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UNIVERSIDADE DE PERNAMBUCO CAMPUS PETROLINA CURSO DE NUTRIÇÃO DISCIPLINA: BROMATOLOGIA UNIDADE II LEGUMINOSAS Monitores responsáveis: EMERSON IAGO GARCIA E SILVA MYLENA DE AMORIM GRANJA UILLA ISLANY SOARES DE MOURA Supervisão: Profa. Dra. Marianne Mendes 1 1. INTRODUÇÃO A família Leguminosae ou Fabaceae é a terceira maior família de plantas superiores, englobando 730 gêneros e mais de 19.000 espécies. O nome Leguminosae é uma referência ao fruto característico da família, denominado legume. A família subdividi-se em três subfamílias: Mimosoideae, Caesalpinioideae e Faboideae (também chamada de Papilionideae). A essa última subfamília pertence o maior número de tribos e gêneros, inclusive a tribo Phaseolae, à qual pertencem os gêneros Glycine (da soja) e Phaseolus e Vigna (dos feijões), além da tribo Aeschynomeneae do gênero Arachis (do amendoim) e a tribo Viceae do gênero Vicia (das favas). São conhecidas cerca de 60 espécies de leguminosas de grão domesticadas e cerca de 20 espécies são usadas na alimentação humana, como sementes secas – ou grãos – chamadas de leguminosas de grão (grain legumes ou pulses, em inglês) (KOBLITZ, 2011). Na Tabela 1, podem-se observar as principais espécies desses vegetais consumidas como alimento pelo homem. TABELA 1 - Principais espécies de leguminosas de grão consumidas como alimento humano Nome específico Nome comum Clima de cultivo Região de maior consumo e origem Arachis hypogaea Amendoim Quente e moderadamente úmido Américas Cajanus cajan Guandu Quente e úmido África Cicer arietinum Grão-de- bico Subtropical e temperado Europa e Oriente Médio Glycine Max Soja Tropical de altitude, subtropical e temperado Extremo Oriente Lens culinaris Lentilha Subtropical e temperado Europa e Oriente Médio Lupinus SP. Tremoço Subtropical e temperado Mediterrâneo e América do Norte Phaseolus lunatus Feijão-fava Quente e úmido Américas Phaseolus vulgaris Feijão- comum Tropical de altitude, subtropical e temperado Américas Pisum sativum Ervilha Subtropical e temperado Europa e Oriente Médio Vicia faba Fava Subtropical e temperado Europa e Oriente Médio Vigna umbellata Feijão-arroz Subtropical e úmido África Vigna unguiculata Feijão- fradinho Quente e úmido África Fonte: Koblitz (2011) 2 2. PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS 2.1.Aspectos botânicos As leguminosas constituem uma família da classe das Dicotiledôneas, muito rica em espécies úteis ao homem. Abrigam plantas de pequeno porte, arbustos e árvores com folhas compostas (AFONSO, 2010). As leguminosas de grão são quase sempre plantas herbáceas de ciclo anual (KOBLITZ, 2011). As flores podem ser hermafroditas, pentâmeras (na maioria), tetrâmeras ou trímeras, com cálice persistente e corola caduca. O fruto é um legume ou vagem. São frutos secos que podem ou não abrir quando maduros. Em seu interior encontra-se uma quantidade variável de sementes de formato e aspecto características da espécie e do cultivar. O embrião tem dois cotilédones, por ocasião da germinação. Na morfologia da germinação da semente de leguminosas, usando-se soja e ervilhaca como exemplos, o primeiro órgão que aparece nesse caso é a raiz primária. A raiz primária procura penetrar e se fixar no solo. Conseguido isso, a zona da raiz mais próxima à semente começa a crescer. Essa região é denominada hipocótilo, que, ao se prolongar, empurra a semente para cima da superfície do solo. O hipocótilo é a parte compreendida entre a raiz ramificada e os cotilédones; da primeira ramificação, para baixo, começa a raiz propriamente dita. Os cotilédones, ao se livrarem da casca e ficarem expostos à luz, tomam coloração verde (AFONSO, 2010). As sementes maduras das leguminosas de grão apresentam duas partes: tegumento e embrião. O tegumento representa apenas