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Marlus-v-c-Ferreira-Hipnose-Na-Pratica-Clinica-1.pdf

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I
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II
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E PSICANÁLISE
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Fenichel – Teoria Psicanalítica das Neuroses
Figueiró e Bertuol – Depressªo em Medicina Interna e em Outras Condiçıes
MØdicas – Depressıes SecundÆrias
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Freud – Chaves/Resumo das Obras Completas (Organizaçªo Editorial: National
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Gauderer – Autismo 3a ed.
Gesell e Amatruda – Psicologia do Desenvolvimento – Do Lactente e da Criança
Pequena – Bases Neuropsicológicas e Comportamentais
Graeff – Fundamentos de Psicofarmacologia
Grof – Jogo Cósmico – Exploraçªo das Fronteiras da ConsciŒncia Humana
Grunspun – Crianças e Adolescentes com Transtornos Psicológicos e do
Desenvolvimento
Grunspun – Distœrbios Neuróticos da Criança 5a ed.
Grunspun – Distœrbios PsicossomÆticos da Criança 2a ed.
Grunspun – Distœrbios PsiquiÆtricos da Criança 3a ed.
Grunspun – Educar para o Futuro
Hebb – Psicologia 3a ed. (2 vols.)
InaiÆ – Bases PsicoterÆpicas da Enfermagem
InaiÆ – Enfermagem PsiquiÆtrica e de Saœde Mental na PrÆtica
Ivan Lemos – Dor Crônica – Diagnóstico, Pesquisa e Tratamento
Jaspers – Psicopatologia Geral 2a ed. ( 2 vols.)
Jung – Chaves/Resumo das Obras Completas (Organizaçªo Editorial: National
Clearinghouse for Mental Health Information)
Leme Lopes – O Delírio – Perspectivas e Tratamento
Lent – Cem Bilhıes de Neurônios – Conceitos Fundamentais da NeurociŒncia
Levy – Semiologia PsiquiÆtrica
Lief – Sexualidade Humana – 750 Perguntas Respondidas por 500 Especialistas
Lira Brandªo – Psicofisiologia – As Bases Fisiológicas do Comportamento 2“ ed.
Luz – O MØdico, Essa Droga Desconhecida
Marinho – Como Amamentar o seu BebŒ
Marinho – Desvendando os MistØrios da Amamentaçªo
Marlus – Hipnose na PrÆtica Clínica
Mattos – Pediatria e AdolescŒncia Sociais
Matthes – Epilepsia 2a ed.
Mello – Hipnose – Mecanismos Neuropsicofisiológicos e suas Manifestaçıes
Clínicas
Moraes Passos – Hipnose – Aspectos Atuais
Moura Ribeiro e Gonçalves – Neurologia no Desenvolvimento da Criança
Munjack – Sexologia – Orientaçªo Diagnóstica e Princípios Gerais de Tratamento
Comportamental
Nitrini – A Neurologia que Todo MØdico Deve Saber 2a ed.
Numberg – Princípios de PsicanÆlise – Suas Aplicaçıes à Neurose (com PrefÆcio
de Sigmund Freud)
Portella Nunes – Psiquiatria e Saœde Mental – Conceitos Clínicos e TerapŒuticos
Fundamentais
Perestrello – A Medicina da Pessoa 4a ed.
Perestrello – PsicossomÆtica, Psicologia MØdica, PsicanÆlise
ProtÆsio da Luz – Nem só de CiŒncia se Faz a Cura
Ratner Kirschbaum – História da Enfermagem PsiquiÆtrica
Reimªo – Sono – Um Estudo Abrangente 2a ed.
Rodrigues – Estimulaçªo da Criança Especial em Casa – Um Guia de Orientaçªo
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Sanvito e Manzillo – O Livro das CefalØias
Scalco – TerapŒuticas para a Depressªo na Terceira Idade
Seibel – DependŒncia de Drogas
Shader – Manual de TerapŒutica PsiquiÆtrica 3a ed.
Silva Barbosa – Cantando Bem, Falando Mal
Spoerri – Introduçªo à Psiquiatria – Texto Especialmente Escrito para o Estudante
das CiŒncias da Saœde
Takatori – O Brincar no Cotidiano da Criança com DeficiŒncia Física
Taki Córdas – Saœde Mental da Mulher
Tedesco e Zugaib – Obstetrícia PsicossomÆtica
Teixeira – Manual de Enfermagem PsiquiÆtrica
Uchoa – PsicanÆlise – Teoria e PrÆtica
Vincent – Internet – Guia para Profissionais de Saœde
III
© Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA.
São Paulo • Rio de Janeiro • Ribeirão Preto • Belo Horizonte
MARLUS VINICIUS COSTA FERREIRA
Neurologista, Eletroencefalografista e Neurorradiologista.
Membro Titular da Sociedade Brasileira de Neurofisiologia Clínica.
Membro Titular do Colégio Brasileiro de Radiologia.
Membro da Sociedade de Hipnologia do Paraná
IV
© Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA.
EDITORA ATHENEU
São Paulo — Rua Jesuíno Pascoal, 30
Tels.: (11) 3331-9186 • 223-0143 •
 222-4199 (R. 25, 27, 28 e 30)
Fax: (11) 223-5513
E-mail: edathe@terra.com.br
Rio de Janeiro — Rua Bambina, 74
Tel.: (21) 2539-1295
Fax: (21) 2538-1284
E-mail: atheneu@atheneu.com.br
Ribeirão Preto — Rua Barão do Amazonas, 1.435
Tel.: (16) 636-8950 • 636-5422
Fax: (16) 636-3889
Belo Horizonte — Rua Domingos Vieira, 319
— Conj. 1.104
PLANEJAMENTO GRÁFICO — CAPA: Equipe Atheneu
FERREIRA M.V.C.
Hipnose na Prática Clínica
©Direitos reservados à EDITORA ATHENEU – São Paulo, Rio de Janeiro, Ribeirão Preto, Belo Horizonte, 2003
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Ferreira, Marlus Vinicius Costa
Hipnose na prática clínica/Marlus Vinicius Costa Ferreira.
— São Paulo: Editora Atheneu, 2003.
1. Clínica médica. 2. Hipnotismo – Uso terapêutico. I. Título.
CDD-610
02-5468 NLM-WM 415
Índices para catálogo sistemático:
1. Hipnose: Prática clínica: Ciências médicas 610
V
© Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA.
Nota
O autor conferiu cuidadosamente a posologia, os nomes genéricos e comerciais
dos medicamentos mencionados, de modo que todo esforço foi feito para conseguir
exatidão do conteúdo no momento da publicação. Como a medicina está em
constante evolução, novas pesquisas, experiências clínicas e aparecimento de novos
efeitos colaterais de drogas, ampliam o conhecimento, tornando-se necessárias
modificações nas condutas terapêuticas, e no tratamento com medicamentos.
O editor e o autor, nem qualquer outra pessoa que esteve envolvida na preparação
ou publicação deste trabalho, garantem que as informações contidas aqui sejam em
todos os sentidos exatas e completas, de modo que não são responsáveis por
qualquer erro, omissão ou pelos resultados obtidos pelo uso destas informações.
Os leitores são estimulados a confirmar as informações em outras fontes,
especialmente as fornecidas pelos fabricantes. As fraseologias sugestivas
apresentadas e adaptadas às necessidades de cada paciente para as condições
clínicas indicadas não foram submetidas a um estudo controlado randomizado.
VI
© Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA.
VII
© Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA.
Dedicatória
À Eliane, minha esposa,uma usina nuclear de energia,
que muito me estimulou para a conclusão deste livro.
VIII
© Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA.
IX
© Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA.
Agradecimentos
Sou muito grato ao professor de Psiquiatria e Neurologia, Octávio Augusto da
Silveira, de Curitiba, que me deu grande oportunidade e tem sido meu verdadeiro amigo.
Ao professor Dr. Rubens Moura Ribeiro, de Ribeirão Preto, que me transmitiu
valiosos conhecimentos sobre eletroencefalografia.
À professora de Radiologia Anne G. Osborn, da Escola de Medicina da
Universidade de Utah, em Salt Lake City, que, pelo seu exemplo, entusiasmo e
eficiente comunicação despertou meu interesse para publicações científicas.
Agradeço ao meu amigo Márcio Mortensen Wanderley, pelo auxílio na
navegação pela Internet.
Meu reconhecimento aos pacientes anônimos que com maior ou menor
capacidade hipnótica contribuíram para a criação de muitas fraseologias.
Curitiba, inverno de 2003
Marlus Vinicius Costa Ferreira
X
© Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA.
XI
© Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA.
PrefÆcio
Hipnose na Prática Clínica foi elaborado para auxiliar o estudante de hipnose, o
médico, o psicólogo e o odontólogo a atuarem clinicamente junto ao paciente.
Minha meta foi escrever um livro razoavelmente compreensível, com capítulos de
fácil memorização, sem ser exaustivo, mas que auxiliasse a execução da hipnose na
prática diária.
Em várias condições clínicas explicito muitas opções de fraseologias para serem
transmitidas ao paciente com o objetivo de proporcionar aos iniciantes modelos a
partir dos quais eles possam desenvolver seus próprios estilos para cada condição
clínica, especificamente adaptados à realidade de cada paciente. Algumas vezes, a
preferência é propiciar alternativas para que o estudante faça a sua escolha. O
especialista experiente cria a fraseologia a partir da história clínica e dos aspectos
psicológicos de cada paciente e vai desenvolvendo-a durante a hipnose de acordo
com as respostas do próprio paciente.
No Capítulo (8) sobre facilitar a hipnose, sugestionabilidade e suscetibilidade,
há um enfoque com opiniões divergentes sobre a existência ou não de um estado
especial denominado estado hipnótico ou estado de transe hipnótico ou condição
hipnótica ou simplesmente hipnose.
Nos Capítulos relacionados à hipnose para dormir bem (22), terapia por meio da
auto-hipnose (25), hipnoterapia para permanecer afastado das bebidas alcoólicas
(27), e técnicas de reprogramação mental para tornar-se e permanecer esbelto (29),
há instruções detalhadas para elaboração de fita gravada ou disco compacto (CD),
especialmente para o paciente que está diante de você. Muitas vezes, o tratamento pela
hipnose é seguido com auto-hipnose, por meio de uma fita gravada personalizada,
que o paciente recebe para executá-la diariamente em sua residência. Incluo ainda,
nos Capítulos (4) e (27), considerações sobre aspectos da sugestão subliminar, cujas
XII
© Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA.
palavras e frases podem ser algumas vezes acrescentadas a uma fita gravada de
forma artesanal com fraseologia hipnótica. Nos Capítulos (27) e (29) apresento
aspectos de como elaborar uma fita gravada com dupla voz.
