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DIREITO CIVIL I AULA 5

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DIREITO CIVIL I – AULA 5
DIREITOS DA PERSONALIDADE:
A pessoa enquanto sujeito de direito atrela-se à ideia de personalidade.
A personalidade jurídica é a base que sustenta todas as pessoas, garantindo-lhes um mínimo de proteção fundamental.
A personalidade jurídica sempre foi vista apenas como um atributo genérico reconhecido a uma pessoa para que viesse a ser admitida como sujeito de direitos.
Todavia, não se pode olvidar que, determinadas entidades ou grupos, não personalizados (ou seja, desprovidos de personalidade jurídica, existindo apenas no prisma fático) como o condomínio edilício, a sociedade de fato ou a massa falida, podem titularizar diversas relações jurídicas, mesmo não possuindo personalidade. Mesmo não dispondo de personalidade jurídica os entes despersonalizados podem ser sujeito de direitos.
Assim não podemos atrelar a personalidade jurídica à possibilidade de titularizar relações jurídicas.
Na avançada visão-constitucional personalidade jurídica é o atributo reconhecido a uma pessoa (natural ou jurídica) para que possa atuar no plano jurídico e reclamar uma proteção jurídica mínima, básica, reconhecida pelos direitos da personalidade. Titularizar a personalidade jurídica significa ter uma tutela jurídica especial, consistente em reclamar direitos fundamentais, imprescindíveis ao exercício de uma vida digna.
A personalidade não se esgota na possibilidade de alguém ser sujeito de direitos, mas relaciona-se com o próprio ser humano, sendo consequência mais relevante do princípio da dignidade da pessoa humana.
O texto constitucional ancorado na afirmação da cidadania e a dignidade da pessoa humana como valores supremos, confere à legislação infraconstitucional uma nova compreensão da personalidade, de modo a afirmar a primazia da pessoa humana.
A personalidade não é um direito, e ela quem apoia os direitos e deveres que dela irradiam, é objeto de direito é o primeiro bem da pessoa.
Cuida-se de uma aptidão genericamente reconhecida; toda pessoa é dotada de personalidade.
É a possibilidade de ser titular de relações jurídicas e de reclamar o exercício da cidadania, garantida constitucionalmente e que será implementada através dos direitos da personalidade.
A personalidade é parte integrante da pessoa, é uma parte intrínseca; permitindo que o titular venha a adquirir exercitar, modificar, substituir, extinguir ou defender interesses.
BREVE RESUMO HISTÓRICO
O Direito Romano não cuidou dos direitos da personalidade nos moldes que são concebidos hodiernamente, apenas contemplando a chamada actio injuriarum (a ação contra a injúria) que foi estabelecida para abranger qualquer atentado contra a pessoa. Também os gregos não estruturaram uma categoria jurídica específica para tutelar a personalidade, existia tão somente uma ação denominada dike kakegoric, tendendo à punição de quem violava algum interesse físico ou moral.
Com o Cristianismo e a pregação a uma fraternidade universal, tem início um despertar para a proteção da personalidade humana.
A Carta Magna Inglesa de 1825 estabeleceu a proteção de aspectos fundamentais da personalidade humana, como a liberdade, vindo a reconhecer implicitamente os direitos da personalidade. Mais adiante a Declaração dos Direitos do Homem em 1789, valorizou a tutela da personalidade humana e a defesa de direitos individuais.
No entanto somente após a II Guerra Mundial, consideradas as atrocidades praticadas pelo nazismo contra a individualidade da pessoa humana e contra a humanidade como um todo, sentiu-se a necessidade de proteção de uma categoria básica de direitos reconhecidos à pessoa humana.
Era preciso assegurar uma tutela fundamental em favor da personalidade humana, salvaguardando a própria raça.
Em 1948 foi promulgada a Declaração Universal de Direitos do Homem.
Os Códigos Civis como um todo não faziam menção aos direitos da personalidade. Com o pós-guerra os códigos foram paulatinamente reformados, vindo a sua grande maioria a proteger os Direitos da personalidade. Importante colaboração adveio do Direito Alemão.
Entre nós os direitos da personalidade foram admitidos após importantes contribuições doutrinárias, alçados à altitude legislativa por normas esparsas e posteriormente consagrados na CRFB/88.
O CC/2002 reconheceu os Direitos da personalidade nos arts. 11 a 21. Hodiernamente muitos ordenamentos jurídicos a fim de dar efetividade a dignidade do homem, elevada ao status de princípio fundamental, entendem que o melhor caminho legislativo é inscrever no texto constitucional os direitos da personalidade.