cerca de 3% da massa do grão e é bastante delicado, mas protege o embrião contra agentes externos e, se for danificado, pode prejudicar tanto a germinação quanto a conservação durante o armazenamento. O embrião responde por 97% da massa do grão, (onde se acumulam as substâncias de reserva) e o eixo embrionário (cerca de 3% da massa do grão), constituído de plúmula (que contém duas folhas primárias e a gema apical), epicótilo (caule rudimentar) e radícula/hipocótilo (que levanta os cotilédones acima da superfície do solo). O grão apresenta ainda hilo, marca ou cicatriz da junção da semente com o fruto, por onde se estabelece, nos estágios iniciais de frutificação, a relação fonte-dreno, e micrópila, o orifício através do qual permeia a umidade para possibilitar a germinação e de onde emerge a radícula no início da germinação (EMBRAPA, 2014) (Figura 1). 3 Figura 1 – Estruturas básicas da semente de feijão Fonte: Koblitz (2011) Os cotilédones exibem uma estrutura altamente organizada, formada por células parenquimatosas pouco típicas e por feixes vasculares. Os cotilédones, ou folhas germinais, funcionam como órgãos de reserva e, quando verdes, constituem folhas provisórias. Ao mesmo tempo, começa a se desenvolver o botão do caule, junto aos cotilédones. Nessa região originam-se as folhas propriamente ditas. A porção compreendida entre os cotilédones e a primeira folha denomina-se epicótilo, e da primeira folha para cima, caule. Quando a planta torna-se maior, os cotilédones caem, deixando somente pequenas cicatrizes (EMBRAPA, 2014). Os sistemas de raízes das leguminosas resulta do desenvolvimento da raiz primária do embrião e de suas ramificações eventuais (Figura 2). Normalmente, esse eixo principal é mais comprido e grosso do que qualquer das ramificações. A raiz principal, denominada axial ou pivotante (uma raiz principal e várias raízes secundárias, terciárias e quaternárias), apresenta extraordinário desenvolvimento e sustenta a planta durante toda a vida desta (EMBRAPA, 2014). Além disso, apresentam principalmente na subfamília Faboideae, grande quantidade de nódulos formados por colônias de bactérias fixadoras de nitrogênio atmosférico que vivem em estreita simbiose com as leguminosas. Há uma grande especificidade entre o grupo de bactérias fixadoras e a planta hospedeira (AFONSO, 2010). 4 FIGURA 2 – Morfologia de algumas leguminosas Fonte: EMBRAPA (2014) As raízes adventícias, em geral, faltam ou se desenvolvem escassa e tardiamente, havendo, contudo, uma série de espécies herbáceas rasteiras nas quais o desenvolvimento é normal, como no trevo branco (Figura 3). Mesmo em tais casos, geralmente, o sistema embrionário segue funcionando e pode ser mais robusto que o das raízes adventícias. Em trevo vermelho, surgem raízes adventícias na base dos talos. Em touceiras velhas, observa-se a raiz pivotante acompanhada ou substituída por várias raízes adventícias perpendiculares (EMBRAPA, 2014). Caule é o órgão que mais influi no aspecto vegetativo da planta. Nas leguminosas, esse órgão pode apresentar formas variadas. Caules aéreos das leguminosas podem ser herbáceos ou lenhosos, cilíndricos ou angulosos, porém nunca suculentos. O primeiro caule, que se forma da plúmula da semente (Figura 3), é ereto e de simetria variada . A disposição das folhas sobre o caule geralmente é alternada, havendo também casos de folhas opostas. As leguminosas apresentam vários tipos de caules aéreos, por exemplo, estoloníferos (trevo branco - Figura 3), escandentes (ervilhaca) e ereto (alfafae trevo vermelho) (EMBRAPA, 2014). As folhas de leguminosas (Figura 3) são compostas das seguintes partes: estípula, pecíolo, ráquis, peciólulo e lâmina composta de folíolos. As estípulas soldadas 5 são frequentes e aparecem unidas ao pecíolo por trecho mais ou menos longo, como, por exemplo, em trevos e em alfafa. As estípulas nectaríferas são providas de glândulas, como, por exemplo, no cornichão (EMBRAPA, 2014). FIGURA 3 – Constituição de folhas de leguminosas Fonte: EMABRAPA (2014) O pecíolo é a parte que une a lâmina ao caule e geralmente é bem desenvolvido em leguminosas, como, aliás, na maioria das dicotiledôneas. Por sua forma alongada, assemelha-se a um caule. 