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Psicopatologia das Relações Amorosas - Otto Kernberg

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Apresentação à Edição 
Brasileira 
A presentar este livro do Dr. Otto F. Kernberg ao público 
especializado brasileiro é uma dupla satisfação. Primeiro, 
porque, devido a uma estratégia editorial inusitada da Editora 
Artes Médicas, esta edição vem a público bem antes de sua 
publicação em língua inglesa, visto que Love Rdations: Normality and 
Pathology está programado para ser publicado pela Yale University 
Press somente no final do próximo semestre, o que faz desta edição 
brasileira a primeira publicação em nível mundial deste livro. 
Segundo, porque seu lançamento, neste momento, vindo a servir 
como base para a discussão do Tema Oficial da XVII Jornada Sul-
Riograndense de Psiquiatria Dinâmica, promovida pelo Centro de 
Estudos Luís Guedes, do Departamento de Psiquiatria e Medicina 
Legal da UFRGS, confirma a amizade e o vínculo afetivo 
significativos que ligam os Drs. Otto e Paulina Kernberg à 
psiquiatria e à psicanálise do Rio Grande do Sul. 
Otto F. Kernberg é, sem dúvida, atualmente um dos mais 
distinguidos personagens da cena psicanalítica internacional, tendo 
se destacado com importantes contribuições nas áreas da 
contratransferência, da teoria das relações de objeto e da descrição, 
compreensão e tratamento das organizações de personalidade 
narcisistas e fronteiriças (borderliné). 
A amplitude e, ao mesmo tempo, a profundidade e a erudição 
dos seus interesses levaram o Dr. Kernberg a também pesquisar a 
aplicação da psicanálise a várias áreas afins de interface, como a 
psicoterapia de orientação analítica, a psiquiatria dinâmica (incluindo 
tratamentos hospitalares) e a dinâmica de grupos e instituições (o 
que lhe conferiu, entre diversas outras distinções já recebidas, o 
Presidential Awardfor Leadership in Psychiatry ofthe National Association 
ofHealth Care Systems, de 1993, nos Estados Unidos). 
 
 
 
 
 
 
 
vn 
 
 
Predestinado e estimulado talvez por uma peculiaridade 
biográfica (nasceu em Viena, na Europa, emigrou jovem para a 
América do Sul, Chile, onde se graduou como médico, psiquiatra e 
psicanalista; transferiu-se após para os Estados Unidos, onde 
desenvolveu e consolidou a maior parte de sua carreira psicanalíti-
ca), um dos aspectos mais importantes das contribuições do Dr. 
Kernberg foi o de trazer o trabalho de psicanalistas europeus e 
latino-americanos para conviver com a psicanálise norte-americana 
e o movimento inverso: apresentar e salientar, aos psicanalistas 
europeus e latinos, as principais contribuições da psicanálise ameri-
cana, especificamente da psicologia do ego, e de suas variações. 
Esta talvez seja a marca mais distintiva de sua produção 
científica, incluindo o presente livro: a de avançar ideias, formular 
conceitos, propor hipóteses, que tendem a integrar, por um lado, 
contribuições de duas das mais fortes correntes do pensamento 
psicanalítico atual, como o são a psicologia do ego e a teoria das 
relações de objeto, e, de outro, não desconhecer e nem descartar 
aspectos de vários outros enfoques que tensionam, enriquecem e de 
certa forma conflagram o cenário psicanalítico contemporâneo. 
Nos vários capítulos deste livro, o leitor poderá apreciar a 
convivência crítica da psicologia dos impulsos instintivos e do 
conflito libidinal-agressivo do Freud clássico, com teóricos 
americanos não menos clássicos como M. Mahler, E. Jacobson ou R. 
Stoller, lado a lado com autores fundamentais das relações de objeto 
anglo-saxões, como Fairbairn, M. Klein, H. Resenfeld, W. Bion, D. 
Meltzer - ou franceses como J. McDougall, J. Chasseguet-Smirgel, B. 
Grunberger, J. Laplanche, A. Green, entre outros. 
Tais aportes americanos e europeus integram e são 
integrados pelas personalíssimas contribuições do próprio 
Kernberg, que esboça neste livro uma original teoria dos afetos 
para dar suporte básico aos desenvolvimentos teórico-clínicos, não 
menos originais, que constituem a essência desta sua mais recente 
obra, isto é, as conceptualizações que Kernberg faz da função e 
evolução da excitação sexual, do desejo erótico e do amor sexual 
maduro, nas suas variantes normais e patológicas. 
A passagem desses fenómenos sexuais-eróticos do universo 
intrapsíquico, individual e da primeira interação mãe-bebê para a 
constituição do casal adulto, bem como a dinâmica da interação dos 
casais entre si, com outros casais e com o que Kernberg denomina 
as pressões do convencionalismo dos grandes grupos são outros dos 
momentos mais instigantes deste texto, que se expõem à reflexão 
do leitor interessado e que provavelmente farão da leitura do mesmo 
uma experiência certamente criativa e enriquecedora. 
Sidnei S. Schestatsky Gramado, novembro de 1994. 
 
 
 
 
 
Agradecimentos 
oi o Dr. John D. Sutherland, antigo diretor-médico da 
Clínica Tavistock, em Londres, e por muitos anos o 
consultor-sênior da Fundação Menninger, quem primeiro dirigiu a 
minha atenção ao trabalho de Henry Dicks. A aplicação da teoria das 
relações objetais de Fairbairn ao estudo dos conflitos conjugais, 
realizada por Dicks, proporcionou-me uma estrutura referencial 
que se tornou essencial quando comecei a desenredar as complexas 
interações que os pacientes com organização de personalidade 
borderline mantinham com seus amantes e parceiros conjugais. O 
trabalho dos drs. Michel Fain e Denise Braunschweig sobre a 
dinâmica de grupo, no qual as tensões eróticas são acionadas nos 
primeiros anos de vida e por toda a idade adulta, iniciou meu 
contato com as contribuições francesas ao estudo psicanalítico das 
relações amorosas normais e patológicas. No curso de dois períodos 
sabáticos em Paris, quando comecei a desenvolver os estudos 
incluídos neste livro, tive o privilégio de consultar importantes 
psicanalistas interessados no estudo das relações amorosas normais e 
patológicas, incluindo os Drs. Didier Anzieu, Denise Braunschweig, 
Janine Chasseguet-Smirgel, Christian David, Michel Fain, Pierre 
Fedida, André Green, Bela Grunberger, Joyce McDougall e François 
Roustang. Os drs. Serge Lebovici e Daniel Widlocher ajudaram 
muito a esclarecer minhas ideias sobre a teoria do afeto; mais tarde, 
os drs. Rainer Krause, de Saarbrucken, e Ulrich Moser, de Zurique, 
auxiliaram a esclarecer ainda mais a patologia da comunicação 
afetiva nas relações íntimas. 
Também tive o privilégio de contar, entre meus maiores 
amigos, com alguns dos mais importantes colaboradores ao estudo 
psicanalítico das relações amorosas nos Estados Unidos: os drs. 
Martin Bergman, Ethel Person e Robert Stoller. Ethel Person ajudou-
me a reconhecer as importantes contribuições que ela e o Dr. Lionel 
Ovesey fizeram sobre a identidade de género nuclear e a patologia 
sexual; Martin 
ix 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
F 
 
