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Mário Ferreira dos Santos A Sabedoria das Leis Eternas

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20.10
... Au morrrr. en» l% 8 . M irio l;erreir.i dos SjniiM «|< i
.ikm *lc unta i|iu\c centena dr livros publicados, uma volumo».i di iniUlilot
emtéos i | i i .i i \ «c cncontram£ posso a «segurar lUjtftfatn mai» vaUo«a«
Dentre elas, dc»tacam-*c nem /<rlUirruat, que um exame ohJcjivn |m im iir «mui. 
«em (|ii.il(|U(*r exagero, como um d<friumatdo penvanterifo m<-uluiio un « . ulo XX ...
... I rn i]u.iU|iici país sírio, um legado filosófico deste porte «eria <oittid#rado 
patrimônio nacional c haveria equipes t&nicat. sob esdpfndio d» I stado. 
nfoiçindn-sc para organizar os manuscritos, editá-los, estudiloie dismti los sob 
todos os aspectos. M irio Ferréirt é, afinal, de pleno direito, o Pbiltnophut bnni/inisir, 
*ua obra testemunha a eclosão, tardia ma» esplêndida, de uma Consciência filosófica 
integral neste país e mafea. assim, o verdadeiro ingresso do Brasil na história 
espiritual do mundo, ji n;u> na condição de ouvinte, nus na de orador e mestre ...
( )la iv de Carvalho
S a b e d o r i a d a í 
L e i s E t e r n a s
Introdução. ediçíto de texto e notai Olavo àé Q ai^liho
ário Ferreira dos Sanltn (1907-1968). 
nasceu em Tietê. Estado tie São Pauto, 
tendo passado sua mfàncux e adolescência 
•m Pelotai. Rio Grande do Sul Licenciou-se em Direito
• ciências Sociais pela Unnemdade de Porto Alegre. 
Mudou-se para São Paulo, onde fundou duas editoras 
tara publicarão e divulgação de suas obras: Editora 
'ogos e Editora Matese).
'■'seritor e pensador extraordinariamente fecundo, 
•ubhcou, em menoi de quinze anos. a coleção 
' miclopêdia de ciências Filosóficas e Sociais, que 
ibrange 45 i <olumet. parte de caráter teorêtico e parte 
>iitànco-criticoi. Em 1957. publicou Filotofu 
ortcrru. que estabelece o leu modo de filosofar. Mário 
' erretnt doi Santoi considera a Ftloiofia como ciência
A
S abedoria das 
L eis 
E ternas
ImpfcMo no R ra iil. setembro de 2001
l opytight 10 2001 by Nadícjda Santos N'unct Galvão e 
Yolanda 1 hullici do» SU W »
( «pyriglit J j introduçta e nota» O 2001 by O lavo dc Carvalho
f-ditor l-dson Manoel J c O liveira Filho
< .tf/w e prnjfto grAfuo Shadow 1V*ign
/ ' G trios Ntmgoc
2 ’ M núJo Tere/a M aria teuunso Pereira
/luiiruof^ Capitular c» - Alfabeto I uca Pacioli 
p % . 3 • D . W iener (l Jm m a X I I I ) 
p ig. 41 - Uconardo «la Vm ci
págs. 40 ,62 . 73. 110- I-coiurdo da V inci (corpo» geométrico*) 
pag.l.M - W cn iw l Jam n itirr (corpos geométricos)
/•í *$oluo l )np
hit/trnuio Donnelley Cochrane
O» direitos devo rd isio pertencem a É Realiu fâe* l.tda.
C j .k j 1\m u 1: 45321 0400*) ‘)70 • Sào Paulo SI*
T e l r f « : ( l l ) 5572 5363
c-m.ill: c^errali/acoo.tom .br wsvw.errali/ot oes.com br
Rcsersadot iodos o» direitos desta obra. Proibida toda c <|ual<|iicr rcptoduçio desta 
cdi(,ao (nu qualquer meio ou fom u, seja ela eletrônica. »eja iixx in io». fotocopia, 
^ravaçjo ou qualquer meio de repioduçio. sem permissão exprrssa do editor.
M a r io F i iir i ira d o s S antos
Sabedoria das Leis Etern;
Encidop&lia das Ciências Filosóficas 
Srwn III: M aihis* Mfcnrrr • Parti II (AnaUdca) • Tomo IV
Introdução, «lição de texto e notas 
Olavo dc Carvalho
k
S u m á r i o
in t r o d u ç ã o
Mário Ferreira dos Santos.......................................................... 12
A Enciclopédia c sua realização........................................................ 16
O texto desta edição................................................................ 29
Estrutura da Enciclopédia das Ciências Filosóficas...........................42
A SABF:DORIA DAS LE IS ETERNAS
I. A Lei de Unidade e a Lei de Oposição..................................... 46
(O TEMA DESTAS LIÇÔESj ......................................................... 46
[D istinçoesJ ..........................................................................50
1 [Lei da Unidade].....................................................................51
{A díada Indeterminada] .......................................................53
IO Ato e a Potência] .............................................................57
2 [Lei da Oposição] ..................................................................60
II. As demais leis da Década....................................................... 63
3 [Lei da Relação].....................................................................63
4 [Lei de Reciprocidade, ou Lei do Quaternáriol........................65
5 [Lei da Forma, ou Lei do Q uin irio ]......................................66
6 [Lei de Harmonia, ou Lei do Scnirio]...................................68
7 [Lei de Evolução, ou Lei Setenária].........................................69
8 [Lei de Superação, ou Lei do Octonário]...............................71
9 [Lei da Integração, ou Lei Nonária]...................................... 71
10 [Ix i da Unidade Transcendente, ou Lei Denária]...............72
[Conclusão das lei* da Década]..............................................72
III. I,eis I Ji.idicas c Parte I das Ixis Triádicas...............................74
13 (Unidade. Relação] ................................................................75
14 [Unidade, Reciprocidade] ...................................................... 75
15 [Unidade. Forma]................................................................. 76
17 [Unidade, Evolução]............................................................. 76
18 (Unidade. Assunção]..............................................................76
(Conclusão das Leis Binárias]............................................... 76
[LcisTernárias: Parte 1 - Nota sobre as Tensões].................... 77
123 Unidade. Oposição, Relação................................................ 79
124 Unidade. Oposição, Reciprocidade.......................................81
[Comentários às duas leis anteriores].....................................83
IV. Leis Triádicas (Parte I I ) ........................................................85
125 Unidade, Oposição, Forma..................................................85
126 Unidade, Oposição, Harmonia..............................................87
127 Unidade. Oposição. Flvolução................................................ 91
128 Unidade. Oposição, Assunção................................................ 94
V. Leis Triádicas (Parte I I I ) .........................................................98
129 Unidade, Oposição, Universalidade............../........................98
134 Unidade, Relação, Reciprocidade.................. :........................98
135 Unidade, Relação, Forma...................................................... 99
136 Unidade. Relação, Harmonia.................................................99
137 Unidade, Relação, Evolução...................................................99
138 Unidade, Relação, Assunção............................................... 100
139 Unidade, Relação, Universalidade....................................... 100
145 Unidade, Reciprocidade. Forma......................................... 100
146 Unidade. Reciprocidade. Harmonia.................................... 100
147 Unidade. Reciprocidade, Evolução...................................... 101
148 Unidade. Reciprocidade, Assunção..................................... 101
149 Unidade, Reciprocidade, Universalidade............................. 101
156 Unidade. Forma. Harmonia............................................... >02
157 Unidade. Forma. Evolução................................................. 102
158 Unidade. Forma. Transformação......................................... 103
159 Unidade. Forma. Universalidade........................................ 104
167 Unidade. Harmonia. Evolução............................................ 104
168 Unidade. Harmonia.Transformação................................... 105
169 Unidade. Harmonia. Universalidade................................... 105
178 Unidade. Evolução. Transformação.................................... 105
179 Unidade. Evolução. Universalidade..................................... 106
189 Unidade, Transformação, Universalidade............................ 106
(Leis que partem da oposição]............................................ 106
234 Oposição, Relação, Reciprocidade...................................... 106
235 Oposição, Relação. Ordem ................................................ 107
236 Oposição, Relação, Harmonia............................................ 107
237 Oposição, Relação. Evolução.............................................. 107
238 Oposição. Relação, Transformação...................................... 108
239 Oposição, Relação. Universalidade...................................... 108
245 Oposição. Reciprocidade, Forma........................................ 108
VI. Ixis Triádicas (Parte IV ) ..................................................... 111
(ESCOUSTKA F. PtTAGORISMO].................................................................. 1 1 1
246 Oposição, Reciprocidade, Harmonia................................... 114
247 Oposição, Reciprocidade, Evolução.................................... 114
248 Oposição, Reciprocidade, Assunção................................... 114
249 Oposição, Reciprocidade, Universalidade Cósmica............. 115
256 Oposição, Forma. Harmonia.............................................. 115
257 Oposição, Forma. Evolução............................................... 116
258 Oposição. Forma. Assunção............................................... 117
259 Oposição. Forma. Universalidade Cósmica......................... 117
[Excukso: O Problema i x > Mai | ....................................... 117
267 Oposição. Harmonia. Evolução.......................................... 118
268 Oposição, Harmonia. Assunção......................................... 119
[Substancia e Or/x /s] ........................................................119
269 Oposição. Harmonia, Universalidade Cósmica................... 120
278 Oposição. Evolução. Assunção........................................... 121
279 Oposição. Evolução. Universalidade Cósmica..................... 121
289 Oposição. Assunção. Universalidade Cósmica..................... 121
345 Relação. Reciprocidade. Forma.......................................... 122
346 Relação, Reciprocidade, Harmonia..................................... 122
347 Relação, Reciprocidade, Evolução...................................... 123
348 Relação, Reciprocidade, Transformação............................... 123
349 Relação, Reciprocidade, Universalidade Cósmica................ 123
356 Relação, Forma. Harmonia................................................ 124
357 Relação, Forma, Evolução.................................................. 124
358 Relação, Forma, Transformação-Assunção........................... 124
359 Relação, Forma, Universalidade Cósmica............................ 125
367 Relação, Harmonia, Evolução................................../,......... 126
368 Relação, Harmonia, Transformação.................................... 126
369 Relação, Harmonia, Universalidade Cósmica...................... 126
378 Relação, Evolução. Transformação...................................... 127
379 Relação, Evolução. Universalidade Cósmica........................ 127
389 Relação, Transformação, Universalidade Cósmica............... 127
V II. Parte V das Leis Triádicas e Conclusão................................ 128
456 Reciprocidade. Forma, Harmonia...................................... 128
457 Reciprocidade, Forma, Evolução........................................ 128
458 Reciprocidade. Forma, Assunção........................................ 128
459 Reciprocidade. Forma. Universalidade Cósmica.................. 129
467 Reciprocidade, Harmonia. Evolução................................... 129
468 Reciprocidade. Harmonia, Assunção................................... 129
469 Reciprocidade. Harmonia, Universalidade Cósmica............ 129
478 Reciprocidade. Evolução. Transformação.............................. 130
479 Reciprocidade, Evolução. Universalidade Cósmica................ 130
489 Reciprocidade. Transformação, Universalidade Cósmica...... 130
{Leis da Forma]................................................................. 130
567 Forma, Harmonia. Evolução.............................................. 131
568 Forma. Harmonia, Transformação...................................... 131
569 Forma. Harmonia. Universalidade Cósmica........................ 131
578 Forma. Evolução. Transformação....................................... 131
579 Forma, Evolução, Universalidade Cósmica.......................... 132
589 Forma, Transformação. Universalidade Cósmica................. 132
(Leis da Harmonia]........................................................... 132
678 Harmonia, Evolução, Transformação................................... 132
689 Harmonia, Transformação, Universalidade Cósmica........... 132
789 Evolução, Transformação, Universalidade Cósmica............. 132
[Conclusão]...................................................................... 133
A PÊN D IC ES
Ortografia da Enciclopédia.................................................. 136
Bibliografia de Mário ferreira dos Santos............................ 137
Mario I:irkmra ix>s Santos 
(1907-1‘>68)
I n t r o d u ç ã o
Guia Breve para o Estudioso da Obra Filosófica 
dc M tirio Ferreira dos Sttntos
. - or quanto (empo ainda conseguirá a aliança entre a 
\ displicência, a incpcia c o invejoso desdém manter 
a b _ estendida a rede de sombras que, desde a morte do maior 
dos nossos filósofos, caiu sobre a sua obra luminosa? Por quanto 
tempo ainda durará o reinado dos momos filosóficos, cujo ruidoso 
carnaval abafa o discurso da mais alta inteligência?
