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Arbitragem em direito societário Pedro A. Martin fls. 1 até 119

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ARrBilRAGEM NO 
DIREITO SOCIETÁRIO 
"A QyARTIER LATIN teve o mérito de dar início a uma nova 
fase, na apresentação gráfica dos livros jurídicos, quebrando a 
frieza das capas neutras e trocando-as por edições artísticas. 
Seu pioneirismo impactou de tal forma o setor, que inúmeras 
Editoras seguiram seu modelo." 
I VES G ANDRA DA SILVA MARTINS 
Editora Quartier Latin do Bra,sil 
Empresa Brasileira, fundada em 20 de novembro de 2001 
Rua San ro Amaro, 3 16 - CEP O 1315-000 
Vendas: Fone (1 1) 3101-5780 
Ema i 1: quarcierla[i n@quarrierlatin.ar[. br 
Si[e: www.quarcierlarin.an.br 
PEDRO A. BATISTA MARTINS 
S6cio de Batista Martins Advogados. Arbitro, consultor e parecerista. Autor de 
livros e diversos artigos sobre arbitragem e outros ramos do Direito. Membro do 
Corpo de Árbitros de diversas instituições brasileiras e internacionais. 
Coautor da Lei Brasileira de Arbitragem. 
ARBITRAGEM NO 
DIREITO SociETÁRIO 
Editora Qyartier Latin do Brasil 
São Paulo, inverno de 2012 
quartierlatin@quartierlatin.art.br 
www.quartierlatin.art.br 
EDITORA QUARTIER LATIN DO BRASIL 
Rua Sanro Amaro, 316 - Centro - São Paulo 
Contato: qWlrtierlatin@quartierlatin.art.br 
www. quartierlatin. art.br 
Coordenação editorial: Vinicius Vieira 
Diagramação: José Ubiratan Ferraz Bueno 
Revisão gramatical: Rafael Almeida 
Capa: Eduardo N allis Villanova 
MARTINS, Pedro A. Batista - Arbitragem no Direito Societário-
São Paulo: Qy.artier Latin, 2012. 
ISBN 85-7674-630-1 
1. Arbitragem. 2. Direito Societário. I. T ítulo 
Índices para catálogo sistemático: 
1. Brasil: Arbitragem 
2. Brasil: Direito Societário 
TODOS OS DIREITOS RESERVAD OS. Proibida a reprodução total ou p-arcial, por qualquer meio ou processo, especialmente 
por sistemas gráficos,microfilmicos,fotogr.ificos,reprográficos, fonográficos, vidcográficos. Vedada a memorização e/ou a recuperação 
total ou parcial, bem como a inclusão de qualquer parte desta obra em qualquer sistema de processamento de dados. Essas proibições 
aplicam-se também às características gr'.úicas da obra e à sua cditomção. A violação dos direitos automis é punível como crime (art. 184 
e parágrafos do Código Penal), com pena de prisão e multa, busca c apreensão e indenizações diversas (arts. 101 a 110 da Lei 9.610, 
de 19.02.1998,Lci dos D ircitosAummis). 
SUMÁRIO 
Prefácio - Arnoldo Wald ......... ..... ...... ............ ................ ...................... . 
Notas Introdutórias - Nelson Eizirik .................. .... ...................... ...... . . 
Nota do Autor .......... .... ................... .... ... ..... ......... ........... ....... .... ...... ..... . 
Introdução 
Abordagem Metodológica e Estrutura do Trabalho, 19 
Capítulo 1 
Arbitragem Como Paradigma de Justiça para Os Grupos Sociais. 
Uma Visão Filosófica, 27 
1. Inexiste Monopólio Judiciário ............... ...... ................ ..... ................ . 
2. Liberdade: Espinha Dorsal da Arbitragem ............ ........... ..... .......... . 
3. Arbitragem. Breve histórico. Meio Viabilizador da Justiça .... ...... .... . 
4. A Indesejável Intervenção Estatal .... ............ ..... ....... .... ...... ............... . 
Capítulo 2 
Prevalência da Maioria como Princípio Social lnarredável, 41 
Capítulo 3 
As Distintas Correntes sobre a Natureza Jurídica das Sociedades 
Anônimas Não Meta a Eficiência Jurídica da Arbitragem, 53 
Capítulo 4 
9 
15 
17 
2 8 
34 
35 
38 
Arbitrabilidade Subjetiva. A Inserção de Cláusula de Arbitragem 
nos Estatutos de Sociedade Anônima Aberta, por Maioria de Votos, 
e a Imposição de seus Efeitos a Todos os Acionistas, 71 
1. Introdução.... ........ .... ........... ..... ...... ...... ..... ........... ..... ....... .... .. ............ 7 2 
2. Breve Histórico das Sociedades Anônimas . ... ..... ........ ... ... ... .............. 7 3 
3. A Limitação de Responsabilidade ....... ............ ........... ..... ................ .. 7 5 
4. O Princípio Majoritário ..... ..... ...... ................ ...... ..... ..... ..... ........... .... . 
5. As Limitações ao Poder de Controle ................. ..... ............ .............. . 
6. A Arbitragem Não Afronta os Ditames Aplicáveis às 
Sociedades Anônimas ..... ...... ............ ......... ...... ..... ...... ......... · · ..... · · · · · · ·· · 
78 
91 
99 
6.1. O Ramo Societário e o Princípio Deliberativo que Norteia ..... . 
6.2. Há Sujeição e Não Renúncia a Direito .............. .. .................... . 
6.3. Não há Vício na Introdução, por Maioria, de Cláusula 
Compromissória Estatutária ........................... ..... ........... .......... .... . 
7. Arbitragem como Meio Eficaz de Governança Corporativa ......... ... . 
8. O Estatuto Social como Contrato de Adesão. 
Argumento Impertinente ... ............. ............... ............................... ..... . 
9. A Natureza e a Força Jurídica da Manifestação de Vontade em 
Assembleia Geral de Alteração Estatutária ............................ ............ . 
10. A Vinculação de Diretores Estatutários, Conselheiros de 
Administração e Fiscal aos Efeitos da Cláusula Compromissória 
Constante de Estatuto Social ............................................................. . 
11. A Cessão de Ações e a Eficácia Continuativa da Cláusula 
Arbitral Estatutária .................. .......................... .... ............................ . 
12. Vinculação dos Novos Acionistas à Convenção Arbitral 
99 
104 
106 
112 
119 
125 
131 
141 
Estatutária nas Operações de Incorporação, Fusão e Cisão ................ 152 
13. Observação quanto a Arbitrabilidade Subjetiva de Disputas 
Oriundas das Deliberações que Aprovam a Incorporação, 
a Fusão ou a Cisão...................... ... ............................. .... .. .... ............... 15 6 
14. Transformação de Tipo Societário e Vinculação Subjetiva 
à Arbitragem .... ..................... ............................ .................................. 162 
Capítulo 5 
Arbitragem e Empresas sob Controle Estatal, 163 
Capítulo 6 
Arbitrabilidade Objetiva. Enfoque Relativo a Certas Qyestões 
Societárias e sua Submissão à Arbitragem, 175 
1. Nota Introdutória........................................................................... .... 176 
2. Indisponibilidade e Ordem Pública. Normas Imperativas................ 177 
3. A Arbitrabilidade dos Conflitos de Natureza Negocial.............. ...... 185 
4. A Disponibilidade dos Direitos Políticos ......... ........................ ....... .. 192 
5. A Arbitrabilidade dos Conflitos Relativos à Constituição 
da Sociedade .. . . .. . . . ... . . . ... . . ..... ... .. ... . . . ... . . ..... ..... ... .. ..... .. . .. .. ... .. ...... .. . .... .. 19 7 
6. A Arbitrabilidade das Qyestões Objeto de Impugnações de 
Deliberações Assembleares ............................. ..................................... 204 
6.1. A Decisão Arbitral Vincula Todos os Acionistas ............. ........ . 
6.2. Caso em que a Deliberação Assemblear Qyestionada 
Atinge Direitos de Terceiros ......................... ............................... .. 
7. Arbitragem e a Ação de Responsabilidade 
contra Administradores ................. .......... ................. ..... ..... ...... .......... . 
8. Arbitrabilidade das Q,Iestões que Envolvem o Direito de Recesso .... . 
9. Arbitrabilidade das Demandas Objeto de Dissolução 
da Sociedade ....................................................................................... . 
Bibliografia, 229 
L Livros ... .................. ....................... .... ..................... .. ..... ..................... . 
11. Artigos de Periódicos ................................ ....................... · · · · .... · · · · · · · · · · 
111. Decisões Judiciais .............. ...... ............ ..... ..... ........... ....................... . 
IV. Legislação ......... .................. ............................................................. . 
210 
211 
218 
221 
222 
231 
234 
236 
236 
PREFÁCIO 
Na ampla bibliografia brasileira referente à arbitragem, a obra de Pedro 
Batista Martins referente à sua aplicação no direito societário se destaca, consti-
tuindo uma contribuição importante e oportuna ao nosso direito e ao direito 
comparado. É um trabalho original, feito com a profundidade e o estudo minu-
cioso, que caracterizam a obra científica apresentada à Universidade, mas, tam-
bém, com a riqueza do conhecimento dos problemas práticos e das suas soluções, 
que decorre da atuação do autor, que, já há longo tempo, se especializou na 
matéria. Efetivamente, Pedro Batista Martins participou ativamente do de-
senvolvimento da arbitragem, como coautor do anteprojeto da nossa lei, como 
advogado militante, e como árbitro nacional e mundialmente reconhecido. É, 
também, autor de vários livros e de numerosos artigos sobre o tema, bem 
como conferencista nos principais congressos realizados nos últimos quinze 
anos, no Brasil e no exterior. 
Os seus conhecimentos e a sua experiência permitiram que reunisse no 
livro, que ora nos apresenta, não só a teoria, mas também a prática, o direito 
vigente e a sua história, a legislação, a jurisprudência e a doutrina, tanto brasi-
leiras como estrangeiras, e, finalmente, o funcionamento efetivo da arbitra-
gem, em todos os aspectos que reveste nos conflitos societários. 