x Agradecimentos 
Bergman auxiliou-me a obter uma perspectiva histórica da natureza 
das relações amorosas e sua expressão na arte; e Robert Stoller 
encorajou-me a continuar a análise da íntima relação entre o 
erotismo e a agressão, da qual ele foi tão brilhantemente o pioneiro. 
Os drs. Leon Altman, Jacob Arlow, Martha Kirkpatrick e John 
Munder Ross proporcionaram-me úteis oposições às minhas ideias e 
o estímulo de suas próprias contribuições nesta área. 
Como sempre, um grupo de amigos próximos e colegas na 
comunidade psi-canalítica ajudou-me imensamente com suas 
reflexões e críticas, mas sempre encorajadoras e estimulantes, ao 
meu trabalho: os drs. Maria Bergman, Harolc Blum, Arnold 
Cooper, William Frosch, William Grossman, Donald Kaplan, Paulina 
Kernberg, Robert Michels, Gilbert Rose, Joseph e Anne-Marie 
Sandler e Ernst e GertrudeTicho. 
Também, como sempre, sou profundamente grato à Srta. 
Louise Traitt e à Srta. Becky Whipple por seu trabalho alegre e 
paciente nas muitas etapas que conduziram, desde os primeiros 
rascunhos, à versão final.A firme preocupação da Srta. Whipple 
com os pequenos detalhes deste original foi essencial à sua produ-
ção. A Sra. Rosalind Kennedy, minha assistente-administrativa, 
continuou a proporcionar o cuidado, organização e coordenação 
totais do trabalho em meu escritório, o que permitiu a emergência 
deste rascunho em meio a muitas tarefas e prazcí conflitantes. 
Este é o terceiro livro que escrevi com a estreita colaboração de 
minha editora de muitos anos, a Sra. Natalie Altman, e a editora-
sênior da Yale University Press, l Sra. Gladys Topkis. Sua revisão 
competente e sempre encorajadora, habilmente l crítica, foi, mais 
uma vez, uma experiência esclarecedora. 
Sou profundamente grato a todos os amigos e colegas que 
mencionei, e aos meus pacientes e alunos, que me proporcionaram 
maisinsight em um número relativamente limitado de anos do que 
eu esperaria adquirir na minha vida inteira, i Eles também me 
ensinaram a aceitar os limites de meu entendimento desta vasta i e 
complexa área da experiência humana. 
Também sou grato aos editores originais pela permissão de 
reimprimir material nos capítulos abaixo listados. Deve-se enfatizar 
que este material foi amplamente reformulado e modificado. 
Capítulo 2: Adaptado de "New Perspectives in Psychoanalytic 
Affect Theory". Em: Emotion: Theory, Research and Experience, ed. R. 
Plutchik e H. Kellerman. NOVÍ Iorque: Academic Press, 11-130,1989. 
Publicado com a permissão da Academicl Press, e de 
"Sadomasochism, Sexual Excitement and Perversion". Journal 
o/the| American Psychoanalytic Association. 39:333-362,1991. Publicado 
com a permissão c Journal ofthe American Psychoanalytic Association. 
Capítulo 3: Adaptado de "Mature Love: Prerequisites and 
Characteristics".,| Journal ofthe American Psychoanalytic Association. 
22:743-768,1974, e de "Boundaries j 
Agradecimentos xi 
and Structure in Love Relations" .Journal ofthe American Psychoanalytic 
Association. 25: 81-114,1977. Publicado com a permissão dojournal 
ofthe American Psychoanalytic Association. 
Capítulo 4: Adaptado de "Sadomasochism, Sexual 
Excitement and Perversion" .Journal ofthe American Psychoanalytic 
Association. 39:333-362,1991, e de "Boundaries and Structure in Love 
Relations". Journal ofthe American Psychoanalytic Association. 25:81-
114,1977. Publicado com a permissão do Journal ofthe American 
Psychoanalytic Association. 
Capítulo 5: Adaptado de "Barriers to Falling and Remaining in 
Love" .Journal ofthe American Psychoanalytic Association. 22:486-
511,1974. Publicado com a permissão do Journal ofthe American 
Psychoanalytic Association. 
Capítulo 6: Adaptado de "Agression and Love in the 
Relationship of the Couple". Journal ofthe American Psychoanalytic 
Association. 39:4-70,1991. Publicado com a permissão dojournal ofthe 
American Psychoanalytic Association. 
Capítulo 7: Adaptado de "The Couple's Constructive and 
Destructive Superego Functions". Journal ofthe American 
Psychoanalytic Association. 41:653-677, 1993. Publicado com a 
permissão dojournal ofthe Psychoanalytic Association. 
Capítulo 8: Adaptado de "Love in the Analytic Setting". Aceito 
para publicação. Journal ofthe American Psychoanalytic Association. 
Publicado com a permissão do Journal ofthe Psychoanalytic Association. 
Capítulo 11: Adaptado de 
"TheTemptationsofConventionality".íntemfltional Review of 
Psychoanalysis. 16: 191-205, 1989. Publicado com a permissão de 
The International Review of Psychoanalysis e de "The Erotic Element in 
Mass Psychology and in Art". Bulletin ofthe Menninger Clinic. Vol. 
58, Número l, Inverno de 1994. Publicado com a permissão doEulletin 
ofthe Menninger Clinic. 
Capítulo 12:" Adolescent Sexuality in the Light of Group 
Processes." 
The Psychoanalytic Quarterly. Vol. 49,1:27-47,1980, e de "Love, the 
Couple and 
the Group: A PsychoanalyticFrame".Tfe Psychoanalytic Quarterly. Vol. 
49,1:78-108, 
1980. Publicado com a permissão doPsychoanalytic Quarterly. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Prefácio 
 í alguns anos, quando meus escritos sobre 
pacientes com organização de ersonalidade 
borderline enfatizavam a importância da agressão 
em sua sicodinâmica, um colega e bom amigo disse-me, meio 
brincando: "Por que você não escreve sobre o amor — todo 
mundo tem a impressão de que você se preocupa apenas com a 
agressão!" Prometi a ele que faria isso quando as respostas a 
algumas das intrigantes perguntas nessa área estivessem mais 
claras para mim. O presente trabalho é o resultado das 
minhas reflexões sobre aquelas questões, embora eu deva 
admitir que de modo algum tenha encontrado as respostas a 
todas as perguntas. Mas acredito que avancei suficientemente 
em minhas ideias para partilhá-las, e espero que, assim 
fazendo, contribua para que outros venham a iluminar o que 
ainda está obscuro. 
A psicologia e a patologia das relações amorosas 
começaram a chamar a minha atenção quando percebi que era 
quase impossível predizer o destino de uma relação amorosa, 
ou de um casamento, com base na psicopatologia individual do 
paciente. Às vezes, diferentes tipos e graus de psicopatologia nos 
parceiros pareciam resultar numa combinação confortável para 
o casal; outras vezes, estas diferenças tornavam-se a fonte das 
incompatibilidades. As perguntas "O que mantém os casais 
juntos? O que destrói seu relacionamento?" me perseguiam, e 
foram o ímpeto para que eu estudasse a dinâmica presente nos 
relacionamentos íntimos dos casais. 
Ao longo dos séculos, o assunto do amor recebeu muita 
atenção por parte dos poetas e filósofos. Em épocas mais 
recentes, ele foi estudado por sociólogos e psicólogos. Mas, com 
raras exceções, encontramos surpreendentemente pouco sobre o 
amor na literatura psicanalítica. 
xiii 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
H 
xiv Prefácio 
Repetidamente, em minhas tentativas de estudar a natureza 
do amor, me obrigado a confrontar a relação do erótico com a 
sexualidade. Descobri que, e contraste com os abundantes estudos 
sobre a resposta sexual de uma perspectr biológica, muito pouco 
fora escrito sobre ela como uma experiência subjetiva. LOJ me 
descobri lidando com fantasias inconscientes e suas raízes na 
sexualidade: f antil—em resumo, de volta a Freud. Clinicamente, 
também descobri que era p meio da mútua identificação projetiva 
que os casais reencenavam "cenários" pá sados (experiências e/ou 
fantasias inconscientes) em seu relacionamento, e qu« "perseguição" 
mútua, fantasiada e real (derivada da projeção de aspectos inf ar; do 
superego), assim como o estabelecimento de um ego ideal 
conjunto, influe ciavam poderosamente a vida de um casal. 
Minha base de dados foram pacientes tratados por psicanálise e 
psicoterap psicanalítica, a avaliação e o tratamento de casais com 
conflito conjugal, e partic larmente os estudos de seguimento, a 
longo prazo, de casais através da "janela"; psicanálise e da 
psicoterapia psicanalítica de pacientes individuais. 
Logo descobri que era impossível estudar as vicissitudes do 
amor sem tai bem estudar as vicissitudes da agressão, 
independentemente de o foco ser o rtí cionamento do casal ou o 
indivíduo. Os aspectos agressivos do relacionamer, erótico do 
casal emergiram como uma importante característica de todas as rd 
coes sexuais íntimas, uma área em que o trabalho pioneiro de 
Robert Stoller p: porcionou um esclarecimento significativo. Mas 
achei que os aspectos agressiv da ambivalência universal das 
relações objetais íntimas eram igualmente impe tantes, assim como 
os componentes agressivos das pressões do superego, desenc deados 
na vida íntima de um casal. A teoria psicanalítica das relações 
objet; facilitou o estudo da dinâmica ligando os conflitos 
intrapsíquicos e as relacõ interpessoais, as mútuas influências entre 
o casal e seu grupo social circundar; assim como a interaçãodo 
amor e da agressão em todos esses campos. 
Assim, apesar da melhor das intenções, as evidências 
indiscutíveis me oh garam a focar, nitidamente, também a agressão 
neste tratado sobre o amor. Ma justamente por isso, o 
reconhecimento da maneira complexa pela qual o amor e agressão 
se fundem e interagem na vida do casal também destaca os 
mecanisrn pelos quais o amor pode integrar e neutralizar a agressão, 
e, em muitas circunstá cias, triunfar sobre ela. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Sumário 
Apresentação à Edição Brasileira................................................... vii 
SidneiS. Schestatsky 
Agradecimentos .............................................................................. ix 
Prefácio .................................................................................... xiii 
Capítulo l Determinantes e Constituintes da Experiência Sexual 3 
Capítulo 2 Excitação Sexual e Desejo Erótico ......................... 17 
Capítulo 3 Do Desejo Erótico ao Amor Sexual Maduro ........... 33 
Capítulo 4 Amor Sexual Maduro, Édipo e o Casal .................. 48 
Capítulo 5 Experiência Sexual e Psicopatologia ...................... 63 
Capítulo 6 Agressão, Amor e o Casal .................................... 79 
Capítulo 7 Funções Superegóicas Construtivas e Destrutivas do 
Casal... 94 
Capítulo 8 O Amor no Setting Analítico 109 
Capítulo 9 Patologia Masoquista e Relações Amorosas.......................................... 122 
Capítulo 10 Narcisismo e Relações Amorosas ......................................................... 137 
Capítulo 11 Sexualidade da Latência, Processos de Grupo e 
Convencionalidade ..................................................................................................... 156 
Capítulo 12 Desafio Externo do Casal: Processos Grupais 
Adolescentes e Adultos .............................................................................................. 171 
Referências Bibliográficas .......................................................................................... 185 
 
 
 
 
 
