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4. OBJETO E FINALIDADE DA INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO

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OBJETO E FINALIDADE DA INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO 
REALE, MIGUEL. Lições preliminares do Direito (Capítulo I). São Paulo: Saraiva 2012. 
 
SUMÁRIO: Noção elementar de Direito. Multiplicidade e unidade do Direito. 
Complementaridade do Direito. Linguagem do Direito. O Direito no mundo da 
cultura. O Método no Direito. Natureza da Introdução ao Estudo do Direito. 
NOÇÃO ELEMENTAR DE DIREITO 
 Como poderíamos começar a discorrer sobre o Direito sem admitirmos, 
como pressuposto de nosso diálogo, uma noção elementar e provisória da 
realidade de que vamos falar? 
Um grande pensador contemporâneo, Martin Heidegger, afirma com 
razão que toda pergunta já envolve, de certa forma, uma intuição do 
perguntado. Não se pode, com efeito, estudar um assunto sem se ter dele uma 
noção preliminar, assim como o cientista, para realizar uma pesquisa, avança 
uma hipótese, conjetura uma solução provável, sujeitando-a a posterior 
verificação. 
 No caso das ciências humanas, talvez o caminho mais aconselhável 
seja aceitar, a título provisório, ou para princípio de conversa, uma noção 
corrente consagrada pelo uso. Ora, aos olhos do homem comum o Direito é lei 
e ordem, isto é, um conjunto de regras obrigatórias que garante a convivência 
social graças ao estabelecimento de limites à ação de cada um de seus 
membros. Assim sendo, quem age de conformidade com essas regras 
comporta-se direito; quem não o faz, age torto. 
Direção, ligação e obrigatoriedade de um comportamento, para que 
possa ser considerado lícito, parece ser a raiz intuitiva do conceito de Direito. A 
palavra lei, segundo a sua etimologia mais provável, refere-se a ligação, liame, 
laço, relação, o que se completa com o sentido nuclear de jus, que invoca a 
idéia de jungir, unir, ordenar, coordenar. 
Podemos, pois, dizer, sem maiores indagações, que o Direito 
corresponde à exigência essencial e indeclinável de uma convivência 
ordenada, pois nenhuma 1 sociedade poderia subsistir sem um mínimo de 
ordem, de direção e solidariedade. É a razão pela qual um grande jurista 
contemporâneo, Santi Romano, cansado de ver o Direito concebido apenas 
como regra ou comando, concebeu-o antes como "realização de convivência 
ordenada". 
 De "experiência jurídica", em verdade, só podemos falar onde e quando 
se formam relações entre os homens, por isso denominadas relações 
intersubjetivas, por envolverem sempre dois ou mais sujeitos. Daí a sempre 
nova lição de um antigo brocardo: ubi societas, ibi jus (onde está a sociedade 
está o Direito). A recíproca também é verdadeira: ubi jus, ibi societas, não se 
podendo conceber qualquer atividade social desprovida de forma e garantia 
jurídicas, nem qualquer regra jurídica que não se refira à sociedade. 
 O Direito é, por conseguinte, um fato ou fenômeno social; não existe 
senão na sociedade e não pode ser concebido fora dela. Uma das 
características da realidade jurídica é, como se vê, a sua socialidade, a sua 
qualidade de ser social. 
 Admitido que as formas mais rudimentares e toscas de vida social já 
implicam um esboço de ordem jurídica, é necessário desde logo observar que 
durante milênios o homem viveu ou cumpriu o Direito, sem se propor o 
problema de seu significado lógico ou moral. É somente num estágio bem 
maduro da civilização que as regras jurídicas adquirem estrutura e valor 
próprios, independente das normas religiosas ou costumeiras e, por via de 
consequência, é só então que a humanidade passa a considerar o Direito como 
algo merecedor de estudos autônomos. 
Essa tomada de consciência do Direito assinala um momento crucial e 
decisivo na história da espécie humana, podendo-se dizer que a 
conscientização do Direito é a semente da Ciência do Direito. Não é necessário 
enfatizar a alta significação dessa conversão de um fato (e, de início, o fato da 
lei ligava-se, como veremos, ao fado, ao destino, a um mandamento divino) em 
um fato teórico, isto é, elevado ao plano da consciência dos respectivos 
problemas. 
Não é demais salientar essa correlação essencial entre o Direito como 
fato social e o Direito como ciência, a tal ponto que, ainda hoje, a mesma 
palavra servepara designar a realidade jurídica e a respectiva ordem de 
conhecimentos. Tem razão Giambattista Vico, pensador italiano do início do 
século XVIII, quando nos ensina que verum ac factum convertuntur, o 
verdadeiro e o fato se convertem. 