Na esperança de que esse reinado esteja perto do fim, apresento 
aqui a obra magnífica que desenterrei dos inéditos legados por Mário 
Ferreira dos Santos, c à qual dei, atendendo a honroso pedido da 
filha do autor, a preparação textual melhor que pude, fazendo-a 
acompanhar desta Introdução para guiamento do leitor.
Nas páginas que se seguem, não intento um resumo ou análise 
do pensamento filosófico dc Mário Ferreira dos Santos, matéria 
para estudo de maior fôlego, mas delineio apenas um rápido perfil 
biográfico do autor, um esquema da estrutura da obra cíclica em 
que este livro se insere - a Enciclopédia das Ciências Filosóficas - e 
um breve relato dos trabalhos editoriais desenvolvidos para a pu­
blicação destas Leis Eternas. Bem sei que discernir numa monta­
nha dc textos os lineamentos de uma estrutura interna global é já 
interpretar, c muito. £ pelo menos remover o principal obstáculo 
no caminho dc uma interpretação, sobretudo no caso dc uma obra 
de dimensões oceânicas, cm que mesmo leitores habilitados não 
souberam enxergar senão um caos movente c inabarcável. Mas. se
.iqui entro na investigação dessa estrutura, n io é bem na posição 
de intérprete filosófico, ao menos por enquanto, c sim apenas na 
de introdutor propriamente dito, para que não se perca o leitor 
entre as colunatas c corredores do maior templo filosófico já erigido 
cm língua portuguesa. Estas páginas tem, portanto, um sentido 
exclusivamente prático c utilitário, sem a ambição de ser um estu­
do filosófico, que não obstante elas preparam e anunciam, no in­
tuito sincero de que a promessa bem-intencionada não se substitua 
ao cumprimento do dever.
M ário F erreira i>os Santos '
Mário [Dias] Ferreira dos Santos nasceu cm Tietê, Estado dc 
São Paulo, no dia 3 de janeiro de 1907, às 13H20, filho de Francis­
co Dias Ferreirados Santas e de Maria do Carmo Santos.
Seu pai, português dc nascimento, descendia dc uma família de 
advogados e juristas, mas seguiu carreira de artista c se notabilizou 
como um dos pioneiros do cinema, tendo produzido c dirigido 
dezenas dc filmes, incluindo O Crim e dos Banhados, reconhecido 
como o primeiro longa-metragem da filmografia mundial. Mário, 
quando menino, participou como ator de alguns filmes do pai.
Casado com uma senhora muito católica, Francisco Santos era 
ateu e maçom. Mário contaria a seus filhos que o contraste entre as 
crenças do pai c da mãe foi um dos primeiros motivos de espanto
1 Para estas notas biográficas, baseei-me amplamente cm trabalho inédito de 
Nadicjda Santos Nunes Galvio, Mário Ferreira dos Santos: Biografia (original 
datilografado, 55p.), e também em informações que me foram transmitidas 
por Yolanda I.hullier dos Santos.
que despertaram prematuramente tua inquietação filosófica. Ape­
sar de suas convicções. Francisco Santos era grande admirador da 
educação jesuítica, motivo pelo qual, após instalar-se com a famí­
lia cm Pelotas, Rio Cirande do Sul, matriculou o filho no Ginásio 
Gonzaga (hoje em dia dirigido por padres mariscas).
Mário Ferreira dos Santos sempre se considerou devedor dos 
jesuítas, dos quais recebeu as primeiras noções de filosofia e a for­
mação religiosa a que permaneceria fiel, apesar de crises temporá­
rias, até o último dia. Deveu a eles algo mais: sentindo despertar 
cm si o que supôs ser uma vocação clerical, foi orientado pelos 
mestres a que buscasse noutra direção o rumo da sua vida.
Em 1925, ingressou na Faculdade de Direito de Porto Alegre, 
estreando como advogado cm 1928, com sucesso, antes mesmo de 
formar-se. No ano mesmo em que se bacharelou cm Direito e Ciên­
cias Sociais, 1930, abandonou a profissão para trabalhar na em­
presa de produções cinematográficas de seu pai. Simultaneamente, 
dirigia o jornal gaúcho A Opinião Pública. Como jornalista, apoiou 
ativamente a Revolução de 1930. mas não tardou a criticar certos 
atos do novo governo revolucionário, sendo por isto preso e obri­
gado a afastar-se da direção do jornal.
Ainda em Porto Alegre, trabalhou no D iário de Noticias, no 
Correio do Povo e em algumas revistas. Como comentarista políti­
co, escreveu mais de uma centena de artigos sobre a 11 Guerra 
Mundial, alguns deles depois reunidos cm livros.
De 1943 a 1944, fez várias traduções para a Editora Globo, entre 
as quais Os Pensamentos, de Blaise Pascal, D iário íntim o, de Amiel, A 
Fisiologia do Casamento, de Ralzac, c Vontade de Potência, de Nicrache.
Nietzschc foi uma influencia marcante na formação do nosso 
filósofo, que depois traduziu ainda - sempre diretamente do original
alemão - Aurortt, Além do liem e dn M a l c Assim Falava Zaratustra, 
este último acompanhado dc comentários minuciosos que, anali­
sando o simbolismo da obra, constituem até hoje um dos mais 
valiosos itens na bibliografia dos estudos nietzschianos. Ainda so­
bre Nietzsche, Mário Ferreira escreveu um longo ensaio, O Ho­
mem Que Nasceu Póstumo. no qual, tomando a palavra cm nome 
do filósofo-pocta, o defende contra seus detratores.
Datam desse período vários outros ensaios dc tema filosófico 
- mas dc tratamento antes literário cm que vemos pouco a 
pouco delinear-se alguns dos temas básicos da preocupação do 
autor. Encontrando dificuldade para publicá-los, Mário Ferreira 
tornou-se seu próprio editor, obtendo notável sucesso de livraria 
com obras publicadas sob uma estonteante variedade dc pseudô­
nimos. Daí por diante, ele não deixaria mais a atividade edito­
rial, fundando várias empresas; as principais foram a Livraria e 
Editora Logos S.A. c a Fxiitora Ma tese Ltda., ambas de São Pau­
lo. pelas quais publicou - imprimindo-os cm gráfica própria - 
não apenas os seus livros, mas uma infinidade dc traduções de 
obras clássicas, bem como enciclopédias, dicionários c antologias 
dc toda sorte.
Na década de 1950, mudou-se para a capital paulista, onde. 
enquanto prosseguia sua atividade editorial, dirigia quatro c i­
nemas, ao mesmo tempo que dava cursos e conferências, escre­
via para jornais c revistas e ainda ia redigindo, em velocidade 
crescente com o decorrer dos anos, a sua obra filosófica. H o ­
mem dc atividade vulcânica típico colérico da tipologia dc Lc 
Senne - c dotado de gênio empresarial. M ário foi o introdutor, 
no Brasil, do sistema de livros a crédito, vendidos de porta cm 
porta. Fez enorme sucesso, ainda aumentado pela repercussão
dc seu Curso de O ranirta e Retórica, freqüentado por políticos, 
empresários c intelectuais de renome, c que, publicado cm li­
vro, vendeu nada menos que onze edições. Nos intervalos, d i­
rigia um Curso de Filosofia por Correspondência, corrigindo 
pessoalmente as lições enviadas por centenas de alunos c ainda 
encontrando tempo para atuar como conselheiro dc pessoas 
aflitas que recorriam freqüentemente ao auxílio dc sua sabedo­
ria. Esta última atividade inspirou-lhe dois livros que ainda 
estão entre os mais interessantes no gênero auto-ajuda: Curso 
de Integração Pessoal e Convite à Psicologia Prática.
Dc 1952 cm diante, entregou-se com paixão avassaladora ã 
construção dc sua obra filosófica magna: a Enciclopédia das C iên­
cias Filosóficas. cinco dezenas dc volumes cuja maior parte che­
gou a ser publicada em vida do autor, restando porém inéditos 
alguns textos fundamentais, dos quais o presente volume inicia a 
publicação ordenada.