C a p í t u l o l 
 Determinantes e Constituintes 
da Experiência Sexual 
Jue o sexo e o amor estão estreitamente associados é uma afirmação quase ndiscutível. Portanto, 
não deve causar surpresa que um livro sobre o amor :omece com uma discussão sobre as raízes 
biológicas e psicológicas da ex-.a sexual, as quais estão intimamente relacionadas. Já que os 
aspectos biológicos constituem a matriz em que os aspectos psicológicos podem se desenvol-
ver, comecemos explorando esses fatores biológicos. 
As Raízes Biológicas da Experiência e do Comportamento Sexual 
Ao investigarmos o desenvolvimento das características sexuais humanas, observamos que, 
conforme avançamos na escala biológica do reino animal (particularmente quando comparamos 
mamíferos inferiores com os primatas e os seres humanos), as interações psicossociais entre o 
bebé e seu cuidador desempenham um papel cada vez mais significativo na determinação do 
comportamento sexual, associadas a uma relativa diminuição no controle por fatores genéticos e 
hormonais. Minhas principais fontes para o resumo que se segue são o trabalho pioneiro de 
Money e Ehrhardt (1972), e os subsequentes avanços obtidos, talvez mais bem resumidos por 
Kolodny e colaboradores (1979), Bancroft (1989) e McConaghy (1993). 
Nos primeiros estágios de seu desenvolvimento, o embrião mamífero tem o potencial para ser 
homem ou mulher. Gônadas indiferenciadas se transformam em testículos ou ovários, dependendo 
do código genético representado pelas diferentes características do padrão cromossômico 46, XY 
para os homens e XX para as mulheres. Gônadas primitivas no ser humano podem ser detectadas 
desde aproximadamente a sexta semana de gestação, quando, sob a influência genética, são 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Q£ 
 