Cabe salientar que o assunto é da maior atualidade e faz a simbiose das 
relações entre dois institutos em fase de grande transformação, no mundo 
inteiro e, especialmente, no Brasil: a sociedade comercial e a arbitragem. É 
uma nova fase da história do direito, no qual as soluções arbitrais não mais se 
limitam a serem aplicadas nos conflitos individuais, mas passam a abranger 
situações coletivas de grande dimensão institucional, tratando da criação, da 
organização e do funcionamento das sociedades, com os conflitos de poderes 
que, muitas vezes, nelas surgem. 
A relevância da matéria é tanto maior que as sociedades comerciais estão 
aderindo progressivamente aos princípios da governança corporativa, ocorren-
do, assim, uma democratização da empresa, incentivada e determinada pela 
própria legislação. Passa-se, pois, do comando piramidal, com uma hierarquia 
rígida, que existia no passado, para um sistema de coordenação, equihbrio e 
harmonia dos poderes, que também enseja a multiplicação dos conflitos. A 
abertura do capital de um número cada vez maior de empresas, com a criação 
de grupos de controle, que substituem o controlador único do passado, e, até, 
a pulverização da participação acionária, enseja um novo contexto societário, 
no qual os atos dos vários órgãos podem ser conflitantes e contestados. É um 
dos aspectos da chamada "revolução invisível", da qual falava Peter Drücker. 
Ora, há numerosas razões para que os problemas societários não sejam 
submetidos ao Poder Judiciário. Além da complexidade que apresentam, e 
com a qual nem sempre os juízes estão familiarizados, o tempo de duração 
dos processos não se coaduna com o dinamismo empresarial. Acresce que o 
litígio, quando conhecido pelo público, pode afetar a imagem e até o crédito 
da empresa, de modo que a confidencialidade é uma garantia para se obter 
uma solução dos conflitos, com o mínimo de prejuízo social. 
Se a multiplicação das arbitragens societárias é mundial, ela se justifica 
ainda mais em nosso país, no qual a consolidação do mercado de capitais é 
relativamente recente. Em menos de vinte anos, aumentou o número de socie-
dades de capital aberto existentes, não só de direito, mas também de fato, 
cresceram as joint ventures sob todas as formas, e as empresas brasileiras passa-
ram a receber um maior volume de capital estrangeiro e, também, começaram 
a sua implantação no exterior. Adicionalmente, em virtude do investimento 
direto do capital estrangeiro, passamos a ter associações entre acionistas, que 
têm formação cultural e finalidades diversas, dando margem a divergências 
que exigem soluções rápidas e equitativas. Assim, estão sujeitas à arbitragem 
as relações entre acionistas majoritários e minoritários, ou entre sócios com 
participações iguais, as existentes entre administradores e sócios, enfim, toda a 
vida interna da empresa, abrangendo a interpretação dos estatutos ou do con-
trato social e dos acordos de acionistas. 
Durante longo tempo, a arbitrabilidade desses conflitos ensejou algu-
mas dúvidas e opiniões divergentes, alegando-se tanto o caráter institucional 
da sociedade como o fato de serem imperativas as normas de direito societário. 
Tais argumentos não mais prevalecem, em virtude, inicialmente, do trabalho 
da doutrina, mas, já agora, em decorrência da lei, que, em boa hora, consagrou 
definitivamente a arbitragem na matéria. Legem habemus. 
O grande mérito da obra de Pedro Batista Martins consiste em ter resol-
vido de vez todos esses problemas, invocando, inclusive, o princípio da maio-
ria, que deve predominar na sociedade comercial, sem prejuízo das garantias 
dadas aos minoritários, que, todavia, não abrangem a exclusão da arbitragem. 
O autor une as suas qualidades de comercialista e de processualista, para 
invocar a necessidade de soluções eficientes para os problemas societários, tratan-
do tanto da arbitrabilidade subjetiva corno da objetiva e refutando brilhante-
mente os argumentos dos poucos juristas que ainda não se convenceram da 
necessidade de consagrar a arbitragem como meio adequado de resolver os 
litígios societários. 
Partindo dessas premissas, evidencia que a arbitragem também pode e 
deve ser utilizada pelas sociedades de economia mista, conforme jurisprudên-
cia pacífica do STJ, e que a cláusula compromissória constante do estatuto 
vincula os diretores estatutários e os membros dos Conselhos de Administra-
ção e Fiscal. Outras questões interessantes tratadas são a vinculação, à cláusula 
compromissória estatutária, dos cessionários de ações, como, também, dos novos 
acionistas, nos casos de incorporação, fusão, cisão, e transformação da socieda-
de. Também esclarece quais são as questões negociais em relação às quais o 
árbitro pode funcionar, e como deve proceder a fim de evitar a denegação de 
justiça, a paralisação da empresa ou, até, a dissolução da companhia. São tam-
bém interessantes e elucidativas as considerações sobre o uso da arbitragem 
em relação aos chamados direitos políticos, salientando o autor que, em pri-
meiro lugar, são eles direitos de repercussão econômica e, consequentemente, 
disponíveis na maioria dos casos. Por outro lado, certamente cabe a arbitragem 
para assegurar às partes o exercício do seu direito de voto, embora, em tese, o 
árbitro não se possa substituir ao acionista para eleger diretor ou conselheiro, 
sem prejuízo da aplicação de sanções no caso de inadimplemento da obriga-
ção de eleger os membros dos vários órgãos da sociedade, na forma estabeleci-
da nos estatutos ou acordos de acionistas. 
O autor enfrenta, ainda, com bons argumentos, a arbitrabilidade dos 
conflitos relativos tanto à constituição da sociedade, abrangendo a sua nulida-
de, como às impugnações de deliberações societárias e dos seus efeitos em 
relação a todos os acionistas, e, ainda, a arbitrabilidade das questões envolven-
do o exercício do direito de informação e do direito de recesso. 
Numa atitude também muito construtiva e pioneira, admite o autor a 
arbitrabilidade da dissolução da empresa, especialmente quando não está em 
falência, sendo também admissível o uso da arbitragem na recuperação de 
empresas. 
Há três ideias que são essenciais na obra de Pedro Batista Martins e 
constituem, em certo sentido, os fundamentos básicos do seu ensinamento. 
Em primeiro lugar, nada impede a utilizaçãoda arbitragem para fazer incidir 
leis imperativas ou até de ordem pública, que serão aplicadas pelo árbitro, 
tendo este, para tal fim, a mesma competência que o juiz. Em segundo lugar, 
o árbitro é um juiz sem poder coercitivo, podendo, pois, praticar todos os atos 
e tomar as decisões que cabem ao judiciário. Somente sofre eventuais limita-
ções quando se trata da execução coativa das decisões, necessitando, pois, do 
apoio do Poder Judiciário. Uma das ideias-força da tese é, pois, a existência de 
urna parceria público-privada com vistas à prestação dos serviços judiciários, 
que, no entendimento do autor, fortalece e até rejuvenesce a arbitragem. 
Outro aspecto da tese que nos parece da maior relevância é a visão que o 
autor tem do caráter de verdadeiro instrumento social da arbitragem e da 
função teleológica do árbitro. Reconhecendo, com a melhor doutrina recente, 
que a ordem pública societária se caracteriza pela sua relatividade e incerteza, 
o autor atribui ao árbitro a função não só de resolver as disputas, mas também 
de fazê-lo de modo eficiente e equitativo. Trata-se de não olhar somente para 
o passado, mas de encontrar fórmulas equilibradas para a convivência dos 
sócios e a sobrevivência da sociedade- se possível - no presente e no futuro. A 
doutrina arbitral deve, assim, adotar os princípios que regem o nosso Código 
C ivil: a eticidade, a solidariedade e a socialidade. 
Não se trata mais de examinar cada cláusula do contrato e os litígios dela 
decorrentes como constituindo uma unidade, um átomo, mas é preciso colo-
cá-los no contexto das relações entre as partes, examinando o passado das 
mesmas e construindo o seu futuro. Adotando a lição de Eduardo J. Couture, 
o autor considera que "interpretar é alguma coisa mais do que descobrir, é 
relacionar", e, também, de acordo com E mílio Betti, é o ufficio di vivificare. 
Do mesmo modo, inspirando-se na doutrina francesa, vê na jurisdição 
arbitral mais do que um instrumento para a solução de angústias conflituosas, 
pois almeja garantir a paz social, sendo catalizador da mesma. O árbitro, como 
o juiz, abandona, assim, o papel passivo que tinha no passado, para "encami-
nhar soluções, enfatizar o que é útil e sancionar os abusos". Ao juiz pacifica-
dor, que se limita a ouvir as partes e a verificar se as regras legais foram 
devidamente aplicadas, substitui-se, assim, o juiz ativo, construtor e indutor 
ou criador de soluções adequadas, que já se denominou "o juiz treinador" (!e 
juge entraineur}. 
Há, assim, três funções que são exercidas pelo árbitro. Em primeiro lu-
gar, cabe-lhe resolver o litígio que lhe é submetido de modo eficiente ou, 
conforme o caso, induzir as partes a encontrarem soluções negociadas que, 
algumas vezes, não podem ser determinadas pelo tribunal arbitral. Em segun-
do lugar, ele participa da construção da jurisprudência arbitral, cuja evolução 
se reveste de maior importância, especialmente nas fases de grandes transfor-
mações sociais ou tecnológicas, nas quais se torna maior o atraso da legislação 
e da jurisprudência em relação aos fatos. 
Finalmente, ele é um garantidor da paz social, e, especialmente, da so-
brevivência da empresa num clima construtivo e de harmonia. Pode-se, até, 
concluir que, na arbitragem societária, ele tem, ou pode ter, uma competência 
maior do que a do juiz, quando ela lhe é atribuída pelas partes, para encontrar e 
aplicar soluções inspiradas no pragmatismo ético. Cabe-lhe conciliar a eficiên-
cia e a rapidez exigidas pelos problemas da companhia, com a escala de valores 
que se impõe nas relações comerciais, a função social da empresa e a segurança 
jurídica. Para tanto, poderá recorrer não só à legislação aplicável ao contrato, 
mas, também, à sqft law e à !ex mercatoria, cujos princípios estão, hoje, conso-
lidados em vários instrumentos internacionais. 
