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Hal Foster - O Artista Enquanto Etnografo

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O ARTISTA ENQUANTO ETNÓGRAFO 
Hal Foster 
Tradução: Alexandre Sá 
Revisão : Angela Prada 
 
FOSTER, Hal. The return of the real: the avant-garde at the end of the century. The MIT 
 Press. London; 1996. 
 
Resumo: Neste ensaio, que se tornou referência no debate artístico, Hal Foster propõe, 
de modo seminal, uma cartografia específica à arte contemporânea. Calcando-se em 
"O autor como produtor" de Walter Benjamin, Foster discute e revisa a posição do 
artista como sujeito da obra em sua relação com o outro. 
 
Abstract: In this essay, which has become a reference in the artistic debate, Hal Foster 
proposes, seminally, a new cartography specific to contemporary art. Basing his assumptions 
on Walter Benjamin's "Author as Producer", Foster discusses and revises the artist's position 
as subject of the work of art in his relationship with the other. 
 
Palavras-chave : 
Arte contemporânea, crítica, etnografia 
 
 
Uma das mais importantes intervenções na relação entre autoria artística e política cultural é 
“O autor como produtor” de Walter Benjamin, apresentado pela primeira vez em abril de 
1934 sob forma de conferência no Instituto para Estudos do Fascismo em Paris. Lá, sob 
influência do teatro épico de Bertold Brecht e dos experimentos factográficos de escritores 
soviéticos como Sergei Tretiakov, Benjamin chamou o artista de esquerda “a aliar-se ao 
proletariado”. Na Paris de 1934 este tipo de apelo não era radical, sua abordagem, entretanto, 
era. Pois Benjamin instiga o artista “avançado” a intervir, como um trabalhador 
revolucionário, nos meios de produção artística - para alterar a “técnica” dos meios 
tradicionais, e transformar o “aparato” da cultura burguesa. Uma “tendência” correta não era 
suficiente, isto seria assumir um lugar “ao lado do proletariado”i. E “que lugar era esse?”. 
Benjamin perguntava em sua escrita mordaz. “Aquele do benfeitor, de um patrono ideológico 
– um lugar impossível”. 
 Muitas oposições estruturam este famoso argumento. Por detrás do privilégio da 
“técnica” sobre o “tema” e da “tomada de posição” sobre a “tendência”, encontra-se um certo 
privilegiar do produtivismo sobre o proletkult, dois movimentos rivais no início da União 
Soviética. O produtivismo trabalhou para desenvolver uma nova cultura proletária através de 
uma extensão dos experimentos formais construtivistas na produção industrial propriamente 
dita; neste sentido procurou solapar a arte e a cultura burguesas. Já o proletkult, também 
politicamente comprometido, procurou desenvolver uma cultura proletária no sentido mais 
tradicional da palavra, procurando superar a arte e cultura burguesas. Para Benjamin, isto não 
era suficiente: mais uma vez, implicitamente, ele imputou à movimentos como o proletkult 
um patronato ideológico, que posicionou o trabalhador como um outro passivoii. Apesar de 
difícil, a solidariedade com os produtores, que tinha importância para Benjamin, era uma 
solidariedade da prática material e não em temas artísticos ou em forma de atitude política 
apenas. 
 Um rápido olhar sobre este texto revela que duas oposições continuam a atormentar a 
recepção da arte – qualidade estética versus relevância política, forma versus conteúdo; 
questões “familiares e infrutíferas” já em 1934. Benjamin procurou superar estas oposições na 
representação através de um terceiro termo, produção; mas as oposições não desapareceram. 
No início de 1980, alguns artistas e críticos retornaram ao “Autor enquanto produtor” para 
trabalhar questões contemporâneas sobre estas antíteses (por exemplo: teoria versus 
ativismo).iii No entanto, esta leitura de Benjamin se diferenciava de sua recepção no final da 
década de 70; em uma reconstituição de sua própria trajetória, rupturas alegóricas entre 
imagem e texto foram forçadas a tornar-se intervenções culturais e políticas. Do mesmo modo 
que Benjamin havia reagido à estetização da política sob o fascismo, também estes artistas e 
críticos responderam à capitalização da cultura e à privatização da sociedade sob o governo de 
Reagan, Tatcher e Kohl entre outros – ainda que essas transformações tenham dificultado 
ainda mais tal intervenção. De fato, quando esta intervenção não se restringia ao aparato 
artístico apenas, suas estratégias eram mais situacionais do que produtivistas – ou seja, mais 
interessadas em re-inscrições de representaçõesiv dadas. 
 Isto não quer dizer que as ações simbólicas não causassem efeito; muitas foram, 
especialmente aquelas que ocorreram da metade para o final da década de 80, em torno da 
crise da AIDS, direito ao aborto e o Apartheid (Eu penso nos projetos do grupo de artistas 
ACT-UP, os pôsteres de Bárbara Kruger, as projeções de Krzysztof Wodiczko). Mas estes 
não são o meu assunto aqui. Antes, quero sugerir que um novo paradigma estruturalmente 
similar ao antigo modelo “Autor enquanto produtor” emergiu na arte avançada de esquerda: o 
artista enquanto etnógrafo. 
 
