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Graduando a presunção de constitucionalidade

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66 Fórum jurídico
A n D r É r A m o s t A V A r e s e n i c o l A t o m m A s i n ia r t i G o
gRADUAnDo A pREsUnção DE 
ConsTiTUCionAliDADE *
André Ramos Tavares é Professor Associado da USP e 
Professor da PUC-SP. 
Nicola Tommasini é Graduando do 7º semestre de Direito 
na PUC-SP; Bolsista da Fundação de Amparo à Pesquisa do 
Estado de São Paulo (FAPESP); 
* Pesquisa realizada com o apoio da Fundação de Amparo 
à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), processo n. 
2014/27356-2.
1. introdução
Boa parte da doutrina brasileira tem se pre-
ocupado com os “problemas” de legitimidade 
do Poder Judiciário, especificamente quando 
este assume uma postura intuitivamente mais 
ativa e enérgica, pronunciando-se acerca de 
questões tradicionalmente reservadas aos pode-
res cujos membros foram eleitos diretamente 
pelo povo. Neste opúsculo tentamos contribuir 
para essa discussão, indicando um conceito in-
vulgar, no Brasil, de presunção de constitucionali-
dade, o que permitirá aquilatar com maior rigor 
a adequação de certos testes usados para fins de 
controle de constitucionalidade. 
Pretendemos enfatizar, essencialmente, que 
existem níveis de presunção de constitucionali-
dade, os quais acabam por estabelecer limites 
diversos em relação ao controle judicial de 
constitucionalidade e, consequentemente, legi-
timam “em degraus” o exercício desse poder. 
Assim, a presunção em si mesma considerada 
deve servir de base para a criação de outros 
testes de constitucionalidade para além da pro-
porcionalidade. 
2. A presunção de constitucionalidade
É comum nos manuai s de Dire i tos 
Constitucional tomar-se a presunção de 
constitucionalidade como um caso de “princípio 
basilar” do controle de constitucionalidade 
brasileiro. O conteúdo que se atribui a esse 
“princípio” é extremamente variado como se 
pode notar em Barroso, que elenca diferentes 
acepções do princípio: (i) a presunção de 
constitucionalidade consagra que a lei é 
constitucional, até que sobrevenha decisão que 
lhe declare incompatível com a Constituição; 
(ii) a presunção é princípio de interpretação 
constitucional que (ii.1) comanda que o 
Judiciário seja, via de regra, deferente em 
relação às decisões políticas do parlamento; e 
67Fórum jurídico
que (ii.2) o órgão judicial deve sempre optar 
pela interpretação da lei que for compatível com 
a Constituição1. 
Nossa acepção não trabalha com premissas 
tão estanques sobre a legitimidade da Justiça 
Constitucional, antes considerando o nível de 
presunção conforme o caso, lembrando que o 
nível de presunção há de afetar o tipo de teste 
aplicável. 
O que é, rigorosamente falando, a presunção 
de constitucionalidade? Em algumas palavras, 
“a presunção [de constitucionalidade] aloca e inten-
sifica o ônus de persuasão do Direito”2. Essa noção 
permite compreender a presunção como com-
portando níveis de intensidade que determinam 
quão “fortes” terão de ser os elementos para 
certificar a inconstitucionalidade de uma deter-
minada norma. Esses elementos, como adiante 
tentaremos demonstrar, serão adequados na 
medida em que passarem por diferentes testes, 
que são especificamente desenvolvidos para 
determinadas situações (portanto, longe de uma 
tentativa de tratamento monolítico). 
Toda presunção de constitucionalidade é 
“relativa”, no sentido de que ela sempre pode 
ser “derrubada”. No entanto, a evidência dos 
elementos pela inconstitucionalidade que será 
necessária para derrubar a presunção é que 
deverá variar a depender do caso concreto. 
Ao contrário do conceito de “presunção” 
que impera no Direito em geral e na Doutrina 
tradicional, a presunção de constitucionalidade não 
é regra probatória, não estabelece ônus de prova, 
não define a quem incumbe comprovar 
determinado fato3. A presunção de constitucio-
1. BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional Contemporâneo, 
2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 301.
2. JAIN, Tarun. Presumption Of Constitutionality, Icafai University, ainda não 
publicado, p.3. 
3. Cf., por exemplo, definição de “ônus da prova” de DIDIER JR., Fredie. 
Curso de Direito Processual Civil, vol. 2, 9ª ed. Bahia: JvsPodium, 2014, p. 75: 
nalidade não diz respeito a questões de com-
provação factual4, mas a uma questão de direito.