Mário Ferreira dos Santos jamais ocupou um cargo público 
ou uma cátedra universitária. Nem procurou fazê-lo. ele que pau­
tou sua vida por uma independência feroz e que mostrou sua 
capacidade dc vencer sozinho obstáculos ante os quais tremeram 
gerações inteiras. Sua única passagem pelo corpo doccntc dc uma 
universidade deu-se no último ano dc sua vida, quando, por in 
sistência dc um admirador c amigo, o filósofo Ictoniano radicado 
no Brasil pe. Stanislavs Ladusãns, s.j., Mário consentiu cm dar 
algumas aulas na Faculdade dc Filosofia N . S ". Medianeira, dos 
padres jesuítas, encerrando, portanto, sua vida dc estudioso, tal 
como a iniciara, entre os soldados dc Cristo. As aulas duraram 
apenas umas poucas semanas. Mário já estava muito mal dc saú­
de, com graves problemas cardíacos, agravados pelo excesso dc
trabalho c pela imensa tristeza do filósofo ante o avanço do po­
der m ilitar que dominava o Brasil; e a direção da escola, preven­
do o pior. mandou instalar, ao lado da sala de aula. um balão de 
oxigênio para alguma emergência.
Mário não morreu na cátedra, mas cm casa. cercado de seus 
entes queridos - sua esposa Yolanda. suas filhas Yolanda c Nadicjda. 
seus genros Fernando e W ilm ar: os únicos verdadeiros aliados c 
colaboradores que tivera numa vida dc batalhas c construções. Sen­
tindo aproximar-se o instante derradeiro, o filósofo pediu que os 
familiares o erguessem. Morrer deitado, afirmou, era indigno dc 
um homem. Morreu dc pé, recitando as palavras do Pai-Nosso.
A En CICJ-OPÉDIA e s u a r e a i j z a ç A o
Sc Mário Ferreira dos Santos tivesse morrido na primeira meta­
de da dccada dc 1950. sua biografia já teria mostrado um homem 
notável pela criatividade, pela multiplicidade dos talentos, pela atua­
ção pública dc jornalista, editor c educador. Mas ocorrcu que. es­
condida sob essa variedade dc ocupações, se desenrolava uma 
biografia interior dc riqueza ainda maior.
Pouco nos dizem a respeito os documentos. O desenvolvimento 
intcicctual c espiritual dc M ário Ferreira é um mistério, pois os 
escritos publicados ate 1952 só dc maneira parcial e obscura re­
fletem as inquietações mais graves que o agitavam por dentro c 
os vastos planos cuja realização já se preparava, talvez, em seu 
subconsciente. Sabc-sc, é claro, que durante todo esse período 
ele não ccssou dc estudar as grandes obras dc filosofia, dc tomar 
notas, dc mandarbuscar no exterior os livros raros dc que neces­
sitava, e mesmo dc encomendar cópias dc velhos fólios cm biblio­
tecas, como, por exemplo, tc/ comos de filósofos portugueses do 
Renascimento, aos quais ele foi uive/, o primeiro grande pensa* 
dor, depois de Lcibitiz. a devotar longo estudo e profunda admi­
ração. Essa atividade interior foi gerando secretamente, por dentro 
do ensaísta, do tradutor-comcntarista de Nictzschc, do jornalista 
c editor brilhante, um novo homem: um filósofo no sentido mais 
pleno da palavra. Na verdade, o filósofo brasileiro. Mas os escri­
tos publicados até o princípio da década de 1950, se anunciam 
os temas c problemas fundamentais de que o filósofo iria ocupar- 
se, nem dc longe deixam transparecer a profundidade, a enverga­
dura e a solidez dos pensamentos que germinavam na alma dc 
Mário Ferreira dos Santos. Inteiramente desproporcional com o 
anterior, o novo homem surge pronto, como se vindo do nada, e 
explode numa seqüência jde dez obras geniais, publicadas entre 
1952 e 1957: Filosofia e Cosmovisão, I.ógica e D ialética, Psicolo­
g ia, Teoria do Conhecimento, Ontologia, Tratado de Sim bólica, f i ­
losofia da Crise, O Homem Perante o In fin ito , Noologia Ceral c 
sobretudo a obra maior desse período: Filosofia Concreta, cm três 
tomos. Publicadas, não; disparadas, ã razão dc um volume cada 
quatro meses. O estado das edições reflete o improviso da produ­
ção, incapaz dc acompanhar a tempestade de intuiçócs fulguran­
tes que ac suicdiam, cada vez mais ricas e abrangentes, no interior 
dc uma inteligência que parccia querer abraçar com um só olhar 
a totalidade do real. O inacabamcnto desses livros, o descuido 
com a revisão, os freqüentes hiatos na exposição c as súbitas mu­
danças dc assunto podem ter repelido muitos leitores, num país 
onde o esnobismo das capas elegantes c das edições bem 
cuidadinhas ainda é uma conditio sine tjua non para que um livro 
seja respeitado até mesmo pelos intelectuais. Mas aí está contido,
sol» uma forma literária descuidada c opaca. nSo só um pensa­
mento maravilhosamente ordenado, mas uma filosofia total, or­
gânica. sistêmica - enciclopédica no sentido ctimológico do termo: 
um ensinamento abrangente, de estrutura perfeitamente circular 
ou esférica. Porque é evidente que esses dez livros foram concebi­
dos todos dc uma vez, como capítulos de uma exposição seguida, 
destinada a abranger de maneira global e pela ordem lógica os 
temas básicos da indagação filosófica. Pela ordem. sim. porque a 
desordem ali é só do pormenor estilístico: a estrutura, tanto da 
série como dc cada livro, é límpida.
Mas não é só do exame dos livros que se conclui a unidade do 
conjunto. Os familiares do autor contam que, dando uma confe­
rência cm São Paulo, Mário repentinamente se calou c, após al­
guns minutos dc constrangimento geral, pediu aos ouvintes que o 
desculpassem: acabara de ter uma idéia e precisava registrá-la no 
papel antes que escapasse. Foi para casa c redigiu na mesma noite a 
série dc teses principais da Filosofia Concreta. Estas teses, numera­
das, progridem como numa demonstração.matemática, dos prin­
cípios auto-evidentes até as mais remotas conseqüências para os 
vários domínios da filosofia. Mais tarde Mário acrescentou demons­
trações - cruzando vários métodos lógicos c dialéticos -, comentá­
rios, escólios etc. Basta examinar os nove títulos restantes» da Primeira 
Série da Enciclopédia para verificar que eles não fazem senão dar 
recheio à armadura então esboçada, realizar cm detalhe o progra­
ma da Filosofia Concreta, desdobrando, num confronto dialético 
com múltiplas correntes de pensamento, e enriquecendo, com uma 
variedade dc exames segundo as perspectivas dc diferentes discipli­
nas filosóficas, o esquema que, no último livro da série, será apre­
sentado numa síntese geometricamente ordenada.
C) primeiro volume, l ilotofia <■ Counoviulo, ainda mostra hesi­
tações do autor quanto . 1 0 rumo d.i coleção. I)c um lado, tratava- 
se dc apresentar uma filosofia nova, original até à audácia, ao 
mesmo tempo que arraigada no solo arcaico do pitagorismo; e de 
fazê-la dialogar com as correntes principais do. pensamento con­
temporâneo, às quais ela se opunha dialcticamentc, ao mesmo 
tempo que se oferecia como síntese abrangente dos seus momen­
tos positivos. De outro lado, falava a vocação do educador, que 
queria ensinar a todos, ser didático, espalhar livros dc filosofia 
por todo o Brasil, ser compreendido até pelo mais humilde ope­
rário do centro anarquista, onde suas conferências lhe haviam 
conquistado sólidas c duradouras amizades.
A m istura impossível não deu certo. Oscilando enire o 
didatismo vão, nos trechos cm que coloca os problemas clássicos 
da filosofia, c a obscuridade inevitável, naqueles cm que apresen­
ta suas respostas dc uma ousadia c de uma grandeza sem par, 
M ário nos deixou uma obra híbrida c hesitante, que constitui, a 
meu ver, a pior introdução possível ao seu pensamento. Isto não 
desmerece, é claro, os elevados méritos do livro, sobretudo das 
suas partes finais, em que Mário, como que num súbito arran­
que, num acesso dc urgcncia, abandona toda preocupação didá­
tica e informativa para nos entregar, cm páginas dc extrema 
densidade, o núcleo vivo do seu pensamento. O resultado, po­
rém, é que o leitor versado cm filosofia é repelido pelo didatismo 
das primeiras páginas, c o leigo pela obscuridade das últimas, dc 
modo que, faltando a este a paciência c àquele a humildade, ambos 
deixam dc tirar proveito da leitura.
O segundo volume padece do mesmo defeito, mas atenuado, 
porque entre a primeira parte - um manual dc lógica clássica - e
a segunda uma apresentação resumida do novo método dialético 
concebido pelo autor, a decadiaUtica um capítulo intermediá­
rio sobre as várias dialéticas havidas na História faz as vezes dc 
ponte, produzindo um efeito dc graduação crescente da dificuldade. 
que era provavelmente o que o M ário quisera fazer, sem sucesso, 
no primeiro volume.
Do terceiro cm diante, a argumentação toma impulso, as novas 
perspectivas abertas pelo método dccadialético vão surgindo com 
progressão deslumbrante, a filosofia dc Mário Ferreira dos Santos 
vai tomando corpo até perfazcr-sc com uma summa de demonstra­
ção geométrica nos três volumes da Filosofia Concreta.
A meio caminho, Mário tem uma recaída no didatismo, mas é 
uma recaída providencial. O Tratado de Sim bólica, sexto volume 
da série, tratando dc um assunto bastante desconhecido no Brasil 
de então, mesmo pelo leitor culto, interrompe a exposição da filo­
sofia pessoal dc Mário, para dar os princípios fundamentais de 
uma ciência do simbolismo resumidos das obras dos bons 
tratadistas, como Mathila Ghyka, Mircea'Kliadc, Rcné Guénon e 
outros. Acontece que, entre esses princípios, surgem as interpreta­
ções simbólicas dos números dc 1 a 10 segundo o pitagorismo, as 
quais, no confronto com outros símbolos, dc ordem plástica, ad­
quirem uma clareza maior do que se fossem apresentadas 1 1 0 abs­
trato c sem esse suporte sensível. E acontece também que toda a 
metodologia, toda a dialética e toda a ontologia de Mário Ferreira 
se baseiam, cm última análise, num aprofundamento do sentido 
dos números no pitagorismo. Este livro, aparentemente o menos 
filosófico da série, acaba por funcionar, quase que sem querer, como 
a mais didática das introduções ao pensamento de Mário Ferreira 
dos Santos, c será recomendável que o leitor faça por ele seu
primeiro contato com a obra do filósofo. Isto lhe dará uma ba.se 
sensível e imaginativa onde apoiar-se para escalar as abstrações que
o elevaráo. nos volumes seguintes, a alturas quase irrespiráveis, que 
aliás já se anunciavam na Teoria do Conhecimento (vol. iv) e na 
Ontologia (vol. v).
