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Friedrich Nietzsche Uma Introducao

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Prévia do material em texto

Friedrich 
Nietzsche 
Um guia 
Introdutório 
Friedrich Nietzsche: um guia introdutório 
Vinicius Siqueira (Org.) 
 
Talvez não seja tão fácil ler Nietzsche. Talvez alguns iniciantes 
esbarrem em conceitos que ainda não conseguiram dominar. 
O objetivo deste e-book é juntar artigos introdutórios, 
comentários sobre conceitos de Nietzsche, e organizá-los para 
servir como um mini-manual. 
 
Este livro contém artigos de: 
Vinicius Siqueira (Colunas Tortas); 
Rafael Trindade (Razão Inadequada); 
 
São Paulo 
2016 
 
Sumário 
Prefácio ........................................................................................... 1 
O que é a Genealogia em Nietzsche? ............................................. 3 
Da genealogia em Nietzsche ....................................................... 3 
Nietzsche – O que é um filósofo? .................................................... 9 
A moral em Nietzsche: o castrado e o espírito livre ....................... 17 
Nietzsche, moral dos fortes e moral dos fracos ......................... 17 
Moral em Nietzsche: recusa do cristianismo .............................. 22 
A hipótese da moral mínima ...................................................... 23 
O niilismo em Nietzsche: decadência como um processo ............. 27 
Niilismo, Nietzsche e a interpretação moral cristã ...................... 28 
Niilismo e as categorias da razão .............................................. 30 
Nietzsche – eterno retorno ............................................................ 33 
Nietzsche – eterno retorno da diferença ........................................ 37 
 
 
 
 
 
1 
Nietzsche: um guia introdutório 
 
 
Prefácio 
Nietzsche é um dos autores mais lidos do mundo. É o filósofo mais 
popular do planeta, mais pesquisado em universidades e seus livros 
são best-sellers. Mas não é incrível como o livro mais vendido do 
alemão seja Assim Falou Zaratustra, sua obra mais hermética, mais 
difícil? 
Nietzsche vende, por isso é reimpresso e reeditado. Nietzsche é um 
campeão no mercado, afinal, foi criado um mito em torno do autor, 
como se ele fosse a fonte de toda sabedoria do mundo. De certa 
forma, faz parecer que o alemão é um terapeuta, um autor de 
autoajuda. Coisa mais errada não há. 
O objetivo deste e-book é apresentar alguns conceitos-chave da obra 
de Nietzsche. Aquilo que o leitor precisa aprender pelo menos. O que 
é genealogia, chave para entender a genealogia da moral? O que 
moral, chave para entender a obra citada agora? O que é niilismo? 
Vivem chamando Nietzsche de niilista, mas o que significa este termo 
na obra do autor? O que é eterno retorno? 
Acreditamos que este livreto poderá ajudar aqueles que querem 
começar os estudos sobre Nietzsche, e entendemos que o papel 
 
 
2 
Nietzsche: um guia introdutório 
 
deste livro não é grandioso: é só um tira-gosto, pois ainda é papel do 
leitor buscar pelo prato principal. 
 
 
 
3 
Nietzsche: um guia introdutório 
 
O que é a Genealogia em Nietzsche? 
Por Vinicius Siqueira 
A criação do procedimento genealógico, no pensamento 
nietzscheano, foi uma forma de conseguir unir a filosofia e a história 
sem cair em teleologias ou em um puro arquivamento de dados 
históricos. Nas tentativas de Nietzsche, tudo começou com a criação 
da distinção entre “História”, “Filosofia da história” e “Filosofia 
histórica”. 
Da genealogia em Nietzsche 
Essa distinção, citada acima, pode ser resumida da seguinte 
maneira, de acordo com as críticas de Nietzsche a cada uma dessas 
perspectivas: 
- A crítica da “História” é de sua concretização como uma disciplina 
científica. Para Nietzsche, quando se exige que a História 
seja “verdadeira” e que se encaixe nos padrões do método científico, 
se retira toda a ligação com a vida que ela formou em seu caminho e 
a primeira consequência disso é “que uma tal prática da história é 
inevitavelmente paralisante: nada permitindo mais selecionar entre 
os fatos verdadeiros aqueles que importam reter, o passado se torna 
o apeiron [infinito, ilimitado] sob o qual o presente se 
 
 
4 
Nietzsche: um guia introdutório 
 
encontra imerso”, argumenta Bertrand Binoche, professor da 
Universidade de Paris I. 
A segunda consequência é o nivelamento de todos os fatos 
históricos. Afinal, se todos os fatos verdadeiros são de igual 
importância, então qual seria a razão de preferir um a outro? 
“Admitindo que um deles se ocupe com Demócrito, está sempre em 
meus lábios a pergunta: mas por que justo Demócrito? Por que não 
Heráclito? Ou Filon? Ou Bacon? Ou Descartes? – e assim por diante, 
à vontade”, diz Nietzsche, citado por Binoche. “A história verdadeira 
é a história que acredita recusar todo juízo de valor, sem ver que 
acredita na verdade”, continua o autor alemão. 
- Já a “Filosofia da história” é criticada por suas características de dar 
sentido à história retrospectivamente. São as grandes teleologias, 
como a hegeliana que, por fim, encontra na história uma “forma 
acabada da teodiceia”, explica Binoche: “toda tentativa de ordenar a 
história a um sentido equivale, em consequência, a produzir uma 
‘teologia embuçada’ ou ainda o que a quarta Extemporânea denuncia 
como uma ‘teodiceia cristã embuçada’. É exato que a filosofia da 
história justifica Deus, mas é precisamente por essa razão que é 
preciso colocá-la porta afora”. Por conta disso, o professor afirma que 
a filosofia da história é: 
1) Extravagante por sua pretensão: como é possível seriamente 
se crer no ápice da história universal? 
 
 
5 
Nietzsche: um guia introdutório 
 
2) Inconsequente: consciente do ridículo de sua tese, Hegel não 
ousa declarar o que, contudo, dela deduz-se 
necessariamente: “Aliás, ele teria mesmo de dizer que todas 
as coisas que viriam depois dele só devem ser avaliadas, 
propriamente, como a coda musical de um rondó da história 
universal ou, ainda mais propriamente, como supérfluas. Isso 
ele não disse (…)”; 
3) Servil, na medida em que transforma o homem moderno num 
“adorador do processo”, num “idólatra do real” que curva a 
espinha diante dos fatos e se inclina diante de todo sucesso, 
já que a História é seu verdadeiro sujeito. 
 
Esses três pontos se diferem substancialmente da genealogia em 
Nietzsche, como será visto no decorrer do presente artigo. 
A segunda crítica é em sua democratização da história: ao formular 
leis para a história, se perde aquilo que vale a pena investigar, os 
grandes homens, indivíduos dignos que não fazem parte do povo, 
mas são pontos acima de qualquer linha média, “com efeito, a 
filosofia da história pretende formular leis da história; tais leis, porém, 
são concebíveis apenas se o historiador trabalha sobre massas, que 
fazem aparecer regularidades estatísticas”, explica Binochi. 
Trabalhar sobre massas é uma maneira de negar a vida e submeter 
o homem ao rebanho. 
 
