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A1 PESQ.PRAT.ED.III

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A1- PESQUISA E PRÁTICA EM EDUAÇÃO III
A disciplina de Pesquisa e Prática em Educação no curso de Pedagogia e a construção de um novo olhar – desafios para a prática docente
O conjunto de disciplinas denominado “Pesquisa e Prática em Educação” visa primordialmente contribuir para a formação do futuro pedagogo tendo em vista qualificá-lo na apropriação do processo de construção do conhecimento científico na área da educação. Nesse sentido, os PPEs têm como foco a formação de profissionais que busquem a superação do senso comum através de um posicionamento crítico diante das teorias e práticas educacionais existentes no conjunto de relações sociais historicamente constituídas.
OBJETIVOS= 1. Entender a pesquisa como elemento central da formação do(a) professor(a) e do(a) pedagogo(a); 2. refletir sobre a construção do olhar no processo de formação do ser humano no mundo atual; 3. analisar criticamente a dimensão da individualidade e da condição política do ser humano na cultura urbano-industrial; 4. conhecer alguns elementos do pensamento de Antonio Gramsci e o papel da escola na atualidade.
Pedro Demo: O ALUNO QUE SE DIFERENCIA É O ALUNO QUE PESQUISA. SABER FUNDAMENTAR SEM SER DONO DA VERDADE. NÃO FIXAR IDEIAS. OUVIR O OUTRO. O ALUNO QUE PESQUISA BEM, SE FORMA INCRIVELMENTE MELHOR. O ALUNO DEVE PESQUISAR E ELABORAR, INTERPRETAR, RECONSTRUIR. CO-PRODUZIR CONHECIMENTO. SABEMOS INTERPRETAR O SILÊNCIO, UMA RETICÊNCIA, A AUSÊNCIA. LER NAS ENTRELINHAS. 
A construção do olhar
Nas diferentes disciplinas do curso de Pedagogia, podemos identificar um elemento comum. A compreensão de que os diferentes tipos de conhecimento são produtos históricos produzidos pelo homem como forma de compreensão da existência do mundo natural e do mundo humano. Tal entendimento nos coloca diante de outra questão: Quem é o homem?” Tal questão nos leva a outras em nossa disciplina: quem é o pesquisador? De que lugar o pesquisador está falando? Como se constrói o olhar na pesquisa?
Na tentativa de compreendermos tais questões, estaremos dialogando com o pensamento de Antonio Gramsci que, em sua obra “Concepção Dialética da História”, coloca-nos diante da seguinte questão: O QUE É O HOMEM?
A mesma não é colocada de forma genérica, mas de uma forma singular em um dado contexto específico. Para chegarmos a um entendimento, é necessário concebermos que “o homem é um processo, precisamente o processo de seus atos”. (GRAMSCI).
Neste mesmo sentido, Marx  (p.26-27), na obra Ideologia Alemã, afirma o seguinte:
(...) não se parte do que os homens dizem, representam ou imaginam, nem tampouco do homem predicado, pensado, repensado ou imaginado, para chegar, partindo daqui, ao homem de carne e osso; parte-se do homem que realmente atua e, partindo de seu processo de vida real, se expõe também o desenvolvimento de reflexos ideológicos e dos ecos deste processo de vida. (...) E neste modo de considerar as coisas não é algo incondicional.
Parte das condições reais e não as perde de vista nem por um momento. Suas condições são os homens, mas não vistos e plasmados através da fantasia, mas em seu processo de desenvolvimento real e empiricamente registrável, sob a ação de determinadas condições. Tão logo se expõe este processo ativo de vida, a história deixa de ser uma coleção de fatos mortos, ainda abstratos, como o é para os empiristas, ou uma ação imaginária de sujeitos imagináveis como é para os idealistas.
O entendimento filosófico desses pensadores permite compreender a necessidade de se ter consciência crítica do momento histórico vivido pelo homem, em suas dimensões e em suas implicações, como também, se ele pode construir o seu próprio caminho, ou seja, ser responsável pelo seu próprio destino.
Em outras palavras, podemos colocar o Ser Humano como sendo o construtor de sua própria natureza. Desta forma, podemos então perguntar: “O QUE É QUE O HOMEM PODE SE TORNAR?” (GRAMSCI, 1991:38)
Este questionamento de Gramsci nos coloca diante da dimensão de que o homem é resultado da sua relação com a natureza e com os outros homens e, nesta perspectiva do materialismo, compreende-se que se está diante da necessidade de produzir sua existência e o fará através do trabalho enquanto um ato intencional, portanto um fenômeno humano. Em suas palavras, podemos compreender o homem: “como uma série de relações ativas (um processo), no qual, se a individualidade tem a máxima importância, não é, todavia, o único elemento a ser considerado” (idem, 1991: 39).