Cario Bcraldo, no longo verbete que consagrou a Mário Ferreira 
na Enciclopédia Filosofica do Centro d i StudiEilosofici d i Gallarate,2 
definiu a filosofia do mestre brasileiro como uma síntese “ao 
mesmo tempo tradicional c pessoal” - dc pitagorismo c tomismo. 
A definição é incompleta, mas verdadeira no essencial, e constitui 
uma boa via de acesso para a compreensão dessa filosofia.
O ponto dc partida dc Mário Ferreira é uma reinterpretação 
completa do pitagorismo, cm parte com base nos textos remanes­
centes da escola pitagórica, cm parte fundando-sc na idéia dc re­
compor idealmente essa filosofia, tomando como hipótese a sua 
“coerência intrínseca” , isto é, a conjctura historicamente verossí­
mil de que Pitágoras, ou a escola pitagórica, não poderia deixar dc 
pcrccbcr as conseqüências lógicas imediatas - c mesmo algumas 
não tão imediatas - dos princípios que havia postulado.
Mas essa reconstrução não tem ncccssariamcntc, segundo M á­
rio, um sentido histórico, c sim doutrinai c lógico. Sc cia não nos 
dá o pitagorismo historicamente autêntico, dá-nos a autêntica filo­
sofia dc Mário Ferreira, antes inspirada do que calcada em Pitágoras. 
Esta filosofia sc ergue por etapas - não no sentido cronológico, 
mas lógico -, que vão ampliando c aprofundando o sentido dc 
uma intuição originária, até reconstruir, tomando-a como centro,
o edifício inteiro das ciências filosóficas. As etapas são quatro:
J Fircnzc: G. C. Sarnoni Ivdittorc. 2cd. 1969.
Primeira etapa M ário compreende a Década Sagrada dos 
pitagóricos inicialmente como um sistema dc catcgorias lógi­
cas. Desde o primeiro desses pontos dc vista, ele constrói um 
novo método dialético - a decadialética - que, abordando uma 
questão desde dez pontos dc vista interligados, ofcrccc um con­
trapeso dialético ao abstratism o da lógica form al. Para a 
dccadialética, todo o ente (ou todo problema) deve ser enfocado, 
sucessiva c rotativam ente, como unidade, como oposição 
(interna), como relação (entre os opostos), como proporção (entre 
as relações internas) c como form a (síntese concreta dos quatro 
aspectos anteriores). Isto perfaz o exame da sua constituição 
interna. M as cm seguida o objeto deve ser visto em sua 
harm onia (com o meio circundante), cm seus aspectos dc rup­
tura c crise, que o separam abissalmente do meio c o sujeitam a 
mutações, cm seu potencial de superação ou assunção (pelo qual, 
perdida a sua harmonia intrínseca, sc integra numa harmonia 
im ediatam ente superio r), na unidade superior da forma 
abrangente (que reúne os oito aspectos anteriores c os integra 
no todo cósmico) c, finalmente, em sua inserção finalística na 
unidade transcendente do real, no Ser supracósmico, no Supre­
mo Bem de que falava Platão.
Há uma segunda maneira dc aplicar a dccadialética. Aqui o» 
dez aspectos tornam-sc dez campos, cada um definido por uma 
oposição básica:
1 Sujeito x objeto
2 Atualidade x virtualidade
3 Possibilidades reais x possibilidades não-rcais
4 Intensidade x extensidade
5 Atualizaçõc* (c virtuâlittiçõcs) da imensidade x atuali/ações 
(c virtualizaçõe») da extriuidade
6 Razão x intuição (oposiçôcs no sujeito)
7 Conhecimento x desconhecimento (oposiçôcs na razão)
8 Atualizações e virtualizações da intuição x atualizações c 
virtualizações da razão
9 Conhecimento x desconhecimento (oposiçôcs na intuição).
10 Variante x invariante
Só quando enfocado por esses dez prismas, cm suas duas ver­
sões, é que um problema filosófico pode considerar-se suficiente­
mente elaborado c, eventualmente, pronto para ser resolvido. O 
método abrange o uso da lógica formal antiga c moderna, das vá­
rias dialéticas (aristotélica, hegeliana, nictzschiana etc.), como ele­
mentos técnicos que são integrados c superados no conjunto. 
Quando o objeto ou tema é encarado como um todo, a decadialética 
inclui ainda um complemento, a pentadialética, que o enfoca cm 
cinco planos sucessivos:
1 Como unidade em si;
2 No todo do qual é elemento;
3 Na strte a que pertence como etapa;
4 No sistema cm que se integra funcional c tcnsionalmcntc;
5 No universo, considerado de maneira csqucmitica c abstrata.
Segunda etapa - Tendo construído este método e demonstrado 
sua cficicia na resolução dc uma variedade de problemas filosófi­
cos, ele dá o passo seguinte: demonstrar que os dez números não 
são apenas categorias lógicas, mas noéticas: não regem somente a
estruturação do raciocínio coerente c ideal, mas toda a esfera da 
cognição luimana real. As categorias são assim elevadas a arquéti­
pos. Nesta etapa, ele demonstra a coerência entre suas interpreta­
ções das categorias pitagóricos e os simbolismos dos números de
1 a 10, tal como se encontram nas obras dc arte sacra, nos textos 
sagrados das várias religiões etc.
Terceira etapa - Isto feito, ele avança ainda mais; demonstra 
que não são arquétipos só cm sentido noético, mas ontológico; 
que imperam necessariamente sobre todo ser possível, indepen­
dentemente e acima das formas da cogniçáo humana: os arquéti­
pos tornam-se princípios.
Quarta etapa - Finalmente, ele demonstrará que os princípios 
universais assim encontrados não são apenas esquemas da possibi­
lidade universal, mas leis ontológicas, que imperam efetivamente 
sobre todas as ordens de realidades.
Essas etapas são percorridas em imensos giros, em que o olhar do 
filósofo vai abarcando sucessivamente todos os temas c problemas 
da filosofia universal e reordenando-os segundo novas sínteses, cada 
vez mais abrangentes, que reabsorvem numa unidade transcendente 
as teses mais opostas, as correntes mais antagônicas, enfim reconcilia­
das à luz da Mathesis megiste - o “ensinamento supremo".
Mathesis megistr. Mário utiliza-se desta expressão pitagórica para 
nomear a última série da sua Enciclop/iiia c a culminação do seu 
ensino. Para explicar dc que se trata, ele começa por classificar cm 
quatro tipos as linguagens com que se transmitem conhecimentos: 
pragm ática, para as comunicações cotidianas: sim bólica, para a
poesia c a religião; cientifica, para dar conceitos nítido» às coisa» 
classificadas pelo conhecimento; c finalmente filosófica, “onde o» 
conceitos atingem »ua mixima pureza, válidos para todos os seto­
res do conhecimento humano". Realização última c plenária da 
linguagem filosófica, a Mathesis megiste, assim, constrói "um uni­
verso dc discurso válido para todas as esferas do conhccimcntoV 
Quanto ao conteúdo, a Mathesis compóc-sc dc verdades per se nou, 
coligidas das obras dc todos os principais filósofos (não houve um 
que não perccbcssc alguma) c ordenadas cm sistema. A Mathesis é, 
pois, algo como uma unidade transcendente das filosofias, na qual se 
expressam os princípios auto-evidentes subjacentes a toda filosofia 
possível; é, ao mesmo tempo, a lógica interna dc todo sistema dc 
metafísica e ontologia, c finalmente uma supramctodologia dc to­
das as disciplinas filosóficas.4
Para dar expressão a esse pensamento grandioso. Mário conce­
beu o plano dc sua Enciclopédia cm três partes, acompanhando a 
exigência dc sua dccadialética de que toda abordagem dc um pro­
blema filosófico, grande ou pequeno, o enfocasse primeiro numa 
rápida visão sintética, cm seguida o desdobrasse analiticamcntc cm 
seus vários aspectos c componentes discernidos pela abstração, c 
que, finalmente, os vários ângulos abstrativamente separados fos­
sem reumficados, concrccionados (dc cum crescior. “ crescer junto") 
na visão simultânea das dez dimensões do ser.
5 Cf. A Sabedoria dos IVim/pioi, p. 15 u.
* Beraldo foi particularmente feliz ao assinalar que essa síntese é “a um tempo 
tradicional e pessoal", pois Mirio nío apresenta a Mathetii como obra original 
sua, e sim como uma elaboraçio pessoal dc uma ciência ji anunciada c parcial­
mente realizada pelos grande» filósofos do passado, particularmente Pitigoras. 
Platlo. Aristóteles. S. Tomis de Aquino e S. Boaventura.
Esse esquema ternário - e isco é fundamental para a compreen­
são do pensamento dc Mário- ordena não somente a construção 
dc cada livro cm particular, mas a da Enciclopédia como um todo, 
c também a dc cada uma das três séries dc que, coerentemente com 
o mesmo esquema, ela sc compõe. A rigorosa geometria do con­
junto escapa de todo ao leitor que examine as obras dc Mário sepa­
radamente. ainda que as leia cm grande quantidade; c é só a estrutura 
do conjunto que ilumina a das seções c a dos livros individuais, 
refletindo-se o todo nas partes c estas no todo.
Mas a ordem geométrica da construção vai ainda mais fundo: 
na primeira e na tcrccira séries da Enciclopédia, isto é, na síntese 
inicial c na concreção final, a distribuição dos volumes segue, 
pelo assunto, a progressão das categorias pitagóricas, de 1 a 10, 
isto é, o primeiro volume enfoca seu tema pelo prisma da unida­
de, o segundo pelo da oposição, o tcrcciro pelo da relação etc. A 
série intermediária não poderia obcdcccr a uma ordenação seme­
lhante, visto que é a parte analítica da Enciclopédia. na qual sc 
examinam, um a um, temas e problemas cuja divisão, c subdivi­
são, poderia, cm princípio, prosseguir indefinidamente. A í, por­
tanto, a numeração é livre, obedecendo somente à seqüência 
cronológica das edições.