A obra de Pedro Batista Martins não se limita, pois, a ser urna excelente 
consolidação do que de melhor se escreveu na matéria, mas também abre 
novos caminhos para a arbitragem no direito societário e o faz com coragem, 
excelente argumentação e lógica irrefutável. Na batalha que se trava pela com-
pleta aceitação da arbitragem nos conflitos societários, o livro evidencia a vitó-
ria dos que defendem a tese pro arbitrandum. 
Em conclusão, cabe lembrar a lição de Tullio Ascarelli, quando ensina 
que, ''na atual crise de valores, o mundo pede aos juristas ideias novas, mais do que 
sutis interpretações". São essas ideias novas e construtivas que encontramos na 
obra de Pedro Batista Martins. 
ARNowo W ALD 
NoTAS I NTRoouTóRIAs 
Foi com grande prazer que aceitei o convite do Autor para escrever estas 
notas de introdução ao seu excelente livro. 
Pedro Batista Martins tem participado de maneira brilhante do desen-
volvimento da arbitragem. Foi coautor do anteprojeto que resultou na L ei 
9.307/1996, escreveu vários livros e artigos sobre a matéria e tem destacada 
atuação na prática da arbitragem, quer como advogado, quer como árbitro. 
A arbitragem tem inequivocamente apresentado enorme desenvolvimento 
nos últimos anos, entre nós, particularmente após a declaração de sua constitu-
cionalidade pelo STF, em 2011. ~em quer que atue na área do Direito E m-
presarial sabe que praticamente não há acordo de acionistas ou contrato de 
maior complexidade em que não se preveja cláusula compromissória. 
O Autor enfrenta no presente livro tema de maior atualidade, uma vez 
que cada vez mais os litígios societários, por sua própria natureza, serão resol-
vidos pela via arbitral. 
A Lei das Sociedades por Ações sofreu alterações importantes com a 
promulgação da Lei n° 10.303/2001, a qual introduziu uma série de modi-
ficações, com intuito de adequar o mercado de capitais brasileiro às práticas 
de governança corporativa mais avançadas. Uma das alterações mais impor-
tantes foi a inserção do §3° ao artigo 109 da Lei das S.A., permitindo que as 
companhias prevejam em seus estatutos cláusulas compromissórias aplicáveis 
a disputas oriundas das relações entre a companhia e seus acionistas ou entre 
os acionistas minoritários e o acionista controlador. 
A arbitragem no direito societário é mais vantajosa do que a solução de 
litígios pela via do Judiciário, pois permite que as relações corporativas possam 
ser mantidas a longo praw. Essa situação decorre do fato de a arbitragem ser um 
mecanismo alternativo de solução de controvérsias em que as partes podem 
determinar a lei aplicável ao mérito do litígio e controlar os custos do procedi-
mento, buscando desenvolver um comportamento mais cooperativo entre elas. 
Ainda que a arbitragem não seja financeiramente adequada para todo e 
qualquer litígio, relações decorrentes de contratos de execução prolongada ou 
situações em que as partes já são antigas parceiras comerciais se ajustam me-
lhor a esse procedimento, que permite a indicação de árbitros especializados 
na matéria. Ademais, permite a solução rápida dos conflitos, o que é de funda-
mental importância para as companhias e os empresários, que não podem ficar 
- - -- ---- - --------------------J 
à espera de decisões por muito tempo, pelos prejuízos evidentes que ocasionam 
tais demoras ao desenvolvimento normal das atividades empresariais. 
O Novo Mercado, segmento especial de listagem das companhias aber-
tas na BM&FBOVESPA, alcançou enorme desenvolvimento nos últimos seis 
anos. Particularmente no ano de 2007 verificamos um significativo aumento 
no número de ofertas públicas de ações; naquele ano, o volume total de recur-
sos captados em ofertas primárias (59 registros) e secundárias (103 registros) 
situou-se na faixa de 67 bilhões de reais. 
Temos, presentemente, 144 companhias abertas com ações listadas no Novo 
Mercado e no Nível2 da BM&FBOVESPA. Tais companhias, dentre outras 
boas práticas de governança corporativa que devem seguir, comprometem-se a 
resolverseus litígios societários pda via arbitral, na Câmara de Arbitragem do 
Mercado. Ou seja, todos os conflitos societários de expressivo número de com-
panhias abertas serão, necessariamente, decididos mediante arbitragem. 
No direito societário, as duas questões mais importantes na decisão dos 
conflitos mediante arbitragem são: a arbitrabilidade subjetiva e a arbitrabilidade 
objetiva. Ou seja, saber quem se submete à arbitragem - questão complexa pois 
envolve o alcance da cláusula compromissória estatutária- e quais as matérias do 
direito societário que, por tratarem de direitos disponíveis, podem ser decididas 
pela via arbitral. O Autor enfrenta com grande proficiência, utilizando argu-
mentos teóricos e práticos, as duas questões. Também analisa, de forma bastante 
completa, a vinculação à cláusula compromissória estatutária dos cessionários de 
ações, bem como dos novos acionistas em hipóteses de reestruturação societária 
decorrente de transformação, incorporação, fusão e cisão. 
São ainda objeto do seu estudo outras questões de direito societário rele-
vantes como: a utilização da arbitragem pelas sociedades de economia mista; a 
arbitrabilidade dos conflitos surgidos na constituição da companhia; a arbi-
trabilidade de questões envolvendo o direito de recesso; a utilização da arbi-
tragem na dissolução e na recuperação da empresa. 
No trato de todas as matérias o Autor, além de revelar-se um entusiasta da 
arbitragem na solução dos conflitos societários, demonstra enorme conhecimento 
teórico do direito brasileiro e do direito comparado e vivência prática na matéria. 
Assim, é com grande entusiasmo que recomendo a leitura desta obra 
pioneira de Pedro Batista Martins. 
NELSON EIZIRIK 
NoTA oo AuToR 
Enquanto no prelo o presente trabalho, a Lei Espanhola de Arbitragem 
(Lei n. 60/2003) mencionada em certas passagens neste livro foi alterada pela 
Lei n. 11, de 20 de maio de 2011, inclusive para inserir artigos sobre arbitra-
gem estatutária. 
Nesse particular, dita lei fixou quorum qualificado - a nosso ver, excessi-
vo - de "dois terços dos votos correspondentes às ações ou participações em que se 
divide o capital social" para a introdução de cláusula compromissória nos esta-
tutos sociais. Incluiu também dispositivo autorizando a sujeição à arbitragem 
das controvérsias que envolvam "a impugnação dos acordos sociais pelos sócios ou 
administradores"". 
Essas alterações - a rigor - não são de todo relevantes para o presente 
estudo, visto que as referências nele constantes à doutrina e decisões espanho-
las quanto a essas alterações são anteriores à Lei n. 11/2011, momento no 
qual as discussões travadas não se encontravam positivadas, tal qual a atual 
realidade brasileira. 
Lei Espanhola n. 11 /201 1, art. 11.bis. (2). Tradução livre. De acordo com o art. 1o da Lei 
Espanhola de Sociedades de Capital, o capital das sociedades anôn imas e de comand1ta por 
ações é dividido em "ações", enquanto o capital das sociedades limitadas e m "participações. 
Le i Espanhola n. 11/2011 , art.11.bis.(3). Tradução livre. Nos te rmos da Lei Espanhola de 
Sociedades de Capital, "acordos sociais" são as deliberações da Assemble1a Geral. 
INTRODUÇÃO 
Abordagem Metodológica 
e Estrutura do Trabalho 
20- ARBITRAGlM NO 0 1RCITO SOCIETÁRIO 
O presente trabalho de investigação tem por objeto analisar e propor 
construções jurídicas sobre questões que envolvem a adoção do instituto da 
arbitragem no seio das sociedades anônimas abertas, notadamente no que diz 
com o direito brasileiro e espanhol. 
Trata -se, portanto, de estudo voltado para os temas e obstáculos que 
surgem na adoção da arbitragem para a solução de conflitos interna corporis. 
Com isso restam afastadas, portanto, as matérias atinentes ao uso da arbitra-
gem nas relações das empresas com terceiros, sejam parceiros, fornecedores ou 
contraparte em atos de comércio e demais negócios empresariais. 
Por suposto, não é pretensão deste trabalho esgotar todas as matérias e 
debates que podem surgir de tema tão amplo, notadamente no que toca a 
arbitrabilidade objetiva das controvérsias societárias, razão pela qual o estudo 
se concentra em determinados temas de relevância e cuja prática societária é 
mais usual. 
Não se está a pretender fazer uma análise profunda e conceitual dos dis-
tintos institutos e hipóteses de direito societário, exceto no limite necessário de 
se verificar seu potencial impacto positivo ou negativo no que tange a eficácia da 
cláusula compromissória constante dos estatutos sociais da companhia. 
Para levar a cabo esse objetivo, é preciso, previamente, fazer uma breve 
referência à terminologia empregada. Muito embora o estudo trate de hipóte-
ses atinentes aos direitos espanhol e brasileiro, a bem da verdade tanto os 
conceitos como os nomen juris insertos no direito arbitral quanto no direito 
societário de cada um desses países bastante se aproximam a despeito de certas 
nuances e diferenciações. 
Por essa razão, em grande parte do trabalho me refiro ao tema objeto de 
atenção a partir de uma proposição comum aos distintos sistemas jurídicos. 
Tal é possível dada a universalização dos princípios que norteiam a arbitra-
gem e a aproximação de muitos dos conceitos lançados nas leis brasileira e 
espanhola de arbitragem, respectivamente, dos anos de 1996 e 2003. 
Nesse particular, ressaltem-se os princípios da autonomia da cláusula com-
promissória e o da Kompetenz-Kompetenz amplamente difundidos em matéria 
de direito arbitral. A autonomia da vontade e a disponibilidade dos direitos são 
outros dois dos pressupostos comuns às legislações espanhola e brasileira. 
O mesmo se pode dizer da orientação jurídica que norteia as legislações 
do anonimato espanhola e brasileira. O regime comum da civillaw as aproxi-
PEDRO A. BATISTA MARTINS - 21 
ma no seu todo, sem embargo de certas distinções naturais mas que pouco 
impactam os fins pretendidos com o presente trabalho. 
O princípio majoritário das deliberações sociais é pressuposto particular, 
relevante e universal às sociedades anônimas. A estruturação das sociedades 
anônimas, com os órgãos que a compõem, os direitos de voto e de fiscalização, 
a responsabilidade dos administradores e a sua dissolução e liquidação estão 
presentes no direito do anonimato espanhol e brasileiro. 