 
6 
Nietzsche: um guia introdutório 
 
- A “Filosofia histórica” se concretiza como uma união sem 
subordinação da história com a filosofia. É aquilo que viria a ser 
chamado de genealogia, mais tarde. A filosofia histórica de opõe à 
filosofia metafísica, que é aquela que coloca os sentidos das coisas 
como se sempre tivessem existido, como o “belo”, “justo” e etc. 
Segundo esta filosofia, as coisas citadas são a-históricas e só é 
necessário descobrir seu verdadeiro significado. 
A filosofia histórica encontrou, primeiramente, na história dos 
sentimentos morais uma maneira de pensar o vir a ser sem divinizá-
lo, sem colocá-lo em um pedestal – de procurarna história dos 
conceitos morais uma outra história mais interessante, que é a dos 
próprios sentimentos que os próprios julgamentos morais 
transformam. Segundo Binochi, “não se trata mais, portanto, do 
problema do valor da história, mas dos valores na história, estes 
transformando o próprio homem enquanto agregado de instintos”. 
No início de sua trajetória, a genealogia em Nietzsche (ainda não 
nomeada como tal) se apoia no utilitarismo inglês para realizar tal 
façanha: 
 
Nietzsche lança mão de um esquema perfeitamente 
identificável: na origem, a utilidade dita o valor, depois o 
hábito recobre a causa, deixando subsistir o efeito, ao 
qual é preciso, por conseguinte, 
 
 
7 
Nietzsche: um guia introdutório 
 
estabelecer, retrospectivamente, uma nova causa, 
completamente fictícia; é por isso que a história dos 
sentimentos não pode ser identificada com a dos 
conceitos que os designam posteriormente. Olhando de 
perto, a origem não desaparece, ela permanece, 
mas dissimulada pela segunda origem que se lhe 
sobrepõe a posteriori: ‘Tais ações, em que foi esquecido 
o motivo fundamental, o da utilidade, denominam-se 
então morais: não porque seriam realizadas por aqueles 
outros motivos, mas porque não são feitas em nome 
da utilidade consciente1 
Mas sua perspectiva muda radicalmente em “Genealogia da moral”, 
quando a utilidade já não é tão importante, mas a potência toma 
conta da explicação, 
Para a genealogia da moral, em que, a propósito do 
castigo, encontra-se exposta a historicidade genealógica 
propriamente dita, segundo a qual toda coisa sempre se 
encontra já interpretada por uma vontade de potência que 
lhe confere seu valor e seu sentido até que outra vontade 
de potência se aposse dela e a recubra com um novo 
valor e um novo sentido, para além de qualquer 
‘evolução’ e em total contingência.2 
 
1 BINOCHE, Bertrand. Do valor da história à história dos valores. Cad. Nietzsche, São Paulo 
, v. 1, n. 34, p. 35-62, jun. 2014. 
2 Do valor da história à história dos valores... 
 
 
8 
Nietzsche: um guia introdutório 
 
Quando se reduz “bem” ou “mal” à utilidade se mantém uma 
característica universal de seus valores. A metafísica permanece, 
apesar de sub-reptícia. Sem contar que pretender pela utilidade é 
também traçar uma história linear do desenvolvimento humano, como 
se tivesse uma direção já dada. Ainda por cima, a utilidade é sempre 
– naquela perspectiva – uma utilidade para o rebanho, para a massa. 
O novo procedimento precisava de um nome, que conseguisse 
expressar a noção da morte de Deus, portanto, da morte da 
“sucessão contingente de hegemonias provisórias” durante a história. 
Genealogia caiu como uma luva. 
Em resumo, para uma genealogia nitzscheana ser feita, é necessário 
perceber que não se trata de encontrar aquilo que é útil à comunidade 
ou aquilo que é “teleologicamente favorável à espécie”, explica 
Binochi. Se trata de entender que a utilidade está a serviço da 
vontade de potência e que, sendo assim, o “útil genealógico” é aquilo 
que permite que a potência se estenda indefinidamente, que os 
modos de existência que se impõe aos indivíduos são como são 
porque é somente desta forma que é possível avaliar o mundo e a si 
próprio, em função daquilo que pode estender a potência. 
 
 
 
 
9 
Nietzsche: um guia introdutório 
 
Nietzsche – O que é um filósofo? 
Por Rafael Trindade 
Desde que se é uma pessoa, tem-se necessariamente a 
filosofia de sua pessoa3 
Nietzsche sabe filosofar com o martelo, mas também sabe dançar. 
Sua definição do filósofo é tão múltipla quanto as forças que nele 
habitavam. Há nele uma singularidade belíssima: a vida confunde-se 
com o pensamento. O simples fato de existir, se reflete em uma 
maneira de existir – eis a filosofia: quais são os valores que 
engendram uma vida? Como a saúde e a doença fazem de um corpo 
um filósofo? 
Num homem são as deficiências que filosofam, no outro, 
as riquezas e forças. O primeiro necessita da sua filosofia, 
seja como apoio, tranquilização, medicamento, redenção, 
elevação, alheamento de si; no segundo é apenas um 
formoso luxo, no melhor dos casos a volúpia de uma 
triunfante gratidão, que afinal tem de se inscrever, com 
maiúsculas cósmicas, no firmamento dos conceitos4 
 
3 Nietzsche, A Gaia Ciência, Prólogo, §2. 
4 Nietzsche, A Gaia Ciência, Prólogo, §2. 
 
 
10 
Nietzsche: um guia introdutório 
 
Nietzsche não quer saber de mundo das ideias, este ídolo quebrou-
se há muito tempo. O filósofo alemão também não perde tempo 
subindo uma montanha com as tábuas que serão gravadas com as 
leis de deus, Deus está morto, resta este mundo e nós que o 
habitamos. Quem filosofa são os homens, e ela nasce da saúde ou 
da doença. Se no primeiro existe uma Vontade de Potência em 
constante atualização, no segundo encontramos um corpo enfermo, 
fraco, procurando em que se segurar. 
“Que virá a ser do pensamento mesmo que é submetido à pressão 
da doença?” (Nietzsche, A Gaia Ciência). De onde nascem as 
filosofias ascéticas? De onde nascem os ideais? Nietzsche responde 
isso em seu livro Genealogia da Moral: o homem doente vive a falta 
de sentido, não tem a capacidade de afirmar-se, não pode suportar a 
dor e cria mundos e planos onde procura descansar e se esconder. 
Todo idealismo, toda filosofia e religião até agora, todo platonismo 
disfarçado, todo desejo revolucionário de um mundo perfeito foi 
produto de um corpo cansado, esgotado, ávido por um paraíso 
perdido onde possa repousar. 
A filosofia nasce do corpo, em Nietzsche, filosofia e fisiologia se 
confundem. 
Temos de continuamente parir nossos pensamentos em 
meio a nossa dor, dando-lhes maternalmente todo 
 
