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Psicologia da Educação I - Sandra Armoa - UNIGRAN 51 JEAN PIAGET O PENSAMENTO PIAGETIANO Aula 07 Piaget apresenta uma visão interdisciplinar ao longo de seus estudos, onde se observa uma influência marcante em suas obras de três áreas da ciência: a biologia, a filosofia e a psicologia. Dentre estas áreas Piaget dedicou grande parte do seu trabalho à Psicologia do Desenvolvimento, no qual se pretende analisar a sua concepção em relação ao aprendizado. Na Psicologia do Desenvolvimento existem várias teorias de aprendizagem e entre estas teorias se observa duas grandes correntes acerca do desenvolvimento, sendo uma considerada maturacionista e a outra empirista. A corrente maturacionista aborda o processo de desenvolvimento do ser humano por meio de regulação endógena de mecanismos considerados inatos. Já a fundamentação da corrente empirista se baseia no entendimento de que todo desenvolvimento se processa através da experiência adquirida (aprendizagem) em função da interação com o meio físico e social. Com base na contextualização com relação ao desenvolvimento do ser humano Piaget aborda a questão do desenvolvimento ao estudar a formação das estruturas lógicas, apresentando uma concepção com relação ao processo de aprendizagem que ultrapassa o pensamento fechado tanto da maturação quanto da experiência. Para Piaget o processo de aprendizagem é devido a fatores de maturação, sociais e cognitivos, que representa para o ser humano a obtenção do equilíbrio interno, que este denominou de Equilibração. Psicologia da Educação I - Sandra Armoa - UNIGRAN 52 Piaget pressupunha o conhecimento humano como sendo adquirido através do processo de regulação e de equilibração, como condições básicas para se viabilizar a adaptação e a inteligência, através de uma teoria interacionista e construtivista do desenvolvimento da inteligência, no momento em que considera os fatores biológicos, psicológicos e sociológicos como sistemas vitais na construção do conhecimento, sobre a ótica de um sistema aberto, que propicia um inter-relacionamento contínuo do organismo com o ambiente em que se encontra inserido, através de um processo de trocas de influências equivalentes. A abordagem de Piaget é uma crítica à corrente de filósofos empiristas, quando através de suas experiências mostra que a construção do conhecimento, não é obtida apenas baseada na percepção dos sentidos, muito menos em percepção e linguagem, mas evidencia ainda o fazer e agir concreto. O processo de conhecimento para Piaget se apresenta fundamentado em duas funções essenciais: a organização e a adaptação. Considera que a evolução da inteligência se trata de um processo único, sendo a organização o aspecto interno do conhecimento, enquanto a adaptação representa o seu aspecto exterior. A função adaptação se constitui de duas atividades, a assimilação e a acomodação, que são complementares. Para elucidar o posicionamento de Piaget, a assimilação representa um mecanismo que viabiliza a ação do sujeito sobre o objeto, integrando-o a uma estrutura já estabelecida, enquanto a acomodação se constitui no processo de transformação das estruturas do sujeito por força da ação do objeto, para que a assimilação possa se realizar. A aprendizagem não se propõe como fim, um melhor rendimento ou desempenho maior, mas visa, por reforços internos, provocar uma diferenciação das respostas pela eliminação das contradições e assegurar sua coesão lógica que tende para uma estruturação mais equilibrada. Nesta forma de aprendizagem, o processo de aquisição sobreleva- se ao resultado da aquisição. Para dizer em termos diferentes, as respostas à situação de aprendizagem, onde se pode colocar as crianças, revela as estruturas que elas estão em vias de adquirir. Tais afirmações dizem respeito aos métodos ativos em pedagogia, métodos estes já descobertos intuitivamente pela prática ou pela reflexão de pedagogos geniais. Logo a pedagogia pode ser apenas ativa e não diretiva. Não diretividade, não significando laisser- faire, mas deixar agir por si mesmo o ser humano, sem lhe impor ou mesmo lhe propor quadros de soluções já prontas. A grande crítica que se pode fazer à pedagogia é que ela procura antes fazer aprender, ou seja a repetir, do que agir, para compreender e inventar. Tal só será possível quando todos os alunos forem pesquisadores, e isto pressupões que todos os professores também o sejam. Nesse caso é bom lembrar que em pesquisa, inclusive, os métodos precisam ser constantemente reinventados. Logo, o pedagogo não pode esperar muito das receitas prontas, pois a pesquisa não as tem. Psicologia da Educação I - Sandra Armoa - UNIGRAN 53 Estas reflexões levam a relembrar que um dos principais resultados da psicologia genética piagetiana é que nada se obtém com a coerção, isso leva a uma reconversão das relações do mestre com o aluno, e reciprocamente do aluno com a matéria escolar, com o pessoal escolar ou com a instituição e das relações dos alunos entre si. Neste sentido as relações pedagógicas só podem supor um clima de confiança, no qual a afetividade está compreendida. Neste sentido há total concordância com os psicólogos da afetividade. Na realidade a educação forma um todo indissociável e não é possível formar personalidades autônomas no domínio moral se, por outro lado, o indivíduo está submetido a uma coerção intelectual tal que deva se limitar a aprender passivamente, sem tentar descobrir, por si mesmo, a sua verdade: se ele é passivo intelectualmente não pode ser livre moralmente. Mas reciprocamente, se sua moral consiste exclusivamente numa submissão à vontade adulta e se as únicas relações sociais que constituem a vida da classe são as que ligam cada aluno individualmente a um mestre que determina todos os poderes, ele não pode tampouco ser ativo intelectualmente. Uma das críticas mais comuns dirigidas ao trabalho de Piaget é a de que ele não considerou com a ênfase devida a influência da interação social e da aquisição da linguagem na aprendizagem humana. Aqui vale lembrar que Piaget foi um epistemólogo, ou seja, ele não estava exatamente construindo uma teoria educacional. No entanto, a epistemologia genética desenvolvida por Piaget, em momento nenhum nega a importância da interação social no processo de aprendizagem, ao contrário ela é considerada como essencial para o declínio da fase egocêntrica. O que Piaget ressalta é que a linguagem não é o princípio do nascimento da inteligência, ou seja, que a relação com o mundo dos objetos e do espaço que nos rodeiam também são