 
A POLÍTICA CULTURAL DA ALTERIDADE 
 Neste novo paradigma, o objeto de contestação continua sendo, em grande parte, a 
instituição de arte burguesa-capitalista (o museu, a academia, o mercado e a mídia); bem 
como suas definições excludentes de arte, artista, identidade e comunidade. Mas o motivo da 
associação mudou: o artista comprometido batalha em nome de um outro cultural ou étnico. 
Ainda que possa parecer extremamente sutil, esta troca de um sujeito definido em termos de 
relação econômica, para um outro sujeito definido em termos de sua identidade cultural é 
bastante significante e irei comentar de forma mais pormenorizada abaixo. Entretanto aqui, os 
paralelos entre estes dois paradigmas devem ser traçados, porque algumas pressuposições do 
modelo antigo do produtor ainda persistem, de forma problemática, no novo paradigma 
etnográfico. Em primeiro lugar está a pressuposição de que o lugar da transformação política 
é o mesmo da transformação artística e que as vanguardas políticas alocam as vanguardas 
artísticas e que, sob certas circunstâncias, as substituem. (Este mito é básico às interpretações 
esquerdistas da arte moderna: idealiza Jacques Louis David na Revolução Francesa, Gustave 
Courbet na Comuna de Paris, Vladimir Tatlin na Revolução Russa e assim por diante.)v Em 
segundo, a pressuposição de que este lugar seja sempre um outro lugar, no campo do outro – 
no modelo do produtor, junto ao outro social, o proletariado explorado; no paradigma do 
etnógrafo, junto ao outro cultural, o oprimido pós-colonial, subalterno ou subcultural – e este 
outro lugar, este exterior, é o ponto de Arquimedes onde a cultura dominante será 
transformada, ou, pelo menos, subvertida. Terceira é a pressuposição de que, se o artista 
invocado não for percebido como um outro social e/ou cultural, ele ou ela só terá acesso 
limitado a esta alteridade transformadora e que, se ele ou ela é percebido como outro, ele ou 
ela terá acesso automático. Reunidas, estas três pressuposições podem conduzir a um ponto 
menos desejado de conexão com a interpretação de Benjamin do autor enquanto produtor: o 
perigo, para o artista enquanto etnógrafo, de um “patronato ideológico”vi 
 Este perigo pode originar-se da cisão presumida na identidade entre o autor e o 
trabalhador ou entre o artista e o outro, mas também pode originar-se na própria identificação 
(ou para usar uma linguagem antiga, compromisso) empreendida para superar esta cisão. Por 
exemplo, o autor proletkult poderia ser um mero companheiro de viagem do trabalhador não 
por causa de qualquer diferença essencial na identidade, mas porque a identificação com o 
trabalhador aliena o trabalhador, e confirma mais do obstrui a lacuna entre os dois, através de 
uma representação redutora,idealista, ou então, ilegítima. (Esta alteridade na identificação, na 
representação, preocupa Benjamin quanto ao proletkult). Uma alteridade relacionada pode 
acontecer com o artista enquanto etnógrafo em relação ao outro cultural. Certamente o perigo 
do patronato ideológico não é menor para o artista identificado enquanto outro, do que para o 
autor identificado enquanto proletário. De fato, este perigo pode aprofundar-se quando o 
artista for solicitado a assumir as regras do nativo e informante bem como do etnógrafo. 
Resumidamente, identidade não é a mesma coisa que identificação e a aparente simplicidade 
da primeira não deve ser substituída pelas efetivas complicações da segunda. 
 Um marxista ferrenho poderia questionar o paradigma do etnógrafo/informante na arte 
porque desloca a problemática de classe e exploração capitalista para a de raça e opressão 
colonialista, ou, de forma mais simples, porque desloca o social para o cultural ou o 
antropológico. Um pós-estruturalista ferrenho poderia questionar este paradigma pela razão 
oposta: porque não desloca de maneira suficiente a problemática do produtor, porque tende a 
preservar a estrutura do político – para reter a noção de um objeto da história, de modo a 
definir esta posição em termos de verdade e para alocar esta verdade em termos de alteridade 
(novamente, esta é a política do outro, primeiramente projetada, e então apropriada, que me 
interessa aqui). 
 A partir desta perspectiva pós-estruturalista, o paradigma do etnógrafo da mesma 
forma que o modelo do produtor, falha ao refletir sobre sua premissa realista: que o outro, 
aqui pós-colonial, lá proletário, está, de alguma forma, na realidade, na verdade e não na 
ideologia, porque ele ou ela é socialmente oprimido, politicamente transformador, e/ou 
produtor material. (Por exemplo, em 1957 Roland Barthes, que mais tarde se tornou o mais 
famoso crítico da pressuposição realista, escreveu: “Há portanto, uma linguagem que não é 
mítica, é a linguagem do homem enquanto produtor: onde quer que o homem fala de maneira 
a transformar a realidade e não mais preservá-la enquanto imagem, onde quer que ele articule 
esta linguagem à criação de coisas, a metalinguagem se referirá à uma linguagem-objeto e o 
mito será impossível. Esta é a razão pela qual a linguagem própria da revolução não pode ser 
mítica.”vii). Muitas vezes esta presunção realista é composta com uma fantasia primitivista: 
de que o outro, usualmente presumido como alguém de cor, possui acesso especial a um 
psiquismo primário e a processos sociais do quais o sujeito branco é de alguma forma 
bloqueado – uma fantasia que é fundamental para os modernismos primitivistas da mesma 
forma que a presunção realista o é para os modernismos produtivistasviii. Em alguns 
contextos, os dois mitos são efetivos, necessários mesmo: a pressuposição realista em alegar a 
veracidade de uma posição política ou a realidade de uma opressão social e a fantasia 
primitivista em desafiar convenções repressivas de sexualidade e estética. Ainda assim, a 
codificação automática da diferença aparente enquanto identidade manifesta e o da alteridade 
enquanto exterioridade devem ser questionados. Pois esta codificação poderá não somente 
tornar essencial a identidade, mas poderá inclusive, restringir a identificação, tão fundamental 
para a afiliação cultural e para a aliança política (identificação nem sempre é patronato 
ideológico). 
 Existem dois precedentes importantes do paradigma do etnógrafo na arte 
contemporânea nos quais a fantasia primitivista é mais ativa: o surrealismo dissidente 
associado a Georges Bataille e a Michel Leiris no final da década de 20 e início da década de 
30 e o movimento da négritude associado à Léopold Senghor e Aimé Césaire no fim da 
década de 40 e começo da década de 50. De maneiras diferentes, os dois movimentos 
relacionaram o potencial transgressivo da inconsciência com a radical alteridade do outro 
cultural. Assim, Bataille relacionou os ímpetos auto-destrutivos do inconsciente ao dispêndio 
sacrifícial em outras culturas, enquanto Senghor opôs uma emotividade fundamental às 
culturas africanas a um racionalismo fundamental às tradições européiasix. Aida que 
revolucionárias nesse contexto, estas associações primitivistas acabaram por limitar ambos os 
movimentos. O surrealismo dissidente pode ter explorado a alteridade cultural, mas somente 
de forma a satisfazer um ritual de alteração de identidade (a instância clássica é L’Afrique 
fantôme, onde a “etnografia-autoidentitária” foi performatizada por Leiris a respeito da 
missão etnográfica-museológica de Dakar a Djibouti em 1931).x Da mesma forma, o 
movimento de négritude tenha reavaliado a alteridade cultural, mas somente em parte ao ser 
constrangido por estaa segunda natureza, e seus estereótipos essencialistas de negritude, 
emotividade, africano versus europeu e assim por diante (tais problemas foram articulados 
primeiramente por Frantz Fanon e desenvolvidos mais tarde por Wole Soyinka e outros).xi 
 Na arte quasi-antropológica de hoje, a associação primitivista entre inconsciente e o 
outro raramente subsiste nesses formatos. Em alguns momentos, a fantasia é tomada como tal, 
criticamente, como em Seen (1990) de Renée Green, onde o observador é colocado diante de 
dois fantasmas europeus de uma excessiva sexualidade feminina Africana (americana), a 
Vênus Hottentot, de meados do século XIX (representada por uma autópsia) e a dançarina de 
jazz do início do século XX, Josephine Baker (fotografada em uma famosa pose, nua), ou em 
Vanilla Nightmares (1986) de Adrian Piper, onde os fantasmas raciais invocados nos 
anúncios de moda do New York Times se transformaram em vários espectros negros para 
deliciar e aterrorizar os consumidores brancos. Não obstante, em alguns casos, a fantasia 
primitivista se torna absorvida na presunção da premissa realista, de forma que se crê que o 
outro está posicionado dans le vrai. Esta versão primitivista da presunção realista, este 
posicionamento de uma verdade política sobre um outro projetado ou uma exterioridade, 
possui efeitos problemáticos que vão além da codificação automática de uma identidade vis-à-
vis a alteridade exposta acima. Primeiramente, esta exterioridade não é outra em qualquer 
sentido simplista. Em segundo lugar, este posicionamento da política enquanto exterioridade e 
o outro, como uma oposição transcendental, pode distrair da política do aqui e agora, de uma 
contestação imanente. 
 Primeiramente tem-se o problema da projeção deste outro/fora. Em Time and the 
Other: How Anthropology Makes its Object (1983) Johannes Fabian argumenta que a 
antropologia foi construída em um mapeamento mítico do tempo sobre o espaço, baseada em 
duas pressuposições: “1. O tempo é imanente para, e portanto coextensivo ao, mundo (ou à 
natureza ou o universo, dependendo do argumento); 2. Relacionamentos entre partes do 
mundo (no sentido mais abrangente possível de identidades naturais e socioculturais) podem 
ser entendidos enquanto relações temporais. A dispersão no espaço reflete diretamente, o que 
não significa dizer simplesmente, ou de maneira óbvia, a seqüência no Tempo.”xii Portanto, 
com tempo e espaço mapeados um sobre o outro, “lá” torna-se “no passado” e o mais remoto 
(medido por algum “Método Greenwich de Civilização Européia”) torna-se o mais primitivo. 
Este mapeamento do primitivo era evidentemente racista: no imaginário do branco ocidental 
seu lugar estava sempre escuro. Mas esta concepção ainda perdura tenaz, por ser fundamental 
para as narrativas da “história como desenvolvimento” e da “civilização como hierarquia”. 
Essas narrativas do século XIX ainda são residuais em discursos como o da psicanálise e 
disciplinascomo a história da arte, que ainda presumem uma conexão entre o 
desenvolvimento (ontogenético) do indivíduo e o desenvolvimento (filogenético) das espécies 
(como na civilização humana, arte mundial e assim por diante). Nesta associação, o primitivo 
é primeiramente projetado pelo sujeito branco Ocidental como um estágio primal na história 
cultural e depois reabsorvido como um estágio primal na história individual. (Assim em 
Totem and Taboo [1913], cujo subtítulo é “Alguns pontos de concordância entre vidas 
mentais de neuróticos e selvagens,” Freud apresenta o primitivo enquanto uma “imagem bem 
preservada de um estágio inicial do nosso próprio desenvolvimento”).xiii Novamente esta 
associação entre o primitivo e o pré-histórico e/ou o pré-edipiano, o outro e o inconsciente é a 
fantasia primitivista. Apesar de reavaliada por Freud, onde nós, neuróticos podemos também 
ser selvagens, ou por Bataille e Leiris ou Senghor e Césaire, onde tal alteridade é a melhor 
parte de nós, esta fantasia não é desconstruída. E na medida em que a fantasia primitivista 
não é desarticulada, na medida em que o outro permanece fundido com o inconsciente, as 
explorações da alteridade até este momento, irão alienar o ser de um modo antigo, onde o 
outro permanecerá como uma das facetas do ser (não importando o quanto este ser sofra no 
processo), mais até do que “identificar” o outro de novas formas nas quais a diferença seja 
permitida e até mesmo apreciada (talvez através de um reconhecimento de uma alteridade da 
identidade). Nesse sentido, também, a fantasia primitivista pode subsistir em uma arte “quasi-
antropológica”. 
 Por outro lado, existe o problema da política deste outro/fora. Hoje, em nossa 
economia globalizada, a presunção de uma exterioridade pura é praticamente impossível. Isto 
não deve implicar em uma totalização prematura do sistema mundial, mas sim especificar 
tanto a resistência quanto a inovação enquanto relações imanentes ao invés de eventos 
transcendentais. Há muito tempo atrás Fanon percebeu uma confirmação inadvertida da 
cultura européia na oposição lógica ao movimento da négritude, mas só recentemente artistas 
e críticos pós-coloniais retiraram a prática e a teoria das estruturas binárias da alteridade para 
modelos relacionais de diversidade, partindo de um espaço/tempo discreto para áreas 
fronteiriças misturadas.xiv 
 Esta mudança foi difícil porque caminha no sentido contrário ao das antigas políticas 
da alteridade. Uma idéia básica para grande parte do modernismo, esta apropriação do outro 
persiste em grande parte do pós-modernismo. Em The Myth of the Other (1978), o filósofo 
italiano Franco Rella argumenta que, teóricos tão diversos quanto Lacan, Foucault, Deleuze e 
Guatari idealizam o outro como uma negação do semelhante – com efeitos deletérios na 
política cultural. Este trabalho muitas vezes aceita definições dominantes do negativo e/ou do 
desviante, mesmo enquanto se prepara para reavaliá-los.xv Da mesma forma, este trabalho 
freqüentemente permite a reversões retóricas de definições dominantes tomar o lugar da 
própria política. De forma mais generalizada esta idealização da alteridade tende a seguir uma 
linha temporal onde um grupo é privilegiado como o novo objeto da história, unicamente para 
ser substituído por outro, em uma cronologia que pode solapar não somente diferentes 
diferenças (sociais, étnicas, sexuais e etc...) mas também diferentes posições no interior de 
cada diferençaxvi. O resultado é uma política que pode consumir seus objetos históricos antes 
mesmo que eles se tornem historicamente efetivos. 
 Este hegelianismo do outro não é ativo somente no modernismo e pós-modernismo; 
pode ser estrutural para o sujeito moderno. Numa célebre passagem em The order of the 
things (1966) Michel Foucalt argumenta que este sujeito, que este homem moderno que surge 
no século XIX, difere do sujeito clássico das filosofias cartesiana e kantiana porque ele 
procura sua verdade no não pensado – o inconsciente e o outro (esta é a base filosófica do 
cruzamento primitivo entre os dois). “Um desvelar do não consciente”, escreve Foucault, “é a 
verdade de todas as ciências do homem” e é por isto que desvelamentos tais como a 
psicanálise e a antropologia são dos mais privilegiadosxvii discursos modernos. Nesse sentido, 
a alteridade da identidade, passada e presente, é apenas um desafio parcial para o sujeito 
moderno, pois esta alteridade também apóia o ser através de uma oposição romântica, 
conserva o ser através de uma apropriação dialética, o extende através de uma exploração 
surrealista, o prolonga através de uma problematização pós-estruturalista e assim por 
diante.xviii Da mesma forma que a elaboração da psicanálise e antropologia foram 
fundamentais para os discursos modernos (incluindo-se a arte modernista), também a crítica 
destas ciências humanas é crucial para os discursos pós-modernos (incluindo-se a arte pós-
modernista); ambos estão em uma relação de ação protelada. Mas, esta crítica, que é uma 
crítica do sujeito, ainda está centrada no sujeito e ainda centraliza o sujeitoxix. Em The 
Sauvage Mind(1962), Claude Lévi-Strauss faz uma previsão de que o homem será dissolvido 
numa remodelagem linguística-estrutural das ciências humanasxx. No final de The Order of 
Things, Foucault reitera este famosa previsão com sua imagem audaciosa do homem 
“apagado como um rosto desenhado na areia à beira-mar”. Intencionalmente ou não, poderá 
essa virada psicanalítica-antropológica na prática e teoria contemporânea se estruturar de 
forma a restaurar esta figura? Não teríamos recaído novamente naquilo que Foucault chama 
de “nosso sono antropológico?”xxi 
 Sem dúvida a alteridade da identidade é crucial para práticas críticas na antropologia, 
arte e política; pelo menos em conjunturas como a surrealista, o uso da antropologia como 
auto-análise (como em Leiris) ou crítica social (como em Bataille) é culturalmente 
transgressiva, até mesmo politicamente significante. Mas claramente aqui também existem 
perigos. Porque então, tanto quanto agora, a auto-diferenciação pode tornar-se auto-absorção, 
na qual o projeto de uma “auto-modelação etnográfica” torna-se a prática de uma auto-
restauração narcisistaxxii. Para estar certa, a reflexibilidade pode perturbar pressupostos 
automáticos sobre posicionamentos do sujeito, mas também pode promover um 
mascaramento deste distúrbio: uma tendência para confissões traumáticas na teoria que indica 
às vezes um retorno de uma crítica sensível, ou a tendência para relatórios pseudo-
etnográficos na arte que, algumas vezes, são relatórios de viagens dissimulados do mercado 
da arte mundial. Quem, na academia ou no mundo da arte nunca presenciou tais testemunhos 
do novo intelectual empático ou destas flâneries do novo artista nômade?xxiii 
 
