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A CONFERÊNCIA DO CAIRO SOBRE POPULAÇÃO E DESENVOLVIMENTO E O PARADIGMA DE HUNTINGTON

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A CONFERÊNCIA DO CAIRO SOBRE POPULAÇÃO E DESENVOLVIMENTO E O PARADIGMA DE HUNTINGTON
Introdução
O artigo de Samuel Huntington trata do choque das civilizações e é considerado o ensaio teórico de relações internacionais mais influentes dos anos 90.
Nele se definia que o modelo bipolar político-ideológico que prevaleceu de 1945-1989, seria substituído por um novo paradigma de comportamento e conflito entre as nações, baseado nas culturas erigidas sobre as grandes religiões.
Pode-se afirmar que o teste mais próximo do modelo por ele visualizado, seria oferecido pela Conferência do Cairo de 1994
Celebra no Cairo de 5 a 13 de setembro de 1994
Refletiu as principais tendências verificadas nas relações internacionais da época contemporânea, trazendo à luz, simultaneamente, outros paradigmas encobertos até então pelos diferentes fatores que já se haviam apresentado mais imediatamente e visivelmente com o fim das rivalidades ideológicas entre capitalismo e comunismo.
Havia muita apreensão devido aos temas que ela iria tratar
Diferença das outras duas grandes conferências da década (Rio-92 e Viena 93, mas não com a Cúpula precursora sobre a Criança):
 a agenda para a do Cairo foi estabelecida sem grandes dificuldades
 o projeto de documento que foi adotado por ela, continha poucas passagens entre colchetes
Por esse motivo, as delegações não consideraram necessário constituir um Comitê de Redação
O projeto foi discutido nas sessões do Comitê Preparatório no período 1991-1993
Só se estabeleceu um único comitê e que ficou a cargo de estabelecer o consenso e a retirada dos colchetes: o Comitê Principal.
Não quer isto dizer que as negociações tenham sido fáceis ou desinteressantes
Antecedentes temáticos
A Conferência de Bucareste
Antes dela veio duas conferências mundiais, de caráter técnico-científico, sobre o tema: em Roma, em 1954, e em Belgrado, em 1965
Por isso é denominada a Terceira Conferência Mundial sobre População – Conferência de Bucareste de 1974
Ela foi, na verdade, a primeira grande conferência intergovernamental a tratar da questão populacional.
Foi realizada em plena Guerra Fria
Sofreu influência das previsões cataclísmicas precisões do Clube de Roma
Foi sobretudo um palco de divergências entre posições “CONTROLISTAS” e “NATALISTAS”.
Tricotomia entre posições: N, C, FN.
Controlistas: Países asiáticos e os ocidentais desenvolvidos. Dentre estes, a postura mais radical era dos EUA;
Fator Neutro: Países socialistas – acreditavam que a população é um “fator neutro”, cujos problemas se deviam unicamente às injustiças dos sistemas econômicos e à propriedade desigual dos meios de produção;
Natalistas: Africa (exceto, por exemplo, Quênia) e quase todas as demais delegações da América Latina.
O Plano de Ação de Bucareste convidava os países a considerar a conveniência de adotarem políticas populacionais, no contexto do desenvolvimento socioeconômico, e indicava o papel de apoio da cooperação internacional, baseada na coexistência pacífica de Estados com diferentes sistemas sociais
O Plano era impreciso em termos de alvos numéricos ou estratégias de ação;
Era um período no qual os países em desenvolvimento tinham forte capacidade de articulação multilateral em defesa de uma nova ordem econômica internacional.
A Conferência do México
Reunida 10 anos depois – 1984
Objetivo: Avaliar a implementação do Plano de Ação de Bucareste
Ocorria após a adoção, em muitos países, de políticas de apoio ao planejamento familiar ou de programas de planejamento populacional
Total inversão dos EUA, então sob a administração Reagan. Advogaram nessa conferência, a neutralidade do fator populacional;
China, desde 1979, já havia adotado a diretriz de “um filho por casal”;
Da África, o país mais expressivo na época, a Nigéria, anunciou a intenção de promover “um enfoque integrado para o planejamento populacional” de forma a evitar que a taxa de crescimento de sua população impusesse a longo prazo carga excessiva sobre a economia nacional;
Brasil: tinha acabado de aprovar a integração do apoio ao planejamento familiar aos serviços público de saúde
Maior inovação em relação a Bucareste foi: a atenção dada à situação e ao papel da mulher.