fundamentais. Ao propor um desenvolvimento cognitivo como função da influência biológica e da afetiva, na ontogênese e autopoiese do sujeito, abre portas a uma abordagem de ensino, que não se restringe a um aspecto apenas, mas a toda uma multiplicidade de fatores. Piaget não elaborou teorias de desenvolvimento da aprendizagem, mas de desenvolvimento do conhecimento. Sua contribuição à educação é restrita e ao mesmo tempo vasta, visto que ao interpretar a inteligência não como algo determinado e finito, mas como um processo em movimento, ou seja, em desenvolvimento, deu a base que permitiu aos pesquisadores educacionais desenvolver parâmetros para a elaboração de dispositivos motivacionais e cognitivos, que possibilitem às crianças, jovens e adultos, desenvolverem potencialmente esse conhecimento. Modifica não só a noção de como se aprende, mas também com quem se aprende. A partir da aquisição da linguagem (estágio pré-operatório) inicia-se uma socialização efetiva da inteligência, contudo ainda limitada pelo pensamento egocêntrico1 , que restringe a possibilidade de estabelecimento de trocas intelectuais equilibradas. 1 Pensamento egocêntrico: é aquele no qual o indivíduo não possui a capacidade de aderir a uma escala comum de referência; não conserva ouleva em conta o que admitiu ou disse, e tampouco conserva-os nas construções ulteriores; e tem extrema dificuldade de se colocar no ponto de vista do outro. Psicologia da Educação I - Sandra Armoa - UNIGRAN 54 A partir do estágio operatório, as trocas intelectuais começarão a se efetuar, e paralelamente, a criança alcançará o que Piaget denomina de Personalidade (coordenação de individualidade com o universal), o indivíduo submetendo-se voluntariamente às normas da reciprocidade e de universalidade - é tomar consciência desta relatividade da perspectiva individual. O “caminho” para o desenvolvimento cognitivo inicia-se no período sensório- motor, na construção de esquemas de ações que constituem uma espécie de lógica das ações e percepções. Depois, segue-se o período pré-operatório, no qual as ações serão interiorizadas, porém sem reversibilidade. Tal reversibilidade será construída nos períodos operatórios concreto e formal. Piaget pensa o social e suas influências sobre os indivíduos pela perspectiva da ética. Ser coercitivo ou cooperativo depende de uma atitude moral. A cooperação (democracia) é condição necessária ao desenvolvimento e à construção da personalidade. Na teoria de Piaget, o aspecto afetivo é um dos componentes do desenvolvimento intelectual, assim como o aspecto cognitivo. Esses aspectos formam uma unidade, dois lados de uma mesma moeda, pois à medida que amadurece física e psicologicamente e que é estimulada pelo ambiente físico e social constrói-se a inteligência. Um dos aspectos da afetividade tem ligação direta com a motivação que norteia a atividade intelectual e outro tem a ver com a seleção que dirige a atividade para este ou aquele objeto ou evento particulares. O interesse é um dos exemplos que seleciona nossa atividade intelectual. Para Piaget, o crescimento orgânico, a maturidade neurológica e fisiológica são determinantes fundamentais do desenvolvimento psicológico, mas é a própria criança que irá construir seu crescimento mental, sendo assim agente de seu próprio desenvolvimento, alicerçado pela maturação, estimulação do ambiente físico, aprendizagem social e tendência ao equilíbrio. Segundo o autor, o aspecto afetivo tem uma profunda influência sobre o desenvolvimento intelectual, podendo acelerar ou diminuir seu ritmo, porém não pode modificar as estruturas cognitivas2 : Nas poucas obras que Piaget dedicou à escola, o autor ressalta a importância do papel da escola na formação de pessoas intelectual e moralmente autônomas. Segundo Piaget, o conhecimento não é dado, nem adquirido, é construído. O que implica em ação do sujeito e transformação do objeto de conhecimento. Suas idéias sobre estrutura psicológica, operações mentais e transformações cognitivas, e princípios cognitivos pelos quais o bebê organiza e 2Refere-se às propriedades organizacionais inferidas que explicam a ocorrência de determinados comportamentos. Quando você solicita a uma criança que ela compare uma fileira de cinco tampinhas enfileiradas de maneira mais espaçada, com uma outra de seis tampinhas de maneira menos espaçada, portanto mais curta e pergunta qual das duas tem mais tampinhas e ela responde que é a mais longa, de cinco tampinhas, podemos inferir que esta criança não possui um conceito de número completo. Ou seja, entre a razão e a percepção, sua escolha baseia-se na percepção, só depois de mudanças em suas estruturas ela poderá basear-se na razão. Psicologia da Educação I - Sandra Armoa - UNIGRAN 55 aprende de sua própria experiência, foram todas importantes, e radicalmente opostas à teoria comportamental (behaviorista)3 vigente na sua época. Para Piaget o professor é aquele que chega à aula para ensinar e aprender. Esse professor também viveu um mundo de experiências, apropriou-se de conhecimentos e estabeleceu relações significativas num domínio específico do conhecimento humano. Sua linguagem ou sua forma de comunicação com os alunos terá sentido dentro do seu contexto: o contexto do professor. E é na interação professor-aluno, que os dois contextos serão ligados pela linguagem, isto é, pelo conjunto de símbolos (visuais, escritos e sonoros) que terão que adquirir significados comuns para que a comunicação se efetue dentro de sua finalidade: a construção do conhecimento. O professor ao fazer perguntas pressupõe que o aluno responderá dentro do contexto que ele, professor, está falando. E nem sempre isso acontece. Nessa comunicação, devemos lembrar o princípio básico da linguagem: quem dá sentido ao texto é o contexto. Dessa forma, possibilita-se ao aluno que ele receba a informação, aproprie-se dela, integrando-a com sentido em sua estrutura cognitiva e aplique-a em outras situações. Para Piaget o professor deve estar atento, enquanto fala, para trazer o aluno no contexto do movimento do seu pensamento. Sua aula é assim um desafio. Seus alunos devem acompanhar as idas e vindas de seu pensamento, construindo suas próprias estruturas. Piaget nos alerta que, para que haja uma aproximação entre as estruturas de pensamento dos alunos e dos professores, naquilo que se refere ao conhecimento lógico matemático, em primeiro lugar é necessário considerar que a compreensão real de uma teoria, por parte daquele que a desenvolveu ou estuda, supõe sua reinvenção por esse sujeito. O papel do professor não