A estrutura da Enciclopédia pode entao ser visualizada segundo
o diagrama da página 43. Flis aí, clara e distinta, a ordem interna 
dc uma obra filosófica cm que os contemporâneos do autor - 
incluindo os pajés c caciques da taba filosófica tupiniquim - não 
souberam enxergar senão a confusão da sua forma externa, movi­
dos por uma ilusão - como direi? - tipográfica. É claro que, ao lhes 
fazer esta censura, estou consciente dc não haver da minha parte 
atinado com essa estrutura num relance dc antevisão genial, mas
num esforço continuado dc algum ano». Mas fiz afinal esse esfor­
ço, movido pelo prestemimemo confiante dc que por trás da apa­
rente mixórdia dos textos havia algo dc precioso a compreender; ao 
passo que eles, os importantes do dia - entre os quais muitos ainda 
importantes hoje em dia logo empinaram os narizinhos c vira­
ram as costas a esta obra magnífica, fundados na presunção de que 
ali não havia nada a compreender. Presunção no duplo sentido, de 
suposição c dc pretensão vaidosa. É claro, também, que a obra 
materialmente realizada não perfaz cm todos os pontos essa estru­
tura ideal, deixando várias lacunas c imperfeições - sobretudo nos 
dez volumes finais, inéditos c alguns incompletos as quais, no 
entanto, nem dc longe bastam para ocultar os lineamentos do todo 
aos olhos dc um leitor paciente.
Quanto ao sentido geral da obra. a fórmula dc Cario Bcraldo, 
se peca por incompleta - já que entram na composição do pen­
samento dc M ário muitas outras heranças além da pitagórica c 
da tomista -, chama no entanto a atenção para um ponto fun­
damental: observando a tendência geral do mundo moderno para 
a macematização do pensamento filosófico, M ário empenhou* 
se a fundo em sanear essa tendência de sua preconceituosa here­
ditariedade gnóstica e anticristã, e supôs, aparentemente com 
razão, que os males do maternalismo só poderiam ser sanados, 
hom copaticam cntc, com um m aternalism o ainda mais 
aprofundado. A crítica que ele empreendeu da lógica matemáti­
ca. num dc seus livros, aliás dos mais prejudicados pelo descuido 
da edição,' mostra uma intuição quase visionária dc uma das 
principais raízes da tragédia contemporânea: a matcmatização
' Grandezas t Mtitruu iLt Ijtgíuica. Sfto IViulo: Maiesc, 1966.
do pensamento empreendida por intelectos menores, incapazes 
dc apreender, da matemática» senão os seus aspectos lógico-for- 
mais, e totalmente cegos para a esfera superior em que por trás 
do puro formalismo, aparece a realidade suprema dos princípios 
ontológicos, substancialmente os mesmos proclamados por 
Aristóteles e S. Tomás dc Aquino. A ponte entre o matcmatismo 
c a ontologia, Mário julgou encontrá-la em Pitágoras. Daí o accr- 
to essencial da fórmula dc Bcraldo.
Pouco importa, ademais, saber sc o Pitágoras aí referido é o 
histórico ou sc é uma pura projeção dc um aspecto superior da 
alma do próprio Mário Ferreira dos Santos. Mário mesmo brincou 
com essa hipótese, auto-representando-sc, num diálogo filosófi­
co,6 na figura de um personagem de nome Pitágoras dc Mello.
Não é impossível, no entanto, que a fantasia exata do seu 
pitagorismo tenha acertado mais fundo, historicamente, do que 
ele mesmo supós. Pois, na sua ousadia de reconstrutor ideal, ele 
avança sua conjetura até delinear, na base da pura dedução, o 
que poderia ter sido o ensinamento oral de Platão; c aqui ele 
acerta na mosca, como sc vc pela perfeita homologia entre o seu 
Platão ideal c aquele revelado, duas décadas após a morte do nos­
so filósofo, pela exaustiva confrontação histórica dos textos, em­
preendida cm trabalho memorável pclu Im toiiudoi italiano
Giovanni Reale.
* Filmofiat da Afirmação e da Negação. Sào 1'aulo: Logo». 1959.
V. Giovanni Reale, Per una Nuoiu Interprrtazione dt Platone: Rilettura delia 
Meiafitua da Crandi Dialoghi alia l.uce delir "Dottrine Non-Scntte". 5.cd. 
Milano: Vita c IVmiero. 1987, c tb. Henrique C. dc Uma Vaz, “Um novo 
Platio?". Slnteie (Bdo Horizonte), n.50. jul-set. 1990, p.101-3.
O I I X I X ) DP.STA ID U An
Ao morrer. cm I % 8 , Mário Ferreira dos Santos deixou. além dc 
uma quase centena dc livros publicados, uma volumosa colcçfto dc 
inéditos, entre os quais sc encontram posso assegurar suas obras 
mais valiosas. Dentre das, destacam-se estas /.ris Eternas, que um 
exame objetivo permite situar, sem qualquer exagero, como 
um dos cumcs do pensamento metafísico no século XX.
Não foi porém a consideração dc seu valor c importância singu­
lares que mc fez decidir a começar por este livro a edição da série 
das Obras Inéditas do grande filósofo brasileiro. As razões foram 
duas. A primeira, dc ordem meramente prática: dos inéditos, este 
era o mais acabado, o dc preparação editorial menos dificultosa.'
A segunda requer mais explicações. Mário Ferreira dos Santos 
escreveu sua obra magna, a Enciclopédia das Ciências Filosóficas. ' 
mais dc cinco dezenas dc volumes, dc um só jato, trabalhando 
incansavelmente dc 1952 até o ano dc seu falecimento (1968). 
movido por uma intuição central cuja unidade não sc perde. um 
só instante, ao longo dc toda a série.
Obra sistêmica e circular, os vários volumes que a compõem se 
apóiam c sc explicam mutuamente, sendo por isto freqüentes as
• A expressão não e cuual: no estado dc catastrófica mixórdia c inacalumcnto cm 
que o autor deixou seus manuscritos, o "mais fácil", para o editor, pode significar 
na melhor das hipóteses apenas o “menos difícil”.
’ O título é incerto. O autor ora usa "Enciclopédia das Ciências Filosóficas t 
Culturais", ora “Enciclopédia das Ciências Filosóficas r Sociais", ora apenas 
"Enciclopédia das Ciências Filosóficas". Para simplificar, o editor optou |x>r 
esta última alternativa.
remissões dc um a outro. Como, ao escrever um dos volumes, o 
autor já tivesse cm vista sua complcmcntação pelos seguintes, ocorre 
também, com frcqücncia, o anúncio dc que tal ou qual argumento 
será desenvolvido ou fundamentado numa obra posterior, àquela 
altura só existente como intenção c plano. No ritmo frenético cm 
que o autor trabalhava, é compreensível que muitas vezes mencio­
nasse uma mesma obra sob títulos diferentes, seja por distração 
(ele mesmo se penitenciava citando o célebre Aristotelis insignis 
negligentia in scribendo), seja por haver decidido a mudança dc 
título, seja porque resolvera desdobrar cm vários volumes a obra 
inicialmente planejada para um só, ou comprimir num só o conce­
bido para muitos. Ao leitor que conheça somente os volumes pu­
blicados cm vida do autor, mesmo que os leia em sua totalidade, a 
obra de Mário Ferreira dos Santos parecerá truncada c informe no 
seu gigantismo, Ficando difícil rcconhcccrnela as linhas subjacentes 
de uma coerência arquitetônica que, não obstante, o autor procla­
ma existir. A idéia que nos ocorre ante essa montanha dc pensa­
mentos é a da absoluta impossibilidade dc completar a execução 
de um projeto tão ambicioso. Com estonteante surpresa, portan­
to, foi que descobri, ao examinar os inéditos, que o plano anun­
ciado fora realizado integralmente, que a Enciclopédia das Ciências 
Filosóficas era uma realidade, um todo completo e acabado, não 
faltando um só volume dentre os muitos que o autor prometera.
Diante desse fato, restava organizar o conjunto, seguindo as in­
dicações, nem sempre concordantcs, é verdade, que o autor deixa­
ra quanto às linhas dc construção c à distribuição das partes; c em 
seguida preparar o texto dc cada volume para publicação.
Para a primeira dessas tarefas, a fórmula da solução foi encon­
trada. miraculosamente. num fragmento dc papel, do tamanho da
palma du m io, metido entre a* pana* de cartolina guardada* na 
cava da Avenida Irerê, no bairro do Planalto Paulista, cm S lo Pau­
lo. onde Mário Ferreira dos Santos vivera seus últimos dias. Nesse 
papclucho o filósofo rabiscara às pressas a numeração dos dez últi­
mos volumes da Enciclopédia, que compóem juntos uma série com­
pleta dedicada ao estudo da disciplina a que o autor chamava, 
pitagoricamente. Mathesis megiste, “ Ensinamento supremo" o 
coroamento do seu sistema filosófico. Como, por outro lado, o* 
dez primeiros volumes da obra publicada - dc Filosofia e CosnwvtsAo 
(1954) a Filosofia Concreta (1957) - constituíam também e 
declaradamente uma série completa, dc caráter introdutório, fica­
va nítida a divisão da Enciclopédia em três blocos ou séries: 
uma série dc dez títulos no começo, outra dc dez no fim, cada uma 
formando por si uma unidade dc caráter sintético; no meio. algu­
mas dezenas de obras consagradas a temas específicos, abordados 
analiticamente. A estrutura do todo seguia fielmente o método 
expositivo do autor, adotado dentro dc cada obra cm particular, 
que dividia o tema numa “síntese inicial abstrata” , num desdobra­
mento analítico intermediário e numa “síntese final concreta". 
O amontoado confuso dc papéis resolvia-se num edifício dc linhas 
perfeitamente cristalinas.
Na breve anotação dc M ário Ferreira dos Santos, os volu­
mes finais da Enciclopédia distribuíam-se cm oito títulos e dez 
volumes, assim:
I A Sabedoria dos Princípios
II A Sabedoria da Unidade
lll/iv A Sabedoria do Ser e do Nada, 2v.
v A Sabedoria das Is is Eternas
vi D iaU tica Concreta 
vii/viii Tratado de Esquematologia, 2v.
IX Teoria Geral das Tensões 
x Deus
Esses volumes deveriam estampar, transcrito c corrigido, o con­
teúdo do curso que, sob a denominação geral Mathesis megiste, o 
autor vinha proferindo para um grupo privado desde 1966. Os 
três primeiros títulos estavam publicados. O volume II dc A Sabe­
doria do Ser e do Nada saíra, logo após o falecimento do autor, por 
iniciativa dc sua filha Yolanda Lhullier dos Santos (M ário Ferreira 
era editor dc si mesmo, com uma grande grifica própria, onde 
pusera a trabalhar todos os seus familiares). Os títulos restantes 
foram encontrados em manuscrito, no seguinte estado:
A Sabedoria das Leis Eternas. Transcrição de seis aulas, gravadas 
cm fita c datilografadas pela esposa do filósofo. Yolanda Santos 
Burdettc. e ainda sem revisão do autor.