 
11 
Nietzsche: um guia introdutório 
 
sangue, coração, fogo, prazer, paixão, tormento, 
consciência, destino e fatalidade que há em nós.5 
Saber viver, enfrentar a dor, fazer do sofrimento ferramenta para 
superar-se. Se a vida é o prato do dia, a dor é seu tempero. O filósofo 
faz de seu corpo instrumento para afirmar valores e encontrar novos 
modos de vida. 
Nietzsche sofria de dores de cabeça horríveis que às vezes o 
deixavam de cama por dias. Ele era extremamente sensível ao clima 
e à culinária dos lugares por onde passava. Parte de sua vida foi 
dedicada à encontrar o melhor clima, os melhores pratos, os 
melhores livros, músicas. Aquilo que não o matou, o fortaleceu. “O 
veneno que faz morrer a natureza frágil é um fortificante para o forte 
– ele nem o chama de veneno” (Nietzsche, A Gaia Ciência). Ele 
soube fazer de sua dor o remédio para tornar-se mais forte, não o 
entorpecente para fugir do mundo e de si mesmo. Se o sofrimento é 
a condição de crescimento e criação de qualquer artista, porque não 
seria também do filósofo? 
Mas o fato de que hoje todos falem de coisas de que não 
podem ter qualquer experiência vale particularmente, e 
desgraçadamente, para os filósofos e os estados 
 
5 Nietzsche, A Gaia Ciência. 
 
 
 
12 
Nietzsche: um guia introdutório 
 
filosóficos: – a pouquíssimos é dado conhecê-los, e todas 
as opiniões populares acerca deles estão erradas.6 
Isso fez de Nietzsche um filósofo sem meias palavras. É de se 
esperar, então, que sua concepção de filósofo não seja das mais 
amistosas. Filos (amigo) e sofia (sabedoria) são interpretados por ele 
de uma perspectiva diferente. O filósofo, para Nietzsche, é aquele 
que carrega o martelo,e faz a sabedoria passar pelas mais duras 
provações. Que grande amigo da filosofia é este personagem cuja 
dureza e rispidez tira o melhor que tem de seu material de trabalho. 
O filósofo, com sua disciplina e rigidez, talvez até truculência, busca 
lapidar um diamante bruto, desinfetar a ferida purulenta. 
“Entendo o filósofo como um terrível corpo explosivo diante do qual 
tudo corre perigo”7. 
Para Nietzsche, a filosofia não deve ser o refúgio dos fracos. Filosofar 
está distante de rezar, pregar, salvar, cuidar… O filósofo é o contrário 
de um sacerdote e a filosofia não é uma casa onde os doentes 
descansam. Não há compaixão na filosofia! “Os autênticos filósofos 
são comandantes e legisladores: eles dizem ‘assim deve ser!’, eles 
determinam o ‘para onde?’ do ser humano”8. Ser filósofo é tornar 
 
6 Nietzsche, Além do Bem e do Mal, §213. 
7 Nietzsche, Ecce homo, as Extemporâneas, §3. 
8 Nietzsche, Além do Bem e do Mal. 
 
 
13 
Nietzsche: um guia introdutório 
 
sinônimo querer e criar, é dar vazão à Vontade de Potência. O 
filósofo cria valores, recicla, redispõe, reordena. Filosofar é 
comandar: “Seu ‘conhecer’ é criar, seu criar é legislar, sua vontade 
de verdade é – vontade de poder. Existem hoje tais filósofos? Já 
existiram tais filósofos? Não têm que existir tais filósofos? […]”9 
A filosofia é a criação e transvaloração de valores. E para criar, os 
filósofos assumem diferentes perspectivas, trazem um novo olhar 
(aquele que só um homem sadio poderia trazer). O filósofo não sai 
do mundo para refletir, pelo contrário, se ele faz avaliações, seu 
dever é mergulhar no mundo. Sendo assim, o filósofo não poderia 
deixar de ser também um experimentador. Para ir além do bem e do 
mal, é preciso experimentar para além da moral. O pensador é como 
um alquimista, ele mistura afetos e forças. 
Fazer invenções, testar vidas, pensamentos, práticas. Aí faz-se a 
diferença entre o “trabalhador filosófico”, definido por Nietzsche como 
um pensador menor, e o “livre-pensador”, o filósofo legislador. Um, 
busca compreender para reproduzir e copiar, o outro compreende 
para inventar e criar em cima. “Filosofia, tal como até agora a entendi 
e vivi, é a vida voluntária no gelo e nos cumes – a busca de tudo o 
 
9 Nietzsche, Além do Bem e do Mal, §211. 
 
 
14 
Nietzsche: um guia introdutório 
 
que é estranho e questionável no existir, de tudo o que a moral até 
agora baniu”10. Ir para além da moral, mas não se esconder, não fugir, 
não ter nojo. Nietzsche faz a negação da negação, ele vira o rosto 
para tudo que denigra este mundo. O filósofo não se isola, ele anda 
no mundo para exaltá-lo e conhecer seus inimigos. 
Talvez seja indispensável, na formação de um verdadeiro 
filósofo, ter passado alguma vez pelos estágios em que 
permanecem, em que têm de permanecer os seus 
servidores, os trabalhadores filosóficos; talvez ele próprio 
tenha que ter sido crítico, cético, dogmático e historiador, 
e além disso poeta, colecionador, viajante, decifrador de 
enigmas, moralista, vidente, “livre-pensador” e 
praticamente tudo, para cruzar todo o âmbito dos valores 
e sentimentos de valor humanos e poder observá-los com 
muitos olhos e consciências, desde a altura até a 
distância, da profundeza à altura, de um canto qualquer à 
amplidão. Mas tudo isso são apenas precondições de sua 
 
10 Nietzsche, Ecce Homo. 
 
 
15 
Nietzsche: um guia introdutório 
 
tarefa: ela mesma requer algo mais – ela exige que 
ele crie valores.11 
A tarefa do filósofo é então a de assumir uma postura nova, dar vazão 
à alegria criadora, à inspiração de artista e deixar-se levar pelo mar 
de forças que o farão viver e pensar como um juiz de si. A tarefa do 
filósofo é criar e ordenar valores. Mas como chegar tão alto? Como 
atingir os cumes do pensamento? Zaratustra ensina a dançar: 
somente aqueles com pés leves podem ir tão longe. Sim, a 
transvaloração de todos os valores implica em tornar tudo leve. 
Deixar todo peso, todo “Tu deves!”, é a tarefa do filósofo dançarino. 
É preciso ser muito leve, a fim de levar sua vontade de 
conhecimento a uma tal distância e como que acima de 
seu tempo, a fim de criar para si olhos que abarquem 
milênios e, além disso, um céu puro nesses olhos! É 
preciso haver se livrado de muita coisa que justamente a 
nós, europeus de hoje, oprime, inibe, detém, torna 
pesados.12 
Aprender a dançar é aprender a ir além de si mesmo, criar valores, 
legislar, tornar-se senhor de si, sapatear em tudo que é pesado e 
lento. O verdadeiro dançarino é aquele que, apesar da dor dos pés 
 
11 Nietzsche, Além do Bem e do Mal, §211. 
12 Nietzsche, A Gaia Ciência, §380. 
 
 
16 
Nietzsche: um guia introdutório 
 
machucados, parece voar. Dor, superação e beleza. O sofrimento 
transforma-se em meio para descolar-se do chão. E que outro 
caminho haveria? Não queremos a preguiça do homem sedentário. 
Tornar-se leve, flexível, imbatível, escorregadio, nômade, impossível 
de emboscar. Criar o novo, experimentar, inverter valores, inventar 
novos modos de vida: eis o filósofo. Zaratustra disse que só 
acreditaria em um deus que soubesse dançar, ele estava certo; 
Nietzsche, por sua vez, só acreditaria em um filósofo que soubesse 
dançar, tal como ele sabia. 
“Eu não saberia o que o espírito de um filósofo mais poderia desejar 
ser, senão um bom dançarino”13. 
 