consiste, simplesmente, em dar aula, lições, mas organizar situações que levem o aluno a investigar, utilizando instrumentos apropriados. Os conhecimentos que habitam entre as pessoas, são recriados na interação de um ato socialmente cotidiano. Para ele, o ambiente escolar deve proporcionar ao aluno a oportunidade de desenvolver plenamente a sua personalidade no que se refere á construção da inteligência e da moralidade e contribuir para a formação de um cidadão apto a cooperar, a ser solidário. Para Piaget (1994), toda moral consiste num sistema de regras, e a essência de toda moralidade deve ser procurada Reflita então, a importância da vida escolar, o modelo Piagetiano afirma que o ser humano se desenvolve em um processo de interação. A qualidade dessas interações é determinante no desenvolvimento do pensamento lógico, por isso Piaget foi chamado de interacionista. O desafio do professor é educar para enfrentar as vicissitudes deste mundo, de modo que a criança possa conhecê-lo no espaço e no tempo, nas suas realizações e compreensões. 3Behaviorismo, traduzido pelo português como comportamentalismo, esta corrente define a psicologia como sendo a ciência do compor- tamento e preocupa-se com aquilo que e manifesto. Psicologia da Educação I - Sandra Armoa - UNIGRAN 56 no respeito que o indivíduo adquire por essas regras. Então é necessário perceber como se dá o respeito às regras e aos valores que norteiam a vida da criança. Por isso, tentaremos abordar a postura da criança frente à regra, num dos estágios da infância, o heterônomo, conforme Piaget. Ao analisarmos o desenvolvimento moral na criança, deparamo-nos com as relações adulto-criança e criança-criança. Uma das histórias contadas por Piaget (1994) é a seguinte: “Um menino desobedeceu à mãe. Um dia que lhe fora proibido, pegou a tesoura. Mas colocou-a no lugar antes da volta da mãe, ela não viu nada. No dia seguinte ele foi passear e atravessar um riacho por uma pequena ponte. Acontece que a madeira estava podre. Quebrou-se e crac! Ele caiu na água?” (E se não tivesse desobedecido, teria caído assim mesmo?). As respostas a essa questão mostraram que aos 6 anos 86% das crianças entrevistadas atribuíram à queda ao fato do menino ter desobedecido à mãe, essa porcentagem modifica-se conforme vão crescendo, deixando de acreditar que a natureza conspira com os pais para que não haja violação de regras. Vejamos o resultado da pesquisa com crianças mais velhas: entre 7-8 anos: 73%, 9-10 anos:54% e 11-12 anos: 34%. A justiça de reciprocidade caracteriza-se pelo rompimento de um elo social, o indivíduo que cometeu a falta ou infringiu uma regra estabelecida pelo grupo deve buscar maneiras de reatar esse laço, “há relação de conteúdo e de natureza entre a falta e a punição”. (Piaget, 1994, p.162) Piaget relatou fatos priorizando formas de justiça por reciprocidade e justiça expiatória, para verificar o surgimento da justiça retributiva. Vejamos um desses relatos: “Um menino brincava em seu quarto, enquanto seu pai trabalhava na cidade. Depois de algum tempo, teve vontade de desenhar. Mas não tinha papel. Lembrou-se então que na escrivaninha de seu pai havia belas folhas brancas numa gaveta. Foi sorrateiramente procurá-las, encontrou-as e tirou todas. Quando o pai voltou, verificou que a gaveta estava em desordem e acabou por descobrir que haviam roubado o papel. Foi logo em seguida, ao quarto do menino e viu no chão todas as folhas rabiscadas com lápis de cor”. Nessa primeira situação, o filho foi, então, castigado, com uma bela surra. (Piaget, 1994, p.171) Num segundo momento, o fato foi relatado às crianças; no entanto o pai ao chegar ao quarto não o castigou, explicou que não era certo e lhe disse: “Quando você não está, quando vai à escola, se eu lhe roubasse brinquedos de seu armário, você não gostaria. Então, quando eu não estiver você não deve nunca mais roubar o meu papel. Isto não me agrada. Não é bonito fazer isso.” (Piaget, 1994, p. 171). Após o relato destes acontecimentos, a avaliação continuava da seguinte forma: “Agora, estes dois meninos, depois de alguns dias, brincavam cada um em seu jardim. Aquele que fora punido estava em seu próprio jardim e aquele que não fora punido brincava também em seu próprio jardim. Então, cada um encontrou um lápis de cor. Era o lápis de cor do pai deles. Lembraram-se imediatamente de que o pai dissera, ao meio-dia, que perdera o lápis de cor na rua e estava aborrecido, porque não poderia mais achá-lo. Pensaram Psicologia da Educação I - Sandra Armoa - UNIGRAN 57 então que, se escondessem o lápis de cor, ninguém saberia de nada e não haveria punição.” Ao término desses relatos eram feitas perguntas, tais como: “Um dos dois guardou o lápis de cor e o outro o levou ao pai. Adivinhe qual foi que o devolveu: será que foi aquele que fora punido devido ao papel ou aquele ao qual apenas foi explicado?”. Foi constatado que as crianças de 6-8 anos afirmavam que a punição deveria acontecer no primeiro caso. O menino que não recebeu o castigo foi quem não devolveu ao pai. Percebemos que para os pequenos castigos deve existir independentemente das circunstâncias, pois este previne reincidências. A partir dos 9 anos, as crianças afirmavam que o garoto que devolveu o lápis de cor foi aquele com quem o pai conversou. As crianças mais velhas tendem à justiça por reciprocidade não escolhendo punições tão severas. É interessante observar que nesta fase a criança se coloca no lugar daquele que receberá a punição. Piaget elaborou diversas histórias, situações hipotéticas, onde as crianças tinham liberdade de explicitar suas opiniões, julgando qual deveria ser o castigo aplicado ao indivíduo que violou uma determinada regra. Um outro relato foi o seguinte: “Uma mãe tinha duas filhas, uma obediente, outra desobediente. Gostava mais daquela que obedecia e dava-lhe os maiores pedaços de doce. O que você acha disso?” (Piaget, 1994, p.201). Quando questionadas, as crianças posicionaram-se da seguinte forma: 70% delas entre 6-9 anos avaliaram positivamente a atitude da mãe, enquanto que entre 10-13 anos, essa porcentagem chega apenas a 40%. Piaget afirma que as noções de justiça e de solidariedade desenvolvem-se em função da idade mental da criança, ou seja, “na proporção em que podemos falar de estágios na vida moral, a existência de três grandes períodos no desenvolvimento da justiça na criança: um período estendendo-se até mais ou menos os 7-8 anos, durante o qual a justiça está subordinada à autoridade adulta, um período compreendido entre 8-11 anos aproximadamente, e que é o do igualitarismo progressivo, e