Na Constituição brasileira vigente não há 
qualquer menção expressa à “presunção de 
constitucionalidade”. Um olhar mais atento 
fixará a presunção de constitucionalidade tanto 
na cláusula democrática quanto na função 
“contra-majoritária”5 dos direitos fundamentais. 
A presunção cuidaria, nesses termos, de aper-
feiçoar o processo político, que se inicia nos 
debates parlamentares e continua para além dos 
pronunciamentos judiciais. 
Assim, embora a lei legitimamente reflita a 
vontade da maioria, nas Constituições moder-
nas a democracia seguramente não se reconduz 
à simples “vontade da maioria”. A presunção de 
constitucionalidade deve ser construída, por-
tanto, respeitando o sistema majoritário, mas 
prezando, para fins de equilíbrio, pelos direitos 
e objetivos fundamentais de cada Constituição 
positiva. 
Em suma, a postura da Corte deve ser me-
dida e regulada pela presunção, a qual, por sua 
vez, é regulada pela democracia e pelos direitos 
e objetivos fundamentais constitucionais: a in-
tervenção da Corte deve ser mais ou menos 
aguda conforme a presunção que cobre deter-
minada lei sob escrutínio. 
“Ônus da prova é, pois, o encargo que se atribui a um sujeito para de-
monstração de determinadas alegações de fato (...)”. 
4. JAIN, Tarun. Idem, p. 3. 
5. No sentido de limitarem o espaço de atuação das maiorias politicamen-
te constituídas. 
“Na coNstituição brasileira vigeNte 
Não há qualquer meNção expressa à 
“presuNção de coNstitucioNalidade”
68 Fórum jurídico
A n D r É r A m o s t A V A r e s e n i c o l A t o m m A s i n ia r t i G o
3. níveis de presunção de constitucionalidade e rig-
orosidade de controle
A “maleabilidade” da presunção de constitu-
cionalidade tem relação com seu fundamento, 
que, por sua vez, é a capacidade de os juízes 
constitucionais aperfeiçoarem o processo polí-
tico democrático. Esse aperfeiçoamento se dá a 
partir da Constituição, que estabelece direitos 
que não podem ser violados por norma que 
venha florescer a partir do processo político 
ordinário. 
Abstratamente, portanto, a Constituição es-
tabelece hipóteses em que a presunção deve ser 
relativizada: o nível da presunção de constitu-
cionalidade de determinada norma é medido a 
partir de quais direitos ela “restringe” (logica-
mente que em favor de outros direitos)6. Neste 
momento, surge a “teoria dos direitos preferen-
ciais” que, embora não hierarquize os direitos 
fundamentais, acaba concedendo proteção 
constitucional mais acentuada a alguns deles. 
Portanto, a teoria promove uma mudança fun-
damental na atuação da Justiça Constitucional, 
pois o juiz constitucional se coloca como “fiscal 
do processo político” e essencialmente formata 
sua intervenção tendo em mente que deve 
proteger mais rigorosamente alguns direitos que 
provavelmente foram ignorados ou menospre-
zados no processo de formação da lei7. 
6. Nesse sentido, cf. nota 4 em United States vs. Carolene Products, voto do 
Justice Stone. 
7. Aliás, uma das possíveis razões para se estabelecer uma presunção é 
justamente a probabilidade de tal estipulação se verificar de fato. Para mais, 
É importante deixar claro, no entanto, que 
embora o fundamento da atuação da Justiça 
Constitucional, para esta teoria, seja o processo 
político, a suspeita em relação a esse processo 
se verifica na lei em si, isto é, no resultado da 
deliberação legislativa e não na investigação do 
histórico legislativo, por exemplo. É uma 
verificação abstrata de quais direitos estão em 
jogo e de quais direitos devemser mais 
intensamente protegidos pelo Poder Judiciário. 
Assim, se determinado direito for suficiente-
mente relevante, a teoria exposta sugere que 
uma lei restritiva deve presumir-se constitucio-
nal em menor grau, sendo necessária uma vi-
gilância mais estreita a fim de analisar-se sua 
compatibilidade com a Constituição. Em outras 
palavras, a lei passa por um processo de “justi-
ficação constitucional” mais rigoroso. 
Essa vigilância e proteção mais intensa se dão 
de uma maneira simples: a noção de níveis de 
presunção de constitucionalidade autoriza uma 
construção teórica e jurisprudencial específica 
– e aqui a parte crucial – de diferentes testes de 
constitucionalidade, a depender do nível da pre-
sunção que se adota: a rigorosidade do con-
trole deve variar conforme varia a pre-
sunção, isto é, se a presunção for fraca, o 
controle deve ser mais rigoroso, e se a presunção 
for mais forte, o nível de deferência deve ser 
maior e o controle menos rigoroso8. 
ver COMELLA, Victor Ferreres. Justicia Constitucional y Democracia, Madrid: 
Estudios Constitucionales, 1997, p.155-156. 