Meu contato inicial com a hipnose aconteceu durante minha primeira década de
vida, formalmente, quando assistia aos vários espetáculos de mágicos e ilusionistas
que incluíam apresentações de hipnose nos seus programas. Aos 13 anos de idade,
tínhamos nossa própria companhia, denominada Quarteto Mágico, que também
incluía na apresentação números de hipnose e de mnemotecnia. Nessa época, 1958,
tive a oportunidade de adquirir meu primeiro livro sobre hipnose, Hypnotism and the
power within, escrito pelo médico australiano S.J. Van Pelt, e traduzido para o
espanhol com o título VD. y el hipnotismo. Em 1961, fiz o Curso de Hipnotismo do
Instituto Haim, de Porto Alegre, cujo grande mérito foi deixar-me totalmente
confiante para sua prática. Em 1963, entrei para o curso médico da Faculdade de
Medicina da Universidade Federal do Paraná. Durante os seis anos de graduação
tive a oportunidade freqüente de exercitar a hipnose objetivando minorar o
sofrimento dos pacientes ou aumentar a capacidade de aprendizado para estudantes
que iriam prestar o exame vestibular. Em 1969, tive a oportunidade de aprender
eletroencefalografia no Departamento de Neurologia do Hospital de Clínicas da
Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, USP,
o que favoreceu, posteriormente, a sua aplicação em alguns pacientes hipnotizados.
Na década de 1970, durante os anos que passei no Instituto de Neurologia da
Universidade de Londres, no The National Hospital Queen Square, paralelamente
ao estudo da neurologia, procurei conhecer as informações sobre hipnose médica
que circulavam na Inglaterra.
Os temas são apresentados de diferentes maneiras nos diversos capítulos,
objetivando o mais fácil aprendizado, isto é, a assimilação de informações com
raciocínio crítico para suas aplicações com sabedoria e criatividade, relacionada a
outros conhecimentos, possibilitando ao hipnólogo exercer sua especialidade com
eficiência. Determinados assuntos e fraseologias reaparecem mais de uma vez na
seqüência dos capítulos.
A meta de Hipnose na Prática Clínica é proporcionar informações essenciais e
orientar os procedimentos dos estudantes interessados pela hipnose diante dos
pacientes, porém a melhor maneira para adquirir experiência no tratamento dos
pacientes pela hipnose é praticando-a.
Espero que a leitura de Hipnose na Prática Clínica seja agradável, proveitosa,
favoreça a criatividade, a prática e estimule a pesquisa.
Curitiba, inverno de 2003
Marlus Vinicius Costa Ferreira
XIII
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SumÆrio
1 Hipnose na Vida Diária, 1
2 Modelos Conceituais e Natureza da Hipnose, 7
3 Características do Paciente Hipnotizado, 47
4 Comunicação Sugestiva — Tipos de Sugestões, 65
5 Defesas, Medos e Conceitos Errados sobre a Hipnose, 115
6 Aspectos da Comunicação Hipnólogo-Paciente-Hipnólogo, 131
7 Preparação do Paciente para o Tratamento pela Hipnose, 139
8 Facilitar a Hipnose, Sugestionabilidade e Suscetibilidade, 161
9 Perguntas e Respostas Relacionadas com a Hipnose, 179
10 Efeitos Secundários Adversos e Complicações do Uso Clínico da Hipnose, 203
11 Vamos Começar a Hipnose (Ajuste a Indução Hipnótica ao Paciente), 213
12 Como Terminar a Consulta Deixando o Paciente Alerta, 253
13 Respostas Motoras, Amnésia e Hipermnésia, 261
14 Analgesia e Anestesia por Meio da Hipnose, 277
15 Dissociação, Ilusões, Alucinações e Distorção do Tempo, 305
16 Como Relembrar e Revivificar (“Regressão de Idade”), 313
17 Respostas Psicoplásicas, Ansiedade e Manejo de Algumas Condições Clínicas, 329
XIV
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18 Reprogramação Mental para a Superaprendizagem, 343
19 Hipnose para Aumentar a Autoconfiança e a Auto-estima, 361
20 Hipnose para o Progresso Individual, 373
21 Hipnose para Vencer a Depressão, 383
22 Hipnose para Dormir, 405
23 Hipnose no Tratamento da Enurese Noturna, Gagueira, Onicofagia, Chupar
os Dedos, Sudorese Excessiva no Corpo e Rosto Corado, 427
24 Eliminar Fobias, 437
25 Terapia pela Auto-hipnose, 451
26 Técnicas para Permanecer Longe do Tabagismo, 489
27 Hipnoterapia para Permanecer Afastado das Bebidas Alcoólicas, 519
28 Informações sobre Obesidade e como se Tornar e Permanecer Esbelto, 563
29 Técnicas de Reprogramação Mental para Tornar-se e Permanecer Esbelto. Como
Elaborar uma Fita Gravada ou um Disco Compacto (CD), 607
30 A Hipnose nos Transtornos de Estresse Pós-traumático, 649
31 Usuário Patológico da Internet, 659
32 Ser um Vencedor em Competições, 665
33 Hipnose em Pacientes Hospitalizados, 675
34 Aspectos da Hipnose em Odontologia, 695
35 Técnicasde Psicoterapia com Hipnose (Hipnoterapia), 703
36 Anexo A – Registro das Observações sobre o Paciente, 715
37 Anexo B – Aprender a Estudar, a Fazer um Exame ou uma Prova, 721
38 Anexo C – Hipnose para Dormir, 725
39 Anexo D – Permanecer Respirando Ar Puro, 729
40 Anexo E – Permanecer Afastado de Bebidas Alcoólicas, 735
41 Anexo F – Tornar-se e Permanecer Esbelto, 739
42 Anexo G – Superando o Diabetes Melito, 749
Índice Remissivo, 757
CAP˝TULO 1 1
CAP˝TULOCAP˝TULO
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As manifestações da hipnose ocorrem na
vida diária sem que a maioria das pessoas
perceba. Quando assistimos a um filme no
cinema ou na televisão e estamos realmente
gostando, nós nos emocionamos com as ce-
nas do filme. Podemos rir, chorar, ficar re-
voltados ou alegres com determinadas cenas.
A freqüência cardíaca pode aumentar em
determinadas seqüências do filme; em ou-
tras pode ocorrer sudorese nas mãos, redu-
ção do ritmo respiratório. Nesses momentos
em que nossa atenção está focalizada nas
cenas (sugestões visuais, verbais, extraver-
bais, subliminares), respondemos a elas se-
gundo nossa imaginação, segundo o conteú-
do das próprias cenas e segundo nossas ex-
periências passadas (estamos hipnotizados).
Durante essas cenas nosso juízo crítico dei-
xa de analisar se estão passando 24 quadri-
nhos por minuto na tela, ou se a resolução da
imagem é de 240, 336, 425, 724 ou até 1.000
linhas horizontais no monitor da TV de alta
definição, ou se as cenas foram feitas com
miniaturas dentro de um computador, ou se
outras pessoas estão conversando. Não fi-
camos pensando que é apenas um conto, nós
nos envolvemos com as cenas, sentimos as
cenas com todos os nossos sentidos, e mui-
tas vezes deixamos de ouvir ou de prestar a
atenção num barulho estranho ao filme como
o som da campainha da nossa residência.
Quando estamos interessados na leitura
de um determinado livro, reagimos emocio-
nalmente às descrições das situações inte-
ressantes sem estarmos analisando critica-
mente o tamanho das letras, a ortografia, fa-
lhas na impressão ou se uma letra está com
a impressão mais fina do que a outra. Desse
modo, limitamos a nossa atenção visual ao
conteúdo do que estamos lendo e somos auto-
hipnotizados. Quando estamos ouvindo com
entusiasmo uma música de nossa preferên-
cia, permanecemos sem analisar criticamente
a afinação do cantor ou a performance da
orquestra. Essencialmente, concentramos a
nossa atenção no som musical, permitindo
que a música entre em nossa mente e em
nosso corpo, e até podemos ser hipnotiza-
Hipnose na
Vida DiÆria
2 CAP˝TULO 1
© Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA.
dos pela música, a qual pode nos fazer recor-
dar de um acontecimento passado, ocorrendo
uma relembrança ou mesmo revivificação.
Por outro lado, as manifestações da hip-
nose apresentam-se como atos não do cons-
ciente, mas sim do subconsciente, como
aquelas experiências que aprendemos no
passado e ficaram gravadas no nosso cére-
bro, e no presente instante não estão consci-
entes, mas que podem ser acessadas quando
necessitarmos. As manifestações da hipno-
se podem também brotar das aferências ar-
mazenadas no subconsciente, mesmo que
tenham ido para o subconsciente aparente-
mente sem a percepção e o criticismo do
consciente. Quando estamos dirigindo nos-
so carro de casa para o trabalho, prestamos
atenção consciente ao trânsito, contudo, a
direção do carro é realizada em nível sub-
consciente. Nós não ficamos conscientemente
engatando as marchas e pisando no freio.
Assim mesmo, enquanto dirigimos o veículo
prestando atenção ao trânsito, uma série de
estímulos chega ao nosso cérebro sem tornar-
se consciente nesse exato momento e pode
ser armazenada em algum lugar do encéfalo.
Quando uma pessoa está aprendendo a
dançar, presta atenção ao compasso musical,
presta atenção na sua posição do corpo, olha
para os pés para saber onde irá posicioná-
los. Enfim, procura seguir o professor ou o
seu par. Essa fase pode ser comparada às
sugestões que o médico formula ao paciente
durante o tratamento pela hipnose. Posterior-
mente, quando a pessoa já sabe dançar, sim-
plesmente ouve a música, deixa-a entrar pelo
seu corpo e sai dançando automaticamente.
Analogamente, corresponde ao tratamento
bem-sucedido pela hipnose quando, por
exemplo, o paciente reprogramou seu modo
de alimentar-se para tornar-se e permanecer
esbelto; quando, por meio da hipnose, am-
pliou sua capacidade de aprender e relembrar
o aprendido ou eliminou uma fobia.