6 O ráquis é a parte do eixo mediano da folha, que sustenta os folíolos. É bem desenvolvido nas folhas penadas e bipenadas; falta nas folhas simples e nas digitadas. A lâmina foliar é sempre composta, salvo que, por redução, apareçam lâminas simples, fáceis de interpretar, como as unifolioladas. Predominam as folhas penadas (como, por exemplo, na alfafa) e as bipenadas. Os folíolos estão dispostos nitidamente articulados sobre o ráquis e dão uma aparência peculiar à folhagem das leguminosas (EMBRAPA, 2014). Em geral, quanto maior o número de folíolos, menor o tamanho e vice versa. As configurações da lâmina podem ser: 1) Folhas penadas - são aquelas em que os folíolos estão dispostos em dupla, em fileiras ao longo do ráquis. Geralmente formam pares de inserção oposta ou se alternam sem constituir pares. A lâmina pode ser ainda paripenada ou imparipenada, se apresentar na extremidade um único folíolo, em posição mediana (como, por exemplo, em alfafa), ou então um par de folíolos, no meio dos quais encontra-se a extremidade do ráquis, reduzida ou transformada em gavinha (como, por exemplo, em ervilhaca); 2) Folhas trifolioladas – são uma variante comum, em que a folha tem três folíolos; caracterizam os trevos Os pecíolos são os órgãos que ligam os folíolos ao ráquis primário ou secundário, tratando-se de folhas penadas ou bipenadas. Os folíolos são quase sempre largos e nitidamente bifaciais; a face superior costuma ser de verde mais intenso, menos pubescente e com nervuras menos salientes que a face inferior. Em ervilhaca, por exemplo, os folíolos da extremidade das folhas são transformados em gavinhas (EMBRAPA, 2014). Composição química A composição do tegumento de leguminosas, que corresponde a cerca de 3% da massa do grão, é aproximadamente: 8% de água, além de (em base seca): 5% de proteínas, 20% de pectinas, 40 a 75% de celulose e hemicelulose; 0,5 a 1,0% de lipídios; 1 a 11% de lignina; e 2 a 8% de cinza. A maior parte da composição do grão deve-se, no entanto, aos cotilédones. Leguminosas são grãos conhecidos e cultivados por seu alto teor proteico, que pode chegar a 40% de sua massa seca. Além disso, de acordo com a espécie, pode haver maior concentração de lipídios (soja, amendoim e tremoso, por exemplo). 7 Nos grãos que armazenam amido, o total de carboidratos pode representar até 65% da massa e, nesses casos, o teor lipídico, de modo similar ao encontrado em cereais, não ultrapassa 2% da massa do grão. Nos grãos que armazenam óleo, a fração de carboidrato varia de 30 a 40% da massa, mas quase sempre a fração proteica é maior (KOBLITZ, 2011). Na Tabela 2, estão expostas as composições nutricionais de algumas leguminosas. TABELA 2 - Composições nutricionais de algumas leguminosas, em base seca Grãos Proteínas (%) Carboidratos (%) Lipídios (%) Fibras (%) Minerais (%) Feijão- comum 26,1 61,4 1,80 6,60 4,10 Feijão-de- corda 27,5 58,5 2,10 7,00 4,90 Soja 40,0 29,0 20,0 5,00 6,00 Grãos de bico 20,6 65,2 7,0 3,80 3,40 Ervilha 28,8 60,0 1,60 6,70 2,90 Lentilha 29,6 61,7 3,10 3,20 2,40 Fonte: Koblitz (2011) Carboidratos Segundo Koblitz (2011), os carboidratos presentes nos grãos de leguminosas podem ser divididos em três frações principais: amido; açúcares solúveis (monossacarídeos, dissacarídeo e outros oligossacarídeos de baixa massa molecular) e polissacarídeos estruturais de parede celular (celulose, hemicelulose e pectina). Nos grãos amiláceos, a maior fração é representada pelo amido que corresponde acerca de 35 a 45% da massa do grão. Em oleaginosas, no entanto, as outras frações de carboidratos são mais importantes e o amido representa apenas 0,5 a 1,5% da massa. O amido armazenado por leguminosas de grão é basicamente o mesmo encontrado em cereais. Entretanto, há evidências de que em leguminosas o amido é menos digerível, em função de características do grânulo (empacotamento, forma cristalina e presença de proteínas e lipídios) e da presença de fatores antinutricionais. 