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Michel Foucault (a verdade e as normas jurídicas) e Carl Schmitt (o nomos da Terra no direito das gentes do jus publicum europaeum)

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FOUCAULT
A verdade e as formas jurídicas. “Conferência III”.
O velho direito germânico, dos “povos bárbaros” (paralelo à Roma) porta os traços mais característicos do direito medieval.
Como ordenamento normativo, o direto germânico tem grande proximidade ao Direito Grego Arcaico, da época de Homero: “dois guerreiros se afrontam para saber quem estava errado e quem estava certo, quem havia violado o direito do outro. A tarefa de resolver esta questão cabia a uma disputa regulamentada, um desafio entre os dois guerreiros. Um lançava ao outro o seguinte desafio: ‘És capaz de jurar diante dos deuses que não fizestes o que eu afirmo? ’ Em procedimento como este não há juiz, sentença, verdade, inquérito nem testemunho para saber quem disse a verdade. Confia-se o encargo de decidir não quem disse a verdade, mas quem tem razão, à luta, ao desafio, ao risco que cada um vai correr. (pg. 53)
Schmitt analisou como o direito era difuso e temporário na Idade Média e só ocorria mediante um conflito. Conflito que só era válido entre soberanias católicas. Esse direito era exercido ora por um pároco local, senhor local, príncipe ou imperador. Não havia, portanto, figuras encarregadas somente do exercício do direito.
A forma do direito positivo praticamente inexistia dentro das soberanias. 
Para Schmitt, à ideia de soberania é sobreposto uma série de convicções mitológicas. Portanto, a figura do outro político tem sempre um viés religioso e é negativa. Assim, não há um direito universal propriamente dito. É do direito interno da República Cristã que emerge o Nomos da Terra.
O direito romano ganhou importância na constituição das autoridades políticas, que começam a se desenvolver nos sécs. XIV e XV. Tal direito criou um nomos capaz de criar a distribuição de poder em todo o planeta.
Há uma outra hipótese que explica como o direito romano vai instituir o direito positivo, que reside na teoria formulada por Foucault.
A primeira forma do direito positivo se dá na época absolutista, a qual não fornece liberdade efetiva para o todo.
Foucault inicia a sua posição fazendo uma breve descrição do direito germânico. Ele enfatiza o aspecto local do direito medieval. Assim, para ele, aquilo que define o direito medieval a partir de uma circunscrição local consiste na maneira como a comunidade na Idade Média constrói seus modos de convivência.
Os homens da Idade Média não sabiam que se encontravam nesse período entre a Antiguidade Clássica e a Modernidade. Eles achavam que viviam na própria Antiguidade, assim como os romanos. Eles se consideravam, portanto, herdeiros diretos da tradição clássica.
De acordo com Foucault, a tradição medieval é também clássica, devido à influência dos institutos da tradição da Grécia Arcaica.
Para o autor, o direito medieval é herdeiro do direito germânico, que é uma vertente do direito grego arcaico.
No direito grego arcaico, a justiça não é arbitrada por um juiz, mas sim observada e fundamentada por rituais. As regras de tradição prescrevem as normas dentro de cada sociedade. Assim, o que é justo ou não é estabelecido por um ideal de tradição.
A fórmula do direito grego arcaico é um ato no qual dois guerreiros enfrentam-se. A decisão acerca da justiça desse confronto é a observância do mesmo, à luz da tradição que predomina na sociedade.
A nossa civilização não avança lentamente, mas desdobra-se por meio de descontinuidades, por meio de substituições de ideias por outras. Uma dessas mudanças se dá pela substituição do direito medieval pelo moderno, positivo.
No direito grego arcaico, existe um pressuposto de um conflito entre dois indivíduos. Neste, estabelece-se um ritual, dentro do qual é verificado qual das partes condizem com ele ou não, qual é mais ortodoxo ou heterodoxo. Quem arbitra esse conflito são os Deuses. E as questões de direito comum são teológicas.
