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REVISTA CIENTÍFICA ELETÔNICA DE PSICOLOGIA – ISSN: 1806-0625 Revista Científica Eletrônica de Psicologia é uma publicação semestral da Faculdade de Ciências da Saúde de Garça FASU/FAEF e Editora FAEF, mantidas pela Associação Cultural e Educacional de Garça – ACEG. Rua das Flores, 740 – Vila Labienópolis – CEP: 17400-000 – Garça/SP – Tel: (0**14) 3407-8000 – www.revista.inf.br – www.editorafaef.com.br – www.faef.br. Ano V – Número 8 – Maio de 2007 – Periódicos Semestral RESENHA BERVIQUE, Profa. Dra. Janete de Aguirre Docente do Curso de Psicologia FASU / ACEG - Garça-SP – Brasil e-mail: jaguirreb@uol.com.br 1. IDENTIDADE DA OBRA BOSS, Medard Angústia, culpa e libertação (Ensaios de Psicanálise Existencial). 3. Ed. São Paulo: Editora Duas Cidades, 1981. 2. NOTÍCIAS SOBRE O AUTOR Medard BOSS, psiquiatra suíço, é professor de Psicanálise na University of Zurich School of Medicine. Além de sua intensa atividade junto à Clínica Psiquiátrica na Universidade, e das numerosas viagens para conferências em Universidades da Europa, dos Estados Unidos, da Ásia etc., publicou vários livros e trabalhos, sendo a maioria deles traduzidos para o inglês, o francês, o espanhol e, inclusive, para o japonês. Graças a uma amizade de mais de 25 anos com Martin HEIDEGGER, BOSS teve a oportunidade de assimilar uma nova concepção a respeito do existir humano, que o levou a se afastar da metapsicologia de Sigmund FREUD. Juntamente com Ludwig BINSWANGER, Medard BOSS foi um dos primeiros a realizarem a tentativa de introduzir a Fenomenologia na Psiquiatria. BOSS aprendeu a falar o português, por influência dos laços familiares que o unem ao Brasil, pois um de seus filhos e sua filha estão radicados como fazendeiros no interior de São Paulo. 3. BREVE RESUMO DA OBRA Na presente obra, as idéias de BOSS são apresentadas através de três pequenos trabalhos de sua autoria – 1) Angústia vital, sentimento de culpa e libertação psicoterápica; 2) Sinais de alarme da Psicologia e psicoterapia; e 3) O médico e a morte – que representam uma nova e completa contribuição do autor para a aplicação da Fenomenologia-existencial no campo da Medicina e, particularmente, no da Psicopatologia. O desenrolar do discurso consolida o pensamento e a postura de BOSS frente aos problemas existenciais REVISTA CIENTÍFICA ELETÔNICA DE PSICOLOGIA – ISSN: 1806-0625 Revista Científica Eletrônica de Psicologia é uma publicação semestral da Faculdade de Ciências da Saúde de Garça FASU/FAEF e Editora FAEF, mantidas pela Associação Cultural e Educacional de Garça – ACEG. Rua das Flores, 740 – Vila Labienópolis – CEP: 17400-000 – Garça/SP – Tel: (0**14) 3407-8000 – www.revista.inf.br – www.editorafaef.com.br – www.faef.br. Ano V – Número 8 – Maio de 2007 – Periódicos Semestral fundamentais do ser humano; o autor inicia com uma análise substancial e profunda sobre o sentido da ANGÚSTIA e da CULPA, para, em seguida proceder a uma rigorosa reflexão sobre a problemática do EXISTIR HUMANO contemporâneo, em um mundo dominado pela tecnocracia; e culmina com uma profunda análise do conflito do HOMEM PERANTE A MORTE. No transcorrer de toda a obra, BOSS mostra-se menos preocupado em explicar do que em compreender o existir humano, ou seja, “o relacionamento fundamental frente aos fatos do seu mundo, como frente a si mesmo e a seus próximos” – relacionamento este que, segundo o autor, “está gravemente enfermo” (p. 7). 3.1. Aspecto mais interessante A afirmação categórica do autor de que “os métodos de pesquisa científico-naturais não alcançam o âmbito dos fenômenos humanos, muito menos conseguem realmente penetrar neles” (p. 68). Esta afirmação representa a conclusão da constatação de que os médicos são muito mal preparados para a compreensão da vida e da morte humanas, e que os métodos de pesquisa científica adotados só permitem o sucesso na função terapêutica da Medicina Somática; mas não conseguem penetrar “naquilo” que no existir humano é tipicamente humano. E se não permitem a compreensão do existir humano, “eles não nos ajudam também em relação ao fim, isto é, em relação à morte” (p. 68). 