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Cidade dos meninos Ogenis Magno Brilhante

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VI - 060
20o Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental 3915
20o CONGRESSO BRASILEIRO DE ENGENHARIA SANITÁRIA E AMBIENTAL
A EXPOSIÇÃO AMBIENTAL AO HCH NA CIDADE DOS MENINOS
E PILAR - DUQUE DE CAXIAS
Ogenis Magno Brilhante(1)
Prof. Doutor ENSP/DSSA/FIOCRUZ.
Robson de Souza Franco
Engenheiro Químico. Mestre em Ciência - COPPE/UFRJ (1995).
Estudante de doutorado do DSSA/ENSP/FIOCRUZ
Endereço(1): Departamento de Saneamento e Saúde Ambiental /ENSP -
FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ. - Rua Leopoldo Bulhões, 1481 -
Manguinhos - Rio de Janeiro - RJ - CEP: 21041-000 - Brasil - Tel:
(021) 590-3789 - ramal 2073 - Fax: (021) 280-8194 - e-mail:
ogenis@ensp.fiocruz.br
RESUMO
Uma fábrica para a produção do pesticida hexaclorociclohexano (HCH) grau técnico
(mistura dos isômeros α, β, γ e δ), pertencente ao antigo Instituto de Malariologia, então
Ministério da Educação e Cultura, localizada na Cidade dos Meninos, Duque de Caxias,
RJ, Brasil, foi desativada em 1955. Parte da sua produção e de seus rejeitos, em muitas
toneladas desta mistura, foram abandonadas no local. O produto foi usado na época para
matar baratas, piolhos e na luta contra o mosquito responsável pela transmissão da
malária.
Um estudo de avaliação da saúde ambiental, atualmente sendo executado na área
contaminada e no seu entorno, objetiva determinar os níveis de perigo que o sítio oferece,
as vias de exposição e estimar a população receptora.
Este artigo mostra os resultados obtidos através de questionários, sobre as preocupações
de saúde e hábitos alimentares das populações dos bairros Cidade dos Meninos e Pilar.
PALAVRAS-CHAVE: Saúde, Avaliação, Risco, Pesticidas.
INTRODUÇÃO
Na área da Cidade dos Meninos, em Duque de Caxias, foi construída em 1950 uma
fábrica para sintetizar o pesticida hexaclorociclohexano (HCH) para o uso em campanhas
contra os vetores causadores da Doença de Chagas e Malária. A fábrica funcionou
durante cinco anos.
Em 1955, a fábrica de HCH foi desativada sob a argumentação de que era antieconômico
mantê-la. O processo de desativação não foi controlado e todo o acervo da fábrica foi
abandonado no local, inclusive estoques de HCH de grau técnico, além dos rejeitos de sua
produção.
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Durante mais de trinta a comunidade do bairro conviveu na região, numa situação de
grande relação com os resíduos do HCH. Vários moradores comercializavam o “pó de
broca” nas feiras livres do município de D. de Caxias, utilizavam como controle de
insetos em suas casas, em animais e vegetais, aterraram a estrada de acesso com os
resíduos, o gado pastava no terreno da fábrica e seus filhos brincavam no terreno da
antiga fábrica indiferentes ao perigo de contaminação.
A fábrica de pesticida na Cidade dos Meninos, tornou, a ser lembrada em 1989, após uma
denúncia sobre o comércio dos resíduos do pesticida em uma feira livre no município de
Duque de Caxias e então as preocupações recaíram sobre os efeitos da contaminação ao
meio ambiente e à saúde das pessoas. O Centro de Estudos da Saúde do Trabalhador e
Ecologia Humana (CESTEH), unidade da Fundação Oswaldo Cruz, ao realizar um exame
clínico e toxicológico na população vizinha a antiga fábrica (43 adultos e 4 crianças),
encontrou concentrações de HCH 63 vezes maiores que as observadas no grupo de
controle (indivíduos não expostos). Oliveira (1994), encontrou no solo variações entre
concentrações inferiores a 100 ppb à milhares de ppb, nas águas freáticas, verificou que
os isômeros do HCH se apresentam em níveis também elevados e no pasto observou uma
extensiva contaminação visto que encontrou-se isômeros do HCH na ordem de milhares
de ppb. Braga (1996), encontrou em análise do sangue de 180 crianças e adolescentes,
aproximadamente 25% das amostras acusavam a presença do isômero beta HCH em
concentrações mais elevadas que a encontrada no grupo de controle (0,5 ppb).