 É difícil, com efeito, separar a experiência jurídica das estruturas 
lógicas, isto é, das estruturas normativas nas quais e mediante as quais ela se 
processa. 
MULTIPLICIDADE E UNIDADE DO DIREITO 
Como fato social e histórico, o Direito se apresenta sob múltiplas formas, 
em função de múltiplos campos de interesse, o que se reflete em distintas e 
renovadas estruturas normativas. 
 Mas é inegável que, apesar das mudanças que se sucedem no espaço 
e no tempo, continuamos a referir-nos sempre a uma única realidade. É sinal 
que existem nesta algumas "constantes", alguns elementos comuns que nos 
permitem identificá-la como experiência jurídica, inconfundível com outras, 
como a religiosa, a econômica, a artística etc. 
Deve existir, com efeito, algo de comum a todos os fatos jurídicos, sem o 
que não seria possível falar-se em Direito como uma expressão constante da 
experiência social. A primeira finalidade de nossas aulas será, pois, oferecer 
uma visão unitária e panorâmica dos diversos campos em que se desdobra a 
conduta humana segundo regras de direito. 
Antes de se fazer o estudo de determinado campo do Direito, impõe-se 
uma visão de conjunto: ver o Direito como um todo, antes de examiná-lo 
através de suas partes especiais. 
O Direito abrange um conjunto de disciplinas jurídicas. Mais tarde, 
teremos oportunidade de examinar a questão relativa à divisão do Direito, mas 
é indispensável antecipar algumas noções, sem as quais nossas 
considerações não teriam consistência. 
O Direito divide-se, em primeiro lugar, em duas grandes classes: o 
Direito Privado e o Direito Público. As relações que se referem ao Estado e 
traduzem o predomínio do interesse coletivo são chamadas relações públicas, 
ou de Direito Público. Porém, o homem não vive apenas em relação com o 
Estado, mas também e principalmente em ligação com seus semelhantes: a 
relação que existe entre pai e filho, ou então, entre quem compra e quem 
vende determinado bem, não é uma relação que interessa de maneira direta ao 
Estado, mas sim ao indivíduo enquanto particular. Essas são as relações de 
Direito Privado. 
Essas classes, por sua vez, se subdividem em vários outros ramos, 
como, por exemplo, o Direito Constitucional, o Direito Administrativo, no campo 
do Direito Público; o Direito Civil, o Direito Comercial, no campo do Direito 
Privado. O Direito é, pois, um conjunto de estudos discriminados; abrange um 
tronco com vários ramos; cada um desses ramos tem o nome de disciplina. 
Por que essa palavra disciplina? Aconselhamos sempre nossos alunos a 
dedicar atenção ao sentido das palavras; elas não surgem por acaso mas, 
como já vimos ao nos referirmos aos termos lex e jus, guardam muitas vezes o 
segredo de seu significado. Disciplinador é quem rege os comportamentos 
humanos e sabe impor ou inspirar uma forma de conduta aos indivíduos. 
Disciplina é um sistema de princípios e de regras a que os homens se devem 
ater em sua conduta; é um sistema de enlaces, destinados a balizar o 
comportamento dos indivíduos de qualquer idade ou classe social, bem como 
as atividades dos entes coletivos e do próprio Estado. O que importa é verificar 
que, no conceito de disciplina, há sempre a idéia de limite discriminando o que 
pode, o que deve ou o que não deve ser feito,mas dando-se a razão dos 
limites estabelecidos à ação. Daí podermos completar o que já dissemos, com 
esta parêmia: ubi jus, ibi ratio. Aliás, a palavra "razão" é deveras elucidativa, 
porque ela tanto significa limite ou medida (pensem na outra palavra que vem 
de ratio, ração) como indica o motivo ou a causa de medir. De qualquer modo, 
ninguém pode exercer uma atividade sem razão de direito. 
 Lembro-lhes, por exemplo, que este nosso contato está sob a proteção 
do Direito: eu, dando aula e os senhores ouvindo-a, estamos todos no exercício 
de uma faculdade jurídica. Os senhores conquistaram o direito de freqüentar as 
aulas, através dos exames que prestaram, e se não pagam taxas é porque 
ainda não há norma que as estabeleça. Quer dizer que estão aqui no exercício 
de uma atividade garantida. Também, por meu lado, estou no exercício de uma 
função 4 que se integra na minha personalidade, como meu patrimônio: exerço 
um poder de agir, tutelado pelo Direito. 