Desde o nascimento vamos acumulando
informações e experiências com conteúdo
emocional, algumas poucas estão no nosso
consciente no momento presente, mas a mai-
oria está no disco rígido de nosso compu-
tador mental, chamado encéfalo. Isto é, na
nossa memória subconsciente que se arma-
zena em vários locais no nosso encéfalo, es-
pecialmente nas estruturas do hipocampo,
para-hipocampo e sistema límbico ou talvez
simultaneamente em vários locais e circui-
tos neurais do sistema nervoso central. Al-
gumas dessas experiências armazenadas no
subconsciente com conteúdo emocional trau-
mático para o consciente são mantidas no
subconsciente pelo senso crítico de nosso
consciente. Mas, mesmo do subconsciente,
podem causar problemas para a nossa vida
consciente. É possível que durante uma via-
gem de turismo, uma paisagem visualizada
acesse algumas dessas experiências traumá-
ticas, tornando-as conscientes, facilitando a
resolução de problemas conscientes. Por
meio da hipnose podemos ter acesso direcio-
nado para essas experiências armazenadas no
subconsciente, e podemos trazê-las para o
consciente com diversas técnicas de hipno-
terapia como análise de sonhos, escrita auto-
mática, relembrança e revivificação. Muito
embora essas experiências passadas possam
não brotar exatamente do mesmo modo como
aconteceram, as cargas emocionais associa-
das a elas podem facilitar o tratamento.
Durante uma conferência ou uma aula,
quando o aluno se interessa pela matéria e o
professor é habilidoso, o aluno permanece
com sua atenção tão focalizada e limitada
ao assunto (hipnotizado) que os ensinamen-
tos são gravados no seu subconsciente e mes-
mo no seu consciente. Ao terminar a confe-
rência ou a aula, o aluno sai satisfeito com
os ensinamentos compreendidos, sendo ca-
paz de lembrá-los durante uma prova (res-
postas positivas às sugestões de ensino). Al-
CAP˝TULO 1 3
© Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA.
ternativamente, quando o professor é chato,
fala baixinho e apenas lê os diapositivos
projetados, o aluno não se interessa pela
matéria e se distrai com qualquer coisa (não
há focalização da atenção, nem hipnose), e,
conseqüentemente, não há adequado apren-
dizado. Muito provavelmente o aluno será
incapaz de lembrar durante uma prova, nem
para o seu proveito durante a sua vida, o que
esse professor tentou transmitir.
Na vida cotidiana, uma mãe que ama seu
filho, durante à noite dorme um sono pro-
fundo, sem ser despertada pelo som da tele-
visão, por trovões de uma tempestade, pelo
bater de portas. Contudo, o choro do seu fi-
lho acorda a mãe (há uma ligação emocio-
nal entre as características do choro do filho
e a mãe). Comparativamente, durante a hip-
nose o paciente está atento às sugestões ver-
bais (palavras) ou não-verbais do hipnólogo,
deixando de se importar com o que se passa
em torno.
Enquanto o presidente de uma empresa
está discursando numa reunião da diretoria,
algumas vezes um diretor — muito embora,
aparentemente, esteja ouvindo a exposição
do presidente — permanece durante todo o
tempo batendo ritmicamente com a ponta do
pé direito sobre o tapete, sem perceber o que
está fazendo. O diretor está executando um
movimento automático. O seu pé e seu mem-
bro inferior direito movimentam-se automa-
ticamente, como que dissociados do restan-
te do corpo.
Numcurso interativo de aperfeiçoamen-
to destinado para funcionários já especia-
lizados de uma firma, alguns deles encon-
tram-se rabiscando o papel com uma caneta,
embora estejam atentos ao desenvolvimen-
to do curso. A mão desses funcionários apa-
rentemente escreve automaticamente como
se estivesse dissociada do corpo, como ocorre
durante a técnica da escrita automática na
hipnoterapia.
Em Brasília, durante uma reunião do pre-
sidente da República com os seus ministros,
convocada para criar diretrizes para aumen-
tar as exportações, o presidente comunica
enfaticamente ao ministro das Relações Ex-
teriores que está concentrado nas palavras
do chefe da nação, a necessidade de dizer a
todos que o lema é exportar ou morrer. O
ministro das Relações Exteriores aceita e
acredita nessa idéia porque o seu objetivo
também é exportar cada vez mais. Ao sair
da reunião, ao ser entrevistado por uma emis-
sora de televisão, comunica a imprensa a fra-
se de efeito “exportar ou morrer”. O mesmo
ocorre quando um paciente atento às pala-
vras do hipnólogo recebe uma sugestão pós-
hipnótica que está de acordo com as suas
idéias. Posteriormente, o paciente cumprirá
a sugestão.
O aprendizado das crianças é enorme-
mente influenciado pela maneira como são
ensinadas, especialmente pelos pais e tam-
bém pelos educadores. Frases repetidas cons-
tantemente, como “você precisa comer, coma
tudo que está no seu prato”, geralmente as-
sociadas às sugestões táteis e à sugestão pela
atitude dos pais, ficam gravadas no subcons-
ciente da criança. Na idade adulta essas
idéias podem desencadear uma vontade de-
senfreada pela alimentação constante, faci-
litando o desenvolvimento do excesso de
peso e da obesidade. Muitas das dificulda-
des na vida advêm do subconsciente estar
armazenando informações erradas, negativas
e experiências de fracasso.
Muitas sugestões indiretas ocorrem no co-
tidiano e conduzem a respostas similares às
ocorridas durante a hipnose formal. Quantas
vezes estamos passeando num shopping
center com o desejo de adquirir alguma peça
para o vestuário quando, passando pela frente
de uma lanchonete, sentimos o odor do café
(sugestão sensorial olfativa indireta) e somos
levados a entrar e saborear um cafezinho.
4 CAP˝TULO 1
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Uma sugestão direta aplicada na hora
certa com palavras corretas e poderosas, com
tom emocional adequado ao contexto, pode
fazer uma multidão mover-se imediatamen-
te sem que as pessoas parem para raciocinar
e optar pela melhor alternativa de compor-
tamento. Isto ocorre quando num cinema
durante a exibição de um filme alguém gri-
ta: “Fogo! Está pegando fogo!”
Quantas vezes ao tirarmos uma roupa des-
cobrimos que nos arranhamos num braço ou
numa extremidade do corpo, sendo que no
momento do arranhão nada sentimos (está-
vamos com a atenção concentrada em ou-
tras coisas), estávamos anestesiados.
Algumas vezes, quando estamos com
muita vontade de comer algum alimento que
apreciamos muito, como uma laranja, sim-
plesmente imaginamos essa fruta e nos
visualizamos descascando a laranja e colo-
cando um pedaço dentro da boca. Imedia-
tamente começamos a salivar, sentimos na
boca o gosto de laranja e percebemos o odor
desta. Essas percepções sem objeto seriam
como se estivéssemos facilitando o surgi-
mento de alucinações visuais, olfativas e
gustativas.
Na televisão, os anúncios de produtos e
serviços são cuidadosamente preparados e
repetidos várias vezes para influenciar as
pessoas-alvo. Muitas vezes deixam de mos-
trar os aspectos técnicos e operacionais para
criar um clima emocional de sucesso, rique-
za e prazer que são associados à marca anun-
ciada. A propaganda escolhe e associa as
imagens do que está sendo anunciado com
pessoas adequadas, com tom de voz adequa-
do, com música de fundo, e, algumas vezes
incluindo sugestões subliminares, de modo
a deixar o cliente em potencial com interes-
se pelo produto (como que hipnotizado).
Quantas vezes uma pessoa que usa ócu-
los fica procurando seus óculos em vários
lugares, e depois de algum tempo percebe
que eles estão justamente no local que deve-
riam estar, sobre seus olhos. A pessoa até
encontrá-los apresentava uma ilusão negati-
va visual e tátil, pois não percebia pela visão
nem pela sensibilidade tátil os óculos.
A sensação ou sentido do tempo pode ser
percebida de modo expandido ou concentra-
do nos acontecimentos cotidianos. Por exem-
plo, quando estamos assistindo a uma parti-
da de futebol entre Coritiba e Atlético Para-
naense, dois times que disputam o campeo-
nato brasileiro. O primeiro está vencendo por
2 x 1 e estamos nos 42 minutos do segundo
tempo. Os torcedores do Coritiba têm a sen-
sação de que os três minutos finais demo-
ram muito a passar, parecendo uma eterni-
dade, isto é, têm sensação de tempo expan-
dido. Por outro lado, os torcedores do Atlé-
tico têm a sensação de que os mesmos três
minutos finais passam muito rapidamente,
parecendo passar num relâmpago, isto é, têm
a sensação de tempo concentrado. Durante a
hipnose pode-se utilizar a sensação de ex-
pansão do tempo para permitir que aconte-
cimentos agradáveis “demorem” para pas-
sar e o paciente possa curtir esse tempo de
alegria, sucesso e felicidade. A sensação de
contração do tempo é empregada para fazer
“passar mais depressa” os acontecimentos
desagradáveis.
Durante atividades muitas vezes cotidia-
nas, as pessoas podem entrar em hipnose sem
que nenhuma sugestão verbal seja pronun-
ciada: simplesmente dirigindo um veículo
numa estrada com longas retas ou numa auto-
estrada; outras vezes simplesmente assistin-
do a um programa na televisão.
Nos intervalos de um trabalho ou de um
estudo, uma pessoa pode perceber e ouvir
nitidamente uma música que aprecia muito,
sem nenhum aparente estímulo externo; ou
pode ser estimulada pela imagem da capa de
um CD deixado sobre a mesa, com o nome
dessa música visível, a começar a escutar
CAP˝TULO 1 5
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essa música. Outra pessoa, estando em casa
descansando, ocasionalmente ao ver uma fo-
tografia tirada de uma festa que participou
durante as férias em um outro país, pode ser
capaz de conseguir perceber vivamente as
imagens dela na festa, dançando com deter-
minada pessoa, como se tudo estivesse ocor-
rendo neste momento. Uma pessoa cami-
nhando na rua ao passar pele frente de uma
banca que vende frutas pode sentir o gosto
da fruta de sua preferência na boca, e inclu-
sive salivar.
A hipnose na vida diária ocorre mais fre-
qüentemente do que imaginamos, e contribui
para a compreensão de que não é necessária
a indução formal para obtermos a hipnose.
No consultório do profissional médico,
odontólogo ou psicólogo, faz-se a indução
formal da hipnose para obtê-la no momento
desejado e com finalidades específicas.
