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Etnoconhecimento e Co manejo

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Etnoconhecimento:
Conhecimento tradicional pode ser definido como o saber e o saberfazer, a respeito do mundo natural e sobrenatural, gerados no âmbito da sociedade não urbano/industrial e transmitidos oralmente de geração em geração. Para muitas dessas sociedades, sobretudo as indígenas, existe uma interligação orgânica entre o mundo natural, o sobrenatural e a organiza- ção social. Nesse sentido, para estas últimas, não existe uma classificação dualista, uma linha divisória rígida entre o “natural” e o “social” mas sim um continuum entre ambos. Descola (1997)
Nesse sentido, o conhecimento tradicional somente pode ser interpretado dentro do contexto da cultura em que ele é gerado.
Conhecimento adquirido através de transmissão não formal, sobretudo aquele derivado de comunidades tradicionais. 
Por etnoconhecimento entende-se o conhecimento como concebido a partir das referências sócio-culturaias dos diferentes grupos que ao longo do tempo elaboram padrões que possibilitam formas específicas de ler o mundo e atribuir significados relevantes para aquele grupo, de tal sorte a conceber o conhecimento necessariamente como uma construção social que comporia uma parte do conhecimento como um todo.
O prefixo ETNO precede do grego ÉTHNOS, para identidade de origem e condição, incluindo identidade de crenças, de valores, de símbolos, de mitos, de ritos, de morais, de língua, de códigos e de práticas. Dessa identidade, se formaram as vivências e os conceitos de raça, povo, nação, classe social e corporação. Desse prefixo nasceria, por exemplo, a palavra Etnia.
Construção sócio-cultural em que cada grupo étnico e cultural tem um modo próprio de ver, entender e representar o mundo. Denominamos “conhecimentos tradicionais” ou “etnoconhecimentos” aqueles conhecimentos produzidos por povos indígenas, afrodescendentes e comunidades locais de etnias específicas transmitidos de geração em geração, ordinariamente de maneira oral e desenvolvidos à margem do sistema social formal. São conhecimentos dinâmicos que se encontram em constante processo de adaptação, com base numa estrutura sólida de valores, formas de vida e crenças míticas, profundamente enraizados na vida cotidiana dos povos. Podemos, então, considerar etnoconhecimento o conhecimento produzido por diferentes etnias em diferente locais no globo terrestre a partir do saber popular. (Marcos Luiz Cavalcanti de Miranda (PPG-PMUS/UNIRIO))
Co-manejo:
O co-manejo ou manejo participativo, é definido como o compartilhamento de responsabilidade e autoridade entre o governo e os grupos usuários no manejo dos recursos (Sem e Nielsen 1996). O manejo participativo envolve o reconhecimento e a formalização de sistemas tradicionais ou informais de manejo, ressaltando-se que certo grau de manejo comunitário é elemento central do sistema (Pomeroy e Berkes 1997). 
Diferentemente da maior parte das estratégias conservacionistas ocidentais com foco em apenas uma espécie ou população, a percepção de manejo de populações tradicionais geralmente envolve vários recursos ou ecossistemas, e pode ser uma ferramenta importante para alcançar um manejo integrado dos recursos naturais no sistema de co-manejo. O conhecimento ecológico local é particularmente útil para o manejo de populações que ocorrem em áreas remotas onde estudos científicos extensivos são impraticáveis ou de alto custo. 
O sucesso de sistemas de co-manejo e manejo comunitário é intimamente ligado ao nível de envolvimento das populações locais, usuárias diretas do recurso. 