Sabe-se que o pesticida ainda persiste na região, e de acordo com Sexton (1992), o
contato entre as pessoas e os contaminantes, levam a uma exposição e requer a ocorrência
de dois eventos: a presença de um poluente no meio ambiente (ex. água, ar solo e
alimento) e o contato entre as pessoas e o meio. Harvey (1994), reporta que a avaliação da
exposição inclui a identificação de indivíduos ou a população que pode estar exposta a
um dado contaminante, as rotas de exposição e a estimativa de duração, bem como as
concentrações de contaminantes envolvidas na exposição. A Exposição pode ser avaliada
por diversas técnicas: (1) Modelagem matemática da relação fonte-emissor que já é
baseada no dado de emissão., conhecimento das características de transportes
(meteorologia, hidrogeologia), e demografia, (2) Medida direta do poluente no meio
como o ar, água e alimento, também inclui a estimativa da população no meio, e (3)
monitoramento pessoal, em que o receptor é diretamente assistido.(Sexton,1992).
O presente trabalho tem por objetivo discutir os resultados dos questionários aplicados na
Cidade dos Meninos e Pilar, quanto as preocupações da comunidade com a sua saúde e
identificar os possíveis pontos de exposição.
Descrição da área de estudo
O estudo foi limitado aos Bairros da Cidade dos Meninos e Pilar. O bairro da Cidade dos
Meninos, apresenta característica rural em toda a sua extensão e baixa densidade
demográfica. De acordo com os dados censitários (IBGE, 1991), o bairro possui 1505
pessoas e aproximadamente 314 residências fixas, relativamente distantes umas das
outras, Atividades comerciais praticamente não existem no bairro e quanto ao uso do
solo, observa-se grande parte da área é destinada a pasto e a plantações de subsistência.
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Há ainda algumas residências em estilo veraneio e devido as características do bairro, é
comum a presença de pessoas fazendo caminhadas, andando de bicicleta, crianças
andando a pé e descalças e o gado pastando no local.
O bairro Pilar é vizinho a Cidade dos Meninos. O bairro apresenta uma parte mais
urbanizada com considerável densidade demográfica. De acordo com os dados censitários
(IBGE, 1991), o bairro possui 18.515 pessoas, 4.824 residências fixas e o funcionamento
de um pequeno comércio local. Porém, esta característica não é uniforme em todo o
bairro, pois o mesmo também se constitui de áreas de pastagem e criação de gado e
loteamentos. Em todo o bairro é marcante a falta de saneamento e devido ao
abastecimento de água da CEDAE ser bastante irregular e haver pontos sem o tal
abastecimento, é comum a utilização da água de poço.
MATERIAL E MÉTODO
Um questionário versando sobre questões relativas ao estilo de vida, saúde, usos de
pesticidas/meio ambiente, demografia e situação sócio-econômica foi aplicado na
população desses dois bairros de forma a se obter as informações relativas ao perfil de
exposição, bem como as preocupações dessas comunidades por sua saúde.
Através dos mapas de cada bairro e dos dados censitários fornecidos pelo IBGE calculou-
se o passo da amostragem de forma a se consultar 15% das residências em cada bairro. A
seleção das casas para a entrevista ocorreu dentro de um passo de três em três casas
dentro de um mesmo quarteirão, sendo estes, sempre percorridos no sentido horário.
Desta forma pesquisou-se 611 residências, sendo que dessas 25 famílias são pertencentes
a Cidade dos Meninos e 586 pertencentes ao Pilar. Os dados obtidos nos questionários
foram processados pelo programa para epidemiologia em microcomputadores “Epi Info”
versão 6.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
As populações dos Bairros Cidade dos Meninos e Pilar apresentam características sócio
econômicas um pouco parecidas. O Pilar por ser mais populoso tem os indicadores de
pobrezaum pouco mais acentuados. Suas respectivas populações vivem dentro de um
mesmo estilo de vida. A população amostrada, foi subdividida de acordo com o tempo de
permanência nos bairros, 6, 12 e 24 horas respectivamente. Foram incluídas nos grupos
de permanência de 24 horas, as crianças menores que 7 anos, as crianças que estudam no
bairro e as pessoas que trabalham em casa. Para os períodos de permanência de 6 e 12
horas, as pessoas foram incluídas de acordo com o tempo de permanência no bairro. A
tabela I mostra esses resultados. 80,6% das pessoas entrevistadas na Cidade dos Meninos
permanecem mais de 24 horas no bairro. No Pilar este percentual é um pouco menor,
76,5%.
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Tabela I. - No DE PESSOAS SEGUNDO TEMPO DE PERMANÊNCIA NO BAIRRO.