DIREITO CIVIL-CONSTITUCIONAL:
O conjunto das situações jurídicas individualizadas susceptíveis de apreciação econômica, é dito patrimônio.
Ao lado das situações patrimoniais temos os direitos da personalidade (enraizadas na esfera íntima da pessoa).
Os Direitos da personalidade constituem verdadeiros direitos subjetivos atinentes à própria condição de pessoa.
Os Direitos da personalidade são os direitos essenciais ao desenvolvimento da pessoa humana, em que se convertem as projeções físicas psíquicas, intelectuais do seu titular. Possibilitam a atuação na defesa da própria pessoa. É um conjunto de prerrogativas jurídicas.
A matéria precisa ser enxergada nos dias de hoje sob a ótica civil-constitucional. A afirmação da cidadania e da dignidade da pessoa humana como princípios constitucionais juntamente com a proclamação da igualdade e da liberdade dão novo conteúdo ao direito da personalidade, realçando a pessoa humana como ponto central da ordem jurídica brasileira.
Os direitos da personalidade estão unidos ao desenvolvimento da pessoa humana, caracterizando-se como garantia para a preservação de sua dignidade.
Os direitos da personalidade passam a expressar o minimum necessário e imprescindível à vida com dignidade.
E. 274 da Jornada de Direito Civil: “os direitos da personalidade regulados de maneira não exaustiva pelo CC são expressões da cláusula geral de tutela da pessoa humana, contida no art. 1º, III, CF.”
FONTES:
Alguns entendem decorrer do Direito Natural, seriam direitos inatos ao homem.
Na posição minoritária os positivistas entendem que o próprio ordenamento jurídico seria fonte dos direitos da personalidade.
Dividem-se em 2 categorias: Inatos – direito à vida, a integridade física e moral e os adquiridos que decorrem do status individual e existem na extensão da disciplina que lhes foi conferida pelo direito positivo.
Os doutrinadores entendem que caberia ao Estado apenas reconhecer os direitos da personalidade, dotando-os de proteção própria.
CARACTERÍSTICAS:
As mais importantes características dos direitos da personalidade são a intransmissibilidade e a sua inalienabilidade.
DA DISPONIBILIDADE:
Muito embora os Direitos da personalidade sejam indisponíveis ao seu titular admite-se, eventualmente, a cessão do seu exercício em determinadas situações e dentro de certos limites.
É permitido ao titular ceder o exercício de alguns dos direitos da personalidade. Ex.: Direito da imagem, que pode ser cedida onerosa ou gratuitamente, durante determinado lapso temporal.
E.4 da Jornada de Direito Civil: “O exercício dos direitos da personalidade pode sofrer limitação voluntária, desde que não seja permanente, nem geral.”
Assim o ato de disposição de um Direito da personalidade há de ser transitório e específico.
Ex.: Ceder o uso da imagem para edição de uma revista. Mas não é possível autorizar o uso indeterminado da imagem, sem limites temporais.
Também se admite a cessão de direitos autorais e a doação de órgãos humanos duplos ou regeneráveis, relativizando a indisponibilidade.
O ato de disposição também não pode violar a dignidade do titular. Mesmo que alguém manifeste sua vontade não será possível ceder o exercício de um direito da personalidade com afronta à sua dignidade (mínimo existencial).
Ex. da jurisprudência francesa – arremesso de anões, mesmo estes consentindo. Ficou decidido que o respeito á dignidade humana é absoluto e não poderia se cercar de quaisquer concessões em funçãode apreciações subjetivas que cada um possa ter a seu próprio respeito. Por sua natureza a dignidade humana está fora do comércio.
O ato de disposição de um direito da personalidade pode decorrer da lei ou da autonomia privada.
ABSOLUTO:
Possuem eficácia contra todos, impõe à coletividade o dever de respeitá-los (é um dever geral de abstenção).
IMPRESCRITÍVEL:
Impede que a lesão a um Direito da personalidade venha a convalescer com o tempo. Não se confunde com a prescritibilidade da pretensão indenizatória decorrente de um eventual dano à personalidade.
Imprescritível é a pretensão de garantir o exercício do direito, mas não o de reparar pecuniariamente um eventual dano sofrido. Ex.: Se alguém se utiliza da imagem de outrem, a pretensão para impedir que se continue a utilizar a imagem não sofre limitação temporal, porém em 3 anos prescreverá a pretensão de reparação pecuniária do dano causado à imagem.
