Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Colégio Pensar Curso Técnico em Química EQUILÍBRIOS QUÍMICOS Físico-Química 2016/1 Prof. Diego Dias 1. Introdução aos Equilíbrios Químicos Algumas reações químicas cessam quando todos os reagentes são transformados nos produtos. No entanto, existem outros tipos de reações que são reversíveis, ou seja, ao mesmo tempo em que os produtos são formados (reação direta), eles combinam-se e rege- neram os reagentes (reação inversa). Existe um momento em que as taxas de desenvolvimento ou velocidades das reações direta e inversa tornam-se iguais, esse é o estado de equilíbrio químico. Macroscopica- mente parece que a reação acabou, porém, microscopicamente ela está ocorrendo nos dois sentidos. É, portanto, um equilíbrio dinâmico, e não estático. Esse estado de equilíbrio químico é indicado nas equações químicas por meio de uma seta dupla ⇌. Existem, porém, alguns fatores que causam o deslocamento do equilíbrio, tais como a variação da temperatura, da concentração dos reagentes e/ou dos produtos e da pressão. O nosso dia a dia está repleto de exemplos de equilíbrios químicos, como o que existe na camada de ozônio entre a formação e a decomposição do ozônio, no estômago, nos dentes, nas lentes fotossensíveis de óculos, na ingestão de remédios e nas cavernas com a formação das estalactites e estalagmites. 2. Reações Reversíveis e Irreversíveis Quando queimamos um palito de fósforo, a combustão processa-se até que toda a madeira seja consumida, cessando a reação. Esse tipo de reação é denominado de irrever- sível, pois se processa em um único sentido: o de consumo dos reagentes. Considera-se que as mesmas tenham rendimento de 100%. Reagentes ⟶ Produtos Porém, existem várias reações em nosso cotidiano que são reversíveis, ou seja, tanto os reagentes quanto os produtos são consumidos e formados simultaneamente. Vamos con- siderar um exemplo: quando você olha para a garrafa fechada abaixo, você acha que a água dentro dela evapora? Pode ser que cheguemos à conclusão de que a água dentro da garrafa tampada não evapora porque o seu nível permanece inalterado. Entretanto, a água evapora sim. O que Figura 1. Dentro dessa garrafa com água existe um equilíbrio dinâmico. acontece é que nesse sistema existem moléculas de água passando do estado líquido para o de vapor (evaporando), e também moléculas passando do estado de vapor para o líquido (condensando), esses dois processos ocorrem com a mesma velocidade. É por isso que o nível da água na garrafa não sofre alteração. Mas apesar de não vermos, o sistema está em constante movimentação. Reagentes ⇌ Produtos Nestas reações (irreversíveis) há uma velocidade direta, de formação de produtos, a qual vai decrescendo e uma velocidade inversa, de regeneração de reagentes, que vai au- mentando, até o instante em que estas duas velocidades se tornam iguais. Este momento é chamado Equilíbrio, o qual pode ser homogêneo ou heterogêneo, em função da composição do sistema. Alguns exemplos: N2(g) + 3 H2(g) ⇌ 2 NH3(g) (fase gasosa – homogêneo) CH3COOH(aq.) + C2H5OH(aq.) ⇌ CH3COOC2H5(aq.) + H2O(l) (fase aquosa – homogêneo) CaCO3(s) ⇌ CaO(s) + CO2(g) (gases e sólidos – heterogêneo) 6 CO2(g) + 6 H2O(l) ⇌ C6H12O6(s) + 6 O2(g) (sólido, líquido e gases – heterogêneo) No caso da garrafa com água dizemos que temos um equilíbrio dinâmico e que esse processo é reversível. Geralmente, quando pensamos em equilíbrio, nos vem à mente o tipo de equilíbrio estático, como o que ocorre quando colocamos dois pesos iguais em uma ba- lança de pratos. Os pratos com massas iguais ficam “equilibrados” e a balança fica imóvel. Entretanto, o equilíbrio dinâmico é diferente, ele está constantemente em movi- mento. Para ilustrar, pense em um estacionamento em que todas as vagas estão lotadas; porém, existem pessoas chegando e outras saindo com os seus carros. Imediatamente no momento em que uma pessoa desocupa uma vaga, outra toma o seu lugar, e essa situação se repete continuamente durante todo o dia. Visto que as velocidades de pessoas que saem e de pessoas que chegam são iguais, temos um equilíbrio dinâmico. Quando temos um equilíbrio dinâmico ocorrendo com uma reação química, ele é cha- mado de equilíbrio químico. Vamos considerar um exemplo de reação reversível que atinge o equilíbrio químico, a reação de produção da amônia pelo método de Haber-Bosch. Nesse método, com a pressão e a temperatura controladas, reagem-se os gases nitrogênio e oxi- gênio, conforme mostrado pela equação química abaixo: N2(g) + 3 H2(g) ⇌ 2 NH3(g) Se essa reação fosse irreversível, ocorrendo apenas no sentido de formação da amô- nia, 1 mol de N2(g) e 3 mol de H2(g) produziriam 2 mol de NH3(g). Porém, não é isso o que ocorre na realidade, a quantidade de amônia obtida experimentalmente é sempre menor que essa proporção. Isso ocorre porque essa reação é reversível, conforme representado na equação quí- mica mais acima pela seta dupla (⇌). Essa representação indica reações ocorrendo nos dois sentidos (direto e inverso) simultaneamente. A reação direta (⇀) ocorre no sentido de formação dos produtos, para a direita; A reação inversa (↽) ocorre no sentido de formação dos reagentes, para a esquerda. Parte da amônia produzida decompõe-se, isto é, os gases que a formam são regene- rados. Quando