As recomendações de 1984 observam que: 
a capacidade das mulheres de controlar sua própria fecundidade constituía base importante para o gozo de outros direitos;
a garantia de oportunidades socioeconômicas igualitárias com os homens, assim como a provisão dos serviços e meios necessários, permitiria às mulheres assumirem maior responsabilidade em suas vidas reprodutivas.
 O planejamento familiar foi objeto de 11 recomendações que realçavam a necessidade dos Governos em fornecer educação e meios “aos casais e indivíduos para alcançarem o número desejado de filhos”.
O aborto foi tratado com os seguintes termos: Todos os esforços devem ser feitos para reduzir a morbidade e a mortalidade materna. 
Quase todos os subtemas mais delicados, que acabaram por ser objeto de controvérsias no Cairo, já haviam sido considerados e registrados em documentos internacionais precedentes.
A Santa Sé, tanto em Bucareste, em 1974, como na cidade do México, em 1984, manifestou mesmo tipo de apreensões e discordâncias com as deliberações e dissociou-se do consenso na aprovação dos documentos finais. Única delegação a fazê-lo. A dissociação não se repetiu no Cairo.
 As circunstâncias da Conferência do Cairo
A noção de “neutralidade” do fator populacional perdeu seu substrato ideológico com o fim do bloco socialista. E o consequente esvaziamento das teses por ele propaladas como marxista.
Os EUA, com a eleição do democrata Bill Clinton, desloca do centro de influência, a Moral Majority religiosa, que era arraigadamente conservadora, que tanto determinou as posições republicanas das eras Reigan e Bush, reabrindo a possiblidade do Governo encarar a questão populacional em seu peso específico.
Foi fácil superar as antigas dicotomias entre “controlismo” e “natalismo”, “planejamento populacional” e “desenvolvimento econômico”, pois os preparativos para a Conferência da ONU sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento trouxe um conceito novo que veio a se consagrar no Rio-92.
Conceitos novos: desenvolvimento sustentável, a englobar simultaneamente os sistemas produtivos, os padrões de consumo, a pobreza, o crescimento econômico, a população e a sustentabilidade da vida no planeta.
A adoção da Resolução pelo Ecosoc decidiu, desde o primeiro momento, que a Conferência de 1994 seria sobre População e Desenvolvimento, ao contrário das de Bucareste e do México. EVIDENCIAVA ASSIM COMO É ESSENCIAL QUE HAJA A ESTREITA INTERLIGAÇÃO DOS DOIS TEMAS.
Março de 1991 e maio de 1993 – as duas primeiras sessões do Comitê Preparatório. 
Foram tranquilas;
Decidiram consensualmente os pontos prioritários da conferência:
População, meio ambiente e desenvolvimento;
Políticas e programas populacionais;
População e mulher;
Planejamento familiar;
Saúde de bem-estar familiar;
Crescimento populacional e estrutura demográfica;
Distribuição populacional e migrações
Decidiram os tópicos conceituais para a inclusão do documento final:
Relação entre população, meio ambiente, crescimento econômico sustentável e desenvolvimento;
Capacitação e o fortalecimento da mulher;
Envelhecimento populacional;
Saúde e mortalidade;
Distribuição populacional;
Urbanização e migrações internas;
Migrações internacionais;
Saúde reprodutiva e planejamento familiar;
Parceria entre Governos e ONGs (um dos fenômenos mais marcante da década).
Foi somente a terceira sessão do Comitê Preparatório, em abril de 1994, que o dissenso liderado pela delegação da Santa Sé e de alguns países latino-americanos se manifestou.
