil esse tipo de alinhamento não existe. É necessário haver discussão
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A RIQUEZA NA BASE DA PIRÂMIDE 19
significativa, compartilhamento de informações, definição dos benefícios para cada ator e proximi-
dade com debates locais.
Conduzir P&D voltada para os mais pobres. É necessário haver P&D e pesquisa de mercado
com foco nas necessidades específicas dos mais pobres, segmentados por região e por país. Na Índia,
na China e no norte da África, por exemplo, pesquisas sobre como prover água de qualidade para
beber, cozinhar, lavar e limpar são uma grande prioridade. A pesquisa também deve procurar adaptar
as soluções “de fora” para as necessidades locais. Por exemplo, uma dosagem diária de vitaminas pode
ser adicionada a uma grande variedade de produtos alimentícios. Para empresas que têm distribuição
e presença de marca nos países em desenvolvimento, como a Coca-Cola, a base da pirâmide oferece
um vasto mercado, não aproveitado, para produtos como água e nutrientes.
Por último, a pesquisa deve identificar princípios úteis e aplicações em potencial a partir de práticas
locais. Na camada 4, o conhecimento relevante é transmitido oralmente de geração para geração.
Respeitar as tradições, buscando analisá-las cientificamente pode levar a novos conhecimentos. A
criativa CEO da The Body Shop, Anita Roddick, construiu um negócio baseado em entender o
porquê de práticas e rituais locais. Ela observou, por exemplo, que algumas mulheres africanas
utilizam fatias de abacaxi para limpar sua pele. À primeira vista, essa prática parece ser um ritual
inexpressivo. Entretanto, as pesquisas mostraram ingredientes ativos no abacaxi que removiam
células mortas da pele de forma mais eficaz do que as formulações químicas.
As organizações multinacionais precisam desenvolver unidades de pesquisa em mercados emer-
gentes tais como China, Índia, Brasil, México e África, embora poucas tenham se empenhado forte-
mente nisso até agora. A Unilever é uma exceção; ela opera centros de pesquisa fortemente reco-
nhecidos na Índia, empregando mais de 400 pesquisadores dedicados aos problemas dos “merca-
dos tipo Índia”.
Formar novas alianças. As multinacionais tradicionalmente formaram alianças apenas com o
objetivo de penetrar em novos mercados; mas agora elas precisam expandir essas estratégias de
aliança… Quando formam alianças visando crescer em mercados da camada 4, as organizações
multinacionais se beneficiam dos “insights” provenientes da cultura e do conhecimento local dos
países em desenvolvimento. Simultaneamente, as multinacionais melhoram sua própria credibilidade.
Elas também podem garantir acesso preferencial ou exclusivo para determinado mercado ou ma-
téria-prima. Nós antevemos três tipos de relacionamentos importantes: alianças com empresas e
cooperativas locais (como a Cooperativa de Leite do Distrito de Khira); alianças com ONGs locais
e internacionais (como a aliança da Starbucks com a Conservation International no setor cafeeiro);
e alianças com governos (por exemplo, a recente aliança da Merck & Company na Costa Rica para
fomentar a preservação das florestas tropicais em troca dos direitos de bioprospecção).
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A RIQUEZA NA BASE DA PIRÂMIDE 20
Dada a dificuldade e a complexidade de se construir modelos de negócios dependentes de relaci-
onamentos com governos nacionais ou centrais (por exemplo, no desenvolvimento de infra-estru-
tura de grande porte), nós prevemos mais alianças no nível local e regional. Para ser bem-sucedido
em tais alianças, os gestores das organizações multinacionais precisam aprender a trabalhar com
pessoas que podem não ter a mesma agenda ou o mesmo referencial econômico e educacional. O
desafio e o resultado estão em gerir e aprender com a diversidade - econômica, intelectual, racial
e lingüística.
Aumentar a intensidade de emprego. As organizações multinacionais acostumadas aos mer-
cados da camada 1 pensam em termos de intensidade de capital e produtividade da mão-de-obra.
Na camada 4, aplica-se exatamente a lógica oposta. Dado o grande número de pessoas na base da
pirâmide, o método de produção e distribuição deve gerar empregos para muitos, como no caso
do jeans Ruf&Tuf de Arvind Mills: ele empregou um exército de costureiras(os) locais como
armazenadores, promotores, distribuidores e provedores de serviço, embora o custo do jeans
fosse 80% menor do que o da Levi’s. Como Arvind demonstrou, as organizações multinacionais não
precisam empregar muita gente de forma direta em sua folha de pagamento, mas o modelo
organizacional na camada 4 deve aumentar a intensidade de emprego (e renda) entre os mais
pobres e fazer com que se tornem novos consumidores.