D iaU tica Concreta. Constituía-se. em párte, de aulas transcritas, 
cm parte, de anotações manuscritas do autor.
Tratado de Esquematologia. Idem.
Teoria Geral (Lis Tensões. Coletânea dc breves anotações, trans­
critas c numeradas por D. Yolanda à medida que as cuucgavu u 
autor, acompanhadas dc alguns planos e esquemas para a 
estruturação da obra.
Deus. Sob este título, o autor reunia sob a unidade dc um plano 
de conjunto materiais dc tempos c origens diversas. Aproveitava 
em parte o que escrevera décadas antes para um livro projetado sob 
o título Deus: Provas contra e a favor da Sua Existência, juntando- 
lhe notas rcccntcs c transcrições dc aulas da Mathesis.l0
Ao lado dos oito título» tia *érie final. M irio deixara vários ou­
tros que, segundo compreendi, la/iam parte da série intermediá­
ria. já que tratavam sempre dc temas específicos. Alguns deles sc 
constituíam dc traduções comentadas - S. Boavcntura, Plotino, 
Lao-Tsê, Duns Scot -, o que seguia o hábito do autor, manifestado 
em sua obra publicada, de expor parte dc suas idéias ao fio dc 
comentários a algum filósofo célebre.
Do conjunto dos inéditos, só quatro podiam ser ditos incom­
pletos: a Teoria G eral das Tensões, coleção dc fragmentos soltos 
que não abrangiam a totalidade dos temas anunciados no Plano 
que os acompanhava; a tradução dc De Prim o Princip io dc Duns 
Scot, a que faltavam os prometidos Comentários; a tradução da\ 
F.néadas dc Plotino. também sem os anunciados comentários; c 
Filosofia e Romantismo. dc que não sc encontraram senão frag­
mentos esparsos. Todos os demais títulos anunciados - da segunda 
c da tcrccira série - estavam lá completos, ainda que cm rascu­
nho. A Enciclopédia realizara-se. O filósofo não sc fora deste 
mundo sem terminar sua tarefa.
FJc até deixara, abreviada, mas nem por isto menos eloqüente, 
uma indicação do que esperava dc seu futuro editor: completar,
10 Curiosamente, o* textos mais antigos eram anteriores mesmo i intuito ini­
cial da Enciclopédia (1954). que assinala uma mudança decisiva no curso do* 
pensamentos do autor. Verifiquei depois que Mário Ferreira, tendo pastado 
por uma grande transformação interior por volta dos quarenta anos. quando ji 
era autor de muitas obras publicadas c outras tantas inéditas, tentou reintegrar 
nas novas linhas do seu pensamento as obras dc juventude, mediante corre­
ções, cortes e remanejamentos. com maior ou menor sucesso conforme o caso, 
Deut i o único exemplo de remanejamento levado até o fim com plena eficácia, 
dando origem a uma obra totalmente nova. forjada com as palavras antigas.
antes dc tudo o mais, a série da Mathesis, fechando a unidade da 
Enciclopédia, no qual mais tarde os volumes restantes poderiam 
encaixar-se como detalhes complementares. O filósofo mesmo 
seguira este caminho, publicando os três primeiros volumes da 
série final antes dos demais inéditos que deixara. Eis por que 
começo a publicação dos Inéditos por estas Leis Eternas, quarto 
tomo da série Mathesis Megiste. Qualquer outra escolha seria in­
correta, ainda que talvez mais conveniente do ponto dc vista pu­
ramente editorial.
Quanto ao texto da presente edição, segui o mais fielmente que 
pude a transcrição, feita pela esposa do filósofo, das gravações das 
aulas 85* a 911 da Mathesis, transcrição a que D. Yolanda acrescen­
tou no fim a seguinte nota:
"Aulas proferidas pelo Prof. M ário Ferreira dos Santos em 1966. - 
Estas seis aulas, numeradas de 85 a 5H, no total de 50 págintis, seriam 
posteriormente revisadas e completadas pelo autor para o volume 
A Sabedoria das Leis, que seria publicado após A Sabedoria do Ser e 
do Nada. o que não se realizou devido ao falecim ento do Prof. M ário 
Ferreira dos Santos em ab ril de 1968. Foram datilografadas direta­
mente da fita gravada, não tendo, portanto, correção do autor. ”
Foi inevitável cortar repetições inúteis e completar algumas fra­
ses truncadas, destacando naturalmente, entre colchetes e com ti­
pos menores, os acréscimos dc responsabilidade do editor. Sendo o 
texto compacto, denso e dc leitura dificílima para quem desconhe­
ça com certa minúcia os livros anteriores de Mário Ferreira dos 
Santos, julguei conveniente amparar o texto cm notas c remissões, 
sobretudo para indicar os lugares da obra restante onde o leitor
poderá encontrar explicações muis detalhadas sobre certos pomos 
obscuros, e para destacar alguns pomos de comparação possível 
entre o pensamento do autor e algumas correntesfilosóficas con­
temporâneas. Como todas as notas eram de autoria do editor, n&o 
fazia sentido repetir a toda hora “ N . do Ed.", sendo portanto om i­
tidas as obsessivas letrinhas.
M ário Ferreira dos Santos costumava conservar, no texto dc 
suas obras, o uso de algumas consoantes mudas que a ortografia 
dc 1943 suprimira, por julgar que, destacando a etimologia das 
palavras, ajudava a apreender o seu sentido profundo, por exem­
plo cm acto, dialéctiea etc. Julguei artificioso imitar esse uso num 
texto que não saiu da pena do filósofo, mas que preparei a partir 
de uma fita gravada." Empreguei, portanto, a ortografia corren­
te, mas, para orientação do leitor, dou cm apêndice uma lista das 
palavras deste texto que vi escritas com consoantes mudas cm 
outras obras do autor.
Quanto ao título, cm algumas anotações do autor aparccc 
como A Sabedoria das Leis, cm outras como Leis Eternas, cm 
outras ainda como A Sabedoria das Leis Eternas, que preferi por 
conter os outros dois.
11 O próprio Mário, confcssadamcntc um péssimo revisor dc si mesmo, nem 
sempre seguiu esse uso dc maneira coerente, dc modo que mesmo uma reedição 
dos textos publicados trará dificuldades editoriais bem complicadas. Em quase 
todos os livros publicados, há erros, frases truncadas, trocas dc palavras, confu­
sões na ordenação das partes ctc. Segundo mc informou a filha do filósofo, 
Yolanda. ele estava consciente dessas deficiência!., mas, na urgência dc terminar 
a obra que havia planejado, não pódc parar para as devidas revisões, e expressa­
va seguidamente o voto dc que, pelo menos após sua morte, alguém daria a 
seus textos o tratamento editorial compatível.
O editor da presente obra tem o dever dc acrescentar a es­
tas advertências algumas palavras que talvez soem estranhas e 
desagradáveis.
Mário Ferreira dos Santos é, dc longe, o maior dos filósofos 
brasileiros. A Enciclopédia Filosofica do Centro d i Studi Filosofici d i 
Gaüarate rcconhcccu-o implicitamente, ao conceder ao nosso au­
tor um verbete dc página inteira, quando não atribuiu aos demais 
pensadores dc língua portuguesa mais que algumas poucas linhas. 
Há dc rcconhecê-lo também qualquer leitor habilitado c honesto, 
após um exame criterioso deste c dos demais livros fundamentais 
do autor, especialmente Filosofia Concreta, Pitágoras e o lem a do 
Número, A Sabedoria dos Princípios, A Sabedoria da Unidade, mes­
mo sem conhcccr os demais inéditos em que o filósofo se deva às 
alturas da pura sapiência.
Apesar disso, e talvez por isso mesmo, a vasta obra dc Mário 
Ferreira dos Santos não encontrou, da parte do nosso establishment 
universitário, senão uma indiferença renitente e por vezes malévo­
la, que atesta apenas a inépcia fulgurante dc muitas cabeças coroa­
das - coroadas pela aura cinzenta da inveja.
M ário não foi um desconhecido. Algumas dc suas obras al­
cançaram, cm vida do autor, nove, dez, quinze edições, e seus 
cursos tiveram como alunos muitas celâbridadcs de “miolo 
mole", que, tendo recebido ali um ensinamento dc valor extra­
ordinário, não souberam nem reconhccé-lo nem mostrar-se dig­
nas dele, trabalhando por seu resgate c difusão após o 
desaparecimento do mestre. Falecido o autor, uma ominosa cor­
tina dc silêncio baixou sobre sua obra.
Fm qualquer país sério, um legado filosófico deste porte seria 
considerado patrimônio nacional e haveria equipes técnicas, sob
estipêndio do Rttddo, cxlon,ando-*c para organizar os manuscri­
tos. editá-los, cttud ilns c discuti-los sob todos os aspectos. Mário 
Ferreira é. afinal, de pleno direito, o Philosophus Oras iltm s ir, sua 
obra testemunha a eclosão, tardia mas esplêndida, dc uma consciên­
cia filosófica integral neste país e marca, assim, o verdadeiro in­
gresso do Brasil na história espiritual do mundo, já não na condirão 
dc ouvinte, mas na dc orador c mestre.
A ausência dc apoio estatal, no entanto, não desculpa a incúria 
pessoal daqueles que, pelo contato direto com o mestre, se torna­
ram herdeiros dc seu patrimônio filosófico c moralmente respon­
sáveis pela sua guarda c cuidado.12 Quanto àqueles que, sem ter 
sido alunos dele, tiveram por outros meios a oportunidade dc 
conhcccr algo dc sua obra c nem mesmo perceberam a grandeza 
do que tinham por diante, atestam com isto a inépcia dc uma 
intelectualidade que nada enxerga com os próprios olhos c só 
sabe reconhecer um filósofo quando ele vem com rótulo dc au­
tenticidade firmado por alguma autoridade estrangeira. Infeliz­
mente, o meio filosófico brasileiro é ainda dominado por essa 
gente futil, leviana e palavrosa.