6 CAP˝TULO 1
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CAP˝TULO 2 7
CAP˝TULOCAP˝TULO
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Modelos Conceituais e
Natureza da Hipnose
O conceito de hipnose e as tentativas para
explicar o que exatamente ocorre durante a
hipnose variam com o passar do tempo. Cada
cultura tem usado a hipnose de uma forma ou
de outra, e tem passado seus conhecimentos
adiante para outras culturas. A base funda-
mental da comunicação hipnótica é a suges-
tão sob suas diferentes formas e diferentes
aspectos. A prática do que hoje chamamos
hipnose ou hipnotismo vem da mais remota
antigüidade. A evidência mais primitiva da
existência da hipnose foi encontrada entre os
xamãs,1 que eram também referidos como
“doutores bruxos”, “homens de medicina”, ou
“curadores”. Os xamãs, que são quase sem-
pre homens, usaram (e seus remanescentes
ainda usam) muitas técnicas de visualização
para curar seus pacientes ou para amaldiçoar
seus inimigos. Há ainda alguns remanescen-
tes xamãsna África, Lappland, Havaí, ao lon-
go do Alto Amazonas na América do Sul, nos
primitivos da Austrália e mesmo entre índios
norte-americanos.2 Para o antropólogo
Michael Harner que pratica a cura xamânica
desde 1961, e que recebeu o doutorado da Uni-
versidade de Kerkeley, a palavra shaman, na
língua original da tribo Tungus da Sibéria,
refere-se a uma pessoa que faz a viagem para
a realidade não ordinária, num estado altera-
do de consciência.3 Para Mircea Eliade, xama-
nismo é a técnica de êxtase.4 Os xamãs alcan-
çavam o estado alterado de consciência de
várias maneiras, incluindo cantos, sons pro-
duzidos por tambores, movimentos do corpo,
danças e plantas psicoativas.
Há 2400 a.C. sacerdotes caldeus já eram
tidos como capazes de transmitir fluidos por
meio de passes, que colocavam em transe os
sofredores.5 O hipnotismo foi a base das ciên-
cias ocultas no antigo Egito, na Grécia e na
Índia. As manifestações da hipnose eram
consideradas como “milagres” com que os
feiticeiros, bruxos ou sacerdotes pagãos, di-
zendo-se mensageiros dos deuses, empolga-
vam o povo.6
No antigo Egito, que absorveu os conhe-
cimentos dos Caldeus, nos chamados tem-
plos do sono, os enfermos eram pacientes de
8 CAP˝TULO 2
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sugestões terapêuticas e passes mágicos. Um
papiro dessa época (1552 a.C.), o papiro de
Tebas (onde hoje se localiza a cidade de
Luxor) e, portanto, com mais de 3.550 anos,
conta técnicas de hipnose muito semelhantes
às empregadas atualmente.7 Esse papiro, des-
coberto por Ebers e traduzido em 1860 por
Chabas, é o mais completo registro conheci-
do da medicina egípcia, está na biblioteca da
Universidade de Leipzig. Um baixo-relevo
encontrado num sarcófago de Tebas mostra
um sacerdote em pleno ato de indução hipnó-
tica de um paciente.5 Este baixo-relevo ainda
hoje pode ser visto no Museu Britânico, em
Londres. Na Grécia no templo de Esculápio,
o deus grego da medicina, os sacerdotes usa-
vam processos semelhantes, invocando a pre-
sença daquela divindade para colocar os do-
entes em transe hipnótico. Na Índia, também
são conhecidas manifestações do hipnotismo
que chegaram aos nossos dias pelos Yogas.
No século X o persa, de origem árabe,
Abu-Ali-Hussain Ben Abdallah Ibn-Sina
(Avicena 980 a 1036),8 que era filósofo e
médico, foi o verdadeiro precursor da refle-
xologia pavloviana. Ele achava que a imagi-
nação humana tinha poderes e forças, que
podiam atuar não só sobre o seu próprio corpo,
como também sobre o funcionamento corpo-
ral de outras pessoas.8 Avicena afirmava que
pela palavra, pela vontade e pela persuasão
muitos padecimentos poderiam ser curados.
No seu excelente livro Aplicações clíni-
cas da sugestão e da hipnose em 1958,
William T. Heron dizia que “a hipnose é e
deve ser considerada como um fenômeno
psicológico natural, e o papel do hipnotista
é, simplesmente, o de um instrutor ou pro-
fessor que auxilia o paciente a realizar o es-
tado de hipnose”9 (p.51).
A existência de muitas teorias indica que
a natureza real da hipnose é desconhecida.
Os modelos conceituais sobre a hipnose vão
aparecendo e modificando-se com a evolu-
ção do mundo, e vão permitindo seu melhor
entendimento e utilização. Na explanação dos
modelos conceituais, os anos mais importan-
tes no desenvolvimento de cada teoria estão
seguindo o nome do autor.
PRINCIPAIS MODELOS CONCEITUAIS
SOBRE A HIPNOSE E A SUA NATUREZA
1. Tratamento pelo ímã (Paracelso)
2. Magnetismo animal (Franz A. Mesmer)
3. Sonambulismo artificial (Armand M.
J. de Chastenet, Marquês de Puységur)
4. Sono lúcido (José C. de Faria)
5. Hipnotismo (James Braid)
6. Sugestionabilidade aumentada (Esco-
la de Nancy)
7. Escola da Reflexologia (Ivan P. Pav-
lov e sua escola)
8. Comportamento dirigido (Robert W.
White)
9. Fenômeno psicossomático (Lewis R.
Wolberg)
10. Superconcentração da mente (Sydney
J. Van Pelt)
11. Exclusão psíquica relativa (Raphael
H. Rhodes)
12. Desempenho de um papel (Theodore
R. Sarbin e William C. Coe)
13. Estado emocional intensificado (Ga-
lina Solovey e Anatol Milechnin)
14. Regressão atávica (Ainslie Meares)
15. Psicoplasia acrescentada pela concen-
tração total da mente (Marcelo Lerner)
16. Teoria da neodissociação (Ernest R.
Hilgard)
17. Teoria do controle dissociado (Ken-
neth S. Bowers)
18. Estado particular da mente (John
Hartland)
19. Estado de consentimento (David L.
Scott)
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20. Regressão psicológica topográfica
(Michael R. Nash)
21. Estado alterado de consciência (Char-
les T. Tart e Erika Fromm)
22. Comportamento cognitivo (Theodore
X. Barber)
23. Modelo sociocognitivo (Nicholas P.
Spanos)
24. Hipnose como obediência e crença
(Graham F. Wagstaff)
25. Teoria do aprendizado social (Irving
Kirsch)
26. Modelo social-psicobiológico (Éva I.
Bányai)
27. Relaxamento hipnótico (William E.
Edmonston Jr.)
28. Sistema de comunicação influencia-
da (Michael D. Yapko)
29. Abordagem interativa centrada no pa-
ciente (Milton H. Erickson)
30. Modelo integrado de hipnose (Steven
J. Lynn e Judith W. Rhue)
31. Perspectiva do ecossistema aplicada
à hipnose (David P. Fourie)
32. Hipnose como compromisso cogniti-
vo motivado (Peter W. Sheehan)
33. Paradigma multidimensional (Theo-
dore X. Barber)
TRATAMENTO PELO ÍMÃ (PARACELSO —
1529)
Philippe Bombast von Hohenheim (Para-
celso) era médico e filósofo suíço, viveu de
1493 a 1541, e considerava que todos os se-
res humanos estavam sobre a ação do influ-
xo sideromagnético dos astros.5 Para ele,
considerado o pai da medicina hermética, o
corpo humano se comportava como um ver-
dadeiro ímã, que podia atrair o fluxo dos
astros e absorvê-lo, bem como assimilar ou
eliminar os elementos terrestres. O pólo norte
do corpo humano corresponderia aos pés e o
pólo sul aos genitais. Ele empregava mine-
rais magnéticos para o tratamento das doen-
ças e relatava várias curas. Em virtude das
suas idéias Paracelso foi perseguido, tendo
que ir de uma cidade para a outra.
MAGNETISMO ANIMAL (FRANZ A.
MESMER — 1776, 1779)
Franciscus Antonius Mesmer, conhecido
como Franz Anton Mesmer nasceu em 23 de
maio de 1734 em Iznang, junto ao lago
Constança, pertencente à Áustria, que em
1805, por meio de um tratado, passou a fazer
parte do território alemão.5, 8 Mesmer fez es-
tudos de filosofia, teologia e, em 1759, estu-
dou jurisprudência. Depois fez o curso de
medicina na universidade de Viena, forman-
do-se com 32 anos de idade em 1766, com a
apresentação da tese Dissertatio Physico-
Medica de Planetarum Influxu (Dissertação
Físico-médica sobre a Influência dos Plane-
tas). Sua tese considerava que um “fluido su-
til” unia todos os corpos do universo, fazendo
com que uns atuassem sobre os outros. Os
astros, principalmente o sol e a lua, exerciam
influência sobre os homens. O fluido emana-
do pelos astros teria a capacidade de ser cap-
tado e armazenado nos metais especiais, e pela
sua analogia com as propriedades do ímã, foi
chamado de magnetismo animal. O padre je-
suíta Maximillian Hehl (1720-1792), interes-
sado em magnetismo, e astrônomo real para a
corte da Áustria, tomou conhecimento da tese
de Mesmer e fez alguns ímãs nas formas dos
órgãos, que estavam destinados a curar.10 O
padre Hehl ou Hell como muitos grifam (que
em alemão significa luz), conta isso ao seu
amigo Mesmer, que pede ao padre para con-
feccionar alguns ímãs e começa a fazer expe-
riências conseguindo bons resultados. Inici-
almente Mesmer usou placas imantadas
condensadoras e condutoras de “fluido mag-
nético” para a cura de pessoas. Mais tarde,
10 CAP˝TULO 2
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Mesmer chegou à conclusão de que as pla-
cas imantadas eram um intermediário inútil,
porque o corpo humano sendo um depósito
natural do “fluido”seria o agente por exce-
lência atuando sobre outros corpos. Em 1777
tratou uma jovem de 18 anos de idade cha-
mada Maria Thereza Paradis, pianista preco-
ce, que havia subitamente perdido a visão des-
de os três anos de idade, e já havia consultado
eminentes médicos da época. Mesmer, consi-
derando a necessidade de um rapport ade-
quado, transferiu-a para a sua própria clínica.