8 Entre os açúcares solúveis, os monossacarídeos estão presentes em menor proporção nos grãos secos. O principal monossacarídeo encontrado é a glicose, que se apresenta em maiores concentrações no eixo embrionário do que nas moléculas cotiledôneas. Os oligossacarídeos aparecem em concentrações mais expressivas, sendo a sacarose o dissacarídeo mais abundante (podendo representar até 6% da massa do grão). Em leguminosas estão presentes ainda diversos grupos de oligossacarídeos, ligeiramente maiores, conhecidas como alfa-galactosídeos. Como o nome indica, são formados por unidades de galactose ligadas a diversos compostos. Os galactosídeos mais abundantes são os derivados da sacarose, conhecido como “oligossacarídeo da família da rafinose” (RFO – raffinose family of oligosaccharides) e são formados por unidades de alfa-galactose ligadas ao carbono 6 da glicose pertencente a sacarose. O grupo é composto por rafinose, estaquiose, verbascose, ajugose e outros oligossacarídeos maiores (até nonassacarídeos) sem nome específico. Outro alfa-galactosídeo encontrado em diversas leguminosas são derivados do mioinositol (família do galactinol), do D-ononitol (Família do galactosilononitol), do D- pinitol (Famílias A e B do galactopinitol), e do D-quiroinositol (Família A do faropiritol). Os galactosídeos apresentam atividades prebióticas, não são digeridos no trato intestinal humano e favorecem o desenvolvimento de bifidobactérias na produção da microbiota intestinal. No entanto, o consumo em doses muito elevadas pode acarretar fermentação excessiva com produção de gases e geração de flatulências. Os polissacarídeos estruturais são compostos por celulose, hemicelulose e pectinas. A celulose é um polissacarídeo linear de altíssima massa molecular, formado por unidades de glicose uunidas entre si por ligações glicosídicas do tipo ß 1,4. Sua estrutura fibrilar é estabilizada por ligações de hidrogênio intra e intercelulares, o que gera estruturas de alta cristalinidade, com algumas regiões amorfas, que compõem 35% de parede celular dos cotilédones. Hemicelulose é o nome dado a uma grande variedade de heteropolissacarídeos complexos. São compostos extraídos com soluções alcalinas das paredes celulares após a extração dos compostos solúveis em água, e tem a função de manter ligações cruzadas entre a celulose e a pectina e entre esses dois compostos e a lignina. As xiloglicanas são os compostos hemicelulósicos predominantes nas paredes celulares de dicotiledôneas, e são formadas por glicose, xilose e galactose na proporção de 4:3:1.Outros componentes 9 da hemicelulose são: ß-xilanas, glicomananas e mananas. Juntos, esses compostos representam cerca de 15% da parede celular dos cotilédones. As ligações entre celulose e hemicelulose se mantém por ligaçõesde hidrogênio e podem ser intermediadas por compostos fenólicos, especialmente o ácido ferúlico. Pectinas ou substâncias pécticas são denominações que designam compostos da parede celular e da lamela média, formados basicamente por ácidos galacturônicos e seus derivados metoxilados (esterificados com metanol). As substâncias pécticas podem ser separadas, com base no seu grau de metoxilação, em: ácido péctico – polímeros de ácidos galacturônicos, ligados entre si por ligações glicosíidicas do tipo α – 1, 4, contendo