a taxa de desenvolvimento (velocidade) de formação da amônia for igual à taxa de desenvolvimento de formação dos gases nitrogênio e hidrogênio, dizemos que a reação está em equilíbrio químico. Portanto, um equilíbrio químico pode ser caracterizado pelos seguintes pontos: 1. As reações direta e inversa ocorrem simultaneamente, portanto, o equilíbrio quí- mico é dinâmico; 2. A velocidade da reação direta é igual à velocidade da reação inversa; 3. Se não houver mudança no sistema em equilíbrio, as concentrações dos reagentes e produtos permanecerão constantes. Todas as propriedades macroscópicas do sistema não variam com o tempo; 4. Esse tipo de equilíbrio é obtido somente em sistemas fechados, isto é, sistemas em que tanto a matéria quanto a energia não são introduzidas ou removidas, não há trocas delas com o exterior. Observação: A característica 3 mostra que as concentrações se mantêm constantes, porém, dificilmente as concentrações dos reagentes serão iguais às dos produtos. Por outro lado, são as velocidades com que elas se formam e se decompõem que se tornam iguais e constantes no equilíbrio químico. Para a reação homogênea: CO(g) + H2O(g) ⇌ CO2(g) + H2(g) As variações de concentração de reagentes, produtos e das velocidades direta e in- versa podem ser assim representadas: Figura 2. Gráficos comparando as velocidades direta e inversa de uma reação. 3. Constantes de Equilíbrio Cato Guldberg (1836-1902) e Peter Waage (1833-1900) foram os criadores da Lei de Ação das Massas que permitiu formular a expressão da constante de equilíbrio. Para en- tender como se chegou a ela, vamos considerar a reação genérica abaixo, em que as letras minúsculas referem-se aos coeficientes da equação química em equilíbrio, e as letras mai- úsculas referem-se às substâncias que participam da reação: aA + bB ⇌ lM + mM Quando uma reação reversível atinge o equilíbrio significa que a taxa de desenvol- vimento ou a velocidade da reação direta é igual à taxa de desenvolvimento ou à velocidade da reação inversa: rdireta = kdireta[A]a[B]b e rinversa = kinversa[L] l[M]m Se no equilíbrio: rdireta = rinversa Então: kdireta[A] a[B]b = kinversa[L] l[M]m Isolando os termos semelhantes: kdireta kinversa = [L]l[M]m [A]a[B]b A relação kd/ki é a constante kc ou constante de equilíbrio em função de concentra- ções molares. kc = [L]l[M]m [A]a[B]b Quando algum dos componentes for gasoso, a constante de equilíbrio pode ser cal- culada em função das pressões parciais exercidas pelas substâncias gasosas, na forma kp ou constante de equilíbrio em função das pressões parciais: k𝑝 = (pL)l(pM)m (pA)a(pB)b Onde: p = pressão parcial do componente gasoso, calculada como: PA = xAP. Como a pressão parcial de um componente depende da sua concentração em fase gasosa, podemos estabelecer a seguinte relação entre kc e kp: kp = kc(RT) ∆n Onde: R = constante geral dos gases; T = temperatura absoluta (K); n = diferença entre os coeficientes dos produtos e reagentes (gasosos): ∆𝑛 = (𝑙 + 𝑚) − (𝑎 + 𝑏); A constante de equilíbrio também pode ser expressa em função das frações molares dos constituintes. Desse modo teremos kx ou constante de equilíbrio em função de frações molares: kx = xL l xM m xA axB b Do mesmo modo que kc e kp, a relação entre kp e kx pode ser estabelecida, resultando em: kp = kxP ∆n Onde: P = pressão do sistema. Nos equilíbrios heterogêneos, a constante de equilíbrio não inclui os componentes sólidos, porque à medida que a massa de um sólido vai se reduzindo e transformando-se num produto o seu volume também reduz, mantendo constante a concentração do mesmo. M = 𝑚1 �̿�𝑉 M′ = 𝑚1 ′ �̿�𝑉′ Mas: m1 V = m1 ′ V′ = constante Portanto: M = M′ Veja agora alguns exemplos de expressões de equilíbrio para algumas reações em equilíbrio e veja como os sólidos não participam: N2(g) + 3 H2(g) ⇌ 2 NH3(g) kc = [NH3] 2 [N2][H2]2 CaCO3(s) ⇌ CaO(s) + CO2(g) kc = [CO2] Zn(s) + 2 HCl(aq.) ⇌ 2 ZnCl2(aq.) + H2(g) kc = [ZnCl2][H2] [HCl]2 Zn(s) + Cu+2(aq.) ⇌ Zn+2(aq.) + Cu(s) kc = [Zn+2] [Cu+2] Tanto kc quanto kp e kx são adimensionais, isto é, não são expressos usando unidades ligadas a alguma grandeza, mas são expressos somente pelos números puros. Além disso, ambos só variam com a variação da temperatura, sendo característicos para cada reação. Aplicação: (Vunesp-SP) Na precipitação de chuva ácida, um dos ácidos responsáveis pela acidez é o sulfúrico. Um equilíbrio envolvido na formação desse ácido na água da chuva está representado pela equação: 2 SO2(g) + O2(g) ⇌ 2 SO3(g) Calcule o valor da constante de equilíbrio kc nas condições em que, reagindo-se 6 mol/L de SO2 com 5 mol/L de O2, obtêm-se 4 mol/L de SO3 quando o sistema atinge o equi- líbrio. Resolução (podemos colocar os dados em uma tabela): 1. Já temos a equação balanceada: 2 SO2(g) + O2(g) ⇌ 2 SO3(g); 2. A proporção estequiométrica é de 2:1:2; 3. Com essa proporção e os dados fornecidos no enunciado, vamos ver a quantidade de reagentes consumida e a quantidade de produto formada: se a proporção é 2 : 1 : 2 e foram formados 4 mol de SO3(g), então, 4 mol de SO2(g) e 2 mol de O2(g) foram usados. Então, temos: Quantidades envolvidas 2 SO2(g) 1 O2(g) 2 SO3(g) Quantidade no início 6 5 0 Quantidade que reagiu e que foi produzida 4 2 4 4. Vamos descobrir a quantidade de cada espécie no equilíbrio: Quantidades