finalmente um período que se inicia por volta dos 11-12 anos, durante o qual a justiça puramente igualitária é temperada pelas preocupações de eqüidade.” (Piaget, 1994, p.236). Uma das mais importantes descobertas de Piaget, no campo da Psicologia da moral, foi a de que “... com a idade o respeito muda de natureza" (Piaget, 1932/1992, p.79). Piaget chamou de cooperação “... toda relação entre dois ou n indivíduos iguais ou que se percebem como iguais, ou seja, toda relação social na qual não intervém nenhum elemento de autoridade ou de prestígio" (Piaget, 1965/1977, p.226). O vínculo que a criança estabelece com os seus pares é a principal fonte de relações cooperativas, nas quais o respeito unilateral dá lugar ao respeito mútuo. Psicologia da Educação I - Sandra Armoa - UNIGRAN 58 As operações lógicas são segundo Piaget (1965/1977), os instrumentos mentais que permitem a coordenação de diferentes pontos de vista, seja os pontos de vista de indivíduos distintos seja as intuições sucessivas de um mesmo indivíduo. A vontade desempenharia, no plano afetivo, uma função equivalente à operação, no plano intelectual. Por isso, operação e vontade aparecem em um mesmo momento do desenvolvimento mental. A escola deve proporcionar ao aluno a oportunidade de desenvolver plenamente sua personalidade no que se refere à construção da inteligência e da moralidade e contribuir de maneira decisiva para a formação de um cidadão apto a cooperar, a ser solidário e capaz de empreender transformações sócias e culturais. Mas estará a escola conseguindo executar bem suas funções? Esta o aluno tendo oportunidade de encontrar na escola um ambiente educacional que lhe possibilite construir, até a conclusão, os instrumentos indispensáveis de adaptação ao meio físico e social que são as operações da lógica, como afirma PIAGET (1973, p.38), numa de suas obras sobre educação? PIAGET explica que para compreender ou conhecer é preciso que o dado exterior seja assimilado às estruturas intelectuais do sujeito, o que só é possível se tais estruturas existirem anteriormente. Por conseguinte, para aprender as noções matemáticas mais simples, como, por exemplo, a noção de número e as operações de adição, subtração, multiplicação e divisão, o sujeito precisa ter à sua disposição estruturas mentais que lhe possibilitem adquirir as noções matemáticas e as operações numéricas. Isso ocorre porque uma aprendizagem não parte jamais do zero (PIAGET, 1994), pois o novo elemento é reorganizado internamente a partir das aquisições anteriores. Dessa reorganização surgem novas combinações que abrem possibilidades para a aprendizagem de novos dados. Nos experimentos idealizados por Piaget (1976) sobre as noções de conservação, o conflito entre a experiência perceptiva atual e a dedução lógica é visível no comportamento dos sujeitos que se encontram em um nível intermediário entre a não-conservação e a conservação. Por exemplo, quando se apresentam duas fileiras com o mesmo número de fichas e, a seguir, aproximam-se (ou, ao contrário, se afasta) as fichas de uma delas, a criança oscila entre afirmar e negar que ainda tem a mesma quantidade de fichas. Podemos dizer que graças à operação é possível situar a configuração atual em um conjunto de relações não dadas no campo perceptivo atual (a relação de equivalência anterior, a relação densidade versus comprimento da fileira, etc.). Como nos Vale dizer , que Piaget pesquisou a prática e a consciência da regra, pedindo as crianças que lhe ensinasse a jogar e jogassem com ele, e em seguida lhe dissesse de onde vinham essas regras, quem as tinham inventado, se poderiam ser modificadas. Com esses dados Piaget formulou hipótese de que o desenvolvimentodo juízo moral, ou seja, da compreensão das regras ditas morais seguiriam as mesmas etapas. Estudando assim concepções infantis de dano material, mentira e roubo.Utilize histórias em quadrinhos para conhecer e desenvolver a noção de justiça dos alunos. Psicologia da Educação I - Sandra Armoa - UNIGRAN 59 explicou Piaget, o raciocínio lógico consiste em conservar os dados perceptivos anteriores e tirar uma conclusão coerente com esses dados. Na teoria piagetiana, pode-se dizer que primeiro há a ação/operação, depois a construção cognitiva. Em outros termos, tomando o exemplo das classes no contexto das noções lógico-matemáticas, pode-se dizer que uma “’classe’ supõe ‘classificação’, e o fato primeiro é constituído por esta última, porque as operações de classificação que engendram as classes particulares” [Piaget 1976 pg. 44]; antes de ser uma classe como tal, ela é uma coleção intuitiva (e o mesmo se verifica em outras situações, independentemente se envolvam noções infralógicas ou de valores). As provas operatórias têm como objetivo principal determinar o grau de aquisição de algumas noções chaves do desenvolvimento cognitivo, destacando-se o nível operatório do pensamento da criança, ou seja, o nível da estrutura cognoscitiva com que opera. Mas, o que se conclui, a priori, e que há um significado particular para a ação dessas provas que recebe uma interferência emocional: e comum encontrarmos crianças, filhos de pais separados e com novos casamentos dos pais, que só não obtinham êxito na prova de intersecção de classes. Deixando transparecer a dificuldade de estabelecer territórios comuns com novos membros presentes nesta situação, quer seja uma nova esposa, ou marido, quer seja com possíveis filhos dessas pessoas. Piaget (1973) cita, ainda, crianças muito dependentes dos adultos que ficam intimidadas com a contra-argumentação do examinador e passam a concordar com o que ele fala, deixando de lado a operação que já são capazes de fazer, ou seja, crianças que abrem mão de suas conclusões intelectuais em função de suas carências emocionais. Apesar desses exemplos da interferência emocional no desenvolvimento intelectual da criança, e preciso lembrar: “... embora a questão afetiva cause o comportamento, embora ela acompanhe cons- tantemente o funcionamento da inteligência e embora ela acelere ou freie o ritmo de desenvolvimento, ela, em si mesmo, no entanto, não pode gerar estruturas de com- portamento e não pode modificar as estruturas em cujo funcionamento ela intervém” (Wadsworth 1993, p.23). Portanto, a criança que gosta de “língua portuguesa” tende a fazer rápidos progressos nesta área, já aquela que não gosta tende a demorar mais em seus progressos, mas avança também. Em cada um dos casos, o comportamento foi influenciado pela afetividade que motivou a atividade intelectual, selecionando aquela área sobre a qual deveria