Esses pontos de contacto entre os direitos arbitral e societário de ambas 
as jurisdições, autorizam, regra geral, o desenvolvimento do presente trabalho. 
Sob o ângulo da originalidade do tema como justificativa para sua elabo-
ração penso que esta se afirma tanto do ponto de vista teórico quanto prático. 
Deve-se, de início, a crescente utilização pelas empresas da arbitragem como 
método de resolução de seus conflitos. Conquanto esse incremento seja perce-
bido nas relações que envolvem negócios comerciais com terceiros, o fato é que 
a opção pela arbitragem já se faz notar fortemente nos acordos parassociais (v.g. 
acordos de acionistas) o que tem resultado na sua inserção interna corporis. 
Cresce, portanto, o número de sociedades anônimas que incorporam cláu-
sula de arbitragem nos seus estatutos sociais como forma de solucionar, de modo 
célere e confidencial, os conflitos existentes entre sócios e entre estes e a socieda-
de, incluindo os impasses nas deliberações de seus órgãos sociais. 
Não obstante a difusão da arbitragem no campo societário, ainda é incipien-
te a atuação legislativa nesse particular e também tímida a doutrina a respeito das 
relevantes questões de ordem teórica que se apresentam no seu enfrentamento. 
Em 2003 a Itália dispôs sobre o tema em seu direito positivo; o mesmo 
aconteceu, mais recentemente, no Perú, no ano de 2008. O Brasil tratou da 
matéria de forma genérica, com a introdução de um parágrafo ao art. 109 da 
sua Lei do Anonimato, em 2001. 
A matéria, contudo, é ainda esquecida do legisladorem várias jurisdi-
ções, e mesmo naquelas em que o tema é tratado as questões jurídicas atinen-
tes à arbitrabilidade subjetiva e/ ou objetiva é e continuará sendo objeto de 
muito debate pelos operadores do Direito. 
Se, por um lado, a difusão da arbitragem societária é fato inquestionável, 
de outro, com o surgimento dos conflitos a prática arbitral necessitará valer-se 
dos estudos teóricos disponíveis na literatura jurídica que, diga-se a bem da 
verdade, não são muitos. 
22- ARBITRACFM NO DIRFITO SOCIITÁRIO 
E, nesse ponto, funde-se a originalidade teórica e prática do presente 
trabalho aliada à escassez de material escrito, notadamente de livros específi-
cos e, mesmo, de artigos sobre o tema. 
Registre-se, nesse sentido, a divergência ou a indefrnição em ambos os 
sistemas jurídicos - espanhol e brasileiro - quanto ao alcance da cláusula de 
arbitragem a toda a comunidade de acionistas, nomeadamente àqueles que 
não concordaram expressamente com a sua introdução nos estatutos sociais. 
Dado que na Espanha o direito positivo é silente (conferir Nota do Autor), 
o presente estudo buscou demonstrar, de lege ferenda, através de análise histórica, 
jurisprudencial e doutrinária o melhor sistema de Direito a ser adotado. 
O mesmo se pode dizer quanto ao interesse jurídico brasileiro, haja vista 
que a única disposição legal existente não pôs fim aos debates e às dúvidas que 
a matéria encerra. 
Com efeito, no caso brasileiro, de lege lata, o estudo expressa originalida-
de ao buscar extrair do criticado e discutido dispositivo legal uma gênese e um 
alcance favorável à tese defendida. 
Com a análise da jurisprudência existente e da doutrina, o presente tra-
balho objetiva nortear o contorno e o alcance jurídico de eventual e futura 
regra legal a ser lançada no direito espanhol, bem como direcionar a interpre-
tação do existente sistema jurídico brasileiro. 
Sob o ângulo de projeção prática, ainda se demandará tempo para que os 
tribunais e a doutrina se aproximem, razoavelmente, de um ponto de convergência. 
Ademais, a par do sofrido tema da arbitrabilidade subjetiva, o presente 
estudo enfrenta matéria, não especificamente nas duas jurisdições, qual seja, a 
das controvérsias societárias passíveis de submissão à arbitragem (arbitrabili-
dade objetiva). 
Dada a ausência de previsão legal expressa tanto no direito espanhol 
quanto no brasileiro1, ao presente estudo se impõe uma análise menós legalis-
ta e mais jurídico-interpretativa dos tópicos nele contidos. 
Neste ponto, é importante mencionar que se trata, por conseguinte, de 
um trabalho mais restrito ao Direito Internacional do que ao Direito Compa-
Como salientado, a previsão legal brasileira merece interpretação sistemática c profunda dada 
a generalidade de seu conteúdo que não toca na seara da arbitrabil idade objetiva. 
PEDRO A. BATISTA MARTINS - 23 
rado, embora o tema se trate sempre de uma "zona cinza" na delimitação de 
disciplinas jurídicas nos trabalhos de pesquisa. Segundo Palao Taboada, "cada 
comparatista debe ser también un internacionalista, ya que, de otro modo, aquél no 
puede tener una idea exacta de la medida en que las diferencias de derechos pueden 
constituir un obstáculo en las relaciones internacionales. Se ha dicho, asimismo que 
todo internacionalista deberia ser comparatista"2• 
A ausência de regras próprias e objetivas nos direitos espanhol e brasileiro 
sobre os dois grandes tópicos da presente tese - arbitrabilidade subjetiva e obje-
tiva no direito societário - conduz o trabalho mais para o campo do estudo de 
Direito estrangeiro, com a análise de ordenamentos jurídicos particulares, resul-
tando de suas descrições dados ilustrativos e informativos que possibilitarão 
nortear as ideias e construções jurídicas apresentadas e defendidas nesta tese. 
Para a elaboração deste trabalho foram examinadas fontes normativas 
' 
nomeadamente as leis societárias e de arbitragem brasileira e espanhola, e dou-
trina e jurisprudência desses e de alguns outros países. 
Do ponto de vista de sua estrutura, a presente investigação se divide, 
basicamente, em três partes. A primeira traz uma abordagem filosófica do 
instituto da arbitragem que, a par de encerrar uma introdução, estende suas 
reflexões para a melhor compreensão dos seus paradigmas visando com isso 
nortear a interpretação dos temas que se abordarão à frente. 
Nele se analisam questões históricas, conceituais e dogmáticas atinentes 
à justiça, à liberdade e à regra de coexistência em sociedade, elementos rele-
vantes na defesa deste trabalho. 
Como intróito ao tema da arbitragem no campo das sociedades anônimas, 
o Capítulo 2 apresenta as principais teorias relacionadas à natureza jurídica de 
tais sociedades de forma a demonstrar, conceitualmente, que a arbitragem com 
elas se harmonizam, não obstante a tese ou corrente doutrinária que se adote. A 
natureza jurídica das sociedades anônimas não é fator prejudicial ao uso da 
arbitragem como método de solução das disputas interna corporis. 
Partindo-se, portanto, de uma visão mais ampla e filosófica, o estudo 
passa a reduzir seu foco para a seara das sociedades anônimas, no que diz com 
2 Cf. Palao Taboada, C. "EI Método Comparativo en el derecho Tributaria" . In: Estudios Jurídicos 
en Memoria de Don César Albiriana Carcia-Quintana Vil lar Ezcurra Marta (dir) Madrid IEF 
2008, p. 76. . ' ' ' ' 
24- ARBITRAGEM NO DIREITO SOCIETÁRIO 
as correntes doutrinárias existentes ao redor de sua natureza jurídica e, ato 
contínuo, já em seu Capítulo 3, aborda, especificamente, a matéria da arbitra-
bilidade subjetiva no tocante à cláusula compromissória estatutária. 
Para tanto, inicia-se o estudo com uma parte histórica e conceitual que 
leva o·intérprete a encarar a importância das sociedades anônimas no contexto 
do comércio e da economia mundial e o tripé que a sustenta. 
Desse tripé extrai-se a relevância para as anônimas do princípio da maioria, 
elemento central do desenvolvimento do trabalho e das-conclusões quanto à 
validade e eficácia da cláusula de arbitragem introduzida por maioria nos 
estatutos sociais. 
O estudo desse princípio é apresentado sob o seu prisma histórico e 
contemporâneo. É analisada a evolução legislativa e posta à luz a forte doutri-
na de suporte ao pressuposto majoritário. 
Ainda nesse mesmo capítulo, torna-se imperioso traçar as esferas legais 
que limitam o poder de controle de modo a se demonstrar a legalidade do voto 
majoritário proferido no âmbito de seu restrito escopo. O exercício desse direito 
nos estritos limites legais resta por sufragar a vontade majoritária. A dogmática 
jurídica que norteia o controle do exercício desse poder foi posto à mostra. 
Passa-se, a seguir, a uma análise interpretativa e conceitual do eventual 
ponto de confronto entre os pressupostos essenciais da arbitragem e da socie-
dade anônima de modo a se investigar qual das disciplinas deve prevalecer. 
Esse estudo se faz necessário frente ao preceito da autonomia da vontade e o 
pressuposto majoritário que norteiam cada qual dos institutos e que, aparen-
temente, podem restar confrontados. 
Em suporte à tese da prevalência do princípio majoritário, é importante 
salientar, como feito no trabalho através de informes governamentais, dentre 
outras argumentações, as regras de governança corporativa que hoje são esti-
muladas e não raro impostas às sociedades anônimas abertas. Foi o que se 
procurou demonstrar. 
Como preliminar ao tema da validade e eficácia da cláusula compromis-
sória estatutária inserida por maioria, o trabalho enfrentou, para afastar, a ques-
tão da natureza de adesão dos estatutos sociais. 
Feita essa inicial análise histórica, dogmática e conceitual, passou-se ao 
tema específico da arbitrabilidade subjetiva no que toca aos acionistas da so-
PEDRO A. BATISTA MARTINS - 25 
ciedade, estendendo-o, inclusive,aos diretores estatutários e membros dos 
Conselhos de Administração e Fiscal. 
Mais adiante, nesse mesmo Capítulo 3, o presente trabalho procura de-
monstrar a efteácia continuativa da cláusula compromissória estatutária na hi-
pótese de cessão de participação acionária. Essa análise teve por suporte argumentos 
jurídicos embasados na doutrina e na jurisprudência internacional. 