Muitos fatores podem ter contribuído para fomentar c legiti­
mar o descaso. O primeiro deles está, evidentemente, no tamanho 
docomunal da obra dc M ário, na sua desordem editorial, no c»tilo 
abstruso que, aliado a erros dc tipografia, leva por vezes o leitor ao
11 A única e meritória cxccçáo foi o psicólogo paulista Thomaz dc Aquino 
Ferreira, que sc esforçou o quanto pôde para difundir a obra dc Mirio no» 
meios universitários, mas que circunstâncias adversas impediram de levar a 
cabo o trabalho começado. O editor registra aqui sua sincera homenagem a 
ase pioneiro.
desespero. Mas isto não é desculpa. As obras dc Aristóteles, quan­
do reencontradas no século i a .C , náo estavam cm melhores con­
dições, e cm matéria dc inacabamcnto c confusão os textos do nosso 
filósofo não são mais assustadores que os dc Jakot» Bühme ou que 
os originais taquigrafados dc Fxlmund Husscrl, que nem por isto 
deixaram dc ser publicados c estudados.
Mas um segundo fator é o preconceito amicscolástico. arrai­
gado nos intelectuais brasileiros a ponto dc torná-los ccgos para a 
mera possibilidade dc que algo dc novo ou dc valioso venha a 
emergir um dia dessa filosofia, que eles tomam, a p rio ri, como 
relíquia dc um passado morto ou como uma subfilosofia dc ma­
nual. A p rio ri, naturalmente, porque a desconhecem: nunca co­
nheci neste país um amicscolástico dc cartcirinha que tivesse lido 
dc S. Tomás, por exemplo - c só para ficarmos no nome dc maior 
projeção -, algo mais que De Ente et Essentia, um curto resumo, 
e partes da Sum a Teológica, obra que o autor classificava como 
elementar c introdutória. Uma tradução completa dos Comentá­
rios aquinatenses a Aristóteles, feita por meu amigo Antônio 
Donato Rosa. não despertou o menor interesse da cúpula uspiana 
nem dos editores em geral.
Um terceiro fator, mais sutil, é a propensão, fortíssima nas cul­
turas dependente», dc cada intelectual só sc interessar pelas obras 
que expressam idéias afins às suas ou às dc seu grupo de referência. 
Num a atmosfera dom inada pelo “ intelectual coletivo" do 
gramscismo, só têm atrativo as obras que expressam aspirações ge­
rais da comunidade letrada - aspirações que sc resumem em tomar 
o poder e despedir-se o mais rápido possível das obrigações cientí­
ficas cm nome dc supostas urgências maiores. O critério dc valor 
das idéias é aí puramente mercadológico, c mesmo a mais profunda
das verdades, sc dita por um homem solitário numa linguagem 
que não ecoe logo no coração d.is multidões intelectuais, é rejeita­
da como de menor importância. O império da opinião majoritária 
nas comunidades letradas, triste herança dos clubes literários da 
Revolução Francesa, é a versão moderna e absolut izada do rmtgistrr 
dixit. Ter razão sozinho é, para a mentalidade colctivista, o pior 
dos pecados. Sócrates ou Jesus Cristo, para essa gente, simples 
mente não aconteceram.
O editor deste livro discorda profundamente de muitas opiniões 
dc M ário Ferreira dos Santos c não sc considera sob aspccto ne­
nhum seu seguidor ou discípulo. Nunca o conheceu pessoalmen­
te nem muito menos foi seu aluno, tendo tomado conhecimento 
da obra somente cm 1981. graças a uma feliz casualidade que 
trouxe à sua presença a filha do filósofo, D . Yolanda Lhullicr dos 
Santos, cuja amizade muito ohonra e cuja confiança, ao pedir- 
lhe que revisasse c editasse estas páginas, o desvanece acima dc 
toda medida. Mas, antes mesmo que ela o fizesse, ele já tomara 
para si esse dever indeclinável, movido tão-somente pelo impac­
to iluminante dc uma primeira leitura c pelo sentimento dc 
inconformidade ante o desconhecimento cm que jazia a única 
filosofia plenamente digna deste nome que se produzira cm lín ­
gua portuguesa e neste país. Nem por um instante lhe passou 
pela cabeça a idéia de franzir o nariz, com desdém afetado, movi­
do por objeções menores, ante uma obra cuja grandeza e valor 
devem ser manifestos a todo leitor sério, por mais que ele divirja 
dc um ponto ou dc outro, ou mesmo do conjunto. Ele não com­
preende que aqueles que a conheceram antes e desfrutaram do 
convívio pessoal do seu autor não tenham tido sentimento igual 
ou que, sc o tiveram, isso não os movesse a nada. Trabalhando
por conca própria, sem apoio dc nenhuma instituição estatal ou 
privada c sem remuneração dc espécie alguma, ele se considera 
recompensado, com sobra dc generosidade, pela simples oportu­
nidade dc conhcccr, pelo trato direto dos manuscritos, um pen­
samento filosófico dc tal elevação c envergadura, c dc poder 
contribuir para lhe dar uma vestimenta editorial mais próxima 
dc seu merecimento.
Olavo de Carvalho
O ed itor agradece a A s a CEija R odrigues Warschauer 
pela a juda ua pesquisa da bibliografia de M drio Ferreira dos Santos 
e a M árcia Regina Sarc in elli pela digitação dos originais.
E s t r u t u r a d a 
■n c ic lo p é d ia d a s C iê n c ia s F il o só f ic a s
SínteseUnidade
Análise Dc /.
volumes, 
numerados 
segundo 
a ordem 
das
categorias 
pitaeó ricas
Oposição
Relação
Reciprocidade
Forma
Harmonia
Mutação
Assunção
Integração
Unidade
Transcendente Concreçáo
S é r ie II
Numeração
livre
Unidade
Oposição
Relação
Rrr.iprocidade
Síntese SÉRIF. I I I
Numeração
pitagórica
AnáliseForma
Harmonia
Mutação
Assunção
Integração
Unidade
Transcendente Concreçáo
A n Alise
C o ncreçáo
I . A L e i d e U n i d a d e e a L e i d e O p o s iç ã o
|0 TEMA DESTAS UÇÔES]
pós o estudo dos princípios, penetraremos agora num 
dos terrenos mais importantes da Mathesis megiste 
o mais importante de todos: o estudo das leis, dos 
logoi enquanto leis. Já não sc trata, como antes, dos logoi arkhai 
enquanto possibilidades puras, enquanto arithmoi arkhai,2 e sim 
das leis propriamente ditas, das leis que [descendo do plano dos 
princípios ao da manifestação* imperam efetivamente em todas as 
ordens dc realidade.4
1 Mathesis megiste = "Ensinamento superior?, “Ensinamento máximo" ou “Sabe­
doria suprema". Com esta expressão pitagórica. o A designa a pane superior c 
última do sistema integral da filosofia. O lugar que de atribui a esta ciência 
corresponde àquele que. na formulação dc Rcné Gucnon, cabe à "metafísica". 
Ferreira dos Santos, dando a esta ciência o nome dc Malhem, conserva o de 
metafísica para a Ontologia Geral, seguindo, nisto, a nomenclatura que sc consa­
grou na tradição arisiotélica (embora não seja do próprio Aristóteles), da qual 
Guénon sc afastou justamente para sublinhar que aquilo que entendia por 
“metafísica" transcendia - tal como o faz a Mathesis - o campo da Ontologia 
Gcnd. Noic-ac tjuc Guéuuu icvonlicxia o caráter meramente convencional c pro­
visório do termo "metafísica", afirmando pretender usá-lo 'tant quo» de nous aum 
pus propcne un meillevr terme pour le rempLuer" (cf. L* Màapiryiique Orientale, 
Paris: íditions Traditionncllcs, 1976, p.8). Que o leitor, portanto, náo sc enrede 
na aparente confusão terminológica, f. dc metafísica, no sentido guénoniano 
(c não acadêmico), que sc trata nos dois casos. É também importantíssimo obser­
var que, exatamente como a metafísica, cm Guénon, náo cra somente uma ciência 
teórica, mas implicava uma "realização espiritual" da qual a teoria constituiria a 
preparação (op. cit., p. 12-13): igualmente a Mathesis, segundo Ferreira, estaria 
associada, no contexto pitagórico, a uma "iniciação dc terceiro grau" (v, infra, n.9).
Alcançamos estas lei* por melo da especulação, como os senho* 
res j i viram nas aulas anteriores e no* nossos livros.'Tal cspccula- 
ção é feita, ainda, em certa analogia com o pensamento pitagórico.
1 O lofpi dc um ente i a sua “lei dc proporcionalidade intrínseca'*, a nuâê da 
sua “forma essencial". que expressa sintcticamcntc todo o corpo dc possibilida­
des dc manifestação desse ente. O arithmot arkhe do mesmo ente ó, assim, o 
número que. por suas propriedades intrínsecas, corresponde estruturalmente a 
esse logos segundo uma analogia de atribuição intrínseca (ou analogia de 
proporcionalidade). Por exemplo, a um ente cuja forma essencial tenha uma 
estrutura seniria corresponderá o arithmot arkhe 6. Tanto o logos quanto sua 
expressão matemática ou arithmot designam o ente considerado meramente na 
esfera das possibilidades (c das combinações dc possibilidades, ou. como di/ia 
Lcibnir.. das «impossibilidades). Para que esse ente possa maniícstar-ic num 
universo real, tem dc haver, num plano mais baixo que o do puro arithmot 
arkhe, também uma lei senária, que governe c delimite a sua manifestação av 
sim como o número 6 governa e delimita a sua csscncia. O conceito de “ lofot 
dc um ente" cncontra-sc cm A Sabedoria dot Princípios, p.68-91; o dc arithmot 
arkhe, cm Vttágoras e o Tema do Número, p.72-82.
* Lcmbrc-sc que todas as frases entre colchetes c/ou cm tipos menores tio 
intervenções do editor.
' A passagem do estudo das "possibilidades puras” ao das “leis que efetivamente 
regem o ser" corresponde, portanto, cm termos gulnonianos, ã descida do 
plano da "metafísica" ao da “ontologia geral" ("metafísica" no sentido 
aristotllico). Sc os arithmot arkhai são os “princípios puros", as leis são o» "prin­
cípios de mani/ettafdo~ desses princípios puros.
* O conteúdo das “aulas anteriores” a que o A. sc refere - da 1* à 85* - ettí 
reunido, pela ordem, cm A Sabedoria dot Printipiot (São Paulo: Matcsc, l%7), 
A Sabedoria da Unidade (id., 1968) c A Sabedoria do Ser e do Nada, 2v. (id., 
1968). O presente volume - v. tv, portanto, da síric - compõe-se das atilas 85* 
a 90*. As aulas subseqüentes, da 91 * atò aproximadamente a 130* (a numeração 
dos originais i titubcantc), compõem os volumes V a X da s^ ric Mathesis. Quanto 
ao» “nossos livros", os principais precursores da» Ltit Eternas foram Filosofia 
Conrreta (Slo Paulo: Ix>gos. 1957; reed. aumentada cm trís volume», 1960) e 
Pitdgorat e o Tema do Número (São Paulo: Matcsc, 1960).