Há, portanto, em cada comportamento humano, a presença, embora 
indireta, do fenômeno jurídico: o Direito está pelo menos pressuposto em cada 
ação do homem que se relacione com outro homem. O médico, que receita 
para um doente, pratica um ato de ciência, mas exerce também um ato jurídico. 
Talvez não o perceba, nem tenha consciência disso, nem ordinariamente é 
necessário que haja percepção do Direito que está sendo praticado. Na 
realidade, porém, o médico que redige uma receita está no exercício de uma 
profissão garantida pelas leis do país e em virtude de um diploma que lhe 
faculta a possibilidade de examinar o próximo e de ditar-lhe o caminho para 
restabelecer a saúde; um outro homem qualquer, que pretenda fazer o mesmo, 
sem iguais qualidades, estará exercendo ilicitamente a Medicina. Não haverá 
para ele o manto protetor do Direito; ao contrário, seu ato provocará a 
repressão jurídica para a tutela de um bem, que é a saúde pública. O Direito é, 
sob certo prisma, um manto protetor de organização e de direção dos 
comportamentos sociais. Posso, em virtude do Direito, ficar em minha casa, 
quando não estiver disposto a trabalhar, assim como posso dedicar-me a 
qualquer ocupação, sem ser obrigado a estudar Medicina e não Direito, a ser 
comerciante e não agricultor. Todas essas infinitas possibilidades de ação se 
condicionam à existência primordial do fenômeno jurídico. O Direito, por 
conseguinte, tutela comportamentos humanos: para que essa garantia seja 
possível é que existem as regras, as normas de direito como instrumentos de 
salvaguarda e amparo da convivência social. Existem tantas espécies de 
normas e regras jurídicas quantos são os possíveis comportamentos e atitudes 
humanas. Se o comportamento humano é de delinquência, tal comportamento 
sofre a ação de regras penais, mas se a conduta visa à consecução de um 
objetivo útil aos indivíduos e à sociedade, as normas jurídicas cobrem-na com 
o seu manto protetor. 
Pois bem, quando várias espécies de normas do mesmo gênero se 
correlacionam, constituindo campos distintos de interesse e implicando ordens 
correspondentes de pesquisa, temos, consoante já assinalamos, as diversas 
disciplinas jurídicas, sendo necessário apreciá-las no seu conjunto unitário, 
para que não se pense que cada uma delas existe independentemente das 
outras. Não existe um Direito Comercial que nada tenha a ver com o Direito 
Constitucional. Ao contrário, as disciplinas jurídicas representam e refletem um 
fenômeno jurídico unitário que precisa ser examinado. Um dos primeiros 
objetivos da Introdução ao Estudo do Direito é a visão panorâmica e unitária 
das disciplinas jurídicas. 
COMPLEMENTARIDADE DO DIREITO 
 Não basta, porém, ter uma visão unitária do Direito. É necessário, 
também, possuir o sentido da complementaridade inerente a essa união. As 
diferentes partes do Direito não se situam uma ao lado da outra, como coisas 
acabadas e estáticas, pois o Direito é ordenação que dia a dia se renova. A 
segunda finalidade da Introdução ao Estudo do Direito é determinar, por 
conseguinte, a complementaridade das disciplinas jurídicas, ou o sentido 
sistemático da unidade do fenômeno jurídico. 
Existem vários tipos de unidade: há um tipo de "unidade física ou 
mecânica" que é mais própria dos entes homogêneos, pela ligação de 
elementos da mesma ou análoga natureza, nenhuma ação ou função 
resultando propriamente da composição dos elementos particulares no todo. 
Assim dizemos que um bloco de granito é unitário. Há outras realidades, 
entretanto, que também são unitárias, mas segundo uma unidade de 
composição de elementos distintos, implicados ou correlacionados entre si, 
sendo essa composição de elementos essencial à função exercida pelo todo. 
Pensem, por exemplo, no coração. O coração é uma unidade, mas unidade 
orgânica, que existe em virtude da harmonia das partes; há nele elementos 
vários, cada qual com sua função própria, mas nenhuma destas se desenvolve 
como atividade bastante e de per si; cada parte só existe e tem significado em 
razão do todo em que se estrutura e a que serve. Essa unidade, que se 
constitui em razão de uma função comum, chama-se unidade orgânica, 
tomando a denominação especial de unidade de fim quando se trata de 
ciências humanas. Nestas, com efeito, o todo se constitui para perseguir um 6 
objetivo comum, irredutível às partes componentes. A ideia de fim deve ser 
reservada ao plano dos fatos humanos, sociais ou históricos. 