Exceção no que tange as ações indenizatórias causadas por prisão ou tortura durante o regime militar de exceção art. 14 da Lei 9140/05 e STJ: pois que tais ações referem-se ao período em que a ordem jurídica foi desconsiderada com legislação de exceção, havendo sem dúvida incontáveis abusos e violações dos direitos fundamentais, mormente do direito à dignidade da pessoa humana. (Ag Rg 970 753/Mg, rel. Min. Denise Arruda)
EXTRAPATRIMONIAL:
Insuscetibilidade de apreciação econômica dos direitos da personalidade ainda que a eventual lesão possa produzir consequências monetárias. No entanto, ocorrendo uma violação aos valores da personalidade, independente de causar prejuízo material, surge a possibilidade de reparação do dano como forma de compensar o prejuízo imposto à vitima e sancionar o lesante, inclusive com caráter educativo.
Decorre do caráter extrapatrimonial dos direitos da personalidade a sua impenhorabilidade.
VITALÍCIO:
Extinguem-se naturalmente com a morte; confirmando o seu caráter intransmissível.
No entanto reconhece-se a pessoa viva a proteção aos Direitos da personalidade de alguém que já morreu – art.12, parágrafo único, CC.
São os chamados lesados indiretos, que estão legitimados para reclamar em nome próprio a proteção aos seus direitos da personalidade na defesa da personalidade do cônjuge ou companheiro falecido, bem como de seus parentes em linha reta ou colateral até o 4º grau.
Os Direitos da personalidade são intransmissíveis, todavia os reflexos patrimoniais admitem transmissão.
DIREITOS DA PERSONALIDADE E A LIBERDADE DE IMPRENSA
Se a informação veiculada pela imprensa vulnera a privacidade ou a imagem de alguém, estará desvirtuando o exercício do direito à notícia, caracterizando verdadeiro abuso de direito, prontamente reparável.
A democracia e as liberdades constitucionais podem impor uma relativização no exercício de todo e qualquer direito, inclusive no que tange a liberdade de expressão e de imprensa quando colidir com outros valores também constitucionais de proteção da pessoa humana.
Impor limites à liberdade de expressão é inibir o preconceito ou a intolerância que atingem as minorias sociais, étnicas e econômicas.
A liberdade de expressão e a liberdade de imprensa, não têm caráter absoluto, podendo sofrer flexibilização no caso concreto, quando algum Direito fundamental, também consagrado constitucionalmente, reclame proteção privilegiada.
PROTEÇÃO À INTEGRIDADE FÍSICA
- arts. 13 a 15 -	proteção ao corpo vivo.
- art. 14 -		corpo morto.
- art. 15 -		livre consentimento informado do paciente.
Lei 9434/97 exige a manifestação de vontade para que alguém possa doar seus órgãos para depois da morte. Não tendo ocorrido manifestação em vida, tal direito transmite-se aos herdeiros.
Apesar do reconhecimento do direito ao corpo morto como manifestação da própria personalidade, necessita de autorização judicial para exames, avaliações, vistorias no cadáver, sob pena de responsabilização civil.
Em se tratando de pessoa não identificada (indigente), o cadáver não reclamado não poderá ser objeto de retirada dos órgãos para fins de transplantes, mas é possível sua utilização para estudos e pesquisas científicas.
A pessoa humana titulariza direitos que implicam o reconhecimento da titularidade sobre o seu próprio corpo. Por isso não se pode vedar a sua participação em tratamentos terapêuticos e científicos.
O profissional de medicina tem que orientar, sem coagir e menosprezar, a vontade do paciente; é o chamado consentimento informado. Faz-se necessário que o médico advirta expressamente o paciente para todo e qualquer efeito conhecido do procedimento a ser adotado. Até porque o paciente é sujeito e não objeto do tratamento médico. Não ocorrendo a advertência expressa, caberá reparação do dano causado, por violação do dever de informação, corolário da boa-fé objetiva.
Somente havendo motivo comprovado medicamente é que se pode admitir, em caráter totalmente excepcional, a internação forçada de uma pessoa humana; quando houver interesse público justificável, como no caso de doenças transmissíveis. Com isso afasta-se toda e qualquer tentativa de internação por membros da família, que ao invés de cuidar de seus parentes, preferem forçar uma internação.
PROIBIÇÃO DA PRÁTICA PELO TITULAR DE ATO DE DISPOSIÇÃO QUE IMPLIQUE DIMINUIÇÃO PERMANENTE DA INTEGRIDADE FÍSICA
Não havendo redução da integridade física permanente, é possível a prática de diferentes atos de disposição corporal. Ex.: Tatuagem, piercing.