EXEMPLOS
Co-manejo:
Foram investigados o efeito de um Acordo de Pesca e de características do ambiente da várzea de Santarém sobre a abundância relativa de quelônios Podocnemis spp. Analisamos a influência das variáveis ambientais profundidade do ponto amostral, área do corpo d água, nível do rio e distância a praia de desova. Realizamos 14 capturas experimentais com redes de espera durante a vazante, entre agosto e outubro de 2009. A Captura por Unidade de Esforço (CPUE) foi calculada em número de indivíduos capturados (CPUEN = N/1000m2/24hs) e biomassa (CPUEB = kg/1000m2/24hs). A CPUEN média onde o Acordo de Pesca não é respeitado foi de 1,6 N/1000m2/24h (sd = 1,8), enquanto sob Acordo respeitado foi de 13,5 N/1000m2/24h (sd = 9,3). A CPUEB média das pescarias sob Acordo de Pesca respeitado de 20,2 kg/1000m2/24h (sd = 11,7), superior a média de 3,4 kg/1000m2/24h (sd = 2,6) onde as regras não são respeitadas. Os efeitos das variáveis ambientais e das categorias de respeito ao Acordo de Pesca para as CPUEN e CPUEB foram testado através de Análise de Covariância. O modelo completo explicou 89% da variação da CPUEN, com efeito significativo da distância a praia de desova. Para a CPUEB, o modelo completo explicou 87,5% da variação entre as pescarias, com o Acordo de Pesca sendo significativo. Os locais onde o acordo é respeitado foram significativamente mais profundos que os locais onde o acordo não é respeitado. Assim, a influência da profundidade precisa ser melhor estudada, tanto para a captura de quelônios quanto para a própria seleção e funcionamento de acordos de pesca. As principais regras do Acordo de Pesca se referem a proibição da malhadeira, principalmente durante a estação de águas baixas, quando os peixes estão concentrados nos lagos e mais fáceis de capturar. A captura de quelônios é intimamente ligada à atividade rotineira de pesca, sendo relatada a variação da abundância de quelônios relacionada às atividades de pesca de populações ribeirinhas em outros locais da Amazônia. O Acordo de Pesca pode ter efeito positivo para os quelônios principalmente por proteger os indivíduos maiores, subadultos e adultos, durante o período reprodutivo, quando são tradicionalmente mais capturados. O consumo de quelônios é uma prática culturalmente enraizada na população ribeirinha e se faz necessário o monitoramento das populações e o levantamento das práticas tradicionais de manejo. Estas podem ser uma importante ferramenta para a conservação dos quelônios amazônicos, tanto como patrimônio da biodiversidade amazônica quanto como importante fonte de proteína para as populações ribeirinhas.
Etnoconhecimento:
As questões ambientais relacionadas à conservação e proteção da natureza são um dos grandes desafios mundiais, pois afetam a sobrevivência da vida sobre a terra e as relações entre grupos sociais e sociedades, principalmente nas regiões tropicais detentoras de uma vasta diversidade de espécies vegetais e animais, como a Amazônia. A apropriação dos recursos naturais, muitas vezes desconsiderando custos sociais e ambientais, pode conduzir a super exploração de determinadas espécies. Desde a colonização até os dias atuais, a história da pesca do peixe-boi amazônico Trichechus inunguis passou por diversas fases, revelando a importância social e econômica da espécie para o desenvolvimento da região, através da influência cultural local e de fatos históricos da economia que determinaram a intensidade de exploração. Este mamífero aquático, endêmico da região Amazônica, ocorre exclusivamente em águas doces, e ambientes calmos, com abundância de vegetação, base alimentar deste herbívoro não ruminante. Além da exploração comercial, outros fatores conduziram a espécie à vulnerabilidade de extinção. Apesar das estratégias de proteção à espécie, como criação de áreas protegidas e leis proibitivas de captura, o consumo e a comercialização de produtos e subprodutos ainda são vigentes na Amazônia. Assim, algumas questões podem ser levantadas como: importância da espécie para a população, local em que ocorre maior pressão de pesca, estratégias de pesca, sazonalidade e finalidade, e atitudes de conservação da espécie pelos pescadores. O presente estudo teve como objetivo principal caracterizar o conhecimento local (etnoconhecimento) sobre o peixe-boi Amazônico pelos pescadores moradores no Município Amazonense de Novo Airão. Neste estudo de caso, a abordagem metodológica buscou entender os processos de interação das populações humanascom os recursos naturais, embasado nos pressupostos teóricos da etnociência. Através de entrevistas semi- estruturadas, observações diretas; registros fotográficos, mapas e calendários de reconhecimento social dos pescadores, os dados coletados foram analisados através de tabelas de cognição, nas quais as informações citadas nas entrevistas foram comparadas com as informações da literatura científica. Muitos destes dados do conhecimento dos pescadores foram validados, dando crédito a etnociência como produto cultural, podendo subsidiar e complementar o conhecimento científico acadêmico. Os pescadores entrevistados detêm um vasto conhecimento sobre a biologia e ecologia do peixe-boi Amazônico, descrevendo hábitos alimentares, comportamento reprodutivo, comportamento respiratório, e noção espacial e temporal de uso de habitats pela espécie. As estratégias de pesca utilizadas pelos pescadores são tradicionais, desde a técnica ao uso de apetrechos artesanais, com pouca introdução de instrumentos e equipamentos modernos, a quantidade de pescadores de peixe-boi, aliado ao comportamento da espécie, são fatores que favorecem a sobrevivência da população de peixes-boi na região de Novo Airão. Estes conhecimentos adquiridos pelos pescadores integrados ao conhecimento científico acadêmico podem subsidiar na formulação de estratégias de conservação da espécie, levando em conta os aspectos regionais ambientais de influência no conhecimento tradicional e nas técnicas de manejo patrimoniais destes pescadores.

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