menos de 5% de metoxilação; e ácido pectínico - polímeros de ácidos galacturônicos contendo mais de 5% de metoxilação. A denominação “pectina” é especialmente aplicada às substâncias que gelificam em condições específicas (acidez e °Brix). São conhecidas ainda protopectinas, características de tecidos vegetais imaturos, insolúveis em água e que, sob hidrólise limitada, dão origem à pectina. Nas paredes celulares as substâncias pécticas apresentam como polímeros heterogênios, formados por regiões lineares de ácido péctico e/ou pectínico, intercaladas por regiões ramificadas ricas em monossacarídeos neutros (galactose, arabinose, xilose, glicose, manose e frutose). Proteínas Os grãos de leguminosas são reconhecidos como importantes fontes de proteínas para a alimentação humana e animal. As leguminosas de grãos acumulam grandes quantidades de proteínas ao longo do seu desenvolvimento e a maior parte é considerada proteína de reserva – não apresenta atividade biológica. Essas proteínas são armazenadas em organelas com membranas chamadas corpos (ou corpúsculos) de proteína, que se acumulam nas células do parênquima dos cotilédones e se mantém inalteradas durante a maturação da semente, resistindo à desidratação natural e à secagem, mas sofrem hidrólise durante a germinação, fornecendo aminoácidos para o desenvolvimento da plântula. As leguminosas praticamente não armazenam prolaminas e glutelinas, podendo ser consumidas por portadores de doença celíaca (intolerância à gliadina e proteínas semelhantes). As proteínas de reserva desses grãos são predominantemente globulinas, enquanto uma fração minoritária de albuminas é composta por enzimas e outras proteínas biologicamente ativas (inibidores enzimáticos; lectinas). 10 As proteínas de leguminosas são relativamente pobres em aminoácidos sulfurados (metionina e cistina, principalmente) e em triptofano, mas contém quantidades de lisina muito superiores às dos cereais. Assim, com relação ao balanço nutricional de aminoácidos, cereais e leguminosas são considerados complementares. O grau de complementação mútua, no entanto, é limitado pelo teor de outros aminoácidos: triptofano em leguminosas e milho, por exemplo. A biodisponibilidade de leguminosas é considerada significativamente menor do que as proteínas de origem animal, o que é atribuído a dois fatores principais: a) Estrutura compacta (globular), resistente à proteólise, das proteínas de reserva; e b) a presença de fatores antinutricionais (KOBLITZ, 2011). Lipídios A fração lipídica em grãos de leguminosas é particularmente variável, uma vez que algumas espécies armazenam lipídios como sua principal fonte energética, enquanto, outras espécies armazenam predominantemente amido. Em geral, a avaliação físico-química do componente lipídico desses grãos resulta em número de saponificação inferior a 200, índice de iodo superior a 120 e baixa acidez, indicando a predominância de ácidos graxos de alta massa molecular e insaturados (KOBLITZ, 2011). Vitaminas e minerais As vitaminas do complexo B são mais importantes em leguminosas amiláceas, enquanto a atividade de vitamina E, em virtude da presença de tocoferóis, é mais abundante em leguminosas oleaginosas. As leguminosas são particularmente ricas em potássio e fósforo (Tabela 3) (KOBLITZ, 2011). TABELA 3 - Teor de minerais em variedades de feijão (mg/100g) Amostra Na K Ca Mg Mn Fe Cu Zn P Vigna 1 7 2.899 161 350 1,40 18,9 4,3 5,0 412 Vigna 2 10,6 1.146 132 158 1,36 21,6 2,9 4,2 345 Phaseolus 1 4,2 2.324 180 295 1,50 35,1 6,2 2,7 362 Phaseolus 2 7,5 1.960 91,4 180 0,08 32,5 2,5 2,5 245 Fonte: Koblitz (2011) 11 Outros compostos Conforme Koblitz (2011), as leguminosas são ricas em compostos considerados fatores antinutricionais que se desenvolvem ao longo da evolução dessas plantas, possibilitando a redução de sua