Foi assim, encaminhados ao Cairo entre colchetes os trechos do projeto referentes à definição de planejamento familiar, saúde e direitos reprodutivos, maternidade segura, necessidades sexuais e reprodutivas dos adolescentes, bem como aos recursos financeiros necessários à implementação do Plano.As objeções essenciais que foram levantadas pela Santa Sé, não diferiam das apresentadas nas conferências anteriores sobre o mesmo tema.
Dado novo: O crescimento generalizado do fundamentalismo religioso, sobretudo o islâmico. Possivelmente despertados pelas objeções do Vaticano a passagens específicas do projeto de Programa de Ação;
Esse novo dado foi um fator característico da realidade pós-Guerra Fria e proporcionou o grande acirramento das controvérsias em torno da Conferência do Cairo.
O Egito se esforçou para que os países que estavam tentando boicotar o evento vissem que seria mais útil para a fé islâmica confrontar em discussões através da participação ativa nas negociações. As ameaças não surtiram efeito
A Conferência do Cairo contou com 182 delegações, cerca de 2 mil ONGs no fórum paralelo de organizações não-governamentais e grande influência de jornalistas.
Congregou, ao todo, cerca de 20.000 pessoas de nacionalidades diversas – o dobro da Conferência de Viena sobre Direitos Humanos de 1993.
O número de países maior do que em Viena era decorrente do próprio aumento da composição da ONU, resultante do desmembramento de unidade maiores, sobretudo das antigas federações socialistas;
O número maior de indivíduos foi provocado pela atenção crescente que as conferências vinham despertando nas sociedades civis.
A Conferência presenciou um conflito distinto daqueles a que o mundo estava acostumado, no sentido Leste-Oeste ou no sentido Norte-Sul.
 O que se estabeleceu foi uma aliança estratégica entre o dogma cristão e as tradições corânicas, que ia além do previsto por Huntington no seu paradigma do conflito entre civilizações, fundamentadas nas grandes religiões.
Essa aliança, na forma de apoios mútuos e articulações de delegados, foi sensível, audível e visível nas deliberações do Cairo – The Unholly Alliance.
As inusitadas fissuras colocavam de um mesmo lado a Santa Sé e o Irã, a Argentina e a Líbia, Malta e Iêmen, Honduras e Kuate...
No extremo oposto situava-se a União Europeia e os EUA, com alguns apoios afro-asiáticos.
O meio termo, que era a ponte entre os dois polos opostos, composto por sociedades multiculturais e posições tolerantes: Brasil, México, Namíbia, Paquistão...
Foi um paradigma que estava acima das diferenças civilizacionais entre Oriente e Ocidente e entre formas de organização social coletivistas e individualistas, de contraposição política entre autoritarismo e democracia, das disputas socioeconômicas entre países ricos e pobres e das distinções e rivalidades entre confissões e crenças coletivas de cada grupo de nações.
O que se esboçou no Cairo não foi um conflito de civilizações, mas sim outro paradigma de antagonismo internacional que contrapôs fé e realidade social, religião e secularismo, teocracia e Estado civil.
O esboço, felizmente, não se materializou em obra. As fissuras não fraturaram o trabalho coletivo. Elementos que contribuíram:
 Existência de delegações com posições naturalmente conciliatórias;
 A Conferência se realizou em um país mulçumano tolerante, árabe e africano, fundador do Movimento Não-Alinhado;
O Programa de Ação do Cairo
A Conferência do Cairo não chegou a adotar uma Declaração (deferentemente das demais conferências da década);
Não existindo então um texto básico separado oriundo do Comitê Preparatório
Logo o Programa de Ação da Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento, uma vez aprovado, cumpriria também o papel de registrar o compromisso dos Estados com os objetivos visados e os meios de sua consecução.
Com 113 páginas e 16 capítulos, o projeto de Programa de Ação encaminhado à Conferência do Cairo pelo Comitê Preparatório abordava o tema da população de forma abrangente;
Com exceção ao preâmbulo e dos princípios (cap. 1 e 2), todos os capítulos se apresentavam subdivididos em três partes: bases para ação, objetivos e ações.
O projeto indicava dissenso em apenas um único subtema, no capítulo 7, ao se iniciar a conferência.