envolvidas 2 SO2(g) 1 O2(g) 2 SO3(g) Quantidade no início 6 mol 5 mol zero Quantidade que reagiu e que foi produzida 4 mol 2 mol 4 mol Quantidade presente no equilíbrio 6 – 4 = 2 mol 5 – 2 = 3 mol zero + 4 = 4 mol 5. Visto que esse exercício especificou que as concentrações iniciais eram em mol/L, isso indica que estamos considerando o volume de 1 L. Assim, não precisamos cal- cular as concentrações, pois o volume não fará a diferença: Quantidades envolvidas 2 SO2(g) 1 O2(g) 2 SO3(g) Quantidade no início 6 mol 5 mol zero Quantidade que reagiu e que foi produzida 4 mol 2 mol 4 mol Quantidade presente no equilíbrio 6 – 4 = 2 mol 5 – 2 = 3 mol zero + 4 = 4 mol Concentração no equilíbrio 2 mol/L 3 mol/L 4 mol/L 6. Vamos substituir os valores das concentrações na expressão da constante de equilí- brio: kc = [SO3] 2 [SO2]2[O2] → kc = 42 22 × 3 → kc = 1,333 Isto é, a taxa de formação de SO3(g) é de 1,333. Quanto maior for a constante de equilíbrio, maior será a tendência de a reação se processar no sentido dos produtos. Quanto menor, maior a tendência de os reagentes serem regenerados. 4. Princípio de Le Chatelier Quando uma reação reversível se encontra em um sistema fechado, ela acaba por entrar em equilíbrio químico, ou seja, as taxas de desenvolvimento das reações direta e inversa ocorrem com a mesma velocidade. Se não houver nenhuma alteração no sistema, ele permanecerá indefinidamente assim. O cientista francês Henry Louis Le Chatelier (1850-1936) percebeu isso e passou a estudar esse fenômeno. Ele dedicou-se ao estudo de possíveis maneiras de se conseguir deslocar o equilíbrio químico e descobriu aspectos importantes que são até hoje usados por indústrias, por exemplo, para aumentar a produção de determinados produtos com menor custo. Uma das coisas que ele descobriu foi o que passou a ser chamado de Princípio de Le Chatelier, que pode ser enunciado da seguinte maneira: “Quando se provoca uma perturbação em um sistema em equilíbrio, este se desloca no sentido que tende a anular essa perturbação, procurando se ajustar a um novo equilí- brio.” Os principais fatores que causam esse deslocamento no equilíbrio químico são: con- centração dos reagentes ou produtos participantes da reação, pressão e temperatura. O uso de catalisadores apenas acelera a velocidade das reações, isto é, no caso de reações reversíveis, faz com que elas atinjam o equilíbrio mais rapidamente. Mas os cata- lisadores não interferem no deslocamento do equilíbrio, pois eles atuam igualmente tanto no sentido da reação direta quanto no sentido da reação inversa. 4.1. Variação na Concentração A adição de um componente (reagentes ou produtos) desloca o equilíbrio no sentido do consumo dos mesmos, enquanto que a remoção de um componente desloca o equilíbrio no sentido de sua regeneração. Consideremos um exemplo em que haverá variação na concentração: temos o se- guinte sistema aquoso em que os íons abaixo estão em equilíbrio químico: 2 CrO4–2(aq.) + 2 H3O+(aq.) ⇌ Cr2O7–2(aq.) + 3 H2O(l) Os íons CrO4–2(aq.) conferem a cor amarela ao sistema, enquanto os íons Cr2O7–2(aq.) conferem a cor alaranjada. Assim, imagine que adicionemos algumas gotas de limão a esse sistema. Visto que o limão é ácido, estaríamos aumentando a concentração dos íons H3O+(aq.). Seguindo o prin- cípio de Le Chatelier, o sistema irá, então, deslocar-se no sentido de consumir os íons H3O+, ou seja, no sentido da reação direta (para a direita). Isso provocaria mais produção dos íons Cr2O7–2 e a solução passaria de amarela para o alaranjado. O contrário também é verdadeiro, se adicionarmos alguma solução básica ao meio, os íons OH– dessa solução irão reagir com os íons H3O+ e haveria o aumento da concentra- ção da água no meio. Por isso, o equilíbrio se deslocaria no sentido de consumir a água, ou seja, para a esquerda, no sentidoinverso, e o sistema líquido ficaria amarelo. Outro exemplo é a síntese da amônia: N2(g) + 3 H2(g) ⇌ 2 NH3(g) A constante de equilíbrio será obtida pela expressão: kc = [NH3] 2 [N2][H2]3 Se adicionarmos, por exemplo, N2 ou H2, o denominador da expressão aumenta e a constante de equilíbrio diminui. Para que a constante assuma novamente o valor inicial o equilíbrio desloca-se no sentido do consumo do reagente adicionado, formando mais pro- duto e aumentando o valor de kc. Se adicionarmos NH3 o numerador da expressão aumenta e a constante, também. Para que a constante reduza seu valor a amônia em excesso deverá se decompor (parcial- mente) formando H2 e N2, deslocando o equilíbrio no sentido dos reagentes. Resumindo: 1. Aumento da concentração do reagente → desloca para o sentido direto; 2. Aumento da concentração do produto → desloca para o sentido inverso; 3. Diminuição da concentração do reagente → desloca para o sentido inverso; 4. Diminuição da concentração do produto → desloca para o sentido direto. Figura 3. Exemplo de deslocamento de equilíbrio segundo o Princípio de Le Chatelier. 