agir. Para Piaget todo comportamento apresenta ambos os aspectos, não existindo um comportamento puramente cognitivo, tampouco puramente afetivo, ele entende que o desenvolvimento intelectual age do mesmo modo que o desenvolvimento biológico Para Piaget, a atividade intelectual não pode ser separada do funcionamento "total" do organismo (1976, p.7). Psicologia da Educação I - Sandra Armoa - UNIGRAN 60 Continuando a discutir o aspecto afetivo na teoria piagetiana, creio que vale a pena destacar como a afetividade da criança vai se desenvolvendo de acordo com os estágios que ela vai vivenciando. E, ainda, lembrar que em cada estágio a criança desenvolve uma maneira de pensar e de responder ao ambiente, portanto cada um deles constitui uma mudança qualitativa de um tipo de pensamento, de sentimento e comportamento para outro, e que cada um dos estágios serve de alicerce para o seguinte. O desenvolvimento tem início a partir dos reflexos inatos que vão se transformando em esquemas sensoriais motores rudimentares (inteligência exteriorizada), que se modificarão ao longo do tempo sob a forma de interiorização gradual, passando por um processo de desligamento progressivo da ação para a formação de esquemas conceituais, supondo uma ação mental. O Desenvolvimento Afetivo Infantil e os Estágios Piagetianos. O desenvolvimento para Piaget se da por etapas, caracterizadas pela aparição de estruturas originais e de determinadas formas de equilíbrio dependentes de construções anteriores que se distinguem. Cada fase corresponde a determinadas características que se modificam em função de uma melhor organização, constituindo uma forma particular de equilíbrio mais completa e de uma interiorização progressiva. No estágio sensório motor, inicialmente não há sentimentos enquanto tal, ele está associado a reflexos e impulsos que o bebê usa para buscar seu conforto (alimentação - sucção) e a fugir do desconforto (fome – choro). Portanto, o corpo do bebê é o foco de toda atividade e afeto, pois ele não conseguindo ainda transferir afetos para outras pessoas, já que nem diferencia o eu como distinto de outros objetos do ambiente. Algumas atividades auxiliam a criança a compreender que as coisas vão (afastam- se) e voltam (aproximam-se), devendo usar para isto do balanço e brincadeiras de jogar e buscar objetos repetidas vezes; isto contribui para que a mesma desenvolva o conceito de permanência de objeto (ele desaparece, mas volta, continua a existir), preparando-a para fases seguintes onde ela passa a se diferenciar do ambiente, do outro. Ao final deste período, no segundo ano de vida, a criança junto com o desenvolvimento A discussão sobre afetividade reforça a necessidade de conceituar os aspectos afetivos, levando você a pensar sobre os alunos e a aprendizagem, pois afetividade refere-se a disposição do ser humano de ser afetado pelo mundo externo/interno por sensações ligadas a tonalidades agradáveis ou desagradáveis. Por isso a importância de conhecer o desenvolvimento afetivo e os estágios Piagetianos. Psicologia da Educação I - Sandra Armoa - UNIGRAN 61 do conceito de causalidade4 começa a investir afeto em outras pessoas, quando o gostar ou o não gostar são estabelecidos, originando as relações interpessoais, onde o afeto por alguém é expresso pela primeira vez. Neste momento é importante estimular a criança a expressar seus sentimentos, tanto amorosos quanto agressivos e manter uma comunicação afetiva com ela, expressando os nossos sentimentos também, através de sinais e expressões faciais que possam por ela ser compreendidos. No estágio do pensamento pré-operacional, surgem os primeiros sentimentos sociais, possibilitados pela linguagem e pela representação. Ou seja, tanto a linguagem quanto a representação dão uma estabilidade aos objetos, fazendo com que os afetos durem além da presença do objeto, possibilitando os sentimentos interpessoais. E a criança que gostava de um objeto hoje, ou enquanto ele estivesse fazendo parte de seu campo visual, passa a gostar de forma mais consistente, sendo capaz de evocar a experiência passada no tempo presente. Inicia-se a capacidade de formar esquemas simbólicos, ou seja, representar uma coisa por outra e o alcance do pensamento aumenta lentamente, mas a criança ainda continua egocêntrica e presa a ações, pois seu pensamento ainda mistura fantasia com realidade, distorcendo-a mesma. Teremos, então, uma criança atuando ao nível comportamental de modo lógico e coerente e ao nível de entendimento da realidade ainda em desequilíbrio; o egocentrismo é marcante e pode ser observado no campo intelectual, social e na linguagem. Nesse período, os esquemas conceituais são ausentes, ficando o julgamento dependente da percepção e o raciocínio então é centralizado, rígido e inflexível; neste sentido, o relacionamento social é importante, pois através dele a criança vai se adaptando a realidade tendo no adultoum modelo constante de pensamento lógico e socializado, servindo de estímulo fundamental para a diminuição gradual do egocentrismo. Em relação ao brinquedo, este não é cooperativo, e sim paralelo, pois cada criança se envolve apenas com sua própria ação. Por isso é comum neste período à criança olhar a foto de algumas pessoas que não vê ha. algum tempo chamá-la pelo nome ou pelo parentesco e beija-la quando gosta dela. Como ela já desenvolveu o conceito de representação, as brincadeiras de “faz de conta”, começam a ser bem-vindas; e interessante, por isso, estimular a criança assumir papéis (mãe, médico, babá) e agir segundo a sua percepção dos mesmos. Nesse estágio, a criança no início tem comportamentos semelhantes àqueles do final do estágio sensório motor, mas no final, aos sete anos, os comportamentos nada se assemelham aos do estágio anterior. E ela já é capaz de compreender regras, construir conceito de justiça, que vai desde aquele baseado na punição severa até ao que se baseia na reciprocidade e 4Piaget define este conceito como a capacidade de perceber que “a causa de um certo fenômeno não é mais identificada pela criança como tendo ela agido sobre este fenômeno. Ela começa a descobrir que existe um contato espacial entre causa e efeito e que qualquer objeto pode ser a fonte de atividade (e não apenas seu próprio corpo).” Wadsworth (p.39). Psicologia da Educação I - Sandra Armoa - UNIGRAN 62 alguns aspectos do raciocínio moral. No estágio das operações concretas, o desenvolvimento da vontade passa a ser uma escala permanente de valores e o indivíduo passa a aderir a ela sempre, regulando assim seu julgamento afetivo. Observa-se ai