Com o tratamento a paciente começou a en-
xergar, e Mesmer afirmou que ia levá-la para
a Imperatriz (que era madrinha da paciente) a
fim de demonstrar a cura. Contudo, isso des-
pertou a indignação da conservadora socie-
dade médica vienense, que procurou os pais
da paciente afirmando não acreditar que ela
estava enxergando, e que se isso fosse verda-
deiro ela perderia a pensão que recebia por
ser excelente pianista cega. Se voltasse a ver
seria simplesmente mais uma pianista. Desse
modo, convenceram os pais da paciente a
entrar na clínica de Mesmer para retirá-la, à
força. Como resultado desse episódio Maria
Thereza teve uma recaída, perdeu novamen-
te a visão e Mesmer foi convidado a encerrar
sua prática médica ou deixar Viena. Mesmer
foi para Paris e, em fevereiro de 1778, insta-
lou o consultório na Place Vendôme e lá idea-
lizou um aparelho denominado “Baquet” (tina).
O “Baquet” era uma caixa de madeira circu-
lar, cheia de limalha de ferro. Sobre a limalha
estavam garrafas com água “magnetizada”,
que se comunicavam entre si. Do interior da
caixa saíam hastes de ferro móveis as quais
os doentes aplicavam sobre a parte doente do
corpo. Ao redor desse aparelho reuniam-se
ao mesmo tempo 130 pessoas na penumbra e
com fundo musical de órgão. Nessas condi-
ções ideais de sugestão indireta, os doentes
eram acometidos de “convulsões terapêuti-
cas”. Na época de Mesmer os ímãs eram con-
siderados um mistério, e muitos acreditavam
que eles tinham grande poder. As pessoas da
época acreditavam nos ímãs e estavam con-
vencidas de que eles podiam produzir curas;
logo resultados eram esperados e resultados
eram produzidos. Mesmer publicou nova tese
em 1779, Mémoire sur la découvert du
magnétisme animal, modificando alguns con-
ceitos sobre o magnetismo animal. Agora,
Mesmer reconhecia no corpo humano proprie-
dades semelhantes às do ímã, tendo também
dois pólos opostos, e “a ação do fluido” ou
magnetismo animal, entre uns e outros cor-
pos animados e inanimados, sem a interven-
ção de intermediários. O “fluido”, muito em-
bora fosse universal, não existiria em igual
intensidade em todos os corpos, e naqueles
em que estivesse mal distribuído ou ausente,
ocorreriam as doenças. A função do magneti-
zador era fornecer o “fluido” necessário ao
órgão afetado, favorecendo o equilíbrio mais
harmônico do organismo. Em 1781 Mesmer
considerou a importância da relação entre o
magnetizador e o paciente, dizendo que o
magnetismo “devia em primeiro lugar ser
transmitido pelos sentimentos”.11 Em 1784
seus adversários persuadiram o rei Luís XVI
a nomear uma comissão constituída por cin-
co membros da Academia de Ciências, qua-
tro membros da Faculdade de Medicina e cin-
co membros da Sociedade Real de Medicina
da França, para analisar os trabalhos de
Mesmer. Essa comissão concluiu unanime-
mente que as curas eram decorrentes da ima-
ginação e da imitação. A comissão concluiu
que a imaginação sem magnetização produ-
zia as convulsões, e que o magnetismo sem
imaginação nada produzia.12,13 Como a ima-
ginação não era aceita pelos estudos científi-
cos da época, o magnetismo foi considerado
sem valor para ser comentado ou uma fraude
produzida por um charlatão. Um dos partici-
pantes da comissão, o eminente botânico
Antoine Laurent de Jussieu, escreveu que os
CAP˝TULO 2 11
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efeitos positivos do magnetismo não haviam
sido considerados e achou que a estimulação
da imaginação poderia ser terapêutica.14 Um
colega de Mesmer chamado Charles d’Eslon
reagiu contra o relatório da comissão afirmando
que a imaginação desempenha o maior papel
nos efeitos do mesmerismo, e que as forças
da imaginação poderiam ser um agente real
responsável pela eficácia do magnetismo ani-
mal.15 Com o resultado da comissão, a popu-
laridade de Mesmer caiu bastante e ele partiu
para a Inglaterra, depois para a Alemanha,
voltando a Paris em 1801. Em 1803 foi para
Frauenfeld perto do lago Constança na Suíça.
Em 5 de março de 1815 ele morre em
Meersburg na Suíça.
SONAMBULISMO ARTIFICIAL (MARQUÊS
DE PUYSÉGUR — 1784)
Um discípulo de Mesmer chamado Mar-
quês Puységur (Armand Marie Jacques de
Chastenet) tratando separadamente um pa-
ciente de 23 anos de idade de nome Victor
Race, em 1784, observou que ao invés de o
mesmo apresentar convulsões como ocorria
com os pacientes de Mesmer, ele dormia tran-
qüilamente e durante esse sono podia falar,
responder ordens, e após ser acordado não
lembrava de nada.5,8 Então denominou esse
estado de sonambulismo artificial por analogia
ao sonambulismo do sono fisiológico. O Mar-
quês de Puységur também enfatizou a idéia
de que os fenômenos do magnetismo ocorri-
am mais provavelmente em certas condições,
que ele denominou “rapport exclusivo” entre
o hipnotista e a pessoa hipnotizada.
SONO LÚCIDO (JOSÉ CUSTÓDIO DE FARIA
— 1813)
Um sacerdote português de nome José
Custódio de Faria (1756-1819), nascido em
Condolim de Bardez (Goa), Índia Portugue-
sa, chegou em Paris por volta de 1813, e con-
siderava que não podia haver influência de
um “fluido” nas experiências do Marquês de
Puységur. Para o abade Faria era a vontade
do paciente que conduzia ao que chamava
de “sono lúcido”.16 Faria foi o primeiro a
afirmar que a vontade receptiva do paciente
e o rapport entre o paciente e o magnetizador
determinavam a formação do processo de
cura.6
Em 1826, Simon Mialle publicou um livro
relacionando grande variedade de desordens
orgânicas e mentais, em ordem alfabética,
nas quais o magnetismo animal havia sido em-
pregado com êxito, e apresentando uma refe-
rência à nomenclatura baseada no prefixo
hypn- que dá origem às palavras hipnose e
hipnotismo.17 Essa terminologia já existia nos
dicionários franceses.
HIPNOTISMO (JAMES BRAID — 1843)
Com James Braid (1795-1860), nascido
em Fifeshire na Escócia, adepto do ocultis-
mo, médico oftalmologista e cirurgião de
Manchester, Inglaterra, apareceram os pri-
meiros conceitos científicos sobre o hipno-
tismo. Braid estava inclinado a juntar-se
àqueles que consideravam o magnetismo
animal como sendo um sistema de coopera-
ção secreta ilegal e prejudicial ou uma ilu-
são, ou de imaginação exaltada, simpatia ou
imitação.18 Ele foi assistir pela primeira vez
às demonstrações de Lafontaine no dia 13
de novembro de 1841 e saiu com a mesma
impressão que entrou. Contudo, assistiu a
uma segunda demonstração seis dias depois
e o fato de o indivíduo não poder abrir as
pálpebras lhe chamou a atenção.18 Braid
achou que aí estava a causa do fenômeno, e
ao voltar para casa fez experiências com a
sua esposa, um amigo e um criado.8,10,17,18
12 CAP˝TULO 2
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Pediu para que olhassem fixamente um de-
terminado ponto brilhante até que seus olhos
se entregassem extenuados ao repouso. A
partir desse momento teve em suas mãos
essas pessoas “magnetizadas”. As primeiras
conclusões de James Braid foram: (a) o fenô-
meno do mesmerismo era puramente subje-
tivo e não dependia de qualquer poder má-
gico, de nenhuma influência astral, de qual-
quer fluido mineral ou animal, nem sequer
de qualquer influência da pessoa do opera-
dor; (b) esses fenômenos deviam-se exclu-
sivamente à natureza física, mecânica e fun-
cional, produzindo alterações nos órgãos dos
sentidos, especialmente na visão, levando a
um esgotamento do centro visual pela esti-
mulação continuada e monótona; (c) intro-
duziu o método de indução da fixação do
olhar, que ainda hoje pode ser utilizado,com
ou sem modificações.
Em 1843 Braid publica Neurypnology or
the rationale of nervous sleep no qual apa-
rece a primeira terminologia sobre o hipno-
tismo.18 Ele achava que o fenômeno era de-
vido a um tipo de sono nervoso e por isto
aplicou a palavra “Hipnose”. Muito embora
com James Braid a palavra hipnotismo te-
nha ficado consagrada, foi o francês Etienne
Felix d’Henin de Cuvillers,19 que aplicou 20
anos antes o prefixo hypn- para uma varie-
dade de palavras descritivas do processo de
Mesmer.
Mais tarde, Braid percebeu que a indução
da hipnose dependia da contribuição pessoal
do paciente, da sua concentração mental
numa idéia ou numa vontade, ou seja, de-
pendia do domínio de sua atenção. E ainda
Braid afirmava que uma vez obtida a hipno-
se poder-se-ia facilmente plantar idéias e
vontades no cérebro do paciente. A anestesia
obtida sob hipnose era devida a uma inibi-
ção de uma parte do cérebro do paciente.
Braid também achava que existiam acentua-
das diferenças no grau suscetibilidade de
diferentes indivíduos à influência hipnótica,
muitos tornando-se rápida e intensamente
afetados e outros lenta e discretamente afe-
tados. Em 1847 descobriu que os fenômenos
do hipnotismo, como catalepsia, anestesia e
amnésia e poderiam ser produzidos sem a
necessidade de a pessoa dormir.
Em abril de 1843 outro médico escocês,
John Elliotson, professor de cirurgia da Uni-
versidade de Londres, criou o primeiro jor-
nal para artigos de mesmerismo (hipnose) e
fisiologia cerebral denominado Zoist,5,8,10
publicado trimestralmente até 31 de dezem-
bro de 1855.
Em 1891 a Associação Médica Britânica
designou uma comissão para investigar a na-
tureza do fenômeno hipnótico, seu valor
como agente terapêutico e suas indicações.