4.2. Variação na Pressão O aumento da pressão desloca o equilíbrio (gasoso) no sentido do menor volume, ou seja, do menor número de mol. A redução da pressão desloca o equilíbrio no sentido do maior volume, ou seja, do maior número de mols. Na formação da amônia, a partir do N2 e H2 ocorre uma diminuição no número de mol gasosos (contração de volume): Se aumentarmos a pressão o equilíbrio será deslocado no sentido da formação da amônia (menor número de mols e menor volume). Resumindo: 1. Maior número de mol do gás à direita (maior volume): a. aumento da pressão → desloca para o sentido inverso; b. diminuição da pressão → desloca para o sentido direto; 2. Maior número de mol do gás à esquerda (maior volume): a. aumento da pressão → desloca para o sentido direto; b. diminuição da pressão → desloca para o sentido inverso. 4.3. Variação na Temperatura O aumento da temperatura, numa reação em equilíbrio, desloca o mesmo no sentido endotérmico. A redução da temperatura (resfriamento), desloca o equilíbrio no sentido exo- térmico do mesmo. N2(g) + 3 H2(g) ⇌ 2 NH3(g) H < 0 Para obter um maior rendimento na produção de amônia devemos resfriar o sistema, o que provoca um deslocamento do equilíbrio no sentido direto da reação. Resumindo: 1. Reação direta endotérmica: a. aumento da temperatura → desloca para o sentido direto; b. diminuição da temperatura → desloca para o sentido inverso; Figura 4. Relação entre a formação da amônia e diminuição do volume gasoso. libera calor absorve calor 2. Reação direta exotérmica: a. aumento da temperatura → desloca para o sentido inverso; b. diminuição da temperatura → desloca para o sentido direto. 5. Equilíbrio Iônico Neste caso, além de espécies moleculares encontramos espécies iônicas entre os com- ponentes. É o caso particular dos equilíbrios de dissociação de ácidos e bases fracas e da água. 5.1. Dissociação de Ácidos Fracos Num ácido fraco a dissociação é muito reduzida o que significa uma pequena quan- tidade de íons presentes e uma grande quantidade de moléculas não dissociadas. Nesse caso, a constante de equilíbrio será a constante de acidez (ka). Por exemplo: HCN ⇌ H+ + CN– ka = [H+][CN−] [HCN] = 4,0 × 10−10 A solução apresenta pequena quantidade de íons “disponíveis” sendo, portanto, “pouco ácida” quando comparada com outra de igual concentração de um ácido muito dis- sociado (p. ex. HCl). HCl ⇌ H+ + Cl– ka ≅ 10 7 5.2. Dissociação de Bases Fracas Com as bases sucede-se o mesmo que em relação aos ácidos fracos, resultando na constante de basicidade (kb): Figura 5. Predominância de moléculas não dissociadas. Figura 6. Predominância de íons dissociados. NH4OH ⇌ NH4+ + OH– kb = [NH4 +][OH−] [NH4OH] = 4,2 × 10−4 Observação: quanto menor o valor de ka ou kb mais fraco o ácido ou a base será. 5.3. Produto Iônico da Água (kw) A água dissocia-se fracamente, segundo o equilíbrio: 2 H2O(l) ⇌ H3O+(aq.) + OH–(aq.) Medidas de condutividade elétrica permitem estabelecer o valor desta constante, kc (água), nas CNTP: kc = [H3𝑂 +][OH−] [H2O]2 → kc = 3,23 × 10 −18 Como a dissociação é muito pequena, pode-se admitir que a concentração molar da água é constante e vale 55,55 mol/L. Relembrando (para V = 1,0 L e m = 1000 g): Mágua = m M̅ × V → Mágua = 1000 g 18 g mol × 1,0 L → Mágua = 55,55 mol L Então, rearranjando a equação de equilíbrio da água, a sua constante de acidez será: ka = kc × [H2O] = [H3O +][OH−] [H2O] = 1,81 × 10−16 Para reações em água (ou soluções aquosas diluídas), a molaridade da água é prati- camente constante e é omitida da expressão da constante de acidez por convenção. A cons- tante de equilíbrio resultante é chamada de constante de ionização, constante de dissocia- ção, ou constante de autoionização, ou ainda produto iônico da água, simbolizado por kw. kw = ka[H2O] = kc[H2O] 2 = [H3O +][OH−] Nas CNTP (25 °C e 1 atm): kw = 1,0 × 10 −14 E sabendo que [H+] = [OH–], podendo assumir então como sendo [íons]2, temos que: kw = [íons] 2 → 10−14 = [íons]2 → √10−14 = [íons] → [íons] = 10−7 mol L Então a concentração de íons H+ e OH– é igual a 10–7 mol/L, na água pura. Para soluções ácidas: [𝐻+] > [𝑂𝐻−] E para soluções básicas: [𝐻+] < [𝑂𝐻−] É importante destacar que o produto desses dois íons sempre será constante e igual a 10–14. Por exemplo: [H+] = 10–5 e [OH–] = 10–9, portanto: [H+][OH–] = 10–14 [H+] = 10–11 e [OH–] = 10–3, portanto: [H+][OH–] = 10–14 5.4. Relação entre ka, kb e kw Para um ácido de forma geral HA, temos: HA(aq.) + H2O(l) ⇌ H3O+(aq.) + A–(aq.) ka = [H3O +][A−] [HA] Para a sua base conjugada, A–: A–(aq.) + H2O(l) ⇌ HA(aq.) + OH–(aq.) kb = [HA][OH−] [A−] Então teremos: ka × kb = [H3O +][A−] [HA] × [HA][OH−] [A−] Simplificando: ka × kb = [H3O +][OH−] E sabendo que [H3O+][OH–] = kw, portanto teremos: kw = ka × kb 6. Conceitos de pH e pOH Segundo a teoria da dissociação iônica de Arrhenius, uma substância é considerada ácida se, em meio aquoso, ela liberar como único cátion o H+ (ou H3O+). Quanto maior a quantidade desses íons no meio, maior será a acidez da solução. Em 1909, o químico dinamarquês Søren Peter Lauritz Sørensen (1868-1939) propôs o uso de uma escala logarítmica para evitar o uso de expressões matemáticas com expoen- tes negativos, propôs um artificio matemático, introduzindo os conceitos de pH e pOH para trabalhar com as concentrações dos íons hidrônio (H3O+) e íons hidroxila (OH–) nas solu- ções. O pH é o chamado potencial hidrogeniônico, dado por: pH = − log10[H +] ou pH = − log10[H3O +] E o pOH, potencial hidroxiliônico: pOH = − log10[OH −] Estes conceitos permitem expressar a acidez ou alcalinidade de soluções diluídas (entre os limites de 1,0 mol/L para os íons H+ ou OH–). Assim, por exemplo, se a concentração de íons hidrônio numa solução for igual a 10– 3 mol/L, seu pH será 3 e seu pOH será 11 (pois a concentração de íons hidroxila será igual a a 10–11 mol/L). As escalas de pH e pOH variam entre 0 e 14 na temperatura de 25 ºC. Se: pH < 7 → a solução será ácida; pH > 7 → a solução será alcalina oubásica. pH = 7 → a solução será neutra; Sendo uma escala logarítmica, significa que, por exemplo, se temos duas soluções a 25ºC com volumes iguais, sendo que a primeira tem pH igual a 4 e a segunda tem pH igual a 3, então a segunda solução possui 10 vezes mais íons H+ que a primeira. Esses valores podem ser medidos de forma precisa por meio de um aparelho cha- mado pHmetro, como o mostrado abaixo. 