ARTE E TEORIA NA ERA DOS ESTUDOS ANTROPOLÓGICOS 
 
O que aconteceu aqui? Que desvios de reconhecimento ocorreram entre a antropologia, a arte 
e outros discursos? Pode-se apontar para um teatro virtual de projeções e reflexos nas duas 
últimas décadas, pelo menos. Primeiramente, alguns críticos da antropologia desenvolveram 
um tipo de inveja do artista (o entusiasmo de James Clifford pelas colagens interculturais do 
“surrealismo etnográfico” é uma influência insistente).xxiv E neste processo, o artista tornou-se 
uma paradigma da reflexividade formal, um leitor auto-consciente da cultura compreendida 
como texto. Mas o artista é o exemplo aqui, ou seria uma projeção de um ego ideal do 
antropólogo: o antropólogo enquanto um artista da colagem, semiologista, vanguardista? xxv 
Em outras palavras, esta inveja do artista não seria uma auto-idealização onde o antropólogo é 
reconstruído como um intérpreteartístico do texto cultural? Essa projeção raramente para aí 
na nova antropologia ou, neste contexto, nos estudos culturais ou em no novo historicismo. 
Muitas vezes, esta interpretação se estende sobre o objeto desses estudos, o outro cultural, que 
é também reconfigurado para refletir uma imagem ideal do antropólogo, crítico ou 
historiador. Esta projeção não é novidade para a antropologia: alguns autores clássicos desta 
disciplina apresentam culturas inteiras como coletivos de artistas ou as lê enquanto padrões 
estéticos de práticas simbólicas (Patterns of Culture de Ruth Benedict [1934] é apenas um 
exemplo). Mas pelo menos, a velha antropologia projetava abertamente; a nova antropologia 
persiste nestas projeções, mas as considera fundamentais/críticas e até desconstrutivas. 
 Obviamente, a nova antropologia entende a cultura de forma diferente, enquanto texto, 
o que significa dizer que esta projeção sobre outras culturas é tão textual quanto estética. O 
modelo textual supostamente desafia a “autoridade etnográfica” através de “paradigmas 
discursivos do diálogo e da polifonia”xxvi. Contudo, há muito tempo atrás, em Outline of a 
Theory of Practice (1972), Pierre Bourdieu questionou a versão estruturalista deste modelo 
textual porque este reduzia “relações sociais em relações comunicativas e mais precisamente 
em operações decodificadoras” e portanto, tornava o leitor etnográfico mais e não menos 
autoritário.xxvii De fato, esta “ideologia do texto”, esta recodificação da prática enquanto 
discurso, persiste na nova antropologia assim como na arte “quasi-antropológica”, da mesma 
forma que nos estudos culturais e no novo historicismo, apesar das ambições contextualistas 
que também direcionam estes métodos.xxviii 
 Recentemente a antiga inveja do artista entre os antropólogos inverteu-se: uma nova 
inveja do etnógrafo assola muitos artistas e críticos. Se os antropólogos desejavam utilizar o 
modelo textual na interpretação da cultura, estes artistas e críticos aspiravam a um trabalho de 
campo onde teoria e prática pareçam se reconciliar. Muitas vezes, eles esboçam indiretamente 
os princípios básicos da tradição do observador/participante, na qual Clifford aponta um foco 
crítico sobre uma instituição particular e um tempo narrativo que privilegia “o presente 
etnográfico.”xxix Contudo, estas apropriações são somente sinais do direcionamento 
etnográfico em arte contemporânea e crítica. O que impulsiona este desvio? 
 Existem muitas instâncias de endereçamento do outro na arte do século XX, muitas 
das quais primitivistas, com estreitas ligações com a política da alteridade: no surrealismo, 
onde o outro é representado principalmente em termos do inconsciente; na art brut de Jean 
Dubuffet, onde o outro representa um recurso redentor anti-civilizacional; no expressionismo 
abstrato, onde o outro se coloca como exemplar primário de todos os artistas; e de forma 
variável na arte das décadas de 60 e 70 (a alusão à arte pré-histórica em alguns trabalhos de 
site-specific/earthworks, em alguns tipos de arte conceitual e arte crítica institucional o 
mundo da arte visto como um sítio antropológico, a invenção de sítios arqueológicos e 
civilizações antropológicas por Anne e Patrick Poirier, Charles Simonds e muitos outros.)xxx 
Assim, o que caracteriza este direcionamento atual, além de sua relativa auto-consciência 
sobre o método etnográfico? Primeiro, como havíamos visto, a antropologia é pensada como 
a ciência da alteridade; e neste sentido é, conjuntamente com a psicanálise, a língua franca da 
prática artística e do discurso crítico. Segundo, a antropologia é a disciplina que considera a 
cultura como seu objeto e este campo expandido de referências é o domínio da teoria e da 
prática pós-moderna (portanto também a atração por estudos culturais e em um grau menor, o 
novo historicismo). Terceiro, a etnografia é considerada contextual, uma demanda muitas 
vezes automática que artistas e críticos atuais dividem com outros praticantes, muitos dos 
quais almejam desenvolver um trabalho de campo no dia-a-dia. Quarto, a antropologia é 
pensada como reguladora da interdisciplinaridade, outro caminho habitual na arte 
contemporânea e na crítica. Quinto, a recente auto-crítica da antropologia a torna atrativa, 
pois promete uma reflexividade do etnógrafo no centro, preservando um romantismo do outro 
nas margens. Por todas estas razões, investigações marginais da antropologia, como críticas 
queer da psicanálise, possuem um status de vanguarda: é como se, ao longo dessas linhas que 
o arrojo crítico corta de modo mais incisivo. 
 Mas, a virada etnográfica foi confirmada por outro fator, que inclui a dupla herança da 
antropologia. Em Culture and Practical Reason (1976), Marshall Sahlins argumenta que duas 
epistemologias têm por muito tempo dividido a disciplina: uma enfatiza a lógica simbólica, 
onde o social é entendido principalmente em termos de um sistema de trocas; a outra 
privilegia a razão prática, onde o social é entendido principalmente em termos de cultura 
material.xxxi Neste aspecto, a antropologia já participa de dois modelos contraditórios que 
dominam a arte contemporânea e a crítica: por um lado, na antiga ideologia do texto, o 
direcionamento lingüístico na década de 1960 que reconfigurou o social enquanto ordem 
simbólica e/ou sistema cultural e antecipou “a desintegração do homem”, “ a morte do autor” 
e etc... E por outro lado, no desejo recente pelo referente, o direcionamento para o contexto e 
para a identidade que se opõe aos velhos paradigmas textuais e às criticas do sujeito. Com o 
direcionamento para este discurso dividido da antropologia, artistas e críticos podem 
solucionar esses modelos contraditórios magicamente: eles podem assumir os disfarces de 
um semiólogo da cultura e de um pesquisador de campo contextual, eles podem perpetuar e 
condenar a teoria crítica, eles podem relativizar e recentralizar o sujeito, tudo ao mesmo 
tempo. No nosso estado corrente de ambivalências artístico-teóricas e de impasses político-
culturais, a antropologia é o discurso comprometido de escolha.xxxii 
 Novamente, esta inveja do etnógrafo é compartilhada por muitos críticos, 
especialmente em estudos culturais e no novo historicismo, que assumem o papel do 
etnógrafo geralmente de uma forma mascarada: o etnógrafo dos estudos culturais vestido 
pobremente como um colega aficionado (por razões de solidariedade política, mas com 
grande ansiedade social); o novo etnógrafo historicista vestido como um mestre arquivista 
(por razões de respeitabilidade acadêmica, mas com muita arrogância profissional). 
Primeiramente, alguns antropólogos adaptaram métodos textuais da crítica literária de modo a 
reformular a cultura enquanto texto; então alguns críticos literários adaptaram métodos 
etnográficos de modo a de reformular textos como cultura forçada a apequenar-se. E estas 
trocas foram responsáveis por grande parte dos trabalhos interdisciplinares em um passado 
recente.xxxiii Mas existem dois problemas neste teatro de projeções e reflexos, o primeiro 
metodológico; o segundo, ético. Se tanto os direcionamentos textuais quanto os etnográficos 
dependiam de um único discurso, quão realmente interdisciplinares poderão ser os resultados? 
Se os estudos culturais e o novo historicismo freqüentemente trapaceiam um modelo 
etnográfico (quando não um modelo sociológico), poderia haver “uma ideologia teórica 
comum que silenciosamente habita a ‘consciência’ de todos estes especialistas.... oscilando 
entre um vago espiritualismo e um positivismo tecnocrático?”xxxiv O segundo problema, 
mencionado acima é mais sério. Quando o outro é admirado enquanto divertido na 
representação, subversivo no gênero e assim por diante,poderia ele ser uma projeção do 
antropólogo, artista, crítico ou historiador? Neste caso, uma prática ideal pode ser projetada 
no campo do outro, que então é solicitado a refleti-la como se fosse não somente 
autenticamente nativa mas, politicamente inovadora. 
 Em parte esta é uma projeção minha, que a aplicação de métodos etnográficos antigos 
e atuais, em muito esclareceu. Mas também obliterou muito do campo do outro, e em seu 
nome. Isso é o oposto de uma crítica da autoridade etnográfica, de fato, o oposto do método 
etnográfico pelo menos como eu os compreendo. E este “lugar impossível”, como Benjamin o 
chamou há muito tempo atrás, é uma ocupação habitual de muitos antropólogos, artistas, 
críticos e historiadores. 
 