A questão da verdade não é uma questão de justiça, mas da observância da prática de rituais humanos. Assim que se dava o direito no mundo antigo. A justiça de uma conduta é estabelecida mediante uma aproximação desta com o ritual que predomina na sociedade. A justiça, na Antiguidade, se apoiava num caráter agonístico, por meio do qual era possível perceber a conformidade de uma conduta com um ritual.
No Direito Germânico, não há ação pública (ninguém que, representando a sociedade, o grupo dominante, o poder instituído ou seus detentores, acuse os indivíduos de suas eventuais faltas perante a comunidade) – para que houvesse uma ação penal, era necessário a existência de dois personagens e nunca três.
Liquidação judiciária de uma ação penal fazia-se como “uma espécie de continuação de luta entre os indivíduos”, ritualizada, entretanto, segundo formas procedimentais reconhecidas como portadoras de atribuição de direitos. “Uma espécie de guerra particular, individual, desenvolve-se e o procedimento penal será apenas a ritualização dessa luta entre os indivíduos. O Direito Germânico não opõe a guerra à justiça, não identifica justiça e paz. Mas, ao contrário, supõe que o direito não seja diferente de uma forma singular e regulamentada de conduzir uma guerra entre os indivíduos e de encadear os atos de vingança. ” (págs. 56-57) 
Acordo e termo no Direito Germânico: “O antigo Direito Germânico oferece sempre a possibilidade, ao longo desta série de vinganças recíprocas e rituais, de se chegar a um acordo, uma transação. Pode-se interrompera série de vinganças com um pacto. Nesse momento, os dois adversários recorrem a um árbitro que, de acordo com eles e com seu consentimento mútuo, vai estabelecer uma soma em dinheiro que constitui o resgate (...) Nesse procedimento, um dos dois adversários resgata o direito de ter a paz, de escapar à possível vingança de seu adversário” (pág. 57).
Para falar do problema da centralização do direito, Foucault volta para o direito medieval. É do direito instituído na República Cristã que emerge o direito moderno.
Aquilo que nos interessa do direito medieval, data das formas jurídicas da civilização germânica, que vieram a originar o próprio direito medieval.
Foucault extrai do direito desses povos os elementos que originaram o direito moderno. O direito germânico tem a forma de uma disputa direta entre dois contendores. Quem arbitra é a maneira pela qual os desígnios divinos guiam as ações humanas.
O direito germânico alega que a justiça não é a questão de apurar fatos, buscar a verdade. A justiça é um atributo divino, que se realiza relegando a vitória a alguma das partes de um conflito qualquer.
Sobre povos de tradições diversas, esse conflito culminará numa guerra. Isso também pode se dar sobre povos de tradições comuns, porém as duas partes de uma guerra podem recorrer a um árbitro, o qual exerce o mandato do Katechon, de modo a resolver a guerra. Esse árbitro exerce uma opinião acerca de qual parte está correta num conflito, mas tal opinião não tem sua base em fatos e sim em atributos divinos.
Na Idade Média, as questões políticas e de direito não estavam separadas das questões religiosas. No direito germânico, não há oposição entre guerra e justiça, à medida que a própria guerra é uma medida para se alcançar a justiça.
Caso um ato seja ilegítimo, a série de vinganças processuais irão se desdobrar. Normalmente, tais vinganças são rituais locais e têm regras procedimentais. Essas regras não subsistem no direito moderno. No entanto, não desapareceram da cultura da sociedade moderna, se preservando como regras morais. Tais regras são direito que perdeu vigência em grande parte de sua positividade, mas permaneceu no âmbito cultural social.
Embora a guerra e a vingança constituam recursos procedimentais do direito germânico, a guerra não é ilimitadamente regrada por tal direito. É possível a existência de pactos que cessem guerras, os quais se dão por meio do estabelecimento de uma quantia pecuniária, responsável por colocar fim à guerra.
Foucault é envolvido com questões políticas inclinadas para a extrema esquerda, a partir dos anos 70. Isso é influenciado pela onda de protestosestudantis na França, em 68, que tinham o intuito de implantar o regime comunista no país. Esse movimento tem influência no mundo todo.