predação e o aumento de sua sobrevivência. Esses fatores podem ser divididos em fatores antinutricionais proteicos e não proteicos. Fatores antinutricionais proteicos - Inibidores de hidrolases Os mais importantes são os inibidores de tripsina e α-amilase, que apresentam importante ação protetiva contra o ataque de insetos. São polipeptídios que podem ser inativados, por desnaturação térmica, durante o cozimento. Sua atividade residual é responsável, em parte, pela baixa digestibilidade do amido e dos grãos de leguminosas. - Lectinas São compostos proteicos capazes de se ligas à carboidratos e que apresentam grande afinidade por glicoproteínas. Algumas lectinas tem ainda atividade de hemaglutininas e podem causar hemólise. São consideradas agentes de resistência contra a predação por mamíferos, sendo bastante resistente contra herbívoros e roedores. Assim, como os inibidores enzimáticos, o caráter proteico das lectinas faz com que possam ser desativadas pelo calor. No entanto sendo, o tratamento térmico ineficiente, pode ser encontrada atividade residual em produtos cozidos e/ou processados. As lectinas são capazes de atacar células da mucosa intestinal, causando danos (hemorragias) que podem levar ao óbito, dependendo da dosagem ingerida. - Alergênicos A presença de proteínas consideradas alergênicas não é esperada em leguminosas, em virtude do baixo potencial de alergenicidade característico das globulinas (principalmente proteínas do grão). No entanto, casos de alergia não são regularmente relatados, sobretudo com amendoim e soja. Em virtude de sua natureza proteica, a maior parte desses fatores antinutricionais podem ser inativados por tratamentos térmicos, mas altas temperaturas por longo tempo tendem a provocar insolubilização das proteínas de reserva, reduzindo sua digestibilidade e absorção e, em consequência, o valor nutricional dos grãos. Assim, 12 para um ótimo aproveitamento as leguminosas devem receber tratamento térmico tal que seja capaz de inativar fatores antinutricionais mas cause a menor perda de proteínas possível. Fatores antinutricionais não proteicos - Ácido fítico, fitina e/ou fitatos Compostos quelantes dos principais minerais presentes nos grãos, são responsáveis pela baixa absorção desses nutrientes no intestino e apresentam ainda atividade inibitória sobre algumas enzimas. Em leguminosas os fitatos são encontrados na forma de inclusões globóides (trechos cristalinos com alto teor de fosfatos) nos corpos de proteína. Sendo compostos altamente termoestáveis, podem ser mais eficientemente inativados por hidrólise enzimática (fitases endógenas ou exógenas), ou ainda em consequência de molho prolongado (16h) em temperatura superior a ambiente (50°). Esse tratamento tem como consequência a lixiviação de fitatos para a água do molho, embora a ativação de fitases endógenas do grão não possa ser totalmente descartada. - Alcaloides Sua presença provoca sabor amargo e certo grau de toxicidade, especialmente em variedades de tremoço (lupinina e lupanina) e em fava (vicina e convicina), por exemplo. Sendo compostos hidrossolúveis de baixa massa molecular, são de fácilremoção por molho e durante o cozimento. - Compostos fenólicos Os principais compostos fenólicos em leguminosas são ácidos fenólicos, flavonoides e lignina. A expressão “ácidos fenólicos” cobre um enorme grupo de substâncias orgânicas cuja classificação é bastante complexa. Em leguminosas são encontrados, sobretudo, taninos e saponinas. Taninos, compostos fenólicos de baixa massa molecular, apresentam a propriedade de formar ligações cruzadas com proteínas, provocando sua precipitação e reduzindo sua digestibilidade, além de conferirem adstringência. Saponinas são glicosídios formados por uma porção lipídica (sapogenina) composta de esteróides ou triterpenos (mais comuns), ligados