 
13 Nietzsche, A Gaia Ciência, §381. 
 
 
17 
Nietzsche: um guia introdutório 
 
A moral em Nietzsche: o castrado e o 
espírito livre 
Por Vinicius Siqueira 
É impossível se referir à moral em Nietzsche sem citar a ligação 
necessária que o autor concebia entre este conceito, o socratismo e 
o cristianismo. Apesar de irmos em direção de entender o que é a 
moral em geral na formulação nietzscheana, é importante 
compreender a crítica concreta do autor alemão, que começa com a 
repulsa à Sócrates e Platão. 
Nietzsche, moral dos fortes e moral dos fracos 
Reconheci Sócrates e Platão como sintomas de declínio, 
como instrumentos da decomposição grega, como falsos 
gregos, como antigregos ("Nascimento da Tragédia" 
1872). Aquele consensus sapientium - isto fui 
compreendendo cada vez melhor - não prova sequer 
minimamente que eles tinham razão quanto ao que 
concordavam. O consenso demonstra muito mais que 
eles mesmos, esses mais sábios, possuíam entre si 
algum acordo fisiológico para se colocar frente à vida da 
mesma maneira negativa - para precisar se colocar frente 
a ela desta forma14. 
 
14 Friedrich Nietzsche, Crepúsculo dos Ídolos. 
 
 
18 
Nietzsche: um guia introdutório 
 
O declínio, a decadência, como já explicado aqui, é o movimento do 
niilismo, que tem como arma chave a moral. O consenso representa 
exatamente o caminho para esta decadência. O interessante é 
entender aqui que havia um afastamento no pensamento socrático 
no ato de olhar para a vida e a analisar como um objeto exterior ao 
ser vivente. Sócrates emitia juízos de valor sobre a vida, ele a 
valorava como se pudesse estar fora dela. 
No entanto, os juízos de valor a respeito da vida não podem funcionar 
com esta autoridade que Sócrates lhes concedeu mediante seus 
diálogos. É simples: "o valor da vida não pode ser avaliado. Não por 
um vivente, pois ele é parte, mesmo objeto de litígio, e não um juiz; 
não por ummorto, por uma outra razão", diz Nietzsche no Crepúsculo 
dos Ídolos (CI). O que isso significa? Você é vida, não consegue se 
avaliar porque está avaliando segundo valores avaliativos que te 
constituem. Você é parte daquilo que tenta avaliar através de um 
falso distanciamento. 
Mas qual é a relevância desta conclusão? Nietzsche também afirma 
que "toda e qualquer posição naturalista na moral, isto é, toda e 
qualquer moral saudável, é dominada por um instinto de vida" no CI. 
O instinto de vida é o livre fluxo da potência, é a potência movida por 
forças ativas: a moral natural é a moral dos nobres, da potência e a 
moral dos fracos é a moral da repressão, da castração, da religião, 
do cristianismo. Ao mesmo tempo, 
 
 
19 
Nietzsche: um guia introdutório 
 
A moral antinatural, ou seja, quase todas as morais que 
foram até aqui ensinadas, honradas e pregadas, remete-
se, de modo inverso, exatamente contra os instintos 
vitais. Ela é uma condenação ora secreta, ora tonitruante 
e insolente destes instintos. No que ela diz 'Deus observa 
os corações', ela diz Não aos desejos vitais mais baixos 
e mais elevados, tomando Deus como Inimigo da Vida... 
O santo, junto ao qual Deus sente prazer, é um castrado 
ideal... A vida chega ao fim, onde o "Reino de Deus" 
começa...15 
A tentativa de avaliar a vida e decidir a maneira correta de vivê-la ou 
de enxerga-la é, por excelência, força reativa. Ou seja, tentativa de 
barrar a potência do outro, de minar a criatividade e de castrar o 
desejo. É a moral dos fracos, que depende do outro para existir. 
Até agora, conseguimos visualizar a moral em Nietzsche a partir da 
divisão da moral dos fortes (moral naturalista), reconhecida como o 
livre fluxo da potência, e a moral dos fracos (moral antinatural), vista 
como potência movida por forças reativas, que precisam da 
referência do outro (e precisam barrar a potência do outro) para 
existir. Mas o que é a moral em geral, em Nietzsche? 
Segundo Érico de Andrade Oliveira, no artigo A Crítica de Nietzsche 
à Moral Kantiana: Por Uma Moral Mínima, a moral "não seria um 
 
15 Friedrich Nietzsche, Crepúsculo dos Ídolos. 
 
 
20 
Nietzsche: um guia introdutório 
 
capítulo da razão humana [como na visão kantiana], mas o ponto 
para o qual converge toda predicação da natureza do homem e de 
suas ações". A moral é como um todo que valora a vida e a constitui 
o homem, o coloca no mundo e o faz perceber o mundo e suas 
hierarquias de uma forma particular. A moral valora. 
É aqui que passamos a entender que "quando falamos de valores, 
falamos sob a inspiração, sob a ótica da vida: a vida mesma nos 
obriga a instaurar valores, a vida mesma valora através de nós 
quando instauramos valores" (Nietzsche, CI). A moral é uma forma 
de lidar com a vida a partir da valoração do mundo, o dilema da moral 
dos fracos e da moral dos fortes é que a primeira tem valores morais 
como dados imutáveis, já a segunda os considera como criações 
instintivas, explosivas. E é exatamente isso que a Genealogia da 
Moral vai expor: a tendência dependente da moral dos fracos e a 
explosividade e dominação da moral dos fortes. 
A tentativa de avaliar a vida e decidir a maneira correta de vivê-la ou 
de enxerga-la é, por excelência, força reativa. Ou seja, tentativa de 
barrar a potência do outro, de minar a criatividade e de castrar o 
desejo. É a moral dos fracos, que depende do outro para existir. 
Até agora, conseguimos visualizar a moral em Nietzsche a partir da 
divisão da moral dos fortes (moral naturalista), reconhecida como o 
livre fluxo da potência, e a moral dos fracos (moral antinatural), vista 
 