Foucault dedicava a maior parte de seu tempo a pesquisas excêntricas, o que tornou sua trajetória acadêmica, em grande parte, marginal. Ao se formar, Foucault assume um posto público na Suécia e lá ele encontra documentos acerca da saúde mental, o que será tema de estudo. Ele buscou, na história da loucura, fragmentos concisos para explicar como a cultura faz a fronteira entre a loucura mental e a sanidade.
Foucault torna-se famoso em 1966, com uma obra que tinha o intuito de saber as formas do povo pensar a partir do século XV. Ele tem interesse em explicar as maneiras pelas quais o senso comum se estabeleceu nos sécs. XVII e XVIII.
Foucault afirma que, na Idade Média, as principais instituições do direito medieval remontam à Antiguidade Arcaica elencada pela filosofia e mitologia. O direito medieval se refere a um mundo grego que era organizado por tribos guerreiras, onde a honra estava constantemente em jogo. Ademais, o direito medieval tem originalidade pois está inspirado no direito germânico da Antiguidade.
Quando a modernidade de instaura, ela reivindica a sua origem na Antiguidade Clássica. Ela renasce em contraposição com a Idade Média. No momento em que começa a surgir um Estado com capacidade de centralização, esse Estado está inclinado com as instituições do direito romano.
O direito medieval é uma face do antigo direito germânico, no qual existem duas pessoas em conflito. No meio delas há um procedimento capaz de avaliar a conduta das partes em litígio. Aquela que estiver conforme a ortodoxia é a mais justa, já a outra é usurpadora de direitos. O procedimento do direito germânico era o duelo, que regula os conflitos. Ele era, então, uma regra de direito.
Há um acontecimento decisivo na história do ocidente que muda a maneira pela qual se pensava o direito, que foi a tomada da Saxônia pela Normandia, no séc. XI. A partir daí surgiu a busca pela verdade factual num processo, que se deu com a origem do inquérito. A verdade factual, pela primeira vez, põe-se como um problema de justiça. Assim, na tomada da Saxônia, o rei normando buscou governa-la com legitimidade, mas o povo saxão não a reconheceu e isso produziu uma série de rebeliões. 
Para fundar a legitimidade de seu governo, o rei normando busca um mecanismo do Império Carolíngeo, denominado Inquérito.
O inquérito era uma instituição romana, que recorria a depoimentos e provas factuais, de modo a colocar o processo em curso. 
A tomada de terra na Idade Média era a maneira principal pela qual as riquezas circulavam nessa época. Isso se dava por meio da indenização, realizada com o objetivo de cessar uma vingança. Qualquer autoridade soberana de tinha o intuito de centralizar o território mexia na circulação da riqueza.
Para interferir em cada conflito era preciso uma regra de direito que legitimasse a interferência dos soberanos. Essa regra era encontrada numa instituição que buscava a verdade factual (o inquérito).
Os soberanos que estavam centralizando o poder nos sécs. XI e XII recorreram ao inquérito. Se o ato de violação da tradição for percebido, ele se constituirá como uma infração das regras de direito. Por meio da ideia de infração das regras comuns, todos os reis podiam interferir nas lutas. Para tal, o agressor precisava ser flagrado no ato de violação.
O inquérito é o recurso pelo qual a verdade do fato delituoso é introduzida no processo. A partir daí ocorre a centralização do direito nos reinos.
Pacto que interrompe a sucessão das vinganças rituais que, no direito medieval, estabelecem continuidades entre a justiça e a guerra (resgate em dinheiro de um direito à paz) é uma das principais maneiras pelas quais bens e riquezas circulam na Idade Média, junto à herança, ao testamento e à contestação belicosa e confrontado ao tímido comércio.
Vinculação entre guerra, direito e riqueza na Idade Média: “Na medida em que a contestação judiciária assegurava a circulação dos bens, o direito de ordenar e controlar essa contestação judiciária, por ser um meio de acumular riquezas, foi confiscado pelos mais ricos e mais poderosos” (pág. 65).