4 Otto F. Kernberg 
segregados hormônios testiculares nos homens: o hormônio inibidor dos dutos de Muller (MIH), 
que possui um efeito desfeminizador na estrutura dos genitais internos femininos, e a 
testosterona, que promove o crescimento dos órgãos masculinos internos e externos, 
particularmente os dutos bilaterais de Wolff. Se estiver presente um código genético feminino, a 
diferenciação ovariana começa na décima segunda semana gestacional. 
A diferenciação sempre ocorre na direção feminina, independentemente da programação 
genética, a menos que esteja presente um nível adequado de testosterona. Em outras 
palavras, mesmo que o código genético seja masculino, uma quantidade inadequada de 
testosterona resultará no desenvolvimento de características sexuais femininas. O princípio da 
feminização tem prioridade em relação à masculinização. Durante a diferenciação feminina 
normal, o primitivo sistema de dutos de Muller se transforma em útero, trompas de Falópio e no 
terço interno da vagina. Nos homens, o sistema de dutos de Muller regride, e o sistema de dutos 
de Wolff se desenvolve, transformando-se nos vasos deferentes, vesículas seminais e dutos 
ejaculatórios. 
Embora os precursores internos dos órgãos sexuais masculinos e femininos estejam ambos 
presentes para desenvolvimento potencial, os precursores dos genitais externos são de um 
único tipo, podendo se transformar ou em órgãos sexuais externos masculinos ou em femininos. 
Sem a presença de níveis adequados de andrógenos (testosterona e di-hidrotestosterona) durante 
o período crítico de diferenciação, começando na oitava semana gestacional, irão desenvolver-se 
um clitóris, vulva e vagina. Mas com a presença de níveis adequados de estimulação andrógena, 
formar-se-á o pênis, incluindo suas glândulas e o saco escrotal, e os testículos irão desenvolver-
se como órgãos intra-abdominais, que normalmente migram para sua posição escrotal durante o 
oitavo ou nono mês de gestação. 
Sob a influência dos hormônios fetais circulantes, ocorre um desenvolvimento dimórfico de 
certas áreas do cérebro após a diferenciação dos genitais internos e externos. O cérebro é 
ambitípico e, nele, o desenvolvimento das características femininas também prevalece, a menos 
que haja um nível adequado de andrógenos circulantes. As funções hipotalâmicas e pituitárias 
específicas que serão diferenciadas no sentido do funcionamento cíclico nas mulheres, e não-
cíclico nos homens, são determinadas por esta diferenciação. A diferenciação masculino/feminino 
do cérebro ocorre somente no terceiro trimestre, após ter ocorrido a diferenciação dos órgãos 
externos, e possivelmente continua seu desenvolvimento durante o primeiro trimestre pós-natal. 
Nos mamíferos não-primatas, a diferenciação hormonal pré-natal do cérebro predetermina o 
subsequente comportamento de acasalamento. Nos primatas, entretanto, a comunicação e 
aprendizagem social inicial são extremamente importantes na determinação do comportamento 
sexual, de modo que o controle do comportamento concreto de acasalamento é determinado 
amplamente pelas primeiras interações sociais. 
As características sexuais secundárias—a distribuição da gordura corporal e pêlos, mudança 
na voz, desenvolvimento dos seios e um significativo crescimento 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Psicopatologia das Relações Amorosas 5 
dos genitais —, que emergem durante a puberdade, são desencadeadas por fatores do sistema 
nervoso central e controladas por um significativo aumento de andrógenos e estrógenos 
circulantes, como o são as funções femininas específicas da menstruação, gestação e lactação. 
Os desequilíbrios hormonais podem alterar as características sexuais secundárias, 
provocando, na falta de andrógenos, a ginecomastia nos homens e, no caso de andrógenos 
excessivos, ohirsutismo, engrossamento da voz e hipertrofia clitoridiana nas mulheres. Mas as 
influências das alterações dos níveis hormonais no desejo e no comportamento sexual são muito 
menos claras. 
Exatamente como o sistema nervoso central afeta o início da puberdade também não está 
claro ainda; a redução na sensibilidade do hipotálamo ao feedback negativo foi considerada um 
dos mecanismos envolvidos (Bancroft, 1989). Nos homens, a disponibilidade inadequada de 
andrógenos circulantes reduz a intensidade do desejo sexual; mas quando os andrógenos 
circulantes estão em níveis normais, ou acima do normal, o desejo e o comportamento sexual são 
notavelmente independentes dessas flutuações. A castração pré-puberal nos meninos que não 
recebem reposição de testosterona leva à apatia sexual. A testosterona exógena durante a 
adolescência, nos homens com fracasso primário de androgenização, restaura o desejo e o 
comportamento sexual normal. A resposta à terapia de reposição com testosterona nos anos 
posteriores, todavia, quando a apatia tornou-se estabelecida, é menos satisfatória: aqui, 
sequências críticas no tempo parecem desempenhar um papel. Da mesma forma, embora estudos 
em mulheres indiquem um desejo sexual aumentado imediatamente antes e depois do fluxo 
menstrual, a dependência do desejo sexual determinada pelas flutuações hormonais é insignificante 
quando comparada aos estímulos psicossociais. De fato, McConaghy (1993) julga que o desejo 
sexual feminino é mais influenciado por fatores psicossociais do que o masculino. 
Nos primatas e em formas inferiores de mamíferos, o interesse sexual, assim como o 
comportamento sexual, é fortemente controlado pelos hormônios. Nos roedores, o comportamento 
de acasalamento é determinado apenas pelo estado hormonal, e uma injeção pós-natal 
inicial de hormônios pode influenciar crucialmente tal comportamento. A castração pós-
puberal leva a um decréscimo gradual da ereção e do interesse sexual, um decréscimo que 
progride por semanas ou anos; a administração de testosterona reverte imediatamente esta 
indiferença. Injeções de andrógenos em mulheres na pós-menopausa aumentam seu desejo 
sexual, sem modificar de maneira nenhuma sua orientação sexual. 
Em resumo, no ser humano os andrógenos parecem influenciar a intensidade do desejo sexual 
tanto nos homens quanto nas mulheres, mas no contexto de uma clara predominância dos 
determinantes psicossociais na excitação sexual. Embora nos mamíferos inferiores, como os 
roedores, o comportamento sexual seja controlado amplamente pelos hormônios, os primatas 
apresentam certa modificação desse controle pelos estímulos psicossociais. Os macacos Rhesus são 
estimulados pelo odor de um hormônio vaginal segregado pela fêmea na época da ovulação; as 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
6 Ofío F. Kernberg 
macacas Rhesus ficam muito interessadas em acasalar-se na época da ovulação, mas também se 
interessam em outros momentos; aqui, novamente, os níveis de andrógenos influenciam a 
intensidade do comportamento sexual apresentado pelas fêmeas. A injeção de testosterona na área 
pré-ótica dos ratos machos desperta neles um comportamento maternal e de acasalamento, mas 
sua copulação com as fêmeas persiste. A testosterona parece liberar o comportamento maternal, 
uma capacidade que o macho contém em seu cérebro e o que fala a favor do controle do sistema 
nervoso central sobre diversos aspectos do comportamento sexual. Este achado biológico sugere 
que o potencial para comportamentos sexuais habitualmente característicos de um género, ou 
característicos de mais de um género, também existem no outro género. 
A intensidade da excitação sexual, a atenção centrada nos estímulos sexuais, as respostas 
fisiológicas de excitação sexual caracterizadas pelo fluxo sanguíneo aumentado, tumescência e 
lubrificação dos órgãos sexuais, estão todas sob influência hormonal. 
A. Fatores Psicossociais 
A discussão precedente abrange aquilo que é quase inequivocamente aceito como biológico; 
passaremos agora a áreas mais controversas, e a áreas ainda longe de ser bem entendidas, em que os 
determinantes biológicos e psicológicos se sobrepõem ou interagem entre si. Uma dessas áreas 
centrais é a que envolve a identidade de género nuclear e a identidade de papel de género. No ser 
humano, a identidade de género nuclear (Stoller, 1975) — isto é, o sentimento do indivíduo de ser ou 
homem ou mulher—é determinado pelo género atribuído a ele por seus cuidadores durante os 
primeiros dois a quatro anos de vida, e não por suas características biológicas. Money 
(1980,1986,1988; Money e Ehrhardt, 1972) e Stoller (1985) ofereceram evidências convincentes a 
este respeito. Da mesma forma, a identidade de papel de género—isto é, a identificação do 
indivíduo com certos comportamentos típicos em homens ou em mulheres numa dada sociedade 
— é também fortemente influenciada por f afores psicossociais. Além disso, a exploração 
psicanalítica revela que a seleção do objeto sexual — o alvo do desejo sexual—também é fortemente 
influenciada pelas experiências psicossociais iniciais. 
No que segue, examino evidências importantes referentes às raízes desses constituintes da 
experiência sexual humana. Em resumo, elas são: 
— Identidade de género nuclear: se a pessoa se considera homem ou mu 
lher. 
— Identidade de papel de género: as atitudes psicológicas e os comporta 
mentos interpessoais específicos — padrões gerais de interação social, 
assim como padrões específicos referentes às interações sexuais — que 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Psicopatologia das Relações Amorosas 7 
são característicos ou dos homens ou das mulheres, e portanto os diferenciam. 
A seleção de um objeto sexual, quer heterossexual quer homossexual, quer centrada numa ampla 
variedade de interações sexuais com o objeto sexual, quer restrita a uma determinada parte da 
anatomia humana, não-humana ou objeto inanimado. 
A intensidade do desejo sexual, expressada pela dominância de fantasias sexuais, estado de alerta 
aos estímulos sexuais, desejos de se engajar em comportamentos sexuais e excitação fisiológica dos 
órgãos genitais. 
B. Identidade de Género Nuclear 
Money e Ehrhardt (1972) oferecem evidências de que os pais, em circunstâncias comuns, 
mesmo que acreditem estar tratando um bebé do sexo masculino ou um bebé do sexo feminino 
exatamente da mesma maneira, apresentam diferenças determinadas pelo género no seu 
comportamento em relação ao bebé. Embora existam diferenças homem/mulher baseadas na 
história hormonal pré-natal, estas diferenças não predeterminam automaticamente a diferenciação 
pós-natal homem/ mulher: a patologia hormonal f eminizadora nos homens ou a patologia 
hormonal masculinizante nas mulheres, exceto em condições de um grau extremo de anor-
malidade hormonal, podem influenciar mais a identidade de papel de género do que a identidade 
de género nuclear. 
Andrógenos em excesso, no período pré-natal da menina, podem ser responsáveis, por 
exemplo, por molecagens mais características de meninos e maior gasto de energia em recreação e 
agressão. Uma inadequada estimulação androgênica pré-natal nos meninos pode provocar uma 
certa passividade e não-agressividade, mas não influencia a identidade de género nuclear. 
Além disso, as crianças hermafroditas que são criadas sem nenhuma ambiguidade como 
meninos ou meninas irão desenvolver uma sólida identidade como homens ou mulheres em con-
sonância com as práticas de sua educação, independentemente de sua dotação genética, 
produção hormonal e inclusive—até certo ponto—da aparência externa do seu desenvolvimento 
genital (Meyer, 1980; Money e Ehrhardt, 1972). 
Stoller (1975), Person e Ovesey (1983,1984) exploraram o relacionamento entre a patologia 
inicial na interação entre a criança e os pais e a consolidação daidentidade de género nuclear. O 
estudo do transexualismo — isto é, o estabelecimento de uma identidade de género nuclear 
contrária à biológica em indivíduos com um género biológico claramente definido—não mostrou 
que ele está relacionado a anormalidades genéticas, hormonais ou genitais físicas. Embora a 
pesquisa sobre sutis variáveis biológicas, particularmente nas transexuais mulheres, levante a 
possibilidade de algumas influências hormonais, a evidência esmagadora é a favor de uma severa 
patologia nas primeiras interações psicossociais. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Em relação a isso, a investigação psicanalítica com crianças com identidade sexual anormal, 
assim como a história de transexuais adultos, proporciona informações sobre os padrões 
significativos primeiramente descritos por Stoller (1975). Estes incluem, para os transexuais homens 
(homens biológicos que sentem ter uma identidade nuclear de mulher), uma mãe com fortes 
componentes bissexuais de personalidade, mantendo-se distante de um marido passivo ou não-
disponível, e que engolfa seu filho como se este lhe provasse, simbolicamente, a identidade 
sexual complementar que lhe faltasse. Esta simbiose idílica com a mãe que implicitamente elimina 
a masculinidade do menino, levando-o, simultaneamente, a uma excessiva identificação com a mãe 
e à rejeição do papel masculino sentido como inaceitável para a mãe e inadequadamente 
modelado pelo pai. Nas transexuais mulheres, o comportamento rechaçante da mãe em relação à 
filhinha e a ausência de um pai disponível impulsionam a menina, que não se sente reforçada 
enquanto menininha, a tornar-se um homem substituto, para com isto aliviar o sentimento de 
solidão e depressão da mãe. Este comportamento masculino é encorajado pela mãe, cujo 
desespero se alivia, e conduz a uma melhor solidariedade familiar. 
O comportamento inicial dos pais, particularmente o da mãe, que influencia a identidade de 
género nuclear e o funcionamento sexual em geral não é exclusivo dos seres humanos. O trabalho 
clássico de Harlow e Harlow (1965) com primatas demonstrou que um apego adequado através 
de um contato seguro, fisicamente próximo entre o bebé e a mãe, é essencial para o 
desenvolvimento de uma resposta sexual normal nos macacos adultos: a ausência de uma 
maternagem normal e, secundariamente, de interação com grupos de iguais em fases 
desenvolvimentais críticas perturba a capacidade de resposta sexual na idade adulta. Esses 
macacos permaneceram também desajustados em outras interações sociais. 
Embora Freud (1905,1933) propusesse umabissexualidade psicológica para ambos os 
géneros, ele postulou também que a mais primitiva identidade genital, tanto para os meninos 
quanto para as meninas era masculina. Propôs que as meninas — primeiro fixadas no clitóris como 
uma fonte de prazer paralela ao pênis do homem—mudavam de sua identidade genital primária (e 
orientação homossexual implícita) da mãe para o pai, numa orientação edípica positiva, como 
uma expressão do desapontamento por não ter um pênis, por sua ansiedade de castração e pelo 
desejo simbólico de repor o pênis através de um filho do pai. Stoller (1975, 1985), entretanto, 
sugeriu que, dado o intenso apego e relacionamento simbiótico com a mãe, a identificação 
primitiva tanto dos bebés do sexo masculino quanto do feminino seria feminina, com uma 
mudança gradual (como parte da separação-individuação) no bebé do sexo masculino, de uma 
identidade feminina para uma identidade masculina. Mas Person e Ovesey (1983,1984), com base 
em estudos de pacientes com orientação homossexual, travestismo e transexualismo, postularam 
uma identidade de género original que é tanto masculina ou feminina desde o princípio. 
Acredito que essa opinião concorda com os estudos da identidade de género nuclear nos 
hermafroditas, realizados por Mayer (1988), Money e Ehrhardt (1972), 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Psicopatologia das Relações Amorosas 9 
assim como com as observações das interações entre as mães e os bebés de ambos os sexos desde o 
início da vida, e com as observações psicanalíticas de crianças normaise de crianças com 
transtornos sexuais, particularmente quando esses estudos psicanalíticos levam em consideração as 
orientações sexuais conscientes e inconscientes dos pais (Galenson, 1980; Stoller, 1985). 
Braunschweig e Fain (1971,1975), em concordância com a hipótese de Freud de uma 
bissexualidade original em ambos os géneros, argumentam persuasivamente em favor de uma 
bissexualidade psicológica derivada da identificação inconsciente do bebé com ambos os pais, 
uma identificação bissexual inconsciente que é controlada pela natureza da interação mãe/bebé, 
dentro da qual a identidade de género nuclear é estabelecida. Money e Ehrhardt (1972) afirmam 
que não importa "se o pai faz o jantar e a mãe dirige o trator", isto é, os papéis de género 
socialmente definidos que são executados pelos pais são irrelevantes, na medida em que sua 
identidade de género como homem ou mulher esteja solidamente diferenciada. 
A atribuição e a adoção de uma identidade de género nuclear determina, na prática, o 
reforço de papéis de género que são socialmente considerados masculinos ou femininos. Na 
medida em que haja uma identificação inconsciente com ambos os pais, portanto uma 
bissexualidade inconsciente, o que é um achado universal na investigação psicanalítica, isto 
também implica na identificação inconsciente com papéis socialmente atribuídos a um ou outro 
género, fazendo com que existam fortes tendências para a ocorrência de atitudes e padrões de 
comportamento bissexuais, assim como para que uma orientação bissexual seja um potencial 
humano universal. Provavelmente a forte ênfase social e cultural na identidade de género nuclear 
("Você deve ser ou um garotinho ou uma garotinha") é reforçada ou codeterminada pela 
necessidade intrapsíquica de integrar e consolidar uma identidade pessoal em geral, de modo 
que a identidade de género nuclear cimenta a formação da identidade básica do ego; nuclear; 
Lichtenstein (1961) sugeriu há muitos anos que a identidade sexual pode constituir a base da 
identidade do ego. Clinicamente, nós descobrimos que uma falta de integração da identidade 
(a síndrome de difusão de identidade) coexiste regularmente com problemas de identidade de 
género e, conforme Ovesey e Person (1973, 1976) enfatizaram, os transexuais normalmente 
também apresentam severas distorções em outras áreas da sua identidade. 
C. Identidade de Papel de Género 
Em seu clássico estudo das diferenças de género, Maccoby e Jacklin (1974) concluíram, com 
base no exame de uma enorme quantidade de dados, que existiam crenças totalmente infundadas 
sobre essas diferenças de género; outras crenças acabaram bastante estabelecidas, e outras 
ainda se encontravam abertas a questionamentos ou eram ambíguas. Crenças infundadas sobre 
diferenças de gê- 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
10 Otto F. Kernberg 
nero incluem a suposição de que as meninas são mais "sociais" do que os meninos, mais 
"sugestionáveis", têm menor auto-estima, carecem de motivação para maiores realizações, são 
melhores em aprendizagem mecânica e tarefas repetitivas simples, ao passo que os meninos são 
melhores em tarefas que requerem um processamento cognitivo mais elevado e a inibição de 
respostas anteriormente aprendidas; que os meninos são mais "analíticos", que as meninas são 
mais afeta-das pela hereditariedade, os meninos pelo ambiente, que elas são "auditivas" e eles, 
"visuais". 
Por outro lado, diferenças de género que estão bem estabelecidas incluem o seguinte: que 
as meninas possuem uma capacidade verbal maior do que a dos meninos, que eles as superam 
em capacidade visual-espacial e em capacidade matemática, e que os homens são maisagressivos. Permanecem em aberto as questões referentes a diferenças em sensibilidade tátil, medo, 
timidez e ansiedade; nível de atividade, competitividade, dominância, obediência, 
disponibilidade, e capacidades em relação a comportamento "maternal". 
Quais das diferenças psicológicas são geneticamente determinadas, quais são socialmente 
determinadas por agentes socializadores e quais espontaneamente aprendidas através da 
imitação? Maccoby e Jacklin argumentam, e há muitas evidências para apoiá-los, que os fatores 
biológicos estão claramente implicados nas diferenças de género referentes à agressão e 
capacidade visualespacial. Existem evidências de maior agressividade masculina tanto nos seres 
humanos quanto nos primatas subumanos; isso parece ser universal em todas as culturas, e as 
evidências sugerem que os níveis de agressão são responsivos aos hormônios sexuais. É 
provável que a predisposição masculina para a agressão se estenda a outros comportamentos, tais 
como dominância, competitividade e nível de atividade, mas as evidências não são decisivas. 
Maccoby e Jacklin também concluem que uma característica geneticamente controlada pode 
assumir a forma de uma maior predisposição para apresentar um determinado tipo de 
comportamento. Isto inclui comportamentos aprendidos, embora não se limite apenas a eles. 
Friedman e Downey (1993) revisaram as evidências sobre a influência da patologia 
hormonal pré-natal virilizadora nas meninas, em relação ao comportamento sexual pós-natal. 
Examinaram os achados de um estudo sobre meninas com hiperplasia congénita da suprarenal, e 
sobre meninas cujas mães ingeriram, durante a gravidez, drogas com atividade de esteróides 
sexuais. Essas crianças foram criadas como meninas, mas, embora sua identidade de género 
nuclear fosse feminina, a pergunta era até que ponto a dominância dos hormônios masculinos 
pré-natais influenciaria esta identidade de género e a identidade de papel de género durante a 
infância e adolescência. 
Embora tenha sido encontrada uma modesta associação de andrógenos pré-natais 
excessivos e uma maior prevalência de homossexualidade, mais significativo foi o achado de que, 
independentemente das circunstâncias de educação, as meninas com hiperplasia congénita da 
supra-renal apresentavam um comportamento mais "moleque", interessavam-se menos por 
brincar combonecas ebebês e 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Psicopatologia das Relações Amorosas 11 
por adornos, e tendiam a preferir brinquedos como carrinhos e armas, mais do que os sujeitos-
controle. Elas tinham uma maior preferência por meninos como companheiros de brincadeiras, e 
apresentavam maior gasto de energia e mais atividade violenta nas brincadeiras. Os achados 
sugerem que o comportamento de papel de género na infância é influenciado por f atores 
hormonais pré-natais. Friedman (comunicação pessoal) concorda com Maccoby e Jacklin (1974) que 
a vasta maioria dos traços que diferenciam os meninos das meninas são, muito provavelmente, 
determinados pela cultura. 
Richard Green (1976) estudou a criação de meninos efeminados: descobriu que os fatores 
dominantes que codeterminavam o desenvolvimento de comportamentos efeminados eram a 
indiferença dos pais em relação ao comportamento feminino do filho ou o encorajamento desse 
comportamento; também ocorria das crianças serem vestidas de mulher pela mãe ou por uma 
mulher funcionando como tal, superproteção materna, ausência ou rejeição do pai, a beleza física 
da criança ou a ausência de companheiros de brincadeiras do sexo masculino. O aspecto comum 
crucial parecia ser a incapacidade dos pais ou do ambiente de desencorajar o comportamento 
feminino da criança. Os resultados para esses meninos efeminados, no seguimento, foi uma alta 
porcentagem de bissexualidade e homossexualidade, atingindo 75% no seguimento de 2/3 da 
amostra original (Green, 1987). 
Comportamentos característicos do outro género — moleque nas meninas, efeminado nos 
meninos — estão frequente, mas não necessariamente, vinculados a uma escolha de objeto 
homossexual. De fato, poderíamos considerar a identidade de papel de género relacionada tão 
estreitamente à identidade de género nuclear quanto à escolha de objeto: uma orientação sexual 
dirigida para o próprio género da pessoa pode influenciar a adoção de papéis socialmente 
identificados com o outro género. E, ao contrário, uma aculturação predominantemente em 
direção a papéis de género que coincidem com os do outro género poderia predispor à ho-
mossexualidade. O que nos leva ao próximo elemento constituinte, ou seja, à escolha de objeto. 
D. A Escolha do Objeto Dominante 
Money (1980) e Perper (1985) empregaram o termo modelos organizadores do 
comportamento humano ao referir-se ao objeto da excitação sexual do indivíduo. Perper acredita 
que esses modelos não estão codificados, mas derivam-se de processos desenvolvimentais, 
incluindo a regulação genética do desenvolvimento neural e a posterior construção 
neurofisiológica da imagem do outro desejado. Money chama demapas do amor o 
desenvolvimento dos objetos sexuais que seleci-onamos; ele os vê como derivados dos 
esquemas implantados no cérebro e complementados pelo input ambiental antes dos 8 anos de 
idade. Não podemos deixar de notar que a linguagem desses distinguidos pesquisadores do 
primitivo desenvolvimento sexual humano permanece num nível muito geral quando estão 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
12 Otto F. Kernberg 
discutindo a natureza da escolha do objeto sexual. Um achado impressivo de qualquer revisão da 
literatura é que, em contraste com a extensiva pesquisa sobre a identidade de papel de género 
e a identidade de género nuclear, muito pouca pesquisa, se é que alguma, foi feita sobre as 
experiências sexuais das crianças. 
Por trás dessa carência na pesquisa atual e em conhecimentos bem documentados está, eu 
acredito, a persistência do tabu contra o reconhecimento da existência da sexualidade infantil que 
Freud tão ousadamente desafiou. Esse tabu está vinculado às proibições ao comportamento 
sexual infantil em nossa cultura. A antropologia cultural (Endleman, 1989) oferece evidências 
de que, quando essas proibições culturais não estão presentes, as crianças espontaneamente se 
engajam em variados comportamentos sexuais. Galenson e Roiphe (1974), observando crianças 
num contexto naturalista de um berçário, descobriu que os meninos começam a brincar com seus 
genitais por volta do sexto ou sétimo mês, as meninas no décimo ou décimo primeiro mês e que a 
masturbação está estabelecida por volta dos 15 ou 16 meses, para ambos os géneros. As crianças 
da classe trabalhadora apresentam uma probabilidade duas vezes maior de se masturbar do que 
as de classe média, sugerindo que a estrutura de classe e a cultura influenciam o comportamento 
sexual. 
Fisher (1989) relatou como a capacidade das crianças de pensar logicamente sobre seus 
genitais está dramaticamente atrasada comparada com o nível geral de sua lógica, como as meninas 
tendem a ignorar seu clitóris e mistificar a natureza da vagina, e como os pais inconscientemente 
repetem com seus filhos suas próprias experiências de supressão sexual na infância. Também há 
evidências de apreciável ignorância em relação a questões sexuais durante toda a adolescência. 
Money e Ehrhardt (1972) e Bancroft (1989) referem que há um medo universal de investigar a 
sexualidade infantil. No entanto, com a atual e crescente preocupação pública com o abuso sexual 
das crianças, Bancroft sugere (página 152) que seja concebível "que a necessidade de um melhor 
entendimento da sexualidade infantil venha a ser mais amplamente reconhecida, e que as 
pesquisas neste aspecto da infância possam tornar-se mais fáceis de executar no futuro". Mesmo a 
psicanálise, até recentemente, não havia ainda descartado oconceito dos "anos de latência" 
como uma fase durante a qual haveria muito pouco interesse e atividade sexual. Há atualmente 
uma consciência crescente entre os analistas infantis de que os assim chamados anos de latência 
não sejam tão caracterizados por uma redução do interesse ou atividade sexual, mas sim por um 
maior controle e supressão internalizados do comportamento sexual (Paulina Kernberg, 
comunicação pesso-ai). 
As evidências, parece-me, apontam esmagadoramente para os fatores psicológicos, ou 
melhor, psicossociais, como determinantes na constituição da identidade de género nuclear, para as 
influências psicossociais como tendo um papel significativo, se não exclusivo, na identidade de 
papel de género, embora sejam menos claras as evidências de que tais fatores influenciem 
decisivamente a escolha do 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Psicopatologia das Relações Amorosas 13 
 