um declínio do egocentrismo intelectual e um crescimento do pensamento lógico, passando a verdade a ser estruturada pela razão. Nesse caso, a criança passa a adotar atitudes críticas, ao invés de aceitar as idéias, torna-se uma avaliadora das idéias, compreendendo cada vez mais a intencionalidade das atitudes, ampliando sua capacidade de emitir julgamentos. A linguagem egocêntrica sofre um declínio até desaparecer completamente, como também ocorre a diminuição do egocentrismo social, fazendo com que a criança tenha capacidade de perceber que outras pessoas têm pensamentos, sentimentos e necessidades diferentes dos seus, o que a levará a desenvolver uma interação social mais genuína. O estágio das operações formais (adolescência) é marcado pelo desenvolvimento dos sentimentos idealistas e pela continuação da formação da personalidade, ou seja, o adolescente é impulsionado pelo desejo de se ajustar ao mundo do trabalho e à vida adulta, fazendo com que ele viva levando em conta a construção da cooperação e da autonomia pessoal. É marcado pela capacidade de formar esquemas conceituais abstratos e de realizar operações mentais seguindo o princípio da lógica formal, neste período adquire-se a capacidade de criticar os sistemas sociais de propor novas formas de conduta; o adolescente também discute os valores morais dos pais e adquire autonomia para construir os seus valores. Piaget considera que o indivíduo chega a forma de equilíbrio quando adquire as capacidades acima mencionadas. Apesar desta apresentação ter seguido até aqui a seqüência dos estágios de desenvolvimento preconizados por Piaget, só foi feito por de uma questão didática, pois a teoria de Piaget não pode ser reduzida a uma série de estágios ou a um conjunto de procedimentos operacionais, ela consiste numa perspectiva, numa abordagem sobre a qual o professor deve refletir, para que possa usar como instrumento auxiliar na compreensão dos seus alunos e do porquê e como eles aprendem e interagem com o ambiente. As relações estabelecidas com o objeto em função dos estágios Piaget afirma que a fonte do desenvolvimento cognitivo está na ação e que a criança vai modificando sua ação em função das alterações de seu pensamento, na interação com os objetos externos. Para explicarmos melhor: se dermos as crianças de diferentes idades um mesmo material, por exemplo, objetos de madeira de diferentes espessuras, formas e cores e solicitarmos que elas ordenem de varias maneiras estes objetos, poderemos observar condutas muito diferentes em função da idade das crianças. Psicologia da Educação I - Sandra Armoa - UNIGRAN 63 Os bebês de 8 a 20 meses, aproximadamente, desconhecerão as instruções e farão em relação aos objetos uma série de ações que terão pouca ou nenhuma relação com suas características específicas, colocarão na boca, atirarão, sacudirão, colocarão dentro de caixas maiores, enfim mostrarão um comportamento exploratório em relação ao objeto. As crianças de 3 a 4 anos, aproximadamente, poderão fazer várias figuras bonitas com os pedaços de madeira, dizendo que fizeram uma casa, uma homem, um caminhão. A essas construções Piaget chamou de coleção de figuras. Próximo dos 6 e 7 anos, as crianças já classificam os objetos em função de um critério dado, o tamanho, por exemplo. Elas colocarão ainda em conjunto todos os pequenos ou, em função da sua forma, todos os quadrados, todos os triângulos etc. Mas muitas dessas crianças mudarão de critério durante o percurso das classificações, podendo iniciam por separar os grandes dos pequenos e terminar separando os vermelhos dos azuis. Elas poderão, também, recusar a colocar em conjunto dois montes para fazer, por exemplo, o monte dos quadrados vermelhos, por não concordarem em juntar os grandes e os pequenos. Já as crianças de 9 anos, aproximadamente, efetuarão todo tipo de classificações, inclusive aquelas onde aparecem as intercepções, vermelhos, grandes, finos e círculos. Piaget considerou que essas diferentes condutas revelam uma diferença qualitativa sobre o plano dos instrumentos intelectuais postos em ação pelas crianças para resolução dos problemas propostos. A dimensão afetiva, segundo ele, está colocada no interesse, na vontade que cada criança demonstra na realização da tarefa, do proposto, e que e a afetividade que determina quais idéias “vivem” ou quais “morrem”. Para os educadores, de forma geral, fica o alerta de que os estágios são úteis para conceituar o desenvolvimento e para refletir sobre as características do raciocínio da criança, mas deter-se nos estágios pode ser uma armadilha para a reflexão docente e por isso precisa ser evitada. A implicação básica da teoria de Piaget reside no fato de que, se para o educador a meta a ser alcançada é a expansão e a aquisição do conhecimento pelo aluno, torna-se imprescindível conhecer um método que seja consistente e coerente com o modo de aprender dos alunos, assim poderemos reduzir o número de alunos que não aprendem, porque não conseguem entender o que lhes é ensinado. Psicologia da Educação I - Sandra Armoa - UNIGRAN 64 Longe de afirmar que a teoria piagetiana tem todas as respostas para a compreensão do processo da aprendizagem infantil, ela simplesmente oferece de maneira fundamentada, coerente e organizada uma maneira de se entender a criança e muitas práticas educativas. Sugere que sábio é o educador que consegue olhar sua prática educacional sob vários ângulos, não reduzindo tudo a uma única visão, a uma única lógica, buscando sentido e significado no processo de construção da aprendizagem de seus alunos e atento à melhor maneira de contribuir nesta construção. Sábio e o educador que tem convicção da diferença que existe no funcionamento infantil e no adulto, reconhecendo que a criança vai se alimentando de detalhes ínfimos e reais dos objetos, que passam completamente despercebidos para nos, adultos, fato que justifica muitas vezes a estranheza que se estabelece entre adultos e crianças. EXAMES OU PROVAS PIAGETIANOS No final dos anos 60, as idéias de Jean Piaget sobre desenvolvimento intelectual começaram a ser conhecidas e discutidas. Passa assim ater papel central no processo ensino- aprendizagem da ciência numa perspectiva cognitivista. Como observa Rappaport (1981:56), os exames piagetianos avalia como o indivíduo elabora e assimila as suas interações com o meio, isso porque a visada conquista da equilibração do organismo reflete as elaborações possibilitadas pelos níveis de desenvolvimento cognitivo que o organismo detém nos diversos estágios da sua vida. As provas operatórias têm como objetivo