 
21 
Nietzsche: um guia introdutório 
 
como potência movida por forças reativas, que precisam da 
referência do outro (e precisam barrar a potência do outro) para 
existir. Mas o que é a moral em geral, em Nietzsche? 
Segundo Érico de Andrade Oliveira, no artigo A Crítica de Nietzsche 
à Moral Kantiana: Por Uma Moral Mínima, a moral "não seria um 
capítulo da razão humana [como na visão kantiana], mas o ponto 
para o qual converge toda predicação da natureza do homem e de 
suas ações". A moral é como um todo que valora a vida e a constitui 
o homem, o coloca no mundo e o faz perceber o mundo e suas 
hierarquias de uma forma particular. A moral valora. 
É aqui que passamos a entender que "quando falamos de valores, 
falamos sob a inspiração, sob a ótica da vida: a vida mesma nos 
obriga a instaurar valores, a vida mesma valora através de nós 
quando instauramos valores" (Nietzsche, CI). A moral é uma forma 
de lidar com a vida a partir da valoração do mundo, o dilema da moral 
dos fracos e da moral dos fortes é que a primeira tem valores morais 
como dados imutáveis, já a segunda os considera como criações 
instintivas, explosivas. E é exatamente isso que a Genealogia da 
Moral vai expor: a tendência dependente da moral do fracos e a 
explosividade e dominação da moral dos fortes. 
 
 
22 
Nietzsche: um guia introdutório 
 
Moral em Nietzsche: recusa do cristianismo 
Primeiramente, Nietzsche recusa o socratismo, 1) devido ao seu uso 
da dialética, que é o método dos perdedores, daqueles que não têm 
outra saída, afinal, a dialética obriga o forte a se justificar e a provar 
que não é um idiota (vide os diálogos de Sócrates) - os fortes não se 
justificam, não provam sua honra, eles simplesmente fazem e 
dominam. 2) devido ao afastamento da vida que ela promove: a 
separação do mundo tal como percebemos e do mundo ideal, assim 
como a separação do corpo e da alma promovem o niilismo negativo, 
a crença de que a vida de verdade está para além da vida como 
percebemos. 
Após essa primeira recusa, ele ataca a situação concreta da 
decadência exposta no parágrafo anterior (por meio de uma crítica 
ao cristianismo), 
Deus por conceito contrário e condenação da vida, é 
apenas um juízo de valor da vida. - De que vida? De que 
tipo de vida? - Mas eu já dei a resposta: da vida 
decadente, enfraquecida, cansada, condenada. A moral, 
tal como foi entendida até aqui - como por fim foi ainda 
formulada por Schopenhauer, como "negação da vontade 
de vida" -, é o próprio instinto da décadence que se 
 
 
23 
Nietzsche: um guia introdutório 
 
transforma em imperativo. Ela diz: "Pereça!" ela é o juízo 
dos que foram condenados...16 
A vida termina onde o Reino de Deus começa. Isso porque o 
cristianismo é a incorporação da tese socrática de que a vida atual 
não é uma vida efetiva, é só uma aparência. A vida de verdade só 
existirá no paraíso, desta forma, é necessário viver tendo em vista a 
salvação. 
A hipótese da moral mínima 
Érico de Andrade Oliveira, em seu artigo já indicado acima, entende 
que a crítica de Nietzsche à moral Kantiana tem como núcleo a "a 
falta de discussão, por parte daquela moral, de um critério por meio 
do qual a produção e a legitimação de valores são realizadas". Os 
valores morais são como dados para esta proposta moral de Kant e, 
assim sendo, determinam um tipo de homem monolítico. 
A moral em Nietzsche, quando vista sob o ponto de vista da moral 
mínima, desligada da metafísica e inserida na efetividade, ou seja, 
ligada à situação concreta da multiplicidade de valores e de pessoas, 
assim como, que percebe a multiplicidade do indivíduo fora do 
rebanho, é uma moral que preserva condições mínimas para a 
 
16 Friedrich Nietzsche, Crepúsculo dos Ídolos. 
 
 
24 
Nietzsche: um guia introdutório 
 
possibilidade de valorarmos a vida deacordo com as diversas 
perspectivas de o que seria o humano. 
A crítica à Kant é também uma crítica à religião (e, por fim, à 
Sócrates), 
As exigências feitas por Kant para que uma moral fosse 
inscrita num patamar de universalidade, e portanto fosse 
legítima, coincidem, para Nietzsche, com os preceitos de 
uma religião que guarda uma prévia compreensão da 
natureza do homem e tenta, com um controle total das 
paixões, homogeneizar os homens. A individualidade é 
diluída no meio do rebanho17. 
E, citando o próprio Nietzsche em Além do Bem e do Mal, argumenta 
Érico, 
Nessa perspectiva, a exigência kantiana para atribuir o 
predicado de moral a uma ação configura-se como um 
pacto tácito com a tradição cristã que eleva o instinto de 
sobrevivência ao patamar moral. Escreve Nietzsche: “[...] 
é tempo, finalmente, de substituir a pergunta kantiana, 
‘como são possíveis os juízos sintéticos a priori?’ com 
esta outra: “por que é necessária a crença em tais 
juízos?” e de compreender que semelhantes juízos 
devem ser tidos por verdadeiros para a conservação dos 
 
17 Oliveira, A.O. A Crítica de Nietzsche à Moral Kantiana: Por Uma Moral Mínima. 
 
 
25 
Nietzsche: um guia introdutório 
 
seres de nossa espécie; mas isso não impede que “eles 
também poderiam falsos!”18. 
Pensando numa separação kantiana entre moral e direito: a moral 
está na esfera da autonomia, uma definição/motivação interna (e uma 
ação interna) em busca de um fim (que é desinteressado); já o direito 
está na esfera da heteronomia, da coação/motivação externa e da 
verificação. É assim que o imperativo kantiano é exposto da seguinte 
maneira: 
 Imperativo categórico (moral): Age de tal modo que a máxima 
de tua vontade possa sempre valer ao mesmo tempo como 
princípio de uma legislação universal. (na Crítica da Razão 
Prática); 
 Imperativo jurídico: Age externamente de tal maneira que o 
uso do livre arbítrio possa coexistir com a liberdade de todos, 
Age externamente de tal maneira que o uso do livre arbítrio 
possa coexistir com a liberdade de todos. (no Fundamentos 
de uma Metafísica dos Costumes). 
A diferença entre os dois imperativos está situada na diferença entre 
liberdade interna e liberdade externa. Enquanto o imperativo 
categórico precisa de um compromisso com a transcendência da 
moral como natureza ontológico do homem, o imperativo jurídico é 
 
18 Oliveira, A.O. A Crítica de Nietzsche à Moral Kantiana: Por Uma Moral Mínima. 
 
 
26 
Nietzsche: um guia introdutório 
 
verificável, pode ter como avalista, os próprios homens ou a lei, como 
indica Oliveira. 
Desta forma, a solução pautada no imperativo para garantir a 
multiplicidade das perspectivas morais, sem a anulação dos 
interesses dos indivíduos, estaria fundada nos seguintes 
imperativos: 
 Imperativo categórico: age de tal modo que teu interesse 
(motivo de tua ação) possa ser preservado. 
 Imperativo jurídico: age de tal modo que tua ação nunca se 
torne um valor absoluto. 
Essa é, segundo Oliveira, a única maneira de garantir que nenhum 
valor seja universalizado e que haja condições mínimas para a da 
multiplicidade das perspectivas. É o jeito da moral em Nietzsche 
conseguir aproveitar a filosofia kantiana para preservar aquilo que ela 
nega: a potência criativa dentro de sua esfera tão brutalizada pela 
decadência. 
 