 
O LUGAR DA ARTE CONTEMPORÂNEA 
 
A virada etnográfica na arte contemporânea é também direcionada por desenvolvimentos no 
internos a uma genealogia mínima da arte dos últimos trinta e cinco anos. Estes 
desenvolvimentos constituem uma seqüência de investigações: primeiro relativos aos 
materiais constitutivos do meio artístico, depois, sobre as suas condições espaciais de 
percepção, e então das bases corpóreas dessa percepção – mudanças marcadas pela arte 
minimalista no começo dos anos 60 até a arte conceitual, da performance, do corpo e a arte de 
site-specific já no início da década de 70. Assim, a instituição de arte não pôde mais ser 
descrita somente em termos espaciais (estúdio, galeria, museu, etc...); pois era também uma 
rede discursiva de diferentes práticas e instituições, outras subjetividades e comunidades. O 
observador também não podia mais estar delimitado apenas em termos fenomenológicos, ele 
ou ela era também um sujeito definido em uma linguagem e marcado pela diferença 
(econômica, étnica, sexual e etc...). Obviamente a crise das descrições restritivas da arte e do 
artista, identidade e comunidade, foi pressionada também por movimentos sociais (direitos 
civis, feminismos variados, políticas estranhas, multiculturalismo) da mesma forma que os 
desenvolvimentos teóricos (a convergência do feminismo, psicanálise e a teoria 
cinematográfica; a redescoberta de Antonio Gramsci e o desenvolvimento dos estudos 
culturais na Grã-Bretanha; as aplicações de Louis Althusser, Lacan e Foucault, especialmente 
no jornal inglês Screen; o desenvolvimento do discurso pós-colonial com Edward Said, 
Gayatri Spivak, Homi Bhabha, e outros; e assim por diante). Portanto, a arte deslocou-se para 
o campo ampliado da cultura, espaço este pensado pela pesquisa antropológica. 
 Estes acontecimentos também constituem uma série de mudanças no que se refere ao 
lugar da arte: da superfície do meio ao espaço do museu, das molduras institucionais para as 
redes discursivas, a ponto de muitos artistas e críticos tratarem temáticas, como desejo ou 
doença, AIDS ou marginalidade, enquanto lugares da arte.xxxv Paralelamente a esta figura do 
lugar tem-se a analogia do mapeamento. Em um momento fundamental, Robert Smithson e 
outros direcionaram esta operação cartográfica para um extremo geológico que transformou 
radicalmente a localização da arte. No entanto, esta localização também tinha seus limites: 
poderia ser reocupada por uma galeria ou por um museu, jogava com o mito do artista 
redentor (um local bem tradicional) e assim por diante. Por outro lado, o mapeamento na arte 
atual tende na direção do sociológico e do antropológico, a ponto do mapeamento etnográfico 
de uma instituição ou comunidade ser uma forma primária de site-specific na arte hoje. 
 O mapeamento sociológico está implícito em algumas artes conceituais, algumas 
vezes em forma de paródia, desde a gravação lacônica de Twenty-Six Gasoline Stations de 
Ed. Ruscha (1963) até o projeto quixotesco de Douglas Hueber de fotografar toda forma de 
vida humana (Variable Piece: 70). Um exemplo importante aqui é Homes for America de Dan 
Grahan, um artigo (publicado em 1966-67 na Arts magazine) de repetições modulares em um 
projeto de moradias, que reenquadra estruturas minimalistas como objetos encontrados em um 
subúrbio tecnocrático. O mapeamento sociológico é mais explícito em muitas críticas 
institucionais, especialmente no trabalho de Hans Haacke, desde pesquisas de opinião e 
perfis de visitantes de galerias e museus e mesmo denúncia de magnatas do ramo de imóveis 
de Nova York (1969-73) através de cotações de colecionadores de obras-primas (1974-75) e 
até investigações sobre as negociações realizadas entre museus, corporações e governos. 
Embora este trabalho questione de maneira incisiva a autoridade social, não aborda a 
autoridade sociológica. 
 Isto é mais presente em trabalhos que examinam a autoridade articuladora em modos 
de representação documentais. Num vídeo como Vital Statistics of a Citizen, simply obtained 
(1976) e num texto-foto como The Bowery in Two Inadequate Descriptive Systems (1974 – 
75), Martha Rosler desvirtua a aparente objetividade das estatísticas médicas sobre o corpo 
feminino e as descrições sociológicas a respeito de alcoólatras indigentes. Recentemente, ela 
também dirigiu este uso crítico de formatos documentais para preocupações geopolíticas, que 
há muito tempo direcionam o trabalho de Allan Sekula. Particularmente em uma seqüência de 
três fotos-textos, Sekula segue os traços da conexão entre as fronteiras alemãs e as políticas da 
Guerra Fria (Sketch for a Geography Lesson, 1983), uma indústria de mineração e uma 
instituição financeira (Canadian Notes, 1986) e o espaço marítimo e a economia global (Fish 
Story, 1995). Com estas “geografias materiais e imaginárias do mundo capitalista avançado”, 
ele desenha um “mapa cognitivo” de nossa ordem global. Mas, com suas variações de 
perspectiva na narrativa e na imagem, Sekula é tão reflexivo quanto qualquer novo 
antropólogo, sobre a centralização deste projeto etnográfico. xxxvi 
 Uma consciência das pressuposições sociológicas e das complicações antropológicas, 
também norteia os mapeamentos femininos de artistas como Mary Kelly e Silvia Kolbowski. 
Assim, em Interim (1984-89) Kelly registra posições pessoais e políticas no interior do 
movimento feminista através de uma mistura polifônica de imagens e vozes. Na realidade, ela 
representa o movimento como um sistema de parentesco do qual ela participa como uma 
etnógrafa nativa da arte, teoria, ensino, ativismo, amizade, família, aconselhamento, 
envelhecimento. Em várias reorganizações das definições institucionais da arte, Kobolski 
também faz uso do mapeamento etnográfico de modo reflexivo. Em projetos como Enlarged 
from the catalogue (1987-88), ela propõe uma etnografia feminista da autoridade cultural em 
funcionamento em exibições de arte, catálogos, críticas e similares.xxxvii 
Tal reflexividade é fundamental pois, como Bourdieu apontou, o mapeamento 
etnográfico é predisposto a uma oposição cartesiana que conduz o observador a abstrair a 
cultura em estudo. Tal mapeamento pode portanto confirmar, ao invés de contestar, a 
autoridade daquele que mapeia sobre o próprio local, de maneira a reduzir a troca dialógica 
desejável no trabalho de campo.xxxviii Em seus mapeamentos sobre outras culturas Lothar 
Baumgarten é algumas vezes, imputado com tal arrogância. Em muitos trabalhos das últimas 
duas décadas, ele registrou os nomes de sociedades indígenas da América do Norte e do Sul, 
geralmente impostos tanto por exploradores quanto por etnógrafos, em locais, como a cúpula 
neoclássica do Museu Fredericianum em Kassel (Alemanha) em 1982 e na espiral modernista 
do Museu Guggenheim em Nova York, em 1993. Mais do que troféus etnográficos, estes 
nomes retornam, quase como signos distorcidos do reprimido, de forma a desafiar os 
mapeamentos do Ocidente: na cúpula neoclássica, comose declarassem que a outra face da 
Iluminação do Velho Mundo é a Conquista do Novo Mundo e na espiral de Frank Lloyd 
Wright, como se demandassem um novo globo sem narrativas do moderno e do primitivo ou 
sem as Hierarquias do Norte e do Sul, um mapeamento diferente onde o construtor também é 
construído, colocado em uma paralaxe, de maneira a complicar as velhas oposições 
antropológicas do nós-aqui-e-agora versus o eles-lá-e-então.xxxix 
Os exemplos de Baumgarten ainda apontam para uma outra complicação: estes 
mapeamentos etnográficos geralmente são comissionados. Da mesma forma que a arte da 
apropriação da década de 80 tornou-se um gênero estético, até mesmo um espetáculo 
midiático, então, novos trabalho de site-specific muitas vezes parecem um evento 
museológico, no qual a instituição importa a crítica, seja como um show de tolerância ou com 
o propósito de auto-inoculação (contra uma crítica empreendida pela instituição, dentro da 
própria instituição). Certamente tal posição no interior do museu poderá ser necessária para 
tais mapeamentos etnográficos, especialmente se seu significado pretende ser desconstrutivo: 
da mesma forma que a arte de apropriação, para ocupar-se com o espetáculo da mídia teve 
que participar deste; o novo trabalho de site-specific, a fim de remapear o museu ou de 
reconfigurar sua audiência, deve operar dentro deste. Este argumento dá suporte ao mais 
incisivo destes projetos, como Mining the Museum de Fred Wilson e Aren’t they lovely? de 
Andrea Fraser (ambos de 1992). 
Em Mining the Museum, patrocinado pelo Museu de Arte Contemporânea em 
Baltimore, Wilson atuou enquanto um arqueólogo da Sociedade Histórica de Maryland. 
Primeiro ele explorou a coleção do museu (uma “mineração” inicial). Depois ele retomou 
representações evocativas de histórias, principalmente afro-americanas, nem sempre 
mostradas enquanto históricas (uma segunda “mineração”). Finalmente re-emoldurou outras 
representações que durante muito tempo tinham para si o direito da história (por exemplo, em 
uma exibição denominada: “Trabalho em metal 1793-1880’, colocou um par de algemas de 
escravos – uma terceira “mineração” que extrapolava a representação dada). Agindo desta 
maneira, Wilson também trabalhou como um etnógrafo das comunidades afro-americanas 
perdidas, reprimidas ou por outro lado, deslocadas em tais instituições. Andrea Fraser 
realizou, de forma diferente, uma arqueologia nos arquivos de museu e a etnografia das 
culturas de museu. Em Aren’t they lovely? ela retomou uma legado privado frente ao museu 
de arte da Universidade da Califórnia em Berkeley, com o objetivo de investigar como os 