Emerge desta interferência dos soberanos mais poderosos no interior dos litígios uma série de novas regras de direito:
Confiscação do direito das partes adversárias liquidarem entre si os litígios por um poder exterior (judiciário) que a elas se impõe.
Invenção do procurador como representante do soberano da verificação de crimes. Por meio dele, o soberano busca substituir a vítima como alvo da agressão e apossar-se do direito de estabelecer o acordo.
Nesta confiscação geral pela autoridade estatal em formação, o dano (agressão de uma parte a outra) é substituído pela infração (violação à lei).
Reparação não é mais uma indenização de uma parte a outra, mas uma reparação por meio de multas, “confiscações de bens que são, para as monarquias nascentes, um dos meios do seu enriquecimento” (pág. 67).
O indício da emergência do direito moderno data da ocupação normanda da Saxônia. Isso é um acontecimento de maior profundidade na história geral do direito, à medida que surge a necessidade de criar fatos, um corpo de fatos, a fim de serem levados em conta para instruir a criação de um direito. Assim, a verdade factual passou a se introduzir no processo, pela primeira vez.
Antes, a verdade não era considerada importante para deliberar acerca da justiça de um processo.
Foucault explica por que o acontecimento da Saxônia se generaliza para a Europa. O rei da Saxônia se vê na necessidade de estabelecer elementos que incluíssem as convenções da Saxônia. A partir daí emergiram as formas do direito moderno. Os normandos não inventaram apenas um novo direito, ao admitir a verdade factual no interior do processo, mas também a influência das soberanias políticas em cada litígio entre as partes que se deram no território.
A circulação de riquezas, por meio de mercados, é muito pequena na Idade Média, à medida que o comércio é muito restrito. A riqueza circula pela herança patrimonial, por meio das intitulações (autoridade política atribui direitos de tributação a pessoas), por conquistas militares e por meio dos pactos (resgates que estabeleciam um termo entre as partes em litígio).
Os soberanos perceberam que um dos instrumentos importantes para o aumento de seu poder político e econômico seria sua interferência nos litígios, apropriando-se de uma parte das riquezas relegadas em pactos. 
Quando alguém era flagrado provocando um dano, esse indivíduo poderia ser acusado por uma autoridade política. As pessoas podiam julgar sobre o que era justo ou injusto. O ato era, neste caso, julgado sem a aferição de seus efeitos. Isso era previsto no direito medieval da Saxônia. Não havia a invocação do Katechon. Criou-se uma exceção para se fazer valer o direito da Saxônia.
Outros reis da Europa incorporaram esta regra. A partir daí eles passam a interferir na circulação de riquezas, mais precisamente nos pactos dos litígios. Esse mecanismo é o confisco do direito das partes resolverem conflitos sem um árbitro. Nesta confiscação, o dano que uma parte cometia contra a outra passou a consistir numa infração, violação de lei concreta. Parte da riqueza produzida era recolhida pelas monarquias nascentes.
Direito passou a ganhar dimensão universal. 
CARL SCHMITT
Carl Schmitt fala da história situando o direito fora dele mesmo. Ele situa as invenções do direito na história. E trata da centralização do direito a partir da invenção dos estados nacionais. Nesse momento, o velho direito germânico, que não excluía a violência, é centralizado e retorna a evidência do antigo direito romano.
Inquérito: instrumento do direito romano que passou a ser utilizado pelos reis.
O processo de invenção do direito como algo positivo foi tardio e respondeu ao objetivo de centralizar o poder nas mãos dos monarcas, à medida que ele estava descentralizado na Idade Média.
Embora a IdadeMédia tenha sido revestida por uma hierarquia de tradição, ela não significava subordinação de poder político de um monarca para com o outro. Nesse momento, não havia um direito formal para todos. Mas, no final do séc. XII, o velho direito romano começa a reemergir (para tornar população homogênea). 
Schmitt analisa como se forma o direito positivo de um ponto de vista externo. 