 
 
27 
Nietzsche: um guia introdutório 
 
O niilismo em Nietzsche: decadência como 
um processo 
Por Vinicius Siqueira 
O niilismo em Nietzsche é um conceito chave que precisa ser 
discutido. Não é algo misterioso, mas também se diferencia daquilo 
que entende-se comumente pelo termo. Quando se fala de niilismo, 
é comum entender que se trata da negação de quaisquer valores. 
Nietzsche leva o termo para um caminho diferente, se referindo a ele 
como uma negação da vida. 
O que é a vida? A vida é dominação, violência, afirmação de si, é 
exercício da força, é se desligar do rebanho e se individualizar, é 
enfrentar o mundo de peito aberto e não se enganar com falsas 
crenças, é amar o mundo do jeito que ele é. O niilista, desta forma, é 
aquele que acredita em valores que não se confirmam na realidade, 
que não têm fundamento metafísico absoluto, é quem deixa de viver 
o agora em favor de uma suposta vida futura (num paraíso cristão ou 
numa sociedade ideal anarquista). 
O niilismo em Nietzsche não é uma escolha, mas é um processo. É 
uma situação em que nos encontramos não porque simplesmente 
escolhemos individualmente, mas porque fazemos parte de um 
processo que atravessa a história. Segundo Giacoia Junior, o niilismo 
 
 
28 
Nietzsche: um guia introdutório 
 
pode ser visto de duas maneiras nas obras de Nietzsche: como 
resultante da interpretação moral-cristã ou como resultante da crença 
nas categorias da razão. 
Niilismo, Nietzsche e a interpretação moral cristã 
Nietzsche entende que o fundamento niilista da nossa civilização 
ocidental não nasce com o cristianismo, mas tem bases anteriores, 
no entanto o cristianismo precisa ser interpretado como “potência 
civilizatória do mundo moderno, que sistematiza e universaliza as 
condições de conservação e reprodução do ascetismo platônico”. Ou 
seja, o que importa no cristianismo é sua estrutura religiosa – é sua 
forma de iludir e fazer crer naquilo que não é vida, no nada (é 
promover a vontade de nada) e sua força em promover este processo 
civilizatório anti-natural. 
No texto “Niilismo europeu”, o autor realiza uma pequena reflexão 
sobre a interpretação moral-cristã: 
Quais são as vantagens que oferece a hipótese moral 
cristã? 
1. ela conferia ao homem um valor absoluto, em oposição 
à sua pequenez e à sua natureza fortuita no fluxo do devir 
e do desaparecer; 
 
 
29 
Nietzsche: um guia introdutório 
 
2. ela servia aos advogados de Deus, na medida em que 
franqueava ao mundo, apesar do sofrimento e do mal, um 
caráter de perfeição, — aí incluída esta “liberdade” — o 
mal parecia pleno de sentido; 
3. ela coloca no homem um saber que assenta em 
valores absolutos e lhe traz assim um conhecimento 
adequado sobre o que, precisamente, é o mais 
importante, ela impedia que o homem se desprezasse 
enquanto homem, que ele tomasse partido contra a vida, 
que ele desistisse do conhecimento: ela era um meio de 
sobrevivência: — no todo: a moral era o grande remédio 
contra o niilismo prático e teórico19. 
 
A interpretação moral-cristã estabelece um lugar para o homem 
dentro do devir e retira toda sua pequenez, sua fragilidade. Seu corpo 
decrépito é trocado por uma alma imortal. Esse objetivo precisa de 
uma noção que dê valor de verdade para sua trajetória, então o autor 
alemão continua: 
Mas, dentre as forças que a moral desenvolveu, estava a 
veracidade: esta se volta finalmente contra a moral, 
descobre a sua teleologia, a sua perspectiva interessada 
— e eis que a visão desta tendência inveterada para a 
mentira, da qual se desiste de se livrar, age justamente 
como um estimulante. Para o niilismo. Constatamos 
agora a presença em nós de necessidades implantadas 
 
19 Friedrich Nietzsche. O Niilismo Europeu. 
 
 
30 
Nietzsche: um guia introdutório 
 
pela longa interpretação moral, e que nos aparecem 
também como necessidades do não-verdadeiro: por 
outro lado, é a elas que parece estar ligado o valor graças 
ao qual suportamos viver. Este antagonismo — não 
avaliar o que conhecemos, não mais tero direito de 
avaliar as mentiras nas quais gostamos de nos embalar 
— desencadeia um processo de dissolução20. 
A mentira se transforma no estimulante que nos faz agir. Em nossa 
força de viver. Vale dizer que o caminho da superação do cristianismo 
está justamente neste ponto: a crença na verdade nos obriga a evitar 
a mentira, nos colocando de frente com a crença religiosa. A 
“veracidade” que Nietzsche se utiliza acima é o “imperativo pela 
verdade” – esta força é, em seu fim, a auto-supressão da estrutura 
religiosa. A exigência daquilo que a estrutura religiosa possibilitou 
exigir mas que não pode atender. 
Niilismo e as categorias da razão 
Para Nietzsche, a crença nas categorias da razão nos faz acreditar 
num mundo que precisa ser visto por meio de falsas referências. 
Segundo Giacoia Junior, “Nietzsche tematiza três formas do 
niilismo,considerado como “estado psicológico”, ou seja, como 
conteúdo da consciência reflexiva. Em cada um deles, trata-se 
 
20 Friedrich Nietzsche. O Niilismo Europeu. 
 
 
31 
Nietzsche: um guia introdutório 
 
sempre de uma categoria da razão, que dá apoio a uma interpretação 
do vir-a-ser e do valor da existência humana na corrente do devir”. 
Segundo o comentarista (Giacoia Junior), “O primeiro desses estados 
de autoconsciência do niilismo é analisado por Nietzsche na 
perspectiva da categoria do “sentido”, ou finalidade. Para suportar a 
existência, o homem tem necessidade de interpretar o vir-a-ser como 
dotado de um sentido […] O niilismo ocorre, então, nessa primeira 
forma, com a descoberta de que não existe nenhum alvo no e para o 
devir, que o acontecer do mundo e da história não são processos que 
se desenvolvem em vista de um fim a ser alcançado, ao qual 
estaria ligado o seu sentido e valor. Desse modo, o desalento sobre 
a pretensa finalidade é causa do niilismo, enquanto sentimento de 
vazio, de um frustrador ‘foi tudo em vão'”. 
Ele continua, “A segunda forma do niilismo como estado psicológico 
é presidida pela categoria de “totalidade” – enquanto suporte de uma 
interpretação global do vir-a-ser. A representação de uma unidade, 
de uma organização e sistematização globais conectaria 
a multiplicidade caótica dos seres individuais, contingentes e 
efêmeros, a uma totalidade integrada e orgânica – a um todo 
racional, de infinito valor (panteísmo, monismo, etc.), promovendo a 
reconciliação entre a finitude aleatória e o infinito necessário”. 
 