 A Ciência Jurídica obedece a esse terceiro tipo de unidade, que não é o 
físico ou o orgânico, mas sim o finalístico ou teleológico. Às vezes empregamos 
a expressão "unidade orgânica", quando nos referimos ao Direito, mas é 
preciso notar que é no sentido de uma unidade de fins. Alguns biólogos 
afirmam que a idéia de "fim" é útil à compreensão dos organismos vivos, 
representando estes como que uma passagem entre o "natural" e o "histórico". 
É necessário, porém, não incidirmos em perigosas analogias, sob o 
influxo ou o fascínio das ciências físicas ou biológicas. Uma delas constitui em 
conceber a sociedade como um corpo social, tal como o fizeram os adeptos da 
teoria organicista que tanta voga teve entre juristas e teóricos do Estado no fim 
do século passado e primeiras décadas deste. 
LINGUAGEM DO DIREITO 
Para realizarmos, entretanto, esse estudo e conseguirmos alcançar a 
visão unitária do Direito, é necessário adquirir um vocabulário. Cada ciência 
exprime-se numa linguagem. Dizer que há uma Ciência Física é dizer que 
existe um vocabulário da Física. É por esse motivo que alguns pensadores 
modernos ponderam que a ciência é a linguagem mesma, porque na 
linguagem se expressam os dados e valores comunicáveis. Fazendo abstração 
do problema da relação entre ciência e linguagem, preferimos dizer que, onde 
quer que exista uma ciência, existe uma linguagem correspondente. Cada 
cientista tem a sua maneira própria de expressar-se, e isto também acontece 
com a Jurisprudência, ou Ciência do Direito. Os juristas falam uma linguagem 
própria e devem ter orgulho de sua linguagem multimilenar, dignidade que bem 
poucas ciências podem invocar. 
Às vezes, as expressões correntes, de uso comum do povo, adquirem, 
no mundo jurídico, um sentido técnico especial. Vejam, por exemplo, o que 
ocorre com a palavra "competência" - adjetivo: competente. Quando dizemos 
que o juiz dos Feitos da Fazenda Municipal é competente para julgar as causas 
em que a Prefeitura é autora ou ré, não estamos absolutamente apreciando a 
"competência" ou preparo cultural do magistrado. Competente é o juiz que, por 
força de dispositivos legais da organização judiciária, tem poder para examinar 
e resolver determinados casos, porquecompetência, juridicamente, é "a 
medida ou a extensão da jurisdição". 
 Estão vendo, pois, como uma palavra pode mudar de significado, 
quando aplicada na Ciência Jurídica. Dizer que um juiz é incompetente para o 
homem do povo é algo de surpreendente. "Como incompetente? Ele é 
competentíssimo!", disse-me certa vez um cliente perplexo. Tive de explicar-lhe 
que não se tratava do valor, do mérito ou demérito do magistrado, mas da sua 
capacidade legal de tomar conhecimento da ação que nos propúnhamos 
intentar. 
É necessário, pois, que dediquem a maior atenção à terminologia 
jurídica, sem a qual não poderão penetrar no mundo do Direito. Por que 
escolheram os senhores o estudo do Direito e não o de outra ciência qualquer? 
Se pensarem bem, nós estamos aqui nesta Faculdade para realizar uma 
viagem de cinco anos; cinco anos para descobrir e conhecer o mundo jurídico, 
e sem a linguagem do Direito não haverá possibilidade de comunicação. Não 
cremos seja necessário lembrar que teoria da comunicação e teoria da 
linguagem se desenvolvem em íntima correlação, sendo essa uma verdade 
que não deve ser olvidada pelos juristas. 
Uma das finalidades de nosso estudo é esclarecer ou determinar o 
sentido dos vocábulos jurídicos, traçando as fronteiras das realidades e das 
palavras. À medida que forem adquirindo o vocabulário do Direito, com o 
devido rigor, o que não exclui, mas antes exige os valores da beleza e da 
elegância, sentirão crescer pari passu os seus conhecimentos jurídicos. 
O DIREITO NO MUNDO DA CULTURA 
 Não pensem que haja só continentes geográficos, formados de terra, 
mar etc. Há continentes de outra natureza, que são os da história e da cultura, 
os do conhecimento e do operar do homem. Cada um de nós elege um país 
em um dos continentes do saber, para o seu conhecimento e a sua morada. 
Uns escolhem a Matemática, outros a Física, ou a Medicina; os senhores 
vieram conhecer o 8 mundo do Direito. Qual a natureza desse mundo jurídico 
que nos cabe conhecer? Quais as vias que devemos percorrer, na perquirição 
de seus valores? O mundo jurídico encontra em si a sua própria explicação? 