3.2. Aspecto mais importante Considero como o aspecto mais importante a crítica formulada pelo autor ao psicologismo determinista freudiano, que em sua abordagem psicoterapêutica do paciente se espelha na cronologicidade dos eventos da história de vida do mesmo, e procede como se os eventos cronológicos anteriores fossem grilhões que aprisionam o paciente “ad aeternum”. O autor reflete uma grande preocupação com a atitude reducionista que domina os pensamentos e as ações médicas – fruto do “atual espírito violentador da tecnocracia” (p. 19) – atitude essa preocupada com fatos isolados, fornecidos por uma ciência compartimentalizada, e incapaz de chegar REVISTA CIENTÍFICA ELETÔNICA DE PSICOLOGIA – ISSN: 1806-0625 Revista Científica Eletrônica de Psicologia é uma publicação semestral da Faculdade de Ciências da Saúde de Garça FASU/FAEF e Editora FAEF, mantidas pela Associação Cultural e Educacional de Garça – ACEG. Rua das Flores, 740 – Vila Labienópolis – CEP: 17400-000 – Garça/SP – Tel: (0**14) 3407-8000 – www.revista.inf.br – www.editorafaef.com.br – www.faef.br. Ano V – Número 8 – Maio de 2007 – Periódicos Semestral no conceito de homem como uma entidade integrada. Sua preocupação se justifica porque o reducionismo é apriorista e generalizador (apóia-se em “cadeias causais dinâmicas” [p. 21]), representando isto um sério perigo para o relacionamento terapêutico, que deve ser um relacionamento entre sujeitos: no momento em que fazemos afirmações generalizadas a respeito do homem (“Isto nada mais é que...”), transformamos a nossa ciência em mera ideologia. 4. METODOLOGIA Medarde BOSS apóia-se na Fenomenologia hermenêutica para proceder à abordagem da temática central da presente obra, como apoio das psicoterapias analítico-existenciais, imprimindo a estas características que as distinguem de outras psicoterapias: - como qualquer método psicoterápico, investiga a história de vida do paciente; - mas não explica essa história de vida e suas patologias de acordo com um rol de ensinamentos de uma escola, ou de suas categorias preferidas; - em vez disso, compreende (“compreender” extrapola o sentido analítico – intelectual, implicando um “ato de amor”) essa história de vida como modificações da estrutura total do “ser-no-mundo” do paciente; - assim, cada relacionamento terapêutico é “um-em-si”, porque o “ser- no-mundo” tem um caráter de unicidade e de irrepetibilidade. Em suma, isto significa a inclusão da existência na psicoterapia e em oposição a relacionar um sistema de dogmas, ditos científicos, a um quadro aparente de sintomas e sinais de doença. 5. LEVANTAMENTO CONCEITUAL Dos conceitos trabalhados pelo autor para o desenvolvimento da temática da obra, destaco aqueles julgados os mais relevantes à compreensão da mesma: REVISTA CIENTÍFICA ELETÔNICA DE PSICOLOGIA – ISSN: 1806-0625 Revista Científica Eletrônica de Psicologia é uma publicação semestral da Faculdade de Ciências da Saúde de Garça FASU/FAEF e Editora FAEF, mantidas pela Associação Cultural e Educacional de Garça – ACEG. Rua das Flores, 740 – Vila Labienópolis – CEP: 17400-000 – Garça/SP – Tel: (0**14) 3407-8000 – www.revista.inf.br – www.editorafaef.com.br – www.faef.br. Ano V – Número 8 – Maio de 2007 – PeriódicosSemestral - PODER-EXISTIR INTEGRADO: refere-se à inseparabilidade fundamental dos fenômenos físicos e psíquicos da existência humana, nos seus dias de saúde e de doença (p. 13). - ANGÚSTIA e CULPA: como “modalidades existenciais” ou “arranjos existenciais” dominantes, que representam, do ponto de vista fenomenológico-existencial, “processos existenciais modificados”, em comparação com o “sadio”. - LIBERTAÇÃO PSICOTERÁPICA : no que se refere ao tratamento da doença, a psicoterapia implicaria a abertura de novas possibilidades estruturais a esses “processos existenciais modificados”; ou seja, uma compreensão da estrutura da existência humana, permitindo ao paciente encontrar o seu caminho de volta ao seu mundo de existência e possibilitando-lhe ser capaz de usar suas próprias capacidades para existir. Em última instância, trata-se de o psicoterapeuta “recuperar o devido respeito diante da autenticidade e