objetos domésticos heterogêneos de sócios específicos do museu (de óculos a Renoirs) são 
sublimados em uma cultura pública homogênea de um museu de arte genérico. Aqui Fraser 
abordava a sublimação institucional, enquanto Wilson focava na repressão institucional. 
Contudo, os dois artistas jogam com a museologia primeiramente para expor e depois re-
enquadrar os códigos institucionais da arte e dos artefatos – como os objetos são traduzidos 
enquanto provas históricas e/ou exemplos culturais, investidos de valor e catequizados pelo 
público. 
Entretanto, apesar de toda perspicácia de tais projetos, a abordagem desconstrutiva-
etnográfica pode se tornar um gambito, um jogo interno que não torna a instituição mais 
aberta e pública, mas mais narcisista e hermética, um lugar para iniciados, onde apenas uma 
crítica desdenhosa é ensaiada. Então a ambigüidade do posicionamento desconstrutivista, ao 
mesmo tempo dentro e fora da instituição, pode cair em uma duplicidade de pensamento 
cínico onde o artista e instituição são atingidos de duas maneiras – retendo o status social da 
arte e entretendo a pureza moral da crítica, um como complemento ou compensação do outro. 
Estes são os perigos do trabalho de site-specific dentro da instituição; outros surgem 
quando este trabalho é patrocinado por agentes externos, geralmente em colaboração com 
grupos locais. Considere o exemplo de “Project Unité”, um trabalho comissionado de 40 ou 
mais instalações realizadas para a Unidade de Habitação em Firminy (França) durante o verão 
de 1993. Aqui o paradigma quasi-antropológico atuou em dois níveis: primeiro, 
indiretamente, no sentido de que este projeto de habitação decadente desenhado por Le 
Corbusier foi tratado como um local etnográfico (teria a arquitetura moderna se tornado tão 
exótica?); e depois, diretamente, quando sua comunidade, majoritariamente composta de 
imigrantes, foi oferecida aos artistas para um comprometimento etnográfico. Um dos projetos 
sugere as armadilhas de tal combinação. Aqui, um time neo-conceitual, Clegg & Guttman, 
pediu aos residentes da Unidade para que contribuíssem com fitas cassete para uma discoteca, 
que foram editadas, compiladas e dispostas de acordo com o apartamento e o andar, enquanto 
um modelo da construção como um todo. Seduzidos pela colaboração, os habitantes 
emprestaram tais 'procurações' culturais, somente torná-las em artefatos de exibição 
antropológica. E os artistas por sua vez, não questionaram a autoridade etnográfica, nem 
tampouco a condescendência sociológica envolvida nesta auto-representação facilitada. 
Isto é típico do cenário quasi-antropológico. Poucos princípios do participante-
observador etnográfico são observados, muito menos criticados e somente se efetiva um 
engajamento limitado da comunidade. Quase que naturalmente, o projeto se desvia de uma 
colaboração para a remodelação do ser, de uma descentralização do artista enquanto 
autoridade cultural para uma re-estruturação do outro em um disfarce neo-primitivista. 
Logicamente, isto nem sempre é o caso: muitos artistas utilizaram estas oportunidades para 
colaborar com as comunidades de maneira inovadora, para redescobrir histórias suprimidas 
que estão situadas de maneiras particulares, acessadas por uns mais efetivamente do que por 
outros. E simbolicamente este novo trabalho de site-specific pode reocupar espaços culturais 
perdidos e propor contra-memórias históricas. (Eu penso nas placas afixadas por Edgar Heap 
of Birds que reivindicavam a terra nativa americana em Oklahoma e em outros lugares e os 
projetos desenvolvidos por coletivos como Repo History que apontam para histórias 
suprimidas por debaixo das comemorações oficiais em Nova York e em outros lugares). 
Todavia, o papel quase-antropológico estabelecido para o artista pode promover uma 
suposição assim como também, um questionamento da autoridade etnográfica, uma evasão e 
na mesma freqüência, um aprofundamento da crítica institucional. 
Em Firminy, o modelo etnográfico foi utilizado para dar vida a um antigo local, mas 
também poderia ter sido utilizado para desenvolver um novo. O local e a rotina são pensados 
como resistentes ao desenvolvimento econômico porém, também para atraí-lo, por isso, o 
desenvolvimento necessita do local e da rotina mesmo que desgaste estas qualidades e as 
torne sem lugar. Neste caso, o trabalho de site-specific pode ser utilizado para fazer com que 
estes não-espaços se tornem específicos novamente, para reendereçá-los enquanto locais 
estabelecidos e não enquanto espaços abstratos, em termos históricos e/ou culturais.xl 
Assassinados enquanto cultura, o local e a rotina podem ser revividos enquanto um simulacro, 
um “tema” para um parque ou uma “história” para um shopping center e o trabalho de site-
specific pode se desenhar dentro desta reanimação do local e da rotina, esta versão da Disney 
do site-specific. Transformados em tabus na arte pós-moderna, valores como autenticidade, 
originalidade e singularidade podem retornar enquanto características dos locais que os 
artistas foram chamados para definirou embelezar. Não há nada de errado com este retorno 
per se, mas os patrocinadores podem considerar tais propriedades precisamente enquanto 
valores específicos a serem desenvolvidos.xli 
Instituições de arte podem também utilizar trabalhos de site-specific para o 
desenvolvimento econômico, projeções sociais e turismo artístico e em momentos de 
privatização isto é presumidamente necessário e até mesmo natural. Em “Culture in Action”, 
um programa de arte pública: “Sculpture Chicago” realizado em 1993, oito projetos foram 
realizados ao longo da cidade. Liderado por artistas como Daniel Martinez, Mark Dion, Kate 
Ericson e Mel Zeigler, estas colaborações serviram “enquanto um laboratório urbano para 
envolver diversas platéias na criação de projetos inovadores de arte pública”.xlii Porém, não 
podiam também servir enquanto pesquisas de relações públicas para as corporações e 
agências de fomento. Outra instância desta ambigüidade do serviço público é a designação 
anual da “Capital Cultural da Europa”. Na Antuérpia, a capital em 1993, muitos trabalhos de 
site-specific foram mais uma vez, comissionados. Aqui, os artistas exploraram histórias 
perdidas mais do que o engajamento das comunidades presentes, de acordo com o tema do 
show: “Considerando um situação normal e retraduzindo-a em leituras múltiplas e 
sobrepostas das condições do passado e do presente”. Emprestado de Gordon Matta-Clark, 
um pioneiro do trabalho de site-specific, este tema mistura as metáforas do mapeamento do 
local e o détournement situacionista (definido há muito tempo atrás por Guy Debord enquanto 
“uma reutilização dos elementos artísticos preexistentes num novo conjunto”)xliii. Mas, 
novamente aqui, projetos de site-specific impressionantes também se transformaram em 
espaços turísticos e a fratura situacionista foi reconciliada com a promoção sócio-cultural. 
Nestes casos a instituição pode obscurecer o trabalho que a princípio deveria iluminar: 
torna-se espetáculo, arrecada o capital cultural e o diretor/curador torna-se a estrela. Isto não é 
uma conspiração, nem tampouco uma cooptação pura e simplesmente; contudo, pode desviar 
o artista mais do que reconfigurar o local.xliv Da mesma forma que o autor proletkult, de 
acordo com Benjamin, deve buscar o lugar da realidade do proletariado e sentar só 
parcialmente no lugar do patrão, também, o artista etnográfico pode colaborar com uma 
comunidade local, somente para ter este trabalho redirecionado para outros fins. Muitas vezes, 
artista e comunidade estão unidos através de uma redução identitária de ambos; a aparente 
autenticidade de um é invocada para garantir a do outro, em uma forma que ameaça ruir 
novos trabalhos de site-specific em identidade política tout court.xlv Enquanto o artista se 
encontra na identidade de uma comunidade localizada, ele ou ela podem ser solicitados a se 
posicionarem por esta identidade, a fim de representá-la institucionalmente. Neste caso o 
artista é primitivizado, de fato antropologizado assim, a instituição diz: aqui está a sua 
comunidade, personificada em seu artista, agora em exposição. 
De uma forma geral, os artistas mais relevantes estão cientes destas complicações e 
por vezes, trazem-nas para o primeiro plano. Em muitas performances James Luna expressou 
os estereótipos do índio nativo americano na cultura branca (o guerreiro ornamental, o xamã 
ritualístico, o índio bêbado, o objeto de museu). Agindo desta forma, ele convida estes 
primitivismos populares para a paródia, para jogá-los explosivamente de volta à platéia. 
Jimmie Durham também pressiona estes primitivismos até o ponto de uma explosão crítica, 
completamente bombástica, especialmente no trabalhos Self-Portrait (1988), onde uma figura 
representa um cacique sábio dono de uma tabacaria, através de um texto paradoxal de 
fantasias populares sobre o corpo masculino do índio. Em seus trabalhos híbridos, Durham 
mistura objetos ritualísticos com objetos encontrados e objetos ritualísticos de uma maneira 
que antecipadamente auto-primitivista e pervertidamente anti-categórica. Estes fetiches 
pseudo-primitivos e artefatos pseudo-etnográficos resistem a aprofundamentos primitivistas e 
a antropologização através de uma paródia “malandra” destes mesmos processos. Todas estas 
estratégias – uma paródia do primitivismo, a inversão de papéis etnográficas, brincadeiras 
antecipatórias da morte, a pluralidade das práticas – incomodam a cultura dominante que 
depende de estereótipos estritos, linhas estáveis da autoridade, ressurgimentos humanistas e 
ressurreições museológicas de todos os tipos.xlvi 
 