6.1. Indicadores Ácido-Base Os indicadores ácido-base são substâncias naturais ou sintéticas que possuem a ca- pacidade de mudar de cor de acordo com o pH do meio. Isso significa que quando esses indicadores de pH são colocados em contato com uma solução ácida, eles adquirem deter- minada cor, mas quando são colocados em meio básico, apresentam outra coloração. Os indicadores ácido-base normalmente são constituídos de um ácido fraco ou uma base fraca que entra em equilíbrio com a sua base ou ácido conjugado, respectivamente. O ácido fraco possui uma cor, enquanto sua base conjugada possui outra, conforme mostrado a seguir. O mesmo ocorre com a base fraca e seu ácido conjugado, ou seja, cada um possui uma cor. indicador ácido + H2O ⇌ H3O+ + base conjugada (cor A) (cor B) indicador básico + H2O ⇌ OH– + ácido conjugado (cor C) (cor D) Assim, quando o indicador ácido-base entra em contato com uma solução ácida ou básica, ocorre um deslocamento do equilíbrio, conforme explica o Princípio de Le Chatelier. Se o indicador de pH for composto de um ácido fraco em equilíbrio com sua base conjugada e entrar em contato com uma solução ácida, aumentará a quantidade dos íons H3O+ no meio. Essa quantidade de íons é diminuída através de uma reação com a base conjugada, Figura 7. Escala de pH com exemplos de soluções com pH próximo ao indicado. Figura 8. pHmetro usado para medir o pH de soluções. deslocando o sentido do equilíbrio para a esquerda para formar o ácido fraco, ficando com a cor A. Por outro lado, se o indicador entrar em contato com um meio básico, os íons OH– da solução básica reagirão com os íons H3O+ do indicador, diminuindo a concentração deles no meio. Assim, a fim de produzir mais íons H3O+, o equilíbrio químico deslocar-se-á para a direita, no sentido de formação desses íons, mudando para a cor B. Vejamos agora alguns exemplos de indicadores ácido-base: Fenolftaleína: ela adquire coloração avermelhada ou rosa bem intensa em meios bá- sicos, porém fica incolor em meios ácidos; Papel de tornassol: fica azul em meio básico e vermelho em meio ácido; Indicador universal: é constituído por uma tira de papel com uma mistura de alguns indicadores comuns secos que apresentam coloração diferente para cada valor de pH. Assim, basta mergulhar a fita do indicador universal na solução desejada e compa- rar as cores adquiridas com a escala-padrão que aparece na embalagem do indicador. A escolha de um indicador depende da faixa de pH em que ele muda de cor. Por exemplo, a faixa de viragem da fenolftaleína é entre 8,2 e 10,0, então ela é indicada para reações em que o ponto de viragem ocorre em pH básico, mas não em que o ponto de vira- gem ocorre em pH ácido. Veja alguns exemplos na tabela a seguir: Tabela 1. Tabela de indicadores de pH e intervalo de mudança de cor. Indicador Cor em pH abaixo da viragem Intervalo aproximado de pH de mudança de cor Cor em pH acima da vira- gem Violeta de metila amarelo 0,0 – 1,6 azul-púrpura Azul de bromofenol amarelo 3,0 – 4,6 violeta Alaranjado de metila vermelho 3,1 – 4,4 amarelo Azul de bromotimol amarelo 6,0 – 7,6 azul Vermelho de metila vermelho 4,4 – 6,2 amarelo Vermelho de fenol amarelo 6,6 – 8,0 vermelho Fenolftaleína incolor 8,2 – 10,0 rosa-carmim Figura 9. Dois tipos de indicador universal. Timolftaleína incolor 9,4 – 10,6 azul Amarelo de alizarina R amarelo 10,1 – 12,0 vermelho Carmim de índigo azul 11,4 – 13,0 amarelo 6.1.1. Indicadores Ácido-Base Naturais Conforme explicado anteriormente, essas substâncias são capazes de mudar de cor na presença de ácidos e bases, indicando a possível faixa de pH do meio. Em laboratório, normalmente são usados indicadores sintéticos, como a fenolftaleína, azul de bromotimol, alaranjado de metila, papel de tornassol e o indicador universal. Porém, existem algumas substâncias presentes nos vegetais e até em insetos que atuam como indicadores ácido-base naturais. a) Antocianina Essa substância é um pigmento da classe dos flavonoides que é responsável pelas cores azul, violeta, vermelho e rosa de muitos vegetais. Alguns exemplos são repolho roxo, beterraba, uvas, jabuticabas, amoras, folhas vermelhas e flores de pétalas coloridas, como as flores de azaleia e quaresmeira. Para obter um indicador natural, basta realizar a maceração (empapar ou esmagar esses vegetais em água para extrair os produtos solúveis) e depois filtrar. Um exemplo disso pode ser mostrado no experimento indicador ácido-base com repolho roxo, no qual se usa um "suco de repolho roxo" para verificar se determinados produtos usados no cotidiano são ácidos ou básicos. Em água (pH neutro = 7), o indicador de repolho roxo tem coloração roxa, mas con- forme a imagem a seguir mostra, ele muda de vermelho em solução ácida (pH < 7) para púrpura e depois verde em solução básica (pH > 7). No caso de a solução ser fortemente básica, ele torna-se amarelo. b) Esculina Essa substância está presente no tronco e nas folhas da nogueira. No entanto, para ser usada como indicador, é necessário aplicar uma luz ultravioleta sobre ela. A esculina adquire a cor azul fluorescente em pH 2 e fica incolor em pH 1,5. Note que o intervalo de pH em que ocorre a sua mudança de cor é bastante pequeno, por isso não é um indicador muito eficiente. Figura 10. Soluções com extrato de repolho roxo funcionando como indicador de pH. c) Curcumina Está presente nas raízes da cúrcuma longa, que pertence à família do gengibre. Ela adquire cor amarela em pH 7,4 e vermelha em pH 8,6. 7. Reações de Hidrólise Quando um sal é dissolvido em água, verifica-se que a solução resultante pode ser neutra, ácida ou básica, devido à possibilidade de reação de hidrólise do sal. Hidrólise é a reação inversa à neutralização, ocorrendo com sais derivados de ácidos ou bases fracas. Na realidade a hidrólise ocorre com o íon derivado do ácido ou da base fraca, ocor- rendo a liberação de íons H+ ou OH–. Hidrólise significa quebra de uma molécula pela água. A hidrólise salina pode ser definida como a reação entre moléculas de água e um sal, resultando em um ácido ou uma base fraca. Os íons provenientes de um sal, dissociados em solução aquosa, reagem com a água tornando a solução ácida, básica ou neutra. 7.1. Hidrólise de um Sal de Ácido Fraco com Base Forte Os ânions irão reagir com os íons H+ presentes na água e, em consequência dessa reação, a concentração de H+ diminui e de OH− aumenta, tornando a solução básica. CH3COONa + H2O ⇌ CH3COOH + NaOH CH3COO− + H2O ⇌ CH3COOH + OH− O ânion do acetato de sódio (CH3COONa), ao reagir com os íons H+ presentes na água, origina o ácido fraco, ácido acético (CH3COOH). Isso libera íons OH–, aumentando o pH. 7.2. Hidrólise de um Sal de Ácido Forte com Base Fraca Cátions provenientes da base fraca reagem com os íonsOH− liberados com a quebra da molécula de água. Como consequência, a concentração de OH− diminui e a concentração de H+ aumenta fazendo com que a solução fique ácida. Figura 11. A curcumina é um indicador de pH natural. sal de ácido fraco ácido fraco base forte NH4Cl + H2O ⇌ NH4OH + HCl NH4+ + H2O ⇌ NH4OH + H+ O cátion do cloreto de amônio (NH4Cl) reage com os íons OH− e formam a base fraca NH4OH. 7.3. Hidrólise de um Sal de Ácido Fraco com Base Fraca O cátion e o ânion reagem com os íons presentes na água. O meio pode ficar ácido, básico ou neutro, dependendo da força do ácido e base formados. NH4CN + H2O ⇌ NH4OH + HCN NH4+ + CN– + H2O ⇌ NH4OH + HCN Tanto o ânion quanto o cátion proveniente do cianeto de amônio (NH4CN) sofrem hidrólise. O meio será ligeiramente ácido ou básico dependendo da constante de ionização (ka e kb) de cada um. Para o exemplo acima, ka = 4,9 × 10−10 e kb = 1,8 × 10−5, ou seja, a solução é ligeiramente básica pois kb > ka. 8. Produto de Solubilidade (kps) Ao adicionarmos uma determinada substância sólida a uma solução, poderemos ob- servar que ela se dissolve até certo ponto. Se continuarmos adicionando mais desta subs- tância, iremos perceber que, a partir de tal ponto, ela não mais se dissolve, ficando então no fundo do recipiente que contém a solução. Forma-se, então, uma solução saturada com corpo de fundo. Considerando o exemplo do cloreto de prata (AgCl), que se dissocia segundo a equa- ção: AgCl(s) ⇌ Ag+(aq.) + Cl–(aq.) Essa equação também representa a velocidade do processo de dissolução, que é igual à velocidade do processo de precipitação, representado pela equação a seguir: Ag+(aq.) + Cl–(aq.) ⇌ AgCl(s) AgCl(s) forma o corpo de fundo e Ag+ e Cl− compõe a solução saturada. O produto de solubilidade é a constante de equilíbrio correspondente ao equilíbrio de dissolução de substâncias iônicas e é representado por kps. Para o exemplo anterior, a expressão do produto de solubilidade será: kps = [Ag +][Cl−] Pois: kc = [Ag+][Cl−] [AgCl] sal de ácido forte base fraca ácido forte sal de ácido fraco base fraca ácido fraco Como [AgCl] é constante e não entra no cálculo do kps, logo, para a substância hipo- tética BxAy, seguem as seguintes equação de dissociação e expressão do kps: BxAy(s) ⇌ xB+y(aq.) + yA–x(aq.) kps = [B +y]x[A−x]y Quanto maior for o valor de kps mais solúvel será a substância e quanto mais baixos os valores da constante de solubilidade menos solúvel ela será. A constante de solubilidade só irá depender da temperatura, o aumento da temperatura acarretará um aumento na solubilidade da substância. A tabela seguinte mostra o valor de Kps para algumas substâncias, à temperatura ambiente: Tabela 2. Alguns valores de kps a 25 °C. Substância kps AgCl 1,2 × 10–10 CaSO4 2,3 × 10–4 CaCO3 1,7 × 10–8 Fe(OH)3 1,1 × 10–36 8.1. Comparando Produto Iônico e kps O produto iônico é o produto das concentrações dos íons presentes numa solução, elevadas a expoentes numericamente iguais aos coeficientes estequiométricos da equação de dissolução. Logo: Se o produto iônico > kps, a solução estará supersaturada, logo a substância precipi- tará; Se o produto iônico = kps, a solução estará saturada, isto é, estará em equilíbrio; Se o produto iônico < kps, a solução formada será insaturada, e não haverá formação de precipitado. 