Nessa seara, o trabalho enuncia a vinculação dos novos acionistas ao convênio 
de arbitragem por força de operações de incorporação, fusão e cisão, bem como 
algumas ponderações sobre a arbitrabilidade subjetiva no que tange aos conflitos 
derivados de acordos que aprovam os atos societários antes mencionados. 
Ao fim, uma breve referência à arbitrabilidade subjetiva oriunda de con-
flitos resultantes da transformação do tipo societário, situação que encerra 
algumas das considerações adotadas aos atos societários antes referidos. 
Dada as características e peculiaridades que ditam as sociedades anôni-
mas sob controle estatal, a arbitrabilidade subjetiva a elas atinentes foi tratada 
em capítulo apartado. Foi dado um enfoque contemporâneo do cenário em 
que elas se encontram inseridas e o da alegada incapacidade jurídica dessas 
empresas se comprometerem, ausentes certas condições prévias. Os princípios 
foram expostos, bem como a nova visão do direito administrativo e a partici-
pação dessas sociedades no comércio internacional. Tudo de forma a afastar 
teses conservadoras que tendam a boicotar a arbitragem nas relações envol-
vendo ditas sociedades. 
Passando-se ao Capítulo 6 e último do trabalho, são enfrentadas certas 
matérias que normalmente resultam em conflitos no seio das sociedades anô-
nimas. A relevância do estudo, nesse particular, diz com o debate existente 
quanto à arbitrabilidade dessas questões. 
Com efeito, dado que somente os direitos disponíveis são passíveis de sujei-
ção à arbitragem, o estúdo enfoca, em seu início, as nuances e diferenças existen-
tes entre as normas de ordem pública e o conceito de indisponibilidade, visto 
que, não raro, alguns doutrinadores os encerram em um mesmo e único campo e, 
consequentemente, postulam pela inarbitrabilidade de grande parte dos confli-
tos societários à luz das normas de ordem pública insertas na lei do anonimato. 
Outra matéria também debatida na seara da arbitrabilidade objetiva des-
ponta dos conflitos de natureza negociai e a possibilidade de o árbitro resolvê-
-los dado que, nesses casos, não se estaria aplicando o direito ao caso concreto. 
26- ARBITRAGI:M NO DIREITO SOCIFTÁRIO 
Em outros termos, ao árbitro somente seria possível dirimir controvérsias de 
direito. O estudo procura mostrar a nova tendência do exercício jurisdicional 
e a irrazoabilidade que esse entendimento resta por gerar. 
Os direitos políticos também são tratados à vista do requisito da patrimo-
nialidade constante da lei de arbitragem brasileira. O voto, expressão maior 
desses direitos, é analisado sob o ângulo do seu exercício finalístico no âmbito 
das sociedades anônimas, de interesse patrimonial, ao reverso daquele exercido 
como expressão da cidadania. Daí se concluir pela possibilidade de sujeição das 
disputas da espécie à resolução por arbitragem. 
Não passa em branco o debate sobre a possibilidade de solução por arbi-
tragem dos conflitos relativos à constituição da sociedade e daquelas objeto de 
impugnações de deliberações assembleares. Nesse contexto, o estudo aborda o 
tema da anulação e da nulidade, bem como a vinculação de todos os acionistas 
à decisão arbitral, pouco importando se tenham ou não sido partes integrantes 
do processo. 
E vai mais além ao tratar, também, das hipóteses em que a decisão as-
semblear questionada atinge direitos de terceiros, tema esse que transita tanto 
pelo plano jurídico quanto pelo prático. A doutrina não olvida o debate e o 
estudo expressa, ainda, visão mais contemporânea no sentido de se flexibilizar 
a participação voluntária de terceiros, à vista dos novos paradigmas da teoria 
geral dos contratos, tais como a mitigação do princípio da relatividade e do 
individualismo. 
A arbitrabilidade dos conflitos que implicam em responsabilização de 
administradores é tratada sob o prisma das ações social e individual com as 
devidas reservas quanto ao efetivo alcance da cláusula compromissória nas 
hipóteses em que o acionista demanda diretamente e em nome próprio contra 
o administrador. 
As questões que envolvem violação a direitos de informação e de recesso, 
assim como aquelas que se referem à dissolução da sociedade, concluem o 
presente estudo e foram objeto de análise conceitual e doutrinária. 
CAPÍTULO 1 
Arbitragem Como 
Paradigma de Justiça para 
Os Grupos Sociais. 
Uma Visão Filosófica 
28- ARBITRAGEM NO DIREITO SOCIETÁRIO 
1. INEXISTE MONOPÓLIO jUDICIÁRIO 
O instituto da arbitragem, na concepção jurídica do termo, ordena siste-
maticamente o conjunto de regras e princípios que norteiam a solução extra-
judicial dos conflitos. 
A finalística do instituto, per se, ressalta toda a sensibilidade sociopolítica 
que envolve a arbitragem. Com ela se busca a solução dos conflitos fora da 
arena estatal. Se, por um lado, a arbitragem funciona como um equivalente da 
justiça comum, em cooperação com o Estado na realização de uma de suas 
tarefas básicas - pacificação dos litígios - , por outro, justamente por essa equi-
valência e imbricamento com uma das funções do Estado, ainda gera (embora 
hoje em rota decrescente) reações políticas e ideológicas de pessoas e grupos 
que não enxergam legitimidade no instituto, reduzindo-o a mera instância 
co~ciliadora, sem qualquer efeito legal, ou mitigando a aplicação de seus pre-
ceitos, de forma a reduzir seu vigor jurídico. 
Essa corrente que minimiza o alcance jurídico da arbitragem sustenta 
seu entendimento na existência de um monopólio do Poder Judiciário, no 
trato da solução das controvérsias, que o coloca como único órgão capaz de 
ditar a definitividade do direito. 
Desse pensamento monopolista do Judiciário se pode abstrair o modelo 
ideológico em que se sustenta essa corrente doutrinária, qual seja, a da valori-
zação do Estado como ente supremo na condução da sociedade e, particular-
mente, na pacificação de suas crises interpessoais. O ponto nevrálgico do modelo 
está na supremacia do Estado frente à vontade individual dos seus jurisdicio-
nados. Somente o Estado pode pacificar os conflitos porque o Estado é o 
único ser legítimo e capaz para executar essa função. 
Esse modelo ideológico, conquanto embasado em fundamentos de Direito aca~a. por dar guarida ao Estado-Providência, de muito paternalismo e pouc~ 
efetlVldade, e a subtrair do cenário jurídico o princípio da autonomia privada que 
dá vida às qualidades individuais, com retorno positivo à sociedade, sob a singela 
alegação da existência de um monopólio Judiciário na realização da justiça. 
E aqui reside um de seus equívocos. Nesse ponto, discordo do pressuposto 
de que todas as crises de relacionamento devam ser objeto de análise judicial. 
Não é razoável se admitir que os litígios somente possam, e devam ser 
resolvidos, efetivamente, pela justiça comum. 
PCDRO A. BATISTA MARTINS - 29 
De antemão, em contraponto a essa pretensa exclusividade judiciária, vê-se 
o cidadão, com certa frequência, no cotidiano de suas relações jurídicas, transa-
cionar o direito e a obrigação objeto da demanda, de modo a prevenir o litígio. 
Mesmo estando em curso o processo judicial, a própria lei autoriza (quiçá, in-
centiva) as partes a transacionarem sobre o objeto em que se funda a ação. 
Com a transação, os interessados põem em marcha, sem a interveniência 
estatal, a autorregulação dos seus interesses individuais, com a resolução do con-
flito por manifestação própria de vontade. Sob outro prisma, a transação exclui a 
participação do Estado e, nem por isso,deixa de produzir todos os efeitos legais. 
Obriga as partes e o próprio E stado ao cumprimento dos termos fixados 
na transação. Destarte, não será mais possível o exercício de ação judicial que 
tenha por frm o objeto de uma controvérsia já superada pelas partes por força 
do pacto privado. A transação opera efeitos constitutivos e, assim, cria, extin-
gue e modifica direitos. 
Na mesma linha de exclusão do Poder Judiciário, não raro o cidadão 
renuncia ao direito de ação, inobstante crer na existência e na consistência de 
seu direito material. Essa renúncia pode ter por causa um interesse negociai 
ou, mesmo, a noção de que o Estado não será capaz de lhe assegurar o bem 
jurídico pretendido, por força de uma hipossuficiência econômica ou pela 
antevista demora na realização da justiça. 
Seja qual for a razão que sustenta a renúncia, o fato que importa é que a 
existência de um monopólio Judiciário não tem caráter absoluto. Ao contrá-
rio, a transação e a renúncia restam por autorizar essa afirmação. 
No entanto, poderão os defensores do Estado monopolista contra-argu-
mentar que a exclusividade na prestação jurisdicional não redunda na obriga-
ção da utilização do Poder Judiciário sempre que um direito é violado. M as, 
funciona, sim, como a única opção para aqueles que tencionam resolver as 
demandas através de um terceiro investido do necessário poder de decidir. Em 
outras palavras, só o Estado é capaz de prover a jurisdição. 
Aqui, me parece, reside o outro equívoco. Confunde-se monopólio da 
justiça com monopólio do Poder Judiciário3 . Essa confusão, repita-se, advém 
do firme posicionamento da prevalência do Estado sobre a vontade das partes, 
em flagrante redução do alcance do princípio da autonomia privada. 
3 O monopólio do Poder judiciário, por princípio, se resume aos di reitos indisponíveis. 
30 · ARBITRAGEM NO D IREITO SOCIETÁRIO 
E, com esse vetor não posso concordar, sobretudo quando a realidade 
sociopolítica exige maior participação do cidadão nas atividades estatais. 
O Estado, como prestador de serviços, tem sido extremamente criticado 
pelos seus usuários. As queixas variam, mas atingem, praticamente, todas as 
áreas em que ele funciona (ou, melhor, não funciona), notadamente a saúde e 
a educação. 
E é por esse sentimento, ao menos em parte, que o Estado-empresário 
resumiu sua atuação, revertendo-a, em sua grande maioria, para as mãos dos 
particulares. Com isso, tende o Estado a focar seus objetivos nas funções que 
lhe são inerentes e básicas ao atendimento dos anseios primários da sociedade. 