 
MEMÓRIA DISCIPLINAR E DISTÂNCIA CRÍTICA 
Quero elaborar dois pontos em conclusão, o primeiro sobre o lugar da arte contemporânea e o 
segundo quanto a sua função interior de reflexividade. Eu sugeri acima que muitos artistas 
tratam condições como desejo ou doença, enquanto lugares de trabalho. Neste sentido, eles 
trabalham horizontalmente, em um movimento sincrônico da questão social para a questão, 
do debate político ao debate, mais do que verticalmente, num comprometimento diacrônico 
com as formas disciplinares de gêneros ou mídias postos. Além do deslocamento genérico 
(discutido no capítulo 2) da “qualidade” formalista para o “interesse” neo-vanguardista, 
existem várias marcos desta mudança da mídia-específica para a prática do discurso-
específico. Em “Other Criteria” (1968), Leo Steinberg percebeu um deslocamento, nas 
primeiras combinações de Rauschemberg, de um modelo vertical da tela-enquanto-janela para 
um modelo horizontal da tela-enquanto-texto, de um paradigma “natural” da imagem 
enquanto uma paisagem emoldurada para um paradigma “cultural” da imagem enquanto uma 
rede de informações, a qual ele considerava como inauguradora da produção da arte pós-
moderna.xlvii Porém, este deslocamento do vertical para o horizontal permaneceu operacional; 
sua dimensão social só foi desenvolvida na pop-arte. “A aceitação pelos mass media delineia 
uma mudança na nossa noção sobre o que é cultura”, assim antecipou Lawrence Alloway há 
muito tempo atrás em “The Long Front of Culture” (1958). “Ao invés de estar congelada em 
camadas de uma pirâmide”, o pop colocou a arte “em uma continuidade” da cultura.xlviii 
Assim, se Rauschemberg e companhia buscaram outros critérios além dos aspectos 
formalistas do modernismo caracterizado pela especificidade dos meios, o pop reposicionou o 
engajamento com a grande arte ao longo de uma longa fronteira da cultura. Esta expansão 
horizontal da expressão artística e do valor cultural é aprofundada, criticamente ou não, na 
arte quasi-antropológica e em estudos culturais semelhantes. 
 Alguns efeitos desta expansão podem ser sublinhados. Primeiro, o deslocamento para 
uma maneira horizontal de trabalho é coerente com o direcionamento etnográfico na arte e na 
crítica: um seleciona um local, penetra em sua cultura e aprende sua linguagem, concebe e 
apresenta um projeto, para tão somente se deslocar para o próximo local onde o ciclo é 
repetido. Segundo, este deslocamento segue uma lógica espacial: não se mapeia apenas o 
local, mas também se trabalha em termos de tópicos, enquadramentos e etc... (que podem ou 
não sinalizar para um privilegiar do espaço sobre o tempo no discurso pós-moderno).xlix 
Agora na ruptura pós-modernista, que associo ao retorno de uma vanguarda histórica, o eixo 
espacial ainda interceptava o eixo temporal, vertical. De forma a expandir o espaço estético, 
os artistas se aprofundaram no tempo histórico e retornaram modelos do passado para o 
presente, abrindo novos espaços para o trabalhos. Os dois eixos estavam em tensão, mas era 
uma tensão produtiva: idealmente coordenada, os dois moviam-se juntos, com o passado eo 
presente em paralaxe. Atualmente, os artistas seguem linhas horizontais de trabalho e as 
linhas verticais por vezes parecem estar perdidas. 
 Esta maneira de horizontal de trabalhar demanda que os artistas e críticos estejam 
familiarizados não somente com a estrutura de cada cultura de forma suficiente para mapeá-
la, mas também com sua história de forma suficiente para narrá-la. Portanto, se alguém deseja 
trabalhar sobre a AIDS, deverá entender não unicamente a amplitude discursiva, mas também 
a profundidade histórica das representações sobre a AIDS. Coordenar então os dois eixos de 
vários destes discursos é uma fardo muito pesado. E aqui a cautela tradicionalista sobre a 
maneira de horizontal de trabalhar – as novas conexões discursivas podem obscurecer as 
antigas memórias disciplinares – deve ser considerada, mesmo que apenas para ser 
contrariada. Implícita nesta acusação é que esta mudança tornou a arte contemporânea 
perigosamente política. De fato, esta imagem da arte é dominante na cultura geral, com todos 
os apelos para a purificar a arte da política. Tais apelos são obviamente auto-contraditórios, 
mas ainda assim devem ser considerados com o objetivo de serem colocados em questão.l 
 Meu segundo ponto diz respeito à reflexividade da arte contemporânea. Eu tenho 
ressaltado que a reflexividade é necessária para a proteger contra uma super-identificação 
com o outro (devido ao compromisso, a alienação, etc...) que pode comprometer esta 
alteridade. Paradoxalmente, como Benjamin indicou há algum tempo atrás, esta super-
identificação pode alienar o outro mais profundamente se não permitir a alteridade já presente 
na representação. Em face de tais perigos – de pouca ou muita distância – eu defendi trabalhos 
paraláticos que buscam enquadrar o 'emoldurador' enquanto ele (ou ela) enquadra o outro. 
Esta é uma maneira de negociar o status contraditório da alteridade enquanto dada e 
construída, real e fantasmagórica.li Este enquadramento pode ser simples como uma captação 
fotográfica, como no projeto The Bowery de Rosler, ou uma inversão de um nome, como nos 
sinais de Heap of Birds or Baumgarten. Ainda assim, tal re-enquadramento sozinho não é o 
suficiente. Novamente, a reflexividade pode levar ao hermetismo e até mesmo ao narcisismo, 
onde o outro é obscurecido, a identidade proclamada; e também pode conduzir a uma negação 
de todo o engajamento. E o que a distância crítica garante? Será que está noção tornou-se de 
alguma maneira mítica, acrítica, uma forma de proteção mágica, um ritual de pureza? Esta 
distância é ainda desejável, quanto mais possível? 
 Provavelmente não, mas uma super-identificação redutiva com o outro também não é 
desejável. Muito pior, entretanto, é a aniquiladora desidentificação do outro. Atualmente, a 
política cultural da esquerda ou da direita parecem emperradas neste impasse.lii Em grande 
parte, a esquerda se super-identifica com o outro enquanto uma vítima, trancafiando-o em 
uma hierarquia de sofrimento na qual o infeliz possui pouca margem de manobra. Em uma 
maior parcela a direita se desidentifica com o outro, ao qual acusa enquanto vítima e tira 
partido desta desidentificação para construir uma solidariedade política através do medo e 
repulsa fantasmáticas. Diante deste impasse, o distanciamento crítico talvez não seja tão má 
idéia. 
 