Conferência de Viena sobre os Direitos Humanos contava com mais de 200 colchetes.
Com exceção do Preâmbulo e dos princípios, os demais capítulos, igualmente relevantes, já haviam sido extensamente discutidos nas sessões do Comitê Preparatório.
A questão do aborto gerou grandes controversas e a Santa Sé e os países que a seguiam mais estreitamente, continuaram com votos contrários, mesmo com a reformulação do tema no projeto.
Estabelecida as definições de saúde reprodutiva e direitos reprodutivos do capítulo 7, o mesmo paragrafo determina que a promoção do exercício responsáveis desses direitos deve ser a base das políticas e programas estatais;
Fixa-se então o compromisso dos Estados em prol do respeito mútuo e da igualdade entre os gêneros
Chama atenção particular as necessidades dos adolescentes em matéria de ensino e de serviços “para que possam assumir sua sexualidade de modo positivo e responsável”.
Medidas recomendadas incluídas no documento:
Disseminação de informações, assessoramento e serviços de saúde reprodutiva;
Propõe tornar acessível métodos voluntários de contracepção masculina, assim como métodos para a prevenção de doenças sexualmente transmissíveis;
Convoca à participação nesse esforço “todos os tipos de organizações não-governamentais, inclusive os grupos locais de mulheres, os sindicatos, as cooperativas, os programas para jovens e os grupos religiosos”
De especial importância para o país e a região onde se realizava a conferência era a recomendação de inclusão nos programas de saúde reprodutiva de uma ativa dissuasão da prática da mutilação genital feminina.
Planejamento familiar: o parágrafo 7.16 estabelece que a finalidade das medidas propostas no Programa de Ação é de “ajudar os casais e indivíduos a alcançarem seus objetivos de procriação e oferecer-lhes todas as oportunidades de exercer seu direito de ter filhos por escolha”.
Negociações sobre o aborto e demais questões com implicações éticas, conflitavam entre as posições religiosas e as de bem-estar social. Predominaram nas deliberações e negociações do Cairo.
Capítulo 10 (Migrações internacionais) da reunificação familiar dos migrantes, exigiram flexibilidade e acomodações pois para o Terceiro Mundo era um direito, quando para os países desenvolvidos não. Prevaleceu a formula consensual, no qual todos os governos, particularmente os dos países de acolhida, “devem reconhecer a importância vital da reunificação familiar e promover sua integração na legislação nacional”.
Negociação do chapeau dos princípios foi particularmente delicada, exigindo inúmeras reuniões informais de um grupo de “amigos do Presidente do Comitê Principal”.
As dificuldades advinham do nível de obrigatoriedade a ser atribuído ao Programa de Ação, tanto à luz da necessidade de respeito às soberanias nacionais, quanto dos valores cultivados nos diferentes sistemas culturais.
Se, por um lado, ninguém chegava a contestar a necessidade de respeito as soberanias nacionais, por outro, temia-se que a noção de “pleno respeito” aos valores éticos e religiosos de cada cultura anulasse a universalidade dos conceitos e direitos definidos no documento, permitindo aos governos fundamentalistas ignora-los sem qualquer consequência.
A formula afinal encontrada, equilibra a noção de “pleno respeito” com os termos “diversos valores...de seu povo” e com a referência aos “direitos humanos internacionalmente reconhecidos”.
Os avanços do Cairo
Alvo estrito: a redução das taxas de crescimento populacional e a estabilização da população mundial em níveis compatíveis com os recursos do planeta;
Tais como as conferências anteriores de Bucareste e do México.
A implementação das recomendações do Programa de Ação, que se dirigem a desafios nas áreas populacional, sanitária, educacional e do desenvolvimento enfrentados por toda a comunidade humana, resultaria num crescimento populacional inferior às projeções estimadas.