Com a desregulamentação e o processo de privatização o Estado confirma 
sua inaptidão para o exercício de atividades mais complexas e de maior esforço 
econômico. E, também, talvez inconscientemente, demonstra maior confiança na 
atuação do particular. Ao menos, pode-se dizer, faz uma aposta na capacidade do 
indivíduo de cooperar na melhoria das condições do Estado. Aposta na sociedade 
e na utilidade para o Estado das múltiplas qualidades individuais nela latentes. 
E é justamente essa cooperação que o Estado busca e o indivíduo reclama na 
relação social. Essa cooperação é expressão de um viés da nova geração do direito, 
voltada para a solidariedade. Estado e indivíduo agem, solidária e harmonicamen-
te, na definição das questões administrativas, políticas e, também, jurídicas. 
Esse fato encontra sustentação na própria concepção do Estado Dem o-
crático de Direito que atua sob a égide da cidadania. Traduz-se no exercício 
da democracia participativa, onde o indivíduo coopera no gerenciamento das 
atividades públicas4 • 
Ao se defrontar com o seu gigantismo e a sua improdutividade, aliados à 
demanda por resultados eficazes nas áreas sociais básicas, constatou o Estado 
sua incapacidade para suprir todas as necessidades da sociedade, seja pelo dis-
tanciamento da realidade social provocado pela própria atuação dos represen-
tantes do povo, seja pela pouca agilidade e mobilidade de seu quadro pessoal; 
4 Segundo Maria Sylvia Zanella di Pietro, "(d)uas idéias são inerentes a esse tipo de Estado: uma 
concepção mais ampla do princípio da legalidade e a idéia de participação do cidadão na 
gestão e no controle da Administração Públ ica." In: Inovações no Direito Administrativo 
Brasileiro, Interesse Público - Revista Bimestra l de Direito Público, IP30, p. 47. 
De ressa ltar que, de acordo com a sua Consti tuição (art. 1 °), a Espanha também se sustenta na 
premissa do Estado Democrático de Direito. 
PEDRO A. BATISTA MARTINS- 31 
ou, mesmo, pela inexistência de recursos suficientes (ou sua inadequada alo-
cação) ao desiderato popular. 
Daí seu encontro com a individualidade social que muito tem a dar e a 
colaborar com o Estado na realização de seus serviços e na concretização de 
várias proposições e políticas de alcance sociais. 
São várias as manifestações nesse sentido, podendo citar o balanço social 
das companhias e a crescente participação dos cidadãos na definição da polí-
tica urbana. 
Também na área legal, cidadãos têm sido chamados a colaborar na ativi-
dade jurisdicional. Como exemplo, temos os institutos da ação popular e da 
ação civil pública, onde cidadãos ou associações detém capacidade processual 
para a propositura de ações de interesse geral. 
Na área da realização da justiça, exemplo clássico é o do Tribunal do Júri, 
onde simples indivíduos, sem qualquer vínculo com o Estado, ditam o direito 
e solucionam o caso concreto, de natureza criminal. 
Registre-se, ainda, que esse encontro Estado-indivíduo, conquanto in-
formado pelo repúdio da sociedade quanto à insuficiência e à ineficiência na 
prestação dos serviços públicos resulta, na verdade, de uma exigência dos ci-
dadãos como usuários dos serviços estatais. 
A sociedade reclama do Estado melhor nível no exercício de suas ativi-
dades, através de uma atuação mais intensa e direta do próprio indivíduo. 
Desse repúdio e dessa exigência resulta um movimento no inconsciente cole-
tivo em proveito da ampliação da autonomia privada. Esse movimento ganha 
corpo como um direito pressuposto para se tornar realidade e, acima de tudo, 
um direito da sociedade. 
Como assinala José de Oliveira Ascensão, "{o} D ireito é o que está na 
sociedade, não é o que é produzido pelo Estado'6 . 
Ou, nas palavras de Eros Grau, "O Estado põe o direito - direito que dele 
emana -, que até então era uma relação jurídica interior à sociedade civil Mas essa 
relação jurídica que preexistia, com o direito pressuposto, quando o Estado põe a lei 
torna-se direito posto (direito positivo}'16 • 
5 
6 
O Direito - Introdução c Teoria Geral, 2• ed., Rio de Janeiro: Renova r, 2001, p. 54. 
O Direito Posto e o Direito Pressuposto, 2' ed. São Paulo: Malheiros, p. 43. 
32- ARBITRAGEM NO DIREITO SOCIETÁRIO 
O direito surge da cultura da sociedade, de sua relação interior e de sua 
dinâmica. Da sociedade brota o direito. É dela que o legislador extrai a norma, 
positivando o direito. 
E, no que toca à justiça, a sociedade reclama da ineficiência na atividade 
dos serviços judiciários. Reclama da inadequação ou, pior, da usurpação de seu 
direito fundamental de acesso à justiça. 
Há tempos que se buscam portas que atendam, de forma efetiva (no 
sentido jurídico de efetividade); a pacificação dos conflitos. 
E, justamente aqui, retorno ao ponto central da questão do monopólio 
do Poder Judiciário. Não há, a meu ver, exclusividade desse poder do Estado 
no que tange à concretização da justiça. Os indivíduos são livres para solucio-
narem suas divergências por todas as formas lícitas, inclusive (mas, nunca, 
exclusivamente), através do Poder Judiciário. 
O monopólio que o Estado deve perseguir é o da salvaguarda e proteção 
da justiça, visto este sob o prisma do devido processo legal substantivo. Sob o 
prisma da observância plena dos direitos fundamentais do cidadão.Sob o 
prisma garantista do Direito. 
Nesse sentido, o que o Estado não pode abrir mão é da concretização da 
justiça, no que toca seus elementos primários, essenciais e fundamentais. 
Explico: o verdadeiro monopólio do Estado diz com o controle de uma 
adequada realização da justiça. Diz com a plena sujeição, de todo e qualquer 
processo de solução de conflitos, aos princípios e garantias fundamentais dos 
jurisdicionados. 
O monopólio é o da justiça, e não do Judiciário, visto sob sua ótica deon-
tológica em que os valores relevantes da sociedade e o devido processo legal são 
preservados. O que o Estado deve assegurar a todos é uma tutela jurisdicional 
justa. E essa pode ser conduzida tanto por particulares, investidos de autori-
dade, quanto por servidores públicos concursados. 
A escolha do modelo de solução dos conflitos não há de ser aquele im-
posto pelo Estado e, sim, aquele manifestado pelo interessado. 
Em outros termos, o indivíduo é que detém o poder de definir a opção que 
melhor atenda seus interesses pessoais. Sua vontade, no particular, é soberana. 
Aqui, estamos com Rousseau quando afirma que '7a soberania del cuerpo político 
PEDRO A. BATISTA MARTINS - 33 
sobre los ciudadanos se asemeja al 'poder absoluto' que el hombre ejerce sobre sus 
miembros. A Estado soberano, individuo esclavo'17• 
A exclusividade da atuação estatal deve se dirigir ao controle dos vícios 
que violem os direitos fundamentais do cidadão e da coletividade, nomeada-
mente, a ordem pública relevante. 
De resto, se o direito violado atinge o patrimônio jurídico do indivíduo, 
cabe a este a faculdade de optar pela forma e pela via que cursará o exercício 
de sua pretensão. 
Ou, mesmo, a renúncia ao exercício do direito de ação. Trata-se de uma 
faculdade inserida na esfera jurídica da autonomia da vontade. Autonomia 
esta que, mais que uma faculdade, é verdadeiro poder, pois se traduz no direi-
to extremo de autorregulação. Encerra o poder de defmir aquilo que mais lhe 
interessa, o que lhe seja mais conveniente, inclusive o de abdicar de direitos e 
de se impôr deveres. 
A autonomia privada se imbrica ao direito da nova geração - pluralismo -, 
como elemento motivador das diferenças. Não como oposição, mas, tão só, como 
algo distinto e cujo fim deve ser o equihôrio das relações. 
Como salienta Daniel Sarmento, "[( ... ) a autonomia da vontade] está 
indissociavelmente relacionada à proteção da dignidade da pessoa humana. De 
fato, negar ao homem o poder de decidir autonomamente como quer viver, em que 
projetos pretende se engajar, de que modo deve conduzir sua vida privada, é frustar 
sua possibilidade de realização existencial. Todos possuem o inalienável direito de 
serem tratados como pessoas, e o tratamento como pessoa exige o reconhecimento da 
autonomia moral do agente, da sua ontológica liberdade existencial'~. 
Em tudo, e por tudo, o instituto da arbitragem e a nova geração do 
direito, notadamente a solidariedade e o pluralismo, se harmonizam entre si e 
com a realidade social. Mas, não só, se alinham, também, com a incapacidade 
estatal de prover, com eficiência e a tempo e hora, as imensas necessidades da 
7 
8 
Apud, Pierre Lerneim, La Soberania dei Individuo - Fundamentos y Consecuencias del Nuevo 
Liberalismo. Madrid: Unión Edi toria l, 1992, p. 15. 
De Lessing podemos extrair a seguinte passagem: "Falk: Crês que os homens são criados para 
os Estados, ou que os Estados para os homens? Ernest: Aquilo parece ser o que alguns querem 
afirmar. M as isto parece mais verdadeiro." (apud, Gustav R.adbruch. In: !'ilosofia do Direito. São 
Pau lo: Martins Fontes, 2004, p. 77.) 
Direitos Fundamentais e Relações Privadas. Rio de janeiro: Lumen ]uris, 2004, p. 189. 
34- ARlliTRAGEM NO DIREITO SOCIETÁRIO 
sociedade. Esse cenário propicia o revigoramento da autonomia privada, fruto 
de uma motivação inconsciente dos indivíduos, tão forte a ponto de transfor-
mar a arbitragem em direito posto em diversas jurisdições, inclusive no Brasil e 
na Espanha. 
2. LIBERDADE: EsPINHA DoRSAL DA ARBITRAGEM 
A liberdade é o pano de fundo do instituto arbitral. É da natureza de 
sua gênese e dela é indissociável. Arbitragem, já se disse, é um campo de liberda-
de; é para quem quer e sabe ser livre. 