A PROBLEMÁTICA DA INDIVIDUALIDADE
As colocações feitas até o momento nos faz um convite a pensar uma questão essencial para a sociedade moderna e, mais especificamente, para a educação, ou seja, sobre o que a individualidade reflete.
Para Antonio Gramsci, ela reflete a própria humanidade e é composta por três elementos básicos:
“A possibilidade não é a realidade, mas é também ela, uma realidade: que o homem possa ou não possa fazer determinada coisa, isto tem importância na valorização daquilo que realmente se faz. Possibilidade quer dizer liberdade. (...) Mas a existência das condições objetivas - ou possibilidade, ou liberdade - ainda não é suficiente: é necessário ‘conhecê-las’ e saber utilizá-las. O homem, neste sentido, é vontade concreta. (...) 
O homem deve ser concebido como um bloco histórico de elementos puramente subjetivos e individuais e de elementos de massa - objetivos ou materiais - com os quais o indivíduo está em relação ativa” (1991: 47) [Grifo nosso].
Podemos sinalizar que o homem, mesmo sendo determinado por fatores externos, reúne as condições individuais e as condições coletivas para superar o determinismo. Contudo, o momento de tomada de consciência dos elementos que formam a sua personalidade, ou individualidade, é sem dúvida um momento individual, mas a sua realização é resultante das relações que se estabelece com os outros homens, ou seja, em todos os níveis de relações que fazem parte do gênero humano. Portanto, a consciência individual resulta de relações sociais concretas.
É justamente aí que reside a sua mais ampla dimensão histórica, a dimensão política: “Por isso, é possível dizer que o homem é essencialmente ‘político’, já que a atividade para transformar e dirigir conscientemente os homens realiza a sua ‘humanidade’, a sua ‘natureza humana’.” (Gramsci, 1991: 48)
A DIMENSÃO POLÍTICA DO HOMEM
Esta dimensão adquire um significado maior na cultura urbano-industrial, devido à complexidade das relações sociais, com a inserção da ciência no processo produtivo. O homem coletivo atual, segundo Gramsci: “forma-se essencialmente de baixo para cima, à base de composição ocupada pela coletividade no mundo da produção: também hoje o homem representativo tem uma função na formação do homem coletivo, mas muito inferior àquela do passado, tanto que ele pode desaparecer sem que o alicerce coletivo se desfaça e a construção caia.” (b, 1991: 169).
Contudo, o próprio Gramsci adverte que, “cada homem, desde que ativo, isto é, vivo, contribui para modificar o ambiente social em que se desenvolve (para modificar determinados caracteres ou para conservar outros), tende a estabelecer ‘normas’, regras de vida e de conduta.” (b, 1991:154).
 A TRANSFORMAÇÃO DA CULTURA
A concepção de homem para Antonio Gramsci nos possibilita afirmar e acreditar na possibilidade do homem superar os diversos fatores que determinam a sua condição de vida, a partir de uma cultura elaborada pelos seus antepassados e que continua em processo de construção. Portanto, a transformação da cultura é um desafio constante na história da humanidade e, especificamente, para a prática educativa. Sendo assim, se considerarmos o processo de desenvolvimento da cultura urbano-industrial da sociedade moderna e capitalista, percebemos a dificuldade de superação da mesma.
Essa sociedade, por sua vez, está baseada em uma organização de produção que, para alcançar o seu principal objetivo, que é o acúmulo de capital, estabelece uma relação de trabalho de forma individualizada,fragmentada e, acima de tudo, com um caráter mercadológico e competitivo. Essa lógica acaba por aprofundar uma estrutura social de divisão de classes, como também de promoção da alienação da consciência das classes sociais e de uma profunda desumanização, pois a mesma institui uma cultura baseada no sucesso individual, no marketing pessoal da lógica do mercado de trabalho.
Consequentemente, são diversas as desigualdades sociais nos mais variados setores da sociedade. Assim, algumas questões se colocam tanto para uma prática pedagógica comprometida com a transformação quanto para uma pesquisa: De que modo o homem se constitui como grupo social? Como é possível superar a “concepção de mundo” herdada do grupo social ao qual pertencemos?