Diferença fundamental da Conferência do Cairo com relação às anteriores:
As conferências de Bucareste e do Méxicoencaravam a população pela ótica dos interesses estratégicos e geopolíticos dos Estados, supervalorizando sua capacidade de controle e atribuindo aos governos o poder de decidir se a população de um país deveria aumentar ou diminuir conforme suas conveniências;
A abordagem do Cairo se baseia, acima de tudo, nos direitos humanos. Os Princípios do Programa de Ação, configura, na prática, uma ampla e pormenorizada “declaração de direitos”, retomando e expandindo as disposições da Declaração Universal de 1948, com os aportes das 3 conferências anteriores.
Dos 15 princípios que compõem o capítulo 2:
 Os três primeiros reproduzem quase que literalmente a linguagem de vários documentos internacionais de direitos humanos
 O princípio 4, os alicerces dos programas de população e de desenvolvimento relacionados com a população
 Promoção da igualdade de gênero;
 Equidade entre os sexos;
 Capacitação das mulheres;
 Eliminação da violência contra a mulher;
 Garantia de que ela possa controlar sua própria fecundidade
 Princípio 6: introduz a noção do desenvolvimento sustentável (já mencionado no 2), reiterando os conceitos e recomendações genéricas da Rio-92), estendidos no princípio 7 para a cooperação internacional.
 Princípio 8: retoma o artigo 25 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, elevando o direito a condições de vida adequadas ao determinar que “todos têm direito a usufruir do mais alto padrão possível de saúde física e mental”. A isso se acrescem elementos aprovados no Cairo, assinalando que os Estados devem adotar medidas para garantir o acesso universal a serviços de saúde, “inclusive aqueles relativos à saúde reprodutiva”, que incluem o planejamento familiar e a saúde sexual.
Princípio 9: “A família é a unidade básica da sociedade e, portanto, deve ser fortalecida. Tem o direito de receber proteção abrangente e apoio. Em sistemas culturais, políticos e sociais distintos existem várias formas de família. Deve-se acender, ao casamento através da livre vontade dos futuros esposos, devendo marido e mulher ser parceiros iguais.
Princípio 10 e 11: Diz respeito a categorias particularizadas de pessoas, são dedicados aos direitos das mulheres e das crianças
Princípio 12: atenção aos imigrantes
Princípio 13: aos refugiados;
Princípio 14: aos indígenas;
Princípio 15: retoma mais uma vez e adapta o conceito das “responsabilidades compartilhadas” da Rio-92
O “espírito” do Cairo
O Programa de Ação do Cairo é “globalizante” em diversos sentidos.
Em contraste com as abordagens estatizantes – no sentido de se dirigirem quase que exclusivamente aos Estados – dos planos de Bucareste e do México, o Programa do Cairo é “liberalizante”, atribuindo às famílias, casais e indivíduos as principais funções na esfera populacional – cabendo aos Estados a obrigação de assegurar-lhes os meios para exercê-las.
De orientação descentralizante pois reorienta as funções do Estado na matéria, na medida que multiplica e fortalece o número de atores coadjuvantes entre governos, organizações governamentais e não-governamentais.
Reflete, finalmente, o espírito da época, ao assumir os direitos humanos, entre os quais o direito de asilo aos refugiados, e sobretudo os direitos reprodutivos, como fundamento para toda a ação.
Preâmbulo cautelosamente esclarecia que a conferência não criava novos tipos de direitos humanos, mas o Programa de Ação do Cairo foi o primeiro documento universal a adotar e explicar a expressão “direitos reprodutivos”
Resumindo o “espírito do Cairo”:
 A experiência dos trinta anos precedentes comprovava e ainda comprova que, fora dos Estados totalitários, o controle do crescimento populacional é tendência natural e volitiva dos casais, e particularmente das mulheres, no pleno exercício de seus direitos. Ao Estado incumbe a realização das prestações positivas essenciais ao gozo de tais direitos, particularmente os relativos às liberdades fundamentais, à saúde, à educação, ao trabalho, à não-discriminação e, no caso das mulheres, ao controle da própria fecundidade. Para que isso se concretize em escala universal, é imprescindível a firme determinação nesse sentindo dos governos e sociedades. Mas é também essencial a cooperação internacional.