Talvez, nesse particular, re~idam as resistências, reticências e contestações 
à arbitragem. A cultura do estatismo ainda se encontra muito arraigada no 
âmago do ser humano. 
Contudo, deixemos de lado essa discussão ideológica para, desde logo, 
demonstrar que foi, justamente, pelo exercício da liberdade que se proliferou 
a utilização da arbitragem e, com sua prática, se permitiu, em várias passagens, 
a justa e adequada realização da justiça. 
Sem a arbitragem, a história demonstra que a justiça dos povos não seria 
concretizada ou, no máximo, seria realizada de forma insatisfatória. Qlero 
com isso afirmar que, em muitos momentos da vida humana a liberdade foi 
instrumento essencial para a plena pacificação das controvérsias. 
Daí porque, quando registro o papel fundamental da arbitragem na efe-
tivação da justiça, quero afirmar e ressaltar o atributo maior do instituto que 
é, exatamente, a liberdade. O poder da pessoa de se autodeterminar, nomea-
damente no que toca ao acesso à justiça, foi o que propiciou aos interessados, 
sem qualquer intervenção estatal, a solução eficaz de seus conflitos. 
Em outras palavras, a liberdade é elemento fundamental e inerente à 
arbitragem. Liberdade, como primado do indivíduo e corolário da concretiza-
ção da justiça. 
No aspecto subjetivo, a liberdade manifesta-se, no campo do direito 
privado, no poder da pessoa estabelecer, pelo exercício de sua vontade, o 
nascimento, a modificação e a extinção de suas relações jurídicas. No aspec-
to objetivo, significa o poder de criar juridicamente essas relações, estabele-
cendo- lhes o respectivo conteúdo e disciplina. No aspecto subjetivo, 
autonomia de vontade, e no aspecto objetivo, como poder jurídico normati-
PEDRO A. BATISTA M ARTINS - 35 
vo, denomina-se autonomia privada. Instrumento de sua atuação e realiza-
ção é o negócio jurídico9. 
No que toca à arbitragem, a autonomia privada funciona como poder de 
afastar a jurisdição estatal e a autonomia da vontade como o poder de estabe-
lecer as condições pelas quais irá se desenvolver o processo arbitral. 
Essa liberdade, como dito antes, é o ponto nodal do instituto e a história 
demonstra que a ausência de amarras estatizantes permitiu que a justiça fosse 
atingida, como ideal de pacificação social, em seu escopo mais relevante: resol-
ver a lide sociológica. 
3. ARBITRAGEM. BREVE HISTÓRICO. MEIO V IABILIZADOR 
DA jUSTIÇA 
O s estudiosos claudicam quanto ao momento em que surge o instituto da 
arbitragem. Segundo Le Baron Michel de Taube, "(!)a science moderne affirme 
que c'est l'Hellade classique qui est'la 'vraie patrie' de l'arbitrage internationa/'>~0 • 
Contudo, para outros, como Tod, essa afirmação não coincide com des-
cobertas realizadas no Egito e na Síria na década de 1880 sobre as relações de 
uma ampla comunidade internacional no Oriente Antigo desenvolvida entre 
o Egito, o Reino de Khéta, Babilônia, Assíria e outros E stados independentes, 
no período aproximado da metade do segundo milênio antes de C risto. Em 
linha com essa descoberta registra-se um caso de arbitragem envolvendo E sta-
dos-Cidades da Mesopotâmia que remonta ao ano 3.000 antes da nossa era11. 
Na verdade, pode-se dizer, com poucas chances de erro, que a arbitragem 
surge anteriormente à estruturação de um direito positivo e de uma ju stiça 
estatal. Daí, na visão mais entusiasmada de alguns, o instituto e sua prática 
surgem antes da formação dos Poderes Legislativo e Judiciário. 
Com efeito, passada a fase da auto-tutela, onde as desavenças eram resol-
vidas pela força física, os povos de certas comunidades buscam resolversuas 
diferenças heteronomamente, entregando a um terceiro o poder de determi-
nar o direito e a obrigação de cada parte na disputa. 
9 Francisco Amaral. In: Direito Civil - Introdução, 5' ed. Rio de janeiro: Renovar, 2003, p. 22. 
1 O Les Origines de L'Arbitrage lnternational Antiqué et Moyen Age, Librairie du Recuei! Sirey, 
1933, Recuei I des Cours (l-laia) - 1932 - IV, p. 11. 
11 Ibidem, p. 12. 
36- ARBITRAGEM NO DIREITO SOCIETÁRIO 
Normalmente, a pessoa escolhida não era um juiz, figura inexistente 
naquelas priscas Eras e, sim, um ancião, munido de vasta experiência, sabedo-
ria e ponderação. 
Com efeito, por força da intervenção de um terceiro leigo, afirma-se o sur-
gimento da arbitragem em momento anterior à existência do Poder Judiciário. 
Por outro lado, não se aplicava uma lei específica à causa, mas, sim, os 
usos e costumes daquele povo, sua ética e sua moral. 
Daí, também, se dizer que a arbitragem nasce bem antes da existência de 
um direito positivo. 
Vê-se que, nos primórdios, seria inviável a administração da justiça se 
não fosse a possibilidade de as partes, por livre manifestação de vontade, esco-
lherem o julgador e adotar a "lei" que conheciam e que lhes era conveniente. 
Registre-se que a decisão era cumprida bona jide. 
Mais tarde, durante a invasão pelos germanos do território que compu-
nha o Império Romano, os invasores, como é da praxe, impunham sua justiça 
e suas leis aos nativos da região invadida, como técnica de rápida introdução 
da cultura do povo invasor. 
Nesse momento histórico, o povo invadido e oprimido estaria muito mais 
pressionado e injustiçado se os conflitos com seus iguais tivessem de ser apreciados 
e julgados por um tribunal adverso e com base em lei totalmente estranha. 
Os cidadãos que habitavam essas regiões, exatamente para afastar as leis 
dos invasores, que desconheciam e que implicavam numa diversidade cultu-
ral, e para fugir à justiça dos bárbaros, buscavam resolver suas próprias contro-
vérsias por arbitragem para, valendo-se da autonomia privada, adotar a lei que 
lhes era conveniente e o julgador em que depositavam plena confiança. 
Novamente, a liberdade age como instrumento facilitador de satisfação 
da justiça. 
Mutatis mutandis, o mesmo aconteceu na Idade Média, com o boom do 
comércio e o desenvolvimento das práxis comerciais. Os mercadores, com o di-
namismo que lhes é peculiar no enfrentamento de novos negócios e na busca de 
mercados, inovaram nos usos e costumes criando mecanismos e instrumentos 
comerciais não acompanhados, a tempo, pelo ordenamento jurídico de então. 
Cientes dessa distância, solucionavam suas disputas por julgadores priva-
dos, especializados no ramo do comércio e, para tal, aplicavam às questões a !ex 
mercatoria que lhes era peculiar e que, de fato, regia suas relações comerciais. 
PEDRO A. BATISTA MARTINS- 37 
Para os comerciantes, a autonomia na escolha da via de resolução de confli-
tos era fundamental ao correto implemento dos seus negócios jurídicos. A prá-
xis era muito particular e de conhecimento restrito. ~alquer intervenção visando 
solucionar suas controvérsias de forma distinta dos seus usos e costumes, inclu-
sive pela adoção da via estatal, restaria por desestabilizar o sistema comercial e, 
dessa forma, gerar uma enorme insegurança nas relações e tratativas dos merca-
dores. Seus usos e costumes, pioneiros do direito, deveriam ser preservados. Para 
isso, fundamental a autonomia privada. 
Sem o exercício da liberdade, por certo, os comerciantes estariam em 
apuros e suas relações sofreriam grave insegurança se adotada a justiça co-
mum, não afeita ao ramo, e às leis existentes, bem atrasadas em relação à 
prática comercial. 
Mais modernamente se diz que a arbitragem comercial, nos Estados Uni-
dos, ressurge no período da Guerra de Secessão. Segundo relata Bruce L. Benson, 
"(e}! bloqueo naval que sufrió el Sur ocasionó un tremendo atraso en los tribunales 
ingleses por causa de los litigios sobre la compra, entrega y venta de! algodón en los 
mercados británicos. Muchos armadores no querían desqfiar el bloqueo, habia hundimi-
entos y los precios jluctuaban de forma impredecible. La neutralidad británica y las leyes 
de contrabando de guerra engrosaban la lista de di:ficultades. Además, las companias 
aseguradoras se abstenían de dar cobertura a estas jletes, o si lo hacían, era con un gran 
número de complrjas cláusulas, a causa de la gran incertidumbre. Y las cláusulas debían 
ser interpretadas a la luz de cada nueva contigencia''l2• 
Devido a todas as incertezas que o fato gerava e ao bloqueio, os processos se 
acumulavam nos tribunais estatais emperrando a solução das controvérsias. Dian-
te desse quadro de grave crise e insegurança a Associação de Algodão de Liverpool 
(Liverpool Cotton Association) acordou em incluir cláusulas de arbitragem nos 
contratos de seus associados e resolver as pendências numa câmara especializada. 
Dado ao êxito dessa medida a Corn TradeAssociation e a General BrokersAssociation 
seguiram os mesmos passos, assim como outras associações. Os efeitos restaram 
por serem sentidos também em Londres onde outras associações adotaram ames-
ma prática, como aquelas ligadas aos produtores de trigo e café e a profissões, 
como arquitetos, engenheiros e agentes de propriedade imobiliária13• 
12 
13 
}usticia sin Estado. Madri: Unión Editorial, 2000, p. 252. 
ibidem, pp. 252-253. 
38- ARBITRAGEM NO DIREITO SOCieTÁRIO 
Marcante, nesse particular, o relatório elaborado pelo representante do 
Colégio de Advogados da Filadélfia que foi enviado à Inglaterra para estudar 
os procedimentos da arbitragem levados a efeito, com sucesso, no país: 
"Su resurgimiente se ha visto favorecido por la convergencia de la 
organización de! comercio con las regulaciones gubernamentafes durante los 
primeros aiios de! siglo XX(...) cuanto mayor era la obsesión reguladora de la 
Administración, mayor era también ef anhefo de esferas de actividad 
voluntaria foera de su controL E! crecimiento de/ papel regulador de/ Estado 
sofiviantó a los partidarios de la autonomía de los comerciantes, que recurrieron 
af arbitraje como barrera protectora contra la intromisión administrativa. 