 
objeto sexual. A vida sexual dos primatas nos fala da importância da aprendizagem inicial, do conta 
to mãe-bebê, e das relações com os iguais no desenvolvimento do comportamento sexual e do papel 
relativo decrescente dos hormônios na determinação da escolha do objeto sexual, em comparação 
com os mamíferos não-primatas. No bebé humano, como vimos, estes processos evoluem ainda 
mais. 
Meyer (1980) sugeriu que, assim como o bebé e a criança pequena se identificam 
inconscientemente com o genitor do mesmo género ao estabelecer as identidades de género nuclear e 
de papel de género, ele ou ela também se identificam com o interesse sexual deste genitor pelo outro. 
Money e Ehrhardt (1972) também enfatizam que as regras do comportamento masculino/feminino são 
aprendidas, e enfatizam a identificação da criança com aspectos recíprocos e complementares do 
relacionamento dos homens e mulheres. A notável evidência clínica do mútuo comportamento 
sedutor entre a criança e os seus pais é frequentemente ignorada nos estudos académicos da 
identidade de género e do papel de género, talvez em virtude do persistente tabu cultural contra a 
sexualidade infantil. 
Duas contribuições específicas das observações e teoria psicanalítica são relevantes nessas 
questões. A primeira é uma teoria psicanalítica das relações objetais que permite a incorporação dos 
processos de identificação e da complementaridade dos papéis em um modelo único de 
desenvolvimento. Á segunda, a teoria de Freud do complexo de Édipo, discuto posteriormente em outro 
contexto. Aqui me refiro a trabalhos anteriores, em que propus que a formação da identidade origina-
se do primitivo relacionamento entre o bebé e a mãe, particularmente quando as experiências do bebé 
envolvem intenso afeto, quer prazeroso, quer doloroso. 
Os traços de memória que se estabelecem sob essas condições afetivas deixam o esquema 
nuclear da representação doselfdo bebé interagindo com a representação de objeto da mãe, sob o 
impacto ou de um afeto prazeroso ou de um afeto desagradável. Em consequência, formam-se duas 
séries paralelas, e originalmente separadas, de representações doselfe do objeto e suas correspondentes 
disposições afetivas positiva e negativa. Essas representações, respectivamente "totalmente boas" e 
"totalmente más" do se//e do objeto, finalmente se integram em numa representação do self to tal e 
em uma representação total de outras pessoas significativas, um processo que constitui a integração 
normal da identidade. Em escritos anteriores (Kernberg, 1976,1980,1992) também enfatizei minha 
convicção de que a identidade é constituída por identificações feitas a partir da relação com um 
objeto, e não com o próprio objeto. Esta suposição implica uma identificação com o self e o outro 
interagindo entre si, e uma internalização dos papéis recíprocos dessa interação. O estabelecimento da 
identidade de género nuclear — isto é, de um conceito integrado de self que define a identificação da 
pessoa com um género ou outro—não pode ser visto separado do estabelecimento de um conceito 
integrado e correspondente de um outro que inclua um relacionamento com este outro como objeto 
sexual desejado. Este vínculo entre identidade de género nuclear e a escolha do objeto sexualmente 
desejado explica, ao mesmo tempo, a intrínseca 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
14 Otto F. Kernberg 
bissexualidade do desenvolvimento humano: nós nos identificamos tanto com o nosso próprio self 
quanto com nosso objeto de desejo. 
Na medida em que a criança do sexo masculino, por exemplo, experiência a si mesma como um 
filho homem amado por sua mãe, ela se identifica com o papel de filho homem ao mesmo tempo que 
com o papel de mãe mulher, e adquire a capacidade, em relacionamentos posteriores, de atualizar 
sua representação dosei/ enquanto projeta a representação da mãe em outra mulher, ou de 
representar — em certas circunstâncias — o papel da mãe, enquanto projeta sua representação do self 
em outro homem. A dominância da representação do self como filho homem, como uma parte da 
identidade do ego, assegurará a dominância de uma orientação heterossexual (incluindo a busca 
inconsciente da mãe em todas as outras mulheres). A dominância da identificação com a 
representação da mãe pode determinar um tipo de homossexualidade nos homens (Freud, 1914). 
Na garotinha, na medida ení que seu primeiro relacionamento com a mãe cimenta sua 
identidade de género nuclear, ao identificar-se tanto com seu próprio papel quanto com o papel da 
mãe na sua interação, seu desejo posterior de substituir o pai como objeto amoroso da mãe, assim como 
sua escolha positiva do pai na relação edípica, consolidam sua identificação inconsciente também com 
o pai. Ela portanto também estabelece uma identificação bissexual inconsciente. A identificação com 
um relacionamento, e não com uma pessoa, e a construção de predisposições recíprocos de ambos os 
papéis na mente inconsciente, sugerem que a bissexualidade é psicologicamente determinada, e 
expressa na capacidade de se adquirir, ao mesmo tempo, tanto uma identidade de género nuclear 
quanto um interesse sexual pela pessoa do mesmo ou do outro género. Isto também facilita a 
integração dos papéis de género do outro género com o nosso próprio, e a identificação com papéis de 
género socialmente transmitidos, correspondentes ao nosso próprio género e ao outro. 
Esta visão do início da sexualidade sugere que o conceito de Freud (1933) de uma bissexualidade 
original estava correto, assim como seu questionamento do aparente vínculo entre a sexualidade e 
as diferenças estruturais biológicas dos géneros conhecidas em sua época. Em outras palavras, nós 
ainda não temos provas de que haja uma conexão direta entre a predisposição anatómica dimórfica 
para a bissexualidade e a bissexualidade psíquica derivada das primitivas experiências da criança. 
E. Intensidade do Desejo Sexual 
Como vimos, os mecanismos biológicos do interesse sexual, excitação sexual e intercurso sexual, 
incluindo o orgasmo, são relativamente bem conhecidos. É o estímulo que evoca a resposta sexual, 
embora a qualidade subjetiva assumida pela excitação ainda seja uma questão em aberto. Igualmente, 
nós ainda carecemos de 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Psicopatologia das Relações Amorosas 15 
um consenso em relação a como medir os fatores quantitativos da intensidade da excitação. Um outro 
problema é o estudo comparativo da excitação masculina e feminina; novamente, embora seus 
concomitantes fisiológicos sejam bem conhecidos, suas semelhanças e diferenças psicológicas 
permanecem controvertidas. 
Resumindo o que examinei anteriormente, um nível adequado de andrógenos circulantes parece 
ser pré-requisito para a capacidade humana de resposta sexual, influenciando o desejo sexual tanto 
nos homens quanto nas mulheres; mas em níveis hormonais normal eacima do normal, o desejo e o 
comportamento sexuais são notavelmente independentes destas flutuações hormonais. 
Nos seres humanos, o fator dominante que determina a intensidade do desejo sexual é cognitivo 
— a consciência do interesse sexual refletido em fantasias sexuais, lembranças e a atenção aos 
estímulos sexuais. Mas experiência não é puramente "cognitiva", pois ela contém também um forte 
elemento afetivo. De fato, a experiência sexual é acima de tudo uma experiência afetivo-cognitiva. 
Fisiologicamente, a memória afetiva está relacionada ao sistema límbico, que é o substrato 
neural da sexualidade, assim como de outras funções apetitivas (Maclean, 1976). Estudos de 
animais demostraram que áreas límbicas selecionadas determinam a ereção e a ejaculação, e a existência 
tanto de mecanismos de excitação como de inibição que afetam a resposta periférica da ereção. 
Comportamentos de cópula em macacos Rhesus do sexo masculino foram induzidos por estimulação 
elétrica do hipotálamo lateral e do núcleo dorsomedial do hipotálamo, levando a sequências de coito e 
ejaculação enquanto os macacos tinham liberdade para movimentar-se. 
De acordo com Bancroft (1989), a excitação sexual humana é uma resposta global que inclui 
fantasias, memórias e desejos sexuais específicos, assim como uma maior percepção e busca de 
estímulos externos ref orçadores, que são relativamente específicos da orientação sexual do indivíduo. A 
excitação sexual, de acordo com Bancroft, inclui o sistema límbico sob a influência desse estado 
cognitivo-afetivo, que estimula o centro medular e os centros de controle neural periférico, que 
determinam a tumescência, lubrificação e sensibilidade local aumentada dos órgãos genitais, 
proporcionando umfeedback central da percepção dessa ativação genital. O que, por minha parte, 
sugiro é que a excitação sexual é também um afeto específico, que preenche todas as características de 
outras estruturas afetivas, e que constitui o "bloco construtor" central do impulso sexual ou libidinal, 
como um sistema motivacional global. 
A terminologia nesta área talvez precise de um certo esclarecimento. Biologi-camente, a resposta 
sexual pode ser dividida em interesse sexual, excitação sexual e orgasmo. Entretanto, já que o 
interesse sexual pode ocorrer sem a ativação das respostas genitais específicas, e são possíveis estas 
respostas genitais com um limitado ou mínimo interesse sexual, parece preferível empregar o 
termointeresse sexual para nos referirmos a uma percepção ampla do estímulo sexual, pelo pensar a 
respeito, estar interessado e responder a ele.Excitaçãogenital refere-se ao desenvol- 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
16 Otto F. Kernberg 
vimento de uma resposta genital plena: a tumescência vascular conduzindo à ere-ção no homem e aos 
correspondentes processos eréteis e lubrificação vaginal na mulher, com turgescência secundária dos 
seios e ereção dos mamilos. 
Excitação sexual parece um termo apropriado para a resposta total, incluindo os aspectos 
cognitivos específicos e a experiência subjetiva de interesse sexual, excitação genital, orgasmo e os 
correspondentes aspectos neurovegetativos e de expressões faciais (parte do que Freud chamou de 
processo de descarga) desse afeto. Considero a excitação sexual, por sua vez, como sendo o afeto 
básico de um fenómeno psicológico mais complexo, a saber, o desejo erótico, em que a excitação sexual 
está vinculada a um relacionamento emocional com um objeto específico. Examinemos entre a 
natureza da excitação sexual e sua elaboração até o desejo erótico. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
C a p í t u l o 2 
Excitação Sexual e Desejo Erótico 
 i afetos são, em termos filogenéticos, relativamente recentes, característi-os dos 
mamíferos, com a função biológica básica de comunicação entre o »ebê e quem o cuida, 
além da comunicação geral entre indivíduos, a serviço dos instintos básicos (Krause, 1990). Se 
alimentar-se, lutar ou fugir e acasalar-se são organizações instintivas básicas, os correspondentes 
estados afetivos podem ser considerados como componentes seus, que adquirem papéis 
hierarquicamente superiores conforme ascendemos na escada evolutiva, particularmente nos primatas, e, 
é claro, nos seres humanos. 
A excitação sexual ocupa um lugar muito especial entre os afetos. Parece óbvio que ela tem 
raízes em funções biológicas e em estruturas que servem ao instinto básico da reprodução no reino 
animal e que ela ocupa, igualmente, uma posição central na experiência psicológica humana. Mas a 
excitação sexual não se desenvolve tão cedo e não é tão uniforme em suas manifestações quanto os 
afetos primitivos como a raiva, alegria, tristeza, surpresa ou nojo. Em seus constituintes cognitivos e 
subjetivos, ela se assemelha aos afetos mais complexos como orgulho, vergonha, culpa ou desprezo. 
A psicanálise, assim como a observação de bebés psicanaliticamente inspirada, nos forneceu 
abundante evidência de que a excitação sexual se origina no contexto das experiências prazerosas dos 
primeiros relacionamentos intrafamiliares, especialmente os do bebê-cuidadores, culminando na 
centralidade madura das sensações genitais da puberdade e adolescência. A difusa sensibilidade da 
pele envolvida no comportamento de apego inicial, as qualidades sexualmente excitan- 
17 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Q 
 