A ATIVIDADE INTELECTUAL
Numa perspectiva gramsciana, toda atividade intelectual, por mais simples que seja, está contida numa determinada concepção de mundo. Isto nos permite considerar que tanto o conhecimento quanto a pesquisa são datados e intencionais, pois expressam uma compreensão gestada a partir de uma cultura, de um contexto histórico específico. Sendo assim, o desafio que se coloca para o homem é o seguinte: é preferível fazer parte desta concepção de forma consciente ou inconsciente?
Se entendermos que a via correta é a dimensão da consciência, teremos as condições necessárias para fazermos a crítica da mesma e nos tornarmos responsáveis pela elaboração da própria concepção de mundo, ou seja, da nossa personalidade. “Pela própria concepção do mundo, pertencemos sempre a um determinado grupo, precisamente o de todos os elementos sociais que partilham de um mesmo modo de pensar e de agir. Somos conformistas de algum conformismo, somos sempre homens-massa ou homens-coletivos. O problema é o seguinte: qual é o tipo histórico do conformismo e do homem-massa do qual fazemos parte? (...) Criticar a própria concepção de mundo, portanto, significa torná-la unitária e coerente e elevá-la até o ponto atingido pelo pensamento mundial mais desenvolvido. Significa, portanto, criticar, também, toda a filosofia até hoje existente, na medida em que ela deixou estratificações consolidadas na filosofia popular” (Idem a, 1991: 12)
Em um modelo de sociedade baseado na relação de dominação e de exploração da força produtiva, entendemos que o trabalho - enquanto categoria histórica da realidade humana - é o eixo central para a discussão e compreensão das relações sociais decorrentes do modo de produção.
A cultura urbano-industrial, desenvolvida a partir do modelo americano e fordista, trouxe um novo elemento nas relações do sistema produtivo e nas relações sociais decorrentes deste modelo.
As origens desta cultura data da Revolução Industrial do século XIX e da formação do Estado Moderno ou Estado Nação como modelo de Estado da burguesia capitalista. Aqui estamos nos referindo à Segunda Revolução Industrial.
Desta forma, estamos falando da inserção da ciência produtiva, no mundo da produção, e o desenvolvimento de métodos racionalizados de organização do trabalho. A partir deste momento, a educação assume um caráter estratégico para a formação dos quadros especializados adquirindo um novo caráter.
“No mundo moderno, a educação técnica, estreitamente ligada ao trabalho industrial, mesmo ao mais primitivo e desqualificado, deve constituir a base do novo tipo de intelectual” (GRAMSCI, 1978:8)
Em decorrência do desenvolvimento da produção em série racionalizada, a sociedade moderna passou a lidar com dois novos fatores importantes no embate das relações entre classes dominantes e classes dominadas: de um lado, maior controle da força produtiva e, de outro, a organização e o fortalecimento da sociedade civil nos diversos ramos da atividade social.
É neste contexto que a escola aparece como um locus privilegiado para a formação dos intelectuais, que darão organicidade às diversas propostas de sociedade devido à complexidade da realidade. “A escola é o instrumento para elaborar os intelectuais dos diversos níveis (...) quanto mais extensa for a área escolar e quanto mais numerosos forem os ‘graus’ ‘verticais’ da escola, tão mais complexo será o mundo da cultura, a civilização de um determinado Estado.” (1978: 9).
“A multiplicação de tipos de escola profissional, portanto, tende a eternizar as diferenças tradicionais; mas dado que ela tende, nestas diferenças, a criar estratificações internas, faz nascer a impressão de possuir uma tendência democrática (...). Mas a tendência democrática, intrinsecamente, não pode consistir apenas em que um operário manual se torne qualificado, mas em que cada ‘cidadão’ possa se tornar ‘governante’ e que a sociedade o coloque, ainda que ‘abstratamente’, nas condições gerais de fazê-lo (...) a multiplicação das escolas profissionais, cada vez mais especializadas desde o início da carreira escolar, é uma das mais evidentes manifestações desta tendência.” (c, 1978: 136-137)
“O advento da escola unitária significa o início de novas relações entre trabalho intelectual e trabalho industrial não apenas na escola, mas em toda a vida social. O princípio unitário, por isso, irá refletir em todos os organismos de cultura, emprestando-lhes um novo conteúdo.” (c, 124-125).
PARA REFLETIR: 
Todos os homens do mundo, na medida em que se unem entre si em sociedade, trabalham, lutam e melhoram a si mesmos (Antonio Gramsci).

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