Foi com base na Década Sagrada dos pitagóricos que '‘reconstruí­
mos" estas leis, às quais chamamos, por este motivo. leispitagóricos.6 
Esta atribuição não tem necessariamente um sentido histórico, isto 
é. não implica que a formulação que damos às leis tenha sido de fato 
aquela que vigorou dentro da escola pitagórica; mas cremos que ela 
esteja perfeitamente coerenciada com a concepção secreta que os 
pitagóricos tinham da Mathesis megiste.
Como cm filosofia só aceitamos, naturalmente, uma única au­
toridade. que é a demonstração, cabe-nos não só apresentar as leis, 
mas demonstrá-las; c não somente demonstrar que são válidas, mas 
também que são as leis fundamentais dc todo ser. |MasJ para tal 
demonstração podemos valer-nos, parcialmente, dc teses, dc argu­
mentos, dc postulados já expostos cm outras obras dc nossa auto­
ria; c só apresentaremos argumentos demonstrativos quando forem 
novos, portanto necessários.
Ao dizermos que nossa atribuição das leis a Pitágoras não tem 
um sentido histórico, queremos dizer que tem um sentido lógico 
c doutrinário. Flsias leis são perfeitamente cocrcntcs com o pen­
samento de Pitágoras e, segundo o que já dissemos cm nosso 
Pitágoras c o Tema do Número, representam aquilo a que ele teriachegado (sc é que efetivamente não chegou) sc prolongasse 
cocrcmcmcmc as conseqüência» c aplicações do seu pensamento, 
cm concordância com os princípios que havia postulado. 
Presumivelmente, vcrossimilmcncc, podemos dizer que estas leis 
deveriam ter sido dc fato as leis pitagóricas. Naturalmente, uma 
demonstração histórica seria impossível, porque as obras sobre a
6 O sentido da airibuiçio dota* lei» ao pitagorismo está exposto em PiUgonu r
o Tema do Número, p.21 -8 da segunda edição.
parte esotérica du doutrina pitagórica não chegaram até nós, te é 
que foram escrita*. Vamos basear-nos na suposição de que, tendo 
sido escritas, não chegaram até nós, a não ser através de fragmen­
tos na obra dispersa de autores pitagóricos categorizados.' Fun­
dando-nos, assim, cm textos universalm ente aceitos pelos 
pitagóricos, tínhamos neles os elementos dc base para esta 
“ reconstrução" das leis, pelo menos nos seus aspectos ontológicos 
c nos seus aspectos matéticos.® Dada a coerência que as leis apre­
sentam [com] essa doutrina expressa nos textos, podemos supor 
que a demonstração da sua validez, tal como a apresentamos, 
deve ser sim ilar àquela que era conhecida pelos iniciados 
pitagóricos dc tcrcciro grau, c que eles também teriam chegado 
às mesmas conclusões a que chegamos, pelo desenrolar dos pen­
samentos segundo as leis dialéticas da conseqüência.
Dc qualquer modo, a questão da validade histórica não é a 
que nos interessa em primeira instância. O que interessa é que, 
pitagóricas ou não, estas leis são válidas. Se, na análise que se 
segue, vamos usar dc argumentos extraídos dos textos pitagóri­
cos, procuraremos, por outro lado, reforçar esses argumentos 
segundo enfoques que são próprios ao nosso modo dc conside­
rar as coisas.
7 Alguns dos fragmentos mais significativos s io transcritos cm P itJgoraj e â 
Tema do N úm ero , por exemplo os de Filo lau. Arquitas c Jàm b lico , e também o* 
Verwí Áureos de Pitigoras, dos quais o A. fez um externo co m en tà n o , que cstamoi 
preparando para ed iç lo e que. na nossa dassificaçio, se situa entre os títulos da 
Série I ! das O bras de M ir io Peneira dos Santos.
1 "P t lo menos", isto é, sem descer is suas aplicações nos dom ínios das ciências 
filosóficas especiais.
[ D i s t i n ç õ e s ]
Antes de mais nada. não sc deve, quando sc fala dc pitagorismo, 
confundir os números matemáticos, os arithm oi mathemattkoi, que 
pertencem à tríada inferior, com os arithm oiarkhai, que sáo da tríada 
superior.* Fstcs últimos corrcspondcm is “ formas”, no sentido pla­
tônico, ás “ idéias exemplares” , no sentido dc Sto. Agostinho, aos 
paradeigmata do ncopitagorismo e do neoplatonismo. isto é, às idéi­
as universais, cidcticamcntc (c não só nocticamente) consideradas.10 
Outra distinção que devemos ter cm mente á aquela, já menciona­
da. que há entre as duas maneiras - ou níveis - cm que podemos 
encarar os lógoi, ou princípios. Dc um lado. podemos considcrá-los 
enquanto formas arquetípicas. idéias exemplares, arithm oi arkhai, 
paradeigmata - ou ainda, na terminologia cscolástica, />«/apossibilia, 
possibilidades puras - c. de outro lado. enquanto leis ou normas 
reais c efetivas, que imperam c regem sobre as coisas existentes. Nes­
te último caso. os lógoi são normas não somente pelo seu conteúdo 
noemático, mas pela função que efetivamente desempenham." É 
das leis neste sentido efetivo que desejamos falar.
'* A “ irnuLi superior" abrange: l “ , os arithm oi arÁtJKi/ ou números arqunipicos «jue 
expressam o* supremos principio» (objeto do* très primeiros tomos da serie M adtnis 
M fgisie); 2", as estruturas do scr real (as leis estudadas no presente volume); 3“. as 
formas (arithm oi ridetikoi) dos entes reais em particular. Seu estudo corresponde 
respectivamente, na terminologia dc Guénon, à "metafísica". à “ontologia geral", à 
"ontologia cspccial". A “ tríada inferior" compreende, também cm ordem descen­
dente: 1*. os números matemáticos; 2®. as formas geométricas; .V. as coisas sensí­
veis. Abrange, portanto, o dom ínio da “cosmol««gia". C f. PUJgvnts, p.75-9.
10 “ Eidcticam cntc c náo só nocticam ente", istoé, consideradas com o realidades 
arquetípicas, estruturas objetivas do real, c nâo só com o csqucmxs cognitivos.
í / J - . - í \SO \ A
Estas leis, que regem i«k!o» .is coisa*, constituíam aquilo que os 
pitagóricos denominavam .1 Pétrada Sagrada" (ou “Quaternário 
Sagrado"), também chamada dc "Década Sagrada' |>or(|tic a soma 
dos quatro primeiros números ( I + 2 + 3 + 4) dá 10. Ao conjunto 
dc de/, leis, eles denominavam “ Máe dc Todas as Coisas", en­
tendendo com isto que elas constituíam a matriz, a fonte, que, 
ao reger, sc repete c, ao repetir-se. faz repetir, produz a repeti 
çáo. faz surgir as coisas semelhantes e também as coisas que, 
sendo dessemelhantes de umas, sáo semelhantes a outras, listas 
leis, sendo dez, podem ser então denominadas a Le i do Um , a 
Le i do Dois, a Le i do Três (c assim por diante até completar], 
finalmente, a Década.
I [Lei da Unidade]
A Lei do Um seria, conseqüentemente, a Lei da Unidade. Ora, 
o princípio de todas as coisas tem necessariamente dc ser algo dc 
positivo: sc as coisas existentes são positivas, seu princípio tem dc 
ser positivo. C) princípio positivo, o princípio que sc afirma, que 
dá testemunho de si c que se positiva a si mesmo, é precisamente <1 
que sc chama Ser. O princípio de todas as coisas positivas é o Ser.
O nada não pode scr princípio dc liada. O ia , .« unidade, tomo já 
dissemos anteriormente,1’ caracteriza-se por scr indivisa in sec di­
visa ab alio (isto é. distinta de qualquer outro).
" P a abordagem puramente princip iai, apresentada nos ires volume» anterio ­
res, pavva-MT. neste, ao nível da manifestação. O presente livro esof. portanto, 
na fronteira entre a ontologia e a cosmologia.
11 Cf. A SabcHorm Ha VmHtdt, cap. II (p.25-31).
Portanto, u unidade é a lei da integral. Em toda e qualquer for nu t 
dotada de existência, seu ser é u/n. Tudo aquilo quo seja ser, tudo 
aquilo que possamos admitir como presença ou adséncia,1* tem de 
ser uma unidade. A unidade e o ser. portanto, são mutuamente con­
versíveis. Onde há unidade, há ser; onde há ser, há unidade. A 
primeira lei é simbolizada pelo número t. O um é a primeira lei 
que rege todas as coisas. Por ser um, o ser é imperiosamente regido 
pela lei da unidade. Só o nada não é unitário, porque o nada não é.
Há, por certo, uma hierarquia do scr, uma hierarquia dc graus 
intensistas - ou graus de intensidade14 - do scr; cada scr parti­
cipa da unidade segundo o seu próprio grau de intensidade, o 
qual, por sua vez, é comproporcionado à natureza de cada scr. 
Mas, qualquer que seja o seu grau dc intensidade, todas as coi­
sas são unidadc[s]: num grau intensista maior ou menor, 
mas sempre unidadc[sJ. A lei dc unidade preside a todos os se­
res. os quais participam assim, segundo suas respectivas im en­
sidades, da Unidade Suprema do Scr.
" Adiència - “Termo proposto por Suárcv. provindo do verbo latino adwm. no 
sentido dc ser aqui. estar aqui. para substituir ‘presença quando sc refere ao ser 
a se. vúto 'pKMnçi indicar ante* uma rclaçâo. um 'scr ante outro', como *c di 
com o scr ab alio, o scr contingente. Deus tem adscncia. c nós. presença" (Di- 
cioruirio. t.l, p.89).
14 Sobre os conceitos opostos e complementares de extensi& uíe c intensidade, v. 
Filosofia e Cosmovisdo, p. 154-63. Os conceitos foram apresentados originalmen­
te por Ostsvald c I.upasco. Correspondem, cm parte, a ijuantuLuíe e tjuahtLuíe 
l.upasco (c it. supra) associa ao conceito dc ex tem iiía tíe os dc: identidade, 
homogeneidade, materialidade, cspacialidadc. simultancidadc. permanência etc.: 
ao dc nuem uÍM le. os de: nio-identidade. heterogeneidade. sucessão, desapareci­
mento, desenvolvimento, análise.
A máxima unidade «• .1 unidade

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