Para que os Estados se centralizassem e para que, entre eles, vigesse um nomos, as questões de direito, dentro da República Cristã, eram realizadas por meio do Katechon. A figura que exerce o Katechon não é fixada em termos de direito. O exercício do Katecho é um dos recursos possíveis do direito, à medida que quem o exerce emite opiniões e não sentenças.
Quem exerce o Katechon não é propriamente um terceiro termo de direito. Ele só se tornará um terceiro termo quando o procurador confisca os próprios direitos que as partes tinham de resolver seus litígios. O procurador era revestido de poder por parte do soberano.
Do ponto de vista externo do direito das gentes, o Katechon, que era um terceiro entre as partes (terceiro sem poder), passou a se encontrar acima delas. Isso se deu à medida que o poder do rei se fortaleceu. Desde então, ele confiscou a resolução dos conflitos entre as partes em litígio, por elas mesmas.
O Katechon tende a desaparecer quando o poder do Papa entra em declínio, com a Reforma Protestante. A Reforma introduz uma suspeita de que o Katechon e o sacerdócio sejam formas de efetivação na Terra feitas pelo anticristo. E, ao destituir o Katechon de autoridade, Lutero instiga a guerra religiosa contra qualquer decisão feita pelo Katechon. Ademais, a Reforma altera o caráter da guerra do ponto de vista interno. Ela transformou as faidas em guerras de aniquilação total (guerra civil). E emerge, a partir daí a necessidade dos reis de interferirem em tais guerras. Isso se deu pois elas colocaram em risco as soberanias estatais.
Reagindo a essa ameaça, ocorre uma mudança no nomos da terra.
“A tomada de terra em um novo mundo”
A descoberta da América suscita uma perspectiva global do mundo que põe a necessidade de uma nova ordem espacial: terras e mares precisam ser partilhados segundo uma distribuição geométrica estabelecida a partir de linhas (meridianos) que cortam abstratamente todo o globo terrestre (“concepção de linhas globais”).
Carl Schmitt fala da passagem da República Cristã para a ordem Moderna.
No espaço sob jurisdição do Estado, emerge um terceiro termo que exige uma reparação do litígio.
Schmitt fala do espaço externo da jurisdição do Estado. Neste, o Katechon é rompido pela Reforma. No espaço extra-estatal, por sua vez, o Katechon desaparece.
Está se pondo na história, nessa passagem da ordem medieval para a moderna, a necessidade de separação entre direito e religião. 
A conquista da América, liderada pelo Império Espanhol, altera o jogo das coordenadas espaciais que definiam uma relação com a lei. Muda-se o entendimento daquilo que é justo ou injusto.
A primeira forma pela qual emerge a ambição de partilhar a terra, segundo uma regra única, é a definida pelas linhas geográficas que demarcam quais territórios podem ser ocupados por quais potências da Europa. Esse nomos ainda está sob efeito do antigo direito das gentes.
A primeira divisão do nomos é formal, matemática, pois não se sabe a condição das terras que formam o planeta. Ela se dá, via de regra, por meio de mandados papais. O Papa emite uma ordem que atribui a necessidade de reis executarem missões em terras não-cristãs. 
A descoberta da América como território livre é a abertura de todo o globo terrestre como território passível de conquista. Essa descoberta abre a necessidade de que o mundo todo seja convertido ao cristianismo. Dessa forma, o objetivo é que o Katechon seja exercido para além de seu território, isto é, em todo o planeta.
A primeira das linhas abstratas que se forma é o Tratado de Tordesilhas. A partir dele é arbitrada a primeira linha global. Cada uma das divisões que tal tratado estabelece consiste na “raya”.
[Conquista da América]
Distintos estágios de concepção de linhas globais na história (diferentes formas de representação do espaço político):
RAYAS (ou carreiras) hispano-portuguesas.
A delimitação de faixas de terras (rayas) se faz ainda sob as marcas do direito medieval da Respublica Christiana. “À raya é peculiar o fato de que os dois príncipes cristãos reconhecem a mesma autoridade espiritual (...) e firmam um acordo sobre a aquisição de terras de príncipes e povos com outros credos” (pág. 92).