O Programa de Ação do Cairo constitui:
...uma estratégia para estabilizar o crescimento da população mundial e para alcançar o desenvolvimento sustentável através de ações dirigidas às necessidades da saúde reprodutiva, e dos direitos e responsabilidades dos indivíduos.
Diferentemente do ocorrido nas conferências precedentes, respectivamente 20 e 10 anos antes, na Conferência do Cairo a delegação da Santa Sé aderiu, ainda que de forma seletiva, ao consenso com que se aprovou o documento.
A participação do Brasil
Teve caráter pioneiro e modelar;
O processo preparatório brasileiro desenvolveu-se em diálogo direto entre o Governo e a sociedade, de forma transparente e consentânea com o sistema democrático, o que assegurou a solidez e a efetividade de nossas posições;
Para tanto foi constituído um Comitê Nacional que promoveu, em cidades variadas, seminários abertos com ampla divulgação e expressiva participação de representantes da sociedade civil: meios acadêmicos, ONGs, institutos de pesquisa e CNBB.
A primeira fase desse processo teve por objetivo preparar um relatório nacional para encaminhamento à ONU, conforme previsto nas resoluções sobre a conferência;
Não era um documento definidor de posições;
Descrevia os problemas existentes nos diversos setores sociais, registrando, inclusive, a ocorrência do aborto ilegal e da esterilização feminina.
Uma vez encaminhado o relatório, dedicou-se o Comitê Nacional a buscar as opiniões, senão consensuais, predominantes em nossa sociedade sobre os vários subtemas da conferência, para com elas compor nossas posições a serem defendidas no Cairo
As posições do Brasil não conflitavam com o espírito das propostas contidas no projeto de Programa de Ação;
Os delegados brasileiros puderam, sempre assessorados por especialistas não-governamentais, desenvolver intensa atividade em prol do consenso, oferecendo, muitas vezes, as formulas que levaram aos textos finalmente adotados;
Teve prosseguimento entre os governos presidenciais, a interação governo-sociedade civil iniciada no processo preparatório e mantida na realização da conferência.
Em 1995, foi criada no Brasil, conforme recomendação da própria conferência, a Comissão Nacional de População e Desenvolvimento
Atribuição: contribuir para a formulação de políticas e ações integradas relativas ao tema interligado da população e desenvolvimento e acompanhar a implementação dessas políticas e ações.
Conclusão
Ao término da Conferência do Cairo, a imprensa estrangeira relacionou, na forma de listas, as “vitórias” obtidas por cada grupo de participantes, por ela divididos em três: os mulçumanos, os católicos e “os governos ocidentais e as feministas”.
É absurdo falar em termos de “vitórias e derrotas” sobre um exercício de negociação multilateral em que, com frequência, concessões táticas permitem compensações mais importantes em outros pontos.
O movimento de mulheres foi inquestionavelmente muito ativo e influente, antes, durante e depois da conferência;
Houve avanços conceituais e recomendações expressivas para o aprimoramento das situações da espécie, do ser humano em sua universalidade, das mulheres de todo o mundo.
Num sistema internacional de polaridades indefinidas como o atual, em que o Estado secular de qualquer orientação política não tem conseguido cumprir as promessas da Modernidade Ilustrada em matéria liberdade com condições mínimas de igualdade, a religião é, naturalmente, um fator de aglutinação importante, que se apresenta como alternativa.
Daí então a aparência “auto-evidente” do paradigma de Huntington, espécie de “ovo de Colombo” que se propõe explicar tudo pela ótica exclusiva das culturas, numa época já por muitos qualificada de “nova Idade Média”.[1: Metáfora para se referir a soluções muito difíceis de se chegar, mas quequando reveladas mostram-se, paradoxalmente, óbvias e simples.]
O dado novo observado no Cairo foi a aliança de duas religiões cujas rivalidades, no passado, provocaram tantas guerras.
Parecia, assim, que a comunidade internacional se encontrava dividida, não pelas demarcações entre as “grandes civilizações”, mas entre teocratas e profanos. ESSA APARÊNCIA NÃO SE CONCRETIZOU
Houve a superações das principais divergências

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