O relatório da comissão foi apresentado em
1892, destacando: (a) estavam convencidos
dos fenômenos hipnóticos; (b) o termo, hip-
notismo, não traduz bem a natureza do fenô-
meno, já que este é diferente do sono fisio-
lógico; (c) a hipnose é um eficaz agente
terapêutico no alívio de dores, no tratamen-
to da embriaguez e na possibilidade de rea-
lização de atos cirúrgicos; (d) a hipnose deve
ser usada exclusivamente por médicos para
fins terapêuticos, somente em pacientes do
sexo masculino e quando em mulheres, ape-
nas na presença de familiares ou de pessoas
do mesmo sexo; (e) condena veementemen-
te quaisquer exibições recreativas, popula-
res e teatrais de hipnotismo.
SUGESTIONABILIDADE AUMENTADA
(ESCOLA DE NANCY — 1854-1890)
(AMBROISE A. LIÉBEAULT E HIPPOLYTE
BERNHEIM)
Os conceitos a seguir expostos foram de-
senvolvidos pela escola de Nancy, pelo gru-
po liderado pelo médico rural Ambroise
CAP˝TULO 2 13
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Auguste Liébeault (1823-1904), que utilizava
a fixação do olhar associada à sugestão ver-
bal, e pelo neurologista, professor da Univer-
sidade de Nancy, Hippolyte Bernheim (1840-
1919). O primeiro livro científico sobre hipno-
se, De la sugestion et de ses applications a
la therapeutique20 foi escrito por Bernheim,
em 1886. A sugestionabilidade segundo
Bernheim é a aptidão do cérebro de receber
ou evocar idéias e sua tendência a realizá-las
ou transformá-las em atos. Toda a idéia
sugerida tende a se transformar em ato, ou,
dito fisiologicamente, todo neurônio acionado
por uma idéia transmite impulsos para as fi-
bras nervosas eferentes, as quais conduzem
os impulsos para os órgãos que devem efetuar
o ato. Denominou-se isso lei do ideodinamis-
mo. Bernheim também afirmou que qualquer
fenômeno hipnótico poderia ser produzido pela
sugestão em vigília. Na época dessa teoria,
Bramwell considerava cinco os pontos princi-
pais:21 (1) Nada diferencia o sono natural do
sono artificial. (2) Os fenômenos hipnóticos
são análogos à maioria dos atos normais auto-
máticos, involuntários e inconscientes. (3) Uma
idéia tem tendência a gerar uma realidade. (4)
Na hipnose a tendência de aceitar as suges-
tões é algumas vezes aumentada pela ação
própria da sugestão. (5) O resultado da su-
gestão na hipnose é análogo ao resultado da
sugestão no estado normal.
Por volta de 1875 o neurologista Jean
Martin Charcot (1825-1935), que tratava pa-
cientes histéricos no hospital dela Salpêtrière
em Paris, deduzia que a hipnose era uma
manifestação histérica. E, ainda, que a hip-
nose era obtida essencialmente por meios
físicos, dando mínimo ou nenhum valor à
sugestão. É óbvio que foram dois enormes
erros desse famoso neurologista, que, segun-
do a história, nunca teria hipnotizado nin-
guém porque seus pacientes histéricos eram
preparados pelos seus assistentes. É de au-
toria de Charcot, em 1878, a teoria de três
estágios hipnóticos, sempre relacionados com
os pacientes com transtorno de conversão:6
(1) Catalepsia, produzida pela fixação do
olhar do paciente num foco luminoso forte,
ou pela súbita produção de um som como o
de um gongo ou diapasão. Na catalepsia,
havia rigidez nos membros que permaneci-
am na posição colocada pelo médico. Os
olhos estavam abertos. (2) Letargia, obtida
pelo fechamento dos olhos do paciente ou
pelo apagamento do foco luminoso. Na le-
targia havia surdez, mudez e hiperexcitação
neuromuscular. (3) Sonambulismo, obtido
pela simples pressão ou fricção no alto da
cabeça. A hiperexcitabilidade tornava-se
cutânea. Segundo Schnek22 os estádios des-
critos por Charcot não são inerentes à hip-
nose, nem há métodos específicos pelos quais
possam ser produzidos.
As observações da escola de Nancy, reu-
nidas por Nicolas, incluem:23
1. Jamais observaram os três estados, le-
targia, catalepsia e sonambulismo. A hipno-
se é a mesma quer com pacientes histéricos
quer com outros pacientes. As três fases
mencionadas não existem nem mesmo com
pacientes histéricos.
2. A histeria não é um bom terreno para
estudar o hipnotismo. Muitos dos sintomas
“histeriformes” (chamados hoje de conver-
são ou dissociativos), de origem emotiva ou
resultantes de auto-sugestão, misturam-se
aos fenômenos hipnóticos e para um obser-
vador inexperiente é difícil de separar.
3. O estado hipnótico não é uma neurose.
Os fenômenos que ocorrem na hipnose são
naturais e psicológicos, podendo ser obtidos
em muitas pessoas durante o sono natural.
4. Todos os procedimentos de hipnotiza-
ção se resumem na sugestão, e a sugestão é
a chave de todos os fenômenos hipnóticos.
A escola de Paris ou tão-somente chama-
da Escola da Salpêtrière, da qual faziam parte
nomes como Babinski, Binet, Fere, Jean Janet,
14 CAP˝TULO 2
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Richet, Gilles de la Tourete, com relação à hip-
nose jamais prosperou. Durante o II Congres-
so Internacional de Psicologia realizado em
Paris, Sidgwick, o presidente na seção de aber-
tura, reconhecia publicamente a vitória da es-
cola de Nancy.24 A Escola de Nancy expan-
diu-se e ficou mais fortalecida com nomes
como Emil Coué (1857-1926), um farmacêu-
tico que se tornou célebre com seu método de
auto-sugestão consciente,25 e sua célebre frase
“A cada dia, sob todos os aspectos, vou cada
vez melhor”. Para Coué não é a sugestão que o
hipnotizador faz que realiza alguma coisa, é a
sugestão que é aceita pela mente da pessoa.
Bernheim numa palestra proferida na
Universidade de Nancy em 12 de dezembro
de 1906 descreve três estágios mais impor-
tantes na história da hipnose até então. O
primeiro estágio, magnetismo animal elabo-
rado por Mesmer; o segundo, sono hipnóti-
co ou hipnotismo devido a Braid; o terceiro,
a teoria da sugestionalidade de Liebeault.
ESCOLA DA REFLEXOLOGIA (IVAN P.
PAVLOV E SUA ESCOLA — 1901,1904)
A doutrina da inibição e excitação cortical
para Ivan Petrovich Pavlov (1849-1935) rege
a atividade nervosa superior dos animais e
dos seres humanos e foi baseada em estudos
de neurofisiologia com cães. Ele começou a
trabalhar com os reflexos condicionados26
em 1901. As teorias de Pavlovsobre o hip-
notismo originaram-se de seus experimen-
tos com cães publicado no trabalho Sobre a
fisiologia no estado hipnótico do cão. Em
1904 Pavlov usou pela primeira vez os ter-
mos reflexos incondicionados e reflexos con-
dicionados.27 O reflexo incondicionado é
uma ligação nervosa permanente, entre um
excitante determinado, imutável e uma ação
bem definida do organismo. É um reflexo
inato, estável, imutável, característico da es-
pécie, que alguns estudiosos denominam ins-
tintos. Os reflexos condicionados são adqui-
ridos, temporários, ocasionais e constituem
uma característica do indivíduo, não da es-
pécie. Para o aparecimento do reflexo con-
dicionado é necessário que o excitante indi-
ferente preceda sempre o estímulo absoluto,
que haja coexistência de tempo entre os agen-
tes absoluto e o indiferente, que a ação seja
reforçada, e no momento do estabelecimen-
to do reflexo condicionado não haja nenhum
outro estímulo indiferente. Os reflexos con-
dicionados são responsáveis pela adaptação
do indivíduo ao seu meio ambiente.
Os estímulos podem ser exteroceptivos,
isto é, originados no meio ambiente (som, luz,
cheiro, pressão etc.), ou interoceptivos quan-
do originados dentro do próprio organismo.
Os estímulos são recebidos pelos receptores.
Pavlov introduz o conceito de analisador para
significar o conjunto formado pelo receptor,
vias aferentes e conexões centrais. Ele consi-
derava que a atividade nervosa superior ba-
seava-se em dois sistemas de sinalização: (1)
O primeiro sistema representado pelos refle-
xos condicionados. São os sinais que con-
dicionam respostas absolutas. (2) O segundo
sistema representado pelos conceitos conti-
dos nas palavras. A palavra contém um estí-
mulo sonoro (primeiro sistema de sinalização)
e um conteúdo de idéias e imagens (segundo
sistema de sinalização). Nos seres humanos,
os reflexos condicionados podem ser estabe-
lecidos a partir de um som, como também a
partir do conteúdo (mensagem) da palavra.
Nós podemos considerar não somente o con-
teúdo da palavra como representando o se-
gundo sistema de sinalização, mas também
estímulos táteis, térmicos, dolorosos, olfati-
vos, gustativos, cinestésicos, labirínticos,
interoceptivos, independentemente da respos-
ta condicionada da sensação tátil, da sensa-
ção de calor ou de frio, da sensação dolorosa
etc., podem transportar um conteúdo (mensa-
gem) específico para cada indivíduo. O me-
CAP˝TULO 2 15
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canismo do sono fisiológico para a escola
pavloviana é devido à inibição cortical, que
se propaga para centros do sono localizados
mais profundamente. O sono fisiológico se-
ria produzido pela soma de estímulos débeis,
monótonos, atuando durante um certo perío-
do de tempo, produzindo sobrecarga dos pro-
cessos (e vias) inibitórios levando ao espa-
lhamento da inibição. Poderia também ser
produzido por estímulos extremamente for-
tes, que ocasionariam uma inibição cortical
pela sobrecarga dos processos (e vias) ex-
citatórios. Pavlov, já na sua época, presumia
que os processos de excitação e de inibição
dependessem de substâncias químicas dife-
rentes (os neurotransmissores de hoje). As
diferentes funções do córtex cerebral são ca-
racterizadas por diferentes graus de excita-
ção e inibição em várias áreas, formando o
que Pavlov denominou mosaico cerebral.