originalidade de cada fenômeno humano” (p. 25). - SENTIDO DA ANGÚSTIA E DA CULPA: “Cada angústia humana tem um de que, do qual ela tem ‘medo’ e um pelo que, pelo qual ela teme. Cada culpa tem um o que que ela ‘deve’ e um credor ao qual está devendo” (p. 26). - MEDO DA MORTE: angústia do “não-poder-mais-estar-aqui” (p. 33). O homem teme mortalmente por aquilo que ele considera o “seu-estar- aí” e o “seu-poder-ser”. - AMOR: condição existencial em que o “estar-aí” está aberto a uma experiência totalmente diferente diante de tudo, que anula a angústia cotidiana e a libera de sua mesquinhez subjetivista, promovendo o “salto qualitativo”. - MORTE: “O morrer é uma possibilidade destacada do existir humano, por ser a mais extensa e não-ultrapassável (...) com ela, nossa existência se abandona a si mesma (...) é a possibilidade do não- poder-estar-aqui. (...) Logo que existe o ser-aí do homem, ele já está lançado na possibilidade de morrer. (...) O existir humano encontra- REVISTA CIENTÍFICA ELETÔNICA DE PSICOLOGIA – ISSN: 1806-0625 Revista Científica Eletrônica de Psicologia é uma publicação semestral da Faculdade de Ciências da Saúde de Garça FASU/FAEF e Editora FAEF, mantidas pela Associação Cultural e Educacional de Garça – ACEG. Rua das Flores, 740 – Vila Labienópolis – CEP: 17400-000 – Garça/SP – Tel: (0**14) 3407-8000 – www.revista.inf.br – www.editorafaef.com.br – www.faef.br. Ano V – Número 8 – Maio de 2007 – Periódicos Semestral se com sua morte diante do seu mais íntimo poder-ser. Além do mais, cada homem tem que morrer a sua própria morte” (p. 71). 6. CONCLUSÕES POSSIBILITADAS PELA LEITURA DA OBRA 6.1. BOSS se posiciona em prol de uma nova base para a psicoterapia – a apreciação do paciente na sua totalidade, como uma unidade integrada. 6.2. Segundo ele, a atitude racionalista do terapeuta não possibilita a compreensão da natureza plena dos dilemas e das ansiedades do paciente; propõe que isto só será possível se o terapeuta assumir uma atitude fenomenológica em relação ao sistema de valores do paciente, que é expresso nas suas ansiedades e dilemas. 6.3. Apoiado na análise da existência de HEIDEGGER, defende a tese de que a compreensão do homem como ser fenomenístico- existente, não pode ter como base uma teoria, mas a compreensão da existência como “ser-no-mundo” e como tal múltipla, não se enquadrando em nenhuma sistema de dogmas teóricos, sejam biológicos, sociológicos ou psicológicos. 6.4. Destaca a angústia e a culpa como as modalidades existenciais dominantes no mundo contemporâneo, dominado pela tecnocracia. 6.5. Reflete uma preocupação particular com as características mecanicistas que vêm assumindo os pensamentos e as ações dos terapeutas, também dominados pelo espírito tecnocrático. 6.6. Critica, frontalmente, não só o determinismo freudiano, como também o racionalismo cartesiano. 6.7. Defende a tese de que existe, inerente à própria vida humana, um contra-poder à angústia, que se manifesta nos fenômenos do amor, da confiança e do estar-abrigado. 6.8. Propõe o caminho da libertação psicoterápica, com o propósito de liberar o paciente para que ele possa desenvolver uma imagem REVISTA CIENTÍFICA ELETÔNICA DE PSICOLOGIA – ISSN: 1806-0625 Revista Científica Eletrônica de Psicologia é uma publicação semestral da Faculdade de Ciências da Saúde de Garça FASU/FAEF e Editora FAEF, mantidas pela Associação Cultural e Educacional de Garça – ACEG. Rua das Flores, 740 – Vila Labienópolis – CEP: 17400-000 – Garça/SP – Tel: (0**14) 3407-8000 – www.revista.inf.br – www.editorafaef.com.br – www.faef.br. Ano V – Número 8 – Maio de 2007 – Periódicos Semestral construtiva e consciente do seu próprio valor, e não de investigar as causas ou remover os sintomas do comportamento patológico. 6.9. Finalmente, conclui o autor que “nós médicos somos muito mal preparados para uma compreensão do viver e do morrer do homem, da vida e da morte humana” (p. 67), devido à própria limitação dos métodos e conhecimentos científico-naturais, que não conseguem penetrar o conteúdo da certeza do homem do “seu-ser-mortal” e do “seu-ter-que-morrer”.
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