 
Hal Foster é professor de arte e arqueologia da Universidade de Princeton. Publicou diversos 
livros, entre eles The return of the real (MIT Press), do qual este ensaio faz parte, e Art since 
1900 – Modernism, Antimodernism and Postmodernism (Thames and Hudson) junto a 
Rosalind Krauss, Yve-Alain Bois e Benjamin H. D. Buchloh. Recodificação, editado pela 
Casa Editoria Paulista em 1996, e no momento esgotado, é seu único livro traduzido em 
português. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
i Walter Benjamin, Reflections, ed. Peter Demetz, trad. Edmunt Jephcott (New York: Harcourt 
Brace Jovanovich, 1978), 220-38. Exceto quando indicado, todas as referências subsequentes 
a Benjamin são deste texto. 
 
ii Benjamin critica de maneira explícita somente dois movimentos, o ativismo e o Neue 
Sachlichkeit (nova objetividade): o primeiro associado a escritores como Heinrich Mann e 
Alexander Döblin, que abastece o aparato burguês com temas revolucionários, enquanto o 
segundo, associado com o fotógrafo Albert Renger-Patzsch, serve “para renovar de dentro - 
isto é, conforme a moda - o mundo como ele é”. De fato, Benjamin continua relevante ainda 
hoje, este fotógrafo transforma “mesmo a pobreza mais abjeta....num objeto de prazer.” 
 
iii Ver por exemplo, Benjamin Buchloch, “Since Realism there was….(on the current 
conditions of factographic art),” em Marcia Tucker, ed. Art & Ideology (New York: New 
 
Museum of Contemporary Art, 1984). Buchloch discute o trabalho de Allan Sekula e Fred 
Lonidier em particular. 
 
iv “Autor como produtor” aponta para a conjuntura única do alto modernismo - inovação 
artística, revolução social e transformação tecnológica, mas mesmo aí Benjamin estava 
atrasado; Stalin condenou a cultura de vanguarda (sobretudo o produtivismo) em 1932, um 
evento que deve transformar qualquer leitura deste texto. Hoje, faz muito tempo que a 
triangulação do alto modernismo já acabou: não há mais nenhuma revolução socialista no 
sentido tradicional do termo, e a transformação tecnológica apenas deslocou artistas e críticos 
para longe do modo dominante de produção. Resumindo, as estratégias produtivistas são 
dificilmente pertinentes quando sozinhas. 
Vestígios do produtivismo sobrevivem na arte e na teoria do pós-guerra, primeiro no disfarce 
proletário adotado por escultores como David Smith e Richard Serra, e na produção retórica 
da arte pós-studio e na teoria textual (por exemplo, Tel Quel na França). No começo da 
década de 70, as críticas ao produtivismo emergiram; Jean Baudrillard perguntava se os meios 
de representação haviam se tornado tão importantes quanto os meios de produção (ver For a 
critique of the political economy of the sign, 115-16). Isto provocou uma virada situacionista 
nos modos de intervenção cultural (da mídia, local, endereço, e assim por diante), agora 
seguido, como sugiro, de uma virada etnográfica. (Eu delineio o legado produtivista em 
“Somes uses and abuses of Russian Constructivism,” em Richard Andrews, ed.: Ar tinto Life 
[New York: Rizzoli, 1990].) 
 
v Chamar de mito não é dizer que nunca é verdade, mas questionar se é sempre verdade – e 
questionar se ele pode obscurecer outras articulações do político e do artístico. Num sentido, a 
substituição da política pela arte agora desloca a substituição da teoria pela política. 
 
vi Este perigo deve ser distinguido de “a indignidade de falar pelos outros”. Numa “entrevista 
imaginária” de 1983 com este mesmo título, Craig Owens chamou os artistas a ir além da 
problemática produtivista para “desafiar a atividade mesma da representação” (em William 
Olander, ed. Art and Social Change [Oberlin: Oberlin College, 1983]). Apesar da linguagem 
pós-estruturalista, “a indignidade de falar pelos outros” apresenta a representação como um 
deslocamento literal. Este tabu permeou a esquerda cultural norte-americana nos anos 80, 
onde provocou um silêncio censurador tanto quanto um discurso alternativo. 
 
vii Roland Barthes, Mythologies, trad. Annette Lavers (New York: Hill and Wang, 1972), 146. 
Não só a linguagem revolucionária é mítica (aqui é também machista), mas esta noção de 
linguagem, que se encontra entre o produtivismo e o performativo, é praticamente mágica: a 
linguagem aqui confere realidade,conjurando-a. 
 
viii Esta fantasia primitivista também pode operar em modernismos produtivistas, na medida 
em que o proletariado é freqüentemente percebido como primitivo também nesse sentido, 
negativamente (a massa como uma horda primordial) e positivamente (o proletariado como 
um coletivo tribal). 
 
ix Por exemplo, ver Bataille, “The notion of Expendidure” (1933) em Visions of Excess, ed. e 
trad. Allan Stoekl (Minneapolis: University of Minnesota Press, 1985), e Senghor, Anthologie 
de la Nouvelle Poésie et Malagache d’Expression Française (Paris : Presses Universitaires de 
France, 1948) 
 
 
x James Clifford descreve o texto de Leiris como “auto-etnografia” em The predicamant of 
Culture (Cambridge: Harvard University Press, 1988), 170. 
 
xi Ver Fanon, “The Fact of Blackness,” em Black Skin, White Masks (1952), trad. Charles Lam 
Markmann (New York: Grove Press, 1967), e Soyinka, Myth, Literature, and the African 
world (Cambridge: Cambridge University Press, 1976). 
 
xii Johannes Fabian, Time and the Other: How Antropologhy makes its object (New York: 
Columbia University Press, 1983), 11-12. Para um discussão de mapeamentos correlatos na 
história da arte ver “The writing on the wall”, em Michael Govan, ed. Lothar Baumgarten, 
America: Invention (New York: Guggenheim Museum, 1993). 
 
xiii Sigmund Freud, Totem and Taboo, trad. James Strachey (New York: W.W. Norton, 1950), 
1. Esta estranha associação do selvagem e do neurótico – de fato do primitivo, do insano e da 
criança – foi tão fundamental para o alto modernismo que parecia natural. Sua desarticulação 
exporia muitos mitos. 
 
xiv Entretanto um novo perigo surgiu aqui: uma estetização, de fato, uma fetichização de 
signos do híbrido e espaços do "entre". Ambos não apenas privilegiaram a mistura, mas de 
maneira mais problemática, pressupunham uma distinção prévia ou até mesmo pureza. 
 
xv Ver Franco Rella, The Myth of the Other, trad. Nelson Moe (Washington: Maisonneuve 
Press, 1994), especialmente 27-28. Alguém pode objetar que esta ‘re-valoração’ (por 
exemplo, do “black” ou do “queer”) é parte de qualquer política de representação. Ver Stuart 
Hall, “New Etnicities”, em Kobena Mercer, ed. Black Film, Black Cinema (London: Institute 
of Contemporary Art, 1988). 
 
xvi Por exemplo, o movimento négritude associou o colonizado e o proletário como objetos de 
opressão e reificação (ver Césaire, Discourse of Colonialism [Paris, 1955]), uma afiliação 
política que preparou uma apropriação política. Em “Black Orpheus”, seu prefácio para a 
antologia de Senghor (citado na nota 9), Sartre escreveu: “Rapidamente a idéia subjetiva, 
existencial, étnica de negritude ‘passa’, como Hegel coloca, para uma idéia objetiva, positiva 
e exata do proletariado... De fato, a negritude aparece como um termo menor de uma 
progressão dialética” (xl). A que Fanon respondeu: “Fui privado de minha última chance... E 
então não sou eu quem constrói um significado para mim mesmo, mas é o significado que já 
estava lá, preexistindo, esperando por mim, esperando por esta virada da história” (Black 
Skin, 133-34). 
 
xvii Michel Foucault, The Order of Things (New York: Vintage Books, 1970), 364. 
xviii Paradoxalmente, esta preservação da identidade pode ter sido provocada por um 
masoquismo moral na política da alteridade, que Nietzsche atacou em The Genealogy of 
Morals (1887) como o ressentimento funcionando na dialética entre senhor-escravo. Como 
Anson Rabinbach me sugeriu, Sartre exibe este masoquismo em seu famoso prefácio para The 
Wretched of Earth onde, como numa resposta à imputação de uma apropriação dialética (ver 
nota 16), ele então propõe que a descolonização é o “fim da dialética” (1961; trad. Constance 
Farrington [New York: Groove Press, 1968], 31). Sartre então ultrapassa o argumento 
Fanoniano de que a colonização também desumanizou o colonizador via um clamor 
masoquista para reduplicar a vingança redentora do colonizado. Seria este masoquismo moral 
uma versão disfarçada de um “patronato ideológico”? É um ressentimento de segunda ordem, 
 
uma posição de poder na falsidade de sua rendição? É uma outra maneira de manter a 
centralidade do sujeito no outro? 
 
xix Sobre esta questão na psicanálise ver Mikkel Borch-Jabobsen, The Freudian Subject. trad. 
Catherine Porter (Palo Alto: Stanford University Press, 1988). Sou também grato a Mark 
Seltzer, “Serial Killers, I and II”, em Differences (1993) e Critical Inquiry (Autumn 1995). 
 
xx Claude Lévi-Strauss, The Sauvage Mind (Chicago: University Press, 1966), 247. Esta é sua 
reivindicação contra a dialética Sartreana. 
 
xxi Ver Foucault, The Order of Things, 340-43. “’Antropologização’ é a grande ameaça interna 
do conhecimento nos nossos dias” (348). Mas esta restauração pode ser o que a arte quase-
antropológica deseja, e que certamente é efetuada em alguns estudos culturais. The Order of 
Things termina com a imagem apagada do homem; Crusoe’s Footprints, a visão geral de 
Patrick Bantlinger sobre os estudos culturais, termina com suas marcas na areia (New York: 
Routledge, 1990). Esta multiplicidade de homens não pode perturbar a categoria do homem. 
 
xxii Clifford desenvolve a noção de um “auto-remodelamento etnográfico” em The 
Predicament of Culture, em grande parte de Stephen Greenblat em Renaissance Self-
Fashioning (Chicago: University of Chicago Press, 1980). Este sugere uma existência de 
atributos comuns entre a nova antropologia e o novo historicismo. Mais sobre isto, abaixo. 
 