18 Otto F. Kernberg 
tes daquilo que Freud descreveu como as zonas erotogênicas, 
osimprints* cognitivos e os desenvolvimentos da fantasia inconsciente 
vinculados a uma ativação afetiva prazerosa desde quando bebé, e daí 
em diante culminam na experiência cognitivo-afetiva específica de 
excitação sexual. 
O foco específico, consciente e inconsciente, da escolha de 
objeto sexual do indivíduo transforma a excitação sexual no desejo 
erótico. O desejo erótico inclui um desejo de relacionamento sexual 
com um determinado objeto. A excitação sexual, entretanto, não 
deixa de ter objeto. Como acontece com outros afetos, ela existe em 
relação a um objeto, mas aqui o objeto é um "objeto parcial" 
primitivo, inconscientemente refletindo as experiências fusionais da 
simbiose e os desejos de fusão da fase mais primitiva da separação-
individuação. 
Em suas origens, no primeiro e segundo anos de vida, a 
excitação sexual é difusa e vinculada à estimulação das zonas 
erógenas. Em contraste, o afeto do desejo erótico é mais elaborado, 
e a natureza específica da relação de objeto é cognitivamente mais 
diferenciada. 
O desejo erótico é caracterizado pela excitação sexual 
vinculada ao objeto edípico; o desejo é de uma fusão simbiótica com 
o objeto edípico no contexto da fusão sexual. Em circunstâncias 
normais, a excitação sexual no indivíduo maduro é ativada no 
contexto do desejo erótico, de modo que a distinção feita por mim 
entre estes dois afetos pode parecer forçada ou artificial. Mas em 
circunstâncias patológicas, tais como em patologias narcísicas 
graves, o desmantelamento do mundo interno das relações objetais 
pode levar à incapacidade de desejo erótico, com uma excitação 
sexual que se expressa como manifestação aleatória, difusa, não-
seletiva e perpetuamente insatisfeita, ou, inclusive, com a ausência da 
capacidade de experienciar qualquer excitação sexual que seja. 
O amor sexual maduro, conforme discutiremos nos capítulos 
seguintes, expande o desejo erótico para um relacionamento com uma 
pessoa específica, em que a ativação de relacionamentos 
inconscientes do passado e as expectativas conscientes de uma vida 
futura como casal se combinam com a ativação de um ideal do ego 
conjunto. O amor sexual maduro implica num comprometimentona esfera dos' sistemas sexual, emocional e de valores. 
As definições propostas imediatamente levantam certas 
perguntas: se a excitação sexual e o desejo erótico se desenvolvem 
no contexto do relacionamento primitivo entre o bebé e o seu 
cuidador e da situação edípica em desenvolvimento, eles são 
secundários ao desenvolvimento dessas relações objetais? As 
disposições biológicas são "recrutadas", por assim dizer, a serviço do 
mundo em desenvolvimento das relações objetais internalizadas e 
reais? Ou é a gradual maturação do aparelho biológico que permite o 
desenvolvimento da excitação sexual, quem irá organizar as relações 
objetais primitivas e mais maduras. Aqui, entramos no território 
controverso da teoria psicanalítica que se refere aos 
relacionamentos entre 
* Respostas comportamentais adquiridas cedo na vida, não reversíveis, e 
normalmente liberadas por certos estímulos ou situações desencadeadoras. (N. do 
T.) 
 