principal determinar o grau de aquisição de algumas noções chaves do desenvolvimento cognitivo, destacando-se o nível operatório do pensamento da criança, ou seja, o nível da estrutura cognoscitiva com que opera. Essas provas propõem avaliar diversos tipos de conhecimento. Existem conjuntos de provas descritas, visando analisar o conhecimento lógico-matemático na criança, a construção da noção de tempo, de velocidade, do espaço, da relação todo-parte, entre outros. À medida que a influência cognitivista foi se ampliando em base dos estudos piagetianos considerando fases de operações lógicas pelas quais o aluno passa em uma ordem que vai do sensomotor (18 meses), pré-operacional (até 7 anos), concreta operacional (dos 7 aos 11 anos) até o formal operacional (dos 11 até os 15 anos), passa-se então essas fases serem aferidas através dos exames piagetianos, obtendo uma leitura do estágio de desenvolvimento do aluno e de ativação do progresso ao longo desses estágios e do ciclo de aprendizado. Ao finalizar a teoria de Piaget, lembro você que as crianças tem como problema reconstruir, criar inventar, descobrir valores, esquemas cognitivos, afetivos e sociais, fundamentais no seu processo de desenvolvimento, para isso dependem dos adultos que delas cuidam e lhes ensinam. Psicologia da Educação I - Sandra Armoa - UNIGRAN 65 Em todos os estágios, a construção da inteligência se dá pela atividade e essa construção é entendida em termos de significação. A inteligência constrói significações, dá significado ao mundo. A significação é dada na interação do sujeito com o meio (físico, social e simbólico) quando coloca em ação seu sistema de significações. Por essa ação, o sujeito transforma o meio e através das transformações que efetua, transforma-se a si mesmo, ou seja, há um contínuo processo de construção, auto-regulação e auto-equilibração. No desenvolvimento das estruturas de conhecimento, a criança passa de um nível de interação sensório-motora para um nível de representações operatórias. O nível de interação sensório- motora é marcado pelos limites da percepção e pela ação imediata, ou seja, a ação ocorre na presença do objeto. Conhecer o estágio cognitivo que a criança se encontra significa saber como essa criança, imagina ou representa o objeto; como conhece e age sobre esse objeto para transformá-lo e para descobrir as leis que regem suas transformações. As provas piagetianas oportunizam a avaliação de como essa criança interage com o objeto, não sendo possível treinar a criança para respondê-la, mas sim verificar qual o tipo de resposta apresentada, não sendo essa considerada certa nem errada, mas a representação interna de cada um. Por exemplo, de posse de um ramalhete de flores, contendo rosas, margaridas e cravos, o indivíduo com o grupamento lógico-matemático já amadurecido, é capaz de identificar as características de cada uma dessas flores o que lhe capacita a dizer que um cravo pertence à classe dos cravos. Pode dizer, a partir da relação entre as rosas, que existem rosas mais e menos abertas, perfumadas; que o ramalhete comporta mais flores do que margaridas visto que apenas algumas flores são margaridas. Enfim, pode efetuar inserções, substituições, separações, comparações. Além disso, pode concluir que se existem mais rosas do que cravos, obviamente, existem menos cravos do que rosas (reciprocidade); que se foram incluídas 2 rosas e em seguida retiradas 2 rosas, continua a existir a mesma quantidade original de rosas (anulação); que se a soma das margaridas com os cravos resulta em um total de 10 flores, e em seguida deste total são retiradas todas as margaridas serão obtidos todos os cravos (inversão). Enfim, se forem realizadas várias operações e em seguida uma a uma forem desfeitas, se volta ao estado inicial (identidade). Do mesmo modo, em se tratando das interações sujeito-sujeito, pode-se dizer que quando alguém diz que “ajuda outro alguém” significa que ela não ajuda todo mundo, ou seja, antes há um processo de classificação; do conjunto da classe “todo mundo” ela distinguiu a classe “alguém”. Implicitamente nesta frase, há admissão de que se “ajuda mais a esse alguém” do que a outras pessoas, portanto, há um processo de seriação. Esses exemplos ilustram a natureza operatória da estrutura cognitiva e em particular, quando emprega o grupamento lógico-matemático. A construção desse grupamento vai aos poucos sendo organizada em sistemas que dão conta de domínios específicos, mas que operam de maneira similar e visam a manter o equilíbrio da estrutura como tal, além de ampliá-la e enriquecê-la, conservando-a. Psicologia da Educação I - Sandra Armoa - UNIGRAN 66 Assim vistas as operações, elas tanto são resultados da estrutura dos grupamentos operatórios, como sua composição também gera uma estrutura com as características dos grupamentos. Neste sentido Piaget conceitua um grupamento como um sistema de operações tal que o produto de duas operações do sistema seja ainda uma operação do sistema; tal que cada operação comporta um inverso; tal que o produto de uma operação direta e seu inverso eqüivale a uma operação nula ou idêntica; tal que as operações elementares estejam associadas e tal que, enfim, uma operação composta com ela mesma não seja modificada por esta composição.(PIAGET 1973 pg. 97) As provas consistem em apresentar um material previamente organizado para o sujeito e propor atividades em que pode ser observada sua estrutura cognitiva em ação. Os materiais necessários para a aplicação das provas piagetianas em crianças, com o objetivo de avaliação cognitiva: 1- 10 bastonetes de madeira, em tamanhos distintos, para a prova de seriação; 2- 2 fios de cores diferentes, para a prova de conservação do comprimento; 3- 1 ramo de flores, de dois tipos, sendo um em maior quantidade que o outro; (para a prova de Inclusão de Classes) 4- 2 vidros de igual tamanho e diâmetro. 