8. Para um controle de constitucionalidade mais rigoroso em relação à 
“a presuNção de coNstitucioNalidade de ve ser coNstruída, portaNto, 
respeitaNdo o sistema ma joritário, ma s pres aNdo, para fiNs de 
equilíbrio, pelos direitos e obje tivos fuNdameNtais de c ada 
coNstituição positiva”
69Fórum jurídico
Nos EUA, por exemplo, existem diversos 
tipos diferentes de testes: desde os muito rigo-
rosos (como o “strict scrutiny”) para as leis que 
praticamente se presumem inconstitucionais, os 
intermediários (como o “intermediate scrutiny” 
e o “minimal scrutiny with bite”) até os mais 
brandos (“rational basis test”) para normas cuja 
presunção é acentuada9. Isso demonstra a ma-
turidade institucional de uma Corte que co-
nhece sua colocação na divisão constitucional 
de poderes (autocontenção deixa de ser um 
paradigma válido universalmente). É o reco-
nhecimento, também, de que algumas decisões 
devem permanecer primordialmente nos órgãos 
que detêm representatividade política direta. 
Essa teoria nos obriga a repensar, portanto, a 
real utilidade de um teste universal para toda e 
qualquer questão de controle de constituciona-
lidade (especialmente conflito de direitos fun-
damentais), como, por exemplo, o da propor-
cionalidade. Ela acaba por questionar se não 
seria mais proveitoso criar testes com maior 
rigorosidade para determinadas questões cons-
titucionais10, a fim de proteger-se de maneira 
especializada determinados direitos que se co-
locam numa posição diferenciada perante a 
democracia. 
4. Conclusão
Neste breve espaço, objetivamos apenas ofe-
recer rápidas pinceladas de uma concepção 
proteção de minorias constitucionais, cf. TAVARES, André Ramos, Mino-
rias e Justiça Constitucional, In: Revista Brasileira de Estudos Constitucionais – 
RBEC, ano 4, n. 13, jan./mar. 2010, p. 27. 
9. Para mais, cf. CHERMERINSKY, Constitutional Law: Principles and 
Policies, 2nd ed. New York: Aspen Publishers, 2002. 
10. Não se despreza, é claro, os esforços de diversos autores nesta área (em 
relação à margem de discricionariedade do legislador e o teste de propor-
cionalidade, cf. ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais, p.584-628). 
Entretanto, a corrente que adota o tipo de presunção que desenvolvemos 
sugere que a restrição a um só teste acaba por limitar uma produção 
teórica mais rica sobre o tema, além de ser teoricamente mal fundamen-
tada, em especial por não compreender o papel da Corte. 
diversa de presunção de constitucionalidade que 
ainda está a merecer atenção por parte da lite-
ratura jurídica nacional. Embora a exposição 
seja abreviada, consideramos suficiente para, ao 
menos, despertar algum interesse na matéria 
com retomada crítica de certos “dogmas” que 
se estabeleceram recentemente na prática jurí-
dica brasileira11. 
Essas considerações pretendem indicar a 
necessidade de uma elaboração teórica de dife-
rentes testes de constitucionalidade para dife-
rentes situações. Essa nova perspectiva deve 
gerar algum debate sobre a correlação entre 
testes de constitucionalidade e legitimidade da 
jurisdição constitucional.
11. Indicamos, para aprofundamento, a bibliografia norte-americana 
acerca do tema. Cf, por exemplo: CHERMERINSKY, Erwin. Op. cit, 2002; 
Referências Bibliográficas:
ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. 2ª ed. São Paulo: 
Malheiros, 2014. 
BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional Contemporâ-
neo, 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010. 
CHERMERINSKY, Erwin. Constitutional Law: Principles and Policies. 
2nd ed. New York: Aspen Publishers, 2002.
COMELLA, Victor Ferreres. Justicia Constitucional y Democracia, Madrid: 
Estudios Constitucionales, 1997. 
DIDIER JR., Fredie, et. al. Curso de Direito Processual Civil, vol. 2, 9ª ed. 
Bahia: JvsPodium, 2014.
JAIN, Tarun. Presumption of Constitutionality, Icafai University Publica-
tions. Forthcoming. Disponível em: http://papers.ssrn.com/sol3/papers.
cfm?abstract_id=1087388. Acessado dia 20/02/2015, às 14h00. 
TAVARES, André Ramos. Minorias e Justiça Constitucional. In: Re-
vista Brasileira de Estudos Constitucionais – RBEC, ano 4, n. 13, jan./mar. 
2010, pp. 13-33.

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