 
32 
Nietzsche: um guia introdutório 
 
Já a terceira forma surge a partir das duas primeiras, como uma 
situação de negação de sua validade por não compreenderem o 
mundo “verdadeiro”. “E com isso, a terceira forma do niilismo surge 
como consciência da mendacidade do mundo metafísico, e como 
descrença na categoria de verdade – com a descoberta de que o vir-
a-ser é a única realidade – uma realidade, contudo, que não 
conseguimos suportar. Balanço final: desprezamos o resultado que 
alcançamos pelo conhecimento, ao mesmo tempo que não nos é 
mais lícito valorizar aquilo em que gostaríamos de continuar a crer”, 
revela o comentarista. 
Essas três formas de niilismo em Nietzsche (quando tomando as 
categorias da razão como referência) representam a impossibilidade 
de continuar com as interpretações baseadas nas categorias de 
sentido, totalidade e ser. Acredita-se que há um sentido, quando não 
há; acredita-se que há uma totalidade, quando não há; e acredita-se 
que, por nada ser de fato uma verdade (ou seja, por não haver 
sentido e nem totalidade), não há mais como viver a vida senão a 
partir de um movimento autodestrutivo de niilismo passivo, de aceitar 
o mundo sem valores e viver de forma covarde, ou seja, sem criar, 
somente aceitando. Sabemos que o “ser” não pode ser acreditado, 
mas não sabemos como viver sem a presença do “ser”, precisamos, 
então, entender que a única saída é criar. 
 
 
 
33 
Nietzsche: um guia introdutório 
 
Nietzsche – eterno retorno 
Por Rafael Trindade 
O maior dos pesos – E se um dia, ou uma noite, um 
demônio lhe aparecesse furtivamente em sua mais 
desolada solidão e dissesse: ‘Esta vida, como você a está 
vivendo e já viveu, você terá de viver mais uma vez e por 
incontáveis vezes; e nada haverá de novo nela, mas cada 
dor e cada prazer e cada suspiro e pensamento, e tudo o 
que é inefavelmente grande e pequeno em sua vida, 
terão de lhe suceder novamente, tudo na mesma 
sequência e ordem – e assim também essa aranha e 
esse luar entre as árvores, e também esse instante e eu 
mesmo. A perene ampulheta do existir será sempre 
virada novamente – e você com ela, partícula de poeira!’. 
– Você não se prostraria e rangeria os dentes e 
amaldiçoaria o demônio que assim falou? Ou você já 
experimentou um instante imenso, no qual lhe 
responderia: “Você é um deus e jamais ouvi coisa tão 
divina!”. Se esse pensamento tomasse conta de você, tal 
como você é, ele o transformaria e o esmagaria talvez; a 
questão em tudo e em cada coisa, “Você quer isso mais 
uma vez e por incontáveis vezes?‟, pesaria sobre os seus 
atos como o maior dos pesos! Ou o quanto você teria de 
estar bem consigo mesmo e com a vida, para não desejar 
nada além dessa última, eterna confirmação e 
chancela21. 
 
21 Friedrich Nietzsche, Gaia Ciência, 341. 
 
 
34 
Nietzsche: um guia introdutório 
 
O Eterno Retorno talvez seja um dos pensamentos mais conhecidos 
e importantes de Nietzsche. Procurando encontrar alternativas para 
fugir do niilismo decorrente da morte de Deus, o pensador alemão 
invoca a ideia do Eterno Retorno como possibilidade de aceitar e 
afirmar a vida. O importante não é pensá-lo como uma hipótese 
cosmológica, mas sim como um desafio ético, um pensamento 
seletivo. Você viveria sua vida mais uma vez e outra, e assim 
eternamente? Se fosse condenado a viver a mesma existência 
infinitas vezes, e nada além disso, como se sentiria? O Eterno 
Retorno é o niilismo usado como ferramenta contra ele próprio. 
Este pensamento é um teste que só os fortes podem suportar, um 
pensamento que seleciona as forças ativas. Caso se ame a vida e a 
frua autenticamente, a ideia do Eterno Retorno é uma bênção. Mas 
caso se esteja esperando pela próxima, guiando sua existência por 
uma pós-vida, amaldiçoando esta, neste caso, o pensamento de tudo 
voltar eternamente seria encarado como uma maldição. Aqueles que 
ainda podem nadar, abrem seu caminho em meio ao mar caótico das 
forças e chegam em terras desconhecidas, mas o mais pesado dos 
pesos faz naufragar os escravos da moral. 
Para Nietzsche, este pensamento supera todas as religiões e 
metafísicas porque mantém o centro de gravidade ética no real, não 
se busca por justificativas além-mundo para valorizar esta existência, 
ela se justifica por si mesma. O sem-sentido é uma operação seletiva. 
 
 
35 
Nietzsche: um guia introdutório 
 
Mas a seleção é bem diferente da platônica. Aqui a ideia é destruir 
em nós o que não pode ser salvo e voltar a criar o que possui a 
capacidade de criar. O martelo de Nietzsche serve para destruir e 
construir. Ele libera as forças corrompidas pelo ideal. O Eterno 
Retorno seleciona porque dilacera quando passivamente 
interpretado e leva ao êxtase quando ativamente interpretado. 
Com a morte de Deus, o mundo perde todos os parâmetros 
transcendentes em que se guiava. Não temos mais certo e errado, 
bem e mal como valores que alguma divindade nos revelaria, tudo 
passa a ser determinado pelo homem, construído e destruído 
exclusivamente porele. O Eterno Retorno é o niilismo mais selvagem 
que assusta aqueles que buscam um sentido. Ele abre dois 
caminhos: um onde a exaustão se esgota por si mesma; outro onde 
a abundância se supera: se separa e se expande. 
Pois bem, se a vida não tem sentido fora da própria vida, se não há 
valores transcendentes, então não há nenhum sentido na vida fora 
dela mesma, e não há uma entidade para julgar nossas ações. O 
Eterno Retorno coage o indivíduo a dar sentido por si mesmo. Ele se 
torna criador de valores, operando uma transvaloração de todos os 
valores. Esta capacidade de criar e ser juiz é o que justificará sua 
existência. Ele precisa escolher e criar pensando “viveria isso 
eternamente?”, “se tudo retorna, que forças justificam seu retorno?”. 
 