Reinventar as estruturas de custo. Os gestores devem reduzir dramaticamente os níveis de
custo em relação aos da camada 1. Para criar produtos/serviços acessíveis aos mais pobres, as
multinacionais precisam reduzir seus custos significativamente para chegar a, por exemplo, 10% dos
custos atuais. No entanto, mudanças incrementais, ou seja, aperfeiçoamentos nos atuais métodos
de geração de desenvolvimento, produção e logística não alcançarão tal objetivo. Será preciso
reinventar, isto é, repensar o processo inteiro do negócio com foco na funcionalidade, não no
produto em si. Por exemplo, os serviços financeiros não precisam ser distribuídos apenas por meio
de filiais que funcionam das9 da manhã às 5 da tarde. Tais serviços podem ser providos em horário
e local convenientes para os consumidores mais pobres - depois das 8 da noite em suas casas.
Máquinas de sacar dinheiro podem ser implantadas em áreas seguras - delegacias e correios. O
reconhecimento da íris como medida de segurança poderia substituir os nada práticos números de
identificação pessoal e cartões de identificação.
Diminuir as estruturas de custo provoca um debate sobre formas de também reduzir os custos de
investimento. Isso inevitavelmente levará a um maior uso de tecnologia de informação (TI) para
desenvolver sistemas de produção e distribuição. Como dito anteriormente, os telefones instala-
dos nas comunidades já estão transformando o modelo das comunicações nos países em desenvol-
vimento. Com a adição da Internet o impacto é ainda maior: temos toda uma nova forma de
comunicar e criar desenvolvimento econômico nas áreas pobres, rurais. O uso criativo de TI emer-
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A RIQUEZA NA BASE DA PIRÂMIDE 21
girá nesses mercados como um meio de reduzir dramaticamente os custos associados ao acesso
de produtos e serviços, à distribuição e ao gerenciamento de crédito.
UMA CAUSA EM COMUM
A emergência de 4 bilhões de pessoas que constituem o mercado da camada 4 é uma grande
oportunidade para as organizações multinacionais. Também representa uma oportunidade para os
negócios, os governos e a sociedade civil se engajarem em uma causa comum. De fato, acreditamos
que a busca por estratégias para a base da pirâmide desfaz o conflito entre os proponentes do
mercado livre/capitalismo global e os defensores da sustentabilidade social/ambiental.
Por enquanto, os produtos e serviços atualmente oferecidos para os consumidores da camada 1
não são apropriados para a camada 4. Acessar esse mercado exigirá abordagens fundamentalmente
diferentes daquelas adotadas até mesmo nas camadas 2 e 3. Mudanças em tecnologia, crédito, custo
e distribuição são pré-requisitos essenciais. Apenas grandes empresas com alcance global possuem
os recursos tecnológicos, gerenciais e financeiros para beneficiarem-se dessa oportunidade, empe-
nhando-se em promover as inovações necessárias.
Novos negócios na camada 4 não se restringirão a satisfazer necessidades básicas como comida,
vestuário e habitação. A base da pirâmide está aguardando negócios de alta tecnologia, como servi-
ços financeiros, telecomunicação celular e computadores básicos. Na verdade, para muitas tecnologias
emergentes, que rompem com o passado (exemplos: células de combustível, células fotovoltaicas,
telecomunicação via satélite, biotecnologia, microeletrônica e nanotecnologia), a base da pirâmide
pode ser o mercado de entrada mais atrativo.
Até o momento, três tipos de organizações estão nessa direção: empresas locais como a Amul e o
Grameen Bank; ONGs como o World Resources Institute, SELF, The Rainforest Alliance, The
Environmental Defense Fund e Conservation International, entre outras; e algumas poucas organi-
zações multinacionais como a Starbucks, Dow, Hewlett-Packard, Unilever, Citigroup, DuPont, Johnson
& Johnson, Novartis e ABB, além de parcerias de negócio globais como a World Business Council
for Sustainable Business Development. Atualmente, no entanto, as ONGs e os empreendimentos
locais, que contam com muito menos recursos do que as organizações multinacionais, estão sendo
mais inovadoras e fazendo mais progresso no desenvolvimento desses mercados.
Como capitalistas ocidentais, assumimos implicitamente que os mais ricos serão atendidos pelo
setor empresarial, enquanto os governos e as ONGs protegerão os mais pobres e o meio ambien-
te. Essa divisão implícita é mais forte do que muitos imaginam. Todos - de gestores em organizações
multinacionais a formuladores de políticas públicas e ativistas em ONGs - incorporam esta histó-
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A RIQUEZA NA BASE DA PIRÂMIDE 22
AK
rica divisão de papéis. Uma grande oportunidade reside em quebrar esta “regra” - unir os mais
pobres aos mais ricos, em todo o mundo, em um único mercado, organizado ao redor do conceito
de crescimento e desenvolvimento sustentável.
Enquanto coletividade, apenas estamos começando a aproveitar a maior oportunidade de mercado
da história empresarial. Aqueles no setor privado que comprometerem suas organizações com um
capitalismo mais inclusivo têm a oportunidade de prosperar e compartilhar sua prosperidade com
os menos afortunados. De forma bastante realista, podemos dizer que a fortuna contida na base da
pirâmide representa o mais grandioso de nossos objetivos globais.