xxiii Em “World Tour”, uma série de instalações em lugares diferentes, Renée Green 
performatiza este nomadismo do artista reflexivamente. Por um lado, ela trabalha sobre traços 
da diáspora africana; por outro, ela faz um circuito de arte (sua camiseta “World Tour” brinca 
com o modelo dos concertos de rock) 
 
xxiv Em The Predicament of Culture Clifford estende esta noção para a etnografia em geral: 
“Não é todo etnógrafo algo de surrealista, um reinventor e um embaralhador de realidades?” 
(147). Alguns questionaram a reciprocidade da arte e da antropologia no ambiente surrealista. 
Ver Jean Jamin, “L’etnografie mode d’inemploi. De qualques rapports de l’ethnologie avec le 
malaise dans la civilisation,” em J. Hainard e R. Kaehr, eds., Le mal et la douleur (Neuchâtel : 
Musée d’etnographie, 1986) ; e Denis Hollier, « The Use-Value of the Impossible », October 
60 (Spring 1992) 
 
xxv Não exclusiva para a nova antropologia, esta cobiça do artista é evidente na análise 
retórica do discurso histórico iniciado na década de 60. “Não houveram empreendimentos 
significantes”, escreve Hayden White em “The Burden of History” (1966), “na historiografia 
surrealista, expressionista ou existencialista deste século (exceto por novelistas e poetas), 
mesmo com toda a vangloriadas ‘artisticidade’ dos historiadores dos tempos modernos” 
(Tropics of Discourse [Baltimore: Johns Hopkins University Press, 1978], 43). Clifford Geetz 
coloca a antropologia “textual” no mapa em The Interpretration of Culture (New York: Basic 
Books, 1973). 
 
xxvi Clifford : “A antropologia interpretativa, por visualizar culturas como assemblage de 
textos... contribui de maneira significativa para a desfamiliarização da autoridade etnográfica” 
(The premedicament of Culture, 41). 
 
 
xxvii Pierre Bourdieu, Outline of a Theory of Practice, trad. Richard Nice (Cambridge: 
Cambridge University Press, 1977). 1. Os “paradigmas discursivos” da nova antropologiasão 
diferentes – pós-estruturalistas mais do que estruturalistas, dialógicos mais do que 
decodificadores. Mas uma orquestração Bahktniana de vozes de informante não esvazia a 
autoridade etnográfica. Em “Banality in Cultural Studies”, Meaghan Morris comenta: “Uma 
vez que ‘as pessoas’ são ao mesmo ao mesmo tempo fonte de autoridade para um texto e uma 
figura de sua própria atividade crítica, a empresa populista não é unicamente circular mas 
(como a maioria das sociologias empíricas) narcisista na estrutura” (em Patrícia Mellencamp, 
ed., The Logics of Television [Bloomington: Indiana University Press, 1990], 23). 
 
xxviii Ver Fredric Jameson, Ideologies of Theory (Minneapolis: University of Minnesota Press, 
1989). Como percebe Jameson, o primeiro movimento textualista foi necessário para que a 
antropologia afrouxasse suas tradições positivistas. Em “New Historicism: A comment”, 
Hayden White aponta para uma “falácia referencial” (relacionada à minha “hipótese realista”) 
e uma falácia textual (relacionada a minha “projeção textual”): “Daí a crítica de que o Novo 
Historicismo é reducionista num duplo sentido: ele reduz o social ao status de uma função do 
cultural, e então mais além, reduz o cultural ao status de um texto” (em H. Aram Veeser, ed. 
The New Historicism [ New York: Routledge, 1989], 294). 
 
xxix Ver Clifford, The Predicament of Culture, 30-32. “O presente etnográfico” é antiquado 
em antropologia. 
 
xxx Sobre este aspecto da arte conceitual ver Joseph Kosuth, “The Artist as an Anthropologist” 
The Fox 1 (1975). 
 
xxxi Marshall Sahlins, Culture and Practical Reason (Chicago: University of Chicago Press, 
1976). Esta crítica foi escrita no ápice do pós- estruturalismo, e Sahlins, então próximo a Jean 
Baudrillard, favorecia a lógica simbólica (lingüística) sobre a razão prática (marxista). “Não 
há lógica material separada do interesse prático”, escreveu Sahlins, “ e o interesse prático do 
homem na produção é constituído simbolicamente” (207). “Na cultura Ocidental”, continua, 
“a economia é o lugar principal da produção simbólica. Para nós, a produção de mercadorias é 
ao mesmo tempo o modo privilegiado da produção simbólica, e da transmissão simbólica. A 
peculiaridade da sociedade burguesa não consiste no fato de que o sistema econômico escapa 
da determinação simbólica, mas que o simbolismo econômico é estruturalmente 
determinante.” 
 
xxxii O papel do etnógrafo também permite que o crítico recupere um posição ambivalente 
entre o acadêmico e outras subculturas como crítica, especialmente quando as alternativas 
parecem limitadas à irrelevância acadêmica ou à afirmação subcultural. 
 
xxxiii Estas trocas não são triviais no momento em que tais posições são consideradas de modo 
estrito – e quando alguns administradores defendem um retorno à antigas disciplinas, 
enquanto outros procuram reter tentativas interdisciplinares sob programas de custo efetivo. 
Incidentalmente, tais trocas parecem ser governadas por princípios do discurso de vendedor 
de carro usado: quando uma disciplina exaure um paradigma (“texto” na crítica literária, 
“cultura” na antropologia), ela o troca, passando-o adiante. 
 
xxxiv Louis Althusser, Philosophy and spontaneous Ideology of the Scientists & Other Essays 
(London: Verso, 1990), 97. A virada etnográfica em estudos culturais e no novo historicismo 
 
é raramente questionada. Em Renaissance Self-Fashioning (1980), um texto fundamental do 
novo historicismo, Stephen Greenblatt é explícito: “Eu tenho tentado ao contrário [de uma 
crítica literária] praticar uma crítica mais cultural ou antropológica – se consideramos aqui por 
“antropológico”, os estudos interpretativos da cultura feitos por Geertz, James Boon, Mary 
Douglas, Jean Duvignaud, Paul Rabinow, Victor Turner e outros”. Tal crítica percebe “a 
literatura como uma parte do sistema de signos que constituem uma dada cultura” (4). Isto 
então, parece um círculo metodológico: a crítica textual aborda a interpretação antropológica, 
mas somente porque seu novo objeto, a cultura, é reformulada como texto. 
 Para Stuart Hall os estudos culturais realizados no Centro Brimingham desenvolveram 
uma crítica que ia do literário para o cultural e posteriormente para a crítica ideológica, com 
uma “definição muito mais ampla, ‘antropológica’” da cultura como resultado (citado em 
Brantlinger, Crusoe’s Fotprints, 64). Esta mudança foi também básica para os estudos 
culturais norte-americanos. Para Janice Radway o Centro Birmingham junto aos estudos 
americanos, que também foram decisivos para um deslocamento de uma “definição literária-
moral da cultura para uma outra, antropológica”. Também importante foram as críticas 
envolvendo as respostas de leitores, o que preparou as “etnografias da leitura” dos estudos 
culturais apropriadamente (Reading the romance [Chapel Hill: University of North Carolina 
Press, 1991] 3-4). Aqui também, as bases etnográficas são admitidas, mas não questionadas. 
A nova antropologia questiona a premissa etnográfica, claro, mas suas premissas são 
raramente questionadas, pelo menos quando consideradas nos estudos culturais e no novo 
historicismo. 
 
xxxv Então por exemplo, John Lindell, um membro do coletivo Gran Fury, disse: “Em termos 
do meu próprio trabalho, o desejo homossexual é um sítio, e o mundo gay em sua abrangência 
também é um sítio. Novamente estou tentando diluir a noção de um sítio físico: um sítio pode 
ser um grupo de pessoas, uma comunidade” (“Roundtable On Site-Specificity”, Documents 
4/5 [ Spring 1994]: 18). 
 
xxxvi Para Martha Rosler, ver especificamente 3 Works (Halifax: the Press of Nova Scotia 
School of Art and Design, 1981); e para Allan Sekula ver Photography Against the Grain: 
Essays and Photo Works 1973-1983 (Halifax: The Press of Nova Scotia School of Art and 
Design, 1984) e Fish Story (Düsseldorf: Richter Verlag, 1995). Para Fredric Jameson, sobre o 
mapeamento cognitivo, ver Postmodernism (Durham: Duke University Press, 1990). 
 
 
xxxvii Para Mary Kelly ver Interim (New York: New Museum of Contemporary Art, 1990); e 
para Silvia Kolowski ver XI Projects (New York: Border Editions, 1993). Muitos outros 
artistas também questionam as representações documentais e/ou trabalham por sobre os 
mapeamentos etnográficos (Susan Hiller, Leandro Katz, Elaine Reichek...). Para um resumo, 
ver Arnd Schneider, “The Art Diviners”, Anthropology Today 9, nº2 (April 1993). 
 
xxxviii Ver Bordieu, Outline for a Theory Practice, 2. 
 
xxxix Sobre tais oposições ver Fabian, Time and the Other, e sobre Baumgarten ver meu “The 
Writing on the Wall” em Govan, ed.., Lothar Baumgarten, America: Invention. 
 
xl Ver as pontuações de Miwon Kwon em “Roundtable on Site-Specificitity”. Novamente, 
uma lógica redentora governa muito dos trabalhos de site-specific, dos projetos de retomada 
de Smithson em diante. 
 
 
xli Uma instância recente foi “The 42nd Street Art Project”, uma tentativa conjunta de uma 
organização de arte, de uma empresa de design, e do Projeto de desenvolvimento da 42ª rua. 
Aqui, novamente, haviam trabalhos individuais de estética e/ou invenção crítica. Apesar 
disso, artes, artes gráficas e moda foram organizados de modo a melhorar a imagem de uma 
série de imóveis notórios adequados para remodelamento. 
 
xlii Panfleto “Culture in Action” (Chicago: Sculpture Chicago, 1993), ver também Mary Jane 
Jacob et al., Culture in Action (Seattle: Bay Press, 1995). 
 
xliii Guy Debord, “Detournement as Negation and Prelude”, Internationale Situationniste, nº3 
[December 1959], reimpresso em Situationist International Anthology,

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