Ou explica-se, ao contrário, em razão de outros valores? O mundo do Direito 
tem um valor, próprio ou terá um valor secundário? O Direito existe por si, ou 
existe em função de outros valores? Devemos, pois, colocar o fenômeno 
jurídico e a Ciência do Direito na posição que lhes cabe em confronto com os 
demais campos da ação e do conhecimento. A quarta missão da nossa 
disciplina consiste em localizar o Direito no mundo da cultura no universo do 
saber humano. Que relações prendem o Direito à Economia? Que laços 
existem entre o fenômeno jurídico e o fenômeno artístico? Que relações 
existiram e ainda existem entre o Direito e a Religião? Quais os influxos e 
influências que a técnica e as ciências físico-matemáticas exercem sobre os 
fatos jurídicos? É preciso que cada qual conheça o seu mundo, o que é uma 
forma de conhecer-se a si mesmo. 
O MÉTODO NO DIREITO 
Mas, para que todas essas tarefas sejam possíveis, há necessidade de 
seguir-se um método, uma via que nos leve a um conhecimento seguro e certo. 
Adquirem também os senhores, através da Introdução ao Estudo do Direito, as 
noções básicas do método jurídico. Método é o caminho que deve ser 
percorrido para a aquisição da verdade, ou, por outras palavras, de um 
resultado exato ou rigorosamente verificado. Sem método não há ciência. O 
homem do vulgo pode conhecer certo, mas não tem certeza da certeza. O 
conhecimento vulgar nem sempre é errado, ou incompleto. Pode mesmo ser 
certo, mas o que o compromete é a falta de segurança quanto àquilo que 
afirma. É um conhecimento parcial, isolado, fortuito, sem nexo com os demais. 
Não é o que se dá com o conhecimento metódico; quando dizemos que temos 
ciência de uma coisa é porque verificamos o que a seu respeito se enuncia. A 
ciência é uma verificação de conhecimentos, e um sistema de conhecimentos 
verificados. Seria simplesmente inútil percorrermos o mundo jurídico buscando 
a sua visão unitária sem dispormos dos métodos adequados para conhecê-lo, 
pois cada ciência tem a sua forma de verificação, que não é apenas a do 
modelo físico ou matemático. 
Eis aí algumas das finalidades básicas desta disciplina, que é ensinada 
muito sabiamente no primeiro ano, porque temos, diante de nós, todo um 
mundo a descobrir. Qualquer viajante ou turista, que vai percorrer terras 
desconhecidas, procura um guia que lhe diga onde poderá tomar um trem, um 
navio, um avião; onde terá um hotel para pernoitar, museus, bibliotecas e 
curiosidades que de preferência deva conhecer. Quem está no primeiro ano de 
uma Faculdade de Direito deve receber indicações para a sua primeira viagem 
quinquenal, os elementos preliminares indispensáveis para situar-se no 
complexo domínio do Direito, cujos segredos não bastará a vida toda para 
desvendar. 
NATUREZA DA INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO 
Não é a Introdução ao Estudo de Direito uma ciência no sentido rigoroso 
da palavra, por faltar-lhe um campo autônomo e próprio de pesquisa, mas é 
ciência enquanto sistema de conhecimentos logicamente ordenados segundo 
um objetivo preciso de natureza pedagógica. Não importa, pois, que seja um 
sistema de conhecimentos recebidos de outras ciências e artisticamente 
unificados. 
Trata-se, em suma, de ciência introdutória, como a própria palavra está 
dizendo, ou seja, uma ciência propedêutica, na qual o elemento de arte é 
decisivo. Quem escreve um livro de Introdução ao Estudo do Direito compõe 
artisticamente dados de diferentes ramos do saber, imprimindo-lhes um 
endereço que é a razão de sua unidade. Não há, pois, que falar numa Ciência 
Jurídica intitulada Introdução ao Estudo do Direito como sinônimo, por 
exemplo, de Teoria Geral do Direito, ou de Sociologia Jurídica. Ela se serve de 
pesquisas realizadas em outros campos do saber e os conforma aos seus fins 
próprios, tendo como suas fontes primordiais a Filosofia do Direito, a Sociologia 
Jurídica, a História do Direito, e, last but not least, a Teoria Geral do Direito. 
Podemos, pois, concluir nossa primeira aula, dizendo que a Introdução ao 
Estudo do Direito é um sistema de conhecimentos, recebidos de múltiplas 
fontes de informação, destinado a oferecer os elementos essenciais ao estudo 
do Direito, em termos de linguagem e de 10 método, com uma visão preliminar 
das partes que o compõem e de sua complementaridade, bem como de sua 
situação na história da cultura.

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