C.K. Prahalad - (cprahalad@aol.com) professor de administração de empresas na Universidade de Michigan, Ann Arbor. Ele é
também fundador e presidente da Praja, uma empresa pioneira na promoção de eventos interativos vivenciais, sediada em San
Diego, Califórnia.
Stuart L. Hart - (slhart@unc.edu) professor de estratégia empresarial, pesquisador pela Sarah Graham Kenan e co-diretor do
Centro de Sustentabilidade Empresarial da Escola de Administração Kenan-Flagler, da Universidade da Carolina do Norte.
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A RIQUEZA NA BASE DA PIRÂMIDE 23
ANEXOS
Anexo 1. Exemplos de iniciativas no Brasil para atender à base da pirâmide.
Fonte: compilação de notícias em jornais e revistas variados realizada pela Amana-Key.
Mabesa
Fonte: Revista Exame, 1/01/2003
• Recentemente, a subsidiária da mexicana Mabesa entrou no mercado de fraldas brasileiro e
agora já ocupa a segunda posição no ranking (18% das vendas).
• Definindo o foco - “Quando começamos, o percentual de bebês que usavam fraldas era de 15%.
Era óbvio que as classes A e B já compravam, aí focamos nas classes C e D.”
• Preenchendo o vazio – “O segmento de mais baixa renda precisava de uma empresa que se
dedicasse a ele.”
• Atendendo às necessidades e às possibilidades dos clientes: As fraldas para a classe D são
vendidas em pacotes com menor número de unidades (muitos consumidores nessa faixa de
renda ganham por dia de trabalho e só podem comprar aos poucos).
Ace Seguros
Fonte: Revista Exame, 3/04/2003
• O público-alvo da maioria das seguradoras é a população de renda mais alta.
• A seguradora americana Ace Seguros, no Brasil, está indo na contramão do modelo - “Vender
seguros baratos para clientes de baixa renda é um dos pontos mais importantes de nossa
estratégia para crescer no país.“
• Como vencer os desafios da venda de seguros “massificados”?
a) preço baixo: a apólice que consertou o telhado da casa de um segurado custa apenas 3,95
reais por mês.
b) parceria com empresas que possam simplificar o processo, diminuindo os custos da adminis-
tração dos planos: fornecedoras de serviços públicos com um sistema de cobrança regular
podem emitir o boleto no lugar da seguradora.
Gol
Fonte: Revista Exame, 20/03/2003
• Ampliou acesso ao transporte aéreo - pessoas que antes viajavam de ônibus, inclusive aquelas
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da classe C, passam a optar pelo avião.
• Inspirou-se no modelo simples e de baixo custo da Southwest Airlines (a mais lucrativa empre-
sa aérea dos Estados Unidos).
• Os diferenciais do simples:
a) reduzindo custo fixo: serviço de bordo frio (barra de cereais, sucos etc.) reduz abastecimen-
to dos aviões (1x por dia) e diminui necessidade de funcionários para limpeza (apenas 2 em
cada escala).
b) otimizando espaços: cozinhas diminutas possibilitaram acrescentar 12 assentos aos 132 exis-
tentes em cada Boeing.
c) simplificando processos: passagem via internet ou bilhete no balcão da companhia, impresso
como um tíquete de supermercado; informações para pilotos via e-mail.
d) integrando para descentralizar: áreas comercial e operacional juntas sob uma única direção
– “para trabalhar dessamaneira é preciso delegar e confiar nas pessoas.”
e) criando tecnologia: software desenvolvido internamente para indicar aos pilotos uma logística
de abastecimento.
f) verificando a satisfação dos clientes: pesquisas instantâneas, conduzidas pelo pessoal do call
center, sem o rigor do levantamento científico.
Grupo Yamada
Fonte: Revista Exame, 15/11/2000
• Maior rede de lojas de departamentos do Pará, o carro-chefe de um grupo de 11 empresas que
atuam em ramos variados: varejo, processamento de dados, factoring, comércio de automóveis,
turismo e pecuária de corte.
• Princípio orientador: inventar maneiras que facilitem o acesso da população ao consumo.
• Cartão Yamada: responde por 80% do faturamento do grupo. Mais de 85% dos clientes cadas-
trados usam o cartão.
• Minimizando o risco da empresa: seguro contra morte, invalidez permanente e perda de renda –
havendo algum problema, o seguro arca com o valor das prestações que ficarem a descoberto.
• Relacionamento com clientes baseado na confiança - atores da economia informal são clientes
“vip” (crédito é assegurado mesmo sem fonte de renda segura e estável).
• Sistema de gestão de crédito e cobrança único no país: pequeno exército de informantes,
especializados em 15 distritos da cidade, municia a empresa com dados necessários à tomada
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de decisão sobre a conveniência ou não de vender a prazo para esta ou aquela pessoa –
”avaliamos o ponto onde o flanelinha trabalha para verificar como anda o movimento de carros
na área”.
Premissas facilitadoras: “se a patroa acredita na sua empregada, por que nós vamos duvidar?”; “os
melhores pagadores nem sempre são as pessoas de renda elevada”.

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