 
Psicopatologia das Relações Amorosas 19 
instintos biológicos, impulsos psicológicos e relações objetais internalizadas. Será necessário 
explorar essas questões antes de retornarmos às estruturas cognitivas particulares envolvidas no 
desejo erótico — as primitivas estruturas de fantasia que transformam a excitação sexual no 
desejo erótico. 
Instintos, Impulsos, Afetos e Relações Objetais 
Conforme Holder (1970) salientou, Freud diferenciou claramente os impulsos dos instintos. 
Ele via os impulsos como motivadores psicológicos do comportamento humano, constantes em 
vez de intermitentes. Por outro lado, concebia os instintos como biológicos, herdados e 
intermitentes, no sentido de terem de ser ativados por fatores fisiológicos e/ou ambientais. A 
libido é um impulso, a fome é um instinto. 
Laplanche e Pontalis (1973) enfatizam adequadamente como Freud sempre se referiu aos 
instintos como padrões de comportamento intermitentes, herdados, que variam um pouco de um 
membro da espécie para outro. É impressionante ver quão estreitamente o conceito de instinto de 
Freud se assemelha à moderna teoria do instinto na biologia, conforme representada, por 
exemplo, por Lorenz (1963), Tinbergen (1951) e Wilson (1975). Esses investigadores 
consideram os instintos como organizações hierárquicas de padrões perceptivos, 
comportamentais e comunicativos biologicamente determinados, liberados por fatores 
ambientais que ativam mecanismos inatos. Este sistema biológico-ambiental é considerado 
epigenético. Conforme Lorenz e Tinbergen ilustraram em sua pesquisa com animais, a 
organização do vínculo maturacional e desenvolvimental de padrões de comportamento inatos 
distintos, em um determinado indivíduo, é muito determinada pela natureza da estimulação 
ambiental. Os instintos, nesta visão, são sistemas biológicos motivadores hierarquicamente 
organizados. Normalmente classificados na linha dos comportamentos alimentares, de luta ou 
fuga, ou de acasalar-se (e talvez ao longo de outras dimensões parecidas), eles representam a 
integração entre as disposições inatas e os processos de aprendizagem determinados pelo 
ambiente. 
Embora Freud reconhecesse as fontes biológicas básicas dos impulsos, repetidamente 
enfatizou a falta de informações disponíveis referentes aos processos que transformariam essas 
predisposições biológicas em motivação psíquica. Seu conceito de libido ou de impulso sexual era 
o de uma organização hierarquicamente pré-ordenada a integrava impulsos sexuais "parciais" 
desenvolvimentalmente mais primitivos. A teoria dual dos impulsos, da sexualidade e agressão 
(1920) representa sua concepção final dos impulsos como a fonte fundamental do conflito 
psíquico inconsciente e da formação das estruturas psíquicas. Freud descreveu as fontes 
biológicas dos impulsos sexuais de acordo com a excitabilidade das zonas erotogênicas, mas não 
descreveu as fontes biológicas tão concretas assim para a agressão. Em contraste com as fontes 
fixas da libido, caracterizou os objetivos e 
 
20 Otto F. Kernberg 
objetos tanto dos impulsos sexuais quanto dos agressivos como 
mutáveis durante todo o desenvolvimento psíquico: a continuidade 
desenvolvimental das motivações sexuais e agressivas poderia assim 
ser reconhecida numa ampla variedade de desenvolvimentos 
psíquicos complexos. 
Freud propôs (1915a,b) que os impulsos se manifestavam por 
meio de representações psíquicas, ou ideias — que configurariam a 
expressão cognitiva do impulso — e de um afeto. Quanto aos 
afetos, Freud modificou sua definição deles pelo menos duas vezes 
(Rapaport, 1953). Originalmente (1894) considerou os afetos como 
equivalentes aos impulsos; mais tarde (1915a,b), concebeu-os como 
produtos da descarga dos impulsos (particularmente seus aspectos 
prazerosos ou dolorosos, psicomotores e neurovegetativos).Estes 
processos de descarga podem atingir a consciência, mas não sofrem 
repressão; somente a representação mental do impulso é reprimida, 
juntamente com a memória ou com a disposição para a ativação do 
afeto correspondente. Finalmente (1926), Freud descreveu os afetos 
como disposições inatas do ego (no que se refere a seus limiares 
de ativação e canais de expressão e enfatizou suas funções 
sinalizadoras. 
Se os afetos e as emoções (isto é, afetos cognitivamente 
elaborados) são estruturas complexas, incluindo experiências 
subjetivas de dor ou prazer associadas com ingredientes cognitivos 
e expressivo-comunicativos específicos e padrões de descarga 
neurovegetativa, e se eles estão presentes — como os 
pesquisadores de bebés descobriram (Emde, 1987; Emde e 
colaboradores, 1978; Izard, 1978; Stern, 1985) — desde as 
primeiras semanas e meses de vida, serão então os afetos as 
principais forças motivacionais do desenvolvimento psíquico? Se eles 
incluem tanto componentes cognitivos quanto afetivos, o que resta no 
conceito mais amplo de impulso que não está contido no conceito de 
afeto? Freud concluiu que os impulsos estão presentes desde o 
nascimento, mas também concluiu que eles amadurecem e se 
desenvolvem. Poderíamos argumentar que a maturação e o 
desenvolvimento dos afetos são expressões dos impulsos 
subjacentes, mas se todas as funções e manifestações dos impulsos 
podem ser incluídas nas funções e manifestações dos afetos em 
desenvolvimento, seria difícil sustentar um conceito de impulsos 
independentes subjacentes à organização dos afetos. De fato, a 
transformação dos afetos por todo o desenvolvimento, sua integração 
com relações objetais internalizadas, sua total e progressiva dicotomia 
em afetos prazerosos, constituindo a série libidinal, e dolorosos, 
constituindo a série agressiva, tudo aponta para a riqueza e complexi-
dade de seus elementos cognitivos e afetivos. 
Vejo, portanto, os afetos como estruturas instintivas 
(Kernberg, 1992), de natureza psicofisiológica biologicamente 
dadas, desenvolvimentalmente ativadas e incluindo componentes 
psíquicos. Acredito que é este aspecto psíquico que se organiza para 
constituir os impulsos agressivos e libidinais descritos por Freud. Os 
impulsos sexuais parciais, em minha opinião, são integrações mais 
limitadas, restritas, de estados afetivos correspondentes, ao passo que 
a libido como um impulso é o resultado da integração 
hierarquicamente supra-ordenadora desses estados afetivos—isto 
é, a integração de todos os estados afetivos eroticamente centrados. 
 