O que ocorreria durante a hipnose segundo
os conceitos da escola pavloviana? Há um foco
excitatório inicial no córtex cerebral, que pode
estar relacionado com as áreas: auditiva, visu-
al, tátil ou cinestésica, dependendo dos estímu-
los usados. Com predominância de estímulos
auditivos, e pedindo ao paciente para que abra
e feche os olhos para produção de fadiga dos
músculos palpebrais, o arco reflexo condicio-
nado seria assim formado: Os analisadores au-
ditivos fi a área cortical auditiva fi zona
motora oculopalpebral subcortical fi músculos
palpebrais. O estímulo indiferente a condicio-
nar é, no caso, a palavra; o estímulo incondi-
cionado é, no caso, o exercício muscular. En-
tão a palavra débil, monótona, repetida produz
a formação de um foco de excitação no córtex
cerebral e a simultaneidade do estímulo indi-
ferente e do absoluto estabelece o primeiro arco
reflexo temporário no cérebro.26 O foco inicial
é reforçado pela repetição. O foco inicial espa-
lha essa excitação para todo o córtex cerebral.
Essa excitação provoca uma onda inibitória re-
flexa de todos os pontos dirigida ao foco inici-
al de excitação, tentando bloqueá-lo por meio
de uma zona envolvente inibitória ativa. Essa
inibição agora se espalha para todo o córtex. O
foco auditivo irradia a inibição pelo fenômeno
da indução negativa, quanto mais excitado seja
ele, maior a intensidade da inibição que dele
parte. Contudo, continua em estado vígil pela
excitação constante (estimulação com as pala-
vras). Com a estimulação auditiva, agora o
paciente está preparado para receber a sinali-
zação para resposta oculopalpebral desejada,
isto é, a fadiga. Ao afirmarmos que as pálpe-
bras estão cansadas, pesadas etc. seus olhos
fecham-se. Pelo foco auditivo o paciente ouve
as nossas palavras e estabelece-se um novo pon-
to de inibição cortical (centro da percepção sen-
sorial da visão). Como o analisador visual tam-
bém foi cercado pelo segundo sistema de sina-
lização (o conteúdo da palavra, a imagem), cria-
se, em torno do centro sensorial da visão, um
segundo foco de inibição. Deste foco também
se espalha a onda inibitória que, independen-
temente da onda inibitória auditiva, tende a es-
palhar-se pelo córtex cerebral. Agora são dois
focos de inibição que se espalham pelo córtex.
O hipnólogo deve multiplicar os focos de ini-
bição, e isso pode ser feito pela utilização de
estímulos variados. Contudo, o paciente per-
manece ligado ao hipnólogo pelo foco auditi-
vo que agora vamos denominar foco vígil, que
permite a maior parte da comunicação do
hipnólogo com o paciente.
Para a escola pavloviana a hipnose está
associada a uma inibição da atividade refle-
xa condicionada, que se espalha através do
córtex cerebral, muda a interação dos siste-
mas de sinalização, inibindo o segundo sis-
tema de sinalização. Esta inibição diminui o
controle do segundo sistema de sinalização
sobre o primeiro. Isso facilita a memória de
evocação para fatos do passado e para ima-
gens visuais. Essa inibição do córtex propor-
ciona um aumento da excitação de focos es-
timulados pela sugestão.26
16 CAP˝TULO 2
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Existem objeções à teoria de Pavlov sobre
a hipnose. A teoria afirma que a hipnose seria
uma inibição difusa cortical com a presença
de um ponto vígil. Na realidade, transmitindo
sugestões sensoriais verbais, extraverbais, não-
verbais, sugestões táteis, sugestões de imagens
visuais, forçosamente haveria mais de um ponto
vígil. Segundo menciona Lerner, um indiví-
duo desperto fazendo uma complicada conta
matemática ou pronunciando uma conferên-
cia, dificilmente teria um estado difuso cu-
mulativo de inibição cortical, senão mais pro-
vavelmente predomínio de processos de ex-
citação cerebral.28 Como explicar que o mes-
mo indivíduo em hipnose profunda seja ca-
paz de fazer uma operação matemática com-
plicada ou ministrar uma conferência (proces-
sos que exigem elevada excitação cortical),
tendo um estado de inibição difusa cumulati-
va cortical, com a preservação de um ponto
vigente, e logo acorde com absoluta amné-
sia? Haveria necessidade de aceitar que tudo
foi possível apenas por meio do ponto vígil,
apesar de toda a inibição cortical?
COMPORTAMENTO DIRIGIDO (ROBERT W.
WHITE — 1941)
A teoria do comportamento dirigido29
(goal-directed-behavior) foi exposta por
White em 1941. Define o comportamento hip-
nótico como um esforço dirigido, cujo obje-
tivo principal é levar a pessoa hipnotizada a
comportar-se do modo comoé continuamen-
te definido pelo operador e entendido por ela
mesma. A conduta apresentada pelo paciente
hipnotizado nada mais é do que um esforço
dirigido pelo mesmo, com a finalidade de com-
portar-se conforme ele julga que deva atuar
um indivíduo hipnotizado. Este autor acredita-
va que as respostas hipnóticas envolviam um
estado alterado de consciência, mas o que de-
terminava as respostas eram as expectativas
implícitas do indivíduo, guiadas pelo esforço
de apresentar a eles mesmos o que eles acre-
ditavam que o hipnólogo estava esperando. As
respostas hipnóticas são muito complexas para
serem consideradas como resultado automá-
tico das sugestões. O comportamento hipnó-
tico era motivado, objetivo-dirigido, relaciona-
do com a interpretação da sugestão pelo pró-
prio indivíduo e interpessoal.
FENÔMENO PSICOSSOMÁTICO (LEWIS R.
WOLBERG — 1948)
Wolberg acha que o transe não pode ser
explicado quer em bases psicológicas, quer
em bases fisiológicas exclusivas.30 O transe
é uma reação psicossomática complexa que
abrange tanto elementos psicológicos como
fisiológicos. Fisiologicamente há um proces-
so inibitório que parece estender-se aos cen-
tros corticais resultando numa diminuição da
sensação de realidade, alterações na cons-
ciência das sensações, das imagens e do
corpo, e também uma liberação das ações
motoras. Psicologicamente cada pessoa é
individual para experimentar as experiências
hipnóticas internas. Essa experiência inter-
na pode depender da comunicação do hip-
nólogo com a pessoa e vice-versa, do signi-
ficado simbólico da experiência hipnótica
para a pessoa durante a indução do transe.
SUPERCONCENTRAÇÃO DA MENTE
(SYDNEY J. VAN PELT — 1949)
Para este especialista em hipnose médi-
ca, nascido na Austrália, que exerceu a me-
dicina em Londres, a hipnose seria uma su-
perconcentração da mente31 (1949). No es-
tado comum a mente se ocupa com muitas
impressões diferentes de modo que o seu
poder fica disperso. Durante a hipnose a
CAP˝TULO 2 17
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mente concentra-se num grau muito mais
elevado do que no estado comum. Van Pelt
introduz a terminologia, “unidade de poder
mental”, sem defini-la. No estado comum,
somente poucas “unidades de poder mental”
estão afetadas pela sugestão e, portanto, o efei-
to é fraco. Durante a hipnose as “unidades de
poder mental” são concentradas e todas afe-
tadas pela sugestão, portanto o efeito é forte.
Após a hipnose as “unidades de poder men-
tal” dispersas agora estão carregadas de uma
dose de sugestão. A capacidade da hipnose
reside no paciente, o hipnólogo possui so-
mente o conhecimento técnico para manipu-
lá-lo. Contudo, o próprio S. J. Van Pelt em
1956 afirma que “aún cuando ningún doctor,
psiquíatra u hombre de ciencia de alguna
importancia en el mundo arriesgaría hoy día
su reputación negando la existencia del hip-
notismo y la realidad de sus fenómenos, nadie
puede decir exactamente qué es”10 (p. 33).*
EXCLUSÃO PSÍQUICA RELATIVA
(RAPHAEL H. RHODES — 1950)
Cada indivíduo possui duas mentes: a men-
te subjetiva e a mente objetiva.32 A mente
objetiva é capaz de raciocínio tanto indutivo
(dadas as diversas particularidades, chega-
se a uma generalização) como dedutivo (dada
uma generalização, chega-se às particulari-
dades); embora seja impossível considerar
qualquer coisa como uma “particularidade”
ou uma “generalização”, porque cada gene-
ralização pode ser considerada com uma
particularidade sob certas circunstâncias.
Contudo, isso não invalida os processos in-
dutivos e dedutivos. A mente objetiva con-
trola os sentidos: audição, visão, gustação,
tato, cinestesia e olfato. A mente subjetiva
só é capaz de raciocinar dedutivamente. A
mente subjetiva controla a memória. Em cada
indivíduo essas duas mentes estão em esta-
do de equilíbrio mútuo, como se fossem os
dois extremos de uma balança. O predomí-
nio da atividade de uma delas exclui relativa
e concomitantemente os processos da outra.
Quando uma mente se evidencia, a outra re-
trocede. Como a mente subjetiva raciocina
apenas dedutivamente, ela aceita como ver-
dadeira qualquer generalização que lhe seja
apresentada, porque sendo incapaz do racio-
cínio indutivo, não tem como contestar a ge-
neralização. O modo de combater uma gene-
ralização é chegar a uma generalização con-
trária com base em particularidades obser-
vadas, mas isso implica o processo indutivo.
Quando uma das mentes predomina, reduz
em grau concomitante a outra mente e, por
isso, o nome de exclusão psíquica relativa.
Rhodes propôs que essa é a mais ampla
explicação para todos os fenômenos psico-
lógicos manifestados por indivíduos quan-
do em vigília, em sono ou em hipnose.32 Na
vigília a mente objetiva predomina e a pes-
soa é capaz de raciocínio indutivo e deduti-
vo, enquanto a mente subjetiva com menor
predomínio apresenta-se ainda suficiente-
mente ativa para as funções de memória.
Durante o sono predomina a mente subjeti-
va e há redução da mente objetiva. Durante
a hipnose o hipnólogo induz a mente
objetiva do paciente a retroceder, deixando
predominar a mente subjetiva. A mente sub-
jetiva predomina, mas diferentemente do
sono, aqui ela predomina de certo modo
orientada pela comunicação do hipnólogo
com o paciente, quer seja verbal, extra-
verbal ou não-verbal. Na auto-hipnose, a
mente subjetiva é orientada pela mente ob-
jetiva do próprio indivíduo.
* “Ainda que nenhum médico, psiquiatra, homem de
ciência de alguma importância no mundo, arriscasse
hoje em dia sua reputação, negando a existência do
hipnotismo e a realidade dos seus fenômenos, ninguém
pode dizer exatamente o que é”. (Tradução do autor.)