9. Deslocamento do Equilíbrio Iônico (Efeito do Íon Comum) Do mesmo modo como foi visto no equilíbrio químico molecular, o iônico também pode ser deslocado, sendo que a forma mais frequente de deslocamento é pela adição de uma espécie iônica comum (e, às vezes, não-comum) ao equilíbrio, correspondendo à adição ou retirada de um componente, na comparação com o deslocamento do equilíbrio químico. Assim, considerando a dissociação de um ácido fraco, como o HCN: HCN ⇌ H+ + CN– Se adicionarmos um ácido qualquer a essa solução, a adição de íons H+ irá deslocar o equilíbrio no sentido de consumi-lo, diminuindo a dissociação do HCN. Se adicionarmos NaCN, o íon Na+ não irá exercer efeito significativo ao sistema, mas o íon CN–, por ser comum ao equilíbrio também irá desloca-lo no sentido de diminuir a dissociação do HCN. Nesse caso, como consequência, também irá diminuir a acidez da so- lução em virtude do consumo dos íons H+. HCN ⇁ ⃐ H+ + CN– Também merece ser analisado o deslocamento provocado pela adição de um íon não- comum ao equilíbrio, mas que possa provocar algum tipo de reação com íons presentes no mesmo. Considerando, por exemplo, a dissociação da base fraca NH4OH. NH4OH ⇌ NH4+ + OH– Se adicionarmos íons comuns ao equilíbrio (NH4+ ou OH–) o mesmo irá se deslocar no sentido de reduzir a dissociação da base fraca. No entanto se adicionarmos ao sistema um ácido qualquer, ou seja, íons H+, estes irão consumir os íons OH–, pela formação de H2O, deslocando o equilíbrio no sentido de regenerá-los, aumentando a dissociação do NH4OH e, consequentemente, a concentração de íons NH4+ na solução, representado con- forme abaixo: NH4OH ↽ NH4+ + OH– 10. Soluções Tampão As soluções tampão são soluções que resistem a mudanças de pH quando a elas são adicionados ácidos ou bases ou quando uma diluição ocorre. Essa resistência é resultado do equilíbrio entre as espécies participantes do tampão. Um tampão é constituído de uma mistura de um ácido fraco e sua base conjugada ou de uma base fraca e seu ácido conju- gado. Exemplos de soluções tampão: Ácido acético + acetato de sódio Ácido bórico + borato de sódio Ácido cítrico + citrato de sódio Ácido fosfórico + fosfato de sódio Amônia + cloreto de amônio Os tampões têm um papel importante em processos químicos e bioquímicos, nos quais é essencial a manutenção do pH. Assim, muitos processos industriais e fisiológicos requerem um pH fixo para que determinada função seja desempenhada. Por exemplo, o sistema tampão HCO3–/H2CO3 é importante fisiologicamente, uma vez que controla o transporte de CO2 no sangue e o pH do mesmo. 10.1. Ação dos Tampões O produto iônico é o produto das concentrações dos íons presentes numa solução, elevadas Os tampões têm a propriedade de resistir a mudanças no pH. Isto ocorre porque essas soluções contêm um componente ácido e um básico em sua constituição. Para que possamos entender o mecanismo de ação dessas soluções, vamos considerar o sistema tam- pão ácido acético e acetato de sódio. Desde que o sal (acetato de sódio) é um eletrólito forte, em solução aquosa estará completamente dissociado: CH3COONa(s) 𝐻2𝑂 → CH3COO–(aq.) + Na+(aq.) O ácido acético estará em equilíbrio com seus íons: CH3COOH(aq.) ⇌ CH3COO–(aq.) + H+(aq.) A constante de ionização para o ácido acético é dada por: ka = [H+][CH3COO −] [CH3COOH] É importante ressaltar que, na solução tampão, a principal contribuição para a con- centração de íons acetato, a base conjugada do ácido acético, é proveniente do sal. Portanto, a ionização do ácido acético é negligenciável frente ao excesso de sal (efeito do íon comum), assim como é negligenciável a hidrólise do íon acetato frente ao excesso de ácido acético. Por isso, é possível reescrever a expressão da constante de equilíbrio para o ácido acético, substituindo-se o termo [CH3COO–] (que representa a base conjugada do ácido) por [sal]: ka = [H+][sal] [CH3COOH] Assim, é possível verificar o que acontece com uma solução tampão, composta porácido acético e acetato de sódio, quando a ela for adicionado um ácido ou uma base fortes. 10.1.1. Adição de Ácido Se um ácido for adicionado a um tampão, ocorrerá uma elevação da concentração dos íons H+ no meio (uma perturbação ao equilíbrio); de acordo com o princípio de Le Cha- telier, essa perturbação será neutralizada pela base conjugada do tampão, restabelecendo o estado de equilíbrio, e o pH da solução irá variar pouco, conforme a reação abaixo: CH3COO–(aq.) + H+(aq.) ⇌ CH3COOH(aq.) 10.1.2. Adição de Base Se uma base for adicionada a um tampão, ocorrerá uma elevação da concentração dos íons OH– no meio (uma perturbação ao equilíbrio); de acordo com o princípio de Le Chatelier, essa perturbação será neutralizada pelo ácido acético do tampão, restabelecendo o estado de equilíbrio, e o pH da solução irá variar pouco, conforme a reação abaixo: CH3COOH(aq.) + OH–(aq.) ⇌ CH3COO–(aq.) + H2O(l) É importante lembrar que existe um limite para as quantidades de ácido ou de base adicionadas a uma solução tampão antes que um dos componentes seja totalmente consu- mido. Esse limite é conhecido como a capacidade tamponante de uma solução tampão e é definido como a