 
36 
Nietzsche: um guia introdutório 
 
A ideia de que tudo pode retornar exatamente igual nos torna 
infinitamente responsáveis por nossas escolhas e atitudes. Como 
seremos obrigados a vivê-las infinitas vezes, precisamos fazer o 
melhor possível, aqui e agora. Precisamos viver de modo que repetir 
tudo outra vez seja uma bênção! A vida não tem sentido? Ótimo! 
Melhor assim! Já imaginaram como seria se o mundo já estivesse 
justificado por um decreto divino? Já estivesse tudo decidido por 
algum ser superior? Por qualquer entidade que seja? Que tédio! Isso 
sim seria um terrível fardo! Não haveria sentido em criar nada. A 
moral, a religião, protegeram até agora a vida do sem-sentido, mas o 
Eterno Retorno é capaz de liberar as forças e diferenciar. Este é o 
papel do pensamento seletivo, acelerar a decadência nos permite ver 
quais forças devem se salvar e quais devem ser aniquiladas. 
Portanto, o maior de todos os pesos é também o maior de todos os 
presentes: se tudo retorna, a vida não tem sentido! Nós damos 
sentido a nossas vidas, como um artista que dá sentido a sua obra. 
Que bênção! Temos a chance, esta sim nos parece divina, de sermos 
responsáveis por nossa própria criação. Nietzsche abriu a 
possibilidade de nos tornamos artistas! Esculpindo-nos como nossa 
própria obra de arte; dançando a música da vida, não pelo que 
acontece depois que ela termina, mas pelo prazer do ritmo e da 
melodia. 
 
 
 
37 
Nietzsche: um guia introdutório 
 
Nietzsche – eterno retorno da diferença 
Por Rafael Trindade 
A vida tornou-se-me leve, a mais leve, quando 
exigiu de mim o mais pesado22. 
Tornar leve o maior dos pesos! É isso que pretendemos com este 
texto. O Eterno Retorno é um conceito de Nietzsche muito lido e 
comentado nesta página, Deleuze, grande leitor e intérprete do 
filósofo alemão, ocupou-se deste pensamento quando desenvolveu 
o conceito Eterno Retorno da Diferença. interpretação radical de uma 
ideia já um tanto quanto forte. 
E se um dia, ou uma noite, um demônio lhe aparecesse 
furtivamente em sua mais desolada solidão e dissesse: 
“Esta vida, como você a está vivendo e já viveu, você terá 
de viver mais uma vez e por incontáveis vezes”23. 
Sim! Esta é a aposta nietzschiana, você suportaria o pensamento do 
Eterno Retorno? A forma homem é capaz de afirmar o retorno de sua 
vida pequena e miserável? Conseguiríamos afirmar o retorno de tudo 
exatamente igual? “Tudo na mesma sequência e ordem – e assim 
 
22 Friedrich Nietzsche, Ecce homo. 
23 Nietzsche, A Gaia Ciência, §341. 
 
 
38 
Nietzsche: um guia introdutório 
 
também essa aranha e esse luar entre as árvores, e também esse 
instante“. 
Não, o homem não suportaria o Eterno Retorno, ele não abençoaria 
o demônio que lhe dissesse isso; na verdade, ele “se prostraria e 
rangeria os dentes e amaldiçoaria o demônio que assim falou“. O 
homem não consegue afirmar a existência com força o bastante para 
suportar o pensamento do Eterno Retorno; sua vida é muito fraca, ele 
pensa no porvir, no bem da humanidade, no progresso, no retorno de 
Cristo… 
“Você quer isso mais uma vez e por incontáveis vezes?‟ é um 
pensamento extremamente pesado para o homem. Por isso, o cerne 
da questão é quando Nietzsche escreve: “ou você já experimentou 
um instante imenso?“. Sim! Quando a Vontade de Potência afirma a 
si mesma, ela cria! A Potência é sempre força de criação, produção 
do novo, produção de diferença! 
O homem está preso na repetição de sua vida medíocre, sente o 
peso da existência, sente suas forças se esvaírem. O Além-do-
Homem é capaz de afirmar a existência porque sua força de 
afirmação é a de criação de novos valores! Nada é igual porque 
quando ele afirma ele o faz criando! A própria essência de seu ser é 
sua capacidade de diferenciar-se. O homem pequeno julga, tem 
medo, se esconde, pede tutela; já o Além-do-Homem está acima do 
 
 
39 
Nietzsche: um guia introdutório 
 
bem e do mal, só ele é capaz de afirmar o Eterno Retorno, porque 
para ele, o que retorna é a diferença, não o mesmo. 
É no pensamento do Eterno Retorno onde tudo se decide, onde os 
fortes se separam dos fracos, onde se diz Sim ou Não à vida e à 
existência. Ele é a chave para quebrar o niilismo! Por que o Eterno 
Retorno da Diferença separa os fortes dos fracos? Porque ele faz a 
seleção das forças. Você suporta o Eterno Retorno? Então você 
consegue afirmar a diferença que existe na própria afirmação! O 
niilista vence a si próprio, de reativo torna-se ativo. O peso do Eterno 
Retorno quebra o homem, o transforma em algo capaz de criar 
momentos imensos, onde o que se afirma é a própria afirmação de 
sua Vontade de Potência. 
O processo se dá em dois momentos. São duas afirmações: 
 Pensamento Seletivo: acabar com os meio quereres, “Você 
quer isso mais uma vez e por incontáveis vezes?‟. Afirmar 
aquilo que se quer, aquilo que se faz e aquilo que passou, 
“transformar todo foi em assim eu quis”24. 
 Ser Seletivo: o Eterno Retorno da Diferença é uma roda 
(devir) que gira rápido. O movimento centrífugo elimina 
aqueles que não conseguem manter-se. O que gira são as 
 
24 Friedrich Nietsche, Assim Falou Zaratustra. 
 
 
40 
Nietzsche: um guia introdutório 
 
próprias forças que se afirmam, as forças se afirmam no devir, 
somente aquele forte o bastante é capaz de suportar. “Só 
volta a afirmação, só volta aquilo que pode ser afirmado, só a 
alegria volta. Tudo o que pode ser negado, tudo o que é 
negação, é expulso pelo próprio movimento do Eterno 
Retorno”25. 
Por isso trata-se de uma dupla afirmação: do devir, e da própria 
afirmação do devir. É um problema ético, aquele que consegue 
afirmar-se é aquele que dá à Vontade de Potência livre curso. Suas 
forças não estão quebradas, seus joelhos não estão dobrados. A 
Vontade de Potência sabe que a própria afirmação já é afirmar a 
diferença, isto porque a Vontade de Potência é a força de criação e 
diferenciação. Por isso torna-se leve e aprende a dançar. 
O homem ativo sabe que o que retorna é a diferença, e mais, ele quer 
fazer retornar a diferença, está ansioso por isso, operando mortes e 
criações! O movimento de diferenciação é a própria marca do seu 
ser, ele se diz através da diferença. O pensamento do Eterno Retorno 
destrói o homem cansado e o leva à ação, para dar livre curso à sua 
Vontade Criadora. O niilismo é vencido por si mesmo. 
 
25 Deleuze, Nietzsche, p. 32 
 
 
41 
Nietzsche: um guia introdutório 
 
Tudo se torna leve, tudo dança, tudo acompanha o fluxo de produção 
infinita. Não há nada mais leve que o Eterno Retorno da Diferença, 
mas “o quanto você teria de estar bem consigo mesmo e com a vida,para não desejar nada além dessa última, eterna confirmação e 
chancela?“. 
 
 
 
 
 
Por Colunas Tortas.

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