18 CAP˝TULO 2
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Rhodes considera a hipnose “como uma
condição em que se consumou uma troca nas
posições relativas das mentes subjetiva e ob-
jetiva, em que a subjetiva foi posta em evidên-
cia na expectativa de ser controlada pelo
hipnotizador ou pela mente objetiva em reces-
so”32 (p.31). A amplitude do controle hipnótico
está limitada pelo grau de desativação da mente
objetiva do paciente. Quanto maior a desati-
vação, tanto menor o controle hipnótico. Em
virtude do poder de atuação da mente subjeti-
va do paciente, em termos gerais, um pacien-
te não executaria durante a hipnose qualquer
sugestão que fosse contrária aos seus instin-
tos básicos e a sua ética. O próprio autor afir-
ma a validade da teoria diante da existência
de uma só mente, apresentando dois fatores
distintos, um fator subjetivo e um fator objetivo.
DESEMPENHO DE UM PAPEL (THEODORE
R. SARBIN — 1950, 1956, 1972 E
WILLIAM C. COE — 1972, 1991)
Partindo da teoria do comportamento di-
rigido, Sarbin considera a hipnose como uma
forma especial de comportamento sociopsi-
cológico conhecida como “desempenho de
um papel”.33 O indivíduo esforça-se para
desempenhar o papel de uma pessoa hipno-
tizada. O sucesso desse esforço depende de
pelo menos três fatores:34 (a) Motivação fa-
vorável onde o papel a desempenhar e as
convicções próprias não sejam incongruen-
tes. (b) Exatidão da percepção do papel. (c)
Aptidões motoras e imaginativas para desem-
penhar o papel. Depois foram identificadas
seis variáveis que influenciam a qualidade
da representação hipnótica:35 (a) Expectati-
vas do papel do indivíduo. (b) Acurácia da
localização do eu do indivíduo na miniatura
da estrutura social. (c) Habilidades motoras
e de imaginação. (d) Exigências do papel ge-
radas pelas características específicas da si-
tuação clínica ou experimental. (e) Congruên-
cia do papel hipnótico com as autoconcepções
do indivíduo, posteriormente modificada34 para
congruência da performance do papel hipnó-
tico com a seqüência da autonarrativa do indi-
víduo. (f) As propriedades de dirigir e de re-
forçar a audiência do indivíduo.
Estudos comparativos entre pacientes que
são instruídospara se comportar “como se
estivessem hipnotizados”, e pacientes que
são formalmente hipnotizados, mostra que
quando misturados num grupo único e espe-
cialistas em hipnose sejam desafiados a afir-
mar quais pacientes estão hipnotizados e
quais pacientes não estão verdadeiramente
hipnotizados, os pacientes que apenas de-
sempenhavam o papel de hipnotizados po-
dem confundir os especialistas. Os autores
desta teoria destacam alguns pontos: (a) Pa-
pel das expectativas como sendo as coleções
de crenças, probabilidades subjetivas, peda-
ços de conhecimento que especificam condu-
tas apropriadas para uma pessoa ocupando
uma particular posição. O indivíduo represen-
tante traz consigo expectativas preconcebidas
sobre como as pessoas hipnotizadas agem,
além do hipnólogo proporcionar mais expec-
tativas durante a hipnose. (b) O consultório
do profissional ou o laboratório do experimen-
tador é o palco, local da situação hipnótica. A
situação hipnótica depende da habilidade dos
dois atores, hipnólogo e paciente, em usar e
interpretar metáforas amplificadas.
Em 1972 Sarbin e Coe expuseram a teoria
da hipnose em termos dramatúrgicos a partir
da teoria do desempenho de um papel.36 No
modelo dramatúrgico da hipnose a preparação
do paciente corresponde à preparação do pa-
pel que o paciente irá desempenhar. A
congruência do paciente com o papel se esta-
belece pela eliminação das defesas, medos e
conceitos errados sobre a hipnose e pela cria-
ção de expectativas positivas. A indução
corresponde à colocação do paciente no palco,
isto é, na poltrona reclinável, com a diminuição
CAP˝TULO 2 19
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da luminosidade do ambiente e com a modifi-
cação da maneira como o hipnólogo expressa
as sugestões capazes de criar as expectativas
positivas no paciente. A interpretação das su-
gestões pelo paciente é a representação do
papel no palco (consultório do especialista). A
representação do papel é involuntária no sen-
tido de que é realizada sem atenção, mas não
sem intenção. Neste sentido a experiência não-
voluntária é construída por quatro aspectos:37
(a) Intensificação do controle verbal. (b) Con-
dução da atenção. (c) Rotulação da experiên-
cia particular. (d) Apresentação das ações como
ocorrências. Em Alvarez há uma explanação
desta teoria da hipnose em termos teatrais.38
ESTADO EMOCIONAL INTENSIFICADO
(GALINA SOLOVEY E ANATOL
MILECHNIN — 1957)
O estado hipnótico num sentido mais am-
plo não é mais do que um estado emocional
intensificado.39 Toda emoção ao alcançar
certo nível de intensidade ocasiona determi-
nadas particularidades psicofisiológicas que,
por sua vez, provocam determinados fenô-
menos de conduta. Esses aspectos da con-
duta se correlacionam com aspectos hipnóti-
cos, sendo independentes se a emoção é es-
pontânea ou deliberadamente provocada.
Os autores diferenciam dois tipos de emo-
ções: estabilizadoras e perturbadoras. A re-
lação interpessoal na qual se suscitam esses
tipos de estados emocionais básicos é de-
nominada relação interpessoal hipnótica
principal, que é complementada pelas rela-
ções interpessoais hipnóticas secundárias. A
relação interpessoal hipnótica principal é
constituída por relações hipnóticas constan-
temente reativadas, como a do filho e seus
pais, do aluno e do mestre. As relações hip-
nóticas interpessoais secundárias são as que
se mantêm por pouco tempo. O conceito de
estado hipnótico é generalizado para as rela-
ções comuns da vida diária. A indução hip-
nótica seria a intensificação de um estado
emocional de qualquer tipo ou matiz. A es-
sência do estado hipnótico adulto é um pro-
cesso de emoção intensificada, consistindo
numa retrogressão aos mecanismos psicoló-
gicos da primeira infância, o qual criaria as
condições favoráveis para aceitar e experi-
mentar aquelas fantasias que são inerentes à
psicologia da criança. A sugestionabilidade é
a motivação da criança para aceitar proposi-
ções verbais ou extraverbais e cumprir as
exigências de seus pais quando estes fazem
carícias, no momento que a criança necessita
destas, ou assumem uma atitude autoritária.
Holland Jr. propõe ser o estado hipnótico
um estado emocional intensificado. Ele acha
conveniente distinguir transe hipnótico (ou
estado hipnótico no sentido estrito) da hip-
nose em geral, sendo a hipnose o fenômeno
real e básico, e o transe hipnótico uma secção
conceitual, artificial e convencionada taci-
tamente entre hipnotizador e hipnotizado, do
“todo” constituído pela relação hipnótica
global.40 Esse autor pretende que se chame
transe hipnótico “aquela parte do conjunto
total de inter-relações que começa por um
sinal convencionado tácita e conjunturalmen-
te (fechamento dos olhos, levantamento au-
tomático da mão etc.), continua-se por uma
seqüência de outros acontecimentos, duran-
te os quais a atuação do designado hipnoti-
zado é, geralmente, passiva (permanecendo
relaxado, vivendo sonhos espontâneos ou in-
duzidos por sugestão ou ab-reações etc.), e
termina por outro sinal ou conjunto de sinais
implicitamente convencionados (em geral
abertura dos olhos, e início de um conjunto
de elementos comportamentais de quem ‘está
no seu estado comum fora do transe’).
“Desse modo, o fenômeno básico em si
já existe antes que o transe ‘comece’, e con-
tinua depois que ele ‘termina’40 (p. 129).”
20 CAP˝TULO 2
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A obtenção do melhor transe hipnótico
possível num paciente não depende de treiná-
lo muito ou pouco, de falar baixinho, monó-
tona, rítmica, repetidamente, ou de realizar
complicadas manobras para encontrar “pas-
sos” e graus hipnóticos que, ao final, não
existem. Enfim, não depende de ações físi-
co-mecânicas, nem de aspectos quantitativos
dos estímulos. Obtém-se o transe optimal
pela adaptação indutiva a cada paciente in-
dividual, o que se consegue pela conscien-
tização e utilização, por parte do hipno-
tizador, daquilo que é efetivamente regente
na hipnose, isto é, os fatores software: ade-
quação do código portador das mensagens,
respeito às programações preexistentes, in-
cremento, pelas vias apropriadas, de um es-
tado emocional com regressão psicológica
conseqüente, utilização das múltiplas men-
sagens implícitas que, quer o hipnotizador
queira ou não, quer ele saiba ou não, estão
sendo levadas ao paciente pelo tom de voz
utilizado, pelas associações semânticas, pela
atitude geral do hipnotizador, pelos seus ges-
tos, inflexões verbais, pelo ambiente, isto é,
por tudo aquilo que se chama de paralin-
guagem.
Morris41 afirma que “a hipnose é um esta-
do de consciência no qual você fica receptivo
às sugestões mais do que ordinariamente, pode
pensar com mais clareza, pode ver mais viva-
mente com os olhos da mente, pode sentir com
mais atenção e pode realmente ouvir o próprio
íntimo com maior profundidade e mais crité-
rio. Neste estado você tem um singular contro-
le sobre seus processos mentais, suas emoções
e suas atitudes” (p. 25). E ainda de acordo com
outros autores, ela diz que o estado hipnótico
não tem nenhuma correlação física conheci-
da e não pode ser definido por quaisquer cri-
térios exteriores, mas apenas por sua própria
experiência subjetiva. O estado hipnótico não
é um estado alfa, não é um estado de movi-
mentos oculares rápidos associado ao sonho,
não é um estado que possa ser delineado por
quaisquer medidas de ondas cerebrais até
agora conhecidas, ou por medidas da resis-
tência da pele ou pelo potencial elétrico do
corpo. Morris afirma que “a hipnose é real-
mente um estado de consciência desenvol-
vido pelo hipnotizado como resultado de um
processo psíquico íntimo que poderá orientá-
lo através de caminhos que conduzem mais
diretamente ao aperfeiçoamento pessoal”41
(p. 35). Um especialista não pode afirmar
que uma pessoa esteja hipnotizada por meio
de qualquer tipo de teste inventado até hoje.

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