1 vidro mais alto, com diâmetro menor do que os anteriores ; 4 vidros mais baixos com diâmetro menor que o dois primeiros. (todos serão utilizados nas provas Conservação de líquido e volume); 5- 1 vidro de anilina em pó para colorir a água das provas de conservação de quantidade de líquido e volume); 6- 1 caixa de massa plástica (para a prova de conservação de quantidade de matéria ,peso e dissociação peso /volume); 7- 1 pote com tampa , para acondicionar a massa plástica depois de usada; 8- 1 conjunto de 20 fichas de emborrachado sendo 10 de uma cor e 10, de outra, para as provas de conservação de quantidades descontínuas e combinatória; 9- 1 conjunto de fichas de material emborrachado ( círculos e quadrados em tamanhos e cores distintas ) para a prova de dicotomias; 10- 1 conjunto de fichas de material emborrachado ( quadrados e círculos de mesmo tamanho e cores diferentes )para a prova de intersecção; 11- 1 placa emborrachada para a prova de intersecção, que também pode ser usada na prova de seriação, como anteparo. Psicologia da Educação I - Sandra Armoa - UNIGRAN 67 Um exemplo das provas operatórias: 1) PROVA DAS 'FICHAS' (ou conservação das quantidades descontínuas, ou conservação de pequenos conjuntos discretos) a) TÉCNICA Material: dez fichas vermelhas e dez fichas azuis, confeccionadas em papel comum, formato 2x2 cm (as fichas podem ser substituídas por quaisquer objetos que sejam familiares à criança, comopor exemplo tampinhas de garrafa, balas em forma de cubo, etc., observando que cada coleção deve possuir cor diferente, mas forma e tamanho iguais). Desenrolar da prova: Primeira situação: o entrevistador apresenta o material e solicita que a criança escolha para si um dos grupos (azuis ou vermelhas) de fichas. A seguir dispõe sobre a mesa sete de suas fichas enfileiradas e pede à criança que ela componha uma coleção numericamente equivalente com as fichas que possui: "Ponha a mesma coisa com as tuas fichas... o mesmo tanto... igual... nem mais nem menos. Para cada uma das minhas fichas ponha uma das tuas. Vamos fazer-de-conta que essas fichas são balas. Se fôssemos comer, eu e você teríamos que ter o mesmo tanto; igual". Observe que se evita empregar a palavra "número", de forma a não induzir a criança a contar as fichas. Anotar a conduta da criança. Se a criança não conseguir colocar as suas fichas em correspondência termo-a-termo (biunívoca), colocando, por exemplo, 6 ou 8 fichas, o entrevistador deve compor ele próprio a coleção e assegurar-se de que a criança aceita a igualdade, para somente depois prosseguir. É dada aqui uma forma de interrogatório. Fique claro que este deve adaptar-se a cada caso individual, especialmente no que se refere à compreensão pela criança das palavras empregadas para se referir às quantidades. Insistimos no fato de que as idades assinaladas não têm senão um valor indicativo e que, conforme as populações e o sistema escolar, há variações no que se refere às idades em que as condutas aparecem. A análise irá apresentar o nível operatório do sujeito e sua correlação com uma faixa etária.Os resultados são obtidos através da análise das respostas que podem ser agrupadas da seguinte forma: Nível 1, indica ausência total da noção, ou seja, não atingiu o nível operatório neste domínio; Nível 2, indica que as respostas expressam instabilidade em relação ao tipo de operação apresentado; Psicologia da Educação I - Sandra Armoa - UNIGRAN 68 Nível 3, indica a aquisição do nível operatório no domínio testado. As provas de conservação envolvem conservação da quantidade da matéria, são realizadas com massa de modelar. A princípio se apresenta uma igualdade inicial seguida de modificação de elemento (achatamento ou alargamento). Também são realizadas provas de conservação da quantidade de líquidos com recipiente mais fino, mais largo, baixo, alto. As provas de conservação de superfície são realizadas com cartões e provocadas através de modificação espacial. A conservação de peso é avaliada através de massa de modelar de cores diferentes cada uma, cujo tamanho possa fazer duas bolas de aproximadamente 4 cm de diâmetro, uma balança com dois pratos cuja leitura seja pela posição dos braços. Já conservação de comprimento é feito através de barbantes ou corrente um de aproximadamente 10cm e outro de aproximadamente 15cm. Nas provas de classificação, a criança é convidada a organizar coleções, separando seus elementos segundo alguns critérios ou atributos (cor, tamanho, posição, forma) estabelecendo, nesse conjunto, relações de equivalência, propriedades de simetria, reflexividade e transitividade. A ação mental, que envolve a classificação de coleções em classes de conjuntos, serve de base para a construção do conceito de número. Na atividade que envolve seriação, ao organizar uma coleção de objetos estabelece-se uma relação de ordem no conjunto, dotada de propriedades de anti-simetria e transitividade. A criança ao organizar uma fila pelo tamanho, estará coordenando todos os elementos segundo a ordem pré-determinada onde cada um é menor (ou maior do que aquele que o precede (ou antecede). Ao seriar um conjunto pela inserção de objetos, que envolvem as atividades de níveis mais avançados no jogo, a criança estará trabalhando a mesma lógica intuitiva que entra na construção da ordem numérica, mas em nível mais abstrato). A descrição destas provas pode ser encontrada em diversas obras sobre a teoria piagetiana (La Taille, 1992; Rappaport, 1981; Furtado et. al.,1999; Coll, 1992; etc.) e originalmente nas obras de Piaget em que versa sobre Epistemologia Genética. A aplicação deste tipo de teste segue uma metodologia que consiste na aplicação de um interrogatório (método clínico) com a finalidade de conhecer como o sujeito pensa, quais os juízos que faz e como argumenta para justificar suas respostas. O desenvolvimento lógico-matemático é uma das operações de pensamento descritas por Jean Piaget. Trata do estabelecimento de relação lógica entre os entes permite o conhecimento físico e as propriedade dos objetos como: cor, forma, tamanho, textura,consistência, temperatura, som, sabor, odor; noção de espaço, tempo, causalidade, classificação, seriação, conservação; noção de quantidade: muito/pouco; mais/menos; conservação de quantidade: igual/diferente conjuntos (inclusão, interseção, igualdade, relações); geometria (exploração do espaço: curva aberta e fechada, atenção gráfica, ponto de vista); seqüência e seriação (ordem linear); alternância; permuta; medidas; operações (os números, correspondência biunívoca). Psicologia da Educação I - Sandra Armoa - UNIGRAN 69 De acordo com a teoria piagetiana tornar-se humano, construir a inteligência é tornar-se lógico matemático, é pensar lógico matematicamente e construir uma condição fundamental para compreender o mundo. As idéias de Piaget representam um salto qualitativo na compreensão do desenvolvimento humano. Em específico as provas piagetianas que são uma medida onde é evidenciada a integração entre o sujeito e o mundo que o circunda. Cada uma das provas é caracterizada por formas diferentes de organização mental que possibilitam as diferentes maneiras do indivíduo relacionar-se com a realidade que o rodeia (Coll, 1987).
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