AMITY LINES (linhas de amizade)
“A peculiaridade destas ‘linhas de amizade’ reside no fato de que, ao contrário das rayas, elas demarcam um espaço de luta entre as partes de um tratado que aspiram à tomada de terra, mas carecem de pressupostos compartilhados e de uma autoridade comum (...). As partes dessa relação só concordam no que diz respeito à liberdade nos novos espaços que começam do outro lado da linha. A liberdade consiste no fato de que a linha demarca uma área para uso livre e irrefreável da violência (...). Isso significa um imenso desafogo da problemática intraeuropeia, e nele reside o sentido famoso e famigerado de ‘beyond the line’ (além da linha).” (págs. 95-96)
“Sobre o pano de fundo das linhas globais foram alcançadas uma racionalização, uma humanização e uma juridificação ou, em uma palavra, uma circunscrição da guerra (...) a uma relação militar entre Estados” (pág. 103).
HEMISFÉRIO OCIDENTAL.
Para levar à fundação de um novo direito (direito público europeu) foi necessária a conquista da América. A grande invenção que tal conquista possibilitou foi a distribuição das parcelas de terra conquistadas em forma de jurisdições.
O nomos da terra se faz pela reorientação da partilha de terra em todo o planeta, que será partilhado em sua reintegralidade global.
As linhas globais, que instituíram um nomos da terra, modificam-se ao longo da história, enquanto delimitações de direito. O sentido político formado por elas se modifica ao longo da história, com isso modificou-se o nomos e o direito internacional.
Há três formas de representar o espaço político: 
A constituição do ”direito dos povos” se estabelece desde o século XVI e se estende até o séc. XX. Passou por três estágios: 
Descobrimento: A América é partilhada em faixas de terras, denominadas “rayas”. Elas organizam as possessões dos territórios de Portugal e Espanha. O que particulariza as rayas é o reconhecimento de uma autoridade comum capaz de arbitrar sobre quais territórios ficam com quem. Tal autoridade é o Papa. São faixas de terras atribuídas pela autoridade religiosa para as autoridades soberanas, que têm o dever de catequizar povos (exercer o Katechon) com o objetivo de expandir o cristianismo. 
As rayas são de hegemonia espanhola e sua inscrição nos antigos termos do velho direito é o que as destaca.
A atribuição de cada raya a certas autoridades se dá por meio de tratados, firmados pelo Papa.
A América é um espaço livre a ser ocupado e, portanto, é um dever dos soberanos de catequizar esse território. Não há, no entanto, rivalidades e lutas entre os príncipes no que tange à colonização da América.
A linha que divide a raya das Índias Espanholas das Portuguesas se encontra sempre violada pelos portugueses. Contudo, na passagem para o séc. XVII, há uma alteração: as rayas são substituídas pelas “linhas de amizade”. Nessa época, surgiu a Reforma Protestante que elencou guerras civis totais, internalizando a guerra de aniquilação do território da cristandade. Isso se deu, pois o Katechon foi restituído após tal reforma. No fim do século XV houve um desbloqueio do cristianismo. A relação entre a fé e a obediência política foi rompida no interior da cristandade.
A Reforma Protestante é o acontecimento mais importante da história ocidental pois ela interrompe a maneira pela qual a civilização se pensava.
As linhas de amizade delimitavam um espaço de direito nas guerras. Dentre essas linhas, vigem territóriosorganizados sobre a violência, que têm carência do próprio direito. Ademais, delimitam território onde não pode haver aniquilamento. As linhas de amizade garantiam que as guerras fossem controladas pelos territórios europeus. Isso foi uma convenção das potências europeias.
Além dessas linhas é possível realizar várias atrocidades, mesmo entre cristãos. Foi no espírito desta violência que a América se formou. 
A pacificação da Europa correspondeu à brutalização da África, Ásia e América. 
Assim, o direito estatal centralizado é produto de um acordo político acerca da tomada de terras na América.

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