No de Pessoas PERMANÊNCIA DE
24 HORAS
PERMANÊNCIA DE 12
HORAS
PERMANÊNCIA DE
6 HORAS
N°.Pessoas % N°.Pessoas % N°.Pesso
as
%
CIDADE DOS
MENINOS
82 80,4 18 17,6 02 4,0
PILAR 1700 76,5 273 12,3 248 11,2
Com relação aos hábitos alimentares e consumo de água, os dois bairros apresentaram
diferenças importantes. 23,8% das pessoas entrevistadas no Pilar afirmaram consumir
água de poço, enquanto na Cidade dos Meninos este percentual cai para 4, 8%. Quanto ao
consumo de alimentos cultivados no local, na Cidade dos Meninos 17,4% cultivam
hortaliças para consumo próprio e 82,6% plantam fruteiras. No Pilar os percentuais são
menores, respectivamente, 5,8% e 52,9% (tabela II).
Tabela II - CONSUMO DE ÁGUA/ALIMENTOS.
CIDADE DOS MENINOS
CEDAE POÇO CRIA Ñ CRIA PROD. Ñ PROD. CULTIVA Ñ
CULTIV
PLANT Ñ
PLANT
ÁGUA 95,2 4,8
ANIMA
L
36,4 63,6
LEITE 4,3 95,7
HORTA 17,4 82,6
FRUTA 82,6 17,4
PILAR
CEDAE POÇO CRIA Ñ CRIA PROD. Ñ PROD. CULTIVA Ñ
CULTIV
PLANT Ñ
PLANT
ÁGUA 76,2 23,8
ANIMA
L
9,4 90,6
LEITE 1,2 98,8
HORTA 5,8 94,2
FRUTA 52,9 47,1
• Resultados em %
Sobre as questões relacionadas a contaminação na Cidade dos Meninos, 67,8% das
pessoas entrevistadas responderam que sabem do caso do “pó de broca, porém 32,2%
afirmaram que tal problema não traz nenhum problema em sua vida e, quanto ao estado
de saúde da família, 75,4% das pessoas entrevistadas responderam que o estado da
família é bom.
CONCLUSÕES
O trabalho mostrou que embora a maior parte dos entrevistados considere bom o estado
de saúde da família, a população do Pilar associa a contaminação da Cidade dos Meninos
com um possível agravo na sua saúde. Na Cidade dos Meninos, grande parte dos
moradores da especialmente os das residências próximas a antiga fábrica, mostraram- se
interessados pelo assunto, porém não acreditam que o problema traga agravo a sua saúde.
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A comparação do estado de saúde entre as populações dos dois bairros, mostrou que esta
é pior no Bairro do Pilar. Isto pode ser explicado pela condição social deste bairro que é
inferior a do bairro Cidade dos Meninos.
Na Cidade dos Meninos, o solo contaminado é o ponto de exposição mais importante,
seguido da biota (especialmente gramínias) utilizada como alimento do gado e da
poluição do ar.
No Pilar, não há como assumir alguma contaminação porque nenhum estudo sobre a
contaminação pelo HCH foi desenvolvido naquele bairro, no entanto, de acordo com o
relato de que toneladas de hexaclorociclohexano foram espalhadas na região (Brilhante &
Oliveira, 1996) e do conhecimento da importância que a utilização da água de poço
assume naquele bairro (23,8% dos entrevistados afirmaram consumir este tipo de água)),
é razoável que se investigue a presença de tal contaminante na água de poço, e no ar
atmosférico. A próxima etapa do projeto inclui a coleta de amostras ambientais nos dois
bairros e a estimativa do nível de perigo e da população exposta.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. Braga, A. M. C. B.; Contaminação Ambiental por Hexaclorociclohexano em Escolares na Cidade
dos Meninos, Duque de Caxias, RJ; Tese M.Sc.; ENSP-FIOCRUZ; RJ; 1996.
2. Sexton, K, Selevan, S. G., Wagener, D. K., Lybarger, J. A.; Estimating Human Exposures to
Environmental Polluantes: Availability and Utility of Existing Databases; Archives of Environmental
Health; 47; 6; 1992. Pp 398-407.
3. Harvey,T., Mahaffey, K. R., Velazquez, S., Dourson, M.; Holistic Risk Assessment: An Emerging
Process for Environmental Decisions; Regulatory Toxicology and Pharmacology, 22, 1995. Pp. 110-
117.
4. IBGE. (1991); Censo Demográfico. Bairro 17 - Cidade dos Meninos. Município 170 - Duque de
Caxias. RJ.
5. Brilhante, O. M. and Oliveira R. M.; Environmental contamination by HCH in the ‘Cidade dos
Meninos’, state of Rio de Janeiro; International Journazl of Environmental Health Research, 6, 1996;
pp. 15-27.

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