 
 
Psicopatologia das Relações Amorosas 21 
Consequentemente, em contraste com a visão 
psicanalítica ainda bastante prevalente dos afetos simplesmente como 
produtos de descarga, eu os considero como sendo as estruturas —
ponte entre os instintos biológicos e os impulsos psíquicos. Acredito 
também que o desenvolvimento afetivo está baseado em relações 
objetais afetivamente investidas, que constituem uma memória 
afetiva. Emde, Izard e Stern apontam para a função central das 
relações objetais naativação dos afetos. Esta associação apoia minha 
proposição de que os estados afetivos mais iniciais, fixados na 
memória, incluem essas relações de objeto. 
Penso que a ativação de diferentes estados 
afetivos em direção ao mesmo objeto ocorre sob a influência de 
uma variedade de tarefas desenvolvimentais e padrões de 
comportamento instintivo biologicamente ativados. A resultante 
variedade de estados afetivos dirigidos ao mesmo objeto pode 
proporcionar uma explicação económica de como os afetos são 
ligados e transformados em séries motivacionais supra-
ordenadoras que se tornou mais tarde o impulso sexual ou 
agressivo. Por exemplo, as estimulações orais prazerosas durante a 
amamentação e as estimulações anais prazerosas durante o 
treinamento esfincteriano, podem resultar numa condensação de 
interações prazerosas do bebé com a mãe, que ligams esses 
desenvolvimentos oral e anal. E a reação raivosa às frustrações 
durante o período oral e as lutas de poder características doperíodo 
anal podem ligar estados afetivos agressivos consoantes, resultando 
assim no impulso agressivo. Além disso, o intenso investimento 
afetivo positivo do bebé na mãe durante o estágio de prática da fase 
de separação-individuação (Mahler e colaboradores, 1975) pode 
ligar-se com um anseio investido sexualmente em relação a ela, 
derivado da ativação das sensações genitais no estágio edípico do 
desenvolvimento. 
Mas se consideramos os afetos como os 
principais "blocos construtores" psicobiológicos dos impulsos, e 
como os primeiros sistemas motivacionais, ainda teremos de explicar 
como eles se organizam em sistemas hierarquicamente supra-
ordenádores. Por que não dizer que os principais afetos em si mesmos 
é que são os sistemas motivacionais fundamentais? Uma vez que 
acredito que os afetos sofrem uma multiplicidade de transformações 
e combinações secundárias durante o desenvolvimento, uma teoria 
da motivação baseada apenas nos afetos e não nos dois impulsos 
básicos seria muito complicada e clinicamente insatisfatória. 
Também acredito que a integração inconsciente das 
experiências mais primitivas, afetivamente determinadas, requer 
a assunção de uma organização motivacional de nível mais elevado 
do que a representada pelos estados afetivos per se. Precisamos supor 
um sistema motivacional que faça justiça à complexa integração 
de todos os desenvolvimentos afetivos em relação aos objetos 
parentais. 
Da mesma forma, um esforço para substituir 
tanto a teoria do impulso quanto a do afetopor uma teoria do apego ou 
das relações objetais, que rejeita o conceito de impulso, conduz à 
redução da complexidade da vida intrapsíquica, enfatizando somente 
os elementos positivos ou libidinais do apego e negligenciando a 
organização inconsciente da agressão. Embora em teoria isso não 
tenha que ser necessariamente assim, na prática os teóricos das 
relações objetais que rejeitaram a teoria 
22 Otto F. Kernberg 
do impulso, em minha opinião, também negligenciaram 
seriamente os aspectos motivacionais da agressão. 
Por essas razões, penso que não devemos substituir uma 
teoria do impulso por uma teoria do afeto ou por uma teoria das 
relações objetais da motivação. Em resumo, parece bastante razoável 
e preferível considerar os afetos como os blocos construtores dos 
impulsos. Os afetos são portanto o vínculo entre componentes 
instintivos biologicamente determinados, por um lado, e a organização 
intrapsíquica dos impulsos, por outro. A correspondência das 
séries dos estados afetivos recompensadores e aversivos com as 
linhas duais da libido e da agressão faz sentido tanto clínica quanto 
teoricamente. 
Este conceito dos afetos como blocos construtores dos impulsos 
resolve, acredito eu, alguns problemas persistentes na teoria 
psicanalítica dos impulsos. Pensar nos afetos deste modo nos leva a 
ampliar o conceito das zonas erógenas como a "fonte" da libido para 
uma consideração geral a respeito de todas as funções psico-
logicamente ativadas, e zonas corporais envolvidas, nas interações 
afetivamente investidas do bebé e da criança com a mãe. Essas 
funções incluem também a mudança das preocupações com as 
funções corporais para as preocupações com funções sociais e 
desempenho de papéis. O conceito proposto por mim também oferece 
os vínculos que faltam, na teoria psicanalítica, entre as "fontes" das 
interações mãe-bebê agressivamente investidas, e a função "zonal" 
da rejeição agressiva da ingestão oral, do controle anal, das brigas 
físicas diretas pelo poder ligadas aos ataques de raiva da criança, 
etc. As relações objetais com investimento afetivo são o que 
energiza as "zonas" fisiológicas. 
A ativação psicofisiológica sequencial da tristeza, raiva e medo 
primitivos — e mais tarde da depressão e culpa — determina a 
correspondente série de investimentos agressivos nosd/e no objeto. 
Tais investimentos são reativados nos conflitos inconscientes 
relativos à agressão, que se expressam na transferência. A 
internalização direta das disposições afetivas libidinais e agressivas 
como parte das representações do self e do objeto (em termos 
técnicos, "relações objetais internalizadas") integradas nas estruturas 
do ego e superego representa, na minha formulação, os 
investimentos libidinais e agressivos dessas estruturas. 
O id, de acordo com este conceito da relação entre impulsos e 
afetos, consiste em relações objetais internalizadas, reprimidas, 
intensamente agressivas ou sexualizadas. A condensação e o 
deslocamento característicos dos processos mentais do id refletem o 
vínculo entre as representações dose//e do objeto afetivamente 
relacionadas e as correspondentes séries agressivas, libidinais e, 
mais tarde, combinadas. 
Este conceito de impulsos também nos permite fazer justiça aoinput, 
biologicamente determinado, das novas experiências afetivas 
durante toda a vida. Essas experiências incluem a ativação da 
excitação sexual durante a adolescência, quando os estados afetivos 
eroticamente excitantes são integrados com a excitação genital e com 
emoções e fantasias eroticamente carregadas derivadas do estágio 
edípico do desenvolvimento. Em outras palavras, a intensificação 
dos impulsos (tanto 
 
 
 
 
Psicopatologia das Relações Amorosas 23 
libidinais quanto agressivos) em vários estágios do ciclo da vida é 
determinada pela incorporação de estados afetivos 
psicofisiologicamente ativados aos sistemas aferi vos preexistentes 
hierarquicamente organizados. 
Falando de modo mais geral, em minha opinião, uma vez que a 
organização dos impulsos como os sistemas motivacionais 
hierarquicamente supra-ordenados esteja consolidada, qualquer 
ativação específica de impulsos no contexto do conflito intrapsíquico é 
representada pela ativação de estados afetivos correspondentes. O 
estado afetivo inclui uma relação objetal internalizada, basicamente 
uma determinada representação do self relacionada a uma 
determinada representação do objeto, sob o impacto de um 
determinado afeto. A relação de papéis recíprocos entre self e 
objeto, moldada pelo afeto correspondente é normalmente 
expressada como um fantasia ou um desejo. Fantasias inconscientes 
consistem nessas unidades de representação ao self, de representação 
do objeto e de um afeto que os vincula. Os afetos, em resumo, são 
também os sinais ou representantes dos impulsos — como Freud 
(1926) havia sugerido, assim como seus blocos construtores. 
Freud (1905) descreveu a libido como um impulso, 
originando-se da estimulação das zonas erógenas, caracterizado por 
um determinado objetivo, pressão à descarga e objeto. Conforme 
afirmei, acredito que a libido se origina de esta-Z.OB afetivos 
primitivos, incluindo um estado de elação que se encontra no relacio-
namento inicial mãe-bebê e característico da experiência e fantasia 
simbióticas. As experiências cotidianas afetuosas

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