Não pode haver implantação de chips em funcionários de uma empresa; é possível a cirurgia plástica, com o intuito de embelezamento.
A QUESTÃO DO TRANSPLANTE E A INTEGRIDADE FÍSICA
São admitidos atos de disposição do corpo humano, vivo ou morto, à título gratuito, se não causar prejuízo ao titular e tendo em vista um fim altruístico, terapêutico ou científico (arts. 13 e 14, CC).
É possível a disposição gratuita de partes destacáveis do corpo humano, renováveis (leite, sangue, medula óssea, pele, óvulo, esperma, fígado) ou não, para salvar a vida ou preservar a saúde do interessado ou de terceiro, ou para fins científicos ou terapêuticos e, desde que o ato seja à título gratuito, dentro dos limites da lei.
Em vida somente os órgãos duplos e as partes renováveis podem ser doados – art.9º da Lei 9434/97.
O transplante de pessoa viva depende de expresso consentimento do titular e o ato de vontade é revogável. Em se tratando de incapaz será mister autorização judicial ouvido o MP.
Quando se tratar de doação em vida, permite-se que o donatário escolha o beneficiário do transplante, desde que seja parente. O médico, antes de realizar o transplante, deve fazer a comunicação ao promotor de justiça da comarca do domicílio do doador.
No transplante post mortem não pode haver a escolha do beneficiário, impondo obediência à fila de espera criada por lei (Lei 9434/97 – art. 2º, parágrafo único e Decreto 2268/97, art. 24) com o escopo de garantir a universalização da saúde e a igualdade de chances.
A Lei 10211/01 que modificou o art. 4º da Lei 9434/97, não mais admitiu a chamada doação presumida de órgãos post mortem, passando a exigir a autorização do cônjuge, companheiro ou do parente mais próximo. Ex.: art. 14, CC.
E. 277, Jornada de Direito Civil “O art. 14 do CC, ao afirmar a validade da disposição gratuita do próprio corpo com objetivo científico ou altruístico, para depois da morte, determinou que a manifestação expressa do doador de órgãos em vida prevalece sobre a vontade dos familiares, portanto, a aplicação do art. 4º da Lei 9434/97 ficou restrita à hipótese de silêncio do potencial doador”.
Transplante – amputação ou ablação de órgão, com função própria, de um organismo para ser instaurado em outro, no qual atenderá as mesmas funções. Ex.: transplante de córnea ou coração.
Enxerto – retirada de porção orgânica para ser instalada no mesmo organismo ou em outro, com o propósito de atender a funções estéticas ou terapêuticas sem exercer funções autônomas. Ex.: integração de tecidos mortos ou conservados no corpo de alguém.
A norma legal acerca damatéria não diferencia um do outro, submetendo todas as modalidades ao mesmo regramento.
A PROTEÇÃO DA INTEGRIDADE FÍSICA E A CIRURGIA DE MUDANÇA DE SEXO (TRANSGENITALIZAÇÃO)
Não se confunde o transexual com o homossexual, o bissexual, o intersexual (hermafrodita) ou mesmo com o travesti.
O transexual sofre uma dicotomia físico-psíquica, possuindo um sexo físico distinto de sua conformação sexual psicológica. Somente através da cirurgia que o transexual poderá desenvolver livremente sua personalidade.
PRINCÍPIO DA AUTONOMIA DO PACIENTE E OS SEGUIDORES DA RELIGIÃO TESTEMUNHA DE JEOVÁ
Já se admite a prevalência da vontade de não se submeter a transfusão sanguínea quando se tratar de pessoa maior e capaz.
INTEGRIDADE FÍSICA E A POSSIBILIDADE DE GESTAÇÃO EM ÚTERO ALHEIO
CFM Resolução 1957/10 – requisitos:
A maternidade por substituição deverá efetuar-se entre parentes até o segundo grau (mãe e filha, avó e neta ou irmãs) devendo os demais casos serem submetidos à prévia anuência do CRM;
A cessão de útero terá imperativamente caráter gratuito, vedada a remuneração pelo ato;
Somente é permitida a utilização da técnica por pessoas que realmente não podem gestar.
A TUTELA JURÍDICA DO CORPO HUMANO E A PROCRIAÇÃO MEDICAMENTE ASSISTIDA
Professora: Adriana Amaral – Civil I.

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