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Daniele Longo AMEBAS DE VIDA LIVRE 1 As espécies de amebas de vida livre ou mais bem denominadas, "amebas parasitárias facultativas ou oportunistas" possuem uma história do conhecimento de sua patogenicidade muito interessante. Em 1958, Culbertson e cols. verificaram que a Acanthamoeba era capaz de apresentar efeito ciolítico em meios de cultura de tecido e provocar meningoencefalite em animais de laboratório. Foi pensado, então, que essas amebas poderiam, talvez, ser capazes de causar lesões no SNC humano. Pesquisadores atentos, em diversas partes do mundo, passaram a estudar essa possibilidade, procurando determinar a causa mortis e a etiologia de certas infecções do sistema nervoso central, até então desconhecidas. Em 1965, foi relatado o primeiro caso de meningoencefalite aguda (diagnóstico post-mortem) em um jovem, na Austrália, e, em 1966, o segundo, nos EUA, comprovando a hipótese. No Brasil, os primeiros casos humanos foram relatados por Campos, R., 1977, e Salles-Gomes, 1978, seguindo-se importantes de Foronda A e Affonso MHT, em São Paulo. Salazar H e Moura H. no Rio de Janeiro. Atualmente, sabe-se que amebas de vida livre podem causar meningoencefalite, encefalite granulomatosa e ceratite (úlcera da córnea). Provavelmente casos humanos ocorram desde longa data, mas podemos pensar que estamos frente a protozoários em transição para a vida parasitária, o que aumenta a necessidade de pesquisas para se compreender melhor esses novos parasitos, sua patogenia e epidemiologia. → Patogenia: Ultimamente têm sido relatados centenas de casos (no mundo) de ceratite, mas já se sabe que as amebas (Acanthamoeba spp.) só invadem a córnea previamente lesada. Se houver abrasão ampla, a ceratite tem desenvolvimento rápido, com ulceração da córnea, muita dor e perda de visão variável. Em usuários de lentes de contato, as pequenas lesões advindas do uso incorreto desse corretivo visual podem permitir a penetração das amebas, muitas vezes contaminantes de soluções salinas preparadas em casa. O aumento do uso de lentes de contato, especialmente a gelatinosa, associado a falta de cuidado e higiene, tende a ampliar o número de casos de ceratite por Acanthamoeba spp. Essas amebas são frequentemente encontradas no solo e nas águas de lagos e rios. As formas trofozoíticas são ativas e alimenta-se de bactérias; os cistos são encontrados no solo seco ou na poeira. O desencistamento ocorre quando os cistos entram em ambiente úmido, principalmente em presença de Escherichia coli e outras bactérias. Os trofozoítos multiplicam-se por divisão binária simples. A N. fowleri, comum em lagos e brejos, apresenta em certos períodos de seu ciclo de vida livre formas flageladas. Essas entrariam em contato mais facilmente com os banhistas. Já as espécies de Acanthamoeba não apresentam formas flageladas, o que explica o menor número de casos humanos provocados por essas últimas amebas. As formas flageladas movem-se ativamente na água e ao entrarem em contato com a mucosa nasal transformam-se em trofozoítos ativos; daí, via epitélio neuroolfativo atingem o cérebro, onde se disseminam por via sanguínea. Os casos humanos de meningoencefalite podem apresentar-se de duas formas: aguda e crônica. Os casos agudos em geral têm como agente etiológico a N. fowleri; é uma lesão hemorrágico-necrótica mais frequentemente atingindo a base do lobo frontal e o cerebelo. Em geral está relacionada com banhistas jovens, que até alguns dias antes do início dos sintomas gozavam de perfeita saúde e nadaram em lagoas ou piscinas malcuidadas. Os casos crônicos têm sido associados as espécies de Acanthamoeba. Em geral, ocorre uma lesão granulomatosa ("encefalite amebiana granulomatosa"), em pacientes debilitados e, muitas vezes, imunodeprimidos (por ação medicamentosa ou por outra doença imunodepressora). Podem também ocorrer lesões oculares (úlceras, opacificação da córnea e cegueira) provocadas por espécies de Acanthamoeba polyphaga. Casos de pneumonia têm sido descritos. A prevenção da encefalite amebiana só pode ser feita pela abstinência de natação em lagoas, piscinas e rios passíveis de estarem contaminados. Apesar de poder ocorrer infecções em mamíferos e moluscos, não se conhece a importância deles na manutenção do protozoário. → Diagnostico: o laboratorial tem como a primeira medida a coleta do material no órgão afetado (liquor cefalorraquiano, mucosa nasal, faringe etc.), fazendo-se exame direto a fresco ou corado pela hematoxilina fénica, Giemsa ou Gram; é recomendável, também, fazer a cultura do material coletado, conforme indicado adiante.
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