quantidade de matéria de um ácido ou base fortes necessária para que 1 litro da solução tampão sofra uma variação de uma unidade no pH. componente básico do tampão componente ácido do tampão 10.2. Equação de Henderson-Hasselbalch Os sistemas tampão são escolhidos de acordo com a faixa de pH que se deseja tam- ponar, utilizando-se a equação de Henderson-Hasselbalch. Com o propósito da derivação dessa equação, algumas considerações serão feitas a seguir. De acordo com a teoria de ácidos e bases de Brønsted-Lowry, um ácido (HA) é uma espécie química doadora de prótons (H+) e uma base (B) é uma espécie química aceptora de prótons. Após o ácido (HA) perder seu próton, diz-se existir como base conjugada (A–). Da mesma maneira, uma base protonada é dita existir como ácido conjugado (BH+). Segundo a teoria de pares conjugados ácido-base de Brønsted-Lowry, o íon acetato é a base conjugada do ácido acético. Para a reação de dissociação do ácido acético em meio aquoso descrita anteriormente, pode-se escrever a seguinte constante de equilíbrio: ka = [H+][CH3COO −] [CH3COOH] Rearranjando essa expressão, tem-se: [H+] = ka[CH3COO −] [CH3COOH] Aplicando-se –log10 em ambos os lados da expressão acima e como por definição pka = –log10ka e pH = –log10[H+], tem-se: pH = pka + log10 [CH3COO −] [CH3COOH] Ou: pH = pka + log10 [base conjugada] [ácido] Ou, ainda: pH = pka + log10 [sal] [ácido] Esta é a equação de Henderson-Hasselbalch, apenas uma forma rearranjada da ex- pressão da constante de equilíbrio ka, porém extremamente útil no preparo de tampões, pois além de permitir encontrar a proporção exata dos constituintes para a obtenção do pH desejado, possibilita estimar variações no pH dos tampões, quando da adição de H+ ou de OH–. Também permite o cálculo rápido do pH do tampão, quando a proporção dos compo- nentes é conhecida. 11. Ácidos e Bases de Brønsted-Lowry e Lewis A definição de ácidos e bases, em função dos íons H+ e OH– em água, proposta por Arrhenius, é muito restrita, porque limita a discussão do fenômeno ácido-base somente a soluções aquosas. Além do conceito de S. Arrhenius sobre ácidos e bases, em 1923, os físico-químicos J. Brønsted (Dinamarca) e H. Lowry (Inglaterra), independentemente, propuserem uma teoria mais ampla relativa aos conceitos de ácidos e bases, aplicável a qualquer solvente (não apenas água) e alguns íons. Outra abordagem foi proposta, em 1917, pelo americano G. Lewis. 11.1. Teoria Protônica (Brønsted-Lowry) Segundo essa teoria os ácidos são quaisquer espécies químicas que liberam ou doam prótons (H+), enquanto que as bases são quaisquer espécies químicas que recebem prótons (H+). Tais conceitos evidenciam-se em sistemas iônicos em equilíbrio, sendo assim, nos equilíbrios abaixo: HCl + H2O ⇌ H3O+ + Cl– HCN + H2O ⇌ H3O+ + CN– NH3 + H2O ⇌ NH4+ + OH – O conceito de Brønsted-Lowry é mais geral do que o conceito de Arrhenius, porque não se restringe a soluções aquosas, sendo que podemos encontrar reações ácido-base que ocorrem até mesmo sem a presença de um solvente. Observações: As espécies que diferem entre si de apenas um próton (H+) são chamadas de conju- gados ou pares conjugados (HCl e Cl–, H2O e H3O+, etc.); Substâncias que, em função da reação que participam, podem comportar-se tanto como ácidos ou bases (é o caso da água no primeiro e segundo exemplos) são deno- minadas anfipróticas. Nos conjugados, se o ácido é forte a base conjugada é fraca e se o ácido é fraco a base conjugada é forte. 11.2. Teoria Eletrônica (Lewis) Segundo essa teoria, a atenção principal é focalizada na base, sendo definida como uma substância que pode doar um par de elétrons para formar a ligação covalente e o ácido como a substância que pode aceitar um par de elétrons para formar a ligação. Neste sentido moléculas que “doam” elétrons através de ligações coordenadas ou dativas serão consideradas bases segundo a teoria de Lewis. Destacam-se a amônia (NH3), as aminas (RNH2), as amidas (RCONH2) e as espécies aniônicas (Cl–, Br–, I–, OH–, etc.). Como ácidos, destacam-se as espécies catiônicas (H+, Na+, Ca2+, etc.) e moléculas deficitá- rias de elétrons, isto é, que não completam o octeto (BF3, AlCl3, etc.). Exemplo: BF3 + :NH3 → BF3 :NH3 ácido base base conjugada ácido conjugado base conjugada ácido base ácido conjugado base conjugada base ácido ácido conjugado base ácido 12. Bibliografia 1. BRADY, J. E & HUMISTON, G. E. Química Geral. LTC Editora.1996. São Paulo. 2. MAHAN, B & MYERS, R. J. Química – Um Curso Universitário. Editora Edgard Blücher. 3 ed. 1995. São Paulo. 3. ANDRADE, M. A. G. Físico-Química. s ed. mimio. PUCRS. 2001. 4. ATKINS, P.; JONES, L.: Princípios de Química: Questionando a vida moderna e o meio ambiente. 2° edição. Porto Alegre: Bookman, 2001. 5. DIAS, M.V.; GUIMARÃES, P.I.C. e MERÇON, F. Corantes naturais: Extração e em- prego como indicadores de pH. Química Nova na Escola, n.17, p.27-31, 2003. 6. FIORUCCI, A.R.; SOARES, M.H.F.B. e CAVALHEIRO, E.T.G. O conceito de solu- ção tampão. Química Nova na Escola, n. 13, p. 18-21, 2001. 7. SKOOG, D.A.; WEST, D.M. e HOL-LER, F.J. Fundamentals of analytical chemis- try. 7a ed. Nova Iorque: Saunders College, 2001. p. 205-209. 8. TERCI, D.B.L. e ROSSI, D.V. Indicadores naturais de pH: usar papel ou solução? Química Nova, v. 25, p. 684-688, 2002.
Compartilhar