Ef arbitrajr1 permitió a los hombres de negocias resolver sus problemas à su 
manera - sin necesidad de los torpes y jlacos servicios de! Estado. 'H 
Vê-se que a arbitragem ressurge, também nos Estados Unidos, exata-
mente, como único mecanismo viabilizador do acesso à justiça. Sem a inicia-
tiva particular, com certeza, o Estado restaria por denegar justiça aos indivíduos. 
Graças ao mecanismo e a criatividade individual foi possível resolver as várias 
disputas oriundas do comércio internacional durante a guerra de Secessão e, 
assim, deixar fluir os intercâmbios negociais. 
Por outro lado, como ressalta o texto do representante do Colégio de 
Advogados da Filadélfia, a intervenção estatal nas atividades negociais, na-
quela época (e ainda hoje), causou certa repulsa dos comerciantes a ponto de 
impulsionar, ainda mais, a prática da arbitragem. 
O desenvolvimento comercial, historicamente, já reclamava mais liber-
dade e menos interferência do Estado nas relações privadas. Inclusive no que 
toca à realização da justiça. 
4. A INDESEJÁVEL INTERVENÇÃO EsTATAL 
Como vimos, seja pelo atraso, inoperância ou ineficiência da máquina 
estatal, seja pela sua incômoda e desastrada intervenção, a verdade é que a 
autonomia privada se afigura como uma garantia e uma proteção dos direitos 
fundamentais do cidadão, nomeadamente daquele que diz com o acesso à 
justiça. Direito esse visto sob a ótica da pacificação sociológica do conflito e de 
uma prestação jurisdicional efetiva. 
14 Wooldridge. "Uncle Sam, The Monopoly Man" (apud, Bruce L. Benson, ibidem, p. 253). 
PEDRO A. BATISTA MARTINS - 39 
Conquanto o Estado tenha seu papel na sociedade,por certo, não é a 
razão de ser desta. O Estado existe, justamente, para suprir as necessidades da 
sociedade. E, nesse particular, é devedor de uma prestação adequada de seus 
serviços à comunidade. Deve dispor, sim, de uma estrutura judiciária em pro-
veito de seus jurisdicionados. Nessa linha de raciocínio pode-se afirmar que o 
E stado é refém da sociedade, e não esta do Estado. 
Os serviços judiciários são disponibilizados à população em atendimen-
to a um dos deveres básicos e fundamentais do Estado. Conquanto seja um 
dever do Estado, se consubstancia, para o cidadão, em mera opção e, nunca, 
numa obrigação de sua utilização. Em extremo, o órgão judiciário pode nunca 
ser chamado a atuar, mas, nem por isso se libera o Estado do dever de prover a 
estrutura para a resolução dos conflitos envolvendo seus jurisdicionados. 
A pessoa, no âmbito de seu exclusivo discernimento, é que decidirá se 
fará ou não uso da burocracia estatal judiciária para resolver suas lides. 
O indivíduo é soberano para definir o que melhor atende aos seus interesses. 
E a história, como visto, demonstrou que essa liberdade, ao longo dos tem-
pos, teve papel de extrema relevância na resolução adequada e justa dos conflitos. 
Sem esse pressuposto maior - liberdade - , várias seriam as ocasiões em 
que os conflitos restariam latentes. O direito poderia, até mesmo, ser aplicado 
sem que isso resultasse, necessariamente, na realização de uma justiça, efetiva-
mente, justa. Por sinal, como ainda hoje acontece. 
Mais que isso, sustentam alguns estudiosos com base em fatos ocorridos 
décadas atrás que a mitigação da liberdade pela intervenção estatal no institu-
to da arbitragem, não raro, tumultua o ambiente e gera discussões em áreas 
jurídicas cujos efeitos já estão digeridos pelos usuários da arbitragem. É o caso 
das arbitragens ocorridas no seio das associações especializadas em segmentos 
econômicos, como cereais e algodão. 
Com efeito, no início do século XX, o instituto funcionava sem amarras 
e o Estado, com a intenção de reforçar a eficácia da arbitragem, acabou por 
abrir espaços para dúvidas e incentivar novas disputas. 
Isso porque, na prática, a ausência de coerção estatal na utilização da arbitra-
gem e no cumprimento da decisão dos árbitros era suprida, satisfatoriamente, pela 
ação direta das associações junto a seus associados, ou se:ja, sem qualquer participa-
ção da autoridade estatal. Penalidade e expulsão do agente eram sanções suficien-
tes a impor o cumprimento voluntário dos provimentos exarados pelos árbitros. 
40- ARBITRAG[M NO DIREITO SOCIETÁRIO 
Ao ver de uma corrente de arbitralistas a lei promulgada pelo Estado de 
Nova Iorque, em 1920, que conferia eficácia à cláusula arbitral e respaldava, 
judicialmente, a sentença proferida em sede de arbitragem, tornou viável a arbi-
tragem naquele estado e, posteriormente, sua difusão no país como um todo. 
Conquanto não se discuta a rawabilidade dessa afirmação, o fato é que, 
no âmbito das associações de classe e de produtores, já imperava a vinculação 
das partes à arbitragem e a sujeição ao resultado da controvérsia, inobstante lei 
expressa nesse sentido. 
Os associados temiam as sanções impostas pelas associações àqueles reni-
tentes em instituir ou cumprir com a determinação dos árbitros. 
Como atesta Wooldridge, "(..) estas sanciones [expulsão; impossibilidade 
de participar de outras arbitragens] eran mucho más terribles que el quebranto que Ie 
pudiera ocasionar el Jallo con ei que disentía. Estos dictámenes emanados de un proceso 
privado y voluntario se acataban voluntariamente, si por honor, por interés'~5• 
Devido a esse espontâneo cumprimento das decisões arbitrais, sustenta 
Bruce L. Benson que, com a edição da lei nova-iorquina uma miríade de 
ações inundou os tribunais judiciais contestando, dentre outras, a forma de 
indicação de árbitros, a necessidade da presença de advogados, resultando a 
arbitragem em um processo mais complicado e legalista16• 
Extrai-se desse fato, uma vez mais, que a justiça se realizava e se impu-
nha, satisfatoriamente, sem a interveniência do Estado. No seio das associa-
ções imperava, literalmente, o pacta sunt servanda. E, como corolário desse 
pressuposto, se realizava a justiça, que era acatada sem maiores contestações. 
Aplicavam-se os costumes, as práxis e as leis peculiares a cada segmento 
econômico e se nomeavam pessoas com a expertise desejada, tudo com sustentação 
no princípio da autonomia privada. E, dessa forma, sem a intervenção do Estado, 
os interessados pacificavam seus conflitos. As sanções das associações asseguravam 
o cumprimento da decisão, repita-se, sem a necessidade da intervenção estatal. 
Com efeito, a lei de Nova Iorque, ao invés de fortalecer o instituto, res-
tou, naquele momento, por tumultuar o cenário jurídico da arbitragem, em 
mais uma demonstração da indesejada e, às vezes, desastrada, intervenção es-
tatal no setor privado. 
15 llpud, Brucc L. Benson, op. cit., p. 257. 
1 6 Op. cit, p. 257. 
CAPÍTULO 2 
Prevalência da 
Maioria como Princípio 
Social I narredável 
42- ARBITRAGEM NO DIREITO SOCIFTÁRIO 
Analisadas, holisticamente, a contribuição dos indivíduos no aprimora-
mento das funções estatais, em grande escala pela ineficiência do Estado para 
suprir, solitariamente, as necessidades da sociedade, nomeadamente no campo 
do acesso à justiça, e à qualificação dos indivíduos como fonte propulsora da 
melhoria da atividade estatal, em linha com a nova geração do direito e a 
democracia participativa e, ainda, do papel histórico e fundamental da liber-
dade individual na concretização da justiça, reduzirei o foco de minha abor-
dagem para empreender breve vôo a respeito de tema que confronta a liberdade 
individual e a vontade estabelecida pelo grupo social. 
Trata-se da imposição de resolução de conflitos por arbitragem, em de-
trimento da tradicional solução judicial. 
Minha intenção final é a de enfrentar a eficácia de deliberação da espécie 
no âmbito das associações empresariais, mas me parece correto admitir que as 
semelhanças destas organizações com os demais grupos sociais autorizam, nesse 
momento, a adoção de fundamentos e de visão comuns, ao menos no que toca 
aos princípios de convivência social. 
Um cot~jo entre a sociedade privada e a estatal evidenciará a identidade de 
ambas. Os rasgos essenciais de ambas são precisamente os mesmos, como se-
guem: 1) fim comum; 2) existência de normas que regulem a perseguição dos 
fms, numa, sob a forma de contrato, a !ex privata, na outra, sob a forma de lei, ou 
seja, !ex publica; 3) no conteúdo da lei: situação jurídica, direitos e deveres da 
comunidade, como do indivíduo; 4) realização dessas normas contra a vontade 
resistente do indivíduo mediante coação; 5) administração, ou seja, a livre perse-
guição da finalidade com os meios da sociedade dentro dos limites fixados por 
aquelas normas e tudo o que a isso se prende: necessidade de um órgão especial 
para esse objetivo na existência de um número maior de membros (conselho 
administrativo, governo), alinhando-se aí a distinção entre aqueles através de 
quem e aquele por quem existe a administração (empregados, funcionários -
acionistas, concidadãos, súditos) e o perigo, daí decorrente, de um emprego de 
seus meios no interesse de seus administradores, contrariando o interesse da 
sociedade, perigo a que a sociedade estatal, não menos do que a sociedade de 
direito privado, se acha exposta, e, como meio contra esse risco, há o controle 
dele através da própria sociedade (assembleia-geral- assembleia das classes)17• 
1 7 Rudol f Von lhcring. A Finalidade do Direito, vol. I, trad. José Antonio Faria Correa. Rio de 
Janeiro: Editora Rio, p. 161. 
PEDRO A. BATISTA MARTINS - 43 
O aspecto sensível diz respeito aos efeitos erga omnes de um pacto arbi-
tral decidido pela maioria integrante do agrupamento

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