a uma glicose, galactose 13 ou a uma pentose. Em alguns casos, a fração glicosídica é o ácido glicurônico, o que confere sabor amargo ao produto. Em caráter anfifílico, as saponinas são excelentes tensoativos: emulsificantes e espulmantes. Essa ação pode causar a lise de células da mucosa intestinal, reduzindo a absorção de nutrientes, e apresentar atividade hemolítica. O teor de saponinas varia de muito baixo (˂0,1 g/kg) no amendoim, até elevado (6,5 g/kg) na soja. As espécies Phaseolus apresentam tores intermediários de saponinas (2,5 a 3,5 g/kg). Alguns trabalhos atribuem às saponinas atividade antitumoral e anticancerígena, além da propriedade de reduzir o colesterol sérico, provavelmente através da sua capacidade de ligar ácidos biliares e colesterol no intestino. São classificados como flavonoides os seguintes compostos: flavonas, isoflavonas, flavonóis, flavanonas, chalconas, antocianidinas e catequinas. Em leguminosas os principais flavonoides presentes são as antocianidinas dos feijões e as isoflavonas da soja. A lignina faz parte da parede celular de vegetais, conferindo impermeabilização e rigidez, ligada de modo covalente ou por ligações de hidrogênio aos carboidratos da fração hemicelulósica. Representa cerca de 1,0 a 4,0% da massa total dos grãos e, juntamente com a celulose, é computada como fibra insolúvel. LEGISLAÇÃO E CONTROLE DE QUALIDADE Classificação Segundo Koblitz (2011), o padrão oficial de classificação dos grãos – com os requisitos de identidade e qualidade intrínseca e extrínseca, a amostragem e a marcação ou rotulagem – é definido pelo Regulamento Técnico de cada produto, mediante Instruções Normativas ou Portarias do Ministério da agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA). Em geral, os grãos são classificados em grupo e classe – de acordo com características varietais ou de comercialização – em tipo – de acordo com a presença de defeitos, impurezas, matéria estranha etc. Resultados de umidade acima do determinado não levam a desclassificação ou rejeição do lote, mas devem ser informados ao comprador. Para melhor classificação por tipos, são necessárias as definições apresentadas a seguir: 14 Grãos Danificados ou avariados: São os que se apresentam danificados pelo calor, por insetos e/ou outras pragas, ardidos, mofados, germinados, esverdeados, chochos, bem como os quebrados (fragmentados). Grãos Danificados pelo Calor (queimados): São grãos inteiros ou quebrados que apresentam a coloração do endosperma ou do cotilédone diferente da coloração original, no todo ou em parte, devido a ação de temperaturas na secagem ou no armazenamento. Grãos Ardidos: São os grãos inteiros ou quebrados que apresentam a coloração do endosperma ou cotilédone diferente da coloração original, no todo ou em partes, pela ação de processos fermentativos. Grãos Mofados: São os grãos inteiros ou quebrados que apresentam fungos (mofo ou bolor) visíveis a olho nu. Grãos Chochos: São os grãos que se apresentam desprovidos parcial ou totalmente do endosperma ou cotilédone, devido ao incompleto desenvolvimento fisiológico e que vazam através da peneira, cujo crivo e espessura de chapa são determinados para cada grão. Grãos Quebrados (fragmentados): São fragmentos de grãos que vazam através da peneira cujo crivo e espessura de chapa são determinados para cada grão Grãos Germinados: São os grãos que apresentam germinação visível. Grãos Esverdeados: São os grãos que não atingiram a maturação completa e apresentam coloração esverdeada. Grãos Danificados por Insetos e/ou outras Pragas: São os grãos ou pedaços que apresentam danos no germe ou endosperma, resultantes da ação de insetos e/ou outras pragas. Impurezas: partículas oriundas da planta original, tais como: cascas fragmentos do caule e da vagem, folhas, entre outras. Além dos defeitos anteriormente listados, em geral comuns a todos os grãos, cada grão apresenta ainda defeitos específicos. Entre os grãos de amendoim encontram- se podem ser encontrados grãos rancificados (com aroma e cor estranhas devidos a oxidação do lipídio), e entre os grãos de feijão encontram-se os “bandinhas” (quando os cotilédones estão separados, por exemplo). Os produtos que apresentam uma ou mais das características indicadas a seguir são considerados desclassificados, sendo proibida a sua comercialização para alimentação humana: 1) aspecto generalizado de mofo ou fermentação; 2) resíduos de produtos fitossanitários, teor de micotoxinas, de outros contaminantes (sementes de 15 mamonas, por exemplo); 3) mau estado de conservação 4) acentuado odor estranho de qualquer natureza, impróprio ao produto; e 5) presença de insetos vivos no produto destinado diretamente à alimentação humana. Controle de qualidade Para assegurar a qualidade de grãos em geral, a principal característica a ser verificada é sempre o teor de umidade. De acordo com a legislação nacional, esse teor deve ser avaliado pelo método convencional em estufa a 103° por 72, a 135°C por 2h ou em pressão reduzida (25mmHg) a 98 a 100°C por 5h. Podem também ser aplicados métodos indiretos, desde que calibrados com base no método convencional. As metodologias aprovadas são aquelas preconizadas pela American Association of Cereal Chemists (AACC) e incluem: determinação de constante dielétrica (AACC: método 44 a 11) e destilação azeotrópica com tolueno (AACC: método 44 a 51). Mais recentemente, métodos que envolvem a espectrometria em infravermelho (reflectância na região do infravermelho próximo) têm se mostrado extremamente confiáveis e rápidos. Soja – MAPA, Instrução Normativa 11 (DOU 16/5/2007), alterada parcialmente pela Instrução Normativa 37 (DOU 27/7/2007) De acordo com o uso proposto, a soja é classificada em dois grupos: Grupo I: soja destinada ao consumo in natura Grupo II: soja destinada a outros usos. De acordo com a coloração do grão, a soja é classificada em duas classes: I – Amarela: constituída de soja que apresenta o tegumento de cor amarela, verde ou pérola, cujo interior mostra-se amarelo, amarelado, claro ou esbranquiçado em corte transversal, admitindo-se até 10% de grãos de outras cores. II – Misturada: aquela que não se enquadra na classe amarela. Soja dos grupos I e II será classificada em dois tipos definidos em função da sua qualidade, de acordo com os percentuais de tolerância. A umidade máxima de recomendada para a soja é de 14%. Feijão - MAPA, Instrução Normativa 12 (DOU 31/3/2009), alterada parcialmente pela Instrução Normativa 56 (DOU 24/11/2009) A umidade máxima recomendada para o feijão é de 14%. 16 Classificação do feijão em grupos e classes Classes Tolerância Grupo I Phaseolus vulgaris (Feijão comum) Branco Preto Cores Misturada 97% de brancos 97% de pretos Até 10% de outras coresNenhuma das anteriores Grupo II Vigna unguiculata (Feijão- fradinho) Branco Preto Cores Misturada 90% de brancos 90% de pretos Até 10% de outras cores Nenhuma da anteriores 17 REFERÊNCIAS EMPRESA BRASILEIRA DE PESQUISAS AGROPECUÁRIA-EMBRAPA. http://www.cnpt.embrapa.br/biblio/li/li01-forrageiras/cap9.pdf. Acesso em 25/05/2014. AFONSO, S. M. E. Caracterização Físico-Química e Actividade Antioxidante de Novas Variedades de Feijão (Phaseolus vulgaris L.). Dissertação de mestrado,Instituto politécnico de Bragança, SP, 2010. KOBLITZ, M. G. B. Matérias-primas alimentícias: Composição e Controle de Qualidade. Editota Guanabara Koogan. 1ª Ed. 2011. PENHA, L. A. O.; FONSECA, I. C. B.; MANDARINO, J. M.; BENASSI, V. T. A Soja como alimento: Valor nutricional, benefícios para a saúde e cultivo orgânico. B.